SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA E CIENTÍFICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E
MATEMÁTICAS
FLÁVIO NAZARENO ARAUJO MESQUITA
AS DINÂMICAS PRAXEOLÓGICAS E COGNITIVAS E A
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DIDÁTICO DO PROFESSOR
DE MATEMÁTICA
Belém
2011
FLÁVIO NAZARENO ARAUJO MESQUITA
AS DINÂMICAS PRAXEOLÓGICAS E COGNITIVAS E A CONSTRUÇÃO DO
CONHECIMENTO DIDÁTICO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA
Trabalho apresentado ao Colegiado do Programa de PósGraduação em Educação em Ciências e Matemáticas da
Universidade Federal do Pará – Mestrado Acadêmico –
vinculado à Linha de pesquisa Formação de Professores,
como exigência para realização da defesa de mestrado.
Orientador: Prof. Dr. Renato Borges Guerra
Belém
2011
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) –
Biblioteca do IEMCI, UFPA
Mesquita, Flávio Nazareno Araújo.
As dinâmicas praxeológicas e cognitivas e a construção do
conhecimento didático do professor de matemática / Flávio Nazareno
Araújo Mesquita, orientador Prof. Dr. Renato Borges Guerra – 2011.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Pará,
Instituto de Educação Matemática e Científica, Programa de PósGraduação em Educação em Ciências e Matemáticas, Belém, 2011.
1. Professores de matemática – formação. 2. Matemática –
estudo e ensino. 3. Didática. I. Borges, Renato Guerra, orient. II.
Título.
CDD - 22. ed. 371.71
FLÁVIO NAZARENO ARAUJO MESQUITA
AS DINÂMICAS PRAXEOLÓGICAS E COGNITIVAS E A CONSTRUÇÃO DO
CONHECIMENTO DIDÁTICO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA
Trabalho apresentado ao Colegiado do Programa de PósGraduação em Educação em Ciências e Matemáticas da
Universidade Federal do Pará – Mestrado Acadêmico –
vinculado à Linha de pesquisa Formação de Professores,
como exigência para realização da defesa de mestrado.
Orientador: ___________________________________________________________
Prof. Dr. Renato Borges Guerra (UFPA)
1º Examinador: ________________________________________________________
Prof. Dr. Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)
2º Examinador: ________________________________________________________
Prof. Dr. Iran Abreu Mendes (UFRN)
AVALIADO EM: _____/_____/_____
CONCEITO:__________
À minha família e em especial às
minhas filhas Flávia Drielle e Lívia
Vitória, e a todos os professores
comprometidos com a formação de
melhor qualidade dos professores
que ensinam Matemática.
AGRADECIMENTOS
Durante o processo de seleção para o mestrado as pessoas mais próximas
perguntavam sobre a possibilidade de minha aprovação. A resposta que dava era
sempre a mesma: o maior risco que existe é o de ser aprovado. Esse “risco” se
justificava pelo fato da aprovação me tirar da “condição confortável” que vivia e me
colocar diante de um mundo novo, estranho, obscuro.
Assim, ao ingressar no curso tive que superar obstáculos que não seria
possível sem a colaboração de várias pessoas que fizeram e fazem parte do meu
convívio. Assim, esses agradecimentos são uma forma de expressar e eternizar
minha gratidão à minha querida mãe, Maria Amélia Araujo Mesquita, que esteve e
está sempre pronta para ajudar com seu amor e carinho. Ao meu pai, Godofredo
Gaspar Mesquita, que sempre esteve ajudando com suas palavras e gestos de
incentivo. A todos os meus irmãos (Socorro, Paulo, Gerci, Fábio, Cláudio, Moisés,
Amélia e Júnior) e todos meus sobrinhos e cunhados que de alguma forma
contribuíram nessa minha caminhada.
Às minhas filhas Flávia Drielle e Lívia Vitória, que são minha razão de
existência, e minha esposa Maria das Graças pelo companheirismo em todos os
momentos.
Ao meu orientador Renato Borges Guerra por sua contribuição decisiva na
idealização e conclusão deste trabalho.
A todos os professores do Programa pelas contribuições na minha formação.
Aos professores Tadeu Oliver Gonçalves e Luis Carlos Pais pelas valiosas
contribuições na qualificação.
Ao professor Iran Mendes pela sua colaboração decisiva para a realização da
defesa deste trabalho.
Aos colegas mestrandos e doutorandos do curso, em especial ao Denivaldo
Pantoja, à Patrícia Feitosa pelo companheirismo e todos do Grupo de Estudo de
Didática da Matemática pelo incentivo.
Aos funcionários do IEMCI, especialmente à Deyse e ao Eugênio pela
colaboração logística.
Para finalizar agradeço a Deus pela saúde e serenidade que tive para seguir
nesta caminhada.
RESUMO
Este trabalho é uma pesquisa narrativa autobiográfica que busca compreender de
que modo as praxeologias matemáticas por mim vivenciadas enquanto professor de
matemática e aluno de cursos de formação continuada podem contribuir, impedir, ou
mesmo serem neutras, na construção de uma nova praxeologia didática sobre a
fórmula de resolução de equações do 2º grau no ensino fundamental. Sob a luz da
teoria antropológica do didático, mais precisamente de sua dimensão cognitiva, são
exploradas as noções de dinâmica praxeológica e cognitiva de uma pessoa para
análise das duas fases da transposição didática interna, realizadas em uma turma
da quarta etapa da EJA. Os resultados apontam que o equipamento praxeológico e
o universo cognitivo relativos ao objeto matemático em questão contribuem para
construção de uma nova praxeologia matemática. Mas o jeito pontual de pensar e
fazer em sala de aula pode determinar as ações docentes e não permitir o fazer das
conexões entre os objetos matemáticos intencionados na primeira fase da
transposição didática interna sobre o objeto de estudo. Há, portanto, que se romper
com esse fazer cultural pontual docente e permitir renovar o equipamento
praxeológico e cognitivo do professor.
Palavras-chave: Teoria Antropológica do Didático. Equipamento Praxeológico.
Universo Cognitivo. Transposição Didática Interna.
ABSTRACT
This work is an autobiographical narrative research that seeks to understand how the
mathematical praxeology, experienced by me, as a math teacher and a student of
continuing education courses, can contribute, prevent, or even be neutral in the
building of a new didactic praxeology about solving equations of second degree in
elementary education. Under lightof anthropological theory didactic, more precisely of
its cognitive dimension, are explored notions of dynamic and praxeological a person
to analyze the two phases of internal didactic transposition, performed in a class of
fourth stage of the EJA. The results indicate that the equipment and the cognitive
universe praxeological for the mathematical object in question contribute to
buildingnew praxeology mathematics. But the way of thinking and doing occasional
classroom teachers can determine the actions and do not allow the connections
between mathematical objects intended in the first phase of the didactic transposition
of the internal object of study. There is, therefore, to break this cultural spot to allow
teachers and renew equipment and cognitive praxeological teacher.
Keywords: Anthropological Theory of Didactics. Equipment praxeology. Cognitive
Universe. Didactic Transposition Internal.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Os dois estágios da transposição didática interna
22
Figura 2 - Saberes articulados e integrados no texto do saber
68
Figura 3 - Malha retangular
79
Figura 4 - Retângulos e suas dimensões
79
Figura 5 - Resolução do Domingos
84
Figura 6 - Resolução da Cláudia (1)
87
Figura 7 - Resolução da Cláudia (2)
89
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Sumário do livro de 7ª série Praticando Matemática
37
Quadro 2 - Sumário do livro de 8ª série Praticando Matemática
37
Quadro 3 - Sumário do livro Matemática: uma aventura do pensamento da 7ª
série
41
Quadro 4 - Sumário do livro Matemática: uma aventura do pensamento da 8ª
série
41
Quadro 5 - Uma abordagem de equações do 2º grau no livro Praticando
Matemática
44
Quadro 6 - Uma construção da fórmula de resolução de equações do 2º grau no
livro Praticando Matemática
45
Quadro 7 - Resolução de equações do 2º grau completando quadrado no livro
Matemática: uma aventura do pensamento
48
Quadro 8 - Uma construção da fórmula de resolução da equação do 2º grau no
livro Matemática: uma aventura do pensamento
49
Quadro 9 - Sequência de conteúdos no livro Matemática para a EJA
56
Quadro 10 - Passos para resolução de equações do 2º grau no livro Matemática
para a EJA
57
Quadro 11 - Uma nova praxeologia acerca da fórmula de resolução de equação
do 2º grau
67
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
11
2 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
17
2.1 O ENFOQUE EPISTEMOLÓGICO DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA
17
2.2 A TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA INTERNA
19
2.3 A TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO
23
3 SOBRE A FORMAÇÃO DO MEU EQUIPAMENTO PRAXEOLÓGICO E
UNIVERSO COGNITIVO
31
3.1 AS MINHAS DIFICULDADES E OS SUCESSOS COM A MATEMÁTICA
ENQUANTO ALUNO DO ENSINO BÁSICO E O INÍCIO DE UMA PRÁTICA
DOCENTE
31
3.2 AS INFLUÊNCIAS SOBRE MINHA PRÁTICA DOCENTE INICIAL EM
SALA DE AULA
35
3.3 OS CURSOS DE APERFEIÇOAMENTO E PALESTRAS: REAFIRMANDO
UMA PRAXEOLOGIA
51
3.4 O INÍCIO DE MEU TRABALHO DOCENTE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS
E ADULTOS (EJA) E OS PROBLEMAS NO ENSINO PÚBLICO:
QUESTIONANDO A MINHA PRÁTICA
54
3.5 CONSTRUINDO NOVAS PRAXEOLOGIAS A PARTIR DO CURSO DE
ESPECIALIZAÇÃO
58
3.6 NOVA RELAÇÃO COM O SABER: REFORMULANDO
PRAXEOLOGIA DURANTE O CURSO DE MESTRADO
62
UMA
4 A PRÁTICA DOCENTE SOB UMA “NOVA PERSPECTIVA” – A
REALIZAÇÃO DO TEXTO DO SABER EM SALA DE AULA
73
4.1 AS FASES DA MINHA AÇÃO DOCENTE EM SALA DE AULA: O TEXTO
DO SABER POSTO EM AÇÃO
73
4.2 REFLEXÕES SOBRE A AÇÃO EM SALA
90
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
94
REFERÊNCIAS
99
APÊNDICES
102
11
1 INTRODUÇÃO
1.1 O PERCURSO DA PRÁTICA DOCENTE COMO OBJETO DE PESQUISA E A
DEFINIÇÃO DA METODOLOGIA
No transcurso de minha vida como professor, em alguns momentos, ora
sentia que o meu trabalho docente nas escolas estava indo bem, pois havia turmas,
alunos, diretores que se mostravam satisfeitos e ora sentia não estar satisfatório
pelos resultados negativos como o alto índice de reprovação de alunos,
principalmente no ensino fundamental da escola pública, ou a crescente e gradativa
quantidade de alunos sem interesse em assistir aulas.
Diante de problemas desse tipo, assumindo ser o detentor maior do
conhecimento da Matemática na sala de aula, com a presunção de que não
precisava aprender mais nada, imputava aos alunos todas as mazelas relacionadas
à aprendizagem. Assim, construía discursos que faziam com que aqueles que
tinham dificuldades com a matemática que eu lecionava imputassem sempre para si
a culpa por seus fracassos. Falas do tipo: Não sou professor que falta ao trabalho e
sempre dou todo o conteúdo bem explicado e com bastantes exercícios; só cai na
prova e nos testes o conteúdo que foi trabalhado em sala de aula e do mesmo jeito
que foram exercitados sempre estavam prontos para serem verbalizadas.
No entanto, a recorrência a discursos desses tipos, após algum tempo, já não
se mostrava suficiente para justificar a falta de interesse que se acentuava cada vez
mais pelos alunos, principalmente do ensino fundamental. Isso me fez pensar que
algo poderia estar inadequado na minha prática docente ou que esta poderia estar
obsoleta e me conduziu a buscar alternativas para mudar essa situação.
Uma das alternativas foi a busca por formação continuada que se deu
inicialmente por meio de cursos aperfeiçoamento que deram maior ênfase em
conteúdos matemáticos que ainda não atenderiam minhas expectativas. As
problemáticas postas acima acabaram me conduzindo à especialização em
educação matemática e ao mestrado na mesma área, sempre em busca de
encontrar respostas para atender minhas inquietudes no ensino.
Na especialização, tive o primeiro contato com as tendências em educação
matemática, e em especial com etnomatemática e a modelagem matemática que, de
12
um modo geral, trouxeram consequências para minha prática docente, pois
influenciaram
numa
considerável
mudança,
principalmente
nos
aspectos
motivacionais nas minhas ações em sala de aula. O contato que tive com os saberes
dessas áreas me incentivou a um ensino de matemática buscando contextos como o
cotidiano, o cultural, o social, entre outros, em que os alunos pudessem observar a
importância da disciplina matemática.
No curso de mestrado, fazendo parte do Grupo de Didática da Matemática,
tive interesse despertado a respeito do porquê de fórmulas e algoritmos no ensino
de matemática na leitura e estudo do trabalho de Guerra e Silva (2006, 2009). Esses
textos me ofereceram um pensar a respeito de tais objetos, em especial sobre a
fórmula de resolução de equações do 2º grau como articulações de outros objetos
matemáticos (SILVA; GUERRA, 2009): operações entre polinômios, produtos
notáveis, fatoração dos trinômios do 2º grau com uma variável, sistemas de
equações do 1º grau com duas equações e duas variáveis e ainda o teorema
fundamental da álgebra, embora este último objeto matemático citado não esteja
presente explicitamente no ensino fundamental.
Um objeto matemático, a fórmula de resolução da equação do segundo grau,
passa a ser visto como um ente transacional, que acontece de fato quando o
relacionamos a outros objetos matemáticos do passado e futuro, com essa
intencionalidade de fazê-lo acontecer.
Isso me levou a compreender que as críticas a respeito do uso de fórmulas e
algoritmos em matemática citadas por vários autores (BARALDI, 1999; MEDEIROS,
1999; CHAGAS, 2005), no sentido pela forma como são usadas, geralmente, sem
nexo no ensino de Matemática, como instrumentos de um ensino meramente
mecânico, já não cabia e apontava para uma possibilidade de criar respostas para
minhas inquietudes à medida que o saber matemático parece sempre novo e isso de
algum modo me parece ser instigante de modo a manter o interesse do sujeito que
estuda.
Esse olhar vai se ratificar com as minhas leituras dos textos sobre a
transposição didática de Chevallard (2005), que trata da reconstrução do objeto
matemático para o ensino, na sua transposição do saber sábio para o saber a ser
ensinado em que se destaca o caráter de transacionalidade dos objetos
13
matemáticos de ensino, e de Garcia et al. (2006) que trata do problema da
desconexão de saberes matemáticos na escola. Todas essas leituras foram
apoiadas por uma compreensão maior da Teoria Antropológica do Didático (TAD) de
Chevallard
(1999)
que
descreve
o
fazer
matemático
como
praxeologias
desenvolvidas no seio de instituições que impõem as relações entre os sujeitos
dessas instituições e os objetos matemáticos que nelas vivem.
Segundo Chevallard (2009), sob o quadro da TAD, uma pessoa é o resultante
de seu passado e presente de sujeições institucionais de modo que o conhecimento
de uma pessoa em diacronia pode ser imaginado como o fazer da história da pessoa
como sujeito por meio da crônica de suas sujeições e contra sujeições. Ele
considera todas as praxeologias que a pessoa dispõe, o equipamento praxeológico
da pessoa, para destacar que, assim como há uma história da pessoa como sujeito,
existe uma dinâmica cognitiva, em que alguns objetos desaparecem do universo
cognitivo da pessoa, enquanto outros aparecem, e em correspondência há uma
dinâmica praxeológica em que o equipamento praxeológico da pessoa muda, no
sentido de que algumas partes deste equipamento perdem suas características de
operação, enquanto outras partes são remodeladas e que novos elementos são
adicionados ao longo do tempo.
A partir dessa ótica, despertou-me a transposição didática interna, um dos
estágios no processo da transposição didática, que sobremaneira revela o papel da
relação pessoal do professor com o objeto matemático de interesse nesse estágio
do processo da transposição didática. Chevallard (2005) e Ravel (2003) enfatizam
as singularidades da atuação do professor nessa fase do processo de transposição,
apontando o professor como sujeito fundamental na (re)construção final do saber a
ser ensinado que, mesmo sob o assujeitamento institucional, cria sua versão sobre o
objeto matemático a ser ensinado numa dinâmica de movimentos do conjunto de
relações pessoais e das praxeologias disponíveis em seu equipamento praxeológico
de modo único e singular que é só seu - a pessoa, para a elaboração de seu texto
do saber eminente a ser ensinado. Meu despertar se justifica à medida que a
construção de uma praxeologia, ou uso de uma nova praxeologia, por uma pessoa
em uma instituição supõe uma dinâmica cognitiva e praxeológica que resulta da
operação de adequação de novas sujeições para a pessoa, o que implica um
trabalho de identificar e tratar os conflitos relacionados com o choque das novas
14
sujeições com as sujeições anteriores, quando as primeiras são experimentadas
pela pessoa como incompatíveis com a sua identidade.
Esse pensar encaminhou novas compreensões sobre minhas inquietudes,
pois pude assim pensar a respeito do aluno em suas sujeições, mas isso encaminha
para minha posição inicial que imputava aos alunos a falta de interesse nos estudos.
Assim, reformulei minha questão de pesquisa me assumindo como o foco da
pesquisa, no sentido de considerar as múltiplas sujeições que vivi e ainda vivo
enquanto sujeito nas instituições, considerando as posições que nelas ocupo e as
relações pessoais com a fórmula de resolução da equação do segundo grau.
À luz desse entendimento, assumo o problema posto por Chevallard (2009)
que se espera que o equipamento praxeológico e, correletivamente, o universo
cognitivo da pessoa mude de alguma maneira, e nós queremos saber o que no
equipamento praxeológico ou no universo cognitivo da pessoa pode: apoiar a
mudança, interfirir ou ser neutro sobre ela? Isso referente à fórmula de resolução da
equação do segundo grau, mais especificamente quanto ao uso de uma praxeologia
presente no texto de Silva e Guerra (2009) acerca desse objeto matemático
inspirada na organização matemática do ensino superior de Queysanne e Delachet
(1964), sem perder de vista que:
Algumas mudanças desejadas não são obtidas, pois não podemos
produzir um remodelamento adequado da relação a tal ou tal objeto
sensível. Qualquer alteração a este respeito, é uma remodelação da
pessoa e não é sem custo - apesar do ganho esperado
(CHEVALLARD, 2009, p. 7, tradução nossa).
Seguindo nesse pensar, busco contrapor minhas sujeições umas contras as
outras, questionando as relações a esse objeto matemático nas diversas instituições
em que atuei e atuo, pensando na realização do texto do saber anterior à ação em
sala de aula, até a culminância em sala de aula, a partir de reflexões sobre um aluno
hipotético frente ao texto do saber produzido pelo professor e como isso contribuiu
para a construção do meu conhecimento didático, no sentido da (re)construção do
universo cognitivo e do equipamento praxeológico.
Para tanto, busco em minhas memórias as praxeologias sobre a fórmula de
resolução da equação do segundo grau que vivi e ainda vivo nas diferentes
15
instituições em que estive e estou inserido, pois “em geral, nossas relações
"pessoais" são frutos de nossa história de submissões institucionais passada e
presente” (CHEVALLARD, 2009, p. 3, tradução nossa), de como me tornei professor
e como foi se construindo minha prática docente que marca minhas relações
pessoais com o saber matemático, em especial com o objeto matemático
supracitado.
Assumo, assim, o trabalho investigativo a partir de narrativas de minhas
lembranças sobre as praxeologias realizadas em diferentes instituições em que
estou e estive inserido, com seus jeitos próprios de fazer e pensar que vivem em
minhas memórias , e, nesse sentido, “ é válido pensar em termos pluralistas sobre o
uso da memória por diferentes grupos sociais, que devem ter diferentes visões do
que é importante ou memorável” (BURKE, 2000 apud MIGUEL; MENDES, 2010, p.
84) pois isso pode revelar as imposições institucionais que amalgam meu fazer
docente e com isso alcançar meu o objetivo de (re)construir o equipamento
praxeológico e o universo cognitivo de minha pessoa, sem perder de vista que:
As narrativas constituem as expressões de uma realidade que é do
sujeito, não sendo tomadas como uma representação fidedigna de
um contexto histórico, mas como o universo de significação social
que é subjetivamente real para ele. Ou seja, quando uma pessoa
relata os acontecimentos vividos, percebe-se que reconstrói sua
trajetória atribuindo-lhe novos significados (PAIXÃO, 2008, p. 47).
Assim, em acordo que “a narrativa autobiográfica não compreende a verdade
literal dos acontecimentos, mas, antes, uma representação que deles faz o sujeito”
(CUNHA, 1997, p. 3) e que, segundo Chevallard (2009), a relação pessoal a um
objeto emerge de uma pluralidade de relações institucionais e que, portanto, nunca é
perfeitamente conforme com as relações institucionais, ou seja, a pessoa quase
sempre, em certa medida, tem uma relação não conforme com as instituições pois a
sua relação pessoal a um objeto é formada pela integração ao longo do tempo de
diferentes relações institucionais em que se sujeitou, penso ser, nesse sentido,
factível encontrar minhas respostas aos questionamentos postos; o que me leva
espontaneamente a assumir a narrativa autobiográfica, de forma a reconstituir
episódios de minha vida enquanto professor, como pessoa que ocupa seu lugar nas
instituições, de minhas relações pessoais que foram se construindo e se
16
reconstruindo como consequências das várias relações institucionais decorrentes de
diferentes sujeições que vivo e vivi.
1.2 A ESTRUTURA DO TEXTO
Na sequência do texto, o capítulo 2 intitulado Pressupostos teóricos traz a
transposição didática interna e a teoria antropológica do didático que são os
alicerces da pesquisa.
No capítulo 3 que tem como título Sobre a formação do meu equipamento
praxeológico e universo cognitivo trago as narrativas de minhas lembranças de
passados distantes e recentes das praxeologias por mim assumidas nas (das)
instituições acerca da fórmula resolução de equações do segundo grau, e como foi
se construindo o equipamento praxeológico e universo cognitivo de minha pessoa a
partir das relações pessoais com esse objeto matemático ao longo de minha
formação docente e as tensões ao por em confronto assujeitamentos procedentes
de diferentes instituições. Neste capítulo é exibida uma nova praxeologia
matemática acerca da fórmula de resolução de equações do segundo grau
construída anteriormente à praxeologia didática em sala de aula.
