Brasil, o que se espera do pré-sal?
BRASIL, O QUE SE ESPERA DO PRÉ-SAL?
RETROSPECTIVA CONSTITUCIONAL DO PETRÓLEO E
ANÁLISE DO NOVO MARCO LEGAL
BRAZIL, WHAT TO EXPECT OF THE “PRE-SALT”?
CONSTITUTIONAL RETROSPECTIVE OF THE OIL AND ANALYSIS OF THE NEW LEGAL
FRAMEWORK
Marília Gabriela de Araújo Melo Pereira1
Resumo
Este trabalho vislumbra a concreção de uma retrospectiva constitucional petrolífera,
além das legislações referentes ao petróleo e pré-sal, e as modificações do novo
marco legal, analisando-o criticamente e apontando as suas perspectivas, eis que
antes da descoberta do pré-sal, os contratos eram celebrados mediante o regime
de concessão, o qual implica ao concessionário a obrigação de explorar, por sua
conta e risco e produzir petróleo ou gás com direito à propriedade destes bens
extraídos, mas com a exploração compartilhada, o contratado passa a exercer por
sua conta e risco as atividades e em caso de êxito, possui o direito à restituição do
custo do óleo e de parcela do excedente em óleo nas condições pactuadas. Além
disso, houve a criação de um Fundo Social e de uma nova empresa pública, a Présal Petróleo S. A., para gerir os novos contratos no âmbito do pré-sal, a autorização
da cessão onerosa de direitos de exploração da União à Petrobrás e a sua
capitalização. Ocorre que os riscos são inúmeros, não há definição das alíquotas
dos royalties, o Fundo Social não estabelece percentuais fixos para cada área a ser
investida e a capitalização da Petrobrás pode trazer grandes prejuízos à sociedade.
Soma-se a isto a afronta a diversos Princípios Constitucionais. Tendo em vista
tantos questionamentos, vem esta pesquisa demonstrar os prováveis efeitos
gerados pela adoção de um novo marco legal e elencar soluções aos problemas
apontados. Tudo isto por meio de uma abordagem dedutivista e funcionalista num
modelo de pesquisa teórico e metodológico.
Palavras-chave: Pré-sal. Novo Marco Legal.
Abstract
This work presents a retrospective of the concretion constitutional oil rules, in
addition to laws relating to oil and “pre-salt”, as modifications of the new legal
framework, analyzing it critically and pointing their perspectives, as before the
discovery of pre-salt, contracts were awarded by concession, which implies an
obligation of the holder of said concession to explore at his own risk and produce oil
1
Advogada, Especialista em Direito pela UFPE, Mestranda em Direito pela UFPE e Membro do
Grupo de Pesquisa sobre Direito do Petróleo da UFPE. E-mail: [email protected].
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Marília Gabriela de Araújo Melo Pereira
or gas with the right to their ownership, but with shared extraction, the contractor
shall perform at his own risk activities and if successful, is entitled to a refund of the
cost of oil and a portion of the surplus of oil under the conditions agreed upon.
Furthermore, there was the creation of a Social Fund and a new public company,
the “Pre-Salt” Oil S. A., to manage the new contracts under the “pre-salt”, whith the
authorization of the onerous assignment of exploitation rights of the Federal
Governament to Petrobras and its market capitalization. It happens that the risks are
numerous, there is no definition of rates of royalty, the Social Fund does not set
fixed percentage for each area to be invested and the capitalization of Petrobras can
bring great harm to society. This added to the affront of various Constitutional
Principles. Having seen so many questions, this research is to demonstrate the
likely effects generated by the adoption of a new legal framework and rank solutions
to problems identified. All this is analysed through a functionalist approach and a
deductivist model of theoretical and methodological research.
Keywords: Pre-Salt. New Legal Framework.
Sumário: Introdução. 1. Histórico Legal do Petróleo. 2. Alteração de Regimes Fiscais. 3.
