A EXPOSIÇÃO DE 1908 OU O BRASIL VISTO POR DENTRO
THE 1908 EXHIBITION OR BRAZIL SEEN FROM WITHIN
Margareth da Silva Pereira
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Tradução português-inglês: Rafael Saldanha Duarte
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1 Aquarela abertura dos portos - Coleção Elyseo
Belchior.
1 Watercolor of the opening of Brazilian ports to
foreign trade.
Ensinando a olhar o mundo
Olhar, comparar, julgar: esses atos que nos parecem
tão comuns foram, na verdade, objeto de um longo e
Brazil is currently experiencing a new period of affirmation of its international importance and finds itself faced
with the challenge of organising a series of large-scale
events. However, the history of the country and its cities
has displayed comparable periods and situations since
the 19th century. The opening of the ports (1808) and the
proclamation of independence (1822) represented the end
of the colonial pact and began Brazil’s insertion into a
network of relationships with continents and peoples to
define a field of economic and political struggles in which
the country increasingly began to review its own identity.
The organisation of the National Exposition of 1908
and the commemorations of the first centenary of the opening of the country’s ports to free trade with different nations was a powerful moment in this process. The event
can be seen as the grand finale to a first period of Brazil’s
economic and cultural interactions with an increasingly
urban and cosmopolitan world, of which the remodelling
of Rio de Janeiro from 1903 to 1906 was one of its most
glamorous expressions. At the start of the 20th century,
municipal and federal authorities, increasingly confident
about the country’s potential, did not confine the programme of transforming and modernising the national image
to works of architecture, urbanism and landscaping in the
Federal Capital. The challenge in 1908 would be more
ambitious: to celebrate the trade and development of the
country itself, organising at the same time an “inventory”
of Brazil for Brazilians themselves.
During the three months that it was open, the exibition
was visited by more than one million paying visitors, many
coming from different parts of a territory hardly known by
other Brazilians. All the states in the Federation organised
pavilions or stands displaying albums, photographs or catalogues of their cultural and economic progress. The Federal Government and the Federal District Council were also
represented, building important pavilions and demonstrating the development of their public services.
But if the country’s account of itself in 1908 was surprising, even more so is the evidence that many of our current
institutions were conceived and modelled in the temporary
spaces of these past exhibitions. From words to behaviour,
the actual culture of the 20th century or the challenges of
today can be found outlined there in their strength and
limits, in their dreams and ability to achieve them, in their
temporary achievements and their enduring values.
TEACHING HOW TO LOOK AT THE WORLD
Looking, comparing, judging: actions that seem so common were in fact the object of a long and intensive process of education of meanings and above all visions, developed particularly throughout the 19th century. Knowing
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O Brasil vive hoje um novo momento de afirmação
de sua importância no plano internacional e tem se visto
diante do desafio de organizar uma série de eventos
de grande porte. Contudo, a história do país e de suas
cidades exibem, desde o século XIX, momentos e situações comparáveis. A abertura dos portos (1808) e a proclamação da Independência (1922) – ao representarem o
fim do pacto colonial – deram início à inserção do Brasil
em uma rede de relações com diferentes continentes e
povos e delinearam um campo de lutas econômicas e políticas no interior do qual o país passou a dar visibilidade
a si próprio como, a cada vez, reatualizar sua identidade.
A realização da Exposição Nacional de 1908 e as
comemorações do primeiro centenário da abertura dos
portos do país ao livre comércio foi um momento forte
nesse processo. O evento pode ser considerado como o
grand finale de um primeiro tempo de interações econômicas e culturais do Brasil com um mundo cada vez mais
urbano e cosmopolita, que teve nas reformas do Rio de
Janeiro, entre 1903 e 1906 uma das suas maiores expressões. No início do século XX as autoridades municipais e
federais, ainda mais confiantes com as potencialidades
do país, não restringiriam o programa de transformação
e modernização da imagem nacional à arquitetura, ao urbanismo e ao paisagismo na Capital Federal. Em 1908 o
desafio seria mais ambicioso: celebrar o próprio comércio
e desenvolvimento do país, realizando, ao mesmo tempo,
um “inventário” do Brasil para os próprios brasileiros.
Nos seus três meses de abertura, a exposição foi visitada por mais de um milhão de pagantes, muitos deles
oriundos de diferentes pontos de um território em grande
parte sequer conhecido pelos demais brasileiros. Todos os
estados da Federação organizaram pavilhões ou estandes
exibindo seus avanços culturais e econômicos em álbuns,
fotografias ou catálogos. Além disso, o Governo Federal
e a Prefeitura do Distrito Federal também se fizeram representar, construindo importantes pavilhões e mostrando o
desenvolvimento de seus serviços públicos.
Mas se o balanço que o país fazia de si próprio em
1908 mostrava-se surpreendente, mais ainda o é a constatação de que inúmeras das nossas instituições atuais foram
concebidas e moldadas nos espaços efêmeros dessas
mostras do passado. Das palavras aos comportamentos: é
a própria cultura do século XX ou os desafios de hoje que
se encontram aí delineados em sua força e em seus limites,
em seus sonhos e capacidade realizadora, em suas conquistas efêmeras e em seus valores duradouros.
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intenso processo de educação do sentidos e, sobretudo da visão, desenvolvido particularmente ao longo do
século XIX. Saber ver por imagens e sobretudo, ensinar
a ver foi uma construção cultural compartilhada por diferentes sociedades no Ocidente – dentre as quais o Brasil.
Esse culto à imagem se manifestou em uma produção
iconográfica diversificada e que impulsionaria a criação
de diferentes procedimentos técnicos. Dos grandes panoramas circulares, os primeiros desses dispositivos óticos
voltados para a educação visual das massas, que se impuseram nas primeiras décadas do século XIX, rapidamente
passou-se à circulação mais ágil oferecida pelos álbuns
pitorescos, daguerreotipias, fotografias e, décadas mais
tarde, pelas estereotipias, pelos bilhetes postais e pelo cinematógrafo.
Dentre os diversos modos de olhar, comparar e julgar,
as Exposições Universais, talvez tenham sido dos mais eficientes. Estas grandes feiras representaram um dos mais
importantes espaços educativos da cultura do século XIX,
ensinando as novas massas urbanas a observar cidades,
povos, culturas e também a hierarquizá-los a partir de uma
visão única e evolucionista de desenvolvimento e história.
Desde o fim do século XVIII, a França havia começado a realizar exposições nacionais de indústria e comércio, impulsionada pelo desejo de conhecer suas próprias
produções e de igualar-se ao desenvolvimento industrial
inglês. Contudo, uma exposição comparativa “universal”,
isto é, uma feira que servisse de termômetro das atividades manufatureiras, industriais e comerciais de diferentes
países só se realizaria pela primeira vez em 1851, em
Londres, em um vasto edifício que passaria a ser conhecido como o Palácio de Cristal.
A partir de então, as Exposições Universais se instituem
como grandes eventos mundiais regulares o que sinaliza
em que medida o exercício de olhar, comparar e julgar
já havia se difundido e se consolidado como uma prática
social de grande parte dos habitantes das cidades. A circulação vertiginosa de imagens passou, assim, a se fazer
sentir também em outros campos e as comparação entre
hábitos culturais e cenas urbanas de diferentes regiões
não só foi inevitável como tornou-se “natural”: do interior
da África aos Balcãs, dos subúrbios de Glasgow ou Liverpool aos jardins do Plater em Viena, do modo de vida dos
marajás ao rito do chá no Japão ou ao uso dos narguilés
em Istambul.
Olhar o mundo e, em seguida, classificá-lo fez com que
a arquitetura e a imagem das cidades fossem vistas como
um “retrato” das civilizações e dos povos. O clímax dessa
leitura das culturas através de objetos e edifícios se fixa
na segunda metade do século XIX. Através da linguagem
estilística adotada em cada contexto e país – greco-ro8
how to see through images, and above all teaching how
to see, were cultural processes shared by different western
societies, including Brazil.
This cult of the image was demonstrated in the wideranging iconographic production that would boost the creation of various technical procedures. It was a swift move
from the large circular panoramas, the first of these optical
devices aimed at education of the masses, which were
imposed in the early decades of the 19th century, to the
more agile circulation offered by picture albums, daguerreotypes, photographs and, decades later, by stereotypes,
picture postcards and cinematography.
