PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO APELAÇÃO CRIMINAL 17.2010.4.05.8402). 10710-RN (0000315- APTE : JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA ADV/PROC : LEONARDO DIAS DE ALMEIDA APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APDO : OS MESMOS. ORIGEM : JUíZO DA 9ª VARA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (COMPETENTE P/ EXECUçõES PENAIS). RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL CONVOCADO JOAQUIM LUSTOSA FILHO. RELATÓRIO 1. Cuidam os autos de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelo acusado JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA em face de sentença (fls. 156/160) proferida pelo MM. Juiz Federal da 9ª Vara da SJ/RN, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal, ao absolver o réu do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8666/93 (fraude em licitações) e condenálo pela prática do crime capitulado no art. 299, CPB (falsidade ideológica), aplicando uma pena total de 2 (dois) anos de reclusão e multa, fixada em 20 (vinte) dias-multa, calculados com base no valor de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente na data do fato, tendo a pena privativa de liberdade sido substituída por duas penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44, CPB. 2. A exordial acusatória (fls. 03/09) atribuiu aos acusados, JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA e RAIMUNDO NONATO DOS SANTOS, a prática do delito insculpido no art. 90, da Lei nº 8.666/93, ao constatar que os réus, mediante ajuste prévio, fraudaram o caráter competitivo do procedimento licitatório (Tomada de Preços nº 022/2002). O denunciado JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA teria, ainda, inserido informações falsas no contrato da empresa JUACEMA CONSTRUÇÕES LTDA, consistente na inclusão inverídica de sócios no contrato social da referida empresa, a fim de ocultar a verdadeira administração da empresa, que lhe pertencia de fato, incorrendo no crime de falsidade ideológica (art. 299, CPB). JM/IZM 1 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO 3. Proferida sentença às fls. 156/160, fora absolvido o réu JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA da acusação de fraude no procedimento licitatório (art. 90 da Lei 8.666/93), posto que não havia nos autos provas suficientes do suposto ajuste fraudulento entre as empresas dos denunciados. Não obstante, condenou-se o réu JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA ao crime de falsidade ideológica (art. 299, CPB), ao reconhecer a ocultação de fato juridicamente relevante, qual seja, a real composição societária da empresa, que lhe pertencia de fato. O acusado RAIMUNDO NONATO DOS SANTOS, por sua vez, citado por edital (fl. 56), não foi localizado, tendo sido, quanto a este, suspenso o curso do processo e o prazo prescricional. 4. O Ministério Público Federal, às fls. 169/174, interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença condenatória quanto à dosimetria da pena, aduzindo a necessidade de aumento da pena-base cominada. 5. O acusado JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA, por seu turno, interpôs recurso de apelação às fls. 182/200, aduzindo em síntese: a inépcia da denúncia ministerial, a ausência de dolo por parte do denunciado e, subsidiariamente, a diminuição da pena base fixada. 6. Contrarrazões Público Federal às fls. 202/208. apresentadas pelo Ministério 7. Parecer ministerial (fls. 212/215) opinando pelo não provimento do apelo do particular. 8. É o relatório. 9. Remetam-se os autos ao Revisor, nos termos do art. 29, inciso IV, do Regimento Interno desta Corte Regional. Recife, 05 de maio de 2014 Joaquim Lustosa Filho Relator Convocado JM/IZM 2 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO APELAÇÃO CRIMINAL 17.2010.4.05.8402). 10710-RN (0000315- APTE : JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA ADV/PROC : LEONARDO DIAS DE ALMEIDA APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APDO : OS MESMOS. ORIGEM : JUíZO DA 9ª VARA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (COMPETENTE P/ EXECUçõES PENAIS). RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL CONVOCADO JOAQUIM LUSTOSA FILHO. VOTO 1. Cuidam os autos de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelo acusado JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA em face de sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal, ao absolver o réu do crime capitulado no art. 90, da Lei nº 8666/93 (fraude em licitações) e condená-lo, pela prática do crime insculpido no art. 299, CPB (falsidade ideológica), a uma pena total de 2 (dois) anos de reclusão e multa, fixada em 20 (vinte) dias-multa, calculados com base no valor de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente na data do fato, tendo a pena privativa de liberdade sido substituída por duas penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44, CPB. 2. A referida sentença condenatória (fls. 156/160) não vislumbrou nos autos provas suficientes capazes de demonstrar a materialidade e autoria delitiva do crime previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93, supostamente praticado pelos denunciados JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA e RAIMUNDO NONATO DOS SANTOS, representantes das empresas que participaram do procedimento licitatório (Tomada de Preços nº 022/2002), relativa ao Convênio nº 2.716/01. Por outro lado, o douto Magistrado reconheceu a materialidade do crime de falsidade ideológica (art. 299, CPB) imputado ao réu JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA, ao constatar a inserção inverídica de sócios no contrato social da empresa JUACEMA CONSTRUÇÕES LTDA. JM/IZM 3 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO 3. Aduz a defesa de JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA, em suas razões de apelação (fls. 182/200), que a sentença condenatória merece ser reformada no ponto em que condena o réu ao crime de falsidade ideológica (art. 299, CPB), haja vista a inépcia da denúncia ministerial e a ausência de dolo por parte do réu. Subsidiariamente, pugna pela diminuição da pena base cominada. 