No capítulo 4 A prática docente sob uma “nova perspectiva” – a realização do
texto do saber em sala de aula é exibida uma “nova” praxeologia didática realizada
em sala de aula acerca da resolução de equações do segundo grau considerando
uma nova relação pessoal com esse objeto matemático.
Nas considerações finais faço uma síntese do movimento da pesquisa e
comentários sobre as análises feitas acerca das dinâmicas praxeológicas e
cognitivas.
17
2 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Nas leituras, nas disciplinas e nos debates realizados no grupo de estudo de
Didática da Matemática no decorrer do curso de mestrado, fui aos poucos
percebendo a importância da relação do professor com o saber para que esse possa
elaborar organizações matemáticas e didáticas com intencionalidade voltada para as
articulações e integrações de objetos matemáticos . Assim, apresento elementos
constituintes das teorias estudadas nesses encontros como subsídios para alcançar
os objetivos presentes neste trabalho.
2.1 O ENFOQUE EPISTEMOLÓGICO DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA
Segundo Bosch e Chevallard (1999), a busca de respostas provisórias a
questionamentos - por que ensinar Matemática na escola? Qual a razão de ser de
certos conteúdos matemáticos? Qual o foco do problema do ensino e da
aprendizagem de matemática? No professor? Na Matemática? Nos alunos? Ou nas
instituições? - levou muitos pesquisadores a focar tais elementos de forma
dissociada. De forma geral, a Matemática continha uma blindagem em que ela não
estava como o foco principal das pesquisas.
A Didática da Matemática, na perspectiva de Bosch e Chevallard (1999), não
se fundamenta em projetos de estudos científicos em torno dos problemas de ensino
e aprendizagem da Matemática, ou seja, no sujeito que aprende ou que ensina
Matemática, mas em tomar como objeto fundamental de estudo o fazer matemático
que tais sujeitos são conduzidos a estudar em conjunto. Dessa forma, o foco da
Didática da Matemática está na própria Matemática e a relação dos sujeitos com
objetos de natureza matemática.
Bosch e Chevallard (1999, p. 2, grifos no original) afirmam que “a abordagem
clássica, com relação a essa questão, estudava problemas de transmissão e de
aquisição de noções matemáticas supostamente dadas”, onde tais noções eram
invisíveis e não problematizadas, ou seja, as respostas eram inquestionáveis. As
dimensões cognitivas e matemáticas eram percebidas como duas faces opostas de
uma moeda, sendo que uma dessas faces não havia nada a ser estudado, no caso a
18
Matemática, e na outra face, os sujeitos que se relacionam com ela e que eram os
alvos nas pesquisas.
A Teoria das Situações Didáticas (TSD) rompe com esse paradigma ao
colocar o aspecto matemático como a essência dos fenômenos didáticos.
E a
elaboração de uma ciência de estudo desses fenômenos conduz a mostrar os
modelos utilizados para submetê-los às leis de uma epistemologia experimental.
(BOSCH; CHEVALLAR, 1999).
A TSD foca seu estudo nos sujeitos em situação e num determinado meio e
postula que um conhecimento é uma situação, criando dessa forma um modelo geral
de Matemática segundo o qual os conhecimentos matemáticos podem ser descritos
com base em situações fundamentais, dentro dos seus devidos contextos. Isso
remete a uma nova ruptura com a abordagem clássica no momento em que a TSD
supõe que os conhecimentos matemáticos podem ser aprendidos somente através
das atividades que esses conhecimentos permitem realizar e, portanto, através dos
problemas que permitam resolver. (BOSCH; CHEVALLAR, 1999).
Segundo Almouloud (2007, p. 32) “o objeto central de estudo nessa teoria não
é o sujeito cognitivo, mas a situação didática na qual são identificadas as interações
estabelecidas entre professor, aluno e saber”. Sendo assim, o foco de estudo deixa
de ser somente um desses elementos em separado e volta-se para eles dentro de
um determinado meio. Dessa forma, a TSD apóia-se em três hipóteses: o aluno
aprende adaptando-se a um meio que é fator de dificuldades e de desequilíbrios; o
meio precisa ser munido de intenções didáticas por parte do professor para
promover a aprendizagem matemática criando situações; o meio e as situações
devem relacionar os saberes matemáticos de forma enfática (ALMOULOUD, 2007).
Assim,
A Matemática não é somente um sistema de conceitos logicamente
consistente que se produz de demonstrações: ela é, em primeiro
lugar, uma atividade que se realiza em uma dada situação e contra
um meio. Além disso, trata-se de uma atividade estruturada da qual é
possível destacar diferentes fases: ação, formulação e validação, às
quais se acrescentam a devolução e a institucionalização (BOSCH;
CHEVALLAR, 1999, p. 3, tradução nossa).
19
Nesse sentido, Bosch e Chevallard (1999, p.3) firmam que
A noção de transposição didática deve ser interpretada como uma
noção que permite uma leitura dessa dupla ruptura epistemológica
provocada pela teoria das situações. Visto que sua contribuição
principal não foi somente evidenciar a distância que separa o saber
acadêmico do saber ensinado e, portanto, as transformações
necessárias que deve ser submetido todo objeto matemático para
poder ser ensinado.
Assim, a noção de transposição didática, para esses autores, mostra que o
saber matemático está na origem de todos os problemas didáticos.
2.2 A TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA INTERNA
A
Transposição
Didática
proposta
por
Chevallard
(2005)
apoiado
principalmente na teoria das situações didáticas, pautou-se no “propósito de fazer
uma análise epistemológica do saber do ponto de vista didático essencialmente em
termos de objetos do saber” (ALMOULOUD, 2007, p. 113, grifos no original).
Para
Chevallard
(2005)
a
transposição
didática
é
o
conjunto
de
transformações adaptativas que tornam um objeto de saber a ensinar num objeto de
ensino. Objeto esse definido previamente como saber a ensinar. Este processo de
“condução” do saber é feito em etapas e se dá, fundamentalmente, sob a
responsabilidade de instituições, que Chevallard (2005) inicialmente as intitula de
noosfera, das quais fazem parte cientistas, professores, especialistas, políticos,
autores de livros e outros agentes da educação.
Para Chevallard (2005), noosfera é o entorno do sistema didático, sistema
esse que se constitui de aluno-professor-saber e suas relações. São as instituições
que compõem a noosfera que farão a seleção de elementos de conhecimento do
saber que é assim designado como "saber a ensinar" que são então submetidas ao
trabalho de execução. São tais instituições que irão assumir
A parte visível do trabalho transpositivo, no qual podemos chamar o
trabalho externo da transposição didática, em oposição ao trabalho
interno, que se realiza no interior mesmo do sistema de ensino,
bastante depois do lançamento oficial de novos elementos do saber
ensinado. (CHEVALLARD, 2005, p. 36).
20
Dessa forma, o saber a ser ensinado passa por um processo de adaptação
até se transformar em saber ensinado. Nesse sentido, o saber ganha uma dinâmica
e deixa de ser algo rígido no processo de estudo, uma vez que, segundo Leite
(2004), Chevallard considera que o enfoque psicológico restringia sua análise à
relação professor-aluno. Assim,
A teoria da transposição didática pretende desestabilizar esse
entendimento, expondo enfaticamente a necessária distância entre o
saber ensinado e seus saberes de referência. Mais do que isso,
propõe-se a pensar o sistema didático a partir dessa dimensão, com
base na abordagem epistemológica do saber ensinado (LEITE, 2004,
p. 51).
Isso conduz a reflexões acerca do saber a ensinar na medida em que expõe
que o que está posto nos programas escolares não necessariamente é o que está
nas obras matemáticas de referência da academia, pois as obras da matemática
escolar são reconstruções sob condições de viabilizar o ensino e, portanto, sob
condições distintas das obras matemáticas originais. Além disso, para Chevallard,
Bosch e Gascón (2001), esse efeito é variável, pois a transposição didática continua
dentro do sistema didático com a denominação de transposição didática interna.
Lins, Lima e Menezes (2010, p. 119), apoiados em Chevallard (1991), afirmam que
A transposição didática interna é o passo final da transposição
sofrida pelo saber científico, é aquele que acontece intramuros da
sala de aula, cujos parceiros envolvidos são o professor e o(s)
aluno(s), e que tem no professor o elemento humano responsável
por tal transposição.
No entanto, coaduno com Ravel (2003) que considera também a etapa
anterior à sala de aula, quando este pensa no momento de preparação do texto do
saber corporificado nas notas de aulas, o projeto de curso do professor.
Ravel (2003, p. 3, tradução nossa) busca construir inicialmente sua
compreensão destacando que
Se um observador curioso abrir as portas de salas diferentes e
observa vários professores a palestrar sobre o mesmo objeto
matemático em um dado nível de ensino, é provável que, no fechar
das portas, ele não sinta que observou exatamente o mesmo objeto
matemático em todas as classes. E se esse mesmo observador, para
21
tentar explicar esse fenômeno, consultar o currículo, a primeira
referência em que os professores são obrigados para construir os
seus cursos, também pode ser surpreendido que haja uma
discrepância entre o objeto matemático no programa e o que foi
observado em sala de aula.
Assim, me concentro na investigação do processo da transposição didática
interna, ou seja, na passagem do saber a ser ensinado ao saber ensinado em sala
de aula realmente, isto é, o que cada professor apresenta aos alunos de forma
eficaz.
Asarc (1989 apud RAVEL, 2003, tradução nossa), buscou precisar a idéia de
Chevallard (1991), mais precisamente, de que "o conteúdo do conhecimento
designado como a ser ensinado explicitamente nos programas e implicitamente,
através da tradição, evolui da interpretação dos programas” (CHEVALLARD, 1991,
p. 39), afirmando que
Retornando imediatamente sobre o conceito de saber a ser
ensinado, este não pode ser reduzido ao final do programa. Temos
observado o fato de que o texto do programa apela por uma
interpretação. O saber a ensinar é aquele aos quais os professores
acham que tem que ensinar, quando os livros publicados, os anais, e
os hábitos, definem acerca da interpretação do programa (ASARC,
1989 apud RAVEL, 2003, p. 4, tradução nossa).
Nesse sentido, a transposição didática interna não é apenas mais um estágio
da transposição didática, pois aponta para a importância do papel do professor no
processo de transposição. O papel do professor na transposição didática interna não
se restringe apenas à ação em sala de aula, uma vez que nesse processo pertence
a ele a responsabilidade da "preparação" do texto do saber para ensinar o saber que
deve ser ensinado; na preparação da “cartilha didática”, termo emprestado de
Chevallard (1991), que vem do verbo vestir, o que significa "tornar pronto, colocar
em estado de uso eminente" (LE PETIT ROBERT, 2000 apud RAVEL, 2003, p. 4,
tradução nossa).
O papel estratégico do professor no processo de transposição didática interna
é revelado ainda quando Chevallard, Bosch e Gascón (2001, p. 128, grifos no
original), ao tratar do problema do currículo, afirmam que
22
O ponto de vista da didática propõe que o problema da elaboração
do currículo, que tradicionalmente havia sido considerado como um
problema essencialmente psicopedagógico, tem um componente
matemático essencial. Não se trata unicamente de um problema de
seqüenciar e temporizar os conteúdos do currículo, mas de realizar
um trabalho matemático de reorganização dos elementos técnicos,
tecnológicos e teóricos que compõe cada obra com base nas
questões a que esta responde. Trata-se, realmente, de uma
verdadeira reconstrução criativa das obras que fazem parte do
currículo.
Tal reconstrução criativa a que se referem esses autores exige analisar
diversas organizações matemáticas que poderiam fazer parte da obra designada no
currículo e as diferentes atividades matemáticas concretas de modo a atender a
(re)construções segundo a intencionalidade do professor de integrar o currículo, por
exemplo.
Assim, a preparação do texto de saber que, segundo Chevallard (2005), não
está exposto em nenhum lugar e que nesse estágio da transposição didática, o
professor faz uso da ficção de liberdade que lhe cabe para a preparação de sua
aula; do seu momento íntimo frente ao saber, nos parece claro como um estágio ou
fase da transposição interna, o estágio anterior à ação em sala de aula. A Figura 1
esquematiza o que assumo com Ravel (2003) como transposição didática interna.
Figura 1 - Os dois estágios da transposição didática interna
Saber acadêmico
Transposição didática
interna
Saber a ensinar
(Cartilha) (Projeto de curso)
“(Cartilha) do texto
do saber”
(projeto de curso)
Saber ensinado
Fonte: Ravel (2003, p. 6)
23
Ravel (2003) assume em seu trabalho dois estágios na transposição interna:
os estágios da preparação do texto do saber (projeto de curso) e do saber ensinado
que se dá na sala de aula pelo professor.
Assumindo que a preparação do curso ou do plano da aula sobre um
determinado objeto matemático pelo professor é co-determinada pela relação que
este venha a ter com o objeto e pelas praxeologias que este utiliza nas instituições,
ou ainda, como diz Pais (2008, p. 14)
A utilidade do saber permite ao sujeito um referencial de análise
capaz de lhe proporcionar um olhar mais amplo e indagador. É
exatamente essa possibilidade de transformação que permite uma
espécie de transposição interna do saber sobre seu próprio campo
epistemológico. Em suma, quando o sujeito passa a ter um relativo
domínio sobre um saber, torna-se possível desencadear uma prática
transformadora e geradora de novos saberes.
Em busca de melhor compreender o “relativo domínio do saber” me
encaminhou a teoria antropológica do didático na forma explorada por Chevallard
(2009) que revela sobremaneira o papel do professor frente à TAD.
2.3 A TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO
O estudo da Teoria Antropológica do Didático (TAD) no grupo de Didática da
Matemática do Instituto de Educação Matemática e Científica (IEMCI) da
Universidade Federal do Pará (UFPA) levou-me a refletir acerca de minhas ações
docentes antes e após minha conscientização a respeito da relação pessoal com o
saber matemático.
A TAD a partir de noções fundamentais se propõe a modelar as práticas
docentes de professores de Matemática nas instituições e ofereceu-me a clareza do
momento da transposição didática interna na construção de uma praxeologia
matemática e a relação desse fazer com a dinâmica cognitiva e praxeológica que
pode estar envolvida nesse processo. Assim, passo a expor os elementos da TAD
que fundamentam este trabalho.
A partir de Chevallard (2009), considero as noções de universo cognitivo,
equipamento praxeológico e as respectivas dinâmicas cognitivas e praxeológicas
24
que me deram suporte para desenvolver este trabalho. Tais noções requerem que
tratemos das quatro noções fundamentais da TAD que fundamentam as noções
inicialmente citadas: de objeto, de relação pessoal a um objeto, de pessoa e de
instituição.
Um objeto, segundo Chevallard (2009, p.1, tradução nossa), é
Qualquer entidade, tangível ou intangível, na existência para pelo
menos um indivíduo. Então, tudo é objeto, incluindo pessoas. Os
objetos são, assim, o número sete, e ainda o número 7, a noção do
pai como um jovem pai que leva seu filho, ou a idéia de
perseverança (ou coragem, força, etc.), e conceito matemático de
derivadas, e também o símbolo ∂, etc. Em particular, qualquer
trabalho que seja, qualquer produto da atividade humana intencional,
é um objeto.
A segunda noção fundamental é a de relação pessoal de um indivíduo x a um
objeto o, que Chevallard (2009) denota por R (x; o), expressão que significa “todas
as interações que x pode ter com o objeto o - que x manipule, utilize, fale, sonhe,
etc” (p. 1, tradução nossa).
A terceira noção fundamental é a de pessoa. Pessoa é o par formado por um
indivíduo x e o sistema de relações pessoais R (x, o), em algum momento na história
de x. Sobre a palavra pessoa, Chevallard (2009) assume que não deve ser
confundida com indivíduo. Cada indivíduo é uma pessoa, mas a pessoa varia de
acordo com as relações do indivíduo x com um objeto o. Tais relações evoluem, pois
um objeto que não existia para x passa a existir, ou sua relação muda. Nesta
evolução, a invariante é o indivíduo, que está mudando é a pessoa.
Quando me refiro a uma nova relação com o objeto matemático o faço em
relação a esta mudança que Chevallard (2009) anuncia. Mesmo que a minha pessoa
como indivíduo não mude, uma vez que cada indivíduo é único, minha pessoa se
(re)forma constantemente de acordo com as relações pessoais que vou
desenvolvendo com um objeto matemático nas instituições.
Nesse ponto, das relações de uma pessoa com um objeto, Chevallard (2009)
apresenta o universo cognitivo de uma pessoa como o conjunto das relações
pessoais de x com um objeto o, em correspondência com o objeto o. Ele simboliza
da seguinte forma
25
UC(x) = { (o, R(x ; o)) / R(x ; o)
}
Segundo Chevallard (2009), o termo cognitivo não deve ser entendido em sua
corrente intelectualista. Ele cita exemplos, tais como as relações pessoais que um
indivíduo tem com sua escova de dentes, o pedal de freio do seu carro, de onde
segue, em meu pensar, a minha relação pessoal com fórmula da equação do 2º
grau, ou seja, como manipulo, uso, ensino ou mesmo os modos que não ensino.
Essa relação pessoal com um dado objeto matemático é construida por meio
das instituições onde esses objetos vivem e onde fui apresentado a ele quando
passei a assumir um papel nessas instituições, como aluno, professor, por exemplo,
assumindo, em cada caso, jeitos próprios de fazer e pensar. Isso conduz à quarta
noção fundamental, a de Instituiução.
Chevallard (2009) a introduz para explicar a formação e evolução do universo
cognitivo de uma pessoa x. Dessa forma
Uma instituição I que é um bem social "total", o que certamente pode
ser uma parte muito pequena no espaço social (há "microinstituições”), mas permite - e impõe - para seus sujeitos, isto é para
as pessoas x que venham para ocupar diferentes posições p
disponíveis em I, a participação das maneiras de pensar e agir
próprios de I - isto é, praxeologías. O ambiente de sala de aula é
uma instituição (incluindo os dois cargos-chave que são os de
professor e aluno) (CHEVALLARD, 2009, p. 2, tradução nossa).
Assim, desde o nascimento, cada indivíduo é assujeitado a várias instituições,
tais como a sua família, a linguagem etc. Na medida em que é sujeito de uma
multiplicidade de instituições do passado e presente, é que o indivíduo se constitui
em uma pessoa, pois sempre que se torna sujeito de uma instituição em uma dada
posição, o indivíduo já é uma pessoa com um certo universo cognitivo, mas irá
subjugar-se às relações institucionais, que irão reformular suas relações pessoais:
se o objeto existe para os sujeitos da instituição em posição p, a relação pessoal
dele ao objeto, R (x; o), tendem a se parecer com a relação institucional, RI (p; o), a
menos que x revele-se, a este respeito, em não conformidade com I. Assim, em
geral, “nossas relações "pessoais" são frutos de nossa história de submissões
institucionais do passado e presente” (CHEVALLARD, 2009, p. 3). Nessa dinâmica
cognitiva se constitui e evolui o universo cognitivo da pessoa.
26
No entanto, embora a relação pessoal com um objeto seja fruto de seus
assujeitamentos passados e presentes, a relação da pessoa x ao objeto o, R(x, o),
em geral não está em conformidade plena com a relação institucional, RI(p,o), mas
seu universo cognitivo tende a evoluir ao fazer parte da instituição I, pois suas
relações se reformulam. Por outro lado, uma instituição I não existe sem os sujeitos,
pois estes é que fazem com que ela viva, às vezes mudando seu estilo de vida. De
outro modo, essa dialética é fundamental para a vida das instituições.
O fato de que a relação pessoal R(x; o) está a emergir de uma
pluralidade de relações institucionais RI(p ; o), RI’(p’ ; o), RI”(p” ; o)
tem várias consequências notáveis. Em particular, a relação pessoal
R(x; o) nunca é perfeitamente coerente com tais relações RI(p ; o):
uma pessoa x quase sempre, em certa medida, não esta em
conformidade a I, porque a sua relação é formada pela integração ao
longo do tempo das diferentes relações institucionais de que ela tem
sido sujeito - RI(p ; o), RI’(p’ ; o), RI”(p” ; o), etc. Inversamente, R(x ;
o) quase nunca é realmente original na medida em que é um reflexo,
ou alterações mais ou menos das relações institucionais que
influenciaram a formação da pessoa x. Por outro lado, é
precisamente a sua capacidade de desenvolver relações pessoais
institucionalmente inéditas que reconhecemos os criadores no
sentido forte do termo [...] (CHEVALLARD, 2009, p. 3, tradução
nossa).
Assim a conformidade plena a uma instituição pode ser uma desvantagem na
medida em que impediria a pessoa engendrar novas relações e privaria relações
pessoais inéditas. Mas Chevallard (2009), a esse respeito, nos chama atenção que a
multiplicidade de nossa sujeição é, no entanto, a fonte de nosso sentimento de
liberdade das instituições, pois constantemente, para testar ou exercer nossa
liberdade, nós jogamos uma sujeição contra as outras, sem apartes, e assim
sacudimos o “domínio” das instituições sobre nós. E em seguida afirma que em
última análise, para nos liberarmos, criamos uma nova sujeição, voluntariamente,
como faz o cientista que cria uma nova teoria para, em seu assujeitamento, se
descondicionar das maneiras de pensar e fazer que o impedisse ou limitavam.
Os confrontos de assujeitamentos são traduzidos por confrontos dos
mecanismos de assujeitamentos, as maneiras próprias de agir e pensar, nas
atividades próprias da instituição, ou melhor, nas atividades da instituição em que os
sujeitos da instituição em posição p têm que participar. As praxeologías em que os
sujeitos da instituição são os atores que as têm que implementar.
27
Nesse pensar, a noção de praxeologia é o cerne da TAD e, segundo
Chevallard (2009), generaliza diferentes noções culturais correntes - aquelas do
saber e do saber-fazer, de habilidade, uma palavra genérica para "uma habilidade
que é adquirida por treinamento”. A TAD deve ajudar a identificar, sem afetação
epistemológico-cultural, sem julgamento de valor a priori ou a posteriori, de toda
estrutura de conhecimento possível.