Outras modificações legais. 3.1. Capitalização da Petrobrás. 3.2. Modelo de
Fundo Norueguês. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
Tendo em vista a dependência gerada pela sociedade com relação ao uso
do petróleo e de seus derivados, relata a sua evolução histórico-legal através de
uma retrospectiva desde o seu surgimento mercadológico, o desenvolvimento de
sua cadeia de produção, até os ditames imbuídos em meio interno, por meio das
Cartas Constitucionais dispondo sobre seu manuseio e titularidade.
Em sequência abordam os diferentes tipos de regimes fiscais utilizados nos
contratos petrolíferos, em meio à troca de regime efetivada em função da adoção ao
novo marco legal do pré-sal, que mutuou do modelo de concessão para o de partilha
de produção, salientado os aspectos mais polêmicos desta mudança e criticando-os.
Comenta ainda outros pontos referentes às Leis 12.304/2010, 12.351/2010 e
12.304/2010, tais como a criação do Fundo Social estabilizador da economia interna,
aludindo ao modelo paradigma norueguês, a criação da Petro-Sal para a
averiguação dos novos contratos em âmbito de pré-sal, bem como a capitalização
da Petrobrás, com todos os pormenores embebidos nestas inovações, os quais
poderão proporcionar prejuízos à coletividade por razões financeiras e axiológicoconstitucionais.
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Brasil, o que se espera do pré-sal?
1
HISTÓRICO LEGAL DO PETRÓLEO
A história do petróleo foi marcada por um ciclo comercial2 iniciado nos
Estados Unidos, cujo intuito único era remediar enfermos portadores de reumatismo.
Em 1849, o líquido foi intitulado como “kier rock oil” por conta de Samuel Kier o ter
comercializado
como óleo
medicinal a custo
de
um
dólar por garrafa.
Posteriormente, o petróleo foi utilizado como óleo de iluminação, e apenas em 1854
fundou-se a primeira companhia petrolífera dos Estados Unidos, a Pennsylvania
Rock Oil Company of New York, com o objetivo de pesquisa e produção de recursos
minerais e sal, ocorre que as dificuldades eram muitas em razão das paredes das
salinas gerarem desmoronamentos constantes. Assim, em 1859, o Coronel Draker,
um dos sócios da empresa, resolveu revestir as paredes internas com tubos de ferro,
iniciando a era do petróleo e o seu desenvolvimento tecnológico com a indústria do
refino. (COSTA, 2009, p. 1-25)
Nasceu a medida padrão do barril de petróleo a partir de barris
armazenadores
de
uísques,
os
quais
se
encontravam
disponíveis
como
reservatórios, cuja capacidade de 159 litros é até hoje utilizada comercialmente. Em
1863, houve uma grande expansão dos estabelecimentos de refino. Vários países
começaram a produzir petróleo na América, Europa e Oriente Médio. Mais tarde foi
inaugurado o seu transporte por dutos completando a integração industrial do
petróleo, com todas as atividades de exploração, produção, refino, transporte e
distribuição, a cadeia ‘do poço ao posto’, incluindo o upstream, midlestream e
downstream se completava. O desenvolvimento da indústria do petróleo se deu
devido ao emprego do petróleo e seus derivados nas diversas áreas da indústria e
nos motores de combustão, gerando uma dependência econômico-social no século
XIX, cujos reflexos são claramente percebidos no século XX. Em meio a guerras viuse o petróleo e seus derivados atrelados às questões estratégicas e políticas dos
países. Os movimentos nacionalistas cresciam, pois os países hospedeiros
percebiam que as rendas advindas desta riqueza proporcionavam benefícios à
população. Em 1960, foi criada a OPEP em Bagdá formando um cartel de
2
O petróleo sem cunhos comerciais já havia sido utilizado no antigo Egito para o embalsamento de
mortos e também na construção das pirâmides. (SIQUEIRA, 2010, p. 17)
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exportadores de petróleo, o que mudou para sempre as relações de força entre
hospedeiros e compradores. Hoje a dignidade da pessoa humana se vê associada
ao acesso ao Direito de Energia. (COSTA, 2009, p. 1-25)
Em 1864, são datados os primeiros estudos sobre a possibilidade da
existência de petróleo em território brasileiro. Houve a mudança na disciplina
constitucional das riquezas provenientes do solo. Até a Constituição de 1891, art. 72,
