Aprendendo a ler artigo científico Aline Silva De Bona1 Elisa Daminelli2 Humberto Luz Oliveira3 Resumo: Este trabalho apresenta o relato de uma atividade de ensino e de extensão desenvolvida, em 2011, com 120 estudantes do 1º ano do Ensino Médio Integrado do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) Campus Osório. A finalidade da proposta era despertar o interesse do estudante pela pesquisa através de ações que viabilizassem sua compreensão das informações dadas em artigos de divulgação científica na área das ciências exatas, particularmente em Matemática e Física. O projeto foi desenvolvido extraclasse e apoiou-se em recursos digitais como fonte de apresentação dos trabalhos e também de pesquisa. Foram utilizadas revistas com publicações de divulgação científica para a pesquisa e leitura dos artigos. Também foram oportunizados momentos para compartilhar e socializar os trabalhos dos estudantes, com o objetivo de mobilizá-los a aprender a aprender, e aprender a pensar os conceitos de Matemática e Física. Palavras-Chave: Artigo Científico. Matemática. Física. Interdisciplinaridade. Pesquisa. Abstract: This paper presents the report of a teaching and extension activity carried out with 120 firstyear high school students of the Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) Campus Osório in 2011. The aim of the proposal was to arouse the students’ interest in research by actions that helped them to understand the information presented in articles related to Science, particularly Mathematics and Physics. The project was developed as an extra curriculum activity and used digital resources for presentation of works as well as for research. Scientific publications were used for reading and researching articles. It was also given the students opportunities to socialize their works with the aim of mobilizing them to learn to learn, and learn to reflect on concepts in Physics and Mathematics. Keywords: Scientific Articles. Mathematics. Physics. Interdisciplinarity. Research. Introdução A leitura e a interpretação estão presentes em todas as áreas do conhecimento, e as informações se disseminam cada vez mais rápido e por diferentes meios de comunicação. Além disso, a socialização de resultados de pesquisas científicas ocorre através da publicação de artigos em revistas de divulgação científica. Desta forma, considera-se importante que o estudante de ensino médio desenvolva habilidades de leitura que possibilitem a seleção, compreensão e interpretação das informações presentes em textos científicos de sua área de interesse. Outro aspecto importante é a constatação, através da experiência docente dos professores envolvidos na proposta, que os estudantes de Ensino Médio apresentam grande dificuldade para relacionar os conceitos das diferentes áreas do conhecimento, em particular, os conceitos que envolvem a Matemática e a Física. 1 Mestre em Ensino de Matemática – UFRGS; Doutoranda em Informática na Educação – UFRGS. Mestre em Ensino de Matemática – UFRGS. 3 Doutor em Física – UFSC. 2 Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 20 Partindo dessa situação elaborou-se uma proposta de atividade que proporcionasse momentos de leitura e discussão de textos científicos e que, além disso, oportunizasse uma integração entre as disciplinas de Matemática e Física. O projeto de extensão denominado “Artigo Científico: aprendendo a ler” é uma proposta para uma leitura orientada e dialogada entre colegas e professores, cada qual com seu olhar sobre o artigo, de acordo com a sua formação acadêmica e leitura de mundo. Esta troca de ideias permite a reflexão da ciência, do ser humano, da sociedade e sobre todo o aspecto essencial da educação. A proposta tem um projeto de aprendizagem que o estrutura, que está vinculado ao grupo de pesquisa denominado MaTec – Matemática e suas Tecnologias, do IFRS – Campus Osório. Considera-se o projeto inovador, no sentido de aproximar as ciências exatas e as humanas, através da linguagem e das diferentes formas de representar a compreensão de algum conceito científico e/ou técnico. Dessa forma este projeto está em consonância com os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN+ (2000), que objetiva a reformulação do ensino médio e a articulação entre as áreas do conhecimento, e que almeja formar conhecimentos para a vida, e não apenas “reproduzir dados, denominar, classificar ou identificar símbolos. Significa: saber se informar, comunicar-se, argumentar, compreender e agir; tomar gosto pelo conhecimento, aprender a aprender; ...” (BRASIL, 2000, p. 9). O presente relato pretende socializar a ideia de um projeto de ensino e extensão que foi desenvolvido em 2011 com os estudantes do 1° ano do Ensino Médio Integrado em Administração e Informática do IFRS – Campus Osório, com 120 estudantes. As atividades foram conduzidas por dois professores de Matemática e um de Física fora do horário regular de aula. A proposta apoia-se em uma metodologia de diálogo para o trabalho docente e de pesquisa-ação para as atividades de pesquisa entre professores e estudantes. O projeto teve como objetivos: 1) Possibilitar a integração das ciências exatas e humanas, através de uma forma de representar as informações que estão no formato de texto científico, e demonstrar a Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 21 necessidade do conhecimento da lógica da ciência, especificamente através do uso de uma linguagem científica, organizada sob a forma de artigos de divulgação científica. 