Ecologia de Populações
Curso Especialização em Gestão de Recursos Hídricos
Pinto-Coelho, R.M.
Departamento de Biologia Geral
Instituto de Ciências Biológicas – ICB
UFMG
http://www.icb.ufmg.br/~rmpc
Ecologia de Populações (parte 1)
Definições básicas
População
É qualquer de grupo de organismos da mesma espécie
ocupando um espaço particular num tempo determinado. A
população possui um determinado grupo de parâmetros que
podem ser quantitativamente determinados em condições
experimentais ou de campo.
Atributos demográficos de uma população
Densidade
Refere-se ao número de indivíduos por unidade de área ou volume. Existem várias
maneiras de se expressar a densidade de uma dada população.
Natalidade
É um termo que descreve a produção de novos indivíduos por unidade de tempo. Esta
produção pode ser quantificada por nascimentos, postura de ovos, germinação ou
fissão celular (índices mitóticos). Dois aspectos devem ser diferenciados em relação à
produção: a) fertilidade e b) fecundidade.
Fertilidade
Refere-se à performance real de uma população, e está baseada no
número de nascimentos bem sucedidos. A fecundidade refere-se ao
potencial fisiológico de reprodução atribuído a uma dada população.
A população humana apresenta uma fecundidade igual a 1
nascimento/11 meses.fêmea em idade reprodutiva e uma fertilidade
média de 1 nascimento/8 anos.fêmea em idade reprodutiva.
Naturalmente estas estimativas irão depender do organismo a ser
considerado. Uma ostra pode produzir de 55 a 114 milhões de ovos,
os peixes irão produzir milhares deles, os anfíbios centenas e os
pássaros de 1 a 20 ovos. Já os mamíferos poderão produzir de 1 a 10
indivíduos/ciclo reprodutivo.
Mortalidade
Inicialmente deve ser distinguida a longevidade fisiológica daquela ecológica. Isto deve
levar em conta o fato de que, em Ecologia, é muito raro encontrar uma população na
qual a maioria dos indivíduos estejam morrendo por senescência. A maioria dos
indivíduos é predada, sofre doenças ou não escapa de catástrofes naturais. Uma pequena
enchente em um córrego, por exemplo, pode ser o fim para milhares de pequenos insetos
habitantes da várzea. A longevidade da população humana sofreu grandes variações ao
longo do último milênio: na Roma antiga as mulheres viviam em média 21 anos; na
Inglaterra do final do século XVIII elas viviam cerca de 39 anos e nos Estados Unidos
ao início dos anos sessenta elas viviam em média 73 anos (Rabinovich, 1978). A taxa de
mortalidade pode ser estimada diretamente no campo pela técnica de marcação e
recaptura ou por tabelas de vida do tipo horizontal e no laboratório pelas tabelas de vida
do tipo vertical (vide abaixo).
Imigração e emigração
A dispersão (emi e imigração) muitas vezes não tem sido
levada em conta em censos populacionais. Em estudos de
marcação e recaptura é comum trabalhar com a taxa de
diminuição que seria a resultante de mortalidade e
emigração e taxa de incremento que seria a resultante de
nascimentos mais imigração.
O conhecimento da
biologia de migração
de uma espécie é,
portanto, de grande
importância para o
estudo de uma
população. A seguir,
fornecemos dois
exemplos de
migrações de aves de
longo curso, extraído
de Ricklefs (1990)
Modelos de Crescimento de População
Modelo Exponencial:
Lotka (1922) demonstrou
que uma população cuja
distribuição em classes
etárias não se altere deverá
crescer segundo a relação:
Crescimento Exponencial
A população humana tem tido um crescimento que pode ser descrito pelo modelo exponencial. Observe, no
entanto, que a taxa r vem crescendo também ao longo do tempo (crescimento super-exponencial).
A tabela a seguir, resume os dados sobre o crescimento populacional nos últimos 450 anos:
Tabela - Expansão da população humana entre 1650 e 1970.
