A FEDERAÇÃO BRASILEIRA: FATOS, DESAFIOS E PESPECTIVAS
Fernando Rezende e José Roberto Afonso *
Introdução
Após décadas de protecionismo e de um Estado intervencionista, a economia
brasileira expôs-se subitamente à competição externa e passou por um processo
acelerado de privatização. As reformas institucionais implementadas nos anos 90
ajudaram a estabilizar a economia e criaram um ambiente mais amistoso para atrair
investimentos e promover o crescimento. Apesar das incertezas que ainda pairam no
horizonte em relação às perspectivas de reconciliar o desenvolvimento sustentável e a
estabilidade macroeconômica, o balanço geral dos resultados alcançados na década
passada é positivo.
A federação afetou e foi afetada pela transição de uma economia fechada e
controlada pelo Estado para uma economia aberta e comandada pelos agentes privados.
Com efeito, quanto maior o grau de interesse dos governos subnacionais nas reformas
propostas, mais difícil foi executá-las. Em alguns casos, eles tiveram de ser induzidos a
aceitar mudanças que reduziam a autonomia estadual e municipal. Mesmo nos casos
em que os interesses federais não eram tão evidentes, o poder dos estados e dos
municípios no Congresso abriu espaço para negociar compensações para a menor
autonomia ou perdas financeiras.
Entre as reformas prioritárias na agenda de modernização da economia brasileira
durante os anos 90, três merecem atenção especial: privatização, emprego público e
previdência social e tributação. Tendo em vista o papel central dão ajuste fiscal na
estratégia para a estabilidade macroeconômica, essas reformas foram objeto de um
*
Fernando Rezende é economista, professor da Escola de Administração Pública da Fundação Getúlio
Vargas e foi Assessor Especial do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio. José Roberto
Afonso é economista e foi Superintendente da Área de Assuntos Fiscais e de Emprego do BNDES. O
artigo reflete as opiniões dos autores e não necessariamente a dos órgãos a que estão filiados. A base
estatística foi organizada pela economista Erika Amorim Araújo. O texto utiliza informações disponíveis
no final de dezembro de 2001, em particular, dados disponíveis no site “Banco Federativo”.
1
intenso debate e muita discórdia. Delas, a privatização foi o único caso de sucesso até
agora. Alguns avanços foram feitos na redução de exigências futuras sobre o orçamento
nacional, mas a reforma tributária permaneceu impermeável à necessidade de aliviar o
fardo excessivo sobre a competitividade da economia brasileira.
Este artigo pretende explorar as três reformas mencionadas acima, mostrar o que
foi realizado e indicar as principais razões dos fracassos na implementação de mudanças
mais profundas ou nas negociações. O foco da análise recai sobre os desafios que a
federação brasileira enfrenta na esteira das reformas institucionais que podem alterar o
equilíbrio de poder na federação e reduzir a autonomia dos governos estaduais e
municipais.
Com isto em mente, o artigo está organizado da seguinte maneira. Na primeira
seção, a fim de estabelecer o pano de fundo de uma visão do futuro, fazemos um breve
relato histórico dos principais fatos que estão por trás da decisão de adotar um regime
federal na Constituição de 1889. O principal objetivo dessa recompilação histórica é
sublinhar o fato de que uma feroz resistência a um governo central forte e algumas
tentativas importantes de secessão marcaram as sete décadas que precederam essa
decisão. Os motivos por trás desses movimentos – laços econômicos frouxos entre as
regiões do país e relações econômicas externas importantes dos estados brasileiros –
podem voltar novamente, repetindo o que era um traço comum no passado.
A segunda seção pretende resumir os desdobramentos recentes que deram forma
à federação brasileira de hoje. Dois fatos importantes tiveram uma influência decisiva: a
transição do regime autoritário para a democracia, após o fim do regime militar em
1985, e as políticas adotadas nos anos 90 para acabar com uma era de alta inflação,
centradas na eliminação do déficit público e na imposição da disciplina fiscal. Enquanto
a Constituição de 1988 apontava para uma maior descentralização e autonomia
subnacional, o esforço antiinflacionário exigiu duras restrições orçamentárias que
colidiram com a autonomia dos entes federados. Essas forças contraditórias tornaram
difícil harmonizar as necessidades macroeconômicas com a autonomia subnacional.
As questões envolvidas na avaliação das medidas adotadas para ajustar as contas
fiscais a fim de cumprir as metas estabelecidas no plano de estabilização
2
macroeconômica são o tema da seção seguinte. Essa parte destaca as dificuld ades
enfrentadas para implementar reformas destinadas a cortar gastos públicos e benefícios
da previdência social, bem como impor a disciplina fiscal em todos os níveis de governo
da federação brasileira. A assim chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em
2000, mostra boas perspectivas para o futuro próximo, mas ainda é cedo para fazer uma
avaliação definitiva de sua capacidade para sustentar a disciplina fiscal, tendo em vista a
resistência para alterar hábitos arraigados de desregramento orçamentário.
A quarta seção descreve o programa de privatização, seus sucessos e algumas
implicações. Em menos de uma década, a maior parte das antigas empresas estatais foi
vendida em leilões públicos, gerando recursos substanciais que ajudaram a evitar o
crescimento rápido da dívida pública e a destinar dinheiro dos impostos, anteriormente
usado para cobrir os subsídios, para necessidades sociais mais importantes. Além disso,
o programa de privatização contribuiu para aumentos de produtividade que reforçaram a
competitividade do setor industrial brasileiro nos mercados nacional e internacional.
A última das três reformas tratadas neste trabalho – tributária – é o tema da
quinta seção. Apesar de ser reconhecida como a mais importante das reformas da
década passada, foi impossível até agora chegar a um acordo quanto ao novo modelo de
equilíbrio tributário na federação, principalmente por razões relacionadas com conflitos
intergovernamentais e regionais. Essa seção alerta que esses conflitos podem aumentar
no futuro próximo, devido à possibilidade de haver maiores desigualdades regionais
internas após a integração econômica das Américas, na ausência de uma nova
abordagem para as políticas de desenvolvimento regional.
Enquanto as pressões macroeconômicas a favor de finanças públicas saudáveis
ajudavam a empurrar o programa de privatização e implementar restrições
orçamentárias duras, grupos de pressão e conflitos intergovernamentais bloqueavam a
aprovação de propostas mais ambiciosas para cortar mais fundo nos gastos públicos e
avançar na implementação da reforma tributária necessária para melhorar a
competitividade e estabelecer um regime federativo mais equilibrado. Outras pressões
que vêm do calendário da integração econômica regional podem dar novo ímpeto às
3
reformas institucionais que ainda são necessárias para uma integração bem sucedida da
federação brasileira à economia global.
1. História
Ao contrário do que se costuma pensar, a decisão de adotar um regime federal
no Brasil não foi uma mera imitação do modelo norte-americano. Desde o início, a
integridade do território brasileiro esteve ameaçada por tentativas de secessão. No
período colonial, as relações entre as províncias brasileiras praticamente não existiam,
não apenas por razões de distância e falta de meios de comunicação, mas também por
ausência de motivos econômicos para o intercâmbio. O comércio das matérias -primas
brasileiras era monopólio da coroa portuguesa, que mantinha relações bilaterais com as
províncias mais importantes.
As mudanças nessa situação foram provocadas pela instalação temporária da
Corte portuguesa no Rio de Janeiro nos primeiros anos do século XIX. O ressentimento
cresceu nas outras províncias, montando o palco para conflitos. A decisão de separar -se
de Portugal deu chance para que esses conflitos viessem à tona.
Após a declaração de independência, ocorreram importantes movimentos
separatistas. Alimentados pela ex-metrópole e apoiados pelas guarnições portuguesas
em seus territórios, as antigas províncias de Pernambuco, Bahia e Pará se recusaram a
reconhecer a autoridade do novo imperador. Tropas leais forçaram os rebeldes à
rendição, depois de onze meses de batalhas cruéis para manter a integridade do território
conquistado durante o período colonial. O projeto monárquico, concebido por José
Bonifácio, também ajudou a manter a unidade nacional.
Conforme Machado (1980), quando a Constituição de 1824 entrou em vigor, o
Brasil tinha dezoito províncias: Cisplatina (hoje Uruguai), Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, São Paulo, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo,
Bahia, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Maranhão e
Pará, às quais se acrescentou em seguida Sergipe. Sendo uma criatura da vontade do
4
imperador, a Constituição de 1824 pretendia reforçar o poder do centro sobre as
províncias, com o argumento de que era necessário mantê-las unidas.
Durante o curto período em que o primeiro imperador ficou no poder, outros
movimentos liberais ameaçaram a estabilidade do país, os quais se alimentaram de uma
animosidade manifesta entre os brasileiros nativos e os portugueses, aos quais o
imperador estava ligado. Com sua posição minada por disputas internas, dom Pedro I
foi forçado a renunciar. A 7 de abril de 1831, ele passou a coroa ao seu filho e voltou
para Portugal. Um governo interino assumiu a direção do país enquanto o novo
imperador não atingia a maioridade.
A decisão de dom Pedro de ir embora não foi suficiente para aplacar os liberais.
Durante o processo que levou à dissolução da Assembléia Constitucional e a decisão de
impor a Constituição de 1824, os principais líderes do movimento liberal expressaram
seu descontentamento com o autoritarismo do imperador. Batidos na primeira batalha,
eles não abandonaram a aspiração de instalar um regime constitucional ancorado em
princípios liberais, nos quais as idéias federativas tinham forte apoio.
Uma proposta de estabelecer um regime monarquista federal em 1834, quando a
Constituição foi substancialmente modificada, não teve sucesso. A principal mudança
introduzida nessa ocasião foi a criação dos órgãos legislativos das províncias que, ao
contrário da vontade dos federalistas, aumentou a centralização do poder político, ao
reduzir a autonomia que os municípios gozavam durante o período co lonial e nos
primeiro anos do Império. 1
Revoltas continuaram a desafiar a autoridade dos governantes durante a
Regência. No extremo norte, na província do Pará, uma revolta conhecida como a
Cabanada foi sufocada somente depois que as tropas federais sofreram vários revezes.
As forças leais ao governo central também sufocaram levantes na Bahia (Sabinada) e no
Maranhão (Balaiada), mas todos esses movimentos contribuíram para enfraquecer o
regime. A resposta dos que estavam no poder foi elevar ao trono dom Pedro II, em 1840
(quando ele estava com apenas 14 anos de idade), e tentar aumentar o controle do centro
sobre as províncias.
1
De acordo com Pedro Bauducchi, appud Toledo Machado 1980.
