XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
14
AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM,
PESQUISA NA ESCOLA E DOCÊNCIA
Israel da Silva Aquino – UFRGS
Tatiana dos Santos Sequeira – UFRGS
Dóris Maria Luzzardi Fiss – UFRGS
RESUMO: Este trabalho foi desenvolvido na Disciplina Educação Contemporânea:
currículo, didática, planejamento (2011/01) e consistiu no planejamento e realização de
uma pesquisa do tipo Estudo de Caso, numa escola da rede pública estadual de ensino
em Porto Alegre, usando o Ambiente Virtual de Aprendizagem Pbworks como espaço
de interação e produção compartilhada e colaborativa. Buscou-se, na investigação,
estabelecer conexões entre práticas observadas na instituição e o referencial teórico
estudado a fim de se compreender as dinâmicas produzidas nos espaços escolares e
alternativas de trabalho coerentes com demandas identificadas. Com igual importância,
buscou-se, também, compreender se a possibilidade de registro da memória do grupo e
da produção compartilhada entre os sujeitos, através dos recursos digitais, enfatiza o
saber plural e o debate. A investigação foi empreendida por meio de observação de
aulas, entrevistas semiestruturadas, dirigidas a professores e alunos dos Anos Finais do
Ensino Fundamental, e análise documental do Projeto Político Pedagógico e Regimento
da Escola. Os resultados das entrevistas foram sistematizados e discutidos à luz dos
referenciais teóricos propostos pela disciplina, baseando-se em autores como Juarez
Dayrell e Boaventura de Sousa Santos, e apresentados como trabalho de conclusão da
mesma a partir dos registros feitos no PbWorks. Quanto à escola observada, no que se
refere à estrutura física e equipamentos, pode-se depreender que está em situação
privilegiada em relação a outras da rede pública, todavia, quanto à dimensão
pedagógica, apesar dos esforços dos professores entrevistados, ainda se percebe relativa
distância entre conteúdos trabalhados, métodos empregados, interesses e realidade dos
alunos. No que concerne ao uso de um AVA como recurso de aprendizagem, ele
desempenhou papel fundamental para o desenvolvimento de todas as atividades de
pesquisa, funcionando como ferramenta principal de interação e trabalho – o que
evidencia os benefícios exercidos por este tipo de recurso para a produção de
conhecimentos pelos alunos.
Palavras-Chave: Currículo. Pesquisa. Ambiente Virtual de Aprendizagem. Docência.
Produção de conhecimento.
CONTEXTUALIZAÇÃO
A Disciplina Educação Contemporânea: currículo, didática, planejamento se
organiza a partir de dois eixos interligados que traduzem as suas finalidades: a discussão
de fundamentos e conceitos-chave a respeito da escola, do exercício da docência, de
currículo, cultura e sociedade bem como da organização didático-metodológica; e a
investigação em um espaço escolar e/ou não-escolar a respeito dos principais elementos
para o planejamento dos processos de ensino e aprendizagem bem como organização de
proposta de intervenções didático-pedagógicas, tendo como base os resultados da
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004534
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
15
pesquisa realizada e as leituras feitas ao longo do semestre. Nesse sentido, a construção
de um Pbworks, por Grupos de Trabalho (GT) necessariamente interdisciplinares, com
exigência de que participem da composição de cada grupo alunos-representantes das
diferentes áreas de saber presentes na turma, se traduz em exercício que instiga a
produzir ações que articulam os dois eixos supracitados, uma vez que o Pbworks
possibilita elaboração compartilhada: da proposta de pesquisa escolhida ou construída
pelo grupo e dos dados coletados; da análise dos dados à luz dos referenciais discutidos
em aula; da produção de comentários crítico-reflexivos a partir da análise dos dados na
articulação com os referenciais e desde um princípio de autoria coletiva que pressupõe a
necessária participação e contribuição de todos os integrantes do grupo; da construção
das intervenções didático-pedagógicas desde uma perspectiva de currículo integrado
segundo a qual as diferentes áreas de saber rompem com as relações hierárquicas,
estabelecendo possibilidades transversais de diálogo e de trabalho com alunos dos Anos
Finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.