Ano
1650
Bilhões de Indivíduos
0.5
1750
1830
1900
1950
0.75
1.0
1.6
2.5
1960
1970
2.8
3.6
É possível calcular o tempo de duplicação de uma população que crece segundo
O modelo exponencial:
Aplicando a relação obtida acima aos dados da tabela anterior (população Humana), temos:
Modelo de crescimento Logístico (Verhulst, 1838)
Este modelo caracteriza-se por uma associação entre a densidade de
uma população e sua taxa de crescimento. Por esta razão, é também
chamado de modelo densidade-dependente. A população pára de crescer
ao atingir uma densidade máxima (K), definida como sendo a
capacidade de suporte do meio. Em baixas densidades (K tende a 0), o
crescimento é aproximadamente exponencial e em altas densidades (N
tende para K) o crescimento tende a ser zero. O modelo logístico pode
ser definido pela seguintes fórmulas:
Modelo de crescimento logístico
Há várias evidências experimentais
suportando esse modelo. A mais
famosa delas foi publicada por Gauss
(1934), onde é feito um estudo sobre a
dinâmica populacional de dois
Paramecium: P. aurelia e P. caudatum.
Pearl (1927) observou que leveduras
(Saccharomices) podem crescer
segundo um modelo logístico. Jacobs
(1947) cultivou Escherichia coli em
meio aeróbico sob temperatura (35 C)
e pH constantes e contínuo aporte de
comida e obteve como resposta o
crescimento logístico. Chapman
(1928) observou que colônias do
coleóptero Tribolium crescem segundo
um modelo logístico. Park et al.(1964)
observou, entretanto, que culturas de
Tribolium, embora cresçam segundo
uma curva logística, não se
estabilizam em torno de K. Há um
lento e contínuo decréscimo (800
dias). Birch (1953) observou a
ausência de estabilização em K para o
coleópetro Calandra. A figura ao lado
demonstra a grande aderência ao
modelo que é obtida cultivando
cladóceros no laboratório (Macedo,
1999).
Crescimento populacional de Moina micrura obtido em laboratório
(Lab. Ecofisiologia de Organismos Planctônicos, ICB/UFMG).
Publicado por Macedo & Pinto-Coelho (1998).
falta de estabilidade em torno de K apresentada por várias populações sob suposto crescimento
logístico levou a proposição de modelos alternativos:
a) time-lag: depende de N de uma maneira não uniforme;
b) modelos estocásticos ou probabilísticos.
Uma população que obedeça ao modelo logístico deve obedecer aos seguintes critérios (Rabinovich,
1978):
a) qualquer que seja a natureza do novo indivíduo, o efeito em r é o mesmo. Todos os indivíduos são
idênticos, ou seja não há efeito da idade ou sexo sobre a taxa de crescimento;
b) o efeito depressivo da densidade sobre a taxa de crescimento é sentido instantaneamente, ou seja,
não há time-lag (ou tempo requerido para se observar uma dada resposta);
c) a população se encontra numa condição estável de distribuição de idades;
d) o efeito depressivo da densidade sobre a taxa de crescimento é linear;
e) as taxas instantâneas de natalidade e mortalidade (b e m) são as determinantes da taxa instantânea
de crescimento e não mudam ao longo do tempo. Isto significa que tanto as condições ambientais
bem como o genótipo dos indivíduos são constantes ao longo de gerações sucessivas.
Uma das principais características do modelo logístico é a dependência do crescimento em relação a
densidade de uma dada população em um dado instante. Sendo assim, deve ser possível expressar r
em função da capacidade de suporte do meio (K) e da densidade da população (N). O conjunto de
equações abaixo procura demonstrar matematicamente essa dependência.
A taxa de crescimento rm pode ser interpretada como sendo a capacidade inata para crescer
em números. É um parâmetro característico para cada espécie e pode variar segundo o
ambiente ou as condições experimentais.
A taxa rm é uma capacidade inata sendo atingida por uma particular combinação de condições
do meio em conjunto, definidas como sendo ótimas.
O termo "ótimo" deve ser encarado com reservas. Na realidade condições ótimas podem
significar condições controladas e especificáveis.
A importância deste parâmetro está em sua utilidade para simulações e modelizações.
A tabela abaixo fornece algumas destas taxas para roedores e insetos.