4. Quanto à alegação de inépcia da denúncia ministerial, penso que esta não restou configurada no caso em espeque. Analisando a exordial acusatória de fls. 03/09, constato que a peça aponta o fato delituoso de forma exaustiva, em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias, indicando os documentos que ensejaram a falsidade documental imputada ao ora apelante e o convênio que fundamentou a denúncia da suposta fraude em licitação, bem como estabelece consistente vínculo entre o denunciado e a conduta criminosa. Por conseguinte, não restou configurado o cerceamento da defesa, posto que não se caracterizou a inépcia da denúncia, haja vista que o próprio apelante se manifestou sobre todos os fatos aduzidos. 5. No que tange à imputação do crime falsidade ideológica (art. 299, CPB) ao réu JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA, o Código Penal descreve o delito da seguinte forma: Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante . 6. Da dicção legal, extrai-se que a conduta típica consiste em omitir, ou fazer inserir em documento, declaração que falseie a verdade, alterando fato juridicamente relevante no intuito de prejudicar direito ou criar obrigação. Trata-se, portanto, de crime JM/IZM 4 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO formal, em que não é necessária a demonstração do prejuízo, consumando-se com a inserção de informações falsas no documento. 7. Compulsando os autos, verifico que a autoria e a materialidade delitivas estão amplamente demonstradas. No caso em análise, o depoimento dos supostos sócios da empresa, no sentido de que não participavam da administração da sociedade e nem integravam o patrimônio social da empresa JUACEMA CONSTRUÇÕES LTDA, bem como o próprio depoimento do acusado JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA, evidenciam que coube a este efetuar o registro empresarial em nome de terceiros, uma empregada doméstica e um trabalhador rural semianalfabeto (“ laranjas” ), mesmo sabendo que eles não teriam condições de responder pelas atividades da pessoa jurídica (intervalo 04:40 a 05:54, mídia anexa à fl. 98). 8. Veja-se que o réu prestou informação inverídica sobre a real composição societária da empresa JUACEMA CONSTRUÇÕES LTDA (fato juridicamente relevante), omitindo seu próprio nome no contrato social da referida sociedade, quando se sabe que a administração lhe pertencia de fato. 9. Não há como se admitir a tese suscitada pela defesa de que o fato típico restaria descaracterizado por ter o ora apelante agido como procurador da JUCEMA CONSTRUÇÕES LTDA, não tendo em nenhum momento se ocultado da situação. A descrição típica do crime de falsidade ideológica não exige o elemento de ocultação do autor que pratica a falsidade, mas, tão somente, a omissão ou inserção de informações falsas em documento público ou particular, com o intuito de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante (no caso em espeque, a falsa composição societária no intuito de esquivarse das responsabilidades empresariais). 10. Ademais, o fato de ser o apelante mandatário da empresa não afasta o tipo penal, posto que não exclui a potencialidade lesiva do contrato social falsamente formulado e nem exime os falsos sócios de todas as responsabilidades concernentes à atividade empresarial. JM/IZM 5 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO 11. Por fim, penso ser igualmente infundada a tese levantada pela defesa no sentido de que falta à conduta do acusado o elemento subjetivo do tipo. Isso porque a ação do autor evidencia o intuito de eximir-se das responsabilidades inerentes à atividade empresarial, tais como a incidência de carga tributária, o pagamento de verbas salariais e a partilha de lucros entre os sócios, que nada recebiam apesar de constarem como integrantes do contrato social da referida empresa. 12. O elemento volitivo do dolo foi reafirmado no aditivo contratual (fls. 102/105, do IPL 0619/2008), em que insistiu o réu na manutenção de informações inverídicas acerca da real composição societária da empresa, que lhe pertencia de fato. 13. Alega a defesa, ainda, que a pena base cominada pelo Juízo de Primeiro Grau não observou os requisitos exigidos para sua fixação, faltando-lhe fundamentação que justificasse aplicação acima do mínimo legal, em clara violação ao art. 93, IX, CF. 14. Ora, examinando a douta sentença quanto à dosimetria da pena (fl. 159), não observo ausência de fundamentação na fixação da pena base que enseje reforma de seu quantum. As circunstâncias judiciais elencadas no art. 59 foram satisfatoriamente analisadas no caso concreto pelo Magistrado, estando a pena superior ao mínimo legal ante ao maior desvalor da ação do apelante, tendo em vista que se utilizou de pessoas de baixa instrução para satisfazer seu intuito delitivo. 