§17, o proprietário do solo as detinha devido ao caráter da acessoriedade. A partir
da Constituição de 1934, seu art. 119 passou a constar que o aproveitamento
industrial das minas e das jazidas, assim como as águas e energia dependiam de
concessão, assim a sua exploração passa a ser objeto de concessão, perseverando
o pensamento na Constituição de 1937, mas restringindo ao regime das
autorizações. Em 1938, com o Decreto 395 foi declarada a sua utilidade pública,
esta foi a primeira legislação brasileira a respeito do petróleo. Em 1946, as
concessões retornaram. Porém, o monopólio do petróleo foi constitucionalizado
apenas em 1967 no art. 162 da Constituição então vigente, esta carta assegurava o
regime dúplice e o direito ao proprietário do solo à participação nos resultados da
lavra, exceto as jazidas e minas cujo monopólio era da União. A ideia foi perpetrada
na Carta de 1969 em seu art. 169, contudo foi o Poder Constituinte de 1988, por
meio do art. 177, que transcreveu detalhadamente as atividades da indústria
petroleira previstas na Lei instituidora da Petrobrás 2.004/53, a qual teoricamente
determinou a atuação monopolística da empresa de 1953 até 1997, e apenas
conseguiu alcançar a autossuficiência em 2005, mesmo ano da instituição da ANP
por meio da Lei 11.097. A Lei Federal 9847/99 ficou conhecida como a lei do
petróleo, mas no ano de 2007, com a descoberta na bacia de Santos das reservas
de hidrocarbonetos localizadas na camada geológica denominada pré-sal, a cerca
de sete mil metros abaixo da água foi encontrado um óleo de considerável leveza e
voluptuosidade, o que levou ao estabelecimento de um novo marco legal. (SOUTO,
2010, p. 1-248)
2
ALTERAÇÃO DE REGIMES FISCAIS
Há quatro regimes fiscais básicos de exploração e produção de petróleo:
concessão, partilha de produção, prestação de serviços e joint venture. No primeiro
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a empresa explora o recurso e assume os riscos e a propriedade do óleo e gás,
garante direitos exclusivos para pesquisa, lavra e comercialização, sua disputa
depende do pagamento de bônus aos estados e royalties cuja base de cálculo é
relacionada à receita bruta, a principal desvantagem deste regime é a falta de
conhecimento sobre a comercialidade da área a ser concedida. O regime de partilha
foi utilizado pela primeira vez na Indonésia em 1966 e neste a propriedade do
petróleo é do Estado, mas as empresas podem gerenciar e operar as instalações
assumindo todos os riscos. O Estado tem sua parcela do custo no investimento, mas
é pago às empresas com as receitas futuras do estado, o excedente em óleo não
possui critérios de definição, não há o pagamento de bônus, as empresas têm direito
de recuperar seus custos de operação ao longo dos anos e de manutenção nos
anos em que eles ocorrem, pode ser estabelecido um limite para recuperação do
custo em óleo, os riscos e os recursos são partilhados entre a empresa e o governo,
oferece maior segurança tanto ao estado quanto as empresas, pois o contrato é
inflexível por somente poder ser alterado pelo Parlamento. A contratação de serviço
pode ser de dois tipos: de prestação de serviços ou de risco, nos primeiros as
empresas são contratadas para explorar e desenvolver um campo em troca de
pagamento, todos os riscos, investimentos e petróleo são do estado, já no de risco
os investimentos serão recebidos em dinheiro ou em petróleo, pois o risco é de não
ocorrer tal produção. Por último há o regime de joint venture, no qual não existe
critério nem definição estabelecidos, os custos e riscos são compartilhados entre
estado e empresas, exigem longas negociações e o estado é responsável direto, por
isso mister se faz a fiscalização e arbitragem de uma agência reguladora. (LIMA,
2011, p. 11-16)
A escolha do regime fiscal se dá em razão das circunstâncias do local, se o
risco exploratório for alto, deve ser eleito o modelo de concessão, com royalties. Se
há grandes reservas e baixo risco de produção deve ser adotado o contrato de
partilha. Nos países incapazes de atrair investimento de empresas são comuns as
joint ventures e naqueles com grande reserva, baixo risco exploratório e baixo custo
são utilizados os contratos de serviço.
