EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: ESTRATÉGIAS E METODOLOGIAS PARA UMA SUSTENTABILIDADE LOCAL Márcia Regina de Andrade Universidade Federal de Sergipe - UFS Este trabalho pretende refletir sobre a importância da Educação de Jovens e Adultos em sua etapa primeira, a alfabetização. Para tanto indicamos os principais problemas enfrentados no processo de execução do Programa de Alfabetização Solidária junto ao Município de Santo Amaro das Brotas/SE, onde procuramos desenvolver uma estratégia pedagógica criativa e dinâmica, comprometida com os valores da comunidade. Propomos o desenvolvimento de metodologias sócio-interacionistas que desenvolvessem o espírito crítico e criativo dos professores alfabetizadores. Buscamos superar as limitações encontradas no processo de capacitação continuada, valorizando os aspectos locais nas temáticas abordadas em sala de aula, contribuindo dessa maneira para a melhoria das condições de aprendizado dos alfabetizandos e alfabetizadores. Nosso objetivo foi oferecer condições para o auto-desenvolvimento dos alfabetizandos e conseqüentemente, do lugar onde moram, transformando a Educação de Jovens e Adultos em um eficiente instrumento de desenvolvimento local, fator essencial para garantir a auto sustentabilidade da comunidade. 1 EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: ESTRATÉGIAS E METODOLOGIAS PARA UMA SUSTENTABILIDADE LOCAL Márcia Regina de Andrade - UFS Universidade Federal de Sergipe - UFS Introdução A Educação de Jovens e Adultos como parte integrante da educação básica segue os princípios e finalidades da Lei de Educação Nacional. Dessa maneira obriga-se a contribuir com o desenvolvimento humano, bem como com a preparação dos alunos ao ingresso no mundo profissional. Entretanto o maior desafio da Educação de Jovens e Adultos é empreender uma educação capaz de promover a transformação social, uma educação cidadã que forme indivíduos aptos e exercer seus deveres e exigir seus direitos. Um sucinto levantamento já pode evidenciar a distância entre a atual Lei de Diretrizes e Bases e a realidade vivenciada pela Educação de Jovens e Adultos, diante deste contexto precisamos encontrar alternativas que contemple as teorias educativas, sem perder de vista a sua aplicabilidade no mundo concreto e acabar com a ambigüidade entre a teoria e a práxis, o que reforça a necessidade de criação de estratégias e metodologias mais eficientes. 1. Dificuldades e desafios da Educação de Jovens e Adultos Uma análise bastante pertinente que podemos fazer sobre a Educação de Jovens e Adultos diz respeito ao caráter excessivamente jurídico e burocrático da educação brasileira, espera-se que a simples publicação de uma lei resolva os problemas que têm sua origem na desigualdade social e na má distribuição de renda. Espera-se outorgar o direto à cidadania, e muitas vezes esquecemos que a cidadania é uma conquista individual, fruto um processo de maturidade e conscientização do indivíduo, portanto é um processo lento que exige dos profissionais de educação compromisso e seriedade no desempenho de seu trabalho. 2 Evidenciamos inúmeras as dificuldades encontradas pela EJA, do ponto vista pedagógico podemos destacar a falta de profissionais habilitados para trabalhar com este público, bem como, o exíguo número de livros didáticos1 destinados a adultos. Nesta perspectiva procuramos capacitar o professor alfabetizador a trabalhar com os recursos didáticos disponíveis na escola, e quando estes não existirem, ensinamos o alfabetizador a desenvolver seu próprio material didático junto com os alunos, aproveitando os recursos materiais, e principalmente o material cultural existente na comunidade. Estimulamos o alfabetizador a criar em parceria com os alunos, incentivamos todos a se posicionarem de maneira crítica diante da realidade que cada um vive, buscando desenvolver uma consciência desalienada favorecendo o desenvolvimento do senso crítico essencial para a prática da cidadania. Uma vez que a formação do cidadão crítico é um imperativo para o desenvolvimento da sociedade, além de ser um direito inalienável. Neste sentido a Educação de Jovens e Adultos precisa compor um sistema no qual o aluno e o meio social devem estar absolutamente articulados. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais os conteúdos ministrados em sala de aula precisam estar de acordo com um padrão mínimo, e ao mesmo tempo, estar sintonizados com as particularidades e especificidades do lugar em que o ensino está sendo desenvolvido. Precisam ser oferecidas condições para que os alunos possam construir suas idéias a partir de suas experiências, tornado-se sujeitos da própria aprendizagem, para isso é preciso que se desenvolvam propostas de ensino dinâmicas que resguarde as determinações da Lei de Diretrizes e Bases / 9.424/96, ou seja aproximar os conteúdos curriculares ao cotidiano porque o “Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade” (Cap.2, Seção-I, Art. 26.) Por isto partimos da perspectiva de que educar é um processo de criação, portanto é preciso romper com antigos padrões repetitivos dissociados da realidade dos alunos, o objetivo é explorar alternativas que favoreçam a integração do alfabetizando com os conteúdos que lhe serão transmitidos. 1 Apesar do crescente número de títulos que têm sido editados e das coleções publicadas pelo MEC destinados especificamente para o publico de jovens e adultos, estes materiais ainda representam muito pouco diante do contingente de alunos adultos analfabetos, sem contar que os materiais disponíveis ainda não são plenamente utilizados pelos professores em sala de aula. Os motivos desta deficiência originam-se na falta de profissionais habilitados a lidar tanto com o material quanto com os alunos adultos. 3 2. A Educação de Jovens e Adultos em uma perspectiva sócio-interacionista. Muitos professores ainda associam o processo de ensinar á transmissão de conteúdos que precisam ser memorizados e procedimentos que precisam ser reproduzidos, segundo a pedagoga Critelli (1981), essa prática dissocia a educação do contexto social e histórico dos alunos dificultando o processo de aprendizagem. Diante desta realidade novos métodos de ensino precisam ser experimentados, novos conteúdos, novas estratégias. Sendo assim, nossa tentativa é ultrapassar a concepção que a Educação de Jovens e Adultos seja uma modalidade educativa de menor importância, uma vez que se propõe a cumprir uma importante função social, no sentido de tentar reparar as disparidades causadas pela evasão escolar e assegurar a cidadania dos alunos excluídos do ensino regular. Neste sentido elaboramos algumas estratégias que esperamos poder compartilhar com outros profissionais da educação que estejam envolvidos com a Educação de Jovens e Adultos. Nossa estratégia parte do princípio de Vygotsky (1988), segundo o qual o desenvolvimento do indivíduo é resultado de um processo sócio-histórico, sua teoria também é conhecida como sócio-interacionista, enfatizando o papel do contexto histórico e cultural nos processos de desenvolvimento e aprendizagem, no qual o aluno aprende junto ao seu grupo social, ao passo que também constrói os elementos integrantes do seu meio, inclusive o próprio conhecimento. Segundo Freire (2002) a prática pedagógica precisa estar vinculada aos aspectos históricos e sociais dos educandos, visando a elucidação das questões que realmente importam para a comunidade, para ele se não ocorre uma reflexão sobre si mesmo, sobre seu papel no mundo, não é possível ultrapassar os obstáculos, por isso a ação do professor é fundamental, porque estimula o aluno à libertação quando o conscientiza, ou o leva à opressão quando o aliena. Por isso o professor alfabetizador deve ser conscientizado do seu papel político e pedagógico. Cabe ao orientador pedagógico oferecer condições para o desenvolvimento dos alfabetizandos e alfabetizadores, este desenvolvimento conseqüentemente se refletirá na comunidade como um todo, dessa maneira a Educação de Jovens e Adultos torna-se um eficiente instrumento de inclusão social garantindo o processo de auto sustentabildade. 