5
Das insurreições da época, a mais longa e sangrenta ocorreu no Rio Grande do
Sul. Conhecida como a Guerra dos Farrapos, ela durou uma década (1835-1845) e só foi
derrotada depois de muito esforço do exército imperial, que sofreu pesadas perdas
humanas e materiais. Os líderes desse movimento proclamaram a criação da República
de Piratini, um Estado independente e soberano e admitiram abertamente sua união, por
meio de uma federação, com outras províncias brasileiras que viessem a adotar os
mesmos ideais e o mesmo regime. 2
Em sua luta para evitar a fragmentação do território brasileiro, os governantes
imperiais não economizaram esforços. Além de ter de enfrentar insurreições que
explodiam em diferentes e distantes partes do país,3 O Brasil teve de se envolver em
conflitos militares externos com a Argentina (1852) e o Paraguai (1864-1870), para
refrear projetos expansionistas desses país es e sustentar a coesão nacional. Outros
conflitos de fronteira foram resolvidos por negociações diplomáticas.
Desde a independência, os conflitos entre reivindicações de maior autonomia
provincial e pressões a favor da centralização estiveram nas raízes de insurreições
contra o poder imperial. Numa época em que as relações econômicas entre as províncias
quase não existiam, a erupção desses conflitos não podia ser vista com surpresa, pois
não havia coincidência de interesses. Ademais, o impulso separatista foi alimentado por
uma correlação espúria entre liberalismo e descentralização, que atribuía ao puro
conservadorismo intenções de reforçar o poder central.
Não surpreende, portanto, que o nascimento da República tenha sido visto com
uma vitória do espírito liberal, cuja principal manifestação foi o movimento para abolir
a escravidão. A Constituição republicana de 1891 acolhia totalmente as idéias de
descentralização e autonomia federal, iniciando um ciclo que alterna períodos de
descentralização e centralização do poder e que ainda é um traço peculiar da federação
brasileira.
Os primeiros anos da República também foram palco de tumultos políticos e
reações contra o novo regime. Os militares, que desempenharam um papel decisivo na
2
Gonzaga Duque (1998), p. 168.
Além das mencionadas, a Regência e os primeiros anos do Segundo Império testemunharam rebeliões
em Minas Gerais, São Paulo (1842) e Pernambuco (1848).
3
6
derrubada do Império, logo se manifestaram contra os interesses liberais, dando margem
a novas insurreições, logo reprimidas com violência pelo marechal Floriano Peixoto,
que assumiu a Presidência da República depois da renúncia do primeiro presidente, em
1891.
Numa descrição completa das revoluções brasileiras durante os primeiros 75
anos da era republicana, Carneiro (1965) enfatiza o papel desempenhado por Floriano
na repressão aos principais movimentos que ameaçaram a consolidação da recém
fundada República: a revolta da Marinha e a Revolução Federalista. 4 A primeira teve
vida curta, mas a segunda, que abrangeu três estados do sul, durou mais de três anos,
sendo suprimida depois de lutas ferozes, com mais de dez mil baixas no Exército e
pesadas perdas materiais.
No início do século XX, a unidade do país não era mais motivo de preocupação.
Outros conflitos que surgiram na Primeira República (1889-1930) deveram-se mais a
condições sociais (Canudos, Revolta da Chibata) ou divergências políticas do que a
tentativas de secessão. A partir de então, as revoltas tiveram mais a ver com
centralização ou descentralização, apoiadas por interesses regionais, que ainda dominam
o debate sobre a natureza do federalismo brasileiro.
Em 1922, um movimento revolucionário conhecido como Revolta dos Tenentes,
marcou o começo desse novo período. Ele deu início ao processo que levou à ascensão
de Getúlio Vargas em 1930 e a um novo período de centralização do poder político. A
partir de então, a história da federação brasileira foi marcada por oscilações entre
períodos de centralização e descentralização, como destacam vários estudos sobre o
tema. À derrubada de Vargas em 1945 seguiu -se um período de descentralização que
durou até a instalação do regime militar, em 1964. Uma nova onda de descentralização
formada durante a transição para a democracia, no começo dos anos 80, tomou forma
definitiva na nova Constituição de 1988. A reprodução ao longo do tempo do que foi
observado quando a república substituiu a monarquia – uma associação espúria entre
4
Carneiro (1965:77) explica que a assim chamada Revolução Federalista não tinha o sentido de um
movimento federalista. Bem ao contrário, defendia a predominância do poder federal sobre os estaduais.
Seus principais objetivos eram instalar uma república parlamentarista (semelhante à que existia durante à
monarquia ), proibir a reeleição dos governadores de estado e dar mais autonomia aos governos locais.
7
centralização e autoritarismo e entre liberalismo e descentralização – não deu a devida
atenção às causas reais que fizeram o pêndulo oscilar, não permitindo assim encontrar
uma solução para essa instabilidade (para detalhes, ver box 1).
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Box 1
O movimento pendular – ciclos de centralização e descentralização na federação brasileira
1891-1930: Nas primeiras quatro décadas republicanas, a federação brasileira foi altamente
descentralizada. Um governo federal fraco foi acompanhado por estados independentes fortes,
com poder para regular e tributar o comércio interno e externo, além de serem responsáveis
pela provisão da maioria dos bens públicos.
1930-1945: A ditadura de Vargas levou a uma crescente concentração de poderes nas mãos
federais, para pôr em funcionamento um mercado interno mais integrado e estabelecer a base
para a industrialização. A regulamentação do comércio interno e externo passou para o
governo federal e criaram-se tributos nacionais. Reduziu-se a influência das oligarquias
estaduais nas políticas nacionais, embora os governos estaduais mantivessem autonomia para
aplicar seus próprios tributos e até criar outros.
1946-1964: A democratização após o fim da Segunda Guerra Mundial moveu o pêndulo de
volta à descentralização. A autonomia subnacional foi considerada necessária para apoiar
grandes responsabilidades e uma democracia estável. Porém, a concentração da produção de
manufaturados no Sudeste agravou as disparidades regionais e aumentou as rivalidades
políticas. Concederam-se incentivos fiscais para investimentos no Nordeste, com o objetivo de
reverter a tendência de concentração regional.
1964-1985: O advento do regime militar, após o golpe de 1964, levou o pêndulo de volta para a
centralização. Com esse objetivo, a reforma tributária da metade dos anos 60 desempenhou um
papel central. Os poderes tributários do governo federal foram reforçados, possibilitando um
aumento da carga tributária total para financiar a modernização da infra-estrutura e acelerar
o ritmo do desenvolvimento. Tal como na rodada de centralização anterior, os estados não
foram privados de sua autonomia para tributar. Com efeito, ganharam o poder de aplicar um
imposto sobre valor agregado de ampla base, em subst ituição do imposto sobre transações
existente. Ao mesmo tempo, foi instituído um mecanismo de partilha da receita para melhorar a
receita daqueles que tinham uma base tributária estreita.
8
1985-1990: A democratização levou a uma nova oscilação no sentido da descentralização. A
autonomia federalista se beneficiou com a decisão de dar aos estados o privilégio de tributar
petróleo, telecomunicações e energia elétrica, aumentando assim sua base tributária. Além
disso, um significativo aumento das receitas federais compartilhadas com os estados e
municípios foi benéfico para os estados menos desenvolvidos e os pequenos municípios. O
poder dos governos locais foi ratificado quando os municípios ganharam o status de membros
da federação.
1990-até agora: Forças opostas provocaram um resultado pouco claro. As demandas
macroeconômicas de ajuste fiscal e a coordenação política levaram a um aumento na parte do
governo federal da coleta total de impostos e a um grande controle sobre as dívidas
subnacionais. Do lado oposto, a exigência de eficiência e responsabilidade nas políticas
públicas impulsionou a descentralização nos gastos públicos. As pressões da globalização e da
integração regional tornam difícil encontrar um modo de harmonizar essas duas forças
opostas.
Fonte: Serra & Afonso (1999); Afonso (1994, 1995, 1996); Varsano (1996); Oliveira (1995);
Rodriguez (1995); Silva & Costa (1995); Camargo (1993). 5
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As raízes do problema se alimentaram das enormes desigualdades regionais.
Não por acaso, os momentos de virada desses ciclos estão associados a mudanças no
ambiente socioeconômico que enfraqueceram as forças que sustentavam o status quo. A
questão em pauta era a crescente preocupação em outras regiões – principalmente o Sul
e o Nordeste – com o domínio cada vez maior do Sudeste – São Paulo e Minas Gerais –
nos assuntos econômicos e políticos, após a abolição da escravatura e o primeiro
movimento de industrialização. A região mais próspera exigia um papel menor para o
governo central e mais autonomia estadual. As mais atrasadas viam em um governo
federal forte a única maneira de fazer seus interesses prevalecerem no planejamento de
políticas de desenvolvimento.
5
Para mais informações, ver Goldsmith (1986) sobre a história econômica do Brasil, Fausto (1995), sobre
a história brasileira, e Camargo (1993), Carvalho (1993) e Love (1993), sobre a questão da centralizaçãodescentralização.
9
Ao longo do tempo, os problemas regionais e sociais permaneceram
entrelaçados. A descentralização que ocorreu com a proclamação da República
aumentou o poder das oligarquias locais e gerou um descontentamento crescente com as
condições de vida da população, dando margem à rebelião de 1922 e ao início do
período autoritário instalado em 1930. As reformas sociais promovidas durante a era de
Vargas são um marco na história da política social brasileira, mas a duração de sua
ditadura (de 1930 a 1945) provocou o renascimento das idéias liberais que levaram à
derrubada de Vargas quinze anos depois de sua chegada à cena nacional. O
descontentamento social cresceu nas duas décadas seguintes e deu força a grupos de
esquerda que ameaçaram o regime, crise que desembocou no golpe militar de 1964 e
deu impulso a uma nova rodada de centralização. Vinte e um anos depois, o governo
democrático que assumiu o poder em 1985 pretendia melhorar as condições sociais, mas
obteve resultados modestos. As desigualdades sociais continuaram impermeáveis à
mudança das condiçõ es políticas e representam hoje desafios novos e maiores (a tabela
A2 oferece alguns números que mostram a associação entre desigualdade social e
regional).
2. Desdobramentos recentes
As forças centrífugas que levaram às atuais características da federação
brasileira estavam em atividade bem antes da Constituição de 1988. Na metade dos anos
70, os governantes militares projetaram uma transição gradual e controlada para a
democracia. Foi concedido um aumento de poder político às regiões mais pobres e aos
grupos locais para contrabalançar o domínio do partido de oposição nas áreas
industrializadas e aglomerações urbanas mais importantes. Ao mesmo tempo, um
programa agressivo de investimentos públicos em infra-estrutura nas regiões atrasadas,
seguido de um aumento das transferências federais para estados menos desenvolvidos,
forneceu a substância econômica para cumprir a meta de manter o controle federal sobre
o processo de abertura política.