Among the various modes of seeing, comparing and
judging, the Universal Expositions were perhaps the most
efficient. These large fairs represented one of the most
important educational spaces in 19th-century culture, teaching the new urban masses how to look at cities, peoples
and cultures and also to evaluate them from a single, evolutionist view of development and history.
Since the late 18th century, France had begun to organise national trade and industry expositions driven by
the desire to discover its own output and set itself on a level with English industrial development. But a comparative
“universal” exposition, that is, a fair that serves as a gauge
of the manufacturing, industrial and commercial activity
of different countries would only be organised for the first
time in 1851, in a huge building in London that became
known as Crystal Palace.
Universal Expositions have since then established themselves as regular major world events, indicating how
much the exercise of looking, comparing and judging has
been disseminated and consolidated as a social practice
of the majority of city dwellers. The dizzying circulation of
images then began to be felt in other fields, and the comparison of cultural customs and urban settings of different
regions was not just inevitable but became ‘natural’: from
the Glasgow or Liverpool suburbs to the gardens of Plater
in Vienna, from the lives of the Maharajas to the tea ceremony in Japan or the use of hookahs in Istanbul.
Looking at the world and then classifying it led to the
architecture and images of cites being seen as a “portrait”
of civilisations and peoples. The climax of this reading of
cultures through objects and buildings was consolidated in
the second half of the 19th century. Each country’s level of
civility, cosmopolitanism and progress was judged through
the stylistic language adopted: Greco-Roman, Gothic, Moorish, Turkish... or through its technological development. It
might even be said that the idea of an Universal Exposition
and particularly this comparative assessment of peoples
and cultures would consolidate new social practices and a
new trio of terms: Displaying, Admiring, Consuming.
2 Museu da República.
2 Republic Museum.
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3 Museu da República.
3 Republic Museum.
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During the big events that become the Universal Exhibitions, the countries themselves – firstly in stands and then
gradually in isolated pavilions – moved on to display products and inventions from different areas, further extending
the possibilities for comparison and, of course, for admiration, and attracting followers and consumers. It could
be said that these fairs tightened contacts and exchanges
between officials, technicians, artists and scientists, and
that there was a gradual consolidation of a liberal mindset
alert to new inventions but also eager for consumption of
novelties.
Displaying had now become an art, but reports from
the authorities reveal that it also feeds the economy. Indeed, cultural comparisons began to creep in from the 1855
Universal Exposition in Paris, when participating countries
also began to display their achievements in the arts. Several of today’s design schools would be created in the
world, and in Brazil, including the Liceus de Artes e Ofícios
in Rio and Sao Paulo, aimed at training and developing
the abilities and taste of craftspeople to enable them to respond the demands of an increasingly competitive market
for manufactured goods or processed products.
Brazil took part in all the Universal Expositions for almost a century, firstly just in Europe and then in the United
States as well. It began by assembling its products into a
few showcases (London, 1851 and 1862; Paris, 1855 and
1867) and later built admirable gardens and buildings (Paris, 1889; Chicago, 1893; Saint Louis, 1904; New York,
1939).
Since organizing the preliminary exhibition in 1861 for
the Universal Exhibition of 1862 in London, the Brazilian
government had started to hold “national” exhibitions to
pre-select the products and achievements of local industry that would represent the country. The word “industry”
would not have the same meaning in nineteenth-century
culture that it has today, and so with the increasing size
of Universal Exhibitions, displaying a nation’s industrial
achievements meant showing the work of its inhabitants in
a wide range of fields: from the mechanical or manual to
the moral and intellectual.
These achievements were so diverse they began to be
divided into classes, genres and types of activity. In Brazil,
but also in the more distant regions of the planet, all the
provinces and later the federal states began to take part in
these displays, internalizing their reasons for classification
of human activities and creating their identities based on
a hierarchy of peoples and cultures divided into “civilized”
or “uncivilised”, “advanced” or “backward”, “developed”
or “developing.”
From this classifying and evolutionary viewpoint we
can understand the pride of the new Brazilian republic and
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mana; gótica, mourisca, turca... – ou do desenvolvimento
tecnólogico exibido, julgava-se o seu nível de civilidade,
cosmopolitismo e progresso. Na verdade, pode-se dizer
que a idéia de Exposição Universal e sobretudo esse julgamento comparativo de povos e culturas veio consolidar
novas práticas sociais e um novo trinômio: exibir, admirar
e consumir.
Durante os grandes eventos que se tornam as Exposições Universais, os próprios países – primeiro em estandes e pouco a pouco em pavilhões isolados – passaram,
assim, a exibir produtos e invenções em diferentes áreas,
ampliando ainda mais as possibilidades de comparações e atraindo, evidentemente, admiração e também
adeptos e consumidores. Pode-se dizer que nessas feiras
estreitavam-se contatos e intercâmbios entre autoridades,
técnicos, artistas e cientistas, e pouco a pouco consolidava-se uma mentalidade liberal atenta às invenções mas,
também, voraz no consumo de novidades.
Mostrar – o que e como – já havia se tornado uma arte,
mas os relatórios de autoridades revelam que também alimenta a economia. De fato, as comparações do ponto
de vista cultural, se insinuariam a partir de 1855, na Exposição Universal de Paris, quando os países participantes também passaram a exibir seus avanços no campo
das artes. Diversas escolas de desenho existentes hoje no
mundo e, entre nós, os próprios Liceus de Artes e Ofícios,
seriam criados no Rio e em São Paulo, com o objetivo
agora de formar e desenvolver a manualidade e o gosto
dos artesãos, capacitando-os a responder às demandas
de um mercado de objetos manufaturados ou industrializados cada vez mais competitivo.
O Brasil participou de todas as Exposições Universais
realizadas durante quase um século, primeiro somente na
Europa e depois também nos Estados Unidos: de início
reunindo seus produtos em algumas vitrines (Londres,
1851 e 1862; Paris, 1855 e 1867) e mais tarde construindo jardins e edifícios admiráveis (Paris, 1889; Chicago,
1893; Saint Louis, 1904; Nova Iorque, 1939).
Desde 1861, quando organizou a mostra preparatória
da Exposição Universal de 1862 em Londres, o governo
brasileiro passou a realizar exibições “nacionais” com o
objetivo de pré-selecionar os produtos e realizações da
indústria local que iriam representar o país. Na cultura
do século XIX a palavra indústria não possuía o significado que tem hoje e, assim, à medida que as Exposições
Universais foram ficando cada vez maiores, exibir as realizações da indústria de uma nação significava mostrar
o trabalho dos seus habitantes nos mais diversos campos:
do mecânico ou manual ao moral e intelectual.
Por sua vez essas realizações tão diferenciadas passaram a ser divididas em classes, gêneros e tipos de ativida-
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des. No Brasil, mas também nas mais longínquas regiões
do planeta, todas as províncias e depois os estados da
federação passaram a participar dessas mostras, interiorizando suas lógicas de classificação das atividades
humanas, criando suas identidades a partir de uma hierarquia dos povos e culturas em “civilizados” ou “bárbaros”,
“adiantados” ou “atrasados”, “desenvolvidos” ou “em desenvolvimento”.
É a partir da ótica classificatória e evolucionista que
podemos entender o orgulho da jovem república brasileira e dos cariocas em afirmar, com as obras de reformas
da Capital Federal implementadas no governo Rodrigues
Alves: o Rio civiliza-se!
O caráter efêmero dessas mostras que atraiam multidões como se vê paulatinamente foram instituindo formas
de percepção de si e do outro duradouras. Por outro lado,
a partir dos anos 1870 o gigantismo que adquiriram estas
mostras do trabalho e da civilização “universal” fez com
que cada vez mais se colocasse o problema do que preservar ao término de cada evento e passou-se ainda a
avaliar qual o seu impacto ou contribuição para o próprio
desenvolvimento urbano.
Vazios urbanos e áreas limítrofes das cidades após
abrigarem as Exposições Universais dão origem, assim, a
bairros inteiramente novos e os edifícios ou áreas de diversão remanescentes passam a acolher instituições, museus
ou serem integrados nos circuitos turísticos. Pavilhões
também são pensados para serem desmontados e remontados em outras cidades e, dentro de uma lógica onde tudo
se comercializa, muitos edifícios são projetados e construídos até mesmo para serem vendidos para outros países.
a internacionalização do Brasil
A internacionalização dos contatos entre diferentes
regiões do mundo e a organização de um sistema de intercâmbio, impulsionada pelo liberalismo econômico, como
vemos, tiveram nas Exposições Universais seu motor e a
participação do Brasil foi um dos termômetros da internacionalização econômica e cultural do país.
