Vanguardas culturais européias:
ruptura e transformação
No agitado cenário europeu do começo
do século XX, a arte se renova em
diferentes movimentos. Em comum,
todos pretendem criar referências
estéticas mais adequadas ao dinamismo
dos novos tempos.
ODE TRIUNFAL
Fernando Pessoa
À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.
Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
(...)
Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!
(...)
Ó fábricas, ó laboratórios, ó music-halls, ó Luna-Parks,
Ó couraçados, ó pontes, ó docas flutuantes –
Na minha mente turbulenta e incandescida
Possuo-vos como a uma mulher bela,
Completamente vos possuo como a uma mulher bela que não se ama,
Que se encontra casualmente e se acha interessantíssima.
(...)
Eia comboios, eia pontes, eia hotéis à hora do jantar,
Eia aparelhos de todas as espécies, férreos, brutos, mínimos,
Instrumentos de precisão, aparelhos de triturar, de cavar,
Engenhos, brocas, máquinas rotativas!
Eia! eia! eia!
Eia eletricidade, nervos doentes da Matéria!
Eia telegrafia-sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente!
Eia túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez!
Eia todo o passado dentro do presente!
Eia todo o futuro já dentro de nós! eia!
Eia! eia! eia!
Frutos de ferro e útil da árvore-fábrica cosmopolita!
Eia! eia! eia, eia-hô-ô-ô!
Nem sei que existo para dentro. Giro, rodeio, engenho-me.
Engatam-me em todos os comboios.
Içam-me em todos os cais.
Giro dentro das hélices de todos os navios.
Eia! eia-hô eia!
Eia! Sou o calor mecânico e a eletricidade!
(...)
Vanguardas: ventos de
inquietação e de mudança
Nas três primeiras décadas do século XX, o cenário artístico europeu
também vivia um momento de grande agitação. Diferentes
movimentos artísticos, denominados vanguardas, surgiram para
estabelecer novas referências para a pintura, a literatura, a música e
a escultura.
A palavra “vanguarda” está hoje ligada a uma postura radical, que
antecipa um novo caminho, seja ele literário, artístico ou científico.
Por isso, as inúmeras obras de arte que surgiram no início do século
foram associadas a uma tendência vanguardista. Sendo diferentes
de tudo o que fora produzido até então, elas anunciavam novos
padrões estéticos para um mundo em transformação.
Um novo século, um novo olhar
Apesar de muito diferentes entre si, as vanguardas têm
em comum o questionamento da herança cultural do
século XIX. Havia um consenso de que os velhos
padrões de uma arte conservadora e cristalizada eram
coisa do passado: o novo século precisava criar as
próprias referências estéticas. É nesse contexto
histórico-cultural que nascem os vários “ismos”:
Expressionismo, Futurismo, Cubismo, Dadaísmo e
Surrealismo.
O projeto artístico das
vanguardas européias
O desafio enfrentado pelos artistas é claro: encontrar
uma nova linguagem capaz de expressar a idéia de
velocidade, capturar a essência transformadora da
eletricidade, o dinamismo dos automóveis. Por esse
motivo, toda a produção artística de vanguarda terá um
caráter de ruptura, de choque e de abertura. A ruptura
se dá com os valores e princípios do passado; o choque,
com as expectativas do público. A abertura é marcada
pela busca de novos modos de olhar e interpretar a
realidade em permanente estado de transformação.
As vanguardas e o público
As vanguardas lançaram manifestos. Esses manifestos
eram textos que divulgavam as propostas das novas
formas de expressão artística e definiam estratégias
formais para alcançá-las.
O espírito agressivo das vanguardas é confirmado pela
reação, de modo geral, horrorizada do público à
apresentação da primeira obra cubista: o quadro “As
senhoras de Avignon”,de Pablo Picasso, que mostra
cinco prostitutas nuas, com o rosto e corpo deformados.
Qual é a sua reação?
Expressionismo
O Expressionismo é a arte do instinto, trata-se de uma
pintura dramática, subjetiva, “expressando” sentimentos
humanos. Utilizando cores irreais, dá forma plástica ao
amor, ao ciúme, ao medo, à solidão, à miséria humana, à
prostituição. Deforma-se a figura, para ressaltar o
sentimento.
