CASO
CLÍNICO:Cardiopatias
congênitas
Rafael Alvarez e Rodolfo Squiabel
Iamaguti
Coordenação: Sueli R. Falcão
Internato em Pediatria 6°ano- ESCS/HRAS/SES/DF
Brasília, 7 de fevereiro de 2012
www.paulomargotto.com.br
Identificação

J.S.A., 4 meses, sexo feminino, filha de
R.M., reside em Valparaiso
Queixa principal

Mãe refere que a filha fica cansada
durante as mamadas e é sempre muito
suadinha. Reclama também que a
criança é muito irritada.
HDA
Mãe refere que sua filha, desde que nasceu,
apresenta dispnéia que piora muito durante as
mamadas, associada a sudorese intensa e
irritabilidade. Há dois meses houve piora do
quadro. Nega febre, tosse ou cianose.
Na ocasião do nascimento, foi identificado na
criança um sopro sistólico significativo, mas a
criança recebeu alta com solicitação de exame para
ser realizado ambulatorialmente. Por certo motivo,
a mãe não realizou o exame e além disso foi
orientada pelo médico do posto de saúde que o
sopro cardíaco de sua filha poderia ser normal. Ela
somente realizou o exame solicitado na
maternidade quando o quadro de dispnéia de sua
filha se agravou e ela começou a notar a falta de
ganho de peso da criança. Aos 4 meses sua filha
está pesando 4,2kg.
Depois de realizar o referido exame em sua filha,
foi orientada, pelo médico que realizou o exame em
uma clínica particular, a procurar o PS do HRAS pra
mostrar o resultado.
Revisão de sistemas
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Mãe nega alterações nas fezes ou
urina.
Nega atraso no DNPM. Criança aos 4
meses sustenta bem o pescoço, fixa o
olhar e acompanha, se interessa em
pegar objetos.
Nega febre.
Antecedentes
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Pessoais: criança nascida de parto normal
pré-termo de 35 semanas devido rotura
prematura de membranas. Mãe G1 P1 A0,
realizou pré-natal desde o primeiro
semestre de gestação sem intercorrências.
Patológicos: mãe desconhece outras
doenças da criança.
Familiares: avô hipertenso. Mãe nega
familiares com história de doença cardíaca
ou alterações congênitas.
Condições socio-econômicas
e habitos de vida
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Fumo passivo. Tem tio fumante
residindo no mesmo lar.
Ocupação da mãe: do lar
Renda familiar aproximada: 1300,00
Pai operário da construção civil
Mãe nega uso de drogas durante a
gestação
Exame físico
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Inspeção geral: criança em REG, hipocorada +/4+,
taquipnéica, irritada e emagrecida. Apresenta-se anictérica e
acianótica.
AR: MVF presente, sem ruídos adventícios. Taquipnéia
importante (FR:70-75irpm), com esforço respiratório evidente.
Presença de tiragem subcostal e de fúrcula, associado a
batimento de asa de nariz. Saturação O2 em ar ambiente
95%
ACV: Pulsos periféricos femorais e braquiais simétricos, com
boa amplitude e ritmo regular. À palpação do precórdio,
presença de ictus de VD associado a frêmito intenso no 3º e
4º espaços IC na região para-esternal esquerda. À ausculta,
RCR em 2T, FC: 140bpm, B2 hiperfonética e presença de
sopro sistólico 5+/6+ no 3º e 4º espaços IC na região paraesternal esquerda.
Abdome: RHA presentes, timpânico, com Traube livre, indolor
à palpação e sem sinais de peritonite. Fígado palpável 1cm
abaixo do RCD. Baço impalpável.
Extremidades bem perfundidas e sem edemas.
Exames complementares
Hemograma
Hb: 9.1/ Htc: 26/ Leuc: 10.600 (Seg: 23,
EOS: 4, MONO: 3, LINF: 70)/ Plaq:
320.000
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Cardiopatias congênitas
Epidemiologia
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Enquanto na maioria dos adultos as
cardiopatias tem origem isquêmica, nas
crianças a origem é congênita na maior
parte dos casos.
Incidência 0,5 a 0,8% dos nascidos vivos e
o diagnóstico é feito na primeira semana de
vida em metade dos casos.
As cardiopatias congênitas são a principal
causa de morte em crianças com
malformações congênitas. Cardiopatia
Freq. (%)
CIV
30-35
Frequência:
CIA (secundum)
6-8
PCA
6-8
Fisiopatologia
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Na vida intra-útero, a maioria das
anomalias cardíacas são bem toleradas
devido a natureza da circulação fetal.
Na circulação fetal, VD e VE agem em
paralelo já que o leito pulmonar recebe
apenas 10% do CD de VD. Duas
estruturas possibilitam que o sangue
oxigenado proveniente da cava inferior
siga para a circulação sistêmica: forame
oval e ducto arterioso.
Fisiopatologia