Segundo Chevallard (2009), um aspecto crucial do conceito de praxeologia é
o seguinte: numa perspectiva antropológica, não há prática que não seja
acompanhada por um saber, embora desde a posição institucional ocupada por um
observador (praxeologias do professor diante das praxeologias dos estudantes,
pesquisadores frente às praxeologias de professores, os burgueses perante
praxeologias dos proletários etc.), a parte tecnológica- teórica parece estar faltando,
porque ela não é visível (ou mal visível). Portanto,
A estrutura praxeológica mais simples, que se poderia chamar de
"atômico", mas na verdade é chamado de "pontual", consiste em um
tipo de tarefas T, uma técnica t, a maneira de realizar as tarefas de
tipo T que constitui a tecnologia da técnica, fundamentada por um
discurso (logos) sobre a técnica (tekhne). Tal discurso supõe tornar a
técnica inteligível e como um meio para realizar as tarefas do tipo T.
E, finalmente, (a última, mas não menos importante) uma
componente teórica , que regula a tecnologia em si (e, portanto,
todos os componentes da praxeologia). Uma praxeologia pontual
("ponto" aqui é o tipo de tarefas T) é denotada por [T
]. Ele
comporta uma parte prático-técnica = [T / ], ou práxis (que pode
nomear-se por "saber fazer") e um técnico-teórico = [
], ou logos
(que pode identificar-se como um "saber" no sentido usual da
palavra) (CHEVALLARD, 2009, p. 4, tradução nossa).
Mesmo diante da possível não clareza da pessoa sobre a parte tecnológicoteórico das praxeologias que são adquiridas por seus assujeitamentos as diferentes
instituições em diferentes posições ou não, segundo Chevallard (2009), a pessoa
passa a ser dotada de um equipamento praxeológico, EP(x). De outro modo, quando
a pessoa passa a ocupar um lugar em uma instituição, ela dispõe ou está equipada
de um conjunto de praxeologias, mesmo que não possa atualizar tal ou tal
praxeologia.
Sob esses entendimentos Chevallard (2009) afirma que o conhecimento de
uma pessoa, como resultante de seu passado e presente de sujeições institucionais,
pode assumir duas formas principais. Em diacronia, em que se pode imaginar o
28
fazer da história da pessoa como sujeito, por meio da crônica de suas sujeições e
contra sujeições. Em sincronia, em que se pode imaginar o quadro de suas relações
pessoais, de seu universo cognitivo. Assim, ao longo do tempo, da história da
pessoa como sujeito, existe uma dinâmica cognitiva, em que se faz com que alguns
objetos apareçam no universo cognitivo UC (x), enquanto outros desapareçam.
O mesmo pode ser dito a respeito do equipamento praxeológico da pessoa,
ou seja, muda ao longo do tempo, algumas partes deste equipamento perdem suas
características de operação, enquanto outras partes são remodeladas e que novos
elementos são adicionados, havendo assim uma dinâmica praxeológica.
Em geral, as praxeologias podem ser combinadas nas instituições pela ação
da pessoa enquanto sujeito da instituição, numa dinâmica praxeológica, e
correlativamente cognitiva, modificando seu discurso ou sua práxis em relação a um
determinado objeto. Segundo Chevallard (2009), uma praxeologia de uma instituição
I quando transposta para outra instituição I*, pode sofrer modificações de tal forma
que sua parte prático-técnico (saber-fazer) não se altera, mas seu Logus (técnico
teórico) varie e tenda a se aproximar do discurso de I*. Ou, de outra forma, o Logus
pode ser mantido e sua práxis alterada que, segundo Chevallard (2009) pode às
vezes tornar o discurso “vazio”. Dessa forma, as praxeologias se alteram e se
(re)combinam nas instituições, e isso se configura em “um fenômeno central para a
história social das praxeologias” (CHEVALLARD, 2009, p. 4, tradução nossa, grifos
no original).
Sob esse olhar, Chevallard (2009) afirma que a formação de uma pessoa
para uma instituição, como a formação profissional de uma pessoa, supõe uma
dinâmica cognitiva e praxeológica que resulta da operação de adequação de novas
sujeições impressas especificamente para a pessoa, o que implica um trabalho de
identificar e tratar os conflitos relacionados com o choque das novas sujeições com
as sujeições anteriores, quando as primeiras são experimentadas pela pessoa como
incompatíveis com a sua identidade.
No entanto, tratar do universo cognitivo ou do equipamento praxeológico de
uma pessoa não é tarefa simples. Segundo Chevallard (2009) a simples descrição
da relação de uma pessoa x em uma instituição I com um determinado objeto o
dificilmente pode ser esgotado, além de apresentar dificuldades de identificar a
29
sensibilidade do objeto matemático para a pessoa que possa impedir novas
adequações ou remodelamentos das relações com o objeto. De outro modo,
algumas mudanças desejadas não são obtidas, pois não se pode produzir um
remodelamento adequado da relação a tal ou tal objeto sensível. Qualquer alteração
a este respeito, é uma remodelação da pessoa e não é sem custo - apesar do ganho
esperado.
Assim, sob o olhar de “o que é ensinado e aprendido em um estabelecimento
de ensino são praxeologias matemáticas, ou mais geral, que são praxeologias
partilhadas por grupos de pessoas organizadas em Instituições” (GARCIA et al.,
2006, p. 2, tradução nossa) é que analiso a história de minha relação pessoal com a
fórmula de resolução da equação do segundo grau1 desde o início de minha
formação recorrendo à narração de flash de memórias das praxeologias vividas com
esse objeto, de modo a tornar claro de algum modo a dinâmica praxeológica, e
correlativamente a dinâmica cognitiva envolvida nesse processo, enquanto docente
e enquanto aluno da escola e dos cursos de formação aos quais me sujeitei.
Ao narrar minha história de vida, estou tratando da minha pessoa enquanto
sujeito que cumpriu e cumpre papéis nas instituições com relação ao objeto fórmula
de resolução da equação do 2º grau; como aluno e como professor de diferentes
níveis de ensino- fundamental, médio, superior. Busco significar a minha relação
com o saber matemático, como sofreu e sofre modificações resultantes da minha
inserção em várias instituições.
É sob esse entendimento que penso o fazer da transposição didática interna,
como um fazer de confrontos de assujeitamentos que (re)formam meu equipamento
praxeológico e correlativamente o meu universo cognitivo. Nesse sentido, ao
elaborar um novo plano de curso acerca da resolução de equações do segundo
grau, terei diferentes influências das instituições que vivi, inclusive a minha nova
relação com este objeto matemático na instituição do curso de mestrado.
1
Reforço que outros objetos matemáticos foram abordados no episódio que trata da construção do
meu plano de curso, do texto do saber, pois se trata de um processo de construção de técnicas de
resolução da equação do 2º grau, onde tarefas tradicionais como desenvolver os produtos de
polinômios (ou produtos notáveis), fatorar os polinômios, calcular as raizes da equação, tiveram
novas intencionalidades.
30
Nesse sentido, na construção de uma praxeologia como um momento de
liberdade diante do saber, que consiste em elaborar minha versão do saber, por
meio de uma epistemologia artificial2 acerca da fórmula de resolução da equação do
segundo grau, busco fazer revelar a dinâmica praxeológica e cognitiva envolvida na
transposição didática interna e apontar os caminhos para a construção das
respostas às minhas questões de pesquisa.
2
Trata-se de uma epistemologia (re)construída acerca de um objeto, ou seja, uma espistemologia
não natural (Notas de aula do professor Renato Borges Guerra, 2009).
31
3 SOBRE A FORMAÇÃO DO MEU EQUIPAMENTO PRAXEOLÓGICO E
UNIVERSO COGNITIVO
Neste capítulo narro como ingressei na profissão docente, desde minhas
primeiras experiências como aluno do ensino básico até os dias atuais como
professor de Matemática e aluno do curso de mestrado em educação matemática.
Alguns
episódios
trazem
aspectos
que
contribuíram
no
processo
de
desenvolvimento de meu equipamento praxeológico e universo cognitivo acerca da
fórmula de resolução da equação do segundo grau e outros objetos matemáticos
relacionados a ela, desde o momento que comecei a dar aulas particulares de
matemática, inicialmente do como aluno do ensino médio, depois como aluno do
curso de Engenharia Elétrica da UFPA continuando após a formatura neste curso,
bem como durante e após o curso de Licenciatura Plena em Matemática e cursos de
aperfeiçoamento, especialização e mestrado.
Destaco as transformações ocorridas (ou não) na minha praxeologia durante
e após um curso de especialização em Educação Matemática que realizei na
Universidade Federal do Pará (UFPA) que me levou a fazer reflexões da própria
prática no sentido da pesquisa e do ensino com foco nas minhas ações
pedagógicas. E o contato com a Didática da Matemática no percurso do mestrado
em Educação em Ciências e Matemática da UFPA, que me suscitou novas reflexões
da própria prática, no sentido da formação e ensino, porém com um enfoque no
fazer matemático.
3.1 AS MINHAS DIFICULDADES E OS SUCESSOS COM A MATEMÁTICA
ENQUANTO ALUNO DO ENSINO BÁSICO E O INÍCIO DE UMA PRÁTICA
DOCENTE
Ainda quando aluno do 1º grau (Ensino Fundamental, atualmente) tive muitas
dificuldades de entender a Matemática da escola. Lembro-me de obter apenas as
notas necessárias para ser aprovado ao final do ano e usava a estratégia de sempre
repetir várias vezes, antes das provas, os exercícios que o(a) professor(a) resolvia
em sala. Recordo que na 8ª série só adquiri certa habilidade para resolver equações
do segundo grau usando fórmula após duas avaliações sobre as mesmas, tendo
resolvido uma grande quantidade de equações.
32
No entanto, essa ação de repetição daquilo que o professor fazia parecia
insuficiente para me sair bem nas avaliações. Isso me levou a resolver exercícios
que o professor não abordava em sala. E no momento em que percebi que
conseguia chegar aos resultados corretos, obtive maior confiança e passei a estudar
conteúdos em livros didáticos que não eram usados na escola ou que seriam
estudados em séries seguintes. Como exemplo, lembro-me que li num livro de
ensino médio as definições das progressões (aritméticas e geométricas) e apliquei
as fórmulas nos exercícios. Quando consultava os resultados no final do livro e
percebia que estava correto senti que começava a gostar da Matemática. Em outro
momento, estudei equações do segundo grau usando um livro que não era adotado
pela escola. Havia muitos invariantes de um livro para o outro, mas era comum
haver também abordagens diferentes. Por exemplo, no livro que não era o adotado
pela escola surgiram exercícios do tipo Qual a condição para que a equação (2m –
10)x2 – 5mx + 2m = 0 seja uma equação do 2º grau com variável x? Qual o valor de
n na equação x2 – 2x + n = 0 cuja variável é x, tal que ela tenha duas raízes reais e
iguais?
Dentro dos invariantes dos livros que estudei, estava uma forma de resolução
da equação do segundo grau que se dava sempre com o uso da fórmula para as
equações completas (do tipo ax2 + bx + c = 0, com a, b, c ≠ 0) e outras técnicas para
as incompletas do tipo ax2+ bx = 0 e ax2 + c = 0. Os exemplos abaixo mostram a
resolução de equações que se enquadravam em cada um desses “casos”.
a) x2 – 7x + 12 = 0
Resolução: Usando a fórmula a seguir com a = 1, b = -7 e c = 12,
x
b
b2
2a
4ac
para calcular as raízes x = 3 e x = 4.
b) x2 – 5x = 0
Resolução: Usando como técnica a fatoração do polinômio x(x – 5) = 0, donde se
obtém x = 0 e x = 5.
33
c) x2 – 25 = 0
Resolução: Usando a técnica da extração da raiz quadrada, x2 = 25, x = ±
25 x = ±
5
Percebo, agora, que a escola não foi a única instituição em que se deu
inicialmente minha relação pessoal com as equações do 2º grau, mas outra
instituição
se
mostrou
determinante
na construção
do
meu
equipamento
praxeológico: o livro didático. Embora tenha sido na escola, enquanto aluno do
ensino fundamental, que tive a primeira relação com tal objeto matemático.
Ao iniciar o 2º grau (ensino médio, atualmente), minha disciplina preferencial
já era Matemática e durante o curso neste nível, obtive sucesso em tal disciplina,
porém não conseguia obter nota máxima em nenhuma das avaliações escolares e
isso se tornou um desafio para mim. Estudei obstinadamente em busca da nota 10,
o que só veio a acontecer no 3º ano (último ano) do ensino médio.
Devido a um aparente destaque que eu tinha em matemática, durante o
ensino médio, as pessoas mais próximas do meu convívio começaram a me solicitar
ajuda pedindo explicações sobre conteúdos e exercícios matemáticos do nível
fundamental e até mesmo do ensino médio. Parafraseando Chevallard, Bosch e
Gascón (2001), o fato de um indivíduo considerar válido o conhecimento matemático
que eu tinha naquele momento, fazia de mim um matemático para ele. Assim, passei
a ser requisitado para dar aulas particulares.
A primeira aula particular com retorno financeiro se deu quando eu era
adolescente entre 14 e 15 anos de idade e foi direcionada para um aluno de 4ª série
do primário (séries iniciais do ensino fundamental, atualmente). Os resultados
dessas aulas pareciam bons, pois fizeram com que eu ampliasse bastante minha
clientela de alunos no decorrer do tempo.
Um dos acontecimentos que mais me deixou envaidecido ocorreu com um
aluno do 1º ano (ensino médio) de uma escola de Belém que precisava obter nota
9,5 (nove e meio) na avaliação de recuperação e conseguiu a nota 10 (dez). Pelo
histórico desse aluno com relação à Matemática, isso parecia impossível para seus
colegas que imputaram a mim o apelido de “milagreiro”. No entanto, percebo hoje
34
esse fato não como milagre, mas que a decisão do aluno de entrar em processo de
estudo com responsabilidade pelo seu aprendizado foi fundamental para seu
sucesso.
Observo assim, a importância da responsabilidade do aluno com o processo
de estudo, pois as garantias de que isso ocorra no momento de ensino ninguém
pode assegurar. Considero que ao assumir a responsabilidade pelo estudo da
Matemática enquanto aluno foi o que me conduziu inicialmente a estabelecer as
primeiras relações com os objetos matemáticos por meio das praxeologias
estudadas.
Fui professor de aula particular de Matemática por muito tempo, inclusive de
um aluno que acompanhei desde a 6ª série até este entrar na universidade. Devido
a aparentes sucessos alcançados, parecia que já estava definida a minha profissão
para o futuro: professor de matemática. Mas, no decorrer de minha formação,
ocorreram influências externas que me levaram a optar pelo curso de Engenharia
Elétrica e entre elas foi o preconceito levantado por muitas pessoas em relação à
profissão docente, principalmente no que concerne à questão financeira. Assim, fiz o
curso de ensino médio na Escola Estadual Deodoro de Mendonça, que a partir do 2º
ano habilitava em áreas tecnológicas com aulas no Centro Interescolar Maria da
Silva Nunes (atual Escola Técnica Estadual do Pará).
Após conseguir a aprovação em Engenharia pensei em cursar também
licenciatura em Matemática, pois havia essa possibilidade de fazer dois cursos de
áreas afins concomitantemente. Mas no ano em que ingressei, tal possibilidade foi
descartada por lei, e assim cursei toda a engenharia, inclusive fiz estágios dentro
dessa área. Mas continuava ministrando aulas particulares de Matemática e também
de Física que se constituía em minha principal fonte de renda.
Após o término do curso em Engenharia tive dificuldades de empregar-me na
área e decidi, então, buscar trabalho em escolas. Uma dessas escolas fez contato e
me disponibilizou, inicialmente, turmas do ensino fundamental para dar aula de
Matemática de 5ª a 8ª séries3, no ano de 1995. Em seguida, no mesmo ano letivo,
3
Atualmente, o ensino fundamental para as séries finais inicia no 6º ano (5ª série) e vai até o 9º ano
(8ª série).
35
fiquei responsável por turmas do ensino médio para ministrar aulas de Matemática e
Física, inclusive para o supletivo4.
Um dos fatos que ficou marcado foi quando o diretor dessa escola, durante
sua entrevista, perguntou sobre minha formação. Eu disse que era formado em
Engenharia, e ele falou em seguida: Não tem problema, pois esses professores de
Matemática sabem menos matemática que um engenheiro. Isso, de certa forma, se
constituiu um incentivo para que eu começasse a docência, pois me senti
envaidecido e detentor do conhecimento com tal fala.
Inicialmente pensava que aquela atividade era apenas passageira até eu
conseguir trabalho na Engenharia, pois esta era minha formação. No entanto, os
meus primeiros resultados pareciam satisfatórios para a escola, pois recebia muitos
elogios dos alunos e não demorou até eu ficar responsável por várias turmas de tal
forma que nem me interessava mais em Engenharia. Recordo que a professora de
Geografia dessa escola me disse que eu tinha um jeito atencioso de tratar o aluno,
pois ela percebia quando passava pela porta da sala em que eu estava dando aula,
que eu tirava dúvidas dos alunos em particular, sentando ao lado deles. Tal hábito
se devia ao fato de ter por muito tempo ministrado aulas particulares. Ao refletir
sobre esta primeira parte da minha prática docente, percebo que meu fazer
pedagógico me coloca em evidência na instituição. E, nesse tempo, era comum eu
ouvir elogios do tipo “você é muito didático em sala”, ou seja, o pedagógico e o
didático se confundiam.
E assim iniciei e permaneço até os dias atuais na função de professor nas
escolas, porém já tendo a formação acadêmica em Licenciatura Plena em
Matemática desde o final de 1999 e com pós-graduação em nível de especialização
concluída em 2008.
3.2 AS INFLUÊNCIAS SOBRE MINHA PRÁTICA DOCENTE INICIAL EM SALA DE
AULA
Ao ser apresentado a uma turma de 5ª série, com cerca de 40 alunos,
imaginei que poderia estar diante de um grande desafio, pois até aquele momento
não havia dado aula para mais do que uma pequena turma de 3 ou 4 alunos nas
4
Nos dias atuais, sua denominação é Educação de Jovens e Adultos (EJA).
36
aulas particulares. Os materiais que me deram suporte naquele momento foram o
giz, o quadro e, principalmente, o livro didático.
As experiências que tive enquanto aluno da escola básica e professor de
aulas particulares, influenciaram nas minhas ações iniciais como professor dessa
escola, uma vez que o processo de formação docente pode ser desenvolvido desde
as primeiras experiências vivenciadas na escola como aluno e por meio de
observação do trabalho dos professores. Sobre tais experiências Gonçalves e
Mendes (2007, p. 48), apoiados em Camargo (1998), afirmam que “[...] situações
vivenciadas como alunos são de forte influência no trabalho do professor em sala de
aula, porque correspondem a experiências relativas ao ensino, à aprendizagem [...]”.
Nessas aulas iniciais, minha estratégia era resolver com os alunos a maior
quantidade de exercícios possível pondo estes com as dificuldades em ordem
crescente, de acordo como eu obtive certo êxito enquanto aluno e ratificada
enquanto professor de aulas particulares. Nesse sentido, Liston e Zeichner (1993)
citados por Gonçalves (2006, p. 182) reafirmam que
Está claro que os futuros professores ascendem a sua formação
profissional com uma bagagem histórica de experiências educativas
como estudantes. Têm idéias prévias sobre o que significa ser um
bom professor, o conteúdo que deve ensinar, como deve fazê-lo e o
tipo de ambiente de aula que gostaria de proporcionar. Não chega
em branco.
Dessa forma, parecia que para ser professor de Matemática bastava ter o
ímpeto de entrar numa sala e transmitir os conteúdos pré-estabelecidos pelos
programas da disciplina fazendo uso de uma grande quantidade de exercícios, de tal
forma que os alunos “aprendessem a fazer”, sempre com a utilização dos livros
didáticos adotados pela escola.
Assim a influência do livro didático no meu fazer didático se deu de maneira
considerável, pois ao me deparar pela primeira vez com uma turma, uma das minhas
atitudes iniciais foi situar o conteúdo no livro didático adotado pela escola, uma vez
que fui contratado com o ano letivo já em andamento.
A abordagem inicial que fiz dos conteúdos foi fortemente pautada nas
sequências de conteúdos propostas pelo livro, inclusive transcrevendo para o
37
quadro seus exercícios, integralmente. Para exemplificar, na 7ª série do ensino
fundamental, a sequência (Quadro 1) dos conteúdos no livro Praticando
Matemática5, que foi adotado pela escola naquele ano, era a seguinte:
Quadro 1 – Sumário do livro de 7ª série Praticando Matemática
Raiz quadrada.
Frações algébricas.
Conjunto dos números reais.
Equações fracionárias.
Valor
numérico
de
expressão algébrica.
Equações literais do 1º grau.
uma
Expressões algébricas.
Termos semelhantes.
Operações com monômios.
Operações com polinômios.
Produtos notáveis.
Fatoração.
Introdução à geometria.
Ângulos.
Triângulos.
Congruência de triângulos.
Quadriláteros.
Polígonos convexos.
Circunferência e círculo.
Fonte: Andrini (1989-a, p. 4)
E também o livro de 8ª série com os conteúdos dispostos da seguinte forma
(Quadro 2):
Quadro 2 – Sumário do livro de 8ª série Praticando Matemática
Potenciação
Radicais
Equações do 2º grau
Equações biquadradas
Equações irracionais
Relações métricas num triangulo
retângulo
Razões trigonométricas
Relações métricas num triângulo
qualquer
Problemas do 2º grau
Relações
métricas
circunferência
Produto cartesiano
Polígonos regulares
Relações e funções
Área de polígonos
Função do 1º grau
Medida da circunferência e área
do círculo:
Função do 2º grau
na
Grandezas proporcionais
Semelhança
Fonte: Andrini (1989-b, p. 5)
5
Este livro faz parte de uma coleção para 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do ensino fundamental com aprovação
no PNLD sob o código 0412-0.
38
Segui estas sequências por muito tempo, e até hoje direciono os conteúdos
da 7ª e 8ª séries (ensino fundamental) usando, de certa forma, tais organizações,
porém explorando novas relações com os objetos matemáticos, principalmente os
que aparecem em negrito, nas sequências acima, pois eles se relacionam
diretamente com a fórmula de resolução de equações do segundo grau que é o
objeto matemático em destaque neste trabalho.
O fato é que, dessa forma, o planejamento de uma aula se tornava fácil, pois
bastava elencar algumas páginas do livro, copiar no quadro alguns conceitos,
definições e exemplos e resolver exercícios junto aos alunos.