Entretanto, se as primeiras páginas da história da globalização puderam ser escritas ainda no século XIX, isso
só seria possível pelo desenvolvimento sem precedente
dos serviços de transporte e, sobretudo, de comunicações.
Circular e comunicar são atividades que dão suporte ao
próprio processo de intercâmbio econômico entre nações
e à criação de práticas sociais e culturais compartilhadas,
malgrado as singularidades de cada país.
As bases do sistema contemporâneo de comunicação
e circulação de indivíduos, produtos, bens e informação
foram construídos em ritmos quase sincrônicos a esse
sistema de interações e construções culturais. Até o século
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the people of Rio in affirming through the restoration works
in the Federal Capital implemented by the Rodrigo Alves
government: Rio is civilizing itself!
The temporary nature of these exhibitions attracting the
crowds has repeatedly been seen to establish long-lasting
perception of the self and others. On the other hand, the
massive scale of these displays of work and “universal” civilization since the 1870s has increasingly raised the question of what to keep after the end of each event and made
it necessary to assess its impact or contribution for urban
development itself.
After housing Universal Expositions, urban spaces and
regions on the outskirts of cities thus become the origin of
entirely new districts and the remaining buildings or amusement areas begin to house institutions and museums or
become part of the tourist circuit. Pavilions are also planned to be dismantled and reassembled in other cities and,
within a logic in which everything is commercialised, many
buildings are designed and even built to be sold to other
countries.
THE INTERNETIONALISATION OF BRAZIL
The internationalisation of contact between different
regions of the world and the organisation of an exchange
system boosted by economic liberalism were driven by Universal Expositions, as we can see, and the participation of
Brazil was one of the gauges of the economic and cultural
internationalisation of the country.
However, if the first pages in the history of globalisation
could still be written in the 19th century, it would only be
possible through the unprecedented development of transport and, particularly, communications services. Circulation and communication are activities that support the actual process of economic exchange between nations and
the creation of shared social and cultural practices, despite
the individualities of each country.
The basis of the contemporary system of communication
and circulation of people, products, goods and information was constructed in a rhythm almost synchronised with
this system of cultural interaction and construction. Prior to
the 19th century, the regions of the planet had never known such a network of economic and cultural exchange that
could cross seas and oceans and penetrate the inner regions of the five different continents. The expansion of road
networks in the first half of the 19th century was followed
by the development of sea and coastal transport.
By the mid 19th century the railways had been established and a system of communication constructed with the
invention of the postage stamp in England in 1840 and its
rapid international recognition (Brazil would be the third
country, after Switzerland, to adopt it in 1843). Commer-
cial trade thus takes a double leap forward thanks to firm
guarantees of mail exchange and transport networks that
allow circulation of letters, samples, orders, contacts and
products. If one wanted to draw parallels, it could be said
that this period, also known as the Second Industrial Revolution, is what turns the Universal Expositions into major
showcases of trade and culture.
The development of the Brazilian economy throughout
the 19th century was taking place within these large-scale
economic networks. Alongside the significant role of the development of postal services, economic growth was given
further impetus by the expansion of telegraphy following
the first experiments in telegraph transmission in 1852. Between the Vienna Exposition of 1873 and the Paris Exposition of 1878, the more economically active countries had
built new bases for their postal services, including Brazil,
which opened its first building especially constructed for
this purpose on Rua 1º de Março.
The organisation of Universal Expositions on the American continent, firstly in Philadelphia, and at the turn of
the century in Chicago and St Louis, would shift the focus
of economic development from the European setting in a
way that would also favour Brazil. Brazilian pavilions had
begun to attract public attention since 1889 in Paris, but
in this new arrangement of transnational forces Brazilian
engineers would become recognised in the expositions in
the USA, firstly with the prize awarded to Francisco Marcelino de Souza Aguiar in Chicago and then with the design
for the Brazilian pavilion in St Louis (which would be reconstructed in Rio as the Federal Senate Building - Palácio
Monroe, now destroyed).
So the third wave of economic and technological expansion caused by the development of electricity, the telephone and the motor vehicle accelerates the internationalisation of the domestic economy. But it is from an American
point of view that Brazilian intellectuals and authorities see
themselves and the modernisation of the country.
Within this context the expansion of the Mail and Telegraph services becomes a valuable strategic task. They
have to contribute to a dual process of unifying Brazil by
creating regular networks through agencies and service
posts spread throughout the country and continuing the
faster integration of an increasingly large and more established Brazil with an economic system and an ever more
international borderless network of trade and exchange.
GLOBALISATION AND PAN-AMERICANISM
The 1908 National Exposition was the seventh national
exposition organised in Rio de Janeiro. It represented the
peak and also the start of a questioning of the classification process of countries whose parameters had been
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XIX, as regiões do planeta não haviam conhecido uma
rede de trocas econômicas e culturais tão estreita capaz
de cruzar oceanos e mares, embrenhando-se pelo interior
das terras dos cinco diferentes continentes. Na primeira
metade do século XIX observa-se a expansão das redes
de estradas e caminhos, seguidas pelo desenvolvimento
dos transportes marítimo e de cabotagem.
Em meados do século XIX firma-se o desenvolvimento
ferroviário e o sistema de comunicação se estrutura com a
invenção do selo postal na Inglaterra em 1840 e seu rápido
reconhecimento internacional (o Brasil, após a Suíça, seria o
terceiro país a adotá-lo, em 1843). As trocas comerciais dão,
assim, um duplo salto, graças às garantias sólidas na troca
de correspondências e às redes de transporte e circulação
que permitem fazer circular cartas, amostras, pedidos, contatos, produtos. Se quisermos tecer paralelos pode-se dizer
que este período, também designado como o da Segunda
Revolução Industrial, é aquele que torna as Exposições Universais as grandes vitrines culturais e de negócios.
Ora, o desenvolvimento da economia brasileira ao
longo do século XIX vinha construindo seu lugar dentro
destas redes econômicas em larga escala. Paralelamente vinha se desenhando o papel relevante dos serviços
postais para o próprio crescimento econômico, impulsionando, ainda, a expansão da telegrafia, desde 1852 com
as primeiras experiências de transmissão telegráficas.
Entre a Exposições de Viena em 1873 e a de Paris de
1878, os países economicamente mais ativos já haviam
construído novas sedes para seus serviços postais, inclusive o Brasil, que inaugura o seu primeiro edifício especialmente construído para esse fim, na rua 1° de Março.
A organização de Exposições Universais no continente
americano – primeiro na Filadélfia, e na virada do século
XIX em Chicago e Saint Louis – deslocariam, contudo, o
foco do desenvolvimento econômico do cenário europeu, o
que de certo modo também favoreceria o Brasil. Os pavilhões brasileiros começaram a atrair a atenção do público
desde 1889, em Paris. Contudo, é neste novo arranjo de
forças transnacionais que engenheiros brasileiros se notabilizaram nas exposições realizadas nos EUA, primeiro com
a premiação de Francisco Marcelino de Souza Aguiar em
Chicago e, depois, com o projeto para o pavilhão do Brasil
em Saint Louis (que seria remontado no Rio como sede do
Senado Federal – o Palácio Monroe, hoje destruído).
Assim, esta terceira onda de expansão econômica e
tecnológica provocada pelo desenvolvimento da eletricidade, da telefonia e, pouco a pouco, do automóvel,
acelera a internacionalização da economia nacional.
Entretanto, é de um ponto de vista americano que intelectuais e autoridades brasileiras se vêem e a própria modernização do país.
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Nesse contexto, os Correios e Telégrafos e a expansão
de seus serviços passam a ser uma tarefa estratégica e
que exige ser valorizada. Eles deveriam contribuir em um
duplo processo: unificar o Brasil criando redes regulares
de contato através de agências e postos de serviço distribuídos por todo o território e continuar a integrar mais
rapidamente esse Brasil cada vez mais concreto e vasto
como sistema econômico à uma rede sem fronteiras de
comércio e trocas, cada vez mais internacional.
Globalização e pan-americanismo
A Exposição Nacional de 1908 foi a sétima exibição
nacional realizada no Rio de Janeiro. Ela representou o
auge mas também o início do questionamento de um processo classificatório de países cujos parâmetros haviam
sido construídos a partir de um conceito eurocêntrico de
cultura. Por outro lado, ao comemorar o centenário da
Abertura dos Portos ao livre comércio, ela celebrava a
própria cultura capitalista e industrial que firmara suas
bases durante o século XIX.