O trabalho articulador de pesquisa e docência, apresentado neste artigo, foi
desenvolvido no primeiro semestre de 2011, como exigência da referida Disciplina e
parte de Projeto de Pesquisa desenvolvido por professor da Faculdade de Educação
(FACED) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) sobre as funções
desempenhadas pelas Tecnologias da Informação e da Comunicação nos processos de
produção de conhecimento por alunos universitários. Ele se organiza a partir de
orientações fornecidas aos alunos da Disciplina e tem como suporte o Ambiente Virtual
de Aprendizagem Pbworks, envolvendo as seguintes etapas: (1) formação de grupos
interdisciplinares segundo critérios de aproximação definidos pelos alunos da turma; (2)
produção pelo grupo de Projeto de Trabalho que articula Docência e Pesquisa; (3)
execução do Plano de Trabalho segundo orientações fornecidas: construção do Pbworks
do grupo; envio de convite para todos os colegas e para a professora; aproximação do
espaço escolar ou não-escolar no qual será realizada a investigação; coleta de dados
acompanhada de postagem dos mesmos no Pbworks e de sua análise pelos integrantes
do grupo; definição de categorias interpretativas; diálogo com referenciais discutidos
nas aulas durante o processo de análise dos dados; produção de mapas conceituais e
sínteses interpretativas; elaboração de Projeto de intervenção junto à realidade
pesquisada a partir do trabalho de coleta e análise dos dados; estabelecimento de
interlocução com o espaço escolar ou não-escolar, verificando a possibilidade de
execução do Projeto de intervenção; socialização do trabalho junto aos colegas de turma
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004535
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
16
em data a ser definida; (4) acompanhamento de todo o trabalho pela professora e pelos
colegas por meio da postagem de comentários nos Pbworks em datas definidas junto
com a turma.
SOBRE A PESQUISA NA ESCOLA
O trabalho de aproximação de uma escola tomou a forma de uma pesquisa do
tipo Estudo de Caso, que implicou na análise de práticas realizadas numa instituição da
rede pública estadual de ensino em Porto Alegre e seu registro e retrabalho num
PbWorks construído por um grupo de licenciandos dos Cursos de Letras, História e
Ciências Sociais. Segundo Triviños (2009), Estudo de Caso “é uma categoria de
pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa aprofundadamente” (p. 133) e “[...]
deve pretender construir um saber em torno de sua particularidade, portanto, o seu
propósito não é representar o mundo, mas representar o caso” (2009, p. 133). Este
método de pesquisa é caracterizado por ser descritivo, interpretativo e explicativo e está
em diálogo com a finalidade das análises – estabelecer conexões entre práticas
observadas nas instituições e o referencial teórico estudado a fim de se compreender as
dinâmicas produzidas nos espaços escolares e alternativas de trabalho coerentes com
necessidades e demandas identificadas.
A pesquisa foi o ponto de partida da disciplina, sendo entregue aos alunos três
roteiros de investigação para o trabalho inicial de observação de prática pedagógica em
espaços escolares e/ou não escolares. Na Primeira Proposta, foi sugerido aos discentes
que informassem as características físicas da instituição, seu sistema de avaliação, sua
forma de organização, sendo realizada também uma análise documental. Foram
propostas duas entrevistas: uma dirigida aos professores, e outra, aos estudantes,
focando o planejamento adotado pelo educador, a identidade do aluno e como ambos
enxergam a relação professor-aluno Na Segunda Proposta, as entrevistas deveriam ser
focadas nos educadores de cada área de conhecimento presente no GT (Grupo de
Trabalho), sendo parte importante da pesquisa o reconhecimento de características dos
estudantes e professores relacionadas à identidade, linguagem e identificação com as
áreas de conhecimento específicas. Já, na Terceira Proposta, a base da pesquisa de
campo deveria ser a questão da interdisciplinaridade, a importância de cada disciplina
no contexto escolar e o modo de organização da instituição, levando em consideração as
diferenças de idade dos alunos e a metodologia empregada pelos professores nas
disciplinas.
