ESTRUTURAS COGNITIVAS TRABALHADAS NA PRÉ ESCOLA QUE
FACILITAM A CONSTRUÇÃO ADEQUADA DE CONCEITOS MATEMÁTICO
NA EXPECTATIVA DE APRENDIZAGEM NAS SÉRIES POSTERIORES
MARCIA APARECIDA BENTO DOS SANTOS (UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL).
Resumo
O conhecimento numérico da criança origina–se através das relações mediadoras e
convivência com situações cotidianas no ambiente familiar, segundo Vigotski, citado
por MOYSÉS (2001) é no processo de interação social que ocorre o
desenvolvimento do pensamento infantil. A presença dos números é comum e
frequente nas atividades lúdicas de contar e medir em diferentes circunstâncias. A
criança opera procedimentos matemáticos de acordo com a sua própria
compreensão em situações cotidianas que ocorrem nos grupos sociais dos quais
participa ativamente. Segundo FONSECA et CARDOSO, nessa perspectiva implica a
possibilidade de trabalhar assuntos diretamente relacionados à prática social dos
alunos para a construção de estratégias de leitura crítica (2005). A aprendizagem
da criança inicia–se muito antes da aprendizagem formal, Vygotsky (2006), ao
escrever sobre aprendizagem e desenvolvimento em idade escolar, afirma que a
criança já passou por uma aprendizagem aritmética própria, muito antes de se
intregar na escola. A presente comunicação pretende apresentar uma proposta de
estudo sobre aprendizagem aritmética com o auxílio da Literatura Infantil de modo
a promover o conhecimento sobre diferentes linguagens matemática, a partir de
diferentes conceitos, com o propósito de auxiliar a criança transpor conhecimentos,
relacionando diferentes áreas de investigação e leitura de dados, intencionando
desafiá–la a que vá se percebendo na e pela própria prática, sujeito capaz de saber.
(FREIRE, 1997). Aprender e ensinar a linguagem encantadora da matemática na
educação infantil, de acordo com Gimenez( 2006) aponta para a necessidade de
discutir e dialogar com profissionais da área sobre a importância do ensino
aprendizagem matemática na infância com base em experiências cotidianas bem
organizadas pela atividade escolar.
Palavras-chave:
aprendizagem aritmética, linguagem matemática, formação de conceitos.
Introdução
As informações do Referencial Curricular para educação infantil assinalam a
importância da reflexão sobre a prática acadêmica e científica para os que
trabalham com crianças de 0 a 6 anos de idade considerando que a criança, quando
nasce passa a fazer parte de uma classe, de uma etnia e de um grupo social
(KRAMER, 1995).
Aprender uma língua não é somente codificar palavras, mas também compreender
seus significados culturais do contexto que participa (BRASIL, 1998: 117). A
linguagem Matemática é uma prática presente no cotidiano infantil, nas ações
intencionais, nas orientadas e organizadas. Os jogos e as brincadeiras em grupo
motivam o dia a dia da criança em movimentos, as atitudes espontâneas e
autônomas fazem parte das ações intencionais. As ações orientadas e organizadas
ocorrem sob influência da escola. Ambas as situações desencadeiam um processo
de participação social e oportunidades de aprendizagem e a linguagem matemática
ocupa importante papel no universo das ações da criança, pois a matemática é
parte integrante do mundo e das relações humanas e, de acordo com Fonseca e
Cardoso (2005), a contextualização de saberes é influenciada por condições de
ordem social e cultural.
