Fiscalizar, mas para desenvolver Luiz Freire de Carvalho e Mario Sergio Pini* Nesta primeira década do milênio, o Brasil vem passando por um ciclo de desenvolvimento sem precedentes, em função de uma série de fatores internos e externos. Fazem parte desta conjuntura indicadores econômicos favoráveis, o desenvolvimento do mercado interno, saltos qualitativos nas políticas públicas, programas sociais e aumento da renda, entre outros aspectos. Nesse contexto, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos se inserem como eventos esportivos de dimensões únicas, representativos deste ciclo de prosperidade. Com a expectativa de manutenção do crescimento sustentável, é natural que o mercado brasileiro passe a atrair os olhos do mundo e abrigar eventos de outra dimensão. Para isso, porém, é preciso se preparar. Os contratantes de obras públicas se reconhecem engessados por imposições legais (Lei 8.666, LDO e tabelas de custos padrão) e têm, nos seus quadros técnicos e políticos, profissionais cada vez menos dispostos a assumir riscos pessoais de responsabilidade, pelas implicações legais a que estão sujeitos. O resultado prático é uma verdadeira indução à paralisia. Somem-­‐se a isso os termos de referência das licitações. Eles muitas vezes seguem formatações viciadas, sem sentido técnico, que em vez de trazer transparência dificultam a apresentação de propostas comparáveis, claras e pertinentes ao que se deseja construir. Com isso o cenário fica ainda mais delicado e propenso a conflitos. As instituições de fiscalização e auditoria estão hoje desinstrumentalizadas, por imposição legal. Dispõem e utilizam referenciais de custo padrão, baseados em obras convencionais e repetitivas, para identificar indícios de irregularidades em contratos de obras não-­‐
convencionais, com tecnologia inovadora ou obras complexas, por sua magnitude. Em suma: não é possível utilizar a lógica de custos de uma rodovia para mensurar uma pista de aeroporto, nem o custo de uma ponte para mensurar um estádio. Os recursos técnicos precisam ter especificações diferentes. A consequência é uma flagrante distorção de resultados, pela utilização de metodologia de avaliação e instrumentos inadequados. Essas imposições legais derivam de um corpo de leis do século passado, que teve sua origem em outra realidade. As tabelas de custos padrão carecem de revisão de falhas de origem, de consistência, de atualização tecnológica e de consideração a Normas de Engenharia, além de se integrarem a um processo de renovação permanente, para refletir com propriedade a realidade dos custos das obras públicas. As imposições legais trouxeram consigo um efeito perverso, que tem sido a ânsia por enquadrar a realidade das obras a padrões tabeláveis. Mas criar uma padronização supostamente aplicável a todas as obras na prática gera um sem-­‐número de distorções de análise: o confronto da análise padronizada com obras especiais sistematicamente desembocará em equívocos de avaliação de sobrepreço e necessariamente atrairá a mídia para divulgação precipitada de fatos sobre irregularidades que deveriam ser estudadas, caso a caso, confirmando-­‐as ou não, a partir da utilização de metodologias adequadas, com fundamento técnico. Eventuais indícios de irregularidades deveriam ser primeiro estudados caso a caso, com metodologias adequadas e fundamento técnico, para serem ou não confirmados. Claro que é mais prático o estudo de qualquer objeto a partir de padrões universais, mas isso simplesmente não funciona na engenharia. A superação desse impasse não se dará em termos jurídicos, que falham na expectativa de se gerar um ambiente de suposto controle absoluto sobre os custos de obras públicas. A recuperação passa pelo resgate dos conteúdos técnicos, da racionalidade no processo como balizador da transparência. No território dos custos, o conhecimento técnico é capaz de estabelecer as pertinências entre tipologias, metodologias de estudo e valoração e o grau de confiabilidade requerido. Com demonstrações objetivas e lógicas dos valores, monitoradas por instituições suficientemente aparelhadas para checar a validade dos mesmos, chega-­‐se a uma equação que se abre para o desenvolvimento, com transparência e espírito público. * Luiz Freire de Carvalho, engenheiro, é consultor de Engenharia de Custos. Mario Sergio Pini, arquiteto, é diretor da Pini Serviços de Engenharia. 
Download

Artigo