4 3. Estratégias e metodologias para uma sustentabildade local. A elaboração desta estratégia de ensino foi desenvolvida com o objetivo de instrumentalizar o professor alfabetizador de Jovens e Adultos com subsídios que lhe garanta maior eficácia na hora de alfabetizar, fizemos uma combinação de métodos e técnicas que podem ser usadas em sala de aula para empreender o processo de ensinoaprendizagem. Nela também estão presentes as concepções culturais e ideológicas do modo de viver e agir da comunidade que ora se destina. Esta proposta por partir de uma perspectiva sócio-histórica traz a implicação que os conteúdos abordados no processo de alfabetização sejam selecionados a partir de referencias próprios do alfabetizando, ou seja, a história do seu município, a história de sua família, a história do seu bairro. Precisamos contextualizar as atividades didáticas a partir deste vastíssimo conteúdo que é o universo do aluno, situar o alfabetizando como sujeito ativo do seu processo histórico. Portanto uma visita prévia ao município ou uma entrevista preliminar com os alunos que serão alfabetizados será um fator de grande êxito no desenvolvimento de nossa estratégia. O alfabetizador poderá explorar diversos aspectos da cidade como a criação da escola, da igreja, da maternidade, do fórum, da praça, e muitos outros exemplos poderão ser explorados, o importante é selecionar temas locais que envolvam discussões construtivas, que integrem o aluno ao seu meio social. Também poderão ser mencionados assuntos de interesse comum como prevenção do câncer de mama, planejamento familiar, direitos constitucionais, deveres do cidadão, trabalho infantil, compra de voto, técnicas de plantio, pescaria, roça, trabalho doméstico, legislação trabalhista, enfim uma infinidade de temas que devidamente selecionados irão ampliar a visão de mundo dos alunos desenvolvendo o espírito critico necessário ao exercício de sua cidadania. O primeiro passo é propor ao aluno socializar seu conhecimento pessoal, sua experiência de vida, suas habilidades manuais, o segundo passo seria desenvolver atividades com base no relato dos alunos alfabetizandos, valorizando o conhecimento adquirido antes de sua chegada à escola, dessa maneira estaremos resgatando a auto-estima e estimulando a integração dos alunos na sala de aula. Nossa proposta atem-se em selecionar as atividades desempenhadas pelos alfabetizandos, a dona de casa, o pescador, o pedreiro, o pintor, o agricultor, discutir a 5 importância do papel desempenhado pelos alunos na sua comunidade ao mesmo tempo que selecionam-se elementos deste cotidiano para compor os instrumentos necessários ao processo de alfabetização. Igualmente deve-se considerar a riqueza das expressões artísticas tais como, colagem, pinturas, culinária, costura, e habilidades manuais adquiridas no dia-adia que expressam as idéias dos alfabetizandos que ainda não estão dominando completamente o processo de letramento com a finalidade reforçar o processo de aprendizagem de maneira mais descontraída. Para as aulas de ciências, escolhemos um tema que sua explicação pode ser vivenciados no mundo empírico, ou seja, podemos explicar sobre o processo da fotossíntese levando os alunos a até a estação rodoviária da cidade e em seguida levando os alunos para uma praça arborizada, lá se pode comparar a qualidade do ar e compreender na prática como o número de árvores aumenta a quantidade de oxigênio no ar, também podemos discutir a importância da preservação das matas e como conservar o meio ambiente, contribuindo para a sustentabildade local. 4. Considerações finais A prioridade desta proposta foi desenvolver a consciência crítica dos alfabetizandos aumentando o acesso dos alunos às informações de relevância para a construção de sua cidadania ao passo, que pretendeu oferecer ao alfabetizador instrumentos que lhes possibilitasse conduzir suas aulas de forma mais criativa com uma prática pedagógica voltada para o desenvolvimento intelectual dos jovens e adultos que outrora foram excluídos do processo educativo regular.O desenvolvimento desta estratégia além dos aspectos metodológicos necessita de acompanhamento o que é possível de ser feito através da capacitação continuada, já presente no Programa de Alfabetização Solidária, nestas visitas o coordenador pedagógico poderá trocar experiências com ao professores alfabetizadores que poderão relatar as dificuldades encontradas na aprendizagem dos alunos, o objetivo é o continuo aperfeiçoamento e adequação da nossa proposta às necessidades dos alfabetizandos, nossa finalidade é desenvolver cidadãos críticos e participativos e não apenas indivíduos letrados. 6 Referência Bibliográfica CRITELLE, Dulce Mara. 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