Predominância dos valores emocionais sobre os
intelectuais.
Corrente
artística
concentrada
especialmente na Alemanhaentre 1905 e 1930.
Munch foi um artista
determinado a criar
"pessoas vivas, que
respiram e sentem,
sofrem e amam".
Principais características:
* pesquisa no domínio psicológico;
* cores resplandecentes, vibrantes, fundidas ou
separadas;
* dinamismo improvisado, abrupto, inesperado;
* pasta grossa, martelada, áspera;
* técnica violenta: o pincel ou espátula vai e vem,
fazendo e refazendo, empastando ou provocando
explosões;
* preferência pelo patético, trágico e sombrio
Dejamil - A Gazeta, 12/04/2011
As telas expressionistas apresentadas por Anita Malfatti na Exposição de Pintura
Moderna representam um conjunto inédito para o público da época. Nas obras expostas
- como Homem Amarelo, por exemplo - são incorporados procedimentos básicos da
arte moderna: a relação dinâmica e tensa entre a figura e fundo; a pincelada livre
que valoriza os detalhes da superfície; os tons fortes e usados de forma não
convencional; as sugestões de luz que fogem ao claro-escuro tradicional; e uma
liberdade de composição. A novidade da pintora é apreendida pelos jovens artistas da
época: "Não posso falar pelos meus companheiros de então", indica Mário de Andrade
"mas eu, pessoalmente, devo a revelação do novo e a convicção da revolta a ela e à
força de seus quadros".
SONHOS – AKIRA KUROSAWA
Futurismo
- Desvalorização da tradição e do
moralismo;
- Valorização do desenvolvimento
industrial e tecnológico;
- Propaganda como principal forma
de comunicação;
- Uso de onomatopéias (palavras
com sonoridade que imitam ruídos,
vozes, sons de objetos) nas poesias;
- Poesias com uso de frases
fragmentadas para passar a idéia de
velocidade;
- Pinturas com uso de cores vivas e
contrastes. Sobreposição de
imagens, traços e pequenas
deformações para passar a idéia de
movimento e dinamismo;
Umberto Boccioni. A carga
dos lanceiros, 1915.
Felippo Marinetti: o iniciador
do movimento futurista
Futurismo
Umberto Boccioni,
Elasticidad, 1912.
Óleo sobre tela
O traço marcante desse
movimento é o
comprometimento político,
além das afinidades com o
fascismo estabelecidas a
partir de 1919, pois tanto
o Futurismo quanto o
fascismo debochavam das
democracia e do socialismo
e exaltavam a guerra.
Marinetti defende essas
idéias em seu manifesto:
“Nós queremos glorificar a
guerra – única higiene do
mundo –,o militarismo, o
patriotismo, o gesto
destruidor dos anarquistas,
as belas idéias que matam,
e o menosprezo à mulher”.
Cubismo
"Retrato de Picasso", de
Juan Gris (1912).
"Mulher com Violão", de Georges
Braque (1913).
Movimento artístico
que surgiu por volta de
1907 com Georges
Braque e Pablo
Picasso considerava a
obra de arte um objeto
real - ou seja, não
apenas algo que
imitava ou
representava outra
coisa. Com a
geometrização das
formas, foram
abandonadas as
noções tradicionais de
perspectiva.
Mulher que chora,
Picasso.
Os artistas cubistas procuravam novas maneiras de retratar o que viam.
Passaram a valorizar as formas geométricas e a retratar os objetos como se eles
estivessem partidos. Todas as partes de um objeto eram representadas num
único plano, como se o artista visse vários ângulos do objeto ao mesmo tempo.
Além da geometrização das formas e de abandonar a perspectiva, outras
características importantes do cubismo são a perda do uso clássico de claroescuro, a representação do volume colorido sobre superfícies planas o que faz o
quadro passar a sensação de relevo, quase como uma escultura.