Antes da descoberta do pré-sal, os contratos eram celebrados mediante o
regime fiscal de concessão, o qual implica ao concessionário a obrigação de
explorar, por sua conta e risco e produzir petróleo ou gás com direito à propriedade
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destes bens extraídos, entretanto após, o governo e o Congresso Nacional optaram
pela exploração compartilhada, importada da Indonésia nos anos 50, no qual o
contratado exerce por sua conta e risco as atividades de exploração, avaliação,
desenvolvimento e produção e em caso de êxito possui o direito à restituição do
custo do óleo e de parcela do excedente em óleo nas condições pactuadas. Este
novo tipo contratual foi adotado sob o argumento de que em meio a eventual
ausência de sede constitucional para as concessões de petróleo haveria a
autorização na instituição de um novo modelo contratual, bem como outros
mecanismos de funcionamento do setor.
Sendo assim, este regime de partilha altera a Lei 9.748/97, o contratado
exerce
por
sua
conta
e
risco
as
atividades
de
exploração,
avaliação,
desenvolvimento e produção, com direito a apropriação do custo em óleo, da
produção dos royalties e parcela do excedente em óleo, cuja parcela será repartida
entre a União e o contratado sob critérios a definir em contrato, sendo resultado da
diferença entre a produção total, o custo do óleo, os royalties e se necessária a
participação do superficiário. Por se tratar de áreas estratégicas de baixo risco e
elevada produção o operador será a Petrobrás, cuja participação mínima é de 30%
em caso de consórcio. O bônus de assinatura é um valor fixado à União.
A definição dos blocos é papel do MME (com acesso irrestrito e gratuito ao
acervo técnico), CNPE E ANP conjuntamente, bem como a definição do excedente
em óleo, limites, prazos, critérios e condições para os royalties, conteúdo local
mínimo, valor do bônus de assinatura. (LIMA, 2011, p. 35)
3
OUTRAS MODIFICAÇÕES LEGAIS
Além da mudança contratual, as novas Leis 12.304/2010 e 12.351/2010
trouxeram a criação de um Fundo Social e de uma nova empresa pública, a Pré-sal
Petróleo S. A., para gerir os novos contratos no âmbito do pré-sal, bem como a
autorização da cessão onerosa de direitos de exploração da União à Petrobrás e a
sua capitalização, por meio da Lei 12.304/2010, ocorre que isto não garante uma
renda estatal maior que a estabelecida pela antiga lei do petróleo, além disso, o
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Brasil, o que se espera do pré-sal?
Fundo Social não deve receber vultosos recursos a curto prazo e a capitalização da
Petrobrás pode trazer grandes prejuízos ao patrimônio público.