Silva Júnior e Réginer (2007, p. 13) fazem considerações a respeito dessa
conduta diante do livro e destacam que
O livro didático de matemática é para o professor algo mais que um
simples material de uso no ensino-prendizagem. Ele é um objeto de
apoio didático que os professores, em sua grande maioria, utilizam
para estruturar e ministrar as suas aulas, apoiando-se nas
considerações feitas por toda sua estrutura do texto do saber, em
seus exemplos com analogias e seus exercícios os mais variados
[...].
Skovsmose (2007), também em relação à dependência que o professor pode
ter do livro didático, considera que
O ensino tradicional de matemática é dominado pelo uso do livrotexto, que é seguido, mais ou menos, página por página. Outras
espécies de materiais são usadas somente como complementos. O
livro-texto ocupa a cena. As aulas são estruturadas da mesma
maneira (SKOVSMOSE, 2007, p. 33-34).
Observo que minha prática docente até então se dava pautada nessa
perspectiva, reafirmando que ainda fazia com que os alunos “resolvessem” todos os
exercícios sugeridos no livro e os que eu elaborava no quadro ou em listas. Isso
fazia parecer que as dificuldades de realizar as provas fossem reduzidas, pois as
mesmas eram sempre elaboradas de acordo com os exercícios. Nesse sentido,
Skovsmose (2008) ressalta que
Muitas vezes, fazendo exercícios, os alunos não vão aprender
matemática para toda a vida, mas na prática de realização de lista de
exercícios em busca das “respostas certas” vão aprender as regras,
39
aprender como se dá o jogo disciplinado e não criativo [...]
(SKOVSMOSE, 2008, p..2, grifos no original).
Dessa forma, observei “bons resultados” de grande parte dos alunos que,
devido seu fazer se tornar repetitivo reproduzia tal fazer nas provas e testes. Mas
questiono hoje se esses alunos aprenderam realmente a fazer Matemática ou se
tiveram um aprendizado que serviu somente naquele momento para passarem para
a série seguinte.
Pais (2006, p. 47) trata o livro didático como um dos elementos da
transposição didática, pois este “contém registros publicados para defender a
validade do saber a ser ensinado”. No que se refere a sua importância, ressalta que
A presença extensiva que o livro didático ocupa na educação escolar
indica a existência de um recurso pedagógico consolidado, porque
resistiu a diversas mudanças ocorridas na educação e no uso das
tecnologias da comunicação (PAIS, 2006, p. 47-48).
Isso é relevante uma vez que é difícil encontrar uma escola que não adote
livro didático de Matemática. Vale considerar que essa consolidação do livro nas
escolas também perpassa por aspectos comerciais e econômicos.
Em outro enfoque, Pais (2006) faz crítica ao livro didático, pois considera que
Mesmo que seus aspectos visuais tenham se modificado nas últimas
décadas, em função do avanço tecnológico, continua inalterada sua
estrutura básica no que diz respeito ao predomínio de uma
apresentação seqüencial e linear de conteúdos (PAIS, 2006, p. 48).
E ainda ressalta que esses aspectos são difíceis de serem modificados, tendo
em vista “a contingência do próprio modelo estrutural do livro impresso, pelo
encadeamento de linhas, páginas e capítulos” (PAIS, 2006, p. 48). Dessa forma,
cabe ao professor a maneira como vai usar essa ferramenta institucional.
O fato é que, naquele momento, pautado meu fazer didático em grande parte
no livro didático, o resultado parecia ser considerado bom pela escola, pois cada vez
mais me foram ofertadas novas turmas.
Após algum tempo, meu fazer docente havia se tornado rotineiro que já não
precisava olhar no livro para ensinar os conteúdos que estavam contidos nele.
40
Dessa forma, não era raro ouvir perguntas dos alunos tais como: como o senhor
consegue saber tanta Matemática de cabeça, sem usar o livro? Será que um dia vou
aprender toda essa Matemática?
Devido a tais comentários, sentia-me envaidecido a tal ponto de evitar ao
máximo consultar o livro na sala de aula, usando-o apenas para resolução de alguns
exercícios por entender que já tinha o domínio dos conceitos e definições dos
conteúdos e dos exercícios.
Minha praxeologia estava definida de tal forma que mesmo após ter
ingressado em outros estabelecimentos de ensino e estes terem adotado outros
livros didáticos com novas configurações em relação à sequência e abordagem dos
conteúdos, meu planejamento se pautava naquelas sequências e abordagens que já
estavam consolidadas. Para exemplificar, havia livro que inseria a geometria em
todas as suas unidades, conforme será exposto a seguir, contudo eu não
considerava tal organização matemática no meu fazer docente. Lembro que havia
um consenso com relação a tais sequências de conteúdos, pois em reuniões
pedagógicas de início de ano letivo o quadro de professores de Matemática das
escolas que trabalhei coadunava com as sequências as quais eu havia estabelecido
em todas as séries. Ou seja, a organização dos programas parecia consensual e de
certa forma paradigmático.
Assim, usava os livros novos sem segui-los integralmente de forma contrária
como havia feito no início de minha prática docente. Por exemplo, o livro
“Matemática: uma aventura no pensamento” (GUELLI, 2005-a e b)6, que foi adotado
em uma escola pública que trabalhei, inseria objetos da geometria em todas as
unidades contidas no volume da 7ª e 8ª séries. As unidades do livro da 7ª série
estão dispostas no quadro 3 a seguir.
6
Este livro faz parte de uma coleção para 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do ensino fundamental com aprovação
no PNLD (2005) sob o código 820020.
41
Quadro 3 – Sumário do livro Matemática: uma aventura do pensamento da 7ª série
Unidade1
– Matemática financeira
– Do número natural ao número real
– Polígonos semelhantes
–Posições
relativas
de
duas – Corpos geométricos redondos
circunferências
– Volumes
– Comprimento da circunferência
– Estatística e probabilidade
– Área do círculo
Unidade 4
Unidade 2
– Equações com frações algébricas
– Operações com polinômios
– Sistema de equações
– Posições relativas de retas e planos
– Transversais e tipos de ângulos
– Poliedros
Unidade 5
– Volume de prismas e pirâmides
– Inequações
Unidade 3
– Congruência de triângulos
– Fatoração
– Primeiras demonstrações
– Identidades notáveis
– ângulo central, ângulo inscrito
Fonte: Guelli (2005-a, p. 4-6).
E a disposição das unidades do livro de 8ª série está exposta no quadro 4
abaixo.
Quadro 4 – Sumário do livro Matemática: uma aventura do pensamento da 8ª série
Unidade 1
– Números reais
– Aproximação por decimais
– Potências e raízes
– Teorema de Pitágoras.
Unidade 2
– Equações do segundo grau
– Teorema de Pitágoras
– Áreas e volumes de prismas
pirâmides
Unidade 4
– Funções polinomiais
– Feixe de retas paralelas cortadas por
duas transversais
– Sistemas de equações
– Inequações
– Sistemas de inequações
Unidade 5
e - Fatoração de polinômios – Divisão de
polinômios – Razões trigonométricas –
Segmentos secantes e tangentes a uma
Unidade 3
circunferência – Área de polígonos
– Equações biquadradas e com radicais
regulares – Área de setores circulares –
– Semelhança de polígonos
Áreas e volumes de cilindros cones e
– Semelhança no triângulo retângulo
esferas – Estatística e probabilidade
– Matemática financeira
Fonte: Guelli (2005-b, p. 4-6).
42
No entanto, eu encaminhava os conteúdos usando as sequências propostas nos
quadros 1 e 2 que já estavam estabelecidas na minha praxeologia, no meu
equipamento praxeológico, e ao usar estes livros localizava as páginas onde se
encontravam os exercícios dos conteúdos que apresentava aos alunos.
Alguns alunos perguntavam por que eu “pulava” os conteúdos? Dava como
resposta que esses conteúdos só seriam trabalhados depois, pois eles
necessitavam de alguns “pré-requisitos”.
No entanto, percebo hoje que tal prática parecia isolar os objetos matemáticos
que eram trabalhados em forma de pacotes de conteúdos. Nesse sentido
O ensino se transforma em um conjunto reduzido de atividades
matemáticas isoladas, de “casos” matemáticos encadeados
arbitrariamente e independentes entre si, que não permite ao aluno a
dominar nenhuma técnica [...]. (CHEVALLARD et al., 2001, p. 285,
grifos no original).
A partir dessa prática na Matemática escolar Garcia, Bosch e Gascón (2001)
consideram o problema da desconexão dos conteúdos como sendo curricular e
formulam as seguintes questões:
Como organizar o ensino da matemática escolar, de forma a
provocar a ligação dos diferentes tipos de conteúdo: conceitos,
procedimentos e atitudes? Como conseguir que esse conhecimento
matemático aprendido pelos alunos não serão reduzidos a um
conjunto de técnicas desconectadas mais ou menos algorítmicas e
sem qualquer sentido? (GARCIA; BOSCH; GASCÓN, 2001, p. 10,
tradução nossa).
Esses questionamentos foram também motivadores de minhas reflexões, pois
percebo que em minha ação docente não considerava conexões e integrações de
conteúdos matemáticos com justificativas matemáticas bem definidas. E, recordo
que justificava os conteúdos trabalhados em uma determinada série falando para os
alunos que esses conteúdos seriam importantes para as séries posteriores ou para
conteúdos posteriores na mesma série. Observo hoje que essa justificativa se
configurava em senso comum e não tinha abrangência no sentido de evidenciar as
articulações e integrações de objetos matemáticos, tão necessárias no processo de
estudo. Observo ainda que o uso desta justificativa pudesse não ser suficiente para
43
motivar o aluno a se envolver com o estudo, pela fraqueza argumentativa da
mesma.
Quando ensinava equações do segundo grau na 8ª série, eu argumentava
que estas poderiam ser resolvidas por meio de fatoração e que os alunos já haviam
estudado na 7ª série. No momento de apresentação e uso da fórmula, falava para
eles que sua aplicação era apenas uma revisão do estudo de valor numérico de uma
expressão algébrica. Justificava o ensino dessas equações afirmando que elas
seriam importantes na resolução de equações que redutíveis a equações do
segundo grau (equações biquadradas, fracionárias, irracionais etc.), e em outros
conteúdos nos quais elas poderiam surgir. Ou seja, os objetos matemáticos eram
trabalhados de forma estanque nas suas respectivas séries e os alunos obrigados a
lembrar deles em séries posteriores para aplicá-los no devido momento. A
praxeologia que havia se estabelecido para mim desde minha formação escolar
enquanto aluno não havia mudado em relação à resolução de equações do segundo
grau e foi confirmada em minha prática docente ao tomar as praxeologias
apresentadas no livro de Andrini (1989 a e b).
44
Para ilustrar a forma de abordagem da equação do segundo grau no livro de
Andrini (1989), há no Quadro 5 uma parte da unidade 5 do livro (p. 48-50).
Quadro 5 – Uma abordagem de equações do 2º grau no livro Praticando Matemática
5 - Equação do 2º grau
Definição
Uma equação do 2º grau com uma variável tem a forma
ax2 + bx + c = 0
a≠0
x é a incógnita
a, b e c números reais, chamados de coeficientes
Exemplos:
1) x2 – 7x + 10, onde a = 1, b = -7 e c = 10
3) 8x2 – 4x = 0, onde a = 8, b = - 4 e c = 0
Exercícios
2) Determine os valores dos coeficientes a, b e c nas equações seguintes:
a) 2x2 + 8x + 7 = 0
g) 4x2 – 16 = 0
e) – x2 – 4x + 9 = 0
h) x2 – 3x = 0
3) Coloque na forma ax2 + bx + c = 0 as seguintes equações do 2º grau:
a) 5x + 3x2 = 4x – 7
b) x2 + 4x = 2 (x – 1)
4) Coloque na forma ax2 + bx + c = 0 as seguintes equações do 2º grau:
Resolvido
(x + 3)2 = 1, x2 + 6x + 9 = 1, x2 + 6x + 9 - 1 = 0, x2 + 6x + 8 = 0
a) (x – 5)2 – 9 = 0
b) (x + 1)2 – x = 7
Fonte: Andrinni (1989-b, p. 48-50)
45
Em seguida, o livro apresentava equações completas e incompletas, os casos
de resolução de equações incompletas e, como ilustrado no Quadro 6, uma
construção da fórmula de resolução das equações do 2º grau.
Quadro 6 – Uma construção da fórmula de resolução de equações do 2º grau no livro
Praticando Matemática
Fórmula geral de resolução
Seja a equação
ax2 + bx + c = 0
a≠0
Vamos transformá-la em equações equivalentes, de modo que o primeiro
membro seja um quadrado perfeito.
1) Transpomos c para o 2º membro:
ax2 + bx = - c
2) Multiplicamos ambos os membros por 4a (a ≠ 0)
4a2x2 + 4abx = - 4ac
3) Adicionamos b2 a ambos os membros:
4a2 + 4abx + b2 = b2 – 4ac
4) Fatoramos o primeiro membro:
(2ax + b)2 = b2 – 4ac
5) Extraímos a raiz quadrada de ambos os membros:
2ax + b =
6) Isolando x:
b2
4a
x
-b
b2
2a
4ac
Fonte: Andrini (1989-b, p. 54)
O fato é que, mesmo tendo concluído o curso de Licenciatura Plena em
Matemática, por força da Lei de Diretrizes e Bases (LDB/1996), que tornou
obrigatório o curso de licenciatura para professores do Ensino Básico, não mudei
minha praxeologia em sala de aula. Isso pode indicar que o curso de licenciatura
não suscitou uma reflexão sobre minha prática, em particular sobre os objetos
46
matemáticos de ensino. Esse fato talvez se deva ao curso estar, naquele momento,
mais voltado para estudo de matemática em nível superior sem conexões explícitas
com os objetos da matemática escolar.
Na disciplina Análise Matemática em algumas demonstrações havia uso de
equações do segundo grau numa forma funcional, com resoluções de inequações
com uso da fórmula
b2 - 4ac. Ou seja, era outra praxeologia que se distinguia da
praxeologia escolar. Em nenhum momento ensinei a praxeologia de resolução de
equações do 2º grau nas escolas de ensino básico do modo que vivencie enquanto
aluno do curso de licenciatura.
Assim, parecia-me que o mais importante era concluir o curso para
permanecer de forma legal na profissão e não correr riscos de perda de emprego.
Na realidade esse foi o principal fator que me levou a concluí-lo. Desta forma, não
posso atribuir ao curso minha maneira de trabalhar em sala de aula, pois esta
parecia ter sido concretizada antes do início do mesmo. Porém ressalto que a
contribuição do curso foi mínima quanto à mudança do meu equipamento
praxeológico e do universo cognitivo.
Em algumas disciplinas pedagógicas, tais como Metodologia do Ensino da
Matemática, Estágio Supervisionado, entre outras, obtive algumas informações
direcionadas ao ensino básico. No entanto, sentia nesse tempo uma auto-suficiência
que não considerava as sugestões metodológicas dessas disciplinas. E tal
suficiência me levava a pensar o ensino de Matemática de forma bastante
pragmática na qual os alunos precisavam estudar os conteúdos por meio de
resolução de uma grande quantidade de exercícios para fixação de técnicas de
resolução. Na minha concepção, a Matemática estava pronta e acabada para ser
ensinada, bastava que o aluno tivesse interesse e responsabilidade com seus
estudos.
Uma reflexão que faço desse comportamento é que as minhas relações
pessoais com os objetos matemáticos expostos acima, decorrentes de meus
assujeitamentos a diferentes instituições, ficaram enraizadas e ao mudar de
instituição, no caso o livro didático ou a escola, resisti em estabelecer novas
relações com os objetos matemáticos. Ou seja, meu equipamento praxeológico e
meu universo cognitivo parecia não permitir minha mudança, e coadunando com
47
Chevallard (2009), os objetos eram sensíveis para mim no sentido de não concebêlos sob um novo olhar, sob uma nova praxeologia sem qualquer reação. Assim,
enquanto reagia à mudança, as preparações das aulas pareciam um simples ato de
“copiar e colar”. Os roteiros já estavam prontos.
No entanto, com o passar do tempo, devido também ao fato dos alunos
estarem de posse dos livros didáticos, precisava de alguma forma enquadrar minhas
aulas de acordo com o que era estabelecido pelas instituições a assim, percebo que
aos poucos as instituições foram moldando minha relação pessoal com os objetos
do saber matemático, mas não de maneira completa.
As equações do segundo grau apresentavam novas motivações, e as que eu
encontrava nos livros eram as motivações geométricas conforme as indicações nas
unidades dos livros de Guelli (2005- a e b) apontadas nos Quadros 3 e 4.
Retornando ao livro de Guelli (2005-b), adotado por uma escola pública que
trabalhei, a unidade sobre equações do segundo grau também trazia o teorema de
Pitágoras e áreas e volumes de um prisma, conforme exposto anteriormente. Nesta
unidade do livro, o autor mostra a resolução de equações do segundo grau por meio
de fatoração do trinômio quadrado perfeito, conforme o Quadro 7, e uma subunidade
em que aparece uma construção da fórmula no Quadro 8. Essas novas
organizações praxeológicas propostas nos livros muitas vezes nem chegavam a ser
implementadas na escola pela resistência que encontravam por parte dos
professores, entre os quais me incluo. Isso reforça a afirmativa de que:
A praxeologia matemática não emerge de repente, em uma
instituição. Ela não tem uma forma definitiva. Pelo contrário, ela é o
resultado de uma atividade contínua e complexa, onde existem
alguns relacionamentos, que podem ser modelados. Aparecem dois
aspectos indivisíveis da atividade matemática: por um lado sobre o
processo de construção matemática (processo de estudo ou
processo didático) e, por outro lado, o resultado desta construção (a
praxeologia matemática). Na verdade, não há praxeologia
matemática sem um processo de estudo que a engendre, mas, ao
mesmo tempo, não existe qualquer processo de estudo sem uma
praxeologia matemática em construção. Processo e produto são as
duas faces da mesma moeda (GARCIA et al., 2006, p. 2, tradução
nossa).
48
Assim, a implementação de uma nova praxeologia, além de depender da
instituição em que os sujeitos se encontram, precisa passar por um longo processo
de estudo e adaptação e nem sempre é percebido pelos seus agentes (no caso os
professores, a escola e os alunos).
Quadro 7- Resolução de equações do 2º grau completando quadrado no
livro Matemática: uma aventura do pensamento
Resolvendo equações por meio da fatoração do trinômio quadrado
perfeito
Veja como resolvemos a equação do 2º grau (x – 3)2 = 25:
x–3=
ou
x–3=-
x–3=5
x–3=-5
x=8
x=-2
S = {-2, 8}
Então, podemos resolver a equação do 2º grau x2 – 6x + 8 = 0 assim:
1) x2 – 6x = - 8
2) x2 – 6x +
=-8+
3) x2 – 6x + 9 = 1
4) (x – 3)2 = 1
x–3=
ou
x–3=-
x–3=1
x – 3 = -1
x=4
x=2
S = {2, 4}
Fonte: Guelli (2005-b, p. 61)
49
Quadro 8- Uma construção da fórmula de resolução da equação do
2º grau no livro Matemática: uma aventura do pensamento
A fórmula quadrática
Uma equação do 2º grau na variável pode ser escrita na forma
, sendo , e números reais e ≠ 0.
Podemos transformar essa equação do 2º grau e expressar a
variável em termos dos coeficientes , e :
As raízes de uma equação expressa na forma
pela fórmula
, com
≠ 0, são dadas
, sendo
Fonte: Guelli (2005-b, p. 64)
Percebo que ao fazer o confrontamento dessas duas instituições, no caso o
livro de Andrini (1989) e o livro de Guelli (2005), as praxeologias diferem-se pelo
fazer (práxis).
50
Conforme o Quadro 5, Andrini (1989) propõe uma sequência que privilegia o
uso da fórmula de maneira mais direta, pois ao pedir que se escreva uma equação
na forma ax2 + bx + c = 0, quando ela se encontra, por exemplo, na forma,
(x – 5)2 – 9 = 0, que desenvolvendo o quadrado, vem
x2 – 10x + 25 - 9 = 0, e finalmente x2 – 10x + 16 = 0. Daí usa-se a fórmula
x
b2
2a
-b
4ac
Para calcular as raízes x = 2 ou x = 8.
O segundo autor propõe inicialmente em sua organização a valorização da
fórmula ao propor resoluções de equações completando quadrados (Quadro 7).
Tomando-se a equação anterior, Guelli (2005) mostra um caminho inverso ao
proposto por Andrini (1989), onde a equação é resolvida completando-se o quadrado
da seguinte forma:
Dada a equação x2 – 10x + 16 = 0, obtém-se o quadrado da diferença de dois
termos, no primeiro termo, da seguinte forma
x2 – 10x = -16
x2 – 10x +
= - 16 +
x2 – 10x + 25 = -16 + 25
(x – 5)2 = 9
x–5=3
x=8
ou
ou
x–5=-3
x = 2.
O discurso (Logus) nos dois casos é invariante, pois os dois autores
assumem pelas suas praxeologias que a melhor técnica para resolução de
equações do 2º grau é a fórmula. Andrini (1989) não privilegia nenhum processo que
revele a necessidade do uso da fórmula tal como Guelli (2005), porém os dois
demonstram a fórmula por completamento de quadrados (Quadros 2 e 4). Na busca
51
de encontrar uma técnica mais abrangente, no caso a fórmula de resolução, Guelli
assume que a raiz quadrada de um número positivo tem dois resultados simétricos
como mostra o Quadro 8 e a resolução da equação anterior em que (x – 5)2 = ± 3,
quando poderia justificar que os sinais + e – aparecem pela fatoração da diferença
de dois quadrados, ou seja (x – 5)2 – 9 = 0.
Ao fazer o confronto dessas praxeologias, percebo que em relação ao livro de
Andrini (1989), eu era um sujeito que estava de certa forma, em conformidade com
essa instituição, pois continuava preparando minhas aulas seguindo sua
praxeologia, mesmo estando diante de uma nova instituição, no caso o livro de
Guelli (2005) ao qual não estava, naquele momento, em conformidade com sua
praxeologia.
Reflito que tal comportamento se deva pelo fato de não aceitar mudança na
praxeologia até então por mim dominada, pois já havia dominado um jeito de fazer
que parecia não comprometer a confiança que sentia ao transmitir um conteúdo. A
minha sensibilidade em relação a essa praxeologia cristalizada era tal que não me
permitia mudança, de maneira que mesmo adotando o livro da escola, resistia a ele
por perceber uma não conformidade da praxeologia proposta com o meu
equipamento praxeológico e correlativamente ao universo cognitivo, pois naquele
momento para mim o objeto era alcançado por um jeito específico de fazer e pensar.