10
A reforma política promovida em 1977 aumentou o número de representantes
dos estados mais pobres na Câmara Federal, adiou as eleições diretas para governador
para 1982, decretou que dois dos três representantes dos estados no Senado seriam
eleitos por um colégio eleitoral e reduziu à maioria simples o quorum para aprovar
emendas constitucionais no Congresso. Além disso, estabeleceram-se condições para
garantir o controle dos militares sobre o Colégio Eleitoral que decidiria a eleição
presidencial a ser realizada em 1985. Desse modo, o governo central assegurava o
controle sobre a política nacional. 6
Na frente econômica, a política regional contemplada no plano de
desenvolvimento nacional continha investimentos em infra-estrutura e programas
sociais voltados para as regiões menos desenvolvidas do Norte, Nordeste e CentroOeste. Juntos, esses programas previam investimentos para melhorar as condições do
crescimento econômico dessas regiões que totalizavam US$ 2,2 bilhões para o período
1975-79. Esses investimentos contribuíram para aproximar a renda per capita das
regiões menos desenvolvidas da média nacional, reduzindo assim as disparidades
internas até a metade dos anos 80.
Outro componente importante das medidas econômicas adotadas nesse período
foi o aumento constante da porcentagem da receita tributária federal transfer ida aos
estados e municípios, seguida de provisões especiais para beneficiar as regiões Norte e
Nordeste. 7
Durante o longo período de transição para o regime democrático, as demandas
de descentralização levaram a mais aumentos na transferência de receitas tributárias
federais para os estados e municípios. A porcentagem dos dois principais impostos
federais compartilhados com os estados e municípios por meio de fundos especiais – o
Fundo de Participação dos Estados e o Fundo de Participação dos Municípios –
6
O principal objetivo da reforma política de 1977 foi conter o avanço da oposição ao regime militar, uma
vez que seu sucesso nas eleições municipais anteriores aumentou o temor de que ela ava nçasse mais nas
eleições para governadores marcadas para 1978.
7
Dez por cento da quantia transferida aos estados em 1976 e 1977 e 20% em 1978 foram direcionados
para uma conta especial que seria distribuída exclusivamente para os estados do Norte e do Nordeste.
Esses mesmos estados também foram desobrigados de destinar parte desses fundos a investimentos.
11
aumentou novamente em 1984 e 1985, antes de chegar ao nível atingido na Constituição
de 1988. 8
A descentralização política também foi favorecida por esta Constituição, que deu
novo impulso ao desequilíbrio na representação dos estados no legislativo federal. A
partir de 1988, os estados pobres e menos populosos tiveram direito a um mínimo de
oito representantes na Câmara de Deputados, enquanto que os estados maiores ficavam
com um teto máximo de 70 representantes. Essas condições levaram a uma superrepresentação do Norte e uma sub-representação do Sudeste. A região Norte, que tem
8% da população do país, ficou com 14,5% dos assentos, enquanto que o Sudeste, com
43% da população, detém apenas 32,2% das cadeiras. Em casos extremos, o número de
votos necessários para eleger um deputado nos estados mais desenvolvidos é dezesseis
vezes maior do que nos estados menos desenvolvidos e populosos.
Como é comum em outras federações, a representação dos estados no Senado é
igualitária – três cadeiras, independente do tamanho ou da importância econômica.
Neste caso, o desequilíbrio resulta de um grande número de estados em regiões menos
desenvolvidas. Com 43% da população brasileira, as regiões norte, nordeste e centrooeste controlam 74% dos votos no Senado. Tendo em vista as atribuições especiais do
Senado brasileiro (todas as propostas legais e emendas constitucionais aprovadas na
Câmara precisam ser submetidas ao Senado, cuja aprovação é exigida para que entrem
em vigor), essa representação desproporcional no Senado se soma ao desequilíbrio na
representação política na Câmara dos Deputados. Isso levou Stepan (1997) a afirmar
que o Brasil é o principal exemplo do que ele chama de “uma federação democonstrangedora”.
Os desequilíbrios na representação política têm raízes no início da República,
aumentaram após a Segunda Guerra Mundial e chegaram ao ápice com a Constituição
de 1988. Uma indicação nítida da representação desproporcional na câmara baixa
brasileira – o desvio médio do ideal teórico de um homem, um voto – mostrou um valor
de 8,5 na eleição de 1988. Vale a pena observar, no entanto, que em casos de enormes
8
Esses fundos foram criados na Constituição de 1967 para partilhar o produto de impostos federais com
estados e municípios. A fim de distingui-los de outras transferências de recursos federais para governos
subnacionais, eles são chamados, às vezes, de Fundos constitucionais (ver adiante box para detalhes).
12
desigualdades regionais internas, uma representação desse tipo pode-se justificar, uma
vez que põe a questão regional na agenda nacional. Souza (1999) defende essa posição,
argumentando que numa situação como a do Brasil, uma condição democonstrangedora pode ser útil do ponto de vista da necessidade de dar atenção às
disparidades regionais.
Ao longo do tempo, as mudanças nos mecanismos de participação nas receitas
na federação brasileira estiveram intimamente associadas ao ciclo político, com a
centralização do poder político sendo acompanhada por um aumento da participação
estadual e municipal nas receitas federais (ver box 2 para detalhes).
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Box 2
Repartição das Receitas Tributárias
1964-1967: A reforma tributária feita pelo regime militar estabeleceu a base do atual sistema
de repartição da receita. Vinte por cento do produto dos principais impostos federais –
produtos industrializados (IPI) e renda (IR) –foram destinados em partes iguais a um Fundo de
Participação dos Estados (FPE) e um Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e
distribuídos de acordo com uma fórmula própria.
1968: A porcentagem dos impostos federais partilhados com os estados e municípios foi
reduzida à metade e foi criado um Fundo Especial formado com 2% dos mesmos impostos para
aumentar o controle federal sobre o uso dos recursos fiscais. A autonomia fiscal dos governos
subnacionais foi reduzida a um mínimo e permaneceu assim até o começo da transição gradual
para a democracia.
1975-1983: Emendas constitucionais promulgadas em 1975 e 1980 levaram a um progressivo
aumento da participação dos estados e municípios na arrecadação federal do IPI e do IR. Em
conseqüência, os estados e municípios recuperaram as perdas causadas em 1968 (a
porcentagem desses dois impostos que compõem o FPE e o FPM atingiu 10,5% em 1983).
1984-1988: A aceleração do ritmo da democratização aumentou a pressão dos governos
subnacionais por maior participação nas receitas tributárias. O FPE e o FPM aumentaram
novamente em 1984 e 1985, chegando respectivamente a 14% e 16% dos impostos federais. Ao
mesmo tempo, foram adotadas medidas para conter as tentativas federais de reduzir a
participação de estados e municípios nessas receitas.
13
1988: Com a nova Constituição, a porcentagem de impostos federais que compõem o FPE e o
FPM subiu novamente durante cinco anos consecutivos, atingindo 22,5% em 1993. Outros 10%
do IPI formaram um fundo separado para compensar os estados por não tributarem as
exportações de bens manufaturados. Além do mais, 3% do IR e do IPI foram destinados a um
fundo de desenvolvimento regional para financiar investimentos no Norte, Nordeste e CentroOeste.
Fonte: Varsano et alii (1988). Ver tabelas A3 e A4 para detalhes sobre o impacto das mudanças
nos mecanismos de participação da receita sobre a distribuição de receitas tributárias na
federação.
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A descentralização fiscal atingiu o auge na metade dos anos 90, quando foram
plenamente sentidos os efeitos das mudanças introduzidas pela Constituição de 1988. A
participação dos governos estaduais e municipais nas receitas tributárias disponíveis
subiu dos 30% de dez anos antes para 44%. Como mostra o gráfico 1, os municípios
foram os principais beneficiados das decisões adotadas em 1988, tendo aumentado sua
participação no bolo fiscal para 17% em 2000 (ver tabelas A3 e A4).
Apesar de seu ímpeto descentralizador, a Constituição de 1988 deixou as
sementes para uma rápida reversão. Sancionada dois anos antes da queda do muro de
Berlim e da subseqüente predominância das idéias liberais sobre os antigos ideais de
justiça social defendidos por governos fortes, ela aumentou a responsabilidade do
governo federal na garantia dos direitos sociais aos cidadãos brasileiros (ver box 3 para
detalhes) e abriu espaço para a criação de contribuições reservadas para financiar o livre
acesso universal aos serviços públicos.
Gráfico 1
Brasil: Arrecadação de Impostos e Receita Tributária Disponível - 1960, 1965 e
1970/2000e
14
100
100
80
80
60
60
40
40
20
20
0
0
2000
1996
Estadual
1992
1988
1984
Federal
1980
1976
1972
1960
Local
2000
1996
Estadual
1992
1988
1984
1980
1976
1972
1960
Federal
Local
Fonte: Tabelas A.3 e A.4
e: preliminar
Na prática, a nova Constituição instalou um regime fiscal duplo. O tradicional,
que atribuía poderes tributários na federação e criava mecanismos de participação nas
receitas, e um novo, relacionado especificamente ao financiamento de políticas sociais,
ao qual se aplic am normas mais frouxas. Uma vez que mais da metade das receitas
arrecadadas pelos mais importantes tributos federais – imposto de renda e imposto
sobre produtos industrializados – seria transferida aos estados e municípios, o resultado
era fácil de prever. As autoridades federais tiveram de contar cada vez mais com
contribuições sociais para cumprir suas responsabilidades sociais, o que não somente
interrompia a tendência à descentralização observada desde a metade dos anos 70, como
também levou a uma deterioração indesejável na qualidade do sistema tributário
brasileiro.
A deterioração das condições econômicas após a abertura do mercado brasileiro
à competição externa não permitiu que estados e municípios exercessem plenamente a
autonomia supostamente concedida pela descentralização política e fiscal. De um lado,
uma taxa média baixa de crescimento econômico não permitiu que se concretizassem os
ganhos de um aumento da competência para tributar e das transferências recebidas da
União. De outro, a necessidade crescente de implantar a disciplina fiscal, a fim de
evitar problemas macroeconômicos, acarretou restrições maiores à despesa, de tal modo
15
que um instrumento dos mais importantes para o exercício do poder político nos estados
e municípios – o orçamento – foi severamente afetado.
