OPINIÃO
4 — SEGUNDA-FEIRA, 2 de julho de 2007
Deu no Correio
CORREIO DO POVO
EMPRESA JORNALÍSTICA CALDAS JÚNIOR
Flávio Alcaraz Gomes
o Correio do Povo de 2 de julho de 1907: * Brevemente deverão começar os trabalhos de instalação das linhas subterrâneas de telefones da empresa Ganzo, Durruly & Cia. As novas linhas ligarão Porto Alegre a Canoas,
São Leopoldo, Novo Hamburgo, Taquara e Santa Cruz. 486
firmas já se inscreveram. * Lúcio Fernandes, intitulando-se
fiscal da Intendência Municipal, há dias perseguia leitores,
cobrando-lhes impostos. Ontem o agente 191 do 3O Posto
prendeu o gajo em flagrante delito, recolhendo-o ao xadrez.
* O nosso amigo dr. Antônio Martins Costa, procurador da
República, tinha em sua chácara no campo da Redenção
um cão de estima e extraordinária mansidão. Há quatro dias, manifestando sinais de raiva, o animal mordeu o nosso
amigo e sua filhinha Judite. O dr. Martins Costa segue
com a família no primeiro vapor para o Rio de Janeiro, a
fim de submeter-se a tratamento no Instituto Pasteur.
D
[email protected]
Para resgatar a Uergs
Sofia Cavedon
e há uma política pública que tem estatura de política
de Estado e não de governo é a nossa Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Ou deveria ser. Pois nasceu
da luta popular, da demanda e da priorização da sociedade
civil organizada no processo de Orçamento Participativo estadual e consolidou-se no debate no parlamento com o
acordo entre todos os partidos políticos.
Não é assim, no entanto, que ela tem sido tratada. Desrespeitando a construção coletiva, o governo Rigotto deu
um rumo diverso ao construído para a universidade: questionou e modificou cursos; fechou o ingresso em outros, colocando em extinção, especialmente, as pedagogias; reduziu vagas a cada vestibular; não deu continuidade à adequação dos espaços físicos, bibliotecas, laboratórios; não
encaminhou a eleição de reitor pela comunidade acadêmica e nem constituiu o quadro permanente de pessoal, chegando ao ápice de, na transição para o governo Yeda/Feijó,
sequer o vestibular de início de ano acontecer!
O movimento de alunos, professores, funcionários e
parlamentares está pautando o novo reitor e seu governo
para exigir um plano de recuperação e consolidação da Uergs autônoma e democrática. No entanto, os passos são lentos, e a concepção meritocrática, elitista, tecnóloga, de estado mínimo, que fragilizou tanto a universidade na gestão
anterior, parece que é hegemônica também neste governo.
Em Porto Alegre, o curso de Pedagogia da Uergs para
Educadores Populares que atuam em creches, extraclasse,
alfabetização de adultos, educação social de rua foi uma
construção feita a muitas mãos: Associação dos Educadores Populares, Secretaria Municipal de Educação, Conselho
da Criança e do Adolescente, Conselho Municipal de Educação e Uergs. A primeira e única turma, de 150 educadores, já beneficiou uma parte das mais de 50 mil crianças e
adolescentes que são atendidos por eles. Nem isso, nem todas as manifestações, protestos e audiências públicas realizadas no período demoveram o governo Rigotto de sua determinação de fechar as pedagogias!
Nesta retomada da luta pela recuperação da Universidade Estadual do RS, agora diante do novo governo, os educadores de Porto Alegre realizaram uma grande audiência
na Câmara, estiveram em reunião com o prefeito e estão
pressionando pela abertura de novas turmas e somando-se
ao movimento geral pelo respeito a esta que é das mais preciosas conquistas da comunidade gaúcha!
S
FUNDADO EM 1O DE OUTUBRO DE 1895
O aumento populacional urbano
divulgado pela Organização das Nações Unidas
R elatório
(ONU), na quarta-feira, mostra que já está em curso uma in-
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versão dos números em relação ao montante populacional do
campo e da cidade. Já em 2008, a população urbana será maior
que a população rural e, em 2030, aquela terá um percentual de
60% da população mundial. Em 2050, as projeções indicam que
teremos 9 bilhões de habitantes no globo terrestre, com um acréscimo de 2,5 bilhões de pessoas aos números atuais.