O Fundo Social tem como objetivos a formação de uma poupança pública ao
longo dos anos de exploração do pré-sal, e a implementação destes recursos na
aplicação no desenvolvimento social e regional do país, na minoração das variações
de renda e preços na economia interna e no investimento em fontes alternativas de
energia, entre outas pretensões. Todavia, a lei não estabelece percentuais fixos para
cada área a ser investida deixando estes objetivos muito soltos, inclusive o art. 47
§2º que trazia estes percentuais com 50% para educação pública, básica e superior
e 80% para a educação básica e infantil foi vetado pela Presidente da República,
resultando na criação de um Comitê de Gestão Financeira do Fundo Social para
dirimir a politica de investimento do fundo, cuja composição se dá pelo Ministro do
Estado e da Fazenda, Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão e Presidente
do Banco Central, os quais agirão no amplo leque da discricionariedade
administrativa. Dentre os recursos atinentes ao fundo a Lei 12.351/2010 enumera a
parcela do bônus de assinatura, a parcela dos royalties, a receitas advindas da
comercialização do petróleo e gás, a participação especial e as aplicações
financeiras. (LIMA, 2011, p. 24-31)
Afora estes aspectos, no que diz respeito à definição das alíquotas dos
royalties, no regime de partilha de produção não há percentuais fixos como no
regime anterior de concessão que estabelecia o valor entre 5% e 10%, dependendo
da produção, sendo assim a arrecadação do estado pode ser menor do que a
estabelecida na antiga lei do petróleo. A vantagem deste regime foi deixar a
Petrobrás como única exploradora do pré-sal. Além disso, o estado não precisa ser
investidor, nem correr riscos como se dá nos regimes de joint venture e de prestação
de serviços e ainda assim ficar com a maior parcela do excedente em óleo.
3.1
Capitalização da Petrobrás
Com relação à capitalização da Petrobrás, esta se concretizou com a
adoção da Medida Provisória 50/2010, a qual autorizou a cessão e a permuta de
ações entre entes federais, e da Medida Provisória 505/2010, a qual autorizou a
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colocação direta, em favor do BNDS, de títulos da dívida pública mobiliária federal
em até R$30 bilhões de reais. O motivo se pautou devido a grande capacidade
técnica da estatal, além disso com o aumento da participação da União no capital da
Petrobrás, porém, os investidores privados terão que investir na participação para
não serem diluídos de seus dividendos. Esqueceram que a sociedade de economia
mista só foi criada porque houve colaboração do capital privado, uma vez que o
governo sozinho não teria condições de desenvolver a atividade, mas mesmo assim
não permitiram que o acionista privado continuasse recebendo as riquezas do
petróleo. A cessão do direito de pesquisa gerou no ativo da Petrobrás o equivalente
a dívida da empresa para com a União, com a subscrição das ações houve o
lançamento dos títulos da dívida pública no ativo da Petrobrás, aumentando o capital
social no passivo, e como a dívida da Petrobrás pode ser paga com títulos da dívida
pública, aqueles títulos utilizados pela União e entes federais serviram para o
pagamento da dívida, concomitantemente a entrada de outros acionistas trouxe
recursos
no
ativo
da
Petrobrás,
proporcionando
a
captação
de
R$
115.052.319.090,80, tornando-a a quarta maior companhia do mundo. (LIMA, 2011,
p. 109-116)
Esta capitalização além de diminuir o exercício do direito de preferência dos
acionistas, põe em risco o novo valor do capital da empresa. Soma-se a isto a
afronta a diversos princípios constitucionais, tais como a livre concorrência, a
isonomia, a liberdade, a autonomia, a segurança jurídica, a Democracia e o Estado
de Direito. (PRISCO, 2011, p. 1-256)
No Brasil, o aumento do government take na produção do pré-sal deve estar
atrelado a finalidades especificas, como por exemplo, a educação, mas a vinculação
orçamentária deve ser cumprida, como acontece com a CIDE-Combustíveis, inciso II
do § 4º do art. 177 da CF/88, os quais deverão ser destinados ao pagamento de
subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados
de petróleo; financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do
petróleo e do gás; e financiamento de programas de infraestrutura de transportes.
Conforme fiscalização do TCU, de 2002-2004, a arrecadação foi de R$ 22 bilhões,
R$ 9 bilhões não foram aplicados, R$ 10,6 bilhões em despesas do Ministério dos
Transportes, R$ 1 bilhão com pessoal e R$ 657 milhões com juros e encargos. Afinal
de contas não basta existir uma lei, é mister haver a efetivação orçamentária da
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Brasil, o que se espera do pré-sal?
vinculação, caso contrário os recursos advindos do pré-sal acarretarão disputas
políticas na partilha entre ministérios, órgãos e entidades da Administração.