Com o nascimento o leito vascular pulmonar
se expande fazendo com que o fluxo de VD
seja lançado no pulmão. O aumento da précarga do AE promove o fechamento
funcional do forame oval. O aumento da
PaO2 e a redução dos níveis de
prostaglandinas são potentes estímulos para
a obliteração do ducto arterioso.
O fechamento funcional dessas estruturas é
o que, em geral, promove o aparecimento
dos sintomas clínicos das cardiopatias canal
dependentes.
Classificação
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As cardiopatias congênitas dividem-se em
cianóticas e acianóticas.
Nas cianóticas ocorre shunt D-E e podem ou
não cursar com hiperfluxo pulmonar. (ex:
transposição de grandes vasos; T4F; atresia
tricúspide ou pulmonar)
Nas acianóticas ocorre shunt E-D e
geralmente o fluxo pulmonar está
aumentado (ex: CIV; CIA; PCA). Nos casos
de normofluxo pulmonar podemos citar
coarctação de aorta, estenose pulmonar e
estenose aórtica.
Etiologia
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
As anomalias cromossômicas cursam
frequentemente com cardiopatias. Na trissomia do
18 95% dos doentes tem CIV e 25% tem Tetralogia
de Fallot. Na trissomia do 21 50% tem anomalia
cardíaca, sendo a principal delas o defeito do septo
AV total.
Sinais sindrômicos sugestivos de cardiopatia
congênita: hipocalcemia; hipoplasia tímica;
anomalias de face.
Fatores ambientais
Defeito cardíaco
Rubéola congênita
PCA e estenose pulmonar
periférica
Síndrome do álcool fetal
CIV e Tetralogia de Fallot
Avaliação Clínica
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De forma sistemática:
CIANOSE: presença ou não
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA: presença
ou não
Rx TÓRAX: congestão pulmonar ou
não/ cardiomegalia ou não
ELETRO: sobrecarga ventricular
direita, esquerda ou ambas
ECOCARDIO: diagnóstico definitivo
Avaliação Clínica


CIANOSE: pode ser classificada em
central, periférica ou diferencial.
Cianose crônica está associada a
baqueteamento digital. Pode ser de
natureza pulmonar ou cardíaca.
No período neonatal a determinação
da natureza cardíaca da cianose é
decisiva para o tratamento precoce de
patologias que cursam com hipofluxo
pulmonar.
Avaliação Clínica


INSUFICIÊNCIA CARDÍACA: apresentação
clínica habitual das cardiopatias que cursam
com hiperfluxo pulmonar.
Sinais: taquipnéia, dispnéia, interrupção das
mamadas,
taquicardia,
precórdio
hiperdinâmico,
hepatomegalia,
sudorese,
atraso no ganho de peso e estatura e
irritabilidade.
SOPRO: pode ser a manifestação inicial de
uma cardiopatia, mas também pode ser
inocente. Pode estar ausente até em
cardiopatia grave.
Avaliação Clínica


ARRITMIAS: raramente uma arritmia é
manifestação de cardiopatia congênita
EXAME CARDIOVASCULAR:
A palpação dos pulsos é imprescindível.
Fornece dados sobre o coração esquerdo, via
de saída de VE e aorta.
Na palpação do precórdio observa-se o ictus e
sua magnitude e a presença de frêmitos ou não
Na ausculta deve-se avaliar a presença de
sopros identificando sua localização espacial e
temporal. A B2 tem grande importância
semiológica no estudo das cardiopatias.
SOPROS - EXERCÍCIO
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
Cardiopatias acianóticas
CIA
Introdução
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A CIA é indispensável no período fetal. Sua função é
permitir que o sangue oxigenado proveniente da cava
inferior atinja o segmento cefálico do corpo via AE, VE
e aorta ascendente.
Logo após o nascimento a resistência pulmonar cai, a
pressão do VD diminui e cessa o shunt D-E pelo
forame oval. Isso é o fechamento funcional do
forame.
É comum que a CIA esteja associada a outras
malformações cardíacas.
Há quatro tipos de CIA. Tipo ostium primum (mais
próxima das valvas atrioventriculares), tipo ostium
secundum, tipo seio venoso e tipo seio coronariano.
Fisiopatologia