Segundo o estudo, as populações dos países ricos aumentarão
apenas 11% em 30 anos. Já as do continente latino-americano
crescerão 50% e as dos continentes asiático e africano dobrarão.
Se considerarmos a Produção Interna Bruta dos continentes,
bem como a distribuição de renda, já é possível inferir a problemática social e econômica a ser enfrentada no futuro, caso se
mantenham os indicadores socioeconômicos atuais.
ASSINATURA MENSAL
Também chamou a atenção o fato de que as cidades a sofreCAPITAL R$ 19,00
INTERIOR R$ 22,00
rem aumento populacional não são as grandes metrópoles, mas
aquelas com menos de 1 milhão de habitantes. Esse aumento,
ASSINATURAS E ATENDIMENTO AO ASSINANTE:
Rua Caldas Júnior, 219 – Fone (51) 3216.1600
também, não será mais apenas resultado da migração, mas,
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principalmente, do crescimento populacional da população que já
Filiado
INSTITUTO
ASSOCIAÇÃO
se encontra nas cidades. Prevê-se também que em 2050 a quanVERIFICADOR
NACIONAL
DE CIRCULAÇÃO
DE JORNAIS
tidade de idosos será, pela primeira vez na história, maior que a
de crianças. Hoje, esses percentuais estão em 10% e em 28%.
O estudo da ONU é um alerta para que as autoridades e as so- DO LEITOR
[email protected]
ciedades se preparem, com antecedência, para um caos desde já
Trânsito
anunciado. Será preciso investir na infra-estrutura urbana, com
Há muito o “melhoramento” da avenida Baltazar de Olisaneamento, transporte, educação e desenvolver economicamen- veira Garcia prejudica quem por lá se arrisca a transitar.
te os continentes subdesenvolvidos. Também será necessária Com a obra abandonada, proliferam os buracos no que
da via, que, além de sobrecarregada com a conuma eficiente política de planejamento familiar, para evitar as restou
centração do fluxo de veículos em estreita faixa, ainda soconcepções não desejadas e suas conseqüências negativas, co- freu degradação com a intensa chuva de junho. Se o caso
é falta de recursos, que não começassem a obra. Se a
mo o abandono de crianças.
Baltazar já era ruim, conseguiram piorá-la com maestria.
As constatações e previsões consubstanciadas no relatório Cesar
K., Porto Alegre
são subsídios contra o pior. O mundo, num futuro pouco distante, Hospital Belém
será o reflexo das ações ou das omissões das gerações atuais.
O governo municipal, em parceria com o Hospital Moinhos de Vento, vem com projeto de construção de um
hospital na Restinga. A solução não seriam melhorias no
Hospital Parque Belém? O hospital está sucateado, mas
tem estrutura física suficiente para atender à comunidade
da Restinga, distante 9 quilômetros. O gasto seria menor.
Pedro Idilio Sanches Barreto, Porto Alegre
AMORIM
Sensibilidade
Parabenizo o Correio do Povo pela opinião de Léo L.
Vieira “A lição de liberdade”, no dia 26. Parabéns ao jornal
pela sensibilidade e ao autor do texto pela lucidez.
Marcos Rodrigues, São Borja
BR 392
Lamentável que a BR 392 necessite de reparos a cada
seis meses, no trecho entre a BR 290 e Santana da Boa
Vista. Mal termina a recuperação e já reaparecem as perigosas crateras. Onde andará a fiscalização responsável
pela aplicação dos recursos públicos?
Amaro Dewes, Caçapava do Sul
Os artigos publicados com assinatura nesta página não traduzem
necessariamente a opinião do jornal e são de inteira responsabilidade
de seus autores. As cartas para o Correio do Leitor, com assinatura,
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do Povo, na Rua Caldas Júnior, 219, CEP 90019-900. Por razões de clareza ou espaço, as cartas poderão ser publicadas resumidamente.