(RIBEIRO, 2009, p. 179)
3.2
Modelo de Fundo Norueguês
Na verdade, a lei brasileira buscou inspiração no modelo norueguês, pois há
a presença de um regulador, ANP no Brasil e Olje-og Energidepartament – OED na
Noruega e de uma empresa controlada pelo Estado, Petrobrás no Brasil e
StatoilHydro na Noruega. O IBP se assemelha a OLF, entidade que congrega e
representa empresas petrolíferas e prestadoras de serviços. Lá eles utilizam o
contrato de licença ao invés do contrato de concessão brasileiro, que além de ser
mais enxuto, é composto por três documentos: as provisões especiais (o acordo que
prevalece sobre os demais documentos), o JOA (Join Operation Agreement) ou
acordo de operações conjuntas e o accounting agrement. Nenhum desses
documentos são negociáveis, apenas o nome das partes, suas participações, o
nome do operador e o número da licença do bloco são ajustáveis. Com a abertura
do capital da Statoil foi criada em 2001 a PETORO, empresa pública norueguesa
cujo capital é 100% do Estado para administração do SDFI (State’s Direct Financial
Interest) em virtude da necessidade de diminuição do poder e influência da empresa
estatal, à época maior empregadora da Noruega. No que tange ao seu sistema de
royalties, este se encontra em extinção. (RIBEIRO, 2009, p. 126-133)
Seu fundo social foi criado em 1990 e atualmente possui um montante de
2,3 trilhões de coroas ou U$S 420 bilhões de dólares, e apenas são utilizados os
valores frutos do rendimento dos recursos totais, cujos reflexos foram no atingimento
do pleno emprego, com um salário mensal de U$ 5 mil e uma inflação dentro das
metas. (GOBETTI, 2009)
O modelo importado norueguês do SDFI – State Direct Financial Interest e
da companhia estatal PETORO incorre no risco de sobreposição de agentes estatais
reguladores e de interferência governamental contraproducente. Há o risco das
NOCs (National Oil Company) tornarem-se estados dentro dos estados e ao invés
de defender os interesses do governo, utilizá-lo para proteger os seus. O controle do
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160
Marília Gabriela de Araújo Melo Pereira
governo sobre ela a faz uma extensão da Administração Pública e um controle
insuficiente pode fazê-la apenas mais uma multinacional do petróleo. Essa
modelagem vai de encontro ao poder de controle. (RIBEIRO, 2009, p. 166)
Acrescenta-se que os recursos brasileiros advindos do pré-sal acumulados
em um fundo correm o risco de serem utilizados para o aumento do déficit primário,
como já visto com os royalties até então, o que vai de encontro ao objetivo para o
qual a poupança fora criada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É certo que o ganho indireto pela sociedade com a efetivação destes novos
contratos é feito por meio da geração de empregos, inserção social, o que leva ao
ciclo do consumo e movimentação da economia, mas não se pode olvidar da grande
capacidade governamental de proporcionar diretamente desenvolvimento social com
as rendas do pré-sal, e em meio a tanta mudança é necessário “aparar as arestas”
deste novo marco, fixando as pendências, solucionando-as de pronto e visualizando
de forma cristalina o sentido destas modificações legais.
A partilha de produção não assegura ao Estado maior arrecadação, pois
não garante um excedente em óleo mínimo, não estabelece limite para recuperação
dos custos do contratado e nem alíquota de royalties, o que pode gerar grande
renda para o contratado e pouca para o Estado, daí a oportunidade em se criar a
empresa pública federal para representar a União. (LIMA, 2011, p. 128)
Quanto ao Fundo Social, seus recursos serão apenas do retorno sobre o
capital, algo que a um curto prazo será baixo. Com a cessão onerosa, a União
deixou de receber o bônus de assinatura e o excedente de óleo, os quais
vinculavam o contrato anterior e representavam importantes montantes para o
enriquecimento deste fundo, mas mesmo assim este possui um alto risco de ser
utilizado para fins não desenvolvimentistas.