3.3 OS CURSOS DE APERFEIÇOAMENTO E PALESTRAS: REAFIRMANDO UMA
PRAXEOLOGIA
Após o início de meu trabalho como professor, os principais cursos que fiz,
antes da especialização em educação matemática foram, em duas oportunidades,
de aperfeiçoamento em Matemática. Participei também de palestras (principalmente
de autores de livro didático), e de seminários que geralmente eram realizados por
autores de livro da educação, tais como Vasco Moreto, Celso Vasconcelos, Celso
Antunes, entre outros. Minha participação nesses eventos, em geral não se dava por
achar que poderia haver algo inadequado em minha prática docente, mas sim
porque eram oferecidos ou encaminhados pelas escolas que trabalhei e que estas
nos “obrigavam” a participar dos mesmos, pois em geral eles eram realizados nos
horários de aula. Creio que tais eventos possam ter me instigado de tal modo a
52
pensar sobre minha prática docente no sentido da motivação dos alunos em estudar
Matemática e não sobre o meu fazer matemático docente.
Em relação aos cursos de aperfeiçoamentos, os principais fatores que me
levaram a participar desses cursos foram: o período de realização, pois estes
aconteceram nas férias escolares; a melhora do meu currículo como professor; além
da curiosidade em saber que contribuições poderiam me oferecer.
O primeiro aconteceu em 1996 promovido pela Secretaria de Estado de
Educação (SEDUC-PA) e ministrado na Universidade Federal do Pará (UFPA).
Lembro que minha participação neste curso se deu por meio da informação que me
foi dada pelo diretor da escola na qual eu trabalhava. Como naquele momento a
minha formação era somente em Engenharia, decidi participar do mesmo para
começar a “fazer currículo” na área de Educação.
Em 2004 participei de outro curso de aperfeiçoamento sendo que este foi
organizado pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), ministrado em
vídeo conferência por professores deste instituto e também de forma presencial por
professores da UFPA. A diferença, em relação a minha atitude, é que desta vez fui à
busca do curso, porque já começava a sentir necessidade de mudança em minha
prática. O que se constituiu numa busca de conhecer algo novo e que fez de mim
um sujeito epistêmico que em relação com o saber é levado pelo desejo, aberto para
um mundo social no qual ele ocupa uma posição e do qual é elemento que age
(CHARLOT, 2000).
Uma das características desses cursos de aperfeiçoamento é que ambos
eram destinados a professores de matemática do ensino médio. Os dois cursos
foram elaborados em blocos de conteúdos tais como se apresentam nos livros
didáticos. Para mim, contribuíram no sentido de ampliação do domínio de conteúdos
de matemática escolar, com ênfase nos conteúdos do ensino médio, sendo que no
curso do IMPA, observei que em algumas aulas os professores mostravam
conexões de conteúdos e tentavam colocar situações que levassem a integrá-los,
como fez Andrade (2007).
Em alguns momentos de minha prática docente, considerava que já possuía
uma boa experiência para recorrer a determinadas estratégias para iniciar certos
53
conteúdos buscando contextualizações no cotidiano ou em outros campos de
conhecimento, porém não passavam de tentativas para motivações ocasionais. Para
exemplificar, quando iniciava o ensino de números inteiros, levava aos alunos
extratos bancários para que esses pudessem observar a utilização de números
negativos no dia-a-dia. No entanto, no momento do estudo das regras de sinais da
multiplicação, pareciam que estas não tinham sentido prático.
Trabalhei como professor de cursos preparatórios para o vestibular e os
chamados convênios pré-vestibulares nos quais ficava responsável por ensinar
certos conteúdos matemáticos. As aulas eram destinadas em sua maioria a resolver
exercícios de vestibulares passados e de concursos militares. Nessas instituições os
cursos de aperfeiçoamentos reafirmaram minhas relações pessoais com os objetos
matemáticos. As construções das aulas, das organizações matemáticas, que foram
produtos de meus textos do saber, foram pensadas de acordo com o que era
instituído para os cursos preparatórios.
A praxeologia por mim adotada sobre a resolução de equação do segundo
grau não sofreu grandes modificações, ou seja, continuava a pensar e trabalhar este
objeto como produto acabado, apesar de apresentar situações que pareciam
contextualizá-las.
Dessa forma, há momentos em que a equação do segundo grau se constitui
em tarefa rotineira, como no caso do momento em que estava trabalhando nos
cursos preparatórios para vestibulares. Nesses cursos utilizava as equações do
segundo grau apenas como técnica auxiliar nas resoluções de exercícios e
problemas de outros conteúdos matemáticos, tais como a geometria analítica, a
geometria espacial, entre outros.
Assim, ensinava a resolução de equações do segundo grau para os alunos do
ensino fundamental tendo em vista suas utilizações futuras no ensino médio e nos
cursos preparatórios para o vestibular. Ou seja, minha praxeologia continuava
cristalizada em torno da equação do segundo grau e que a percebia como produto.
Isso era inquestionável para mim nessa época.
A minha ação docente ao preparar uma aula e em sala de aula foi reafirmada.
Minhas relações com a equação do segundo grau e correlativamente as praxeologia
54
que dominavam na época pareciam inalteradas. Em geral, meu jeito de abordagem
da Matemática como professor não sofreu modificações significativas, continuei de
certa forma com minha prática já estabelecida de abordar os conteúdos com
conceitos ou definições, resolver alguns exercícios como exemplos e aplicar
bastantes exercícios para os alunos, tal qual era proposto nos livros de Andrini
(1989).
Dessa forma, o meu fazer docente dentro dessas instituições foi reafirmado,
sem a consciência de que a minha relação com os objetos matemáticos se dava de
acordo com a instituição a qual estava submetido; pois a noção de relação pessoal
com o objeto matemático remete às praticas sociais realizadas no contexto da
instituição e que colocam em jogo o objeto e as atividades que podem ser feitas na
instituição com esse objeto (BOSCH; CHEVALLARD, 1999). Nesse sentido parecia
haver uma instituição maior, o livro didático que escolhera inicialmente como
referência, que embora pequeno e até mesmo invisível como instrumento do meu
fazer para as escolas em que atuava, tinha força de impor a prática em jogo das
maneiras de fazer e de pensar próprias - isto é, uma praxeología dominante.
De maneira geral, em todo sistema de ensino das matemáticas
podemos encontrar um modelo epistemológico dominante, muitas
vezes implícito, que se “impõe” aos sujeitos da instituições e que tem
uma importância didática crucial, posto que determina o que se
entende por “ensinar e aprender matemática” dentro dessa instituição
(BOSCH et al., 2006, tradução nossa grifos no original, p. 57).
O domínio que tinha de uma praxeologia (ou será uma praxeologia que me
dominou) me fazia pensar ter o domínio sobre a matemática escolar como um todo,
de tal forma que não questionava minha prática docente até aparecerem alguns
fatos que me levaram a refletir sobre essa prática.
3.4 O INÍCIO DE UMA PRÁTICA DOCENTE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS (EJA) E OS PROBLEMAS NO ENSINO PÚBLICO: QUESTIONANDO A
MINHA PRÁTICA
Ao dar aulas nas turmas da EJA do ensino fundamental e médio, não tinha
inicialmente informações sobre o programa e os conteúdos abordados nessa
modalidade de ensino. Recebi informações sobre as etapas do ensino fundamental
55
e Médio de outros professores mais experientes aos quais perguntei como era
disposto o currículo dessas turmas. Eles forneceram as seguintes informações sobre
como distribuir os conteúdos de cada etapa7:
a) 3ª etapa – seriam trabalhados conteúdos de 5ª e 6ª séries, sendo que os
conteúdos da 5ª seriam no 1º semestre do ano letivo, e da 6ª série, no
segundo;
b) 4ª etapa – conteúdos da 7ª e 8ª séries, sendo que os da 7ª no primeiro
semestre e os da 8ª, no segundo.
c) 1ª etapa – conteúdos do 1º ano do ensino médio e parte dos conteúdos do 2º
ano, distribuídos ao longo do ano letivo.
d) 2ª etapa – parte dos conteúdos do 2º ano e os conteúdos do 3º ano,
distribuídos ao longo do ano letivo.
Assim, os conteúdos trabalhados na EJA eram bastante resumidos, ou
simplesmente não eram alcançados em sua totalidade.
Retomando a transposição didática interna na qual o professor tem gerência
sobre os conteúdos que vai trabalhar, a praxeologia adotada na EJA fez parecer que
o professor não considera tudo que está determinado ou recomendado pelas
instituições.
Como não estava claro para mim a condução do ensino do saber na EJA,
mesmo com as recomendações de professores mais experientes, recorri a uma
instituição que já continha uma organização matemática para esta modalidade de
ensino, no caso, o livro didático, para iniciar uma nova praxeologia. Esses livros
eram destinados apenas às etapas do ensino fundamental.
Na 4ª etapa, por exemplo, além das informações que recebi dos professores,
fazia meu planejamento também apoiado na sequência posta no livro “Matemática”
(SILVA, 1997) recomendado por um divulgador de uma editora de Belém, cujo
sumário se encontra no Quadro 9.
7
No Ensino Fundamental do 6º ao 9º ano são duas etapas (3ª e 4ª). No Ensino Médio são duas etapas (1ª e 2ª).
Cada etapa se dá em um ano letivo.
56
Quadro 9: Sequência de conteúdos no livro Matemática para a EJA
Unidade 1: Conjunto dos números reais (R)
Unidade 2: Cálculo algébrico
Unidade 3: Produtos notáveis
Unidade 4: Fatoração
Unidade 5: Frações algébricas
Unidade 6: Operações com frações algébricas
Unidade 7: Equações fracionárias
Unidade 8: Geometria
Unidade 9: Estudo do triângulo
Unidade 10: Estudo do quadrilátero
Unidade 11: Estudo da circunferência
Unidade 12: Estudo dos radicais
Unidade 13: Operações com radicais
Unidade 14: Equações do 2º grau
Unidade 15: Discussão das raízes de uma equação do 2º grau
Unidade 16: Equações redutíveis ao 2º grau
Unidade 17: Equações irracionais
Unidade 18: Problemas com equações do 2º grau
Unidade 19: Segmentos proporcionais
Unidade 20: semelhança de triângulo
Unidade 21: Relações métricas num triângulo
Unidade 22: Trigonometria
Unidade 23: Perímetro e área
Fonte: Silva (1997, p. 4)
Nesse livro encontra-se uma praxeologia sobre a resolução de equações do
segundo grau (Quadro 10) que não era diferente do que dispunha em meu
equipamento praxeológico, ou seja, em essência é a mesma que foi proposta nos
livros de Andrini (1989-a e b). A diferença é que o livro de Silva (1997) apresenta os
conteúdos dos programas de 7ª e 8ª séries (Quadro 9) contidas num mesmo livro e
de forma mais resumida que nos livros de ensino regular.
57
Quadro 10 - Passos para resolução de equações do 2º grau no livro
Matemática para a EJA
Exemplo: x2 - 3x + 2, para U = R.
1º passo: identificaremos os coeficientes.
=1
b=-3
c=2
2º passo: calcular o valor de .
= b2 – 4 c
= (-3)2 – 4.1.2
=9–8=1
3º passo: calculemos os valores de x (duas raízes), através da
fórmula de Bháskara.
Então:
Logo:
V = {1, 2}
Exercício
Resolva as equações abaixo, sendo U = R.
a) 9x2 – 12x + 4 = 0
b) x2 – 6x + 8 = 0
c) x2 – 12x + 32 = 0
Fonte: Silva (1997, p. 118)
Assim, pondo frente a frente as praxeologias usadas no ensino regular e na
EJA, pude perceber que a nova praxeologia da EJA era aparente, pois mantinham o
mesmo jeito de pensar e fazer da instituição ensino regular. Isso de certo modo,
para atender o tempo didático do currículo, imprimia a aparente liberdade do
58
professor na escolhas de conteúdos que deviam receber maior atenção ou até
mesmo serem eliminados.
Embora pareçam claras as implicações dessa liberdade docente no
rendimento dos alunos da EJA, manifestado no desinteresse e reprovações de
alunos, principalmente do ensino fundamental, percebi sob um olhar crítico, que
outros aspectos poderiam influenciar nesses resultados, colocando inicialmente o
meu equipamento praxeológico em questionamento, ou seja, as praxeologias por
mim dominadas poderiam não dar conta do exigido pela EJA. Embora, segundo
Chevallard (2009), as alterações e as recombinações praxeológicas sejam um
fenômeno no coração da história social da praxeologías, isso parece ainda
efetivamente não ter acontecido para a EJA.
Sob esse olhar, comecei minha busca por cursos na área de educação
matemática onde fiz primeiramente uma especialização e, em seguida o curso de
mestrado que serão abordados em seguida.
3.5 CONSTRUINDO NOVAS PRAXEOLOGIAS A PARTIR DO CURSO DE
ESPECIALIZAÇÃO
Em 2006 ingressei em um curso de especialização em Educação Matemática
da Universidade Federal do Pará (UFPA), no qual tive os primeiros contatos com
teorias diversas dessa área. Os contatos com professores do curso e, por meio
desses, com vários autores relacionados à educação matemática conduziram-me à
relativa mudança de postura diante da abordagem dos conteúdos matemáticos em
sala principalmente levando em consideração as questões pedagógicas na escola.
Dessa forma, segui o caminho da reflexão da própria prática após realizar estudos
nos diversos campos da Educação Matemática, tais como a etnomatemática, a
modelagem matemática, entre outros.
Durante e após o curso, tentava, em minha prática docente, na medida do
possível, contextualizar os conteúdos e (re)significá-los por meio de vários aspectos,
tais como o cotidiano dos alunos e suas práticas culturais, a abordagem de aspectos
econômicos, familiares e até mesmo relacionando a Matemática com outras
disciplinas, tais como Biologia, Geografia, Artes, Educação Física etc. Isso culminou
59
com um artigo no âmbito da etnomatemática e a reflexão da própria prática do
professor. Tal artigo foi construído a partir de um trabalho com turmas de 5ª e 6ª
séries sobre o aumento abusivo do preço do leite no ano de 2007 (MESQUITA;
LUCENA, 2008). Neste trabalho, foram considerados, além de conteúdos
matemáticos como razão, proporção, regra de três, porcentagem, noções de
estatística, também alguns temas transversais como saúde e cidadania, entre
outros. Vale ressaltar que foi uma atividade que elevou o interesse dos alunos pelas
aulas a ponto de no início do ano letivo seguinte eles perguntarem se haveria novos
trabalhos dessa natureza.
Isso suscitou um novo olhar para meu fazer docente no sentido de considerar
alguns aspectos que poderiam motivar o aprendizado dos alunos. Dessa forma,
comecei a dar mais ênfase a situações que chamassem a atenção dos alunos
durante as aulas. Nesse sentido, Gonçalves (2006, p. 47) apoiado em Schulman
(1986) enfatiza que “o conhecimento do conteúdo requer ir além do conhecimento
dos fatos ou conceitos de um domínio” e completa afirmando que isto se refere a
“aspectos mais amplos, que ensejam questões tais como o político, o social, o
econômico, o cultural e o epistemológico. Ele reforça tal pensamento quando afirma
que
Dada a complexidade que é ser um profissional da educação,
independente da disciplina, essa abordagem do conhecimento, por
certo, virá a possibilitar ao professor lidar, com mais propriedade,
com a complexidade educacional do ensinar e aprender matemática
(GONÇALVES, 2006, p. 47, grifos nossos).
Esse enfoque levou-me a encarar o trabalho docente de forma mais ampla,
no sentido de que o professor seja também responsável pela formação do aluno de
maneira mais abrangente e não apenas com relação a contribuições no sentido de
ampliação de conhecimentos específicos da disciplina.
Em 2008, fui convidado para participar do projeto “Imagens amazônicas” desenvolvido pelo Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Matemática e Cultura
Amazônica (GEMAZ) – IEMCI/UFPA - como professor da Rede Estadual de Ensino
do Pará. Tal projeto preconiza o “diálogo” da matemática escolar com a matemática
praticada nos fazeres culturais da região e, inclusive da praticada no cotidiano dos
alunos.
60
Esse projeto influenciou mais ainda a minha prática no sentido de reafirmar a
busca de motivações culturais, no cotidiano dos alunos ou de outras ciências na
abordagem de conteúdos matemáticos, tais como a construção de papagaios para o
ensino de geometria na 7ª série; a montagem de cestas básicas com menor custo
para o ensino de operações numéricas para a 6ª série; construção de um sistema
solar na sala de aula, na abordagem de potências e notação científica na 8ª série,
etc. Recordo que, bastante influenciado por essa formação continuada, em 2008
formei uma comissão de professores para trabalhar temas transversais, tais como
violência, saúde, meio ambiente, entre outros, numa escola pública em que dava
aulas. Porém com o deflagrar de uma greve que demorou bastante, quase todo o
planejamento ficou sem execução.
Ao realizar trabalhos dessa natureza em que os alunos se sentem mais
motivados a participar do processo de sua aprendizagem, há uma solicitação por
parte deles que em todos os conteúdos matemáticos o professor apresente algo
diferente. No entanto, diante das restrições pedagógicas e institucionais nas quais o
professor está sujeito, tais como o tempo para atingir determinadas metas
educacionais; o espaço e as condições de trabalho, etc.; e a própria necessidade do
professor que o leva a trabalhar na regência em sala de aula por até 60 horas
semanais ou mais no ensino básico, fazem com que este não possa realizar
integralmente tais atividades, tendo que muitas vezes dar aulas sob condições
físicas e mentais precárias, trabalhando o “conteúdo pelo conteúdo”. Mas considero
que havia dado um grande passo em meu fazer docente, pois os trabalhos
realizados forneceram-me fortes argumentos na busca de melhorias das condições
de trabalho e a condução de uma prática docente mais significativa para mim.
Quanto à minha relação com o objeto matemático, o curso de especialização
me levou a pensar fortemente em contextos da vida cotidiana fora da escola, de
saberes tradicionais e da cultura para ajudar o aluno a compreender melhor a razão
de ser de certos objetos matemáticos na escola. As equações do segundo grau
começaram a ser abordadas nas aulas com tentativas de minha parte de assim
contextualizar o ensino deste objeto matemático. O desafio era sempre encontrar
situações que envolvessem os objetos matemáticos que queria abordar em sala de
aula. Minha ação docente já apresentava modificações, pois sentia a necessidade
61
de fazer o diálogo entre a Matemática da escola e a “matemática” fora dela, ou seja,
o saber começa a ser observado numa perspectiva etnomatemática.
No entanto, o ensino de resolução de equações do 2º grau não sofreu
mudanças significativas num sentido didático, pois para resolver problemas ou
enfrentar situações que envolvesse equações desse tipo, os alunos teriam que
saber resolvê-las. Para isso, eu ensinava tal resolução da mesma forma que era
ensinada no início de minha prática docente onde me apoiava nas sequências do
livro didático da época: apresentação de equações, sua fórmula de resolução e
cálculo das raízes. Ou seja, as equações continuavam como um produto acabado,
como artefatos para serem utilizadas numa situação.
Nas turmas de 7ª série, ao trabalhar conteúdos numéricos e geométricos,
buscava motivações culturais como, por exemplo, a construção de papagaios 8 para
auxiliar no ensino de geometria. No entanto, ao iniciar os estudos de expressões
algébricas, principalmente as operações entre monômios e polinômios, os produtos
notáveis e a fatoração, argumentava com os alunos que eles precisavam aprender
esses conteúdos, pois iriam utilizar futuramente em outros conteúdos matemáticos.
Assim, percebo que ocorreu uma mudança no meu fazer docente com forte
ênfase no pedagógico, pois minha preocupação em ensinar os conteúdos escolares
buscando relacioná-los a saberes do cotidiano ou da tradição de certas culturas
como contextos motivacionais ocorreu com maior frequência; como consequência de
compreensões que tive dos pressupostos da etnomatemática, da modelagem
matemática e de conhecimento pedagógico do conteúdo (SHULMAM, 1986) onde o
conhecimento específico do conteúdo é posto como um dos conhecimentos que o
professor precisa em sua ação docente, mas que não é suficiente para que este
possa ensinar. No entanto, continuava com minha visão do saber matemático como
produto que é utilizado em situações ou problemas.
8
Pipas voadoras.
62
3.6 NOVA RELAÇÃO COM O SABER: REFORMULANDO UMA PRAXEOLOGIA
DURANTE O CURSO DE MESTRADO
A partir dos estudos de teorias da Didática da Matemática, ao tomar
consciência da responsabilidade como professor na transposição didática interna,
percebi a importância da relação pessoal com o objeto matemático tem nesse
processo, pois na elaboração do texto do saber, preciso de clareza das conexões
que farei entre os objetos matemáticos no sentido de atender minhas
intencionalidades. Nesse sentido, Lins e Menezes (2010, p. 121, grifos nossos)
afirmam que
A transposição do texto didático em um saber ensinado perpassa
pela relação que o professor tem com o saber em jogo. As situações
de ensino a serem propostas estão, em certa medida, vinculadas a
essa relação. A observação de professores em sala de aula revela
que estes parecem se sentir mais à vontade e propõe, muitas vezes,
situações de ensino mais interessantes, bem como suas
intervenções em relação aos alunos parecem ser melhores quando
estes possuem uma relação mais estreita com o saber.
Isso me leva a afirmar que, para minha ação eficaz como agente na
transposição didática interna, preciso ter uma relação com o saber matemático que
não seja limitada apenas ao domínio do conteúdo, mas partindo dessa relação
conduzir meu papel na transposição, por meio de minha ação docente anterior à
sala de aula; de não só revelar novos objetos, mas, sobretudo fazer renovar os
velhos objetos matemáticos por meio de conexões, articulações e integrações entre
os objetos do saber matemático curricular.