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O septo interatrial é constituído de duas membranas (septo
primum e septo secundum) que permitem a passagem de
sangue
por
mecanismo
valvular.
O
defeito
no
desenvolvimento dessas estruturas constituiu uma defeito no
septo interatrial.
O fluxo E-D entre os atrios não é importante no RN e no
lactente jovem, pois o VD, nos primeiros anos de vida, ainda é
bem muscular e pouco complacente, mantendo uma pressão
na circulação pulmonar suficiente para impedir o shunt
excessivo. Os dois fatores que influenciam o hiperfluxo
pulmonar são: pressão arterial pulmonar (e VD) e o tamanho
da comunicação.
A complacência do VD vai aumentando e começa a ocorrer o
shunt E-D e a sintomatologia. O aumento do fluxo pulmonar
leva a dilatação da artéria pulmonar,aumento de VD e de AD.
Manifestações clínicas

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
Com freqüência as crianças são
assintomáticas e o diagnóstico de CIA é feito
através de um achado de sopro ao exame
físico.
Em outros casos pode haver: dispnéia,
palpitações e fadiga aos esforços; infecções
respiratórias e déficit ponderal; raramente
insuficiência cardíaca.
Sinais clínicos: desdobramento fixo e amplo
de B2; sopro sistólico mais audível em borda
esternal esquerda média e alta
Diagnóstico


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Os sinais radiológicos variam com a magnitude
do shunt E-D. Pode haver aumento de AD e VD,
aumento da trama vascular, tronco da pulmonar
abaulado e convexo à esquerda com dilatação de
ramo direito.
O eletro revela ritmo sinusal com onda P normal;
QRS alargado; padrão RSR’ em V1
Com o ecocardio é possível determinar o
tamanho e a posição da CIA, revelar aumento de
AD e VD, além de quantificar a relação entre o
fluxo pulmonar Qp e o fluxo sistêmico Qs. O
normal é uma relação Qp:Qs=1
Evolução e conduta


A evolução natural é benigna, sendo os defeitos
do tipo ostium secundum assintomáticos até a
terceira década de vida. Tardiamente os
pacientes apresentam insuficiência cardíaca,
arritmias atriais, hipertensão pulmonar e
insuficiências mitral e tricúspide. Esses sintomas
são decorrentes de sobrecarga hemodinâmica
como, por exemplo, a gravidez
Para os pacientes sintomáticos e aqueles
assintomáticos com relação Qp:Qs>2:1 devem
ser submetidos a cirurgia ou implante de prótese
para fechamento do defeito.
CIV
Introdução

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A CIV é a cardiopatia congênita mais
freqüente, sendo responsável por 2530% dos casos.
Geralmente as CIVs são de tamanho
médio ou pequenas e 50-60% evoluem
com redução de seu diâmetro e
fechamento espontâneo nos dois
primeiros anos de vida.
Fisiopatologia

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Dois fatores determinam a intensidade
do shunt e a gravidade da cardiopatia:
resistência vascular pulmonar e tamanho
da CIV
Da mesma forma que na CIA, o shunt ED presente na CIV não é muito
importante logo após o nascimento.
Entretanto, com a queda fisiológica da
pressão pulmonar, o shunt se intensifica
e as manifestações clínicas aparecem.
Manifestações clínicas
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Geralmente é ao final do 1º mês de vida que começam os
sintomas, com instalação completa ao final do 3º mês.
O tamanho da CIV influencia diretamente os sinais e
sintomas. Para CIVs pequenas (Qp:Qs entre 1-1,5:1), o
paciente é assintomático com ganho ponderal adequado. Há
B2 levemente aumentada e sopro sistólico em borda esternal
esquerda baixa. Para CIVs moderadas (Qp:Qs entre 1,5-2:1)
já ocorre hiperfluxo pulmonar, sobrecarga ventricular
bilateral, ICC, infecções respiratórias de repetição e déficit
pôndero-estatural. Para CIVs grandes (Qp:Qs > 2:1) o
diâmetro da CIV é maior do que o da aorta, levando a
aumento das cavidades esquerdas e grave hiperfluxo
pulmonar.
Sinais clínicos: ictus de VE deslocado, frêmito paraesternal,
sopro sistólico na borda paraesternal esquerda inferior rude
para CIV pequenas e menos rude para CIV maiores, B2
hiperfonética para CIV grandes
Diagnóstico
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Os sinais radiológicos podem não existir nas
CIVs pequenas. Pode haver aumento da área
cardíaca, aumento da trama vascular, tronco
da pulmonar abaulado.
O eletro das CIVs pequenas é normal, nas
grandes revela sobrecarga biventricular. A
onda T positiva em V1 sugere hipertensão
pulmonar.
Com o ecocardio é possível determinar o
tamanho da CIV e quantificar a relação entre
o fluxo pulmonar Qp e o fluxo sistêmico Qs.
Evolução e conduta
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CIVs pequenas fecham
espontaneamente. Logo as CIVs
pequenas e sem repercussão
hemodinâmica não têm indicação de
fechamento cirúrgico.
Para as CIVs maiores, o tratamento é
dividido em manejo clínico com controle
da ICC e manejo cirúrgico indicado para
pacientes não controlados clinicamente e
para aqueles com Qp:Qs>2:1.
PCA
Introdução