Entretanto, ela marca também uma inflexão ao propiciar a realização de um inventário do país não para ser
exibido para fora de suas fronteiras, mas para os próprios
brasileiros. É a partir desse “Brasil em exposição” que o
país passa a ser visto de dentro e uma visão “interna”
também começa a ganhar forma e, mais do que isso, a
definir com mais clareza políticas conseqüentes para o
país e suas cidades e regiões.
Na verdade, a proclamação da República e, sobretudo, as reformas urbanas da Capital Federal realizadas
pelo Ministério de Viação e Obras Públicas e pela Prefeitura do Distrito Federal, marcaram novos tempos na história
do país. Juntamente com os mecanismos simplistas de exibição e leitura do desenvolvimento dos países instituídos
com as Exposições Universais, a modernização da arquitetura da área central e do Porto do Rio de Janeiro era
percebida como se o Brasil inteiro subitamente houvesse
modernizado o conjunto de suas instituições e a própria
mentalidade e os hábitos dos seus habitantes.
O sucesso obtido pelos pavilhões brasileiros na Exposição Universal de 1893 em Chicago e na Exposição Universal de Saint-Louis em 1904, além do acúmulo de medalhas e prêmios que os expositores passaram a ganhar
em cada exposição, contribuiu para construir o clima de
otimismo em relação ao crescimento do país durante a
primeira década do século XX. Parecia, dessa forma, que
o Brasil tinha encontrado o seu próprio rumo para alavancar o seu desenvolvimento.
Favoreceram esse sentimento positivo ainda dois outros
fatores: a reconstrução, com sucesso, do pavilhão do Brasil
na Exposição de Saint-Louis no Rio de Janeiro, batizado
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constructed based on a Eurocentric concept of culture. On
the other hand, by commemorating the centenary of the
Opening of the Ports to free trade, it celebrated the actual
capitalist and industrialist culture whose bases had been
established during the 19th century.
But it also marks a change in encouraging organisation of an inventory of the country that was not for display
beyond its borders but for Brazilians themselves. Based on
the exposition of Brazil the country will begin to be seen
from within and an ‘inner’ view of the Brazil will also start
to take shape, together with clearer definition of relevant
policies for the nation and its cities and regions.
Indeed, the proclamation of the Republic, and particularly the urban modifications to the Federal Capital carried out by the Ministry of Roads and Public Works and
the Federal District Council, marked a new period in the
country’s history. As a result of the simplest mechanisms of
display and reading of the development of countries with
established Universal Expositions, the modernisation of the
architecture in the central and port areas of Rio de Janeiro
was perceived as if the whole of Brazil had magically modernised its institutions and the actual mindset and customs
of its inhabitants.
The success of the Brazilian pavilions at the 1893 Universal Fair in Chicago and in St Louis in 1904, together
with the accumulation of medals and awards by exhibitors
at each exposition, contributed to the construction of a climate of optimism in relation to the country’s growth during
the first decade of the 20th century. It seemed as if Brazil
had found its own way of ramping up its development.
Two other factors added to this positive feeling: firstly
the successful reconstruction in Rio de Janeiro of the Brazilian pavilion from the St Louis Exposition, christened the
Palácio Monroe; secondly the organisation of the 3rd PanAmerican Conference in 1906, also in the Federal Capital,
on the premises of the recently reconstructed pavilion. Both
events reignited discussions about how the new economic
period the country was experiencing was in less than “five
years Brazil better known than in the four centuries of its
existence”.
This mixture of Pan-American feelings and “mild patriotic joy” can be seen in Kosmos magazine, with comments
on its pages about how much, on the occasion of the event
in the Unites States,
“our economic strengths were defined as comparable
with the old countries of other continents, seen to be perfect
in our industrial products, huge in the expansion of our agriculture, wonderful in the products of our nature, so as to place Brazil in such an advantageous situation in which it could
well be said we are the winners at the giant fair.”
“desenharam-se as nossas forças econômicas, dignas de
ombrear com as dos velhos povos dos outros continentes,
manifestando-se perfeitas em nossos artefatos industriais,
enormes na expansão de nossa agricultura, maravilhosas
nos produtos de nossa natureza, de sorte a colocar o Brasil
em tal situação de avantajamento, que na gigantesca feira
bem se pode afirmar – fomos nós os vencedores.”
A idéia da exposição nacional surgiu no Congresso de
Expansão Econômica, em 1905, por sugestão da imprensa e foi acatada pelo Congresso Nacional, que votou o
orçamento para sua realização em julho de 1907. Destinada “a marcar no caminho dos séculos o primeiro estágio
da vida do Brazil no mundo civilizado”, quatro grandes
ramos da atividade nacional deveriam ser contemplados
– agricultura, indústria, pecuária e artes liberais.
Mas os brasileiros, conheciam eles o Brasil? A pergunta era pertinente na medida em que a exposição de SaintLouis retirara o país da doce ilusão e do conforto da sua
posição periférica revelando a fecunda atividade e os progressos de vários setores da industria nacional, do quais
só se falava em tons de piada. Os brasileiros pareciam
mais se interessar “pelo que vai por além-mar do que o
acontecido dentro das raias do nosso vastíssimo território”.
Se a Exposição de Saint Louis foi uma “maravilha” para
o estrangeiro, era preciso confessar “que talvez fossemos
nós mesmo os mais maravilhados.”
É a constatação de que o país ignorava as suas próprias conquistas e as suas potencialidades, em quase um
século de Independência que explica a rapidez e o entusiasmo com que foi montada a Exposição Nacional de
1908. A comemoração do centenário da abertura dos
portos foi o pretexto para compor o “retrato” da nação.
Os preparativos
Os preparativos da Exposição Nacional começaram
sob a presidência de Afonso Pena sob a tutela do seu
Ministro da Indústria, Comércio, Viação e Obras Públicas,
Miguel Calmon du Pin e Almeida. Em outubro de 1907,
The idea of a national exposition thus arose at the
1905 Congress of Economic Expansion on the suggestion
of the press and was accepted by the National Congress,
which voted a budget for its completion in July 1907. Intended, in the words of the time, to “mark the path though
the centuries of the early stages of life of Brazil in the civilised world”, four major fields of domestic activity were to
be considered – agriculture, industry, livestock and liberal
arts.
But did the Brazilians know Brazil? The question was
relevant in that the St Louis exposition had removed the
country from the fond illusion of its comfortable peripheral position and revealed fertile activity and progress in
various sectors of domestic industry, which had previously
only been spoken of jokingly. Brazilians seemed more interested in “what is going overseas than what is happening
in our enormous territory”. If the St Louis exposition was a
“wonder” for others, it had to be admitted that “perhaps
we could be the most marvellous”.
The fact that the country ignored its own successes and
even more so its potential during almost a century of independence, explains the speed and enthusiasm with which
the National Exposition was organised in 1908. The commemoration of the centenary of the opening of the ports
was the pretext for constructing a “portrait” of the nation.
THE PREPARATIONS
Preparations for the National Exposition began under
the presidency of Afonso Pena, supervised by his Minister of Industry, Trade, Roads and Public Works, Miguel
Calmon du Pin e Almeida. In October 1907, the minister
formed an executive committee of 41 members presided
over by the Engineer Antônio Olyntho dos Santos Pires,
ex-Minister of Roads and teacher at the School of Mines
in Ouro Preto. It was also decided that in terms of logistics
all the transport costs for exhibited objects would be paid
by the Federal Government and delegates were sent to all
states of the Federation to promote the event.
Mindful of the impact of the exhibition for the development of the city, Minister Miguel Calmon analysed various
locations for hosting the event. It should be noted that the
Federal District Council was headed by the engineer Colonel Francisco Marcelino de Souza Aguiar, who as a delegate and recipient of honours and awards at the Chicago
and St Louis expositions had accumulated considerable
experience at organising this type of exhibition.
Several sites in the city were therefore analysed and rejected, either for being too small or for locational reasons
or because operational costs: the as yet unconstructed landfill site of the new Port, Campo de São Cristovão and
the Quinta, Campo de Santana, Russel and Santa Luzia
15
ARQTEXTO 16
como Palácio Monroe; e a realização da III Conferência
Pan-Americana de 1906, também na Capital Federal, nas
próprias dependências do pavilhão recém construído.
Ambos eventos reativavam as discussões sobre o novo
momento econômico do país que vinha fazendo com que
em menos de “um lustro se tornasse o Brasil mais conhecido do que nos quatro séculos que tem de existência”.