2) Viabilizar um meio de estudo, além da fronteira de sala de aula, e não somente com o professor, mas através das trocas entre os colegas de diferentes modalidades de ensino, sendo além de interdisciplinar, multidisciplinar. 3) Mobilizar o aprender a aprender, com autonomia e responsabilidade, na área do conhecimento que o estudante tem maior interesse, potencializando os seus saberes. 4) Incentivar a pesquisa de matemática e suas tecnologias em diferentes momentos, não apenas em sala de aula, e nem somente em temas solicitados pelos professores, mas também sobre temas de curiosidade e interesse dos estudantes, estabelecendo relações, e projetos interdisciplinares que são de aprendizagem, de forma individual ou coletiva, despertando assim a criticidade e contribuindo para a educação científico-tecnológica do estudante. 5) Interpretar os textos segundo diferentes olhares de cada ciência do conhecimento, e conhecer as normatizações de um trabalho de pesquisa seja na área tecnológica quanto na humana. Para atingir os objetivos propostos foram desenvolvidas quatro atividades ao longo do ano letivo de 2011. Em todas as atividades foram realizados momentos para socialização e discussão das leituras. O projeto iniciou com a leitura de um artigo de Simões (2009), publicado na revista Scientific American – Brasil, sob o título “Física Sobre Duas Rodas” (SCIAM - 2009). Em um segundo momento os estudantes foram orientados para uma pesquisa e coleta de material referente às bicicletas e o seu funcionamento. A terceira etapa do projeto foi uma pesquisa e leitura sobre artigos que tratavam das diferentes formas de energia. Para a última atividade cada estudante escolheu, conforme seu interesse, um assunto dentre alguns temas que foram sugeridos pelos professores, e, por fim, elaborou um texto com base nas leituras realizadas. Este artigo pretende socializar a ideia do projeto desenvolvido com os estudantes do Ensino Médio Integrado. Para tanto, apresentam-se as referências teóricas que embasaram o trabalho e descreve-se uma das atividades que foram desenvolvidas. Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 22 Escolheu-se relatar a segunda atividade, na qual os estudantes buscaram informações sobre o funcionamento da bicicleta. A atividade também resultou na apresentação de alguns trabalhos dos estudantes, na forma de “banner”, em um evento científico (I Mostra Científica do Campus Restinga). Finalmente, apresentamse as considerações e as referências bibliográficas. Referências teóricas A ideia inicial surgiu da necessidade de trabalhar de forma integrada, em especial, as disciplinas de Matemática e Física com os estudantes do Ensino Médio Integrado do IFRS Campus Osório. A leitura de artigos científicos possibilita um espaço de aprender a aprender e também a integração interdisciplinar e multidisciplinar entre as ciências exatas e as humanas através de um texto escrito, no qual os estudantes têm a possibilidade de retirar informações que podem ser representadas de diferentes maneiras. Assim, uma informação escrita pode ser representada através de uma equação da Matemática ou de um conceito da Física, por exemplo. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN+ (2000) o Ensino Médio assume a responsabilidade de completar a Educação Básica, portanto com o objetivo de preparar para a vida, qualificar para a cidadania e capacitar para o aprendizado permanente. Além disso, destaca-se a importância de desenvolver habilidades e competências que permitam ao estudante reconhecer e utilizar a linguagem das ciências em sua comunicação e para compreender informações do mundo atual. “De forma geral, o desenvolvimento de competências nesse domínio da representação e comunicação envolve em todas as disciplinas da área: o reconhecimento, a utilização e a interpretação de seus códigos, símbolos e formas de representação; a análise e a síntese da linguagem científica presentes nos diferentes meios de comunicação e expressão; a elaboração de textos; a argumentação e o posicionamento crítico perante temas de ciência e tecnologia.” (BRASIL, 2000, p.26). Para atender a essas orientações são necessárias novas propostas para o ensinoaprendizagem das ciências, preferencialmente, oportunizando atividades que contemplem a interdisciplinaridade e que promovam a integração entre os conceitos das diferentes áreas, promovendo a discussão e o desenvolvimento de uma educação científico-tecnológica crítica. Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 23 A educação é responsável pelo início do processo de reflexão crítica dos estudantes no que se refere a integração das áreas do conhecimento com a finalidade de promover o desenvolvimento da sociedade. Segundo Skovsmose (2010) desenvolver uma educação crítica passa pela relação professor-estudante baseada no diálogo e na democracia tendo como ponto chave o envolvimento dos estudantes no processo educacional. Segundo Ribeiro (2003), D´Ambrosio (1996) e Piaget (1976) é necessário possibilitar aos estudantes espaços de aprender a aprender, de forma que eles sejam capazes de construir seu processo de aprendizagem superando suas dificuldades e potencializando seus saberes. Para Bona, Basso e Fagundes (2011), se faz cada vez mais necessário explorar os diversos espaços de aprender a aprender, aprender a pensar, além dos muros da escola, valendo-se das tecnologias digitais, com a finalidade de despertar o interesse e a curiosidade dos estudantes em construir os conceitos de Matemática e Física, como é o foco deste trabalho. Entende-se por aprender a aprender, e aprender a pensar como a capacidade de refletir, analisar e tomar consciência do que se sabe, dispondo-se a mudar seus próprios conceitos em busca de novas informações, a fim de compreender as ciências, o mundo e a si mesmo. A participação dos estudantes de forma ativa e reflexiva em todas as etapas é fundamental para o desenvolvimento deste projeto. E aos professores é importante a tomada de consciência das diferentes inteligências de cada estudante, que surgem naturalmente no processo de desenvolvimento de cada trabalho, desde a sua apresentação escrita até a socialização com os colegas e professores das suas ideias e conclusões, segundo Gardner (2004). A leitura e discussão de textos científicos atuais, integrando os conceitos estudados em diferentes disciplinas, como a Matemática e a Física, e a realidade, é uma atividade que pode contribuir de forma positiva para a formação crítica e científica dos estudantes. Pois é uma forma de possibilitar ao estudante acesso ao conhecimento sob outro olhar que não o ensino tradicional. Ao mesmo tempo propiciar uma compreensão do impacto produzido pela ciência e pelas inovações tecnológicas no cotidiano e na construção de estratégias para o futuro. Assim, de Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 24 forma atrevida, ousa-se reinvidicar que o projeto ultrapassa o aspecto de “representar” uma aprendizagem meramente informativa, ausente de reflexão crítica e sem significado para o estudante. Freire (1996) destaca que são importantes para a formação emancipatória dos estudantes as diferentes formas de ler e interpretar uma ciência, em particular a Matemática e a Física que parecem tão distantes da realidade, para a maioria da sociedade, e tão fundamental ao desenvolvimento tecnológico. O professor tem papel de mediador da atividade de ensino e extensão e de um orientador da atividade de pesquisa que ocorre paralelamente a sala de aula, sendo os estudantes o centro do processo de ensino-aprendizagem. A proposta teve como método de trabalho docente a metodologia dialogada de Freire (1996), e a pesquisaação como metodologia de pesquisa, segundo Franco (2006). Método e prática A metodologia dialogada do Freire (1996) é uma forma de trabalho com os estudantes que versa sobre a operacionalização do processo de ensinoaprendizagem no contexto da escola - da sala de aula -, de ambos os agentes do projeto - professores, estudantes e pessoas que assistem a apresentação dos trabalhos. Ou seja, um trabalho sustentado pelo diálogo entre os agentes, em que os professores buscam compreender como os estudantes recebem, trabalham, pesquisam e entendem os conceitos de cada artigo, e os estudantes sentem-se desafiados pelas questões dos artigos. Desta forma ocorrem trocas e interações baseadas no diálogo entre todos, sendo que tais trocas, em especial entre os estudantes, são muito importantes para o processo de aprender a aprender. A metodologia da pesquisa do projeto, além dos muros da sala de aula, é a pesquisa - ação de Franco (2005), na qual todos os agentes são pesquisadores em certo momento. Os estudantes pesquisam a temática do artigo e exploram os recursos e conhecimentos que são interessantes. Os professores pesquisam as temáticas em cada área do conhecimento e também sobre a aprendizagem conceitual dos estudantes em cada área do conhecimento e suas articulações. Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 25 A metodologia de pesquisa-ação é muito importante para a Educação Matemática, porque são nas diferentes propostas que se possibilitarão melhores processos de aprendizagem para a construção de conceitos de matemática de forma contextualizada e interdisciplinar. A metodologia de trabalho docente dialogado é articulada e integrada a metodologia de pesquisa do projeto Artigo Cientifico, em que ambas proporcionam um trabalho de pesquisa ao professor. Segundo Becker (2008) todo professor é, no sentindo mais amplo, um pesquisador, na medida em que elabora planos e atividades, desenvolve ações e metodologias, observa e avalia processos. Essa postura de professor-pesquisador é fundamental para que o docente reflita sobre sua prática e elabore estratégias para propor mudanças que visem a melhoria na qualidade do ensino. Conforme mencionado anteriormente, escolheu-se a atividade sobre a temática das bicicletas para relatar a prática desenvolvida no projeto. É importante destacar que a dinâmica de ação dos artigos era composta de três atividades: i) pesquisa e seleção de temática, segundo um artigo científico, pelos coordenadores do projeto e envio deste para lista de endereços eletrônicos dos estudantes; ii) desenvolvimento e orientações dos trabalhos em grupo, seguido de publicação do trabalho na mídia digital (pbworks), entendendo que este é apenas um recurso da tecnologia digital (TIC's aplicadas à educação) e iii) apresentação ao grande grupo, com questões públicas dos professores e colegas. A temática da bicicleta surgiu da ideia do primeiro artigo trabalhado com os estudantes, que tratava do funcionamento das motos e trazia muitos conceitos da Matemática e da Física. Procurou-se explorar novamente esses conceitos, revisitando-os e relacionando-os ao novo tema. Este aspecto pode ser observado no questionário que foi elaborado para a segunda etapa, especificamente nas questões 5 e 6, que exploram conceitos de massa, inércia, centro de massa e efeito de contraesterço. Assim, como primeiro momento desta atividade propôs-se aos estudantes que pesquisassem artigos que abordassem o tema bicicleta. Após a etapa de pesquisa, Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 26 os estudantes foram organizados em grupos de 3 ou 4 estudantes. Para auxiliá-los, os professores elaboraram algumas questões que serviram para nortear os trabalhos e também sugeriram artigos e sites que tratavam do mesmo tema e que serviram para complementar a pesquisa dos estudantes. As questões propostas foram as seguintes: 1) Como funcionam as marchas? Qual a diferença entre uma bicicleta comum e uma de 18 marchas? Para que serve uma marcha leve? E a pesada? 2) Qual a relação da roda da bicicleta com o deslocamento na pista de rolamento? Mencione as principais diferenças que você consegue observar entre os movimentos de rotação e de translação? 3) Entreviste pessoas (oficinas e atletas) que trabalham com bicicletas questionando: Como a bicicleta funciona? 4) Qual a relação entre o tipo de pneu da bicicleta e a pista de rolamento (piso)? Sendo tipo de pneu: largo ou fino. E para que servem os sulcos do pneu? 5) Quais as diferenças entre os modelos de bicicletas e os materiais utilizados em sua construção? E a massa dos modelos? 6) Faça uma pesquisa e discuta por que a bicicleta fica em pé quando está em movimento e cai quando está parada? Aproveite a pesquisa para explicar também por que um ciclista, ao virar para a direita, inclina o corpo e a bicicleta para direita, sem a necessidade de girar a direção? Observe que o efeito de contra-esterço não ocorre para as bicicletas, você sabe por quê? Cada grupo deveria escolher uma das questões acima para pesquisar artigos e realizar as leituras orientadas. Em seguida deveriam elaborar um texto sobre a questão escolhida, apresentando a seguinte estrutura: introdução, desenvolvimento, conclusão e referências bibliográficas; além disso, o texto deveria trazer apontamentos sobre os conceitos de Matemática e Física envolvidos no tema escolhido, relacionando dessa forma a teoria com a realidade. Os estudantes tiveram prazo de um mês para realização desta etapa e tiveram orientações dos professores quanto a escolha e leitura dos artigos. Conforme acordo com os estudantes, os textos foram entregues via pbworks, uma espécie de wiki, no qual os estudantes criaram contas permitindo acesso público das Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 27 informações. Os wiki são utilizados para identificar um tipo específico de coleção de documentos em hipertexto ou ambientes colaborativos usado para criá-lo. Assim, eles postavam as atividades e os professores e seus colegas poderiam acessar as informações e fazer comentários. Após a entrega dos textos, os professores fizeram a leitura, sugestões e apontamentos, possibilitando