______________________________________________________________________
Box 3
A Previdência Social na Constituição de 1988
Numa reação à ênfase atribuída aos problemas econômicos durante o regime militar, a
Constituição de 1988 aumentou o papel do Estado em áreas sociais, com atenção especial para
os sistemas de aposentadorias dos trabalhadores privados e servidores públicos. Entre as
mudanças introduzidas no regime geral estavam um aumento de cobertura, uma redução de
cinco anos na idade de aposentadoria para trabalhadores rurais e um aumento nos benefícios
concedidos a eles. O boom em aposentadorias rurais que se seguiu atingiu seu pico em 1994.
Todos os servidores públicos ganharam estabilidade no emprego e o direito de receber
aposentadoria igual ao salário dos funcionários da ativa. Junto com provisões para
aposentadorias mais curtas (após 35 anos de serviço para os homens e 30 anos para as
mulheres), essas regras ajudaram a aumentar o número de servidores aposentados nos anos 90
(o medo da perda de alguns benefícios, incluída em propostas de reforma da previdência,
também ajudou a aumentar o número de pedidos de aposentadoria).
O impacto financeiro dessas medidas foi impressionante. Os recursos necessários para
pagar as aposentadorias elevaram-se de 44% dos gastos federais com pessoal em 1988 para
51,4% em 1995.
Além de aumentar os benefícios da previdência social, a Constituição concedeu a todas
as pessoas pobres incapacitadas ou idosas o direito vitalício de receber do governo federal um
benefício igual ao salário mínimo; estabeleceu o acesso universal ao sistema de saúde pública,
independente de filiação anterior a um fundo de pensão; e instituiu um orçamento social a ser
financiado com contribuições vinculadas.
Os recursos alocados aos gastos sociais em 1999 equivaliam a 16% do PIB – cerca de
US$ 82 bilhões, dos quais 60% referiamm-se aos benefícios da previdência social. Outros
componentes importantes dos gastos sociais são saúde, educação e seguro-desemprego.
Fonte: Amedeo et alii (2000); Giambiagi e Além (2000); Najberg e Ikeda (1999).
______________________________________________________________________
16
As restrições orçamentárias significaram para os estados uma menor capacidade
financeira para enfrentar as demandas d e serviços sociais e urbanos. Durante os anos 90,
as
finanças
estaduais
seguiram
uma
trajetória
que
refletia
as
condições
macroeconômicas instáveis, com uma parte crescente das receitas tributárias sendo
usada para cobrir despesas com pessoal, benefícios da previdência e juros da dívida
pública. Embora não pudessem lucrar plenamente com a descentralização fiscal, os
governos municipais foram pressionados a aumentar o esforço fiscal para atender as
demandas por maiores gastos sociais, tendo em vista o recuo das agências federais.
Assim, apesar da orientação constitucional para a descentralização da responsabilidade
de fornecimento de serviços sociais, um forte movimento nessa direção foi constrangido
pela falta de meios financeiros.
Na verdade, a provisão co nstitucional para descentralizar os gastos públicos com
programas sociais foi afetada pela centralização das receitas reservadas para esse
propósito. As contribuições sociais continuaram sendo de competência exclusiva do
governo federal (com exceção das contribuições para o sistema de aposentadorias), que
controlava as decisões sobre a arrecadação e a utilização desses recursos. Ainda que
estudos empíricos mostrem que estados e municípios aumentaram o volume de recursos
aplicados em atividades sociais – educação e saúde, principalmente – o grosso dos
recursos financeiros necessários para melhorar a qualidade de vida vem das
contribuições sociais arrecadadas pelo governo federal. Além do desconto em folha que
sustenta os benefícios de pensão e aposentadoria, os recursos arrecadados com essas
contribuições aumentaram para 6,5% do PIB em 2000, muito acima da modesta cifra de
1,1% do PIB em 1990 (ver tabela 1).
Embora uma parte significativa da receita das contribuições sociais seja
devolvida aos governos subnac ionais por meio de negociações ad hoc (convênios),
existem provisões especiais anexadas ao seu uso, o que significa que a autonomia deles
é afetada. Além de não ter autonomia para dispor desses recursos, eles não têm garantia
de sua liberação no tempo. Esses recursos estão sujeitos a revisões anuais e a mudanças
nas relações políticas que não oferecem um terreno sólido para uma descentralização
sustentável das responsabilidades do Estado em políticas sociais. Entre 1996 e 2000,
17
dobrou a quantidade de dinheiro transferida aos estados e municípios para ajudar a
financiar o fornecimento local de serviços sociais, chegando a US$ 7 bilhões. Cerca de
dois terços desse total foram para serviços básicos de saúde, cujo financiamento
enfrenta agora mudanças que tentam reduzir a instabilidade na liberação de recursos.
Tabela 1
Receitas Nacionais de Impostos e Contribuições Sociais: 1988 e
2000e/
1988
2000
(% PIB)
Carga Tributária Nacional
22,4
32,7
Receita Tributária Federal 1/
15,8
22,0
Contribuições Sociais
Cofins
PIS/Pasep
CPMF
CSLL
1,1
0,8
0,3
6,6
3,6
0,9
1,3
0,8
Fonte: Araujo (2001).
e/ preliminar.
1/ Arrecadação total de impostos. Não exclui transferências aos estados e
municípios.
Cofins: Imposto sobre transações para programas sociais
PIS/Pasep: Imposto sobre transações para o seguro-desemprego
CPMF: Imposto sobre transações financeiras.
CSLL: Imposto sobre lucro líquido.
A interferência política no acesso aos recursos que se destinam a sustentar a
municipalização dos serviços públicos básicos pode levar a quatro situações distintas,
mostradas abaixo. A melhor situação é aquela em que a administração local é apoiada
pela mesma coligação que apóia os governos estadual e federal. O caso oposto ocorre
quando o governo municipal está desalinhado ao mesmo tempo com ambas as instâncias
superiores. Das alternativas intermediárias, a mais favorável é aquela em que o governo
municipal segue a linha política do governo federal, pois as relações diretas entre os
dois níveis de governo ganharam mais atenção no passado recente.
18
Padrões de relações intergovernmentais conforme as relações
políticas do Estado e do Município com o Governo Federal9
Estados
Alinhado
Alinhado
Muito Boa
Não Alinhado
Muito Ruim
Não Alinhado
Boa
Municípios
Ruim
Uma característica especial da federação brasileira que também resultou da
Constituição de 1988 é a elevação dos municípios à condição de membros da federação,
com os mesmos direitos e deveres dos estados. A federação de três camadas consagrada
na Constituição reflete a longa tradição de autonomia municipal no Brasil e levou a um
controle menor dos estados sobre seus municípios. Razões políticas e argumentos de
eficácia, baseados na idéia de que passar por cima dos estados aceleraria o processo de
propiciar aos municípios os recursos necessários para atender melhor às necessidades da
comunidade local, deram um grande impulso às transferências da União para os
governos municipais, em detrimento do papel dos estados membros da federação
brasileira.
A estabilização monetária, conseguida graças ao plano adotado em 1994 para
acabar com um longo período de adaptação a altas taxas de inflação, trouxe mais
dificuldades para a administração da política fiscal e local. Durante a época de inflação
alta, o método de postergar gastos e congelar salários dos funcionários públicos ajustava
facilmente as contas fiscais, ao mesmo tempo em que as receitas eram indexadas à
inflação. A eficácia dessa prática desapareceu com a moeda estável, resultando em
grande pressão sobre os políticos dos governos estaduais e municipais. De repente, eles
tiveram de encarar sérias restrições para ajustar seus orçamentos e ficaram
impossibilitados de atender às expectativas de seus eleitores. O problema assumiu uma
19
dimensão importante, uma vez que as autoridades que assumiram o poder em 1995, ano
seguinte à adoção do plano de estabilização, herdaram problemas derivados de políticas
de gastos frouxas de seus antecessores.10 Como mostra a tabela 2, as cifras de 1999 para
consumo e pagamentos de salários dos governos subnacionais estavam bem acima do
nível de 1988.
Tabela 2
Itens selecionados dos gastos públicos: 1998-1999
Federal
1988
1999
Consumo intermediário
Pessoal
Formação de Capital Fixo Bruto
Total
Consumo intermediário 2/
Pessoal
Formação de Capital Fixo Bruto
Total
Subnacional 1/
1988
1999
% PIB
2,1
4,1
4,7
6,5
2,1
1,6
8,9
12,2
Total
1988
1999
2,6
3,2
1,1
6,9
1,9
3,0
0,4
5,3
4,7
7,9
3,2
15,8
6,0
9,5
2,0
17,5
55
41
34
44
% Gastos não financeiros
32
45
68
100
32
59
68
100
20
66
80
100
30
56
70
100
100
100
100
100
Fonte: IBGE.
1/ estados e municípios
2/ compra de bens e serviços
Em 1995, as crescentes dificuldades financeiras foram enfrentadas com a
antecipação de receitas tributárias futuras mediante empréstimos bancários com altas
taxas de juros e atrasos nos pagamentos de fornecedores e salários. Isso levou a novas
pressões para renegociar as dívidas para com o governo federal, inclusive aquelas já
incluídas em renegociações anteriores (ver box 4 para detalhes).
9
As combinações possíveis delineadas acima referem-se ao alinhamento político com o governo federa l,
inclusive a coalizão que tem o poder no Congresso sobre o orçamento federal.
10
No final de 1994, os governos estaduais e municipais concederam generosos aumentos de salário aos
funcionários públicos, na crença de que os aumentos de receita dos primeiros meses do Plano Real
continuariam e ignorando o desaparecimento do imposto inflacionário.
20
A deterioração das contas fiscais dos governos estaduais e municipais na
segunda metade dos anos 90 foi principalmente uma conseqüência de fatores exógenos.
Um ingrediente importante da estratégia de estabilização monetária era a manutenção de
altas taxas de juros, aumentando o peso dos pagamentos de juros sobre os orçamentos
estaduais e municipais. Como essas taxas implicavam uma economia menos dinâmica,
as receitas próprias e as transferências federais não cobriam os compromissos adicionais
dessas esferas , aumentando o déficit subnacional. Portanto, a renegociação das dívidas
dos estados realizada em 1997 e 1998 não pode ser considerada propriamente um caso
clássico de “salvação”, pois as políticas macroeconômicas estavam por trás da
deterioração das finanças estaduais.
Enquanto o governo federal podia refazer sua situação fiscal aumentando a carga
tributária com contribuições sociais, as autoridades estaduais e municipais não tinham
essa possibilidade. Em conseqüência, o déficit primário dos governos subnacionais no
período 1995-98 podia ser compensado com um superávit nas contas federais, evitando
assim um resultado total negativo.