vereadora
JUREMIR MACHADO DA SILVA
N
a semana passada, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul aprovou o
regime de cotas raciais. É um grande
avanço. E um grande retrocesso. O
avanço é claro porque só com medidas de força como essa os negros terão realmente acesso às universidades. O retrocesso se dá em
relação ao discurso iluminista da igualdade
para todos e da anulação da raça como critério de distinção social. Até no racismo o Brasil é um país original. Não se proíbe um negro
de fazer algo. Tudo é permitido. Só lhe falta a
oportunidade. Essa falta eterna de oportunidade se tornou a maneira mais cômoda de
manter tudo sem qualquer alteração. Não haveria necessidade de cotas se a sociedade, por
meio dos seus governos, provesse ensino básico de qualidade para todos e criasse vagas
na universidade para todos os jovens aprovados num exame de saída do ensino médio. A
França não tem cotas pelo simples fato de
que não tem vestibular.
É muito mais fácil transformar a origem
do problema em justificativa: a pobreza. Os
negros não ficariam fora da universidade por
Pela ampliação das cotas
serem negros, mas por serem pobres. Esse
sofisma absolve o Brasil de crime de racismo,
transfere o problema social para os indivíduos e possibilita que nada seja feito. Os governos, por outro lado, em vez de modificarem
a estrutura injusta, jogam o problema de volta para as suas vítimas. Em lugar de resolver
o problema do ensino básico e das vagas nas
universidades, sugerem que a massa se engalfinhe e divida as vagas do jeito que der. Aí
tem de ser na base da porrada. Por exemplo,
pela cor da pele. Raças não existem. É um
conceito antropológico ultrapassado. Tudo é
cultural. Ninguém pensa melhor ou corre melhor porque é branco, negro ou amarelo. Mas
o preconceito racial persiste e muda de pele
para continuar.
Ensino básico de qualidade para todos e
vagas nas universidades significa redistribuição de renda. Algo que a elite brasileira não
quer nem ouvir falar. Está bom assim. O Brasil é tão original que transformou o preconceito racial em questão de classe social. O sujeito é excluído por ser pobre, não por ser negro.
Ora, como não se pretende eliminar a pobre-
za redistribuindo renda, os pobres vão continuar pobres e os negros vão continuar negros
pobres. Salvo se meterem o pé na porta com
mecanismos como as cotas. Os inimigos das
cotas defendem que o vestibular é o regime do
mérito. Bobagem. Não há mérito algum em
ganhar de quem não teve oportunidade de se
preparar. O mérito só há realmente quando
resulta da disputa entre iguais, entre aqueles
que tiveram chances equivalentes de preparação. O vestibular é uma armadilha de uma
sociedade hipócrita para jogar jovens contra
jovens de maneira a que a conta a ser paga
pela sociedade e pelos governos em educação
seja menor. O custo social, claro, é mais alto.
O Brasil misturou as raças quando era
“normal” separá-las. Hoje, para que fiquem
realmente juntas, vê-se obrigado a separá-las
por critérios raciais ou as universidades continuarão totalmente abertas a negros que nelas não conseguem entrar. Somos uma das
sociedades mais hipócritas do mundo. Praticamos um racismo dissimulado, matreiro e
confortável. Negro é bom para jogar futebol e
fazer música. As cotas poderiam desaparecer
num passe de mágica. Bastaria promover
uma revolução educacional em três pontos:
redistribuição de renda e investimento maciço em escolas públicas; fim do vestibular e
instauração de um exame de saída do ensino
médio, com acesso à universidade de todos os
aprovados; mais vagas nas universidades públicas e mais bolsas para estudantes carentes
em universidades privadas.
É tudo o que o Brasil branco e rico não
quer fazer. Então, o jeito é ampliar as cotas.
Aqui vão algumas: cotas de 30% para parlamentares honestos (quase 300, de um total
de 513, sofrem algum tipo de processo ou de
investigação no Congresso Nacional); cotas de
10% (não convém pedir muito no começo) de
governantes eficazes e cumpridores das suas
promessas de campanha; cotas de 1% (vejam
que é um índice relativo, modesto) de juízes
dispostos a pôr na cadeia criminosos do topo
da pirâmide; cotas de 0,5% de parlamentares
decididos a mudar a legislação para acabar
com a impunidades dos Maluf, dos Calheiros,
dos Collor, dos Dirceu e outros. Por fim, cota
de um bom meio-campista no time do Inter.
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JUREMIR MACHADO DA SILVA