que os estudantes pudessem melhorar e corrigir eventuais erros de seus trabalhos. Posterior a esta fase de correção, organizou-se um seminário com todos os estudantes, em que eles deveriam apresentar seus trabalhos. Esta atividade de encerramento da proposta sobre o tema “bicicleta” oportunizou um momento de socialização e discussão de seus trabalhos. A seguir, comentam-se quatro trabalhos que foram apresentados no formato de pôster na I Mostra Científica do IFRS – Campus Restinga em outubro de 2011. Ilustração 1: Pôster do grupo 1: Cálculo da velocidade da bicicleta Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 28 Este grupo relacionou os conceitos de Matemática e Física para explicar a parte qualitativa: relação entre as grandezas físicas das velocidades linear (movimento de translação) e angular (movimento de rotação); e parte quantitativa: cálculo da velocidade linear da bicicleta de acordo com as marchas. Pode-se observar na ilustração 1, que os estudantes exploraram conceitos chaves e que são utilizados comumente no cotidiano, como “rapidez - pesado” e “devagar – leve” para caracterizar o movimento conforme a marcha utilizada. Ilustração 2: Pôster do grupo 2: Por que a bicicleta cai? Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 29 Interessante o encaminhamento da solução dada para a pergunta proposta, primeiro o grupo entende que movimento e repouso estão relacionados com o conceito de inércia (primeiro princípio de Newton). Mas, em seguida entende que ao entrar em movimento, aparece uma grandeza física que explica por que a bicicleta adquire equilíbrio e se mantém em pé enquanto há movimento. Esse equilíbrio ocorre às custas do momento angular (conceito que aparece implícito nas palavras dos autores deste trabalho). Em seguida explicam um efeito (contra-esterço), que é pouco conhecido, até mesmo, por profissionais na área de física. Como última observação, os estudantes realizaram um vídeo demonstrando esse efeito na prática. Ilustração 3: Pôster do grupo 3: Diferenças entre as marchas da bicicleta. Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 30 O grupo três explorou também a questão um (1) (mesma que o grupo 1 já havia respondido), mas com outro enfoque. Embora a discussão seja semelhante a do grupo 1, sobre conceitos de “rapidez - pesado” e “devagar – leve”, aparece o número de combinações possíveis de marchas, isto é, a relação entre as coroas (discos maiores dentados dianteiros) e catracas (discos menores dentados traseiros) e a correia para transmissão da força impressa nos pedais. Ainda, relacionam a marcha utilizada com o tipo de piso (plano ou inclinado) para obter melhor performance. Aqui os conceitos físicos (qualitativos) e matemáticos (quantitativos) são explicados pelos autores, mas de acordo com o seu campo de domínios conceitual e metodológico, ou seja, com sua visão de mundo, asserções de valores, da pesquisa realizada e dos registros que foram extraídos da pesquisa e transformados em conhecimentos concretos a respeito da questão foco. Os conceitos físicos são entendidos como qualitativos num primeiro momento em que os estudantes estão interpretando e compreendendo a proposta dos artigos. E, num segundo momento, já com a compreensão dos conceitos físicos, os estudantes conseguem demonstrar os conceitos físicos em uma linguagem matemática, quantificando-os. No caso do grupo 1, os estudantes inicialmente quantificaram as informações através da linguagem Matemática e da Física, desta forma eles fazem uma relação conceitual e simbólica da Matemática para a Física e da Física para a Matemática. Ilustração 4: Pôster do grupo 4: Diferenças entre os tipos de pneus Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 31 O grupo 4 escolheu pesquisar sobre o tipo de pneu e suas características. Essas características foram relacionadas com o terreno e a performance do atleta. O desempenho está sujeito as circunstâncias do tipo de piso que se deseja pedalar, e isto significa associar como são realizadas as combinações de borracha, e os fatores que influenciam na aderência ao piso (coeficiente de atrito entre o pneu e a pista) e na transferência de movimento para mudar a direção da bicicleta. Outras características dos pneus são mencionadas explicitamente como a ranhura (sulcos, liso, cravado). Assim, como também aparecem conceitos físicos disfarçados, como a pressão e temperatura dos pneus, através da palavra “aderência”. Pneus de competição trabalham nas melhores condições quando a temperatura e calibragem são adequadas com as condições da pista, melhorando assim a aderência e, portanto a performance do atleta. Isto está parcialmente explicado no texto dos estudantes, que poderia ter sido explorado com mais detalhes pelos mesmos. Considerações finais Neste artigo pretendeu-se apresentar de forma clara e