Pelas regras estabelecidas pela lei 9496/97, o governo federal assinou
renegociações de dívidas com 24 estados, num total de US$ 82 bilhões (equivalentes a
10,5% do PIB), em condições bastante favoráveis: trinta anos para pagamento e taxas de
juros fixas entre 6% e 7,5%. Além disso, o reembolso não deveria superar 15% das
receitas atuais (essa porcentagem poderia baixar até 11%). Por esses acordos, os estados
não poderiam emitir novos títulos até que suas dívidas totais fossem compatíveis com
suas receitas anuais. Se não cumprirem com seus compromissos, o governo federal tem
o direito de bloquear as transferências do Fundo de Participação dos Estados e os
estados perdem também os benefícios especiais do acordo.
______________________________________________________________________
Box 4
Calendário das renegociações das dívidas estaduais
21
1989: Depois do colapso do plano de estabilização lançado em 1986, a lei 7976 autorizou o
Banco do Brasil a refinanciar as dívidas dos estados por vinte anos. Por ser parcial – o
refinanciamento limitava-se a dívidas para com o Tesouro Nacional – essa operação fez pouco
para resolver os problemas financeiros dos estados, que continuaram a se deteriorar sob o
impacto de altas taxas de juros e inflação acelerada.
1991: A lei 8388 estabeleceu novas condições para refinanciar dívidas não incluídas na
renegociação de 1989. Vinte anos para quitar, com juros de 6% e pagamentos mensais
limitados a 11% das receitas no primeiro ano e 15% depois. Como as condições não foram
aceitas, essa proposta não se materializou.
1993: Conforme as diretrizes estabelecidas pela lei 8388/91, a lei 8727/93 possibilitou o
refinanciamento de dívidas pendentes para com instituições financeiras federais, inclusive
pagamentos devidos desde 1991. Os limites para reembolso foram baixados para 9% das
receitas no primeiro ano e 11% depois. Embora as novas condições permitissem a
regularização dos pagamentos da dívida, elas não cobriam todo o problema, pois as dívidas
para com os bancos privados e títulos não estavam incluídas.
1995: Depois do Plano Real, o governo federal mudou sua abordagem da renegociação das
dívidas dos estados e introduziu novas medidas para controlar o endividamento. A partir de
então, o refinanciamento estaria associado às reformas do setor público, incluindo
privatizações e condições para cumprir as metas estabelecidas para ajustar as contas fiscais.
Além disso, os novos acordos teriam de ser submetidos aos legislativos estaduais.
1996: Novas regras foram introduzidas pela Medida Provisória 1560, dando ao governo
federal poder para renegociar todos os tipos de dívidas. As negociações deveriam ser feitas
caso a caso, dependendo das medidas adotadas pelos estados. O objetivo final era trazer o total
das dívidas financeiras dos estados a níveis abaixo de suas receitas líquidas.
1997-98: A lei 9496/97 criou critérios a serem adotados nas renegociações, estabelecendo
metas para a dívida total, superávit primário, folha de salários, arrecadação de impostos e
privatização. Dos 27 estados, 24 assinaram acordos com o governo federal dentro das regras
desta lei.
Fonte: Lopreato (2000); Rigolon e Giambiagi (1999).
_____________________________________________________________________________
A crise financeira internacional trouxe mais dificuldades para a economia
brasileira e a federação. O remédio aplicado para combater o impacto das crises asiática
22
e russa – um aperto nas políticas monetária e fiscal – aumentou as dificuldades dos
estados e municípios para responder às demandas de suas populações. Com a economia
andando devagar, as receitas dos impostos não proporcionavam espaço suficiente para
melhorar as políticas públicas, gerando apreensão nas autoridades locais que pretendiam
fazer uso da emenda constitucional que permitia a reeleição em todos os níveis. Os
temores de que a reeleição no nível municipal não daria oportunidade de vitória aos
oponentes não se concretizaram. Somente 40% dos prefeitos foram reeleitos em duas
mil eleições municipais.
Para evitar o risco de repetir experiências passadas de sucessivas renegociações
das dívidas estaduais, que poderiam comprometer o cumprimento das metas fiscais
estabelecidas no acordo do governo federal com o FMI, fez-se um aperto no controle do
endividamento dos estados após a renegociação de 1997-98. A Resolução 78/98 do
Senado proibiu novos empréstimos de qualquer tipo aos estados que apresentassem um
déficit primário no período de doze meses anterior à aplicação, reduziu as margens de
endividamento e aplicou uma redução gradual na proporção dívida/receita. Os contratos
assinados com os estados também proibiam a emissão de nova dívida em caso de não
cumprimento da trajetória estabelecida para reduzir a proporção dívida/receita, ou
contrair nova dívida que pudesse alterar essa trajetória.
Do lado da oferta, controles criados pelo Conselho Monetário Nacional e o
Banco Central impuseram tetos à exposição das instituições financeiras a empréstimos
concedidos aos estados, municípios e instituições sob seu controle.
As duras restrições sobre a gestão de recursos fiscais no nível subnacional trouxe
resultados importantes de uma perspectiva macroeconômica. As contas fiscais
consolidadas dos governos estaduais e municipais atingiram um superávit primário de
1,1% do PIB em 2001, em comparação com um déficit de 0,7% em 1997 (ver tabela A.
7). Do ponto de vista dos serviços públicos urbanos, no entanto, o preço foi alto.
Como mostra a tabela 3, os gastos dos governos subnacionais em segurança
pública, transporte, habitação e serviços urbanos caiu 3,1% do PIB em 2000, de um
nível já baixo de 4,1% em 1996, embora a urbanização continuasse crescendo. O
mesmo não ocorreu com os gastos em serviços sociais – educação, saúde e saneamento
23
– que aumentaram dos 5,5% do PIB registrados em 1996 para 7% em 2000, devido ao
aumento das transferências de recursos do governo federal destinado a aumentar a
descentralização desses serviços.
Tabela 3
Gastos dos governos estaduais e municipais – funções selecionadas
1996 e 2000
Estados 1/
1996 2000
Segurança pública
Habitação & Serviços urbanos
Transporte
Saúde e Saneamento
Educação e Cultura
Previdência Social & Ajuda
Total
1,6
0,2
0,7
0,9
2,1
2,8
8,3
1,1
0,2
0,6
1,1
2,6
1,9
7,4
Municípios 2/
1996 2000
% PIB
nd
0,0
1,0
0,8
0,7
0,4
1,1
1,5
1,4
1,9
0,5
0,6
4,6
5,3
Total
1996 2000
1,6
1,1
1,4
2,0
3,5
3,3
12,8
1,1
1,0
1,0
2,6
4,4
2,5
12,7
1/ Fonte: IBGE (Despesas Públicas por Funções 1996 – 1998). Para 2000, a fonte é STN.
2/ Fonte: STN (Finanças do Brasil 1996 e 2000).
A prioridade esmagadora atribuída à estabilização monetária em uma época de
abertura econômica impôs outros constrangimentos à ação governamental, ao mesmo
tempo em que aumentava os conflitos no interior da federação. De um lado, a política
macroeconômica significava um golp e pesado na autonomia dos governos subnacionais
com conseqüências políticas importantes, como mencionamos acima. De outro lado, a
abertura da economia à competição estrangeira e a incapacidade do governo federal de
tratar dos desequilíbrios regionais levaram a um aumento dos conflitos entre jurisdições
que não favoreceu o avanço de importantes reformas institucionais. Alguns desses
aspectos são abordados adiante.
3. Federalismo fiscal, crise econômica e estabilização macroeconômica
24
Devemos destacar de saída que o ajuste fiscal necessário para dar suporte às
políticas macroeconômicas durante a segunda metade dos anos 90 foi resultado de:
a) um importante aumento das receitas arrecadadas no nível federal por meio de
contribuições sociais não compartilhadas por estados e municípios, as quais foram
responsáveis pelo acentuado aumento da carga tributária;
b) um corte nos investimentos públicos, com conseqüências negativas importantes para
a qualidade da infra-estrutura e dos serviços públicos básicos;
c) condições mais rígidas aplicadas à expansão da dívida pública estadual e municipal,
após as renegociações realizadas em 1997/98;
d) implementação de um importante programa de privatização, que liberou o governo
dos subsídios a empresas estatais ineficientes.
Os arranjos federais afetaram e foram afetados durante o processo de obtenção
da estabilização. De um lado, as dificuldades políticas encontradas para levar a cabo as
reformas necessárias para avançar no corte das despesas administrativas e dos
benefícios da previdência social não abriram espaço para cortar custos orçamentários,
forçando cortes em investimentos, que também afetaram a competitividade das
exportações brasileiras e sua capacidade de evitar déficits crescentes no comércio
exterior
11
(ver box 5 para detalhes). Como a privatização da infra-estrutura básica foi
acompanhada de um virtual desaparecimento da poupança no nível federal, as regiões
menos desenvolvidas viram desaparecer sua capacidade de reduzir a distância regional,
aumentando os ressentimentos no interior da federação.
Na direção oposta, os arranjos federais interferiram nas opções do governo
central com respeito ao ajuste fiscal. Levando em conta todas as condições ligadas à
utilização dos recursos administrados pelo governo central, inclusive transferências para
governos subnacionais, não há muito espaço para realocar despesas no orçamento
federal. Sobram menos de 10% para a manutenção dos serviços básicos e investimentos
menores. Assim, apesar do congelamento dos salários dos servido res públicos, vigente
11
Apesar das emendas constitucionais para reduzir alguns privilégios dos funcionários públicos e cortar o
déficit estrutural da previdência, em 2000, a folha de pagamentos dos estados e municípios continuava no
mesmo nível de 1996.
25
desde 1995, e de medidas tomadas para reduzir a taxa anual de aumento nos
pagamentos de aposentadorias, os investimentos do orçamento federal continuaram
praticamente inexistentes, enquanto o aumento de impostos ia para o pagamento dos
juros da dívida pública, que crescia junto com a política monetária apertada, e para
cobrir a meta estabelecida de superávit primário.
______________________________________________________________________
Box 5
Reforma do Serviço Público e da Previdência Social
Serviço Público
A Emenda Constitucional 19 proibiu a acumulação de cargos, modificou as regras para obter
estabilidade e acabou com o regime único para admissão, abrindo caminho para aplicar
normas mais flexíveis na contratação de novos funcionári os.
A Lei 9962/2000 permitiu a adoção de regras aplicadas aos trabalhadores do setor privado na
admissão de novos servidores públicos.