Na escola da infância, a relação entre língua materna e linguagem se interage de
maneira peculiar, pois para a aprendizagem da escrita a base natural é a fala como
elemento mediador entre pensamento e linguagem, assim sendo na aprendizagem
matemática a oralidade representa um papel fundamental. Na instituição de
educação infantil, a oportunidade de participação nas atividades de leitura e escrita
vinculadas ao contexto matemático, apresenta-se nas instruções de regras de
jogos, na leitura de notícias de jornal, informações sobre datas e horários. Tais
tarefas são, tradicionalmente, realizadas pelo professor e apresentam
características importantes para o processo de formação do conhecimento
matemático pela criança, porém cativar a curiosidade e o interesse da criança pela
leitura depende da oferta e oportunidade de participação no mundo literário
oferecido pelo professor em sua proposta de ensino. Mizukami (2004), baseada em
Shulman (1986), aponta para o fato de a base de conhecimento para o ensino
consiste de um corpo de compreensões, conhecimento, habilidades e disposições
necessárias para o professor tornar favorável o processo de ensinar e aprender em
diferentes contextos do conhecimento a fim de produzir aprendizagens nos alunos.
A diversidade de gêneros apresentados em situações de leitura compõem situações
de alfabetização, constituindo-se em ambiente de letramento que envolve a
participação das práticas sociais em que se usa a escrita. "O letramento também
significa compreender o sentido de uma determinada situação de qualquer outro
produto cultural escrito", (KLEIMAN, 2005:10). Algumas explicações para os
processos de aprendizagem e construção do conhecimento acentuam o papel da
espontaneidade do processo e da maturação das condições biológicas da criança.
Considerar que os recursos para construção do conhecimento resultam da
maturação das condições biológicas, aparecendo em períodos específicos da vida do
sujeito é um olhar reducionista que permite ao educador "esperar" para que a
criança melhore ou aprenda. Outra evidência desta valorização está no tratamento
dado ao educador e a própria identidade da educação infantil. A educação infantil
como um segmento significativo do processo de escolarização que assegura um
desenvolvimento real ou atual necessário para o ingresso no ensino fundamental.
A pesquisa tem por objetivo analisar a importância de desenvolver atividades
relacionadas às práticas sociais cotidianas e de interesse das crianças na escola da
primeira infância, pretende-se também discutir a prática pedagógica de maneira
crítica e reflexiva entre professores da educação Infantil sobre leitura e linguagem
como instrumento importante para a construção de conceitos matemáticos pela
criança.
Referenciais para a Educação Infantil
A qualidade da educação infantil depende do suporte e auxílio oferecidos pelo poder
público nas competências: financeira, administrativa e pedagógica, nos níveis
federal, estadual e municipal, em acordo com a legislação vigente. No entanto, para
desenvolver ações explícitas na LDB é preciso fornecer aos professores e às suas
instituições subsídios teóricos. Foi elaborado o RCNEI (Referencial Curricular para a
Educação Infantil), cujos módulos apresentam um conjunto de informações,
referências e orientações pedagógicas.
O referencial curricular para a educação infantil apresenta-se em três volumes,
possui caráter instrumental e didático com objetivo de subsidiar o planejamento,
desenvolvimento e avaliação das práticas educativas em diferentes regiões do país.
Em seu volume três trata sobre Conhecimento de Mundo, aborda o conteúdo da
Matemática propondo transmitir informações para a prática pedagógica de maneira
a atender as necessidades do aluno para a aquisição de novos conhecimentos
matemáticos.
A matemática e sua linguagem não é um fator isolado no cotidiano da criança, não
é também uma situação de memorização, pois é utilizada em situações diversas e
em diferentes contextos, como atividades informais de cálculo que fazem nas
somas de pontos nos jogos e brincadeiras, nas compras de produtos, na numeração
das casas e horários das atividades rotineiras. (BRASIL, 1997).
Nas escolas da infância, é comum propor às crianças atividades de escrita repetitiva
e memorização dos algarismos, aplicando exercícios de colar, pintar, e perpassar
pontilhados como forma de associar símbolo a quantidade e memorizar o numeral,
supondo que tais atividades favoreçam a aprendizagem matemática,
desconsiderando que a construção do conhecimento ocorre a partir de algo
representativo ao indivíduo, segundo Smole (2005), o conhecimento não é algo que
se produz sem razão.
