Revista Brasileira de Ensino de Fsica, vol. 19, no. 4, dezembro, 1997 369 Centro de Massa de Uma Caneca em Rotac~ao com Nvel de Lquido Variavel ( (Center of Mass of a Rotating Can with a Varying Level of Liquid) Jose Pedro Rino e Christovam Mendonca Departamento de Fsica, Universidade Federal de S~ao Carlos Via Washington Luiz, Km 235, 13565-905, S~ao Carlos, SP Trabalho recebido em 26 de outubro de 1996 Foi determinado o centro de massa de uma caneca girante parcialmente cheia com lquido. Apresenta-se uma discuss~ao relacionando o nvel do lquido e a altura mnima do centro de massa para o conjunto em rotac~ao. The center of mass of a rotating can, partially lled with a liquid, was determined. A discussion relating the level of the liquid and the minimum position of the center of mass for this rotating system is presented. I. Introduc~ao A analise de maximos e mnimos de func~oes e calculo de centro de massa de corpos s~ao alguns dos topicos comumente estudados nos cursos introdutorios de fsica e matematica. A determinac~ao da localizac~ao do centro de massa de um sistema n~ao e um problema novo, mas seu estudo propicia a discuss~ao de resultados bastante interessantes e muitas vezes n~ao obvios. Neste artigo discutimos a localizac~ao do centro de massa de uma caneca cilndrica parcialmente cheia de lquido, girando com velocidade angular constante em torno de seu eixo vertical. A quest~ao de interesse e: Para qual nvel do lquido a altura do centro de massa do sistema sera mnima? Quando analisamos o sistema em repouso e facil ver que o centro de massa esta situado a meia altura tanto para a caneca totalmente vazia quanto totalmente cheia (a massa da base n~ao e considerada neste problema). Ao se introduzir algum lquido o centro de massa desloca-se inicialmente para baixo, e logicamente passa por um mnimo antes de retornar a meia altura. Demonstra-se que a altura do centro de massa e mnima quando coincide com o nvel do lquido [1]. Ao considerar a caneca em rotac~ao chega-se a uma soluc~ao analoga a do caso estatico: o centro de massa de uma caneca contendo lquido e estando em rotac~ao tem seu centro de massa na altura mais baixa quando o nvel do lquido, na condic~ao estatica, coincidir com a altura do centro de massa do sistema girante (caneca + lquido). O sistema e discuss~ao Na Fig. 1 mostramos a caneca nas duas situac~oes, parada e em rotac~ao. As quantidades de interesse s~ao denidas por: HC - altura da caneca R - raio da caneca Z0 - altura da coluna do lquido em repouso ! - velocidade angular ZI - nvel inferior do lquido em rotac~ao ZS = nvel superior do lquido em rotac~ao MC - massa da caneca (sem os tampos) ML - massa do lquido que enche a caneca 370 J. Pedro Rino e C. Mendonca CL = M1 Z Z0 Figura 1. Caneca em (a) repouso e (b) rodando com uma certa quantidade de lquido. Considerando a densidade do lquido constante e a simetria da distribuic~ao de massa, o centro de massa estara localizado ao longo do eixo vertical na posic~ao dada por + MZ0 CL CSist: = MCMCC + M C Z0 (1) onde CC e o centro de massa da caneca vazia, sendo igual a HC =2 quando ignoramos os tampos. CL e o centro de massa do lquido, o qual sera Zo =2 quando n~ao estiver em rotac~ao. MZ0 e a massa de lquido de altura Zo , de modo que MZo = ML (Z0 =HC ): Quando a caneca gira uniformemente a superfcie do lquido atinge o equilbrio sob a ac~ao das forcas gravitacional e centrfuga (quando visto no sistema de coordenadas girante), resultando para sua sec~ao transversal uma forma parabolica dada por 2 2 Z(r; !) = ZI + !2gr (2) onde Z e r s~ao as coordenadas de um ponto na supercie do lquido e g a acelerac~ao da gravidade. Pode-se facilmente mostrar que um paraboloide solido tem seu volume igual a metade do volume do cilindro reto que o circunscreve, e como o lquido n~ao tem seu volume variado ao entrar em rotac~ao, podemos deduzir as relac~oes ZS = Z0 + !2 R4g (3a) 2 ZI = Z0 ; !2 R4g ; (3b) 2 e que s~ao as posic~oes superior e inferior do nvel do lquido quando em rotac~ao (ver Fig.1). O centro de massa do lquido e dado por Z dm = R22Z R Z 0 0 0 r dr Z (!) Z 0 0 Z dZ 0 0 (4) que pode ser diretamente integrado, resultando em !4 R4 CL = Z20 + 96g (5) 2Z 0 e apos substituic~ao na Eq. (1) obtemos a express~ao para o centro de massa de todo sistema (caneca + lquido): 2 ML Z02 + ML (!4 R4=48g2) (6) CSist: = 12 MC HC + M H +M Z C C L 0 Introduzindo as grandezas adimensionais = MC =ML; x = Z0 =HC e 2 = !2 R2 =(4gHC ), podemos reescrever a equac~ao acima na forma mais compacta 2 4 (7) CSist: = 21 HC + x ++x =3 : A m de se achar o mnimo de Csist: fazemos (dCsist:=dx) = 0 para x igual a um valor particular xmin, e da express~ao resultante extraimos a identidade 2 4 xmin = 12 + x ++x =3 x=x min (8) que e equivalente a Eq. (7). A altura minima Z0min correspondente e dada pela raiz positiva da Eq. (8) p Z0min = HC xmin = HC f + 2 + 4 =3 ; g: (9) A soluc~ao estatica [1] e obtida se zermos = 0. A rotac~ao do sistema, no que se refere a localizac~ao do centro de massa, somente eleva a posic~ao do seu mnimo. Figura 2. Regi~ao de restric~ao para a velocidade angular baseado nas condic~oes ZS HC e ZI 0: Revista Brasileira de Ensino de Fsica, vol. 19, no. 4, dezembro, 1997 371 E importante salientar que estes resultados est~ao limitados para valores de ! tal que o lquido n~ao transborde (ZS HC ) ou que o fundo da caneca n~ao que visvel (ZI 0). Utilizando da Eq. (3), estas condic~oes implicam que ! devera satisfazer simultaneamente as condic~oes !2 4gZ0 =R2 e !2 4g(HC ; Z0 )=R2 (10a) ou em termos das variaveis adimensionais, 2 x ; e 2 1 ; x : (10b) Na Fig. 2 ilustramos estas restric~oes: para um dado valor Z0 para o nvel inicial do lquido, a velocidade angular pode ser aumentada somente ate o valor tal que 2 (x) esteja dentro da area delimitada pelo tri^angulo hachurado de quadrados. O comportamento de Csist: como func~ao de Z0 para alguns valores dos par^ametros e 2 e mostrado na Fig. 3. Somente est~ao tracados os pontos que satisfazem as restric~oes da Eq. (10). Pode-se observar que para canecas consideravelmente leves em relac~ao ao lquido que a encheria, a condic~ao do centro de massa mnimo so pode ser realizada com rotac~oes lentas e baixos nveis iniciais de lquido. Figura 3. Centro de massa como func~ao da altura do lquido para varias velocidades angulares e (a) MC =ML = 0:01; (b) MC =ML = 0:1, e (c) MC =ML = 1:0. Refer^encias 1. Marie Baehr, Phys. Teach. 30, 3436 (1992).