Esse misto de sentimento pan-americanista e “suave
alegria patriótica” podia ser acompanhado na revista
Kosmos que comentava em suas páginas o quanto, por
ocasião do evento nos Estados Unidos,
ARQTEXTO 16
o ministro formou uma comissão executiva composta por
41 membros tendo como presidente o engenheiro Antônio
Olyntho dos Santos Pires, ex-Ministro da Viação e professor da Escola de Minas de Ouro Preto. Decidiu-se que do
ponto de vista logístico, todos os gastos com os transporte
dos objetos que deveriam ser expostos seriam pagos pelo
Governo Federal e, a fim de promover o evento, foram
enviado delegados a todos os estados da Federação.
Cioso do impacto da mostra para o desenvolvimento da cidade, o Ministro Miguel Calmon analisou vários
locais para sediar o evento. Deve-se notar que à frente
da Prefeitura do Distrito Federal estava o próprio coronelengenheiro Francisco Marcelino de Souza Aguiar, que,
como delegado e recebedor de honras e prêmios nas
exposições de Chicago e Saint-Louis, acumulava grande
experiência na organização desse tipo de mostra.
Assim, foram analisados e descartados diversos terrenos na cidade, ora por serem muito pequenos, ora por
questões locacionais, ora pelos custos da operação:
a área aterrada e ainda não construída no novo Porto,
o Campo de São Cristovão e a Quinta, o Campo de
Santana, as Praias do Russel e de Santa Luzia. Em fins de
1907, o próprio ministro decidiu-se pela região da Praia
da Saudade, onde dois edifícios pertencentes à esfera
federal poderiam ser aproveitados, reduzindo os custos.
O primeiro era o da Escola Militar, em estado de abandono à época, e o segundo o da projetada Universidade
do Brasil, cuja pedra fundamental havia sido lançada em
1881, mas que permanecia inacabado.
A área de 182.000m2, compreendida entre a Praia
da Saudade e a Praia Vermelha, e situada entre o mar e
a montanha, oferecia um aspecto pitoresco e sua escolha
já apontava para a valorização da orla como espaço de
lazer. Uma nova frente de urbanização acabaria, assim,
sendo “criada” graças a novos aterros hidráulicos na área
e, do ponto de vista do acesso, a um esquema de transportes que contava com os novos bondes elétricos da Light
and Power e modernas barcas da Companhia Cantareira,
construindo-se para tanto um ancoradouro.
Antes mesmo que o plano geral da exposição estivesse decidido, foram iniciadas as obras de infra-estrutura.
Durante um curtíssimo período de hesitações, uma primeira
proposta para a ocupação da área da Praia da Saudade
chegou a ser estudada pelo Dr. Buarque de Macedo e veiculada pela imprensa, mas seria rapidamente abandonada. O projeto aprovado pela comissão entre setembro e
outubro de 1908 começou por mudar a localização e dar
maior grandiosidade à porta de acesso ao recinto propriamente dito da Exposição Nacional. Sua concepção
foi confiada ao arquiteto René Barba, que inspirou-se na
Porta Triunfal da Exposição Universal de 1889, em Paris.
16
beaches. At the end of 1907, the minister himself decided
on the region of Praia da Saudade, where the two permanent federal buildings could be used, reducing costs. The
first was the Military School, in a state of neglect at the
time, and the second was the planned University of Brazil,
whose foundation stone had been laid in 1881, but which
remained unfinished.
The 182,000 m² area between Praia da Saudade and
Praia Vermelha, situated between the sea and the mountain offered a picturesque view and its choice already
pointed to appreciation of the shore as a leisure area. A
new area of urbanisation would therefore be “created”
with new landfills in the area and, from the point of access,
the transport scheme featuring the new Light and Power
trams and modern boats belonging to the Cantareira Company, requiring the construction of moorings.
Work began on the infrastructure even before the overall exhibition plan had been decided. During a very short
period of hesitation, the initial proposal for occupation of
the Praia da Saudade area was studied by Dr. Buarque de
Macedo and published in the press, but was soon abandoned. The project approved by the committee in September
and October 1908 began by changing the location and
paying greater attention to importance of the National Exposition site access gate, designed by the architect René
Barba based on the Triumphal Gateway to the 1889 Universal Exposition in Paris.
The group was structured by an imposing access some
30 m wide and 560 m long, known as Avenida dos Estados – now part of Avenida Pasteur. Starting from the
Monumental Gateway, the avenue led visitors to the old
Military School building, totally restored as the Pavilion of
Industries. The perspective was crowned by an illuminated fountain consisting of planes of water and fountains
forming a huge Château d´eau or reservoir built with the
modern technology of reinforced concrete.
At the beginning of the avenue the old University became the Palace of the States and was adapted to receive
representations from several states in the Federation. A succession of grass and gardens ran along the axis, punctuated by squares and streets, housing isolated pavilions. Two
ring roads skirted the slopes of the Urca and Babilônia hills
and a small railway was built inside for public transport.
From January to June 1908, architects, masons, carpenters, mechanics, plasterers, plumbers, electricians, tilers,
wall painters and artist painters transformed the construction site into a swarm of workers and craftsmen, as recorded in the memoirs of Ferreira da Rosa, allowing construction of the National Exposition setting as an enchantment.
The National Exposition opened on August 11 and remained open to the public until November 15 1908, with
A Exposição de 1908 e seus construtores
“Parece-nos, ainda, um sonho esse inesperado aparecimento da pequenina cidade de palacetes nos areais
da Urca...” A revista Kosmos traduzia assim o sentimento
de deslumbramento em relação às obras realizadas para
a Exposição Nacional. Mais de trinta novas construções
haviam surgido na esplanada entre a Praia da Saudade e
a Praia Vermelha entre janeiro e agosto de 1908, quando
a feira abriu suas portas. O responsável direto por este
feito havia sido José Mattoso Sampaio Correa, Inspetor Geral das Obras Públicas, designado pelo Ministro
Miguel Calmon como Presidente Honorário da Exposição
e engenheiro-chefe da Comissão Construtora.
Sampaio Correa realizou uma obra arrojada na Exposição, introduzindo em quase todos os edifícios sob sua
responsabilidade a nova técnica do cimento armado em
paredes, estruturas e moldagens. Introduziu também sistemas complexos de adução e bombeamento d’água utilizando ainda uma outra tecnologia que apenas começava
a generalizar-se no Rio de Janeiro: a energia elétrica.
substantial investments from the National Government, the
Federal District Council and the states.
THE 1908 EXPOSITION AND ITS BUILDERS
“The appearance of the little town of palaces on the
sands of Urca still seems like a dream…” was how Kosmos magazine translated the sense of wonder surrounding
the construction works for the National Exposition. More
than thirty new buildings had appeared on the esplanade between Praia da Saudade and Praia Vermelha from
January to August 1908, when the fair opened its gates.
The person directly responsible for this feat had been José
Mattoso Sampaio Correa, the General Inspector of Public
Works designated by Minister Miguel Calmon, Honorary
President of the Exposition and chief engineer of the Building Committee.
Sampaio Correa carried out enterprising work at the
Exposition, introducing the new technique of reinforced
concrete for the walls, structures and mouldings of almost
all the buildings he was responsible for. He also introduced
complex water supply and pumping systems using another
technology that had only recently become common in Rio
de Janeiro: electricity.
The Building Committee consisted of four engineers and
two architects, and faced various technical problems. Sometimes it was the foundation stones and concrete coating
for building the wharfs, the stability of the construction of
the Palace of Industries, supply to the Château d’eau to
enable a constant flow of water to the Fountains, or the
electric lighting of the Monumental Gateway. Sometimes it
involved definition of sites to house pavilions that had not
initially been programmed, such as the Fire Brigade, and
the Press. However, nothing required so much attention as
the short-notice change of location and design of the Portuguese Pavilion while still guaranteeing dimensions compatible with those of the original project to be able to house
the showcases and material that had been sent by ship.
Sampaio Correa received many official honours and
compliments in the press for his work. The two architects
from the Building Committee were also singled out. In addition to the Monumental Arch, René Barba also devised the
new facades for the Pavilion of Industries and the Sugarloaf Restaurant, the most elegant of the Exposition. Francisco
Isidoro Monteiro was responsible for the João Caetano
Theatre and adaptation of the Palace of the States.