Tabela - Taxas de crescimento (r e G) em diferentes populações de vertebrados e
invertebrados
Organismo
Microtus agrestes
(r)
Rattus norvegius (r)
Tribolium
castaenum (i)
rm (dia-1)
G (dia)
Ro
0.0125
141.8
5.9
0.0147
217.8
25.9
0.101
55.6
275.0
Calandra oryzae (i) 0.109
43.4
113.6
Obs: roedor (r), inseto (i).
Ecologia de Populações (parte 2)
Tabelas de vida:
Elas foram inicialmente desenvolvidas por demógrafos sociais trabalhando a partir de dados censitários de
populações humanas. Elas reúnem as mortalidades específicas por idades. Há dois tipos de tabelas:
a) tabela estática ou vertical: É baseada num 'transecto' de uma população num tempo definido. É produzida por
um levantamento censitário;
b) tabela de "coorte" ou horizontal: É baseada no estudo de um conjunto de indivíduos da mesma idade (coorte)
durante toda a sua vida.
Estas tabelas se diferem apenas na maneira na qual são coletados os dados que servirão de partida para os
cálculos. Elas serão idênticas se o ambiente não mudar e se a população estiver em equilíbrio.
A montagem de uma tabela é feita a partir da estimativa de uma série de parâmetros demográficos, dentre os quais
podem ser citados:
x: intervalo de idade
lx: número de sobreviventes ao início da idade x
dx: número de indivíduos mortos no intervalo x a x+1
qx: taxa de mortalidade durante o intervalo x a x+1
ex: esperança média de vida no início da idade x
Lx: média de probabilidade de sobrevivência entre duas idades sucessivas
Tx: número total de dias que restam de vida aos sobreviventes que tenham alcançado a idade x.
Tabela 1 Tabela de vida das fêmas do afídeo Aphis fabae construída a partir dos dados de Dixon &
Walther (1971) in Rabinovich (1978).
x
0.5
lx
1000
dx
0
qx
0
Lx
1.000
Tx
4.185
Ex
4.185
1.5
2.5
3.5
1000
990
830
0
10
160
0.000
0.010
0.192
0.995
0.910
0.670
3.190
2.195
1.285
3.190
2.210
1.548
4.5
5.5
6.5
510
360
0
320
150
360
0.627
0.417
1.000
0.435
0.180
0.000
0.615
0.180
0.000
1.205
0.500
0.000
É possível calcular as taxas de crescimento populacional a partir dos dados de
uma tabela de vida. Os seguintes parâmetros são necessários:
Ro: taxa líquida de reprodução, ou seja o número de fêmeas que é produzido por
uma fêmea em seu tempo de geração
T: tempo de geração, ou seja, é o tempo médio de geração entre duas gerações
sucessivas
r: taxa intrínseca de crescimento natural ou simplesmente taxa de multiplicação
instantânea
l: taxa finita, ou seja, ao contrário da taxa instantânea, é o número de indivíduos
que se junta à população por unidade de tempo.
mx: número de nascimentos por fêmea
lx: probabilidade de se estar vivo na idade x.
As seguintes fórmulas permitem realizar esses cálculos
Tabela 2. Tabela de vida de Aphis fabae (Rabinovich, 1978) A pártir dessa tabela podemos
recalcular algumas colunas (4 e 5 colunas).
x (dias)
0.5
lx
1.000
mx
0
lx.mx
0
x.lx.mx
0
1.5
2.5
3.5
1.000
0.990
0.830
0
13.40
11.90
0
13.27
9.88
0
33.18
34.58
4.5
5.5
6.5
0.510
0.360
0.000
4.60
4.60
0.00
2.35
1.66
0.00
10.58
9.13
0.00
34.50
27.15
87.46
Totais
Ro = 27.15 fêmeas/geração.fêmea
Considerando os dados da tabela acima podemos então calcular os parâmetros básicos da
tabela de vida do inseto:
A determinação de Ro é também de fundamental importância em muitos estudos sobre produção
secundária já que a quantidade de biomassa produzida por unidade de tempo em uma população por
unidade de tempo pode ser calculada a partir dos dados de abundância, da taxa líquida de
crescimento (Ro) e do peso dos indivíduos.
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Panorama das Publicações na Limnologia Brasileira