Alguns professores acreditam que atividades infantis trabalhadas ou manipuladas
com material concreto produzem o desenvolvimento do raciocínio abstrato, talvez a
crença ocorra por entenderem que primeiro trabalha-se o conceito no concreto
depois no abstrato numa relação entre manipulável e abstrato. É importante
compreender que as ações manipuláveis dos sujeitos por si só não podem ser
considerados como experiências lógico-matemáticas, mas as próprias ações e a
relação que se estabelece entre sujeito pensante e objeto, as operações mentais ou
intelectuais que intervém nas deduções, originam das ações interiorizadas (SMOLE,
2005).
Segundo Piaget "não basta à criança pequena fazer demonstração de conhecimento
dos números enumerando-os sequencialmente, os números se constroem em sua
função natural" (PIAGET, 1975: 15).
A lógica da construção dos números na criança ocorre através de um conjunto de
ações organizadas em que o sujeito participe, ativamente, de situações dos
sistemas de inclusão, classificação e seriação de números, constituindo-se como
uma sucessão natural do pensamento lógico-matemático na infância.
A estrutura lógica da construção dos números não se dá através de atividades
repetitivas com conceitos idênticos, mas sim intuitivamente através de experiências
com base em generalizações a partir de agrupamentos.
As operações mentais ocorrem do simples para o complexo e a apropriação da
síntese da inclusão e da seriação por volta dos 8 anos, desencadeando um processo
construtivo durante o período escolar.
A simples correspondência dos números, apreendida de modo instantâneo, não
oportuniza a compreensão de situações matemáticas mais complexas.
De acordo com teorias de aprendizagem (PIAGET, 1974), toda nova aprendizagem
se insere num conjunto das aquisições anteriores à aprendizagem das estruturas
lógicas no período pré-operatório de 5 a 7anos, sendo assim a apreensão de
estruturas lógicas utiliza-se de experiências anteriores.
A linguagem matemática na educação infantil
A prática desenvolvida com o conteúdo da matemática na educação infantil parte
de um conjunto de conceitos de que a criança aprende através de atividades
concretas, de repetição e de memorização, segundo LOPES (2000) a matemática é
um contexto sociohistoricamente construído a partir de diferentes conceitos que
possam levar o aluno a construção do conhecimento.
O próprio RCNEI (1998), em seu texto, faz alusão a tal característica quando
ressalta que é comum a aplicação de situações de memorização de algarismos
isolados ou exercícios de escrita de números nas atividades de seguir o lápis sobre
pontilhados, colar bolinhas de papel sobre os numerais, colorir e copiar repetidas
vezes.
Kamii (1991) aponta que a estrutura lógico-matemática de número não pode ser
ensinada diretamente, uma vez que a criança tem que construí-la por si mesma.
O professor exerce importante papel na ação de produzir situações que levem o
aluno a pensar e estabelecer relações sobre a natureza dos números, pois o
número é constituído pela criança a partir das relações que ela cria entre os objetos
e situações vividas, uma vez que o conhecimento da criança e sua interpretação
dos fenômenos da realidade ocorrem em conexão com sua atividade (LEONTIEV,
2006).
Petrovsky (1979) mostra que a criança, trabalhando com objetos reais,
naturalmente efetuam comparações entre eles, diferenciando-os uns dos outros.
Segundo Petrovsky, a criança que ainda não sabe contar consegue verificar a
desigualdade entre objetos, segundo vários parâmetros de comparação. É a partir
dessa idéia de desigualdade que é possível às crianças estabelecer uma base para a
compreensão dos números naturais.
É possível supor que a produção das Atividades matemáticas na escola infantil
parte de uma idéia de que as crianças devem ser treinadas a reproduzir respostas
certas ao invés de apresentarem hipóteses com significados reais.
Podemos atribuir significado à matemática na educação da infância através da
literatura infantil, entendendo que os paradidáticos são fontes capazes de
conquistar pluralidade de idéias referentes aos números, tratamento da informação,
medidas, espacialidade e geometria.
A inclusão de textos literários infantis na educação pré-escolar representa uma
metodologia eficiente e necessária à apropriação de conceitos matemáticos pela
criança, pois estimula o gosto pela leitura e a curiosidade para novas descobertas
de maneira a permitir o surgimento de idéias reflexivas que os auxiliem em
experiências posteriores.