Fica claro afirmar que as mudanças são necessárias em meio à
globalização, ocorre que antes deve haver um debate político, uma participação
social, aberta a sugestões e esclarecimentos quanto às alterações legislativas, eis
que sem estes instrumentos não há democracia e nem segurança jurídica,
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Brasil, o que se espera do pré-sal?
proporcionando uma visão arbitrária, estatizante, anti-democrática, radical e avessa
a sociedade.
O controle social não deveria se restringir a representantes da sociedade
civil no Conselho Deliberativo do Fundo Social, e sim na prestação de contas com
total transparência, pois esta mudança legal acontece em um período pré-eleitoral, o
que historicamente gera demagogia na aplicação das verbas públicas, o Rio de
Janeiro3, por exemplo, possui a segunda maior fonte de renda com o petróleo.
Em meio à assimetria de informações em virtude da preponderância de
conhecimento por parte da Petro-sal, é oportuno o maior supervisionamento
contratual, eis que o art. 174 da CF/88 prescreve caber ao Estado a tarefa de agente
normativo e regulador da atividade econômica, fortalecedor do papel do Estado, ao
gastar menos e arrecadar mais para maior distribuição da riqueza nacional.
É fundamental que o objetivo do Estado, insculpido no art. 3º da CF/88 por
meio da inclusão social dê azo a uma vida humana digna a todos os cidadãos
brasileiros.
REFERÊNCIAS
COSTA, Maria D’Assunção. Comentários à Lei do Petróleo. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
FRANÇA, Vladimir da Rocha; MENDONÇA, Fabiano André de Souza; XAVIER, Yanko
Marcius de Alencar. Energia e Constituição. Ceará: Konrad Adenauer Stiftung, 2009.
GOBETTI, Sérgio Wulff. Política Fiscal e Dívida Pública. Política Fiscal e Pré-Sal: como
gerir as rendas do petróleo e sustentar o equilíbrio macrofiscal do Brasil. Finanças Públicas,
2009.
LIMA, Paulo César Ribeiro. Pré-sal: O novo marco legal e a capitalização da Petrobrás. Rio
de Janeiro: Synergia, 2011.
PRISCO, Alex Vasconcellos. Atuação da Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e
Gás Natural S. A. – Pré-sal Petróleo S. A. (PPSA): gestão e risco no regime jurídicoregulatório dos consórcios constituídos no âmbito do sistema de partilha de produção.
Revista de Direito Público da Economia. Belo Horizonte, Fórum, ano 9, n. 34, p. 1-256,
abr./jun. 2011.
RIBEIRO, Marilda Rosado de Sá. Novos Rumos do Direito do Petróleo. Rio de Janeiro:
Renovar, 2009.
3
Apesar dos valores provenientes do petróleo serem sua segunda maior fonte de renda, vários
municípios do Rio de Janeiro investem em time de futebol, inclusive o ex-secretário de Guamaré
disse “é tanto dinheiro que entra que políticos tem que encontrar um jeito de gastar.” (FRANÇA;
MENDONÇA; XAVIER, 2009, p. 156)
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Marília Gabriela de Araújo Melo Pereira
SIQUEIRA, Mariana de. O fomento aos campos maduros de petróleo e o
desenvolvimento: uma análise jurídico-constitucional. Natal: UFRN, 2010.
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Propostas legislativas de novo marco regulatório do présal. Revista de Direito Público da Economia, Belo Horizonte, Fórum, ano 8, n. 29, p. 1248, jan./mar. 2010.
SUNDFELD, Carlos Ari. Quanto reformar do direito brasileiro do petróleo? Revista de
Direito Público da Economia, Belo Horizonte, Fórum, ano 8, n. 29, p. 1-248, jan./mar.
2010.
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