Assim, minha compreensão de que o saber realmente ensinado é aquele cuja
interpretação é do professor, e este, é fruto de sua relação pessoal com um objeto
matemático formada por seus assujeitamentos nas várias posições de diferentes
instituições em que foi e é sujeito, é o que encaminha seu momento de “ficção de
liberdade” na construção do seu texto de saber. Nesse sentido,
Quando um professor prepara sua aula, podemos assumir que para
ele o texto do saber é, neste momento preciso, temporariamente
estável. No entanto, este texto ainda oferece ao professor uma
variedade de escolhas. As escolhas feitas pelo professor para
construir o seu curso modificando o saber a ensinar, bem como a
implementação efetiva dos cursos propostos aos alunos,
63
inevitavelmente dão lugar a modificações do projeto. O trabalho do
professor é uma tarefa transpositiva (RAVEL, 2003, p. 5, tradução
nossa).
Entretanto, a construção de um texto do saber que venha atender minhas
intencionalidades a partir de uma organização matemática dada pelas instituições,
não pode fazer do saber ensinado algo que seja tão distante do saber a ensinar e
nem seja também o saber sábio ou acadêmico de forma plena, mas que seja um
saber validado pelas instituições e pela sociedade.
Assim, a liberdade que o professor tem na sua interpretação do saber dentro
da transposição didática interna não significa que este deva fazê-la sem considerar
aspectos sobre o saber e sobre as restrições pedagógicas. Para exemplificar, não é
raro observar tentativas de professores de Matemática de contextualizar conteúdos
matemáticos no cotidiano; ou usando estratégias que tendam a distanciar o saber de
suas raízes epistemológicas, como exemplificam Bosch e Gascón (2001) ao se
referirem ao “modelo da balança para ensinar a resolver equações do primeiro grau
ou a situação de espessura de uma folha de papel para introduzir os decimais” (p. 2,
tradução nossa, grifo no original).
No entanto, as relações do professor com os objetos matemáticos, as
praxeologias que dispõe, podem lhe conduzir a uma gestão do saber de modo a
atender sua intencionalidade sob as condições e restrições institucionais impostas,
pois uma praxeologia pode ser a transposição de uma praxeologia existente em
outras instituições, ou recobinações dessas. Assim, em alguns casos pode ser que a
práxis seja essencialmente a mesma, mas o logos seja mudado ou ainda que o
logos seja mantido e a práxis alterada, ou que às vezes a praxeologia seja
esvaziada de sua substância. “Alterações e recombinações praxeológicas são,
portanto,
um
fenômeno
no
coração
da
história
social
da
praxeologías”
(CHEVALLARD, 2009, p. 4).
Esse pensar pode encaminhar possíveis respostas para o problema didático
da conexão da matemática escolar, pois trata
da análise de praxeologias matemáticas no currículo atual e também
na construção de praxeologias matemáticas. Com relação à análise,
nós inquiriremos sobre a natureza das limitações e insuficiências
64
daquelas praxeologias matemáticas para engendrar e dar sentido a
praxeologias mais vastas e mais complexas, superando o nível
temático. Com relação a construção, nós perguntaremos como
complementar as praxeologias existentes e como conectá-las?
(GARCIA et al., 2006, p. 235, tradução nossa).
Nesse sentido, a conexão da matemática escolar pode ser entendida como a
relação passado e futuro em torno de um objeto matemático e isso pode remeter a
otimização do tempo didático (CHEVALLARD, 2005), à medida em que o olhar para
o objeto é sempre como novo, sua compreensão não fica restrita a um tempo. Está
sempre em construção como um novo objeto, sem perder os “traços” característicos
do antigo, mas com novas relações. Assim, está sempre em relação com o passado
e futuro. Por exemplo, a minha nova relação, enquanto professor, com polinômios
me permite fazer relações com o futuro, na 7ª série, com o passado e futuro na 8ª
série, como a resolução de equações do 2º grau e equações polinomiais no ensino
médio, mesmo que não esteja explicitamente posto. Ou seja,
Fazer aparecer um objeto com duas caras, contraditórias entre si.
Por um lado, deve aparecer como algo novo, que produz uma
abertura das fronteiras do universo dos conhecimentos já explorados;
sua novidade permite que se estabeleça, sobretudo, entre professor
e aluno o contrato didático: pode constituir-se em um objeto de
ensino e campo de uma aprendizagem. Por outro lado, em um
segundo momento da dialética do ensino, deve aparecer como objeto
antigo, quer dizer, que possibilita uma identificação (por parte dos
alunos) que lhe inscreve na perspectiva do universo de
conhecimentos anteriores (CHEVALLARD, 2005, p. 77, grifos no
original, tradução nossa).
Dessa forma, Chevallard (2005, p. 77) afirma que “o objeto de ensino produz
um equilíbrio contraditório entre passado e futuro” no qual ele o denomina de objeto
transacional entre passado e futuro. Assim, o “não envelhecimento” de um objeto do
saber corresponde ao papel de transacionalidade do mesmo, ou seja, se pode dizer
que a superação da contradição antigo/novo de um objeto do saber favorece o não
envelhecimento desse objeto. Assim como uma espécie de ser vivo evolui para não
ser extinto, um objeto do saber também pode “evoluir” no sentido de não se tornar
obsoleto e vítima do tempo didático. Isso pressupõe que tal objeto seja renovado no
curso de seu estudo.
65
Nesse sentido, percebo que o papel do professor na relação que une o aluno,
o professor e o saber, ou seja, no sistema didático, é fundamental na condução da
“máquina didática”, cujo motor é a contradição do antigo e do novo. Assim, a
introdução de objetos transacionais, que são objetos do saber convenientemente
convertidos em objetos de ensino, pelo professor alimenta o funcionamento do
sistema didático. Isso implica que o professor, para conduzir a renovação didática do
objeto a ser ensinado, seja o agente da relação que sabe antes que os demais, que
já sabe, que sabe mais, e que esta é a mínima condição para tal renovação
(CHEVALLARD, 2005).
Dessa forma, parece ficar claro o papel do professor na transposição didática
interna, o de buscar a transacionalidade dos objetos matemáticos, de movimentar
praxeologias já existentes em seu equipamento praxeológico e correlativamente
suas relações pessoais com os objetos matemáticos, o seu universo cognitivo, para
(re)construir praxeologias, alterando-as ou recombinando-as.
Nesse sentido, o momento da transposição didática interna, em que o
professor elabora seu texto de saber, pode ser visto como o processo de construção
de uma organização matemática que irá dar lugar à atividade matemática em que se
constitui o “matemático”. De outro modo, é simultaneamente um produto e uma
atividade (BOSCH; ESPINOZA; GASCÓN apud VIVIANO, 2010) à medida que forma
e reforma praxeologias e, correlativamente, o universo cognitivo do professor.
Adicionalmente, se levo em conta que a co-determinação didática entre a
organização matemática e a organização didática correspondente (BOSCH;
GASCÓN, 2001) pode caracterizar, segundo Viviano (2010), em forma mais
exaustiva a relação do professor de Matemática ao saber matemático, urge que eu
elabore e coloque em ação um texto de saber, numa praxeologia didática, sobre a
fórmula da equação do segundo grau, de modo a buscar encontrar possíveis
respostas aos meus questionamentos sobre o que no meu equipamento
praxeológico, correlativamente no meu universo cognitivo, facilita, interfere ou que é
indiferente as suas mudanças quando frente a uma nova organização matemática
que deve dar lugar a uma nova organização didática.
Para isso, a partir de uma organização matemática acerca da fórmula de
resolução de equações do segundo grau presente no trabalho de Silva e Guerra
66
(2009), busquei reconstruir a praxeologia em relação à fórmula da equação do
segundo grau por mim adotada até então. Essa escolha se deu principalmente por
possuir em seu desenvolvimento a integração de diferentes objetos de estudo
estudados em séries anteriores do nível de ensino fundamental, e de outros objetos
matemáticos, de modo implícito, a serem estudados no ensino médio ou mesmo
superior.
Tais articulações me pareceram encaminhar de forma facilitadora o meu
entendimento sobre o processo de transposição didática interna, de introdução de
objetos matemáticos transacionais que se caracterizam por novas relações,
preservando as já existentes, com outros objetos matemáticos, que marcam a
contradição antigo/novo.
Silva e Guerra (2009) apresentam uma abordagem para o estudo das
equações do 2º grau, evocando vários conteúdos posteriores e anteriores a este, no
currículo oficial (Quadro 11).
67
Quadro 11 – Uma nova praxeologia acerca da fórmula de resolução de equação do 2º grau
A equação do 2º grau é apresentada na forma, ax2 + bx + c = 0, com a ≠ 0, que permite escrevê-la como
sendo x2 + px + q = 0. Que é um polinômio do segundo grau que pode ser escrito como um produto de polinômios
do 1º grau x2 + px + q = (x - a )(x - ß) .
x2 - (
Mas, (x - )(x - ß)
ß)x
ß que comparada à expressão x2
px
Isto é, - ( + ß)x é igual ao termo do primeiro grau px e o termo constante (
q, obtém-se
-
) é igual ao termo constante
q.
A resolução, portanto, da equação (x números reais AB
ß
) (x - ß)
0 tem solução observando-se que o produto de
0 é nulo quando pelo menos um dos fatores for nulo (A
0, obtendo-se x
ou x
2
do primeiro grau: x
px
q
0 ou B
0). Ou seja, x -
0 ou x -
ß . Tudo se resume em fatorar um polinômio do 2º grau em um produto de fatores
(x -
)(x - ß).
Em alguns exemplos podem ser fatorados mentalmente como a seguir:
x2 - 7x
12
(x - 3).(x - 4)
0
0
Pois, - (3
4)
-7e3.4
12
Em geral, não é tão fácil encontrarmos
e ß por operações mentais. No
entanto, observando que o quadrado da diferença de dois termos é igual ao quadrado de sua soma menos
quatro vezes o produto entre eles, ou seja, ( - ß)2
(
ß)2 - 4 ß
p2 - 4q, podemos obter o sistema do primeiro
grau
que é resolvido pelo método da adição. Assim, o exemplo anterior x2 - 7x
donde 2
8 produz
4, que substituído em
ß
7 resulta em ß
12
0, resulta em p
-7eq
12, pois
3.
Após vários exercícios, resolvemos o caso geral, e obtemos a fórmula de
resolução da equação do 2º grau
Ao longo desta explanação, foram utilizados vários conteúdos que se interligam, como por exemplo:
equação do primeiro grau (6ª e 7ª séries), produtos de polinômios (7ª série), sistema de equação do primeiro
grau (6ª série), valor numérico (7ª série), identidade de polinômios (3° ano do EM), fatoração e produtos notáveis
(7ª série). Além disso, outros conteúdos estão de forma implícita nesses conteúdos abordados explicitamente,
como é o caso de expressões numéricas (no conteúdo valor numérico), iniciada na 4ª série do ensino
fundamental; operações fundamentais.
Fonte: Silva e Guerra (2009, p. 93-96)
Na reconstrução da organização matemática que co-determina a oganização
didática, considerei um aluno hipotético frente às articulações e integrações
68
justificadas de objetos matemáticos conhecidos previamente de outros tempos
didáticos, de modo a levar esse aluno a tomar consciência do processo de resolução
da equação de segundo grau, sem perder de vista o objeto futuro presente em
minha intenção, não a ser explicitada em sala de aula, de levá-los no futuro escolar
a compreender a resolução de equações polinomiais por meio do teorema
fundamental da álgebra.
A Figura 2 apresenta um esquema que representa a integração dos objetos
matemáticos articulados no texto do saber.
Figura 2: Saberes articulados e integrados no texto do saber
Produto notáveis
Fatoração
Equações do 2º
grau
Sistema de
equações do 1º
grau
Teorema
Fundamental da
álgebra
Fonte: Elaborada pelo autor (2010)
A Figura 2 ilustra minha nova relação com o saber matemático e revela como
foi elaborado meu texto do saber no qual o objeto polinômio é pensado como objeto
transacional, ou seja, que é apresentado no ensino fundamental, mas com
tratamento para o ensino médio.
69
O Teorema Fundamental da Álgebra (TFA) (LIMA et al., 1998, p. 219, grifos
no original) afirma que “todo polinômio complexo de grau maior ou igual a 1 possui
pelo menos uma raiz complexa”. Isto quer dizer que dado um polinômio p(x), este
pode ser escrito na forma p(x) = (x – x1) . Q1(x), sendo
um polinômio
de grau n-1. Ou seja, se p(x) = (x – x1) . Q1(x), e p(x) = (x – x1).Q(x) = 0 , então x =
x1 é uma raiz.
Assim a fatoração fundamenta a técnica de resolução de uma equação do 2º
grau como é exibida no exemplo para equação x2 – 5x + 6 = 0, pois o polinômio x2 –
5x + 6 = (x-2)(x-3) de onde segue que (x-2)(x-3)=0 e que x-2=0 ou x-3=0 de onde
se encontra as raízes x=2 e x=3. Em geral, se o polinômio pode ser escrito na forma
fatorada (x – x1).(x – x2) = x2 –(x1+x2) x +x1.x2
podemos, identificando os termos
semelhantes entre esses polinômios, encontrar a soma das raízes S= x1+x2 (no
caso em tela S= 5) e o produto P = x1 . x2 (no caso em tela P= 6).
No caso em tela, a fatoração pode ser obtida por inspeção da soma S=5 e do
produto P = 6, mas isso nem sempre é possível em todas as tarefas de resolver
equações, como, por exemplo, quando as equações têm coeficientes fracionários ou
irracionais.
Assim, há necessidade de aprimoramento da técnica utilizada, ou o
desenvolvimento de uma (nova) técnica mais abrangente, observando que o
teorema fundamental da álgebra se constituiu na tecnologia da técnica ou
simplesmente que justifica a técnica de resolução de equações do 2º grau, que em
resumo garante que resolver equação polinomial é essencialmente fatorar seu
polinômio.
Em resumo, o texto do saber que desenvolvi teve a intenção de conduzir uma
organização didática envolvendo antigas tarefas, mais precisamente, praxeologias
pontuais anteriormente estudadas como: produtos de polinômios, produtos notáveis,
fatoração de polinômios, resolução de sistemas de equações do primeiro grau,
articulados de modo a resolver equações do 2º grau, sem perder de vista de fazer
valer minhas intencionalidades de evidenciar importância do uso de fórmulas, como
uma técnica simples, rápida e segura de se obter as raízes da equação, mas
sobretudo, como síntese das articulações e integrações realizadas e que marcam a
70
atividade matemática. Isso se torna possível quando imagino um objeto futuro a ser
estudado, no caso a resolução de equações polinomiais à luz do teorema
fundamental da álgebra que constitui o elemento tecnológico dessa praxeologia.
As minhas reflexões sobre o objeto em termos da transposição didática, e a
consequente reflexão da prática docente me conduziu a uma nova relação com os
objetos matemáticos em destaque nesse trabalho. A minha ação docente foi
pensada de modo revelar a característica de transacionalidade dos objetos
matemáticos e suas articulações entre si, e não de objetos tratados isoladamente.
Após essa tarefa de desenvolver o produto de polinômios seria realizado o
trabalho inverso, ou seja, a tarefa de fatorar o trinômio.
Contudo, essa segunda tarefa parece não apresentar técnica de realização
tão simples quanto à primeira, pois há necessidade de realização de tentativas e
erros que podem não ser fáceis dependendo do polinômio a ser fatorado. Por
exemplo, o polinômio x2 – x + 5 não é fatorável se penso em números reais. Assim
como o polinômio x2 + x – 1 não é fatorável se considero números inteiros.
Ao remontar uma situação do tipo “quais são dois números x e y cujo produto
deles é igual a P e cuja soma deles é igual a S”, organizo o sistema x + y = S e x.y =
P, que resulta, por exemplo, na equação x2 – Sx + P = 0 que se constitui num novo
registro para o sistema em questão.
Para certos valores de S e P, a solução da situação acima parece não
apresentar dificuldades se penso em fatorar o trinômio. Por exemplo, x2 – 7x + 12 =
(x – 3).(x – 4). Parece fácil pensar em dois números cuja soma é igual a 7 e o
produto deles é igual a 12. No entanto, mesmo usando o recurso de fatorar o
produto P para encontrar tais números (12 = 2x2x3 = 4x3), há exemplos de
polinômios tais como os citados anteriormente (x2 – x + 5 = 0, x2 + x – 1 = 0), cujo tal
recurso não oferece o resultado de forma prática.
Nesse sentido, faz-se necessário o aprimoramento da técnica de fatorar para
obter solução prática para toda situação desse tipo. Nesse caso, o uso da fórmula
de resolução de equações do 2º grau constitui-se na técnica que alcança tais
situações.
71
No intuito de oferecer uma situação mais concreta, foi pensado o seguinte
problema (situação 1): Quais as dimensões de um retângulo cuja área é igual a P e
cujo semiperímetro é igual a S?
A situação acima nos remete ao seguinte sistema abaixo, se considerarmos x
e y as dimensões do retângulo.
(Sistema S1)
O desenvolvimento da solução do sistema acima, pelo método da
substituição, remete à equação x2 – Sx + P = 0 que por sua vez, para ser resolvida,
precisa de um método mais abrangente, pois se penso na soma e no produto, volto
ao sistema, há um ciclo sem solução para a situação 1.
O desenvolvimento da fórmula de resolução da equação do 2º grau posto por
Silva e Guerra, consiste em transformar essa tarefa em outro tipo de tarefa
presumidamente mais simples: dada a soma e a diferença de dois números, calcular
tais números.
Isso é possível por meio da relação de diferença entre o quadrado da soma e
o quadrado da diferença de dois termos
(p + q)2 – (p – q )2 = 4 p q => (p – q )2 = (p + q )2 – 4 p q
(Sistema S2)
Daí, dada a equação ax2 + bx + c = 0, do sistema acima obtenho a fórmula
x
b
b2
2a
4ac
Dessa forma, a transição da tarefa do tipo “resolver a equação do segundo
grau” para a tarefa do tipo “dada a soma e a diferença de dois números encontrar
esses números”, envolve uma sequência de tarefas pontuais relativas a produtos
notáveis, fatoração e sistema de equações de forma articulada em relações até
então não conhecidas, caracterizando de certo modo a transacionalidade desses
objetos matemáticos
72
A seguir, descrevo a realização da praxeologia, construída no texto do saber
em sala de aula, que constitui outro estágio da transposição didática interna, no qual
eu pude refletir sobre minha relação com o saber, sobre a mudança que pode ter
ocorrido no meu universo cognitivo por conta da nova praxeologia construída e o
que pode ter contribuído, ou impedido nessa mudança.
73
4 A PRÁTICA DOCENTE SOB UMA “NOVA PERSPECTIVA” – A REALIZAÇÃO
DO TEXTO DO SABER EM SALA DE AULA
Aqui tenho por objetivo por em ação o texto de saber a partir da nova
praxeológia planejada em acordo com minha compreensão sobre a transposição
didática interna, mas agora em frente ao aluno real que pode exigir uma
reorganização da praxeologia e consequentemente do meu universo cognitivo.
Para isso foi escolhida uma turma de 4ª etapa da EJA de uma escola púbica
por razões, a saber:
a) As praxeologias de referência encontrada nos livros didáticos, nos manuais
escolares, para a EJA não apresentava substanciais diferenças das praxeologias
adotadas para o ensino regular.
b) Não havia problemas em relação às restrições pedagógicas impostas pelo
estabelecimento de ensino, a direção da escola e os professores, quanto ao uso de
novas praxeologias.
c) A escolha de uma escola pública se deu por acreditar que o professor gerencia
seu fazer docente com maior liberdade, o que propicia, sob minha ótica, uma ação
mais autônoma na transposição didática interna. Além de acreditar que raramente
uma escola da rede particular autorizaria tal intervenção, embora eu tenha realizado
a mesma ação e no mesmo período numa turma de 7ª série de uma escola dessa
rede em que era professor.
4.1 AS FASES DA MINHA AÇÃO DOCENTE EM SALA DE AULA: O TEXTO DO
SABER POSTO EM AÇÃO
A seguir apresento a sequência da praxeologia separada por estágios onde
os objetos matemáticos são expostos de acordo como o texto do saber representado
sinteticamente na Figura 2 da seção 3.
 Primeiro estágio - Produto de polinômios
A aula foi iniciada a partir da operação de multiplicação entre polinômios,
escrevendo no quadro o seguinte produto (x + 5) (x + 3). Perguntei qual seria o
resultado daquele produto. Porém não obtive resposta de nenhum deles. Neste
74
momento, percebi que precisava rever as operações entre polinômios para o
encaminhamento da praxeologia.
Coloquei no quadro algumas multiplicações do tipo (x + a) (x + b), com a e b
sendo inteiros. Com intenção de verificar se eles tinham observado regularidade nos
produtos, coloquei no quadro um que já havia sido desenvolvido pela maioria dos
alunos, conforme descrito a seguir.
Escrevi no quadro o produto (x + 3) (x + 5) = x2 + 8x + 15 e apontei para o 8 e
para o 15, perguntando a respeito de alguma relação desses resultados com os
binômios. A aluna Murielli respondeu que 8 era a soma 3 + 5 e 15 era a
multiplicação 3 × 5. Escrevi mais algumas situações análogas no quadro pedi para
os alunos realizar os produtos de forma rápida. Apesar dessa percepção da aluna,
eles tentaram resolver os exercícios sem dar respostas diretas, ou seja, usaram a
regra da distribuição. Ao final da aula forneci exercícios (Apêndice 1).
Até aqui a aula estava pautada na realização da tarefa de multiplicar dois
binômios do 1º grau, seguindo a regra da distribuição como a técnica de resolução
desta tarefa. No momento em que a aluna Murielli observou a soma e o produto dos
termos numéricos dos binômios, pensei que eles poderiam pensar na possibilidade
de uma nova forma para multiplicar tais binômios que seria também útil para fazer o
caminho inverso, no caso a fatoração do trinômio.
Em outras aulas, pedi aos alunos que apresentassem suas resoluções no
quadro para identificar suas dificuldades. Alguns alunos pareciam não apresentar
dificuldades na resolução, e fizeram os produtos diretamente, sem fazer uso da
regra operatória da distribuição enquanto outros alunos fizeram os produtos por
distribuição e conseguiram chegar aos resultados. Porém outros apresentaram
dificuldades, tais como: não conseguir efetuar a multiplicação correta das variáveis,
não colocar sinais dos termos, como, por exemplo, (x + 3)×(x + 2) = x + 5 × 6), ou
simplesmente nem saber começar os cálculos.
Sendo assim, reuni esses alunos em equipes, onde aqueles que entenderam
melhor a maneira de fazer, explicariam aos demais colegas. Os produtos que
envolviam monômios e polinômios (Apêndice 1) foram desenvolvidos pela maioria
75
dos alunos, sem grandes dificuldades. Outros alunos disseram ter mais facilidade
para fazer o produto de dois binômios.