O canal arterial surge logo após a
emergência da artéria
subclávia
esquerda e seu fechamento funcional
ocorre em torno de 12 horas de vida,
enquanto o fechamento anatômico se
completa entre 14 e 21 dias.
Fisiopatologia


O desvio de sangue da aorta para a
artéria pulmonar depende da diferença
de pressão entre as duas circulações,
do comprimento e do diâmetro do
ducto.
Em grandes PCAs até 70% do DC de
VE é direcionado para os pulmões.
Quando não operados esses pacientes
tem um grande risco de desenvolver
doença vascular pulmonar.
Manifestações clínicas
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
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Paciente acianótico
Pulso de amplitude aumentada, pressão
arterial divergente às custas de redução
da PAD
Precórdio hiperdinâmico
Sopro contínuo ou em maquinária.
Doença vascular pulmonar levando a
cianose diferencial apenas em membros
inferiores.
Diagnóstico



Radiologicamente encontramos
aumento das câmaras esquerdas, da
trama vascular e da aorta ascendente.
No eletro: sobrecarga principalmente
de VE e AE
Ecocardio confirmação do diagnóstico
clínico.
Tratamento
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
Tem por objetivo fechar o canal,
através de implante de dispositivo
(Coil), cirurgicamente ou
farmacologicamente.
Inibidores de prostaglandinas estão
indicado em bebês prematuros para o
fechamento farmacológico do PCA.
COARCTAÇÃO DE
AORTA
Introdução



Essa alteração se caracteriza por um
estreitamento em qualquer ponto da aorta,
desde o arco transverso até a bifurcação
ilíaca.
98% das CoaA localizam-se depois da
emergência da subclávia esquerda, próximo
da origem do ducto arterioso (tipo
justaductal)
Pode ser uma lesão isolada, mas em 70%
dos casos vem associada com outra
anomalias cardiovascular.
Fisiopatologia


A gravidade varia de acordo com o grau
de estenose. Nas CoaA graves a patência
do ducto arterioso é fundamental para a
manutenção do suprimento sanguíneo do
seguimento inferior do corpo. Como esse
aporte é de sangue venoso ocorre
cianose diferencial em MMII.
O aumento da pós-carga (obstrução da
aorta) leva a hipertrofia de VE com ICC.
Manifestações clínicas
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
Importante!!! RN com CoaA grave
desenvolve, logo após o nascimento, ICC
e cianose diferencial, levando a
hipoperfusão de extremidades e acidose
metabólica.
Esses
sintomas
são
decorrentes do fechamento funcional do
ducto arterioso.
Achados clássicos: diferença entre
amplitude de pulsos radiais e femorais,
diferença de PA no braço e na perna.
Pode haver sopro sistólico em borda
esternal esquerda baixa.
Diagnóstico
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Radiologicamente
encontramos
cardiomegalia global, erosões costais e
imagem do algarismo 3, provocada pela
dilatação pré e pós-estenótica.
O eletro releva hipertrofia biventricular
no período neonatal e hipertrofia
ventricular esquerda nos pacientes mais
crescidos.
O ecocardiograma define o diagnóstico
localizando a CoaA e identificando
lesões associadas.
Tratamento
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Em neonatos com CoaA grave o canal
arterial deve ser mantido pérvio
através do uso de prostaglandina E1
em infusão contínua.
O tratamento definitivo é cirúrgico.
OBRIGADO
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Caso Clínico: Cardiopatias congênitas