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004536
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
17
Independentemente da proposta escolhida ou criada pelo GT, os alunos
precisavam informar em que tipo de instituição o trabalho de campo seria realizado,
sendo que cada proposta daria destaque a um determinado tema. Apesar da apresentação
desses roteiros por parte do professor responsável pela disciplina, eles deveriam apenas
servir de base para o trabalho, possibilitando aos alunos que acrescentassem suas
próprias questões e dúvidas e, inclusive, misturassem, como melhor lhes conviesse,
questões das três propostas, possibilitando a criação de outros roteiros de entrevistas
coerentes com os objetivos do GT.
Seria dizer que os Guias de Observação correspondiam a sugestões de
encaminhamento da investigação no espaço escolar ou não-escolar. Mas, em momento
algum, encarceravam os alunos em um trabalho de campo pré-programado. Todos
tinham a oportunidade de levar a campo suas dúvidas sobre a docência e seus desafios.
Sendo assim, o grupo realizou a pesquisa tendo como base a primeira proposta
oferecida, mas adicionou a ela elementos das outras propostas e questões próprias
consideradas importantes para a realização do estudo. As técnicas utilizadas pelo grupo
envolveram observação de aulas, entrevistas semiestruturadas, dirigidas a 02
professores de História e 10 alunos do 7º Ano do Ensino Fundamental, e análise
documental do Projeto Político Pedagógico e Regimento da instituição.
A escola em que se realizou a pesquisa se constitui em referência de ensino na
região, conforme relatos de ex-alunos, se diferenciando em alguns aspectos. A escola
recebe alunos de diversos bairros. Como diferencial, possui um jornal periódico, editado
pelos professores, e um site. As entrevistas com os professores possibilitaram constatar
que: (1) estes dois professores se diferenciam de alguns de seus colegas pelo entusiasmo
em aula, permitindo maior aproximação com os alunos, que se identificam com eles,
mas também provocando maior agitação, o que não resultou em problema; (2) a
participação dos alunos é incentivada e exercida, inclusive no que toca às indagações
próprias dos estudantes sobre assuntos extra-classe; (3) apesar de receber alunos de
vários bairros diferentes, percebeu-se certa identidade socioeconômica comum à
maioria dos alunos; (4) apesar de ser uma escola pública estadual, ela consegue manter
um padrão minimamente diferenciado em termos de estrutura física.
As conversas e entrevistas realizadas permitiram perceber certas tentativas de
trabalhos que apontam para a interdisciplinaridade, embora restritas a poucos
professores. Além disso, à época das visitas, estava-se preparando uma atividade
relacionada com a passagem do aniversário da escola, em conjunto com uma instituição
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004537
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
18
cultural da comunidade, na qual se pretendia trabalhar com a biografia pessoal da
personagem que lhe empresta o nome, abrindo-se aí a oportunidade de um esforço
coletivo e comum entre as diferentes áreas do conhecimento, embora pontual.
Quanto às vivências e experiências dos adolescentes e jovens, transparece, nas
entrevistas, por um lado, uma idéia do espaço escolar como espaço de convivência e
relacionamento, tal como afirma Dayrell (1996; 2007). Por outro lado, é presente
também, entre os discursos dos alunos, a percepção da escola como espaço provedor de
um “futuro melhor”, como necessária a uma boa colocação profissional, o que
demonstra o quanto esse discurso está presente nessa geração – o que está sistematizado
na Tabela 1 (Anexo 1).
No que se refere, especificamente, aos significados atribuídos pelos estudantes à
escola e à importância que conferem ao estudo, constataram-se algumas recorrências
que podem ser assim apresentadas: (1) escola como possibilidade de futuro melhor – 5
vezes; (2) escola como via de entrada no mercado de trabalho – 4 vezes; (3) escola
associada à ideia de “ser alguém” na vida, ser “melhor” – 4 vezes; (4) escola associada à
ideia de que estudar é importante – 4 vezes; (5) escola associada à possibilidade de ver
amigos – 4 vezes; (6) escola associada à possibilidade de aprender e ampliar
conhecimentos – 3 vezes; (7) escola como espaço de lazer – 1 vez. Complementando
essas respostas, os alunos referiram o que gostariam que fosse discutido na escola
(Anexo 2).