15. Portanto, a pena de reclusão de 2 (anos) e 20 (vinte) dias-multa, substituída por 2 (duas) penas restritivas de direitos, aplicada ao apelante está adequada e suficiente para reprovação e prevenção do crime, inexistindo violação ao diploma constitucional, posto que o Magistrado fundamentou sua decisão em face dos preceitos normativos penais. JM/IZM 6 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO 16. O Ministério Público Federal interpôs, ainda, recurso de apelação (fls. 169/174) no sentido de majorar a pena-base cominada. Pugna pela condenação de 2 (dois) anos e 1 (um) mês de reclusão, além da pena de multa, ressaltando que a majoração poderia “ espancar a pretensão punitiva, vez que implicará prazo prescricional de 08 (oito) anos, em lugar de (04 (quatro)”(fl. 173). 17. Não há como admitir tal argumentação. As circunstâncias judiciais elencadas no art. 59, do CPB, foram proporcionalmente consideradas na situação em apreço, ficando acima do mínimo legal porque o acusado se utilizou de pessoas inocentes e de baixa instrução (“ laranjas” ) para fazer valer seu intuito delitivo, violando regras de registro de sociedades empresariais. 18. Não há outras circunstâncias que concorram para o aumento da pena-base, de modo que a dilação do prazo prescricional não é circunstância que enseje o aumento da pena base, o que representaria clara violação ao Princípio da Legalidade e da Proporcionalidade. 19. Ante às razões acima alinhadas, nego provimento às apelações interpostas pela defesa e pela acusação, mantendo a sentença condenatória em todos os seus termos. 20. JM/IZM É como voto. 7 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO APELAÇÃO CRIMINAL 17.2010.4.05.8402). 10710-RN (0000315- APTE : JOSÉ OLIVEIRA FERREIRA ADV/PROC : LEONARDO DIAS DE ALMEIDA APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APDO : OS MESMOS. ORIGEM : JUíZO DA 9ª VARA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (COMPETENTE P/ EXECUçõES PENAIS). RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL CONVOCADO JOAQUIM LUSTOSA FILHO. ACÓRDÃO PENAL E PROCESSUAL PENAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 299, CPB. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO ACATADA. DESCRIÇÃO SUFICIENTE DO FATO TÍPICO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO COMPROVADO. DOSIMETRIA. PENA-BASE ADEQUADAMENTE FIXADA. DECISÃO MOTIVADA. ART. 59, CPB. 1. Inépcia da denúncia não configurada, posto que a peça acusatória apontou o fato delituoso de forma suficiente, indicando os documentos que ensejaram a falsidade documental imputada ao ora apelante e o convênio que fundamentou a denúncia da suposta fraude em licitação, bem como estabeleceu consistente vínculo entre o denunciado e a conduta criminosa. 2. Não restou configurada, portanto, a inépcia da denúncia ou o cerceamento da defesa, tendo o acusado se manifestado amplamente sobre todos os fatos contra ele aduzidos. 3. Autoria e materialidade sobejamente demonstradas no feito. O crime se consumou com o registro de empresa em nome de terceiros (“ laranjas” ), quando esta pertencia, de fato, ao acusado. O fato de o réu ter agido como procurador da empresa não afasta o delito em espeque, posto que não exclui a potencialidade lesiva do contrato social falsamente formulado, nem exime os falsos sócios de JM/IZM 8 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO todas as responsabilidades decorrentes da atividade empresarial. Por outro lado, também não é requisito do tipo penal o elemento subjetivo de ocultação daquele que pratica a fraude. 4. Dolo amplamente demonstrado. Houve a intenção de prestar informação inverídica sobre a real composição societária da empresa (fato juridicamente relevante), a fim de eximir-se das responsabilidades inerentes à atividade empresarial, tais como a incidência de carga tributária, o pagamento de verbas salariais e a partilha de lucros entre os sócios, que nada recebiam apesar de constarem como integrantes do contrato social. Dolo reafirmado no momento do aditivo contratual, em que insistiu o acusado na manutenção de informações inverídicas sobre a composição da empresa. 5. As circunstâncias judiciais elencadas no art. 59, CPB, foram satisfatoriamente analisadas e motivadas de acordo com os preceitos normativos penais pelo Magistrado a quo, sendo a pena aplicada adequada e suficiente para reprovação e prevenção do crime, inexistindo qualquer violação art. 93, IX, CF. Apelo do réu improvido. 6. Pena-base que foi devidamente estipulada. Verifique-se que na fase inicial da dosimetria, o Magistrado a quo fixou a penalidade do acusado em 2 anos, ficando acima do mínimo legal porque o acusado se utilizou de pessoas de baixa instrução (“ laranjas” ) para fazer valer seu intuito delitivo, representando um maior desvalor da ação. Não havendo outras circunstâncias relevantes que concorram para o aumento da pena base, na há que se falar em majoração desse quantum. Apelo ministerial improvido. 7. Negam-se provimento à apelações interpostas pela defesa e pela acusação, mantendo-se a sentença condenatória em todos os seus termos. Vistos, relatados e discutidos estes autos de ACR 10710-RN, em que são partes as acima mencionadas, ACORDAM os Desembargadores Federais da Primeira Turma do TRF da 5a. Região, por unanimidade, em negar provimento às apelações interpostas pela JM/IZM 9 PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A. REGIãO defesa e pela acusação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado. Recife, 29 de maio de 2014. Joaquim Lustosa Filho RELATOR CONVOCADO JM/IZM 10