Vygotysky (2006) ao tratar sobre a aprendizagem da criança em idade escolar
argumenta que o docente deve pensar e agir sobre um conjunto de capacidades:
observação, atenção memória, raciocínio e concentração na linguagem e que a
cada progresso destas capacidades significa adquirir competência de todas as
capacidades em geral.
Smole (1996) considera que a tarefa da educação infantil não é preparar as
crianças para as séries posteriores uma vez que habilidades e competências
adquiridas
são
consequências
da
qualidade
do
trabalho
pedagógico,
predominantemente das ações pedagógicas com origem em diferentes
conhecimentos necessários à aprendizagem dos alunos
As atitudes positivas do professor em relação à organização dos conteúdos e à
didática são elementos fundamentais para o envolvimento entre a literatura e a
matemática, nas atividades de ler, escrever, falar, ouvir, desenhar e colorir. E a
literatura infantil apresenta características desafiantes e convidativas às diferentes
interpretações do discurso matemático em sala de aula.
A prática de leitura de textos literários infantis possibilita ao aluno apropriar-se de
informações através da imaginação que pode ser articulada ao pensamento
matemático, segundo (SMOLE, 1996: 74). A conexão da matemática com a
literatura infantil propicia momentos para aprender novos conceitos e utilizar os já
aprendidos.
A leitura em diferentes contextos faz parte de um processo que estimula o
pensamento e o raciocínio (SILVA e CURI) e ao levar a literatura para a sala de aula
como proposta de trabalho na aula de língua materna é importante que a escolha
do texto literário se aproxime de aspectos matemáticos, algumas obras plausíveis
de serem selecionadas, entre elas: Aritmética da Emília (LOBATO, 1995) que
aborda a combinação dos números sendo o algarismo 1 o pai de todos como feixe
de sucessão numérica. Trecos e Cacarecos (PORTO, 1986) produz uma linguagem
simples e colorida das formas geométricas. Flict (ZIRALDO, 1984) conta a trajetória
de uma cor diferente e solitária que procura em vão por um amigo, a ilustração
colorida possibilita a análise e observação de linhas, curvas e circunferências. Alice
no país dos números (FRABETTI, 2000) o texto é uma literatura de ficção em
contexto interdisciplinar num mundo maravilhoso de aventura em viagens
desafiadoras capazes de transformar o olhar matemático em matemágico.
Considerações finais
A educação infantil é o período de escolaridade capaz de produzir condições
favoráveis para a criança construir novos conhecimentos de interesses sociais,
afetivos e cognitivos, através das ações e relações que estabelece entre o mundo
real e o imaginário.
As atividades espontâneas que a criança vivencia umas com as outras nas
atividades coletivas de brincadeira, jogos ou conversações de seu próprio interesse,
desempenha papel decisivo para transformar a ação em pensamento lógico e a
matemática, em diferentes linguagens, movimentos e percepções, encontra-se
muito presente na vida social da criança.
Desde muito cedo, as crianças tornam-se capazes de se posicionar sobre situações
matemáticas brincando, conversando, ouvindo e representando.
A escola da infância é o espaço para a exploração de elementos que favorecem o
processo de aprendizagem infantil e possibilita oportunidades desafiadoras e
interessantes para a construção das estruturas cognitivas.
A linguagem é a forma mais primitiva de aprendizagem, manifesta-se em diferentes
contextos, desempenhando importante papel no pensamento da criança, pois
segundo PIAGET (2005) através da linguagem os objetos e os acontecimentos
deixam de ser apenas o campo alcançado das percepções imediatistas, passando
para o campo do pensamento racional e conceitual e a literatura é uma fonte de
conhecimento capaz de produzir, na escola da infância, momentos de
aprendizagem matemática através da interpretação de diferentes situações e
vivências literárias que estimulem o pensamento matemático, a fim de que a
criança possa enfrentar desafios com autonomia e criatividade.
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