As respostas evidenciam que os alunos desejam que sejam trabalhados temas de
seu interesse e, também, questões articuladas às relações que se constituem na escola
(por exemplo, violência na escola) – o que significa que há um conjunto variado de
expectativas e significados rondando a escola e que os alunos gostariam de poder
participar de sua construção. Isso lembra o que Dayrell (1996; 2007) chama de escola
“homogeneizante” e de “escola polissêmica” (2007, Dayrell, p. 9). Se, por um lado, a
escola “homogeneizante” não olha para os alunos como sujeitos diversos, mas como
alunos homogêneos dos quais se espera modos de comportamento padrão, por outro
lado, e estabelecendo zonas de tensão, a “escola polissêmica” se revela a partir de seus
múltiplos sentidos, de sentidos que são diferentes para cada um, sentidos que, muitas
vezes, são ignorados pela “organização oficial” (2007, Dayrell, p. 2), que se reúne para
decidir conteúdos e conversar sobre a instituição sem que isso envolva necessariamente
os alunos.
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004538
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
19
As respostas permitiram constatar que os alunos constituem inúmeros saberes, e
que o papel da escola é potencializar este processo, problematizar questões, trazer
desafios. Como diz Dayrell (1996; 2007). “Apreender a escola como construção social
implica, assim, compreendê-la no seu fazer cotidiano, onde os sujeitos não são apenas
agentes passivos diante da estrutura” (Dayrell, 2007, p. 2), percebendo os alunos como
construtores da história da própria escola em que estão inseridos e de sua comunidade.
A experiência de voltar a uma sala de aula fez pensar também sobre se o
conteúdo e a forma como ele é trabalhado são realmente úteis. Muitas correntes
teóricas, incluindo a de Boaventura de Sousa Santos (2008), questionam o paradigma
dominante que se caracteriza por ser “um modelo global de racionalidade científica [...],
um modelo totalitário [...] que nega o caráter racional de todas as formas de
conhecimento que não se pautarem pelos seus princípios epistemológicos e pelas suas
regras metodológicas” (Santos, p. 21). Santos (2008), ao aprofundar tal discussão,
contrapõe a este paradigma o emergente que, segundo o autor, acredita em um
“conhecimento não dualista, um conhecimento que se funda na superação das
distinções” (p. 64), no qual ciências naturais e ciências sociais estão integradas. Desde
esta compreensão, o conhecimento é tomado como “total e local”, ou seja, “Constitui-se
em redor de temas que em dado momento são adoptados por grupos sociais concretos
como projectos de vida locais [...]. Os temas são galerias por onde os conhecimentos
progridem ao encontro uns dos outros” (Santos, 2008, p. 76). Voltar à sala de aula,
acompanhar o trabalho docente, conversar com professores e alunos, na instituição que
contribuiu com este estudo, evidenciou a necessidade de ruptura em relação a alguns
elementos do paradigma dominante que têm produzido distanciamento entre os
conteúdos, a dinâmica de ensino e os interesses e necessidades dos alunos.
SOBRE O TRABALHO NUM AVA
Nas visitas à instituição escolar, tornou-se possível a proposição de
questionamentos e a produção de alguns saberes referentes à docência e aos seus modos
de produção, tendo sido recolhido extenso material junto aos professores e alunos
entrevistados. Para a construção desta investigação, desempenhou papel fundamental a
utilização do Ambiente Virtual de Aprendizagem PbWorks, como ferramenta principal
de interação e trabalho. A descoberta de possibilidades tanto interacionais quanto
informacionais oferecidas pela TIC remete ao que Alves (2010) destaca quando diz que:
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004539
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
20
Através dela podem-se intercambiar informações, ideias,
mensagens eletrônicas, serviços etc. É um espaço de
comunicação que reúne pessoas que se encontram por vezes
muito afastadas umas das outras no plano geográfico, mas que
se aproximam em torno de interesses comuns. [...] um espaço de
reunião e [...] um ‘lugar’ onde se pode exprimir a solidariedade
(Alves, 2010, p. 146).
O ambiente virtual surgiu como uma ferramenta de desenvolvimento da proposta
de trabalho, modificando o entendimento do grupo a respeito da prática escolar no que
tange aos efeitos da utilização do AVA sobre as dinâmicas estabelecidas pelos alunos, o
que significou, também, mudanças no modo como se pensava a educação.
