14ª aula Sumário: Momento angular de uma partícula. Nota matemática sobre o produto vectorial. Momento de uma força e conservação do momento angular. A aplicação de um sistema de forças de resultante nula a um objecto que está em repouso pode alterar-lhe esse estado. É este o caso do corpo da Fig. 14.1 (a): sob a acção das 2 forças representadas o corpo roda e portanto passa a ter uma aceleração angular. Porrém, se as forças estiverem aplicadas como na Fig. 14.1 (b) o corpo permanecerá em repouso. (b) (a) Figura 14.1 É então importante saber onde estão aplicadas as forças. Há duas grandezas físicas úteis para o estudo do movimento de rotação de objectos extensos. Trata-se do momento de uma força e do momento angular. Em particular, o momento angular também se define quando se tem uma só partícula e é neste contexto mais simples que vamos apresentar estas grandezas. Momento angular de uma partícula O momento angular de uma partícula depende do seu momento linear (ou da sua velocidade, para uma partícula de massa fixa), p , e da sua localização, r , em relação a um ponto escolhido para origem. Por definição o momento angular, L , em relação a uma origem é um vector cuja norma é o produto da grandeza do momento linear, p, pela distância à origem, a multiplicar ainda pelo seno do ângulo que p e r fazem entre si. Se estes dois vectores tiverem a mesma direcção, o ângulo entre eles é nulo (ou então é um ângulo raso) e portanto o momento angular é nulo. No caso de os vectores não serem colineares, a direcção de L é perpendicular ao plano definido pelos vectores p e r e o sentido é o da progressão de um saca-rolhas que roda de r para p . Na Fig. 14.2 mostram-se os vectores r , p e L . O ponto O é a origem do vector posicional. 1 L O r θ p Figura 14.2 Escrevemos L=r×p (14.1) onde o sinal × designa produto vectorial (ou produto externo). A expressão anterior lê-se “o momento angular é o produto vectorial de r por p ”. No SI a unidade de momento angular é o “joule segundo” (J s). (Notar que [L]=[r][p]=[r][F][t]=[E][t].) Nota matemática sobre o produto vectorial De uma maneira geral o produto vectorial de dois vectores A e B é o vector cuja grandeza é C = A× B (14.2) C = A B sin θ (14.3) sendo θ o ângulo entre os dois vectores A e B . O vector C tem direcção perpendicular ao plano definido pelos vectores A e B e o seu sentido é o dado pela já referida “regra do saca-rolhas”. C θ B A Figura 14.3 2 Vamos ver como se determina o produto vectorial de dois vectores dados em termos das suas componentes cartesianas: A = Ax î + Ay ĵ + Az k̂ B = B x î + B y ˆj + Bz k̂ (14.4) Atendendo a que o produto escalar goza da propriedade distributiva em relação à adição, A × B + C = A × B + A × C , podemos fazer explicitamente o cálculo de [ ( ] ) A× B : A × B = Ax B x î × î + Ax B y î × ĵ + Ax B z î × k̂ + Ay B x ˆj × î + Ay B y ˆj × ˆj + Ay B z ĵ × k̂ (14.5) + Az B x k̂ × î + Az B y k̂ × ĵ + Az Bz k̂ × k̂ î × î = ĵ × ĵ = k̂ × k̂ = 0 (os vectores têm a mesma direcção) e, por outro lado Ora, î × ˆj = − ˆj × î = k̂ , ˆj × k̂ = − k̂ × ˆj = î , k̂ × î = − î × k̂ = ĵ (ver Fig. 14.4). z k̂ î y ĵ x Figura 14.4 A expressão (14.5) passa então a escrever-se A × B = (Ay B z − Az B y ) î + ( Az B x − Ax B z ) ĵ + (Ax B y − Ay B x ) k̂ (14.6) Há uma forma mnemónica de obter esta expressão que consiste em tomar o seguinte “determinante”1 î ˆj k̂ A × B = Ax Ay Az , Bx By Bz (14.7) desenvolvendo-o em relação aos elementos da primeira linha 1 Trata-se, evidentemente, de uma notação simbólica. Os elementos do determinante são números e não vectores. 3 Momento de uma força e conservação do momento angular Consideremos a equação fundamental da dinâmica escrita na forma F= dp , dt (14.8) em que F é a resultante das forças que actuam numa partícula de momento linear p . Multipliquemos vectorialmente ambos os membros da equação anterior pelo vector posicional r relativamente a uma origem O: dp . (14.9) dt Ora, usando a regra de derivação de um produto (que também se aplica ao produto vectorial de dois vectores), r ×F = r × d (r × p ) = d r × p + r × d p dt dt dt (14.10) donde r× dp d (r × p ) − d r × p . = dt dt dt (14.11) dr = v e p = mv o último termo de (14.11) é nulo pois é o dt produto vectorial de dois vectores com a mesma direcção. Introduzindo então dp d (r × p ) no segundo membro de (14.9) obtemos r× = dt dt Repare-se agora que, sendo r ×F = d (r × p ) dt (14.12) Atendendo à definição (14.1), o segundo membro é a derivada temporal do momento angular da partícula, o que permite escrever a equação anterior na forma dL . (14.13) dt Define-se o momento de uma força em relação a um ponto (ponto O, tomado para origem) como o produto vectorial de r por F , ou seja r ×F = M =r×F . (14.14) Finalmente, a equação (14.13) toma a forma 4 M = dL , dt (14.15) que é a “equação dos momentos” para uma partícula. É evidente que esta expressão não pode ser vista como uma nova lei da mecânica. Tudo o que usámos para a obter foi a Segunda Lei na forma (14.8). A unidade de momento de uma força no SI é “newton metro” (N m) ou joule (J). (Notar que, dimensionalmente, o momento de uma força é o produto de uma força por uma distância, tal como o trabalho.) Registe-se a semelhança formal que há entre as expressões (14.8) e (14.15). Relativamente a (14.8), tínhamos visto que se nenhuma força actuasse na partícula, o seu momento linear era uma constante do movimento. Também agora, a equação (14.15) permite-nos afirmar que, se o momento da força é zero, o momento angular da partícula é uma constante do movimento: se M = 0, L = C . Dizemos, neste caso, que o momento angular se conserva ou que é uma constante do movimento. 5