Os produtos trabalhados nas aulas anteriores foram retomados, porém
explicitando a adição e a multiplicação dos termos constantes, como mostra o
exemplo 2 abaixo.
Exemplo 2
a) (x + 4) (x + 3) = x2 + 4x + 3x + 4 . 3 = x2 + (4 + 3) x + 4 . 3 = x2 + 7x + 12
b) (x - 5) (x - 2) = x2 - 5x – 2x + 5. 2 = x2 - (5 + 2) x – 5 . 2 = x2 - 7x + 10.
Após expor outros análogos a esses mudando os sinais dos termos
constantes, pedi para que resolvessem os exercícios propostos anteriormente.
Houve apresentações de resoluções no quadro pela maioria dos alunos.
Alguns mostraram evolução na ação de fazer os produtos. Realizaram inclusive, os
produtos notáveis, onde indiquei os casos que estão presentes nos livros didáticos
nos momentos em que estes apareceram, a fim de que eles tomassem
conhecimento dos termos usados nesses produtos. Por exemplo: (x + 5) (x + 5) = (x
+ 5)2 (Quadrado da soma de dois termos), (x – 5) (x – 5) = (x – 5)2 (Quadrado da
diferença de dois termos), (x + 6) (x – 6) (Produto da soma pela diferença de dois
termos).
Após perceber que houve uma evolução dos alunos com relação ao produto
dos binômios, decidi iniciar fatoração sem perder de vista os produtos realizados.
 Segundo estágio – Fatoração
Iniciamos os estudos com fatoração, porém trabalhando com os produtos de
polinômios que foram realizados em aulas anteriores, no sentido de articular as
tarefas de desenvolver os produtos e fatorar os polinômios. Foram vistos vários
trinômios e binômios do 2º grau explicitando os constantes nos livros didáticos em
geral tais como: fator comum em evidência, diferença de dois quadrados e o trinômio
do 2º grau.
76
Para ilustrar, escrevi no quadro alguns exemplos, tais como: ax2 + bx = x (ax
+ b), x2 + 2x = x (x + 2), x2 – 5x = x (x – 5), 5x2 – 10x = x (5x – 10), x2 – 5x + 6 = (x –
2) (x – 3), x2 – 4x + 4 = (x – 2) (x – 2), x2 – 16 = (x + 4) (x – 4), entre outros.
Usei figuras geométricas de retângulos e quadrados na intenção de relacionar
o termo “quadrado” que é usado em polinômios do 2º grau, com algo bem conhecido
pelos alunos. Não houve a intenção de encaminhar a aula num contexto geométrico,
pois não era essa a minha intencionalidade e sim uma abordagem com ênfase num
fazer algébrico conforme proposto no meu texto do saber.
Todos os polinômios que foram sugeridos eram fatoráveis. Mas expliquei que
havia polinômios não passíveis de fatoração, e que não iríamos trabalhar com eles
naquele momento. Para os alunos que apresentaram dificuldades para realizar a
fatoração do trinômio por soma e produto, sugeri que fatorassem o termo constante
do trinômio, pois esse poderia fornecer o produto dos termos constantes dos
binômios resultantes. Por exemplo, dado o trinômio x2 – 8x + 12, fatorar o 12
escrevendo 12 = 2.2.3 = 2.6 e testar a soma desses fatores, no caso 2 + 6 = 8.
Assim, obtive melhores resultados para os trinômios.
E seguindo essa mesma estratégia para os binômios do tipo x2 – 16 ou x2 +
5x, sugeri o registro do termo nulo. Dessa forma, x2 – 16 poderia ser escrito como x2
+ 0x – 16 e x2 + 5x, como x2 + 5x + 0. A partir disso, a fatoração se dava pela soma
e pelo produto novamente. Assim, todos os alunos que realizaram as fatorações, as
fizeram dessa forma. Contudo, ressaltei que essas fatorações poderiam ser feitas de
forma direta, sem colocação do termo nulo. Ou seja, x2 – 16 = (x + 4).(x – 4), no qual
expliquei que os termos constantes dos binômios teriam que ser simétricos, pois
como o termo de x não aparece, isso indica que a soma desses números é zero e o
produto deveria ser igual a -16. Para o caso do polinômio x2 + 5x, apenas escrevi x
como um fator comum e fiz sua fatoração direta x2 + 5x = x.(x +5).
 Terceiro estágio – Equações do 2º grau
Aproveitando o trabalho desenvolvido pelos alunos com fatoração do trinômio
do 2º grau, iniciei o cálculo de raízes de equações do 2º grau. Antes discutimos a
77
respeito do produto de dois fatores ser igual a zero. Ex. Quais as possibilidades de A
. B = 0, sendo A e B dois números?
Em seguida foi mostrada a equação x2 – 5x + 6 = 0. Fizemos a fatoração do
trinômio e obtivemos (x – 2) (x – 3) = 0, donde calculamos x = 2 ou x = 3. Foram
calculadas raízes de algumas equações do 2º grau completa ou incompleta,
conforme o exemplo 3 abaixo.
Exemplo 3
a) x2 – 25 = 0 => x2 + 0x – 25 = 0 => (x – 5) (x + 5) = 0 => x = 5 ou x = - 5.
b) x2 – 5x = 0 => x2 – 5x + 0 = 0 => (x – 0) (x – 5) = 0 => x = 0 ou x = 5.
Falei para os alunos que resolver uma equação do 2º grau é calcular o valor
da variável do polinômio do 2º grau para a qual seu valor numérico é igual a zero.
Essa explicação não ficou muito clara para os alunos. Então, fizemos a verificação
da igualdade em dois exemplos, calculando o valor numérico do trinômio para as
raízes encontradas.
Realizamos cálculos de raízes de algumas equações chamadas de completas
(com todos os coeficientes de seus trinômios diferentes de zero), até que questionei
sobre o que os resultados encontrados tinham de relação com os trinômios das
equações? A aluna Cláudia respondeu que “a soma dos números dava o número do
meio e a multiplicação deles dava o último número”. A partir daí indiquei que a soma
das raízes numa equação do tipo x2 – Sx + P = 0 seria o número S e o produto das
mesmas o número P. Deixei outras equações para eles resolverem em casa.
Durante a resolução das equações propostas na aula anterior usando a
técnica da fatoração do polinômio a aluna Marília falou “professor, estou cansada de
fazer essa matemática tendo que adivinhar”. Expliquei que era isso mesmo que eu
estava tentando levar o aluno a refletir e que a partir deste momento o trabalho seria
conduzido no sentido de encontrar um jeito de fazer a resolução das equações sem
ter que “adivinhar” os resultados. Essa percepção nos remete à restrição de uma
técnica como considera Chevallard (1999, p. 3, tradução nossa, grifos no original).
Em primeiro lugar, uma técnica ô – uma “maneira de fazer” – não tem
êxito mais que sobre apenas uma parte P(ô) das tarefas do tipo T a
78
qual é relativa, parte essa que se denomina alcance da técnica: a
técnica tende a fracassar sobre T \ P(ô) de maneira que se pode
dizer que “não se sabe, em geral, realizar as tarefas do tipo T”.
Foi muito importante a fala da aluna, pois pareceu nesse momento que
minhas intenções e objetivos estavam sendo realizados. Esta aluna percebeu a
dificuldade ou limitação da técnica, o que me proporcionou fazer um discurso sobre
o aprimoramento de uma técnica ou utilização de novas maneiras de enfrentar uma
tarefa, seja matemática, seja qualquer tarefa do nosso dia-a-dia. Nesse discurso,
exibi de maneira clara a intenção de buscar outra forma de calcular as raízes de
uma equação do 2º grau e mostrar a importância das generalizações que a álgebra
pode proporcionar. A partir daqui as fórmulas e os algoritmos podem ser
fundamentados por necessidades sociais e consolidados como facilitadores de
atividades com a Matemática.
Esse momento se configurou para mim como o envelhecimento do saber, ou
seja, o momento em que ficou claro que deveria agir e provocar a renovação do
saber, pois o aluno ao mostrar seu descontentamento com a técnica me leva a
refletir sobre as restrições da técnica que foi aplicada. Essa colocação feita pela
aluna fez-me pensar que o direcionamento que eu estava dando às aulas
encontrava-se realmente com minhas intencionalidades antes planejadas com meu
aluno hipotético.
Nessa mesma aula, distribui uma lista de exercícios (Apêndice 2) para que os
alunos fizessem fatorações e resolvessem equações fatorando inicialmente o
trinômio (2ª questão) ou colocando diretamente os resultados por soma e produto
das raízes. O exercício 3 consta de um tipo de tarefa “dados o perímetro e a área de
um retângulo, calcular suas dimensões”.
Exibi inicialmente a resolução do exercício 3, pois os alunos em princípio não
souberam responder como se calcula o perímetro e a área de um retângulo. Durante
a resolução recorri à forma da sala de aula para exemplificar o cálculo do perímetro
e da área do retângulo. Perguntei aos alunos como um carpinteiro colocaria
“molduras” de madeira que estavam nas paredes da sala? Um aluno respondeu que
o carpinteiro deveria fazer medidas. Perguntei “medidas de que?” O aluno Abraão
gesticulou com o indicador circulando e respondeu que “ele deveria medir todos os
79
lados”. Então eu disse que isso forneceria o... O mesmo aluno respondeu
“perímetro”. Daí, falei para eles que “o perímetro de um retângulo se dá pela soma
dos seus lados”. Para o cálculo de área desenhei no quadro uma malha retangular
(Figura 3) que representava o chão da sala e perguntei para os alunos como um
pedreiro faria para calcular a quantidade de lajotas do piso. A grande parte dos
alunos contou as quantidades de quadradinhos da fila horizontal e da vertical que
estão destacadas na figura e as multiplicaram, dando a resposta. Já o aluno
Domingos respondeu que “ele iria medir a largura e o comprimento da sala e
multiplicar os dois”. Expliquei, então, que “dado um retângulo sua área é o produto
das suas dimensões”.
Figura 3 - Malha retangular
Fonte: elaborada pelo autor (2009)
Em seguida, coloquei exemplos de retângulos com dimensões indicadas na
Figura 4 e calculamos seus perímetros e suas áreas.
Figura 4 - Retângulos e suas dimensões
12
15
8
6
Fonte: Elaborada pelo autor (2009)
80
Voltando à resolução do exercício 3, onde teríamos que calcular as
dimensões de um retângulo cujo perímetro é igual a 14 cm e cuja área é igual a 12
cm2, construímos o sistema abaixo.
2 x 2 y 14
x y 7
=>
x y 12
x y 12
Perguntei se isso não era algo já conhecido. A aluna Marília respondeu 3 e 4.
Exploramos esse problema nas próximas aulas.
Na parte final da aula pedi como uma tarefa de casa para eles fazerem a
diferença entre o quadrado da soma e da diferença de dois termos como, por
exemplo, (x + 2)2 - (x - 2)2 e que levassem o resultado na aula seguinte.
Alguns alunos que tentaram resolver a tarefa proposta no final da aula
anterior apresentaram erros de regras de sinais. Uma aluna conseguiu chegar ao
resultado 8x e pedi para ela expor seus cálculos no quadro.
Em seguida fizemos alguns exercícios análogos a esses, tais como:
(a + b)2 – (a – b)2 = 4ab, (x1 + x2)2 – (x1 – x2)2 = 4x1x2. Perguntei à turma se eles
haviam notado algo nesses resultados. Logo recebi a resposta da aluna Cláudia que
“sempre aparecia o 4 na frente das letras”. Retomei a atividade da aula anterior com
(x + 2)2 – (x – 2)2 = 4. x. 2 = 8x, para que eles percebessem o produto exibindo os
termos x e 2 dos binômios e esses multiplicados por 4.
Após isso, reescrevi a igualdade e chegamos à seguinte relação (x – 2)2 = (x
+ 2)2 – 4.x.2.
Em seguida pedi para os alunos calcularem y nas igualdades: a) (x – a)2 = (x
+ a)2 – y, b) (x’ – x’’)2 = (x’ + x’’)2 – y, d) (
–
)2 = (
+
)2 – y. Alguns alunos
chegaram ao resultado correto y = 4ax na equação (a). Após a correção de (a) no
quadro verde, mais alunos conseguiram fazer a equação (b) (y = 4x’x’’) e, na
equação (c) perguntei se eles poderiam fornecer-me a resposta sem fazer cálculos e
eles responderam y = 4
; mostrando assim, que tinham observado a regularidade
nos resultados. No final pedi para que eles substituíssem y pelo resultado
encontrado. Dessa forma, ficou estabelecido para a turma que ( + )2 - ( - )2 =
4
, ou que ( – )2 = ( + )2 – 4
realizado esta tarefa.
. Nenhum aluno questionou a razão de termos
81
 Quarto estágio – Sistemas de equações
Essa aula foi destinada à minha apresentação sobre uma forma de resolver
equações do 2º grau sem ter que “adivinhar” suas raízes. Iniciei com o sistema de
equações resultante da situação apresentada no exercício 3 que foi trabalhado em
aulas anteriores e está indicado abaixo como Sistema S3.
x y 7
x y 12
(Sistema S3)
Antes de solucionarmos tal sistema, mostrei o sistema do primeiro grau
(sistema S4) abaixo, no qual foram feitas perguntas aos alunos sobre quais seriam
os valores de x e y que satisfaziam as duas igualdades. Em pouco tempo houve
alunos que deram a resposta correta (x = 5 e y = 3).
x
x
y 8
y 2
(Sistema S4)
Falei, porém, aos alunos que isso voltava a ser adivinhação, tal como havia
dito à aluna Marília.
Então, indiquei que havia outros métodos para resolver tal sistema. Um
desses métodos é o da substituição e foi este utilizado para resolver o sistema S 4
para o qual também usamos o método da adição que é ensinado na 6ª série do
ensino fundamental. Em seguida foi usado o método da substituição na resolução do
sistema S3. Assim, surgiu a equação do 2º grau x2 – 7x + 12 = 0 com apenas uma
variável e a solução dessa equação eram os valores das variáveis x e y do sistema.
Ainda assim, voltamos novamente à adivinhação das raízes da equação e os alunos
calcularam mentalmente esses valores (x = 3 e y = 4). Dessa forma, discursei sobre
uma possível articulação de objetos matemáticos estudados até então com a
finalidade de encontrarmos uma técnica de resolução de equações do 2º grau sem
ter que “adivinhar” as raízes.
Assim, exibi a igualdade (p – q)2 = (p + q)2 – 4pq (igualdade 1) que já
havíamos trabalhado em aulas anteriores. Em seguida voltamos à equação x2 – 7x
+ 12 = 0 e reforçamos que a soma das raízes era igual a 7 (coeficiente do termo de
82
primeiro grau com o sinal trocado) e o produto das raízes era o termo independente
de x do trinômio, mantendo seu sinal.
A questão da troca de sinal na soma das raízes e da manutenção do sinal no
produto já havia sido trabalhada com a exibição do trinômio na sua forma fatorada.
Escrevi que numa equação do 2º grau de raízes p e q, temos que p + q = S e p.q =
P e a equação poderia ser escrita na forma x2 – Sx + P = 0. A partir da igualdade 1,
reescrevi o sistema S2 que havia exposto no texto do saber.
(Sistema S2)
Nota: Ressaltei que se o coeficiente numérico do termo de 2º grau fosse diferente de
1, por exemplo, 2x2 – 6x + 8 = 0, então deveríamos dividir todos os temos por esse
coeficiente para que a equação ficasse na forma de soma e produto, ou seja, 2x2/2 –
6x/2 + 8/2 = 0/2 => x2 – 3x + 4 = 0. Assim teríamos
S = 3 e P = 4.
A partir disso, as equações do segundo grau foram resolvidas usando-se o
sistema S2. Sugeri o uso de máquina calculadora para agilização dos cálculos. Após
a resolução de algumas equações feitas por meio sistema S2, a aluna Maria
Conceição interveio dizendo que não conseguia entender todo aquele cálculo que
estava no quadro e que estava com receio de tirar nota baixa na prova. Expliquei
para ela que não se tratava simplesmente de entender o que estava naquele
momento no quadro, mas sim de todo o processo que foi realizado até chegarmos
ao sistema que resolve qualquer equação do 2 o grau. Uma vez que foi feito um
trabalho abrangendo produto de polinômios (inclusive os produtos notáveis),
fatoração, equações do 1o grau entre outros conteúdos. Enquanto isso, outros
alunos estavam preocupados em solucionar as equações propostas usando o
sistema. O aluno Domingos foi ao quadro e mostrou a resolução de uma equação
usando o sistema S2.
Numa aula posterior foi feita a atividade (Apêndice 3) que serviu para a
avaliação, pois a escola se encontrava no período da 3 a avaliação. Foi um momento
de observar o fazer individual e em equipe, uma vez que eles se reuniram em quatro
equipes. Alguns alunos conseguiram desenvolver os cálculos por meio de debates
83
entre si, como o caso de Artur, Jorge e Pedro. A aluna Cláudia resolveu as questões
e tentou explicá-las às suas colegas de equipe. Os alunos Domingos e Marília
debateram sobre as questões, contudo no momento de resolver equações, o
Domingos optou por usar o sistema S3 e a Marília, por meio da soma e produto
(fatoração). A Maria da Conceição ficou apenas observando o debate da Marília com
o Domingos. Dois grupos não conseguiam fazer o registro do que estavam
debatendo, então os ajudei a fazê-los.
A resolução do Domingos (Figura 5) mostra que este aluno optou por usar o
sistema S3 (usar uma fórmula) para resolver as equações afirmando que “preferia
usar esta forma por ter certeza que chegaria ao resultado correto”. A aluna Marília
afirmou que “achava mais fácil” a resolução por fatoração, contudo não conseguiu a
resolução de todas as equações por essa técnica.
84
Figura 5 - Resolução do Domingos
Fonte: Caderno de anotações do aluno (2009)
Em aula posterior foram feitas as resoluções de algumas questões da
atividade anterior com o intuito de justificar o uso do sistema de equações. Os
alunos participaram respondendo as questões oralmente e eu fiz o registro dessas
respostas no quadro. Resolvemos as equações aproveitando as fatorações das
questões anteriores.
A aluna Marília disse que quando eu fazia a pergunta com as questões no
quadro ela conseguia entender melhor e dava as respostas corretas, contudo, se
fosse colocar o registro em seu caderno, não conseguia desenvolver com a mesma
85
segurança. Ressaltei a importância do registro no caderno e nas provas por se tratar
de algo com validação institucional.
Continuei discursando sobre as técnicas para resolver equações do 2 o grau e
voltei novamente ao sistema S1. Resolvemos a equação x2 – 3x + 2 = 0 usando
soma e produto. Todos disseram ter sido “fácil” a questão. Expus no quadro as
equações x2 – 7x + 5 = 0 e 2x2 – 5x + 3 = 0 e pedi para os alunos resolverem por
fatoração. Ninguém conseguiu resolvê-las de forma rápida e direta como as
equações anteriores. Assim, recorri ao sistema S2 e a resolução foi realizada com o
auxílio da calculadora. A partir disso, falei a respeito de uma fórmula que
poderíamos encontrar a partir do sistema S2. Aproveitando a equação 2x2 – 6x + 8 =
0, desenvolvi a fórmula usual de resolução da equação do 2º grau
x
b2
2a
b
4ac
.
Meu procedimento foi o seguinte:
Escrevi a equação do 2º grau sob a forma ax2 + bx + c = 0, onde a, b e c são
números reais, com a ≠ 0;
Por comparação escrevi junto com os alunos a = 2, b = - 6 e c = 8;
Coloquei o sistema S2 no quadro
S2
p q
p q
4P
S
Expliquei aos alunos que resolver a equação seria calcular as raízes p e q;
Perguntei aos alunos quais os valores de S e P. Após consultarem os seus
cadernos, alguns alunos responderam 3 e 4. Então substitui estes valores no
sistema, contudo escrevendo S = 6/2 e P = 8/2
6
2
p q
p q
6
2
2
4.
8
2
62
22
p q
=>
p q
6
2
4
8
2
62
p q
=>
p q
6
2
4.2.8
22
=>
86
62
p q
4.2.8
2
6
2
p q
Substituindo 6 por – b, 2 por a e 8 por c, obtive
( b) 2 4.a.c
a
b
, donde veio que
a
p q
p q
p
b
( b) 2 4.a.c
2.a
e q
b
( b) 2 4.a.c
. Como x é a variável da equação,
2.a
então escrevi de forma simplificada
x
b
( b) 2
2.a
4.a.c
Após expor a fórmula para os alunos, resolvemos a equação x2 – 5x + 6 = 0 e
deixamos para resolver outras na aula seguinte. Ressaltei para eles que a fórmula
resolve qualquer equação do 2º grau.
Solucionamos algumas equações do 2º grau usando a fórmula. Inicialmente,
mostrei alguns exemplos, e em seguida eles se reuniram em grupos para solucionar
algumas equações. O maior erro encontrado foi ainda com relação à regra de sinais.
No entanto, falei para aqueles que estavam com essas dificuldades e que no uso
repetitivo da fórmula poderíamos sempre estar reafirmando a regra de sinais.
 Quinto estágio- A importância da fórmula para resolução de equações
do 2º grau e para fatorar polinômios
Após a apresentação que fiz da fórmula de resolução da equação do 2º grau
em sua forma usual, escrevi algumas equações no quadro e pedi para que os alunos
as solucionassem em grupo, utilizando qualquer método. Durante a resolução das
equações eu estava apenas observando a resolução de alguns alunos. Observei a
87
aluna Cláudia e percebi que ela tentava resolver a equação x2 – 7x + 6 = 0 por meio
de fatoração do trinômio, fatorando primeiro o termo independente 6 para encontrar
os possíveis resultados para a soma e o produto.
Contudo, esta aluna decidiu
colocar a fórmula para resolver a equação, conforme a Figura 6.
Figura 6 - Resoluções da Cláudia (1)
Fonte: Caderno de anotações da aluna (2009)
Nesse momento, comecei a questionar com a aluna sobre os motivos pelos
quais ela optou pelo uso da fórmula e deu-se o seguinte diálogo.
Flávio: Cláudia, por que você optou por usar a fórmula? Você começou fatorando o 6
e decidiu usar a fórmula?
Cláudia: Os números que eu achei não deram certos (no caso 2 e 3). Os valores que
eu achei não me contentaram. Aí eu fui por um lado mais difícil.