Guernica é um painel pintado por Pablo Picasso em 1937 por ocasião da
Exposição Internacional de Paris. Foi exposto no pavilhão da República
Espanhola. Medindo 350 por 782 cm, esta tela pintada a óleo é normalmente
tratada como representativa do bombardeio sofrido pela cidade espanhola de
Guernica em 26 de abril de 1937 por aviões alemães, apoiando o ditador
Francisco Franco. Atualmente está no Centro Nacional de Arte Rainha Sofia,
em Madrid.
ENEM - 2002
O autor da tira utilizou os princípios de composição de um conhecido movimento artístico para
representar a necessidade de um mesmo observador aprender a considerar, simultaneamente,
diferentes pontos de vista.
Das obras reproduzidas, todas de autoria do pintor espanhol Pablo Picasso, aquela em cuja
composição foi adotado um procedimento semelhante é:
Dadaísmo
- Objetos comuns do cotidiano são apresentados
de uma nova forma e dentro de um contexto
artístico;
- Irreverência artística;
- Combate às formas de arte institucionalizadas;
- Crítica ao capitalismo e ao consumismo;
- Ênfase no absurdo e nos temas e conteúdos sem
lógica;
- Uso de vários formatos de expressão (objetos do
cotidiano, sons, fotografias, poesias, músicas,
jornais, etc) na composição das obras de artes
plásticas;
- Forte caráter pessimista e irônico, principalmente
com relação aos acontecimentos políticos do
mundo.
O dadaísmo foi um movimento artístico que surgiu na Europa
(cidade suiça de Zurique) no ano de 1916. Possuía como
característica principal a ruptura com as formas de arte
tradicionais. Portanto, o dadaísmo foi um movimento com
forte conteúdo anárquico.
Surrealismo
O termo surrealismo, cunhado por
André Breton com base na idéia
de "estado de fantasia
supernaturalista" de Guillaume
Apollinaire, traz um sentido de
afastamento da realidade comum
que o movimento surrealista
celebra desde o primeiro
manifesto, de 1924. Nos termos
de Breton, autor do manifesto,
trata-se de "resolver a contradição
até agora vigente entre sonho e
realidade pela criação de uma
realidade absoluta, uma suprarealidade".
A importância do mundo onírico, do irracional e do
inconsciente, anunciada no texto, se relaciona diretamente
ao uso livre que os artistas fazem da obra de Sigmund Freud
e da psicanálise, permitindo-lhes explorar nas artes o
imaginário e os impulsos ocultos da mente.
Destino / Salvador Dali & Walt Disney
Surrealismo
Bienal
Zeca Baleiro
Desmaterializando a obra de arte do fim do milênio
Faço um quadro com moléculas de hidrogênio
Fios de pentelho de um velho armênio
Cuspe de mosca, pão dormido, asa de barata torta
Minha mãe não entendeu o subtexto
Da arte desmaterializada no presente contexto
Reciclando o lixo lá do cesto
Chego a um resultado estético bacana
Teu conceito parece, à primeira vista,
Um barrococó figurativo neo-expressionista
Com pitadas de arte nouveau pós-surrealista
Ao cabo da revalorização da natureza morta
Com a graça de Deus e Basquiá
Nova York, me espere que eu vou já
Picharei com dendê de vatapá
Uma psicodélica baiana
Minha mãe certa vez disse-me um dia,
Vendo minha obra exposta na galeria,
"Meu filho, isso é mais estranho que o cu da gia
E muito mais feio que um hipopótamo insone"
Misturarei anáguas de viúva
Com tampinhas de pepsi e fanta uva
Um penico com água da última chuva,
Ampolas de injeção de penicilina
Pra entender um trabalho tão moderno
É preciso ler o segundo caderno,
Calcular o produto bruto interno,
Multiplicar pelo valor das contas de água, luz e telefone,
Rodopiando na fúria do ciclone,
Reinvento o céu e o inferno
Desmaterializando a matéria
Com a arte pulsando na artéria
Boto fogo no gelo da Sibéria
Faço até cair neve em Teresina
Com o clarão do raio da siribrina
Desintegro o poder da bactéria
Com o clarão do raio da siribrina
Desintegro o poder da bactéria
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