Previdência Social
A Emenda Constitucional 20 mudou as normas aplicadas na concessão de benefícios da
previdência social , a saber:
- elegibilidade para se aposentar depois de 35 anos de trabalho (30 anos para as
mulheres), dependendo da prova de ter contribuído para o sistema de previdência social;
- a possibilidade de aposentadoria precoce (cinco anos antes das condições acima) foi
cancelada, ampliando assim a vida útil da força de trabalho;
- os procedimentos para calcular o valor dos benefícios tornaram-se matéria de lei
ordinária;
- fim das vantagens especiais concedidas a professores universitários e empregados de
empresas aéreas, entre outras categorias profissionais;
- a idade mínima para aposentadoria no serviço público foi estabelecida em 60 anos
para os homens e 55 para as mulheres;
- a isenção de contribuições para a previdência concedida a instituições filantrópicas
submetida a critérios mais rigorosos;
- os novos servidores não adquirem os privilégios concedidos aos funcionários antigos;
26
- a contribuição das entidades públicas aos planos de pensão suplementares não pode
ultrapassar a contribuição dos funcionários.
A Lei 9876/99 mudou os critérios para determinar os valores das pensões após a
aposentadoria, com o objetivo de alcançar um equilíbrio atuarial no médio e longo prazo.
Fonte: Ministério de Planejamento e Najberg e Ikeda (1999.
______________________________________________________________________
Uma conseqüência importante foi um sério golpe na competitividade. Além de
sofrer com a falta de investimentos em infra-estrutura, a reintrodução de impostos
cumulativos no sistema tributário brasileiro é percebida por todos como sendo o pior
problema que afeta os produtores brasileiros no mercado mundial. Uma ampla pesquisa
realizada recentemente pela confederação brasileira de associações industriais revelou
que o sistema tributário é o principal vilão que prejudica o desempenho das exportações
brasileiras, bem como sua capacidade de manter sua fatia dos mercados internos. Tendo
sido abolido na reforma tributária de 1967, esse tipo de imposto – os impostos sobre o
faturamento mais a CPMF - responde agora por um quarto da arrecadação de impostos
federais e podem representar um fardo adicional da ordem de 11% do valor agregado
em setores com uma cadeia de produção mais extensa. 12
A volta dos impostos cumulativos não tem paralelo no mundo. Um estudo
recente de um firma de consultoria mostra que o Brasil destaca-se entre os poucos
países que ainda aplicam esse tipo de tributo. Dos 28 países incluídos nesse estudo (dez
da OCDE, oito da Ásia e nove outros da América Latina), os impostos cumulativos são
aplicados em apenas seis deles, com as seguintes alíquotas: Brasil, 3,65%; Argentina,
Bolívia e Filipinas, 3%; Venezuela, 1,5% e Colômbia, 1%. Na época em que o estudo
foi feito, somente o Brasil (0,38%) e a Colômbia (0,2%) aplicavam impostos sobre
transações financeiras, ao qual a Argentina aderiu depois. Esses dados mostram como o
sistema tributário brasileiro está distante das práticas adotadas por seus principais
competidores no mercado mundial.
12
Um estudo recente (Varsano et alii 2001) mostrou que a proporção da carga tributária total efetiva
desses impostos varia de 0,74% do valor agregado (serviços não comerciais) a 10,8% (produção de aço).
27
O excesso de dependência dos estados e municípios das transferências federais
também teve implicações importantes para a obtenção do equilíbrio macroeconômico.
Apesar de um mandato constitucional para revisar a fórmula adotada para distribuir as
transferências federais entre seus beneficiários, essa revisão jamais ocorreu. Algumas
tentativas de introduzir novas variáveis para corrigir os desequilíbrios no mecanismo de
partilha das receitas foram logo abandonadas, pois concluiu-se que era impossível
resolver os conflitos de interesse.
Para driblar a impossibilidade de co nseguir um acordo, adotou-se uma solução
prática em 1992: a participação de cada estado e município nos fundos federais foi
estabelecida mediante negociações baseadas em dados reais do ano anterior,
permanecendo fixa desde então. Como seria de se esperar, os estados mais
desenvolvidos e os municípios maiores perderam algumas posições no processo (ver
box 6 para detalhes).
______________________________________________________________________
Box 6
Critérios para distribuir o Fundo de Participação dos Municípios - FPM
Os critérios aplicados na distribuição das receitas federais através do FPM estabelecem o
seguinte:
- 10% do FPM vão para as capitais dos estados;
- 86,4% são distribuídos para todos os outros municípios;
- 3,6% compõem uma cota adicional para municípios com mais de 156.216 habitantes.
A cota individual das capitais dos estados está em relação direta com sua população e inversa
com a renda per capita dos estados.
A cota individual das outras cidades é estabelecida por índices derivados de uma fórmula que
favorece os municípios menos populosos. O índice varia de 0.6 para aqueles com menos de
10.188 habitantes a 4.0 para municípios com mais de 156.216 habitantes. Entre esses extremos,
16 faixas de população formam uma distribuição de índices individuais que crescem a taxas
decrescentes, permitindo assim transferências per capita menores à medida que a população
aumenta.
______________________________________________________________________
28
À medida que aumentavam essas transferências], o desequilíbrio já existente
ganhava mais ímpeto. Os orçamentos per capita em municípios pequenos atingiram
níveis três vezes mais altos do que os números correspondentes para áreas urbanas
densamente povoadas e grandes metrópoles. O mesmo se aplica aos estados, embora em
escala menor: os estados menos desenvolvidos e pouco populosos mostram orçamentos
per capita uma vez e meia maiores do que os mais desenvolvidos.13
O excesso de transferências trouxe distorções adicionais para a federação. Entre
elas, um incentivo financeiro à fragmentação política no nível local, que levou à criação
de 1.465 novos municípios na década passada – um aumento de 30% no número de
municípios nos últimos dezesseis anos. Como as regras estabelecidas na Constituição de
1988 permitiam a separação política de antigos distritos baseada apenas em um
referendo público realizado na região que pedia a separação, o resultado era facilmente
previsível, pois os novos municípios lucravam com a separação, deixando a outra parte
do município empobrecida.
Outra conseqüência negativa foi a perda de interesse dos contribuintes locais
pela política local. Como a maior parte de seus orçamentos vem de transferências, a
responsabilidade perante a população foi seriamente afetada. Com exceção da capital do
estado e algumas outras áreas urbanas importantes, as receitas próprias representam
menos de 20% das receitas municipais, significando que a clássica abordagem de
Tiebout da competitividade no nível local não se aplica ao caso brasileiro.14 Devemos
observar que o mesmo se poderia dizer dos estados, pois em doze dos 27 as receitas
próprias respondem por menos de 50% de seus respectivos orçamentos.15
13
Os dados de 2000 (SNT) mostram que o menor município brasileiro (Borá, SP) tinha uma receita per
capita de US$ 1.390, dos quais dois terços vinham do FPM. No mesmo ano, o município de São Paulo –
com mais de 10 milhões de habitantes – apresentava um orçamento per capita de apenas US$ 407, com o
FPM representando menos de 1% de sua receita. NO que se refere aos estados, o Amapá, com menos de
500 mil habitantes mostrava receitas per capita de US$ 912, das quais, mais de 70% vinham de
transferências, enquanto que o estado de São Paulo, com 37 milhões de habitantes, apresentava um
orçamento per capita de US$ 624 (menos de 0,3% de transferências).
14
Apesar do desincentivo ao esforço fiscal local embutido no sistema de participação nas receitas,
observou-se uma melhora significativa na arrecadação de impostos no nível municipal recentemente, com
praticamente todos os municípios mostrando algum esforço para usar a base tributária local.
15
Onze dos estados nessa condição pertencem às regiões norte e nordeste. O outro é o Distrito Federal.
29
O modo como a descentralização fiscal evoluiu na federação brasileira provocou
um crescente desencontro entre receitas e responsabilidades. De um lado, a dinâmica
socioeconômica levou a uma concentração cada vez maior das atividades econômicas
modernas e da população em cidades de porte médio e em grandes centros urbanos das
áreas industriais mais desenvolvidas do país. De outro, os critérios para distribuir os
recursos fiscais e financeiros foram na direção oposta e estes correram em maior
proporção para as regiões rurais menos dinâmicas e habitadas. Assim, enquanto uma
grande parte dos recursos públicos era destinado para despesas administrativas e de
baixa prioridade, as demandas por serviços básicos e urbanos em lugares mais
necessitados não conseguia encontrar meios financeiros para ser atendida
adequadamente.
Como foi mencionado antes, um mecanismo lateral para a cooperação
intergovernamental no financiamento da descentralização de responsabilidades cresceu
de acordo com o aumento da arrecadação de contribuições pelo governo federal
reservadas para o fornecimento público de serviços sociais. O aumento decorrente na
dependência dos estados e grandes municípios de recursos da União para atender
demandas básicas de seus habitantes diminuiu as possibilidades de que pessoas e
empresas lucrassem com a competição entre jurisdições na alocação das despesas.
Regras estabelecidas pelo governo federal levaram a uma maior padronização dos
gastos públicos, ao mesmo tempo em que as condições vinculadas ao acesso a
empréstimos das instituições financeiras federais também reduziam a autonomia dos
governos estaduais e municipais.
O aumento das transferências submetidas a negociações ad hoc também trouxe
implicações políticas negativas. Como o acesso aos recursos sofre com alianças
políticas voláteis, a qualidade dos serviços oferecidos pode deteriorar por motivos que
estão fora do controle administrativo dos governantes locais. Além disso, uma vez que
não há possibilidade de fazer projeções confiáveis dos fluxos financeiros no futuro
próximo, o processo de descentralização não avança em terreno sólido e está sujeito a
retrocessos.
30
Em vez de avançar na direção de consolidar a descentralização obtida em 1988,
os últimos desdobramentos recuaram, com aumento da interferência do governo federal
na tomada de decisões a serem implementadas no nível subnacional.
O impacto da abertura econômica também contribuiu para esse resultado. Ao ser
exposta à competição externa após séculos de isolamento, a indústria manufatureira do
Brasil perdeu terreno no mercado interno e não conseguiu participar nos setores mais
dinâmicos do mercado internacional. Em conseqüência, a conta do comércio nacional
deteriorou, indo de US$ 15 bilhões de superávit nos últimos anos da década de 1980
para um déficit de US$ 7 bilhões em 1997. Graças a uma forte queda nas importações,
após uma diminuição do ritmo da atividade econômica, o déficit externo deu lugar a um
superávit próximo de US$ 2 bilhões em 2001. 16
A vulnerabilidade externa tornou mais difícil encarar a crise financeira dos anos
90, sem sacrificar a autonomia federativa. Políticas monetárias e fiscais apertadas fo ram
acompanhadas por normas rígidas para governar as ações dos governos estaduais e
municipais. Além das reformas mencionadas acima, um componente importante das
medidas adotadas a fim de ajustar as finanças estaduais e municipais foi uma reforma no
setor financeiro que forçou a privatização dos bancos públicos estaduais.