Para o grupo de trabalho, o Pbworks foi responsável pelo surgimento de um
novo cenário repleto de possibilidades de aprendizagens, marcando diferentemente cada
um dos componentes do grupo que vinham de três cursos distintos – Letras, Ciências
Sociais e História. Os estudantes se apropriaram do espaço cibernético de formas muito
particulares, se adaptando, superando dificuldades surgidas com a nova ferramenta e
construindo sua finalidade de forma muito individual. Enfim, criando trajetórias
próprias de uso do Pbworks conforme suas áreas de interesse ao mesmo tempo em que
eram instigados a trabalhar com o conteúdo em equipe, utilizando o tema gerador como
perspectiva interdisciplinar de planejamento da ação pedagógica. A necessidade de
trabalhar “em rede” – não apenas no sentido cibernético, mas também no que diz
respeito à interdisciplinaridade – auxiliava a desenvolver a capacidade de trabalhar em
equipe, respeitando e dialogando com os colegas e suas diversas áreas de conhecimento.
De uma maneira pouco convencional, o ambiente virtual trouxe diversos
encontros não programados, compartilhados pelos integrantes do grupo quando os
mesmos acreditavam ter algo para expor. Isso permitiu que os educandos tivessem mais
tempo para pensar o trabalho da disciplina, sem a obrigatoriedade de encontros
presenciais para manifestar suas idéias e dúvidas, pois estas poderiam surgir e serem
expostas a qualquer momento através do ambiente virtual. Por outro lado, como afirma
Marta Leivas (2004), a presença ou a ausência do outro no espaço virtual parece ser
mais sentida, visto ser a forma de participação nesses espaços eminentemente escrita, ou
seja, a única maneira de saber se alguém está participando das discussões é através de
suas postagens. Além disso, a possibilidade de registro da memória do grupo e da
produção compartilhada entre os sujeitos através dos recursos digitais enfatiza o saber
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004540
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
21
plural e o debate. Com o auxílio de um ambiente propício à interação,
independentemente dos participantes estarem conectados ao mesmo tempo ou próximos
geograficamente, tornou-se possível o estabelecimento de práticas de interação
diversificadas, ampliando as possibilidades do trabalho e enriquecimento da produção
como um todo.
Os recursos oferecidos pelo Pbworks permitiram que os alunos gerenciassem
suas práticas educacionais, revelando outras formas de trabalhar, de se comunicar, se
relacionar, aprender e pensar o espaço de aprendizado e de ação educacional. Foi
através do ambiente virtual que os discentes revelaram a sua maneira particular de
compreender os conteúdos e utilizá-los, se constituindo, portanto, em ferramenta “para
construir conhecimento por meio da interação” (Coll e Monereo, 2010, p. 39) e do
trabalho colaborativo, lembrando que, como esclarecem Onrubia, Colomina e Engel
(2010), “na colaboração, cada membro do grupo contribui para resolver conjuntamente
o problema; a colaboração depende, por isso, do estabelecimento de uma linguagem e
de significados comuns no que diz respeito à tarefa, além de uma meta comum para o
conjunto dos participantes” (p. 210).
A oportunidade da presença simbólica, por meio da ferramenta virtual, para a
elaboração e acompanhamento do trabalho em grupo permitiu uma maior integração,
compartilhamento e transmissão de informações, ideias e concepções, não apenas entre
os integrantes do grupo de trabalho, mas também com os demais grupos da classe,
desafiando os estudantes a desenvolverem hipóteses, analisarem resultados, procurarem,
selecionarem e explorarem informações pertinentes, resolverem problemas e
aprenderem independentemente do professor. Em resumo, a utilização do ambiente
virtual permitiu a troca rápida e facilitada de informações entre diferentes grupos, o que
não aconteceria sem este recurso. Revelou-se, também, um importante aliado a se opor à
segregação das disciplinas e possibilitou o exercício da liberdade de expressão, dando
espaço à individualidade – respeitando as diferenças cognitivas e os diferentes modos de
apropriação dos recursos – e, ao mesmo tempo, trabalhando o conceito de coletividade
nas decisões e atuações do grupo – o que envolveu um processo de reconhecimento do
conhecimento do outro.