objetiva uma proposta de atividade interdisciplinar, envolvendo particularmente as disciplinas de Matemática e Física, que foi aplicada com estudantes do Ensino Médio Integrado do IFRS Campus Osório. De forma geral, os estudantes se envolveram bastante nas atividades e demonstraram grande interesse em sua realização, e deste interesse se entende o participante do projeto como estudante, e não como aluno simplesmente, mas como o ser que tem curiosidade e estuda o que lhe desperta o interesse e não somente porque vale nota. Incorpora-se a esta ideia a noção de que a construção dos conceitos deve ser prioridade aos estudantes e não o cumprimento de atividades somente. Além disso, apresentar aos professores é muito bom e importante, porém apresentar aos colegas é ainda mais significativo, em especial em evento científico como na Mostra da Restinga, onde os estudantes entendiam-se como pesquisadores dos seus trabalhos. Com relação aos objetivos propostos para a atividade destaca-se que todos foram atingidos. Em alguns casos, os estudantes superaram as expectativas propondo novas ideias e formas diversificadas para a apresentação dos trabalhos, como Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 32 vídeos com entrevistas de profissionais da área, apresentação de slides, construção de réplicas, entre outros. Foi possível observar a interação entre as ciências exatas e humanas através dos trabalhos produzidos pelos estudantes. A proposta estimulava a leitura e interpretação de textos, além disso, os estudantes produziam textos próprios fazendo uso de linguagem adequada para apresentar e/ou representar os conceitos, de forma que faziam uso tanto da linguagem das ciências humanas quanto da simbologia das ciências exatas para expressar-se. A realização de atividades em grupos possibilitou a troca de experiências e saberes entre os estudantes, valorizando os conhecimentos de cada um, oportunizando momentos de cooperação e aprendizagem em um ambiente de estudo viabilizado pelas atividades propostas. A forma de comunicação entre os estudantes e professores do projeto se deu principalmente via e-mail. Uma parte da avaliação, as sugestões e apontamentos para a correção dos trabalhos ocorreu mediante ambiente virtual, wiki-pbwroks, e outra parte através de encontros agendados, destinados para apresentação de seminários e a socialização das ideias assim como encaminhamentos de temas e procedimentos das atividades de estudos futuros. A interação entre os estudantes e seus colegas e com os professores foi possível através do uso de tecnologias digitais como ferramenta de trabalho. Assim, cada estudante podia pesquisar artigos de sua área de interesse e socializar com os colegas, além de possíveis discussões sobre o tema e a construção do trabalho facilitada pelo uso de email. Essa troca de informações foi incentivada pelos professores como forma de enriquecer o trabalho de todos, mas ao mesmo tempo exigindo responsabilidade de cada um com suas atividades. Os estudantes tiveram oportunidade de aprender a escrever textos em formato científico, inclusive citando fontes referenciadas em seus trabalhos. A atividade proporcionou que os estudantes refletissem sobre a pesquisa e construção de um trabalho científico. Além disso, proporcionou que os estudantes Revista Trajetória Multicursos – FACOS/CNEC Osório Ano 3 – Vol. 5 - Nº 6 - Jul/2012 – ISSN 2178-4485 33 participassem de eventos em outras instituições socializando seus trabalhos valorizando, dessa forma, seus conhecimentos. Destaca-se ainda a relação entre ensino, pesquisa e extensão deste projeto. A proposta potencializa a atividade de pesquisa no transcorrer de uma atividade de ensino e extensão, pois a leitura de artigos traz temas não curriculares e que nem sempre são contemplados de forma linear nos conteúdos da sala de aula. Finalizando, destaca-se a importância do trabalho realizado, pois traz uma proposta inovadora no sentido de trabalhar com pesquisa e leitura de textos científicos oportunizando que os estudantes relacionem diversos conceitos trabalhados em sala de aula com as diferentes ciências e com a realidade. Além disso, proporciona a visualização de que o desenvolvimento tecnológico e social necessita de conhecimentos de diferentes ciências, e que interação entre as diferentes áreas do conhecimento é o que gera novos conhecimentos e impulsiona o desenvolvimento. Referências BECKER, F. Educação e Construção do Conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2011. BONA, A.S.D.; FAGUNDES, L.C; BASSO, M.V.A. A cooperação e/ou a colaboração no Espaço de Aprendizagem Digital da Matemática. In: RENOTE - Revista Novas Tecnologias na Educação, v. 9, n. 2, 2011. BRASIL. PCN+ Ensino Médio: Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. 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