A fragilidade desses bancos veio à tona na esteira da estabilização monetária,
dando ao governo federal a oportunidade para intervir. Criou-se um programa especial
para forçar os governadores a entregar o controle dessas instituições, em troca da
assunção pelo governo federal da responsabilidade de sanear a situação financeira delas
antes da privatização ou liquidação. Em conseqüência, restam somente oito instituições
financeiras nas mãos dos governos estaduais; as outras foram privatizadas, liquidadas ou
transformadas em organizações não-bancárias. O quadro abaixo resume a situação atual.
16
A balança comercial continuou positiva – com uma média de 10 bilhões de superávit – na primeira
metade dos anos 90, mas começou a exibir déficits crescentes em 1995, até atingir 7 bilhões em 1997.
Melhorias menores foram observadas nos últimos anos da década passada, até que a redução da atividade
econômica ajudou na volta para o lado positivo em 2001.
31
Bancos estaduais – situação atual
Privatizados
Sob controle federal
Liquidados
Agências financeiras não bancárias
Nas mãos do estado
09
06
10
16
07
Fonte: Ministério do Planejamento
Mais recentemente, uma importante lei aprovada pelo Congresso estabelece
condições duras a serem observadas na gestão das contas do governo para sustentar a
responsabilidade fiscal na federação. A assim chamada Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF), aprovada em maio de 2000, pretende impor a disciplina fiscal a todos os níveis
de governo, estabelecendo regras claras e objetivas para a administração de receitas e
despesas, dívida pública e ativos públicos. Enfatiza-se a transparência como condição
para o controle social das ações dos governos, a fim de que os contribuintes tomem
consciência do uso que os administradores públicos fazem dos recursos extraídos da
tributação. Entre as normas estabelecidas pela LRF, vale a pena notar:
a) limites para gasto com pessoal – a remuneração dos servidores públicos não
deve ultrapassar 60% das receitas líquidas correntes;
b) limites para o endividamento – o Senado pode aprovar uma revisão dos
limites atuais proposta pelo presidente da República;
c) metas fiscais anuais – o planejamento orçamentário deve estabelecer metas
fiscais para três anos consecutivos;
d) provisão para as despesas correntes – as autoridades públicas não podem
tomar medidas que criem despesas futuras que durem mais de dois anos sem apontar
para uma fonte de financiamento ou um corte compensatório em outros gastos;
e) provisão especial para anos eleitorais – a lei proíbe que governadores e
prefeitos em último ano do mandato antecipem receitas tributárias por meio de
empréstimos de curto prazo, concedam aumentos de salários e contratem novos
servidores públicos.
O não cumprimento das obrigações impostas pela LRF leva a várias penalidades
administrativas, às quais podem ser acrescentadas incriminações pessoais, incluídas
numa lei complementar (Lei de Crimes de Responsabilidade). Infrações mais graves
32
podem ser punidas com a perda do mandato, proibição de exercer cargo público, multas
e prisão.
Vale a pena enfatizar que todos os níveis de governo, inclusive o federal, devem
cumprir as condições estabelecidas pela LRF.
Uma avaliação preliminar, baseada em dados recentes, da situação das contas
fiscais de estados e municípios do ponto de vista do cumprimento das condiçõ es
estabelecidas pela LRF aponta para um cenário otimista, pois as receitas correntes
líquidas cresceram 14% e 17% respectivamente entre 1997 e 2000. Esse aumento da
receita possibilitou uma redução da proporção entre gastos com pessoal e receita em
todos os estados, de uma média de 60,9% em 1997 para 51,4% em 2000. Enquanto em
1997, cinco estados apresentavam uma proporção acima do teto de 60%, esse número se
reduziu para três em 2000. Os mesmos dados para as capitais apontam para uma média
de 41% em 2000, sem que nenhuma ultrapasse o teto estabelecido. Para os outros
municípios como um todo, a proporção das despesas com pessoas para as receitas
líquidas foi de 43% em 2000, com apenas 6,3% deles acima do teto de 60%
(Nascimento e Debus 2001).
Porém, os res ultados acima não refletem ainda a adaptação das finanças
subnacionais às novas normas criadas pela LRF, pois a lei entrou em vigência em maio
de 2000. Há indicações de que o crescimento das receitas diminuirá em 2001-02 e isso,
acoplado ao fato de que 2002 será um ano eleitoral, tornará mais difícil para os estados
e municípios sustentar os resultados obtidos em 2000 e propiciará um bom teste para o
futuro das contas fiscais. Contudo, o papel central desempenhado pela disciplina fiscal
na manutenção da estabilidade macroeconômica e na restauração do crescimento
econômico gera um cenário muito diferente para a gestão das contas fiscais, em
comparação com o passado. 17 Além disso, os políticos brasileiros passaram a perceber o
valor da moeda estável para o eleitorado e os riscos associados ao desmando fiscal.
A crise econômica dos anos 90 e as medidas adotadas pelo governo federal para
conseguir a estabilidade macroeconômica sob novas condições de exposição à abertura
17
No passado, a inflação permitia um ajuste fiscal fácil, pois as receitas estavam totalmente indexadas e
as despesas não. Além disso, uma economia fechada era menos vulnerável às percepções externas dos
riscos associados a um alto grau de endividamento público.
33
econômica e ao livre movimento de capitais forçaram a realização de importantes
mudanças que causaram um retrocesso parcial na autonomia federativa. Essas medidas
tiveram sucesso no objetivo imediato de sustentar a estabilização monetária, mas
provocaram baixos níveis de crescimento do PIB, falta de investimento em infraestrutura e deterioração da qualidade dos serviços sociais e urbanos. Embora o Brasil
tenha conseguido sobreviver à turbulência provocada pelas crises do México, da Ásia e
da Rússia, o preço pago, em termos de crescimento econômico e desigualdade social,
foi alto.
Até agora, as medidas administrativas e a imposição de fortes restrições
orçamentárias substituíram as instituições políticas como meio de atingir os objetivos
macroeconômicos. No processo, a federação não estava preparada para encarar os
desafios colocados pela globalização. As instituições políticas continuaram débeis,
comandadas pelo clientelismo e por velhos hábitos, e várias propostas de reforma
política completa não encontraram qualquer ambiente para prosperar.
Não obstante, para desespero daqueles que não acreditam na possibilidade de ter
disciplina orçamentária no nível subnacional sem uma forte mão federal para orientar as
ações de prefeitos e governadores, podemos encontrar alguns sinais positivos em casos
insuspeitados. No Nordeste, dois estados (Ceará e Bahia), governados por diferentes
grupos políticos por mais de 12 anos, mostraram resultados positivos muito importantes
na gestão do dinheiro público, merecendo a aprovação de suas respectivas populações.
Mais recentemente, o estado de São Paulo, que além de ser o mais rico da
federação brasileira, se notabilizou pelo mau comportamento na política orçamentária,
também fez um movimento importante na direção de manter uma situação fiscal
saudável.
As renegociações das dívidas estaduais também ajudaram a melhorar a situação
em todo o país. Entre 1997 (quando as renegociações começaram) e 2000, a dívida
pendente total de 26 estados – a federação brasileira tem 27 membros – caiu em 25%,
em média. Em conseqüência, a proporção dívida/receita agregada caiu de 2.86, em
1997, para 1.91 em 2000.
34
Além da necessidade de manter um ambiente macroeconômico saudável, os
principais desafios para a federação brasileira hoje são a retomada do crescimento
econômico e a redução das desigualdades sociais e regionais. Para essa finalidade, as
atuais regras que governam as relações intergovernamentais não dão uma contribuição
positiva. É necessária uma federação mais competitiva.
4. Privatização, regionalismo e conflitos intergovernamentais
A partir do começo dos anos 90, o Brasil começou a abandonar sua longa
tradição de governos intervencionistas. Pouco depois de sua posse, em janeiro de 1990,
o governo Collor lançou um ambicioso programa de privatização destinado a conseguir
resultados rápidos. Porém, apesar de algumas facilidades concedidas aos investidores
privados, a meta inicial de obter 17 bilhões de dólares em receitas da privatização nos
primeiros dois anos do programa revelou-se muito irrealista. As batalhas legais e a crise
política que culminou com o impeachment de Collor de Mello em setembro de 1992
foram os principais fatores por trás do ritmo lento do programa em seu início.
Durante sua primeira fase – 1990-94 –, 33 empresas públicas foram privatizadas,
propiciando ao Tesouro federal recursos da ordem de US$ 12 bilhões (8,6 bilhões do
produto das vendas e 3,4 bilhões da transferência de dívidas aos novos proprietários).
No final de 1994, o Estado não interferia mais na produção de aço e fertilizantes e já
alienara a maior parte de sua participação na petroquímica. A privatização dos
monopólios estatais não foi sequer considerada (Pinheiro 1999; Pinheiro e Giambiagi
2000; BNDES 2001).
Como era de se esperar, demorou algum tempo para que o ritmo da privatização
se acelerasse. Apesar dos escândalos políticos que levaram ao impeachment de Collor e
um tom mais nacionalista de seu sucessor, Itamar Franco, a primeira fase do programa
de privatização mostrou uma forte adesão dos brasileiros à idéia da privatização, mas os
monopólios estatais sacramentados pela Constituição de 1988 ainda estavam de pé (ver
box 7 para detalhes).
______________________________________________________________________
35
Box 7
Programa de Privatização – primeira fase
Antecedentes: Os anos 80 viram os primeiros passos no sentido de reduzir o grau de
intervenção do Estado na economia. Empresas privadas que caíram nas mãos públicas após
enfrentar dificuldades financeiras, retornaram ao controle privado. No total, 38 empresas
foram privatizadas nesse período, a maioria de tamanho pequeno e médio. O total arrecadado
foi modesto – 780 milhões de dólares –, mas o principal objetivo do período era deter o
processo de crescimento da propriedade estatal e não obter ganhos financeiros.
1990-1992: A privatização tornou-se um componente importante das reformas econômicas
iniciadas pelo governo Collor de Mello. 68 empresas públicas foram incluídas no Programa
Nacional de Privatização, lançado em 1990. os esforços se concentraram em setores que
haviam ganho status estratégico em políticas de desenvolvimento do passado, tais como aço,
petroquímica e fertilizantes. Dezoito empresas foram privatizadas por US$ 2,3 bilhões,
totalmente financiados pelo assim chamado “dinheiro da privatização” (dívidas do setor
público desvalorizadas no mercado).
1993-1994: O governo Itamar Franco deu novo ímpeto ao programa de privatização. Foram
introduzidas algumas alterações legais para facilitar o processo, tais como a abolição de
discriminação prévia de investidores estrangeiros, que ganharam o direito de adquirir até
100% do capital posto a venda. A privatização das produtoras de aço foi completada e mais
dinheiro foi necessário para acertar os acordos. Quinze empresas foram vendidas nesse
período por US$ 4,5 bilhões, mais US$ 1,9 bilhões de dívidas que passaram para os novos
proprietários. Houve um aumento nos pagamentos em dinheiro, mas o “dinheiro da
privatização” ainda representou dois terços do produto da venda.