THE RHETORIC OF THE PAVILIONS
In addition to the Federal District and Portugal, the only
guest country, four federal states would build their own pavilions – Bahia, Minas Gerais, São Paulo and Santa Catarina. Modernisation of the country and certain federal and
17
ARQTEXTO 16
Um imponente eixo com 30 metros de largura e 560
metros de extensão, a chamada Avenida dos Estados –
hoje parte da Avenida Pasteur – estruturava o conjunto.
Partindo da Porta Monumental a avenida levava os visitantes até o edifício da antiga Escola Militar, totalmente reformada para receber o Pavilhão das Indústrias. Coroava
a perspectiva uma fonte luminosa, composta por planos
d’água sinuosos e chafarizes, formando um gigantesco
Château d´eau – isto é, um reservatório – construído com
a moderna tecnologia do cimento armado.
Situado no início da avenida, o edifício da antiga Universidade passou a ser chamado Palácio dos Estados e
foi adaptado para receber as representações de diversos
estados da Federação. Ao longo do eixo, sucediam-se
gramados e jardins, entrecortados por praças e ruas, acolhendo os pavilhões isolados. Duas vias de contorno margeavam as encostas dos morros da Urca e da Babilônia e
uma pequena via férrea foi construída para a locomoção
do público, internamente.
Arquitetos, pedreiros, carpinteiros, mecânicos, estucadores, bombeiros, eletricistas, ladrilheiros, pintores “de
liso” e artistas pintores transformaram o canteiro de obras
de janeiro a junho de 1908 em um formigueiro de operários e artífices, como registra Ferreira da Rosa em suas memórias, permitindo a construção do cenário da Exposição
Nacional, como um “encantamento”.
A Exposição Nacional foi inaugurada em 11 de agosto
e esteve aberta ao público até 15 de novembro de 1908,
recebendo investimentos maciços do Governo da União,
da Prefeitura do Distrito Federal e dos estados.
5 Projeto do edifício que acolheu a exposição
preparatória para escolher os produtos do Estado
de São Paulo que seriam enviados à Exposição
de 1908. Projeto do engenheiro Hipólito Gustavo
Pujol Junior.
5 Project of the building that housed the exhibition
preparatory to choose the products of the State of
Sao Paulo, which would be sent to the Exhibition
of 1908. Project done by the engineer Gustavo
Hipolito Pujol Junior.
ARQTEXTO 16
4 - Palácio dos Estados, edifício onde foram exibidos os produtos de diversos Estados da Federação
e de Repartições Públicas do Governo Federal.
4 Palácio dos Estados, the building where the
products of various states and of the Public Offices
of Federal Government were displayed.
4
5
18
A retórica dos pavilhões
Além do Distrito Federal e de Portugal, único país convidado, quatro estados da federação construíram pavilhões próprios – Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Santa
Catarina. A modernização do país e de certos setores
administrativos federais e municipais podia também ser
atestada em vários outros edifícios como os Pavilhões dos
Estados, o das Indústrias, o dos Correios e Telégrafos, o
do Corpo de Bombeiros, o da Inspeção de Matas e Florestas, o do Jardim Botânico e até mesmo na presença
discreta do edifício da Assistência Municipal.
Certos ramos da atividade industrial ou econômica
também se fizeram presentes afirmando seu desenvolvimento em requintados pavilhões – como o da fábrica de
tecidos Bangu (projeto em estilo mourisco do diretor da
empresa José Villas Boas) ou o da Sociedade Nacional
da Agricultura, em estilo renascença (construído pelo engenheiro Souza Reis, secretário da instituição).
No campo artístico, o desenvolvimento, refinamento
e atualização do país podia ser medido na produção
exibida no Pavilhão das Artes Liberais, que expunha
plantas e maquetes dos edifícios da exposição e a obra
de artistas como os irmãos Bernardelli, Visconti, Batista
da Costa, Rodolfo Amoedo, Belmiro de Almeida, Nicolina
Vaz de Assis, Ernesto Giradet, entre outros.
No Pavilhão Egípcio, o maestro Alberto Nepomuceno,
municipal administrative sectors could also be seen in several other buildings, such as the Pavilions of the States, Industries, Mail and Telegraphs, the Fire Brigade, the Forests and
Woodland Inspectors, the Botanical Gardens and even the
discreet presence of the Municipal Assistance building.
Certain branches of industrial or economic activity were
also present, confirming their development in sophisticated
pavilions – such as the Bangu textiles factory (a Moorish
design by the company director, José Villas Boas) or the
National Agriculture Society , in a renaissance style (built
by the engineer Souza Reis, the institution secretary).
The country’s development, refinement and modernisation in the field of the arts could be measured by the work
displayed in the pavilion of the Liberal Arts, with an exhibition of the exposition building plans and models and the
work of artists like the Bernardelli brothers, Visconti, Batista
da Costa, Rodolfo Amoedo, Belmiro de Almeida, Nicolina
Vaz de Assis, Ernesto Giradet.
In the Egyptian pavilion the conductor Alberto Nepomuceno, head of the National Institute of Music, had run
a campaign in favour of singing in the national language,
but organised concerts honouring recognised European
composers such as Rimski-Korsakov, who died in 1908,
and the modern composer Claude Debussy.
The 870m2 Teatro João Caetano was an imposing part
of the group and its green and gold internal decoration devised by the bold fantasy of Raul Pederneiras, was celebrated for its originality. Its large, pleasant, perfectly designed
practical and comfortable space, staged various plays by
Arthur Azevedo.
In all the works for the 1908 National Exposition the
contracted architects intended the architectural language of their buildings to emblematise the importance of
each state, the “industry” of its population or its economic
strength. However, four buildings stood out for being not
just almost face to face or side by side but also for their
messages of magnificence, sobriety, elegance, monumentality, luxury or rusticity, seeming at times complementary
but above all contrasting, if not contradictory.
Immediately after passing through the Monumental Gateway, the visitor would be surprised by the pavilions of
Bahia and Minas Gerais, both from the architect Rafael
Rebecchi. The former, occupying 450m2, was in an Italian
renaissance style with its 38-metre height and three floors
crowned by a dome featuring a sculpture of the goddess
of Victory holding a laurel wreath. On the ground floor
a sculptural group allegorically represented the state of
Bahia, and on the first landing an allegory of the state
capital could be seen with the figure of Catarina de Paraguassú. It was built by the director of the Polytechnic
School of Bahia, the engineer Arlindo Fragozo.
19
ARQTEXTO 16
A Comissão Construtora era composta por quatro engenheiros e dois arquitetos e se desdobrou, enfrentando
diferentes problemas técnicos: ora tratava-se do enrocamento e vedação em cimento da construção do cais, da
estabilidade da construção do Palácio das Indústria, do
abastecimento do Chateu d’eau para permitir o constante
fluxo e nível de água dos chafarizes ou da iluminação elétrica da Porta Monumental, ora tratava-se da definição de
terrenos para acolher pavilhões inicialmente não programados como o do Corpo de Bombeiros e o da Imprensa.
Nada, entretanto exigiu tanta atenção como resolver, em
tempo hábil, a mudança de local e projeto do Pavilhão de
Portugal, garantindo, entretanto, dimensões compatíveis
com as do projeto primitivo para poder receber as vitrines
e o material que já havia sido expedido em navio.
Sampaio Correa recebeu inúmeras homenagens oficiais e elogios na imprensa por seu trabalho. Os dois
arquitetos da Comissão Construtora também se notabilizaram. René Barba, além do Arco Monumental também
concebeu as novas fachadas do Pavilhão das Indústrias e
o Restaurante do Pão de Açúcar, o mais elegante da Exposição. Francisco Isidoro Monteiro, além da adaptação
do Palácio dos Estados, foi o responsável pelo edifício do
Teatro João Caetano.
ARQTEXTO 16
à frente do Instituto Nacional de Música, vinha fazendo
uma campanha em prol do canto em língua nacional, mas
organizou concertos homenageando reconhecidos compositores europeus como Rimski-Korsakov, que faleceu em
1908, e o moderno Claude Debussy.
O Teatro João Caetano se impunha no conjunto com
seus 870m2 e sua decoração interna em tons de verde e
ouro, idealizada pela fantasia audaz de Raul Pederneiras,
foi celebrada pela sua originalidade. Em seu espaço bastante vasto, agradável, perfeitamente delineado, prático
e confortável foram encenadas várias peças de Arthur
Azevedo.