José Armando Valente (1993; 1997), nos textos O uso inteligente do
computador na educação e Diferentes usos do computador na educação, estabelece
diferenças no processo de ensino aprendizagem através do computador a partir do modo
como ele é utilizado: “máquina de ensinar”, ou seja, reprodutor do ensino tradicional, ou
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004541
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
22
ferramenta a partir da qual o aluno “ensina” o computador. O autor alerta que é
extremamente saudável a coexistência de ambas as modalidades, devendo, cada uma,
ser utilizada em situações de ensino aprendizagem para as quais mais se adéquam. No
caso do trabalho desenvolvido pelo grupo, a aprendizagem se concretizou através da
execução de tarefas por intermédio do computador, sendo o aluno o protagonista e o
computador um instrumento que possibilitou este desenvolvimento. No entanto, não se
limitou à função de “máquina de ensinar”, pois o ambiente virtual tornou possível uma
nova abordagem pedagógica a partir da qual o próprio PbWorks aparece como criador
de condições de aprendizagem e principal meio de interação e construção coletiva do
grupo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Se, por um lado, a realização da pesquisa na escola ofereceu aos integrantes do
grupo de trabalho a possibilidade de reconsiderar suas concepções, através de debates e
reflexões que enriqueceram o pensar sobre a educação, por outro torna-se indispensável
salientar a importância que a utilização do AVA PbWorks teve enquanto
potencializador das atividades realizadas. A dinâmica diferenciada oferecida por esta
ferramenta de aprendizagem, na condução das discussões e na sistematização das
informações recolhidas, demonstrou de forma clara que a utilização deste tipo de
recurso amplia as possibilidades da pesquisa e do ensino, criando novas formas de
interação e suscitando, mesmo, novos questionamentos e interesses de estudo. Em
outras palavras, tanto a pesquisa quanto o trabalho num ambiente virtual permitiram a
descoberta de outros modos de construção do saber, decorrendo disso novas formas de
trabalho, de comunicação, de colaboração e compartilhamento, de aprendizado.
Questões e temas foram problematizados, incentivando o debate, trazendo desafios,
oferecendo ao educando a possibilidade de criação e apropriação de conhecimentos
produzidos por ele mesmo.
O trabalho de pesquisa com o uso do Pbworks exigiu dos alunos: adaptação às
novas ferramentas utilizadas, superação das dificuldades relacionadas ao trabalho de
campo, habilidade de sistematização do conteúdo e um olhar crítico em relação ao
espaço da escola, instigando-os a enriquecerem sua produção através do conhecimento
do outro, mas sempre respeitando as diferenças cognitivas e os diferentes modos de
apropriação dos saberes. Identificou-se, por meio da investigação num espaço escolar, a
necessidade de dar importância não somente à identidade cultural do aluno e a como ele
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004542
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
23
trabalha o conteúdo, mas também à do educador, considerando como ambos enxergam e
constituem suas representações no que concerne às relações estabelecidas entre eles, os
conteúdos, as dinâmicas de trabalho e a realidade da escola.
Nesse sentido, as Novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NTIC)
podem cumprir um papel de destaque em um momento em que se faz tão necessário
repensar as práticas desde uma perspectiva em que se compreenda essas ferramentas
como parte de um processo cujo protagonismo precisa ser desempenhado por sujeitos
comprometidos com um modelo de ensino plural e democrático. Entende-se ser esta
uma via possível para a incorporação das demandas e saberes dos educandos às práticas
cotidianas das instituições de ensino, uma das muitas formas possíveis de tornar a
educação uma experiência mais atraente e significativa. Sempre levando em conta, é
claro, que a utilização dessas ferramentas e tecnologias “inovadoras” não produzem
mudanças por si só, mas funcionam como mediadoras em ações pedagógicas que podem
levar as relações de ensino-aprendizagem a outros patamares se partirem de uma ação
refletida, consciente e comprometida com os educandos, sua cultura e suas histórias de
aprendizagem.
Conclui-se que a utilização de um Ambiente Virtual de Aprendizagem ampliou
as possibilidades do trabalho de pesquisa na escola, levando mesmo ao surgimento de
questões, entre os participantes, quanto a utilização e benefícios deste tipo de ferramenta
para a prática pedagógica. Ademais, a realização do trabalho permitiu uma aproximação
entre a teoria estudada e a prática nos espaços escolares, bem como a reflexão sobre os
desafios colocados para os futuros professores.