Flávio: Tu achas que pela fórmula é mais difícil?
88
Cláudia: Não. Pela fórmula eu achei mais fácil. Como os valores que eu achei não
me contentaram, então eu fui pela fórmula. Eu sei que pela fórmula vai dar certo.
Flávio: Que valores não te contentaram?
Cláudia: Os valores que achei foram 2 e 3 (fig. 7), mas 2 + 3 = 5 e não 7. Eu sabia
que a fórmula ia me dar a resposta exata. Eu tentei fazer pelo outro método e não
deu certo.
A aluna se refere a outro método em relação à técnica da soma e produto
para calcular as raízes da equação. Contudo, mostrei a esta aluna que não seria
difícil encontrar as raízes por soma e produto, pois bastava continuar a fatoração do
termo 6 da equação, ou seja, olhar para os divisores próprios de 6, no caso, 1 e 6.
A Figura 7 mostra as resoluções da Cláudia de outras equações usando a
técnica da soma e do produto e também da fórmula e a tentativa da aluna em
realizar a fatoração dos trinômios, mesmo não sendo esse o propósito da questão.
Isso mostra que a fórmula tem sua utilidade não somente para calcular as raízes da
equação, mas para transformar o trinômio do 2º grau num produto de dois binômios
do 1º grau, tarefa intencional de engendrar a idéia de que fatorar é resolver equação
polinomial.
89
Figura 7 - Resoluções da Cláudia (2)
Fonte: Caderno de anotações do aluno (2009)
Isso revela que a aluna percebeu que há mais de uma forma de resolver a
equação e, mesmo tendo certeza do resultado apenas fatorando, ela confirmou sua
resposta usando a fórmula. Tomei essas resoluções como exemplo para destacar a
importância de fórmulas em Matemática como sintetizadoras de um fazer mais
simples e seguro, um aperfeiçoamento da técnica. Ressaltei que não podemos abrir
mão de técnicas de que dêem uma solução rápida, simples e segura às equações.
90
4.2 REFLEXÕES SOBRE A AÇÃO EM SALA DE AULA
A relação entre tarefa, técnica e tecnologia ficou evidenciada para mim desde
o planejamento do meu texto de saber, mas as aulas me encaminharam a refletir
sobre as tarefas e perceber um aspecto sobre a razão de ser delas no currículo.
Uma nova praxeologia construída por articulações e integrações praxeológicas só é
realmente exequível e aceita, se todas as praxeologias articuladas e integradas
forem do domínio do sujeito, inclusive do professor. No caso deste, se uma das
praxeologias articuladas não se faz presente em seu equipamento praxeológico,
este poderá abreviar essa praxeologia por mecanização ou algoritmização e
correlativamente não mudará sua relação com o objeto em uma nova praxeologia.
De outro modo, o não domínio de todas as praxeologias articuladas e integradas
interfere na mudança do equipamento praxeológico e correlativamente do seu
universo cognitivo de relações com o objeto da nova praxeologia.
Quando tomei a organização matemática posta por Silva e Guerra (2009)
para referência do meu texto de saber, considerei principalmente a concepção
teórica da transposição didática interna como o momento do professor de fazer valer
a transacionalidade do objeto de ensino por meio de articulações e integrações
praxeológicas e isso parecia ali ser contemplado.
Assim, busquei ir mais longe me pondo de modo a seguir uma
intencionalidade que iria catalisar as articulações, a tecnologia. Claro que tais
articulações estão sujeitas às restrições, em nosso caso, de ordem curricular. Só
poderia articular praxeologias constantes do currículo e isso parecia ser
contemplado na organização de referência, já que a princípio reconheci as
praxeologias ali postas, ou seja, faziam parte de meu equipamento praxeológico,
mas uma se mostrou não muito conforme com o que seria desejado.
Havia uma praxeologia que envolvia a relação entre quadrado da soma e
quadrado da diferença que se mostrou na praxeologia didática como uma
dificuldade. Essa praxeologia não fazia parte de meu equipamento praxeológico
como professor do ensino fundamental e isso me levou a tratá-la em sala de aula embora fosse um passo estratégico que resolve o problema - como algo mecânico
91
que em um momento lançaria mão e depois esqueceria.
O
trabalho
com
a
diferença entre quadrado da soma e da diferença de dois termos, ( + )2 - ( - )2 =
4
=> ( – )2 = ( + )2 – 4
, foi evocado por mim apenas quando estávamos
trabalhando com as equações do 2º grau, de tal forma que pareceu uma tarefa
isolada e não interligada aos objetos produtos notáveis e fórmula de resolução da
equação do segundo grau. Ou seja, isso não fazia parte do meu universo cognitivo,
nem das praxeologias que dispunha para o ensino fundamental, de tal forma que,
mesmo sendo direcionado pelo texto do saber anterior à sala de aula, minha ação
em sala foi redirecionada, de modo a recorrer a antigas práticas docentes como a
mecanização.
Assim, como pode ser notado em meu relato, no processo de resolução da
equação do segundo grau, após mecanizar a praxeologia em questão, eu a
abandono e assumo a resolução da equação do segundo grau como a resolução do
sistema de equações do primeiro grau que passa a ser obtido diretamente por uma
fórmula, processo esse que embaça realmente o pensar sobre o objeto equação do
segundo grau como o objeto sistema de duas equações lineares de duas variáveis,
pois o que permite pensar um como outro é a praxeologia não dominada por mim
para esse nível de ensino.
Tudo se passa como o sujeito que estuda a demonstração de um teorema e
seguindo as articulações de proposições válidas tem a sensação que essas surgem
como passos de mágicas ou adivinhações convenientes. Embora se perceba as
articulações, nada fica a posteriori. Não houve uma nova relação para mim enquanto
professor de ensino fundamental com o objeto de conexão entre o quadrado da
soma e o quadrado da diferença e o produto de dois números. Segundo Chevallard
(2009, p. 7, tradução nossa):
A formação de uma pessoa como sujeito de uma instituição, por
exemplo a formação profissional de uma pessoa, exige uma
dinâmica cognitiva e praxeológica resultantes da exploração
adequada dos novos assujeitamentos impressos especificamente
para a pessoa, que implica em um trabalho de identificação e
resolução de conflitos relacionados com o choque desses
assujeitamentos novos com assujeitamentos antigos, quando
experimentados pela primeira vez pelo indivíduo são incompatíveis
com a sua identidade.
92
Em meu caso, poderia dizer que o meu texto de saber foi construído
movimentando praxeologias dominadas por mim enquanto professor de diferentes
níveis de ensino. E isso não me despertou a possibilidade de uma dada praxeologia
envolvida não ser por mim dominada para o nível de ensino fundamental. Isso me
levou a abreviá-la quando em sala de aula. Naquele momento não tive a consciência
disso e quanto isso estava prejudicando o desenvolvimento por mim desejado da
nova praxeologia. Não surge para mim uma nova relação de conexão objetiva entre
as equações do segundo grau e a resolução de sistemas de equações lineares.
No entanto, minha ação em sala de aula fez revelar com força uma nova
relação com a fórmula da equação do segundo grau para o ensino fundamental, não
como um novo processo de articulações de praxeologias geradas à luz de uma
tecnologia que poderia otimizar o tempo didático e fazer acontecer as
transacionalidades, como pensei inicialmente, mas como uma síntese de um
processo complexo e árduo e que por isso teria que ser valorizada. Isso é enfático
em meus relatos. Deixo claro explicitamente em meus relatos essa intencionalidade
subjacente, desde a elaboração do texto do saber até a culminância em sala de aula
como revela o trecho de meu relato Tomei essas resoluções como exemplo para
destacar a importância de fórmulas em Matemática como síntese de um fazer mais
simples e seguro, um aperfeiçoamento da técnica. Ressaltei que não podemos abrir
mão de técnicas que dêem uma solução rápida e segura às equações, além de,
Nesse discurso, exibi de maneira clara minha intenção de buscar outra forma de
calcular as raízes de uma equação do segundo grau e mostrar a importância das
generalizações que a álgebra pode proporcionar. A partir daqui as fórmulas e
algoritmos podem ser fundamentados por necessidades sociais e consolidados
como facilitadores de atividades com a matemática. Esse pensar não é de quem
deseja as transacionalidades que podem levar a fórmula como consequência, mas
de quem deseja revelar a funcionalidade, ou aplicações, da fórmula.
Outra nova relação estabelecida é a relação entre fatoração de polinômios do
segundo grau e a resolução da equação do segundo grau. Não havia uma
praxeologia objetivamente falando em meu equipamento praxeológico para qualquer
nível de ensino sobre esse fazer para todos os tipos de equações do segundo grau,
incompletas e completas. Os livros textos não tornam visíveis as tecnologias e
tratam os tipos de equações de forma isoladas (completas e incompletas). O pensar
93
de uma tecnologia que dê conta de todos os casos, a leitura conveniente do teorema
fundamental da álgebra, foi estratégico e me fez olhar as equações, inclusive sua
fórmula, de modo único. Isso pode ser notado em meu relato quando escrevo “Isso
mostra que a fórmula tem sua utilidade não somente para calcular as raízes da
equação, mas para transformar o trinômio do 2º grau num produto de dois binômios
do 1º grau, tarefa intencional de engendrar a idéia de que fatorar é resolver equação
polinomial”.
Enriqueceu meu equipamento praxeológico e correlativamente meu universo
cognitivo, pois questões até então tratadas de modo não muito claro, ou errôneo,
nos manuais escolares, foram para mim esclarecidas. Para exemplificar, o livro de
Guelli (2005-b) trata a equação incompleta x2 - p = 0 como técnica/tecnologia para
resolução das equações completas, e para isso precisa mostrar a sua resolução.
Isso é feito alegando explicitamente e de modo meramente algorítmico que a raiz
quadrada de um número positivo assume dois valores, um positivo e outro negativo
o que segundo ele justifica escrever x= ±
x2 - p = 0 => (x -
)( x +
, quando a justificativa correta é que
)=0 que leva justificar que as raízes são simétricas.
Assim uma nova relação com as equações do segundo grau de fato foi
estabelecida e com forte nível de co-determinação didática, como busquei revelar
acima. Para isso, a praxeologia sobre cálculos de raízes de polinôminos, por mim
estudada no curso superior fundamentada na aplicação do teorema fundamental da
álgebra, quando estudada como saber indiscutível, ou intuitivamente verificável,
pôde se tornar uma praxeologia pontual para o ensino fundamental com
desdobramento surpreendente para o desenvolvimento da nova praxeologia didática
em questão.
Claro que a nova praxeologia didática de todo não foi prejudicada, pois
articula várias praxeologias do ensino fundamental presentes em meu equipamento
praxeológico que sem dúvida contribuíram para um fazer de articulação, mesmo
mecânico como por vezes pareceu em meus relatos, e a consequente mudança do
meu universo cognitivo como revelado anteriormente.
94
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao narrar a minha história de formação escolar e acadêmica até me tornar
professor de Matemática, seguida das formações continuadas que fiz na área de
educação matemática, busquei lembrar as praxeologias sobre a fórmula de
resolução de equações do 2º grau que usava e as mudanças, ou não, que
ocorreram ao longo de minha formação docente até os momentos de realização
deste trabalho, em que me deparo com um novo despertar com relação às equações
por meio da praxeologia matemática proposta por Silva e Guerra (2009). A partir
desse momento experiencio uma nova praxeologia didática em duas fases da
transposição didática interna, a primeira fase quando coloquei praxeologia
matemática no desfiladeiro do meu discurso (CHEVALLARD, 2005), e a segunda
fase do efetivo saber ensinado em sala de aula, com o propósito de encontrar o que
nas praxeologias que dispunha, o meu equipamento praxeológico até então, pode
ter favorecido, interferido ou mesmo ter ficado neutro às mudanças.
Para tanto, o presente trabalho foi estruturado de acordo com a formação de
meu equipamento praxeológico e o universo cognitivo em busca de construir uma
possível resposta a minha questão de pesquisa, a saber:
a) A experiência enquanto aluno do ensino básico e superior no curso de
Engenharia, e professor de aulas particulares.
A minha relativa intimidade com o saber matemático quando comparada com
a de outros alunos da escola básica me conduziu para o caminho do fazer docente e
formatou de certo modo minhas concepções de como ensinar Matemática. Embora o
saber matemático esteja presente, a minha relação com o saber ainda era frágil e
distante do fazer matemático dos professores licenciados em Matemática que em
tese teriam melhor domínio dos objetos matemáticos da escola. Nessa fase,
dispunha de uma praxeologia da escola sobre as equações do segundo grau
estudada enquanto aluno do ensino básico que norteou minhas ações desde a
primeira vez em sala de aula como professor e foi se reafirmando ao longo tempo
em meu convívio em outras instituições. As praxeologias matemáticas e didáticas
não estavam em discussão, ou eram indiscutíveis.
b) O papel dos livros didáticos.
95
A experiência que trouxe enquanto aluno das instituições de ensino básico e
superior e as experiências obtidas nas aulas particulares me deram a noção dos
conteúdos programáticos das turmas em que iniciei minha prática em sala de aula,
mas a praxeologia didática era fundamentada na praxeologia do livro didático que
formatou e conduziu minha ação docente, pois em sala de aula seguia o roteiro tal e
qual o do livro didático.
As praxeologias matemáticas e didáticas, e em particular a das equações do
segundo grau, foram progressivamente internalizadas e se tornaram rotineira de
modo que os objetos matemáticos eram indiscutíveis em minhas preocupações
enquanto professor. Essas se restringiam a questões de como fazer os alunos
estudarem mais, ou melhor, como motivá-los a estudarem.
c) A formação inicial no curso de licenciatura em Matemática.
A conclusão do curso de licenciatura não favoreceu mudanças significativas
em minha prática docente, mais precisamente sobre a praxeologia didática que
dispunha sobre a resolução das equações do 2º grau. Embora essa formação tenha
sua importância por oferecer um repertório mais amplo sobre os saberes
matemáticos e, em particular, sobre o jeito de fazer e pensar o conhecimento
matemático, inclusive sobre os objetos de ensino como a equação do segundo grau,
mas em fazeres da matemática superior, não contribuiu para mudanças e, em última
análise, foi indiferente à praxeologia que dispunha, pois não houve durante o curso
nenhum tratamento dos objetos de ensino básico como tal, que permaneceram
indiscutíveis.
d) A formação continuada para uma mudança ou aprimoramento da prática.
A busca que fiz por formação continuada se deu no sentido de encontrar
sugestões
metodológicas,
principalmente
como
abordar
certos
conteúdos
matemáticos de modo a desenvolver, aumentar o meu equipamento praxeológico.
No entanto, no curso de especialização em Educação Matemática, não
encontrei “fórmulas” prontas e acabadas para a construção de praxeologias. Por
outro lado, encontrei fundamentações teóricas que fortaleceram e renovaram a
minha forma de agir e pensar em sala de aula. As (re)construções que fiz sobre as
praxeologias levaram-me a considerar aspectos independentes dos conteúdos
96
matemáticos, tais como o cotidiano, o social, o cultural. Em particular, ao ensinar a
resolução de equações do segundo grau, meu equipamento praxeológico e universo
cognitivo a respeito desse objeto matemático ainda era tal que não favorecia
mudanças sobre a praxeologia que dispunha.
A continuação da formação em nível de mestrado e os estudos da didática da
matemática revelaram-me a importância de minha relação pessoal com o saber na
minha prática docente. Pude pensar minha ação docente inicial com relação pessoal
com o saber que mobilizava objetos matemáticos, rígidos, isolados, prontos e
acabados em si, como a fórmula de resolução de equações do segundo grau.
Nos estudos da transposição didática interna, quando contextualizados por
meio de uma praxeologia sobre equações do segundo grau, proposta por Silva e
Guerra (2009), em que a coloco em meu discurso na construção do meu texto de
saber, fez-me dar conta que as praxeologias em torno de objetos matemáticos
podem ser distintas em instituições distintas em um mesmo nível de ensino. Assim,
pude vislumbrar o objeto de ensino no sentido defendido por Chevallard (2005), da
transacionalidade, em meio de articulações e integrações de outros objetos
matemáticos transacionais em um projeto de ensino, aqui entendido como o texto do
saber.
Ao preparar o texto do saber a partir da organização matemática de Silva e
Guerra (2009) sobre a fórmula de resolução das equações do 2º grau, não encontrei
naquele momento dificuldades, pois reconheci neste imediatamente praxeologias
matemáticas pontuais como as dos produtos notáveis, resolução de sistemas de
duas equações lineares e duas incógnitas, fatorações de polinômios. É importante
destacar as mobilizações entre elas, as quais atendiam a intenção de encontrar a
fórmula por meio de um fazer conduzido por uma tecnologia que reclamava ser
justificada por uma teoria. Mostrava-se inteligível e, sobretudo, (re)significava as
praxeologias matemáticas pontuais em uma praxeologia matemática local. Sob esse
entendimento posso dizer que as praxeologias matemáticas de meu equipamento
praxeológico contribuíram fortemente para construção de uma nova praxeologia e
correlativamente para modificar minha relação com a fórmula de equação do
segundo grau.
97
Embora motivado pela gestão do ensino que poderia otimizar o tempo
didático para o estudo dos objetos matemáticos demandados na 4ª etapa da EJA,
nas ações em sala de aula houve momentos em que rompi com as articulações
entre as praxeologias pontuais como havia planejado, ora por ainda manter as
relações com os objetos do modo posto em praxeologias pontuais, ora por descobrir
que a praxeologia que detinha sobre um objeto não era adequada para a posição
ocupada na instituição ensino da EJA.
Assim, me parece claro que embora tenha havido uma nova relação com o
objeto, a fórmula da equação do segundo grau, materializada em uma praxeologia
matemática não se converteu plenamente em uma nova praxeologia didática.
Há que se repensar a praxeologia matemática de modo a tornar mais
exequível a praxeologia didática para a EJA, mas isso inclui repensar a atividade
matemática que ora parece ter criado dificuldades, senão obstáculos, na construção
da praxeologia didática. Parece que na vontade de tornar mais rápida e simples
essa atividade, fui conduzido a isolar os objetos em praxeologias pontuais e isso
acaba por impedir, como gostaria, um fazer de articulações que se justificam à
medida em que se busca converter o problema em outros de praxeologia mais
simples, por exemplo.
Assim, a dinâmica praxeológica não é simples. Exige muito mais que um
conjunto de praxeologias matemáticas e didáticas conhecidas, bem como uma
compreensão do jeito de fazer e pensar as praxeologias didáticas e matemáticas
desse conjunto que permita construções inéditas de praxelogias, pelo menos para a
pessoa, por meio das praxeologias já dominadas por ela. Tal ineditismo sem dúvida
pode revelar novas relações com os objetos e a correspondente mudança do
universo cognitivo da pessoa.
As praxeologias matemáticas que dispunha, muito contribuíram para a
compreensão da organização matemática de referência que usei para construir a
praxeologia matemática a ser objeto de estudo. Mas, o jeito pontual de pensar e
fazer em sala de aula determinou as minhas ações docentes, como uma cultura de
fazer docente que não permite um olhar de ligações construídas para atender uma
intencionalidade sobre o objeto de estudo. Há que se romper com esse fazer cultural
do fazer pontual que se permita renovar o equipamento praxeológico didático.
98
A revolução que tomou conta do meu pensar sobre minhas praxeologias
docentes não implicou que uma praxeologia venha sobrepor outra, mas que a
prática docente, como equipamento praxeológico, vai sendo singularizada pela
dinâmica praxelológica que vai caracterizando o seu constante aperfeiçoamento. Tal
aperfeiçoamento não ocorre de forma repentina e por isso a história do docente
pode revelar a importância do papel das praxeologias matemáticas e didáticas em
meio à formação continuada para o desencadeamento de reflexões críticas sobre a
própria prática e o conseqüente aperfeiçoamento profissional docente.
99
REFERÊNCIAS
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Ciências e Matemáticas) - Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento
Científico, Universidade Federal do Pará, Belém, 2007.
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______. Praticando Matemática: 8ª série. São Paulo: Editora do Brasil, 1989(b).
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102
APÊNDICES
103
APÊNDICE 1 – LISTA DE EXERCÍCIOS 1
LISTA DE EXERCÍCIOS 1
1 – Efetue as operações
a) 4x . (2x + 3)
b) 3x . (x – 1)
c) x (x + 5)
d) x ( 2x + 3)
e) x ( ax + b)
f) 2a (a – b)
g) ay (a – y)
h) ax2(2x + ax)
i) (x + 2) (x – 3)
j) (x + 7) (x – 5)
k) (x – 3) (x – 2)
l) (x – 5) (x – 6)
m) (x – 1) (x – 7)
n) (x + 4) (x + 4)
o) (x + 5) (x + 5)
p) (x + 1) (x + 1)
q) (x – 2) (x – 2)
r) (x – 1) (x – 1)
s) (x – 5) (x – 5)
t) (x + 3) (x – 3)
u) (x – 6) (x + 6)
v) (x + 4) (x – 4)
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APÊNDICE 2 – LISTA DE EXERCÍCIOS 2
LISTA DE EXERCÍCIOS 2 (Fatoração e equações do 2º grau)
1- Fatore os polinômios abaixo
a) x2 – 7x + 12
b) x2 – 10x + 25
c) x2 – 5x
d) x2 – 16
e) x2 – 5x – 6
f) x2 – 5x + 6
g) x2 – 7x
h) x2 + 6x + 9
i) x2 + 4x – 21
2 – Faça cada polinômio da questão anterior igual a zero e solucione a equação
resultante.
3 – Quais as dimensões do retângulo da figura abaixo, sendo seu perímetro igual a
14 cm e sua área igual a 12 cm2 ?
105
APÊNDICE 3 – ATIVIDADE AVALIATIVA
ATIVIDADE AVALIATIVA (TRABALHO EM GRUPO)
1 – Efetue os produtos abaixo
a) (x + 2) . (x + 3)
b) (x – 4) . (x – 5)
c) (x – 5) . (x – 5)
2- Escreva os polinômios de forma fatorada como um produto de dois binômios
a) x2 – 9x + 20
b) x2 – 10x + 25
d) x2 + 5x + 6
3 – Qual a solução para as equações abaixo?
a) x2 – 9x + 20 = 0
b) x2 – 10x + 25 = 0
d) x2 – 5x – 24 = 0
4 – Quais as dimensões de um sendo seu perímetro igual a 20 cm e sua área igual a
24 cm2?
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