Em todas as obras da Exposição Nacional de 1908 os
arquitetos contratados buscavam que a linguagem arquitetônica de seus edifícios emblematizasse a importância de
cada estado, a “indústria” de sua população ou a própria
pujança econômica. Entretanto, quatro edifícios se sobressaíram, não apenas por estarem quase frente a frente ou
lado a lado, mas também por que suas mensagens de
magnificência, sobriedade, elegância, monumentalismo,
luxo ou rusticidade, mostravam-se em alguns casos complementares mas, sobretudo, contrastantes, senão contraditórias.
Apenas ultrapassando a Porta Monumental o visitante
já se surpreendia com os pavilhões da Bahia e de Minas
Gerais, ambos projetados pelo arquiteto Rafael Rebecchi. O primeiro, com área de 450m², exibia estilo Renascença Italiana e com seus 38 metros de altura em três
pavimentos era coroado com uma cúpula destacando-se
uma escultura da deusa Vitória, com uma palma de louros
nas mãos. No térreo, um grupo escultórico representava
alegoricamente o estado da Bahia em seu conjunto e no
primeiro patamar, via-se a alegoria da própria capital do
estado e a figura de Catarina de Paraguassú. Foi construído pelo diretor da Escola Politécnica da Bahia, o engenheiro Arlindo Fragozo.
O pavilhão de Minas Gerais, além de possuir área significativamente maior, com seus 650m² e com sua torre de
62 metros de altura encimada por um foco luminoso, pontuava a importância política de Minas Gerais na relação
de forças políticas da 1a República. O próprio presidente
do Estado fizera os desenhos iniciais do edifício. Aqui, no
desenvolvimento de projeto, Rebecchi adotara o que era
uma revolução na época – um edifício sem estilo definido
– que, no entanto, impunha-se pela riqueza e elegância
de sua ornamentação. A imprensa, ao comentar o pavilhão de Minas Gerais, sublinhava como o edifício soubera
simbolizar duas virtudes capitais dos mineiros: a altivez
serena e a modéstia afável, mas na verdade parecia, indiretamente, criticar o pavilhão do estado de São Paulo,
em sua exuberância estilistica e em seu monumentalismo.
20
As well a occupying a significantly larger area of
650m2 and with a 62-metre tower topped by a light source, the Minas Gerais pavilion pointed to the political importance of Minas Gerais in the play of power in the 1st
Republic. The president of the state himself had done the
initial drawings for the building. Here, Rebecchi had developed the project by adopting a revolutionary approach
at the time – a building with no defined style – which,
however, made an imposing presence through the wealth
and elegance of its ornamentation. Press comments on the
Minas Gerais pavilion emphasised how the building knew
how to symbolise the capital virtues of the state’s inhabitants: quiet pride and affable modesty, while the State of
São Paulo pavilion seems to be criticised for its stylistic
exuberance and monumentality.
The São Paulo representation was the most acclaimed
by visitors, and the products from different areas of the
state occupied several buildings, particularly two wings on
two floors at the Pavilion of the States. Besides showing
the state’s agricultural production and natural resources,
the stands, showcases and kiosks also displayed textiles,
machinery, leather products, ceramics, models of buildings
and even a huge 11-meter panorama by the photographer
Valério with a view of the state capital. But it was the pavilion built especially by the São Paulo state government for
the National Exposition that caused greatest visitor impact.
Dominating the main square, this pavilion was the biggest and most luxurious of the event. Designed by senior
figures in São Paulo architectural scene at the time, Ramos de Azevedo and Ricardo Severo, it was executed by
the architect Domiziano Rossi. The 1500m2 building was
even bigger than the Federal District pavilion. It had an
exhibition wing, but was intended mainly for official activities, with a main hall for receiving Brazilian and foreign
dignitaries and delegations, a ballroom and conference
areas. The pavilion was profusely decorated with sculptures and decorative reliefs and was topped by no less than
12 domes. It was considered the most beautiful building at
the National Exhibition, winning a contest sponsored by
the Jornal de Commércio. Its opulence allows it be seen
as the ultimate expression of the grandiloquent language
attained by half a century of National and Universal exhibitions.
In contrast to São Paulo, the state of Santa Catarina attracted attention for its simple pavilion as a modest chalet
built with 150 species of timber from the region, evoking
the homes of immigrants and settlers. Noting the excessive
Europeanization of the architecture of some of the buildings the Exhibition Journal recorded that certain national feelings had only been roughly sketched out: “Santa
Catarina can say to the other states (...) ‘ your palaces
6 Pavilhão Santa Catarina.
6 Santa Catarina Pavilion.
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6
21
ARQTEXTO 16
A representação de São Paulo foi a mais aclamada pelo público e os produtos enviados pelos diversos
participantes do Estado ocuparam vários edifícios e, sobretudo, duas alas em dois pavimentos do Pavilhão dos
Estados. Os estandes, vitrines e quiosques do estado,
além de mostrar sua produção agrícola e seus recursos
naturais, também exibia tecidos, máquinas, artefatos em
couro, cerâmica, maquete de edifícios e até mesmo um
grandioso panorama com uma vista de sua capital – o
chamado panorama do fotógrafo Valério, com onze
metros de extensão. Entretanto, era o pavilhão construído especialmente pelo governo do Estado de São
Paulo para a Exposição Nacional que causava o maior
impacto nos visitantes.
Dominando a praça principal o pavilhão era o
maior e mais luxuoso do evento. Projeto de Ramos de
Azevedo e Ricardo Severo, figuras eminentes da arquitetura paulista da época, foi executado pelo arquiteto
Domiziano Rossi. O edifício, com 1.500m2 era maior até
mesmo que o Pavilhão do Distrito Federal e possuía uma
ala expositiva mas destinava-se, sobretudo, às atividades oficiais, reunindo a sala de honra para receber as
autoridades e delegações brasileiras e estrangeiras, o
salão de festas e as áreas destinadas às conferências.
O pavilhão era profusamente decorado com esculturas e
relevos ornamentais e era coberto por nada menos que
12 cúpulas. Foi considerado o mais belo da Exposição
Nacional, vencendo um concurso promovido pelo Jornal
do Commércio. Com sua opulência, pode ser visto como
a expressão máxima da linguagem grandiloqüente que
a arquitetura das exposições Universais e Nacionais alcançara em meio século.
Contrastando com São Paulo, Santa Catarina chamava
a atenção pela sua simplicidade. Seu pavilhão era um
modesto chalet construído com 150 espécies de madeira
da região, evocando as residências dos seus imigrantes.
Observando a europeização excessiva da arquitetura de
alguns edifícios o Jornal da Exposição registrava um certo
sentimento nacional que apenas se esboçava:
“Santa Catarina pode dizer aos outros estados (...) ‘seus
palácios vieram do estrangeiro, ao passo que, em minha casa
modesta, tudo é meu, tudo saiu do meu próprio seio, tudo é
filho de minha pouca fortuna e do meu honrado trabalho.”
Aprendendo SOBRE o Brasil e a Capital Federal
O prefeito Francisco Marcelino de Souza Aguiar
nomeou uma comissão para organizar a forma de apresentação dos expositores do Distrito Federal. Foi decidida
a construção de um pavilhão específico para a mostra
da prefeitura, sendo que os demais expositores ocuparam
22
came from abroad, while in my modest home, everything
is mine, everything came from my own heart, everything is
a child of my small blessings and my honourable work’. “
LEARNING ABOUT BRAZIL AND THE FEDERAL CAPITAL
The mayor, Francisco Marcelino de Souza Aguiar, appointed a committee to organize the presentation of the
Federal District exhibitors. It was decided to build a special
pavilion for the city council exhibition, with the remaining
exhibitors occupying several buildings such as the Palace
of the States and the Palace of Industries. The Botanical
Gardens built a stand to show its own collection, and the
Forest, Gardens, Planting, Fishing and Hunting Inspectorate also held a special exhibition, occupying approximately
1,400m². The exhibitions as a whole occupied more than
4,000m².
The Federal District pavilion occupied about 1,100m²
and was designed by the engineer Francisco Oliveira Passos, who was also responsible for Rio de Janeiro Municipal
Theatre. This was a sober building with the façade ornamentation confined to a few reliefs, featuring the municipal
coat of arms and the symbol of the republic – a female
head. The building was crowned by a rotunda covered by
a transparent dome. Its two floors showed the municipal
administration’s most recent projects, focusing on primary
and vocational education, health, hygiene and public assistance, and other urban improvements. The second floor
was reserved for balls and receptions.