REFERÊNCIAS
ALVES, Sônia Célia de Oliveira. Interação on-line e oralidade. In: MENEZES, Vera
Lúcia (org.). Interação e aprendizagem em ambiente virtual. Belo Horizonte: Ed. da
UFMG, 2010. p. 145-170.
COLL, César & MONEREO, Carles. Educação e aprendizagem no século XXI: novas
ferramentas, novos cenários e novas finalidades. In: ______ (orgs.). Psicologia da
Educação Virtual: aprender e ensinar com as Tecnologias da Informação e da
Comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2010. p. 15-46.
DAYRELL, Juarez Tarcísio. Escola como espaço sócio-cultural. In: ______ (org.)
Múltiplos Olhares sobre educação e Cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1996.
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004543
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
24
DAYRELL, Juarez Tarcísio. A escola “faz” as juventudes? Reflexões em torno da
socialização juvenil. Educação & Sociedade, Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p.
1105-1128, out. 2007.
LEIVAS, Marta. Riscos & Bordados: o ensino de História e as tecnologias de
informação e comunicação. 2004. 142f. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Faculdade
de
Educação,
UFRGS.
Porto
Alegre.
2004.
Disponível
em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/5834/000432212.pdf?sequence=1>.
Acesso em 19/09/2011
ONRUBIA, Javier; COLOMINA, Rosa; ENGEL, Anna. Os ambientes virtuais de
aprendizagem baseados no trabalho em grupo e na aprendizagem colaborativa. In:
COLL, César & MONEREO, Carles. Psicologia da Educação Virtual: aprender e
ensinar com as Tecnologias da Informação e da Comunicação. Porto Alegre: Artmed,
2010. p. 208-225.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as Ciências. 5. ed. Porto:
Afrontamento, 2008.
TRIVINOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a
pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 2009.
VALENTE, José Armando. Diferentes usos do computador na Educação. In:
Computadores e conhecimento: Repensando a Educação. São Paulo: Núcleo de
Informática Aplicada a Educação – Unicamp, 1993
VALENTE, José Armando. O uso inteligente do computador na Educação. Pátio –
revista pedagógica. Editora Artes Médicas Sul. Ano 1, Nº 1, 1997, p. 19-21.
ANEXOS
Anexo I – Tabela 1: Perfil dos estudantes e significados atribuídos à escola
Mora com quem
1
2
Pai, mãe e irmãos
Pai, mãe e irmão
3
4
Pai, madrasta e
irmã
Pai, mãe e irmão
5
Pai, mãe e irmãos
6
Mãe e irmã
Por que vai à escola
O que quer fazer Por que a escola é
depois da escola
importante
Futuro digno
Faculdade, trabalhar Futuro melhor
Aprender e ser alguém
Estágios e
Futuro melhor, ser
faculdade
alguém
Gosta de jogar e ver Ser piloto de avião
“não parar no
amigos
tempo”
Acha importante e
Faculdade de
“sem estudo
gosta de ver amigos
medicina
ninguém é nada”
Estudar e encontrar
Engenharia ou
Para ter um bom
amigos
medicina
futuro
Estudar é importante Direito e carreira
-
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004544
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
25
7
8
9
10
porque “só vencem os
melhores”
Padrasto, mãe e
Acha importante
irmão
Pai e mãe
Acha importante
militar
Fazer cursos e
trabalhar
jornalismo
Pai e mãe
Para conseguir
emprego
Mercado de
trabalho
Define o futuro
Acha importante, ver Trabalhar e fazer
amigos
faculdade
Pai, mãe e irmão Melhor colocação no Cursos, faculdade,
Amplia
mercado de trabalho
trabalhar
conhecimentos e
colocação
profissional
Anexo 2 – Tabela 2: Interesses de estudo
Quantidade de
Alunos
Assuntos
relacionados aos
seus interesses
4
Não sabe
responder
Escola
Atualidades
2
3
1
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.004545
Download

ambientes virtuais de aprendizagem, pesquisa na escola