Apart from the elegance of the modernized classic style of the architecture, attention was also focused on statistics. Under the organisation of Bulhões de Carvalho much
data about the city and municipal services were shown,
while the General Board of Statistics, an agency linked to
the Federal Government, also displayed charts, maps and
texts, providing a comprehensive picture of the country in
figures and allowing analysis of imbalances of growth for
the first time since the proclamation of the Republic.
A Notícia newspaper summed up the 1908 National
Exhibition by noting that Rio de Janeiro had experienced
the joy of thousands of people at first hand, “passing through lovely avenues by the seaside, or visiting the luxurious
halls with such glorious displays of Brazilian energy and
strength...”
LOOKING, STROLLING, LEARNING
Such a beautiful thing, an opulent combination of lights,
until yesterday, we could only see it through the elegance of
magazine pages... Yesterday Rio de Janeiro saw it first hand;
noted the collective joy of maybe sixty-thousand people,
walking through lovely avenues by the seaside, or visiting the
luxurious halls with such glorious displays of Brazilian energy
and strength… Cantareira and especially the Botanical Gardens have made the greatest efforts to serve the huge crowds
passing through the monumental gateway of our Exposition
minute by minute.
A Notícia newspaper’s report from the exhibition opening may have been the feelings of locals and the thousands of visitors during the three months that it remained open.
The material appearing daily in the Rio press, together
with the affordable entry price, made the National Exposition into a success.
The symphony concerts in the Egyptian Pavilion introduced young audiences to a mixed repertoire of classical
music. Even before the opening, the Jornal de Commércio
reported, a real musical education is intended with these
concerts, which promise to be most interesting in terms of
musical performance, choice of pieces, or the soloists.
The Exposition Theatre also included several Brazilian
and foreign companies presenting comic operas and musical concerts, in a clear aim at forming local taste. Visitors could also take part in battles of flowers and confetti,
watch riding competitions, be captivated by the electric
lighting in some of the pavilions or wonder at the domestic, Japanese and English fireworks. They could also go
skating, watch the cinematographer Segreto or enjoy the
wonderful view of the Bay, leaning over the railings in the
Amusements Sector or at the two Restaurants – the Sugarloaf and the Rustic.
More than one million people attended the 1908 National Exposition, and it brought in 11,286 exhibitors from
Brazil and a further 671 from Portugal, definitively putting
Brazil face to face with itself and the challenge of defining
its place within an increasingly globalized and complex
culture.
Ver, flanar e instruir-se
Coisa assim tão bella, combinação tão opulenta de luzes,
até hontem, só nos fora dado ver na polidez de paginas de
revistas... Ontem o Rio de Janeiro viu ao vivo; observou a
alegria de conjuncto de talvez sessenta mil pessoas, passeando por encantadoras avenidas à beira mar, ou percorrendo os luxuosos salões em que a energia e a força brasileiras ostentavam gloriosamente... quer a Cantareira, quer,
principalmente, a Jardim Botanico empregaram o maximo de
esforço em servir a estupenda onda de gente que, de minuto
em minuto, invadiu a monumental porta de nossa Exposição.
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ARQTEXTO 16
vários edifícios, como o Palácio dos Estados e o Palácio
das Indústrias. O Jardim Botânico construiu um quiosque próprio para mostrar sua coleção, e a Inspetoria de
Matas, Jardins, Arborização, Caça e Pesca também realizou uma exposição especial que ocupava aproximadamente 1.400m². Todas as exibições reunidas ocuparam
mais de 4.000m².
O pavilhão do Distrito Federal possuía cerca de
1.100m² e fora desenhado pelo engenheiro Francisco Oliveira Passos, também autor do projeto do Teatro
Municipal do Rio de Janeiro. O edifício caracterizava-se
pela sobriedade, e os ornamentos da fachada se limitavam a alguns relevos, destacando-se as armas municipais
e o símbolo da República – uma cabeça feminina. Uma
rotunda coroava o edifício, sobre a qual se elevava uma
alta cúpula transparente. Nos seus dois pavimentos foram
exibidas as obras recentíssimas da administração municipal, voltadas para a educação primária e profissional,
saúde, higiene e assistência pública, além de outros melhoramentos urbanos. O segundo pavimento foi reservado
aos bailes e às recepções.
Para além da elegância da arquitetura em estilo clássico modernizado, o outro foco de atenções foram as estatísticas. Sob o comando de Bulhões de Carvalho foram
mostrados muitos dados da cidade e dos serviços municipais. Ao mesmo tempo, a Diretoria Geral de Estatística,
órgão afeito ao Governo Federal, também exibiu diversos
pictogramas, mapas e textos do país, fornecendo, pela
primeira vez desde a proclamação da República, um
vasto retrato do país em números, possibilitando, inclusive,
a constatação das assimetrias de seu crescimento.
Como sintetizou o jornal A Notícia, na Exposição Nacional de 1908 o Rio de Janeiro viu ao vivo e observou a
alegria em conjunto de milhares de pessoas, “passando
por encantadoras avenidas à beira mar, ou percorrendo
os luxuosos salões em que a energia e a força brasileiras
ostentavam gloriosamente...”
ARQTEXTO 16
7 Planta baixa do 1o pavimento do Palácio dos
Estados mostrando as áreas ocupadas pelos
expositores do Distrito Federal e Estados do Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, Paraiba, Minas
Gerais, Alagoas , Bahia , Piauí, Ceará, Sergipe,
espírito Santo, Rio Grande do Norte, São Paulo,
Rio de Janeiro, entre outros.
7 First floor plan of the Palácio dos Estados
showing areas occupied by the expositor of Distrito
Federal and by the folowing States: Rio Grande
do Sul, Santa Catarina, Paraiba, Minas Gerais,
Alagoas , Bahia , Piauí, Ceará, Sergipe, espírito
Santo, Rio Grande do Norte, São Paulo, Rio de
Janeiro, among others.
7
24
8 Planta baixa do 2o pavimento do Palácio dos
Estados mostrando as áreas ocupadas pelos
expositores do Distrito Federal e Estados do Rio
de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso, Rio Grande
do Sul, Pará e Amazonas.
8 Second floor plan of the Palácio dos Estados
showing areas occupied by the expositors os
Distrito Federal and by the folowing States: Rio de
Janeiro, São Paulo, Mato Grosso, Rio Grande do
Sul, Pará and Amazonas.
ARQTEXTO 16
8
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ARQTEXTO 16
O jornal A Notícia registrou, na abertura da Exposição, o que talvez tenha sido o sentimento dos cariocas e
dos milhares de visitantes durante os três meses em que
esteve aberta a mostra. As matérias veiculadas diariamente na imprensa carioca, além dos preços módicos da
entrada, fizeram da Exposição Nacional um sucesso.
Os concertos sinfônicos, realizados no Pavilhão
Egípcio, introduziram as jovens platéias a um repertório
variado e erudito. “É uma verdadeira educação musical
o que se visa com esses concertos, que prometem ser
do mais alto interesse, quer como execução, quer como
escolha de peças, quer como solistas.”, comentava o
Jornal do Commércio, antes mesmo da inauguração.
Com um intuito claro de formar o gosto local também se
exibiram no Teatro da Exposição várias companhias brasileiras e estrangeiras, produzindo óperas cômicas, variedades e também concertos de música. Os visitantes podiam
ainda participar das batalhas de flores e de confete, assistir aos concursos hípicos, se encantar com a própria
iluminação elétrica de vários pavilhões ou se maravilhar
com os fogos de artifícios de fábricas nacionais, inglesas
e japonesas. Podiam também patinar, assistir ao cinematógrafo Segreto ou apreciar a maravilhosa vista da Baía,
debruçando-se nas balaustradas do Setor de Diversões ou
nos dois restaurantes – o do Pão de Açúcar e o Rústico.
Freqüentaram a Exposição Nacional de 1908 mais
de um milhão de pessoas, e ela reuniu 11.286 expositores brasileiros e outros 671 portugueses. Definitivamente,
colocou o Brasil diante de si próprio e do desafio de desenhar o seu lugar dentro de uma cultura cada vez mais
globalizada e complexa.
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BIBLIOGRAPHY
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Janeiro: PUC, 1986.
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brasileira – A participação do Brasil nas Exposições Universais.”
em Revista Projeto 139, 1991.
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Indústria, Viação e Obras Públicas. Rio de Janeiro: Imprensa
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Anno 1908.
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BIBLIOGRAFIA
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A EXPOSIÇÃO DE 1908 OU O BRASIL VISTO POR