Fonte: BNDES (2001).
______________________________________________________________________
O governo de Fernando Henrique Cardoso, que assumiu o poder em 1995,
colocou a abolição dos monopólios estatais no topo de sua agenda de reformas. Um
conjunto de emendas constitucionais foi apresentado ao Congresso nos primeiros meses
do primeiro mandato de FHC e o governo federal pressionou o Congresso para aprovar
36
essas emendas. 18 Ao mesmo tempo, os governadores começaram também a implementar
seus programas de privatização.
No nível federal, a privatização era um componente importante do programa de
estabilização monetária do Plano Real. O apoio político da população para acabar com
uma era de inflação alta ajudou o governo a obter apoio do Congresso na aprovação de
emendas constitucionais necessárias para abolir os monopólios estatais nas
telecomunicações, mineração, eletricidade e gás. Nos estados, a privatização começou a
ser vista como uma fonte importante de recursos para financiar investimentos e eliminar
dívidas passadas.
Importantes mudanças institucionais também ajudaram a impulsionar a
privatização. Foi criado o Conselho Nacional de Privatização para uma melhor
coordenação das decisões relativas á venda dos monopólios estatais, que também foi
beneficiada por uma nova legislação para o fornecimento de serviços públicos por
empresas privadas. O status especial que a Constituição de 1988 dava aos investidores
nacionais nos campos da mineração e da eletricidade também foi abolido, ajudando a
acelerar a privatização desses setores.
Entre 1995 e 2001 (até julho), 34 empresas federais e 39 estaduais foram
privatizadas, totalizando vendas de US$ 91,1 bilhões, incluindo a assunção de dívidas
por investidores privados. O programa de privatização efetuou-se em alta velocidade.
Em menos de uma década, o Estado afastou-se de importantes atividades que estavam
sob seu controle absoluto há quase meio século. Hoje, as empresas privadas controlam
ferrovias e telecomunicações, portos, mais da metade da distribuição e uma significativa
parte da geração de eletricidade, e uma pequena mas crescente parte do suprimento de
água e saneamento (ver box 8 para detalhes).
______________________________________________________________________
18
Para ser aprovada, uma emenda constitucional precisa de três quintos dos votos em duas votações
sucessivas, na Câmara de Deputados e no Senado. Além disso, tem de retornar à Câmara, se o Senado
modificar o texto aprovado pelos deputados.
37
Box 8
Programa de Privatização – segunda fase
1995-1996: A partir de 1995, o governo FHC deu alta prioridade à privatização, que se tornou
um componente importante das reformas estruturais. Foi criado o Conselho Nacional de
Privatização e completou-se a venda das empresas estatais não protegidas por monopólios.
Nessa nova fase, os serviços públicos foram postos no topo da agenda da privatização e
declarou-se que a melhoria da qualidade dos serviços prestados pelos novos proprietários era
um motivo importante para privatizar. A adesão dos governos estaduais ao clima de
privatização foi também uma característica saliente desse período, pois o governo federal
apoiou a venda de empresas estaduais. O total das vendas de empresas federais e estaduais
chegou a US$ 8,1 bilhões nesse período.
1997: A venda de uma grande empresa estatal de mineração - a Vale do Rio Doce – por US$
6,9 bilhões foi o ponto alto do ano. Seguiram-se concessões para empresas privadas
explorarem os serviços de telefonia celular em três áreas importantes do território brasileiro,
possibilitadas pela aprovação de uma nova lei das telecomunicações, o que aumentou a receita
em mais US$ 4,7 bilhões. Nesse ano também foi feita a primeira venda de uma instituição
financeira federal e fizeram-se importantes avanços no nível estadual. A privatização de
empresas estaduais de eletricidade atingiu US$ 15,1 bilhões, enquanto que as firmas
financeiras estaduais também começaram a ser privatizadas.
1998: A venda das empresas de telecomunicação foi a privatização mais importante do ano. O
total das transações chegou a US$ 18,9 bilhões, 64% acima do preço mínimo estabelecido para
a venda. Fizeram -se também alguns progressos na privatização de portos administrados pelo
governo federal. Os governos estaduais também mostraram bons resultados nos campos das
empresas de eletricidade e bancos. Em termos financeiros, 1998 atingiu um recorde: US$ 37,5
bilhões foram o produto das privatizações, dos quais 10,8 bilhões referiam-se a governos
estaduais.
I999: Ano de resultados modestos. O desempenho dos estados foi muito melhor que o do
governo federal. O total das vendas atingiu US$ 3,9 bil hões, dos quais US$ 554 milhões vieram
da venda de bens federais. Eletricidade e gás foram os líderes.
2000: A decisão de vender ações em excesso da quantidade necessária para manter o controle
do governo federal sobre a Petrobrás ajudou a engrossar os res ultados do ano. O produto das
privatizações atingiu US$ 7,7 bilhões, sem incluir US$ 3,3 bilhões gerados pelos estados com a
venda de serviços de eletricidade e financeiros.
38
2001(até julho): Outras concessões para a exploração de telefonia celular foram a principal
realização, com receitas da ordem de US$ 2,6 bilhões.
Fonte: BNDES (2001).
______________________________________________________________________
Do ponto de vista dos objetivos mais imediatos, o programa de privatização foi
um sucesso. Os leilões públicos despertaram muito interesse de investidores nacionais e
estrangeiros e os preços de venda foram muito mais altos do que o mínimo estabelecido
por consultores contratados para avaliar o valor líquido das empresas estatais vendidas
na segunda fase do processo de privatização. Entre 1991 e 2001 (até julho), ocorreram
136 privatizações no Brasil (97 realizadas pelo governo federal e 39 pelos estados). A
importância do programa revela-se nos detalhes mostrado abaixo.
Tabela 4
Programa de Privatização: 1991/2001 (até julho)
US$ bilhões
Setor
Aço
Petroquímica
Mineração
Eletricidade
Saneamento
Petróleo & Gás
Telecomunicações
Instituições financeiras
Transporte
Outros
Nível federal
Nível estadual
TOTAL
Fonte: BNDES (2001).
Receita das vendas Dívidas transferidas
5,6
2,6
2,7
1,0
3,3
3,6
24,7
7,5
0,7
6,8
0,1
30,5
2,9
6,0
2,3
2,4
0,3
57,0
11,3
27,9
6,8
84,9
18,1
Total
8,2
3,7
6,9
32,2
0,7
6,9
33,4
6,0
2,3
2,7
68,4
34,7
103,0
39
Gráfico 2
(sumiu
Uma medida comum do grau de intervenção do Estado na economia – a
participação do setor público no investimento total – mostra a importância do programa
de privatização na redução do controle estatal. Essa proporção caiu de 25% em 1991
para 7% em 1999. O gasto das empresas públicas com pessoal também caiu para menos
da metade do nível atingido no começo dos anos 90. (Ver tabela abaixo)
Tabela
Participação das empresas públicas na formação bruta de capital e nos custos
totais do setor público com pessoal
Ano
Total
1991
1999
Fonte: IBGE.
Empresas públicas federais
FBC
24,2
Pessoal
19,7
FBC
16,9
Pessoal
12,4
7,0
8,2
3,4
4,9
Empresas públicas
estaduais
FBC
Pessoal
7,3
7,3
3,6
3,3
O capital externo desempenhou um papel importante no processo de
privatização. Os investidores estrangeiros adquiriram cerca de metade das ações
oferecidas em leilões públicos. No total, o capital externo respondeu por 36% das
receitas geradas pelo Programa Nacional de Privatização, 49% das receitas da
privatização de empresas estaduais e 60% da receita das telecomunicações. Portugueses,
espanhóis e norte-americanos, nesta ordem, lideraram o grupo de estrangeiros
envolvidos no programa de privatização.
40
Gráfico 3
Composição Setorial das Privatizações: 1991/2001
(US$ 103 bilhões)
2,3%
2,6%
0,7%
3,6%
5,8%
32,5%
6,7%
Telecomunicações
Electricidade
Steel
Petróleo & Gás
Mineração
Insittuições financeiras
Petroquímica
Outros
6,7%
7,9%
Transporte
Saneamento
31,2%
Fonte: BNDES (2001).
De acordo com estudos feitos (Ferreira 2000; Novaes 20000; Pinheiro 1999;
Pinheiro e Giambiagi 2000), a privatização realizada durante o período mencionado
trouxe benefícios significativos para o país, a saber:
a) modernização das empresas, ajudada pelos investimentos externos;
b) mais acesso da população aos serviços;
c) redução da necessidade de o governo subsidiar empresas estatais deficitárias;
d) financiamento da dívida externa com IED, que também ajudou a controlar a expansão
da dívida pública;
e) aumento substancial na produtividade industrial.
Como mencionamos antes, a desaceleração das privatizações a partir de 1999,
que coincidiu com o começo do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso,
refletiu uma situação que exigia negociações mais difíceis. Além disso, os choques
externos provocados pelas crises da Ásia e da Rússia também ajudaram a reforçar o
ponto de vista dos que se opunham à privatização por motivos de ideologia ou equidade.
41
A maxidesvalorização do real em 1999 alterou as perspectivas para a economia
brasileira e exigiu uma reavaliação do programa de privatização. Um governo
enfraquecido, um desempenho fraco do PIB e um aumento na percepção de risco
fizeram cair o valor dos ativos, tornando difícil continuar no mesmo ritmo de antes. O
caso dos bancos estaduais foi uma exceção, pois sua privatização era uma condição para
que os estados pudessem renegociar suas dívidas para com a União.
Assim, as metas estabelecidas para privatizar a indústria da eletricidade ficaram
longe de serem cumpridas. Foi feito algum progresso no setor de distribuição dessa
indústria, graças ao fato de que os governos estaduais, proprietários de parte dele, foram
pressionados a encontrar maneiras de levantar dinheiro e amenizar seus problemas
financeiros. Porém, o grosso da geração ainda está em mão s públicas. A deterioração do
cenário internacional, com pouca perspectiva de atrair recursos externos, levou a mais
adiamentos.
Ao contrário da situação
nas telecomunicações, em que a regulamentação
precedeu a privatização, ajudando assim a transferir o controle para o setor privado,
uma estrutura reguladora ruim contribuiu para o aumento da oposição pública ao avanço
do programa de privatização da energia. As regras reguladoras são estabelecidas por lei
federal e fiscalizadas por agências federais, mas as relações entre os órgãos federais
reguladores e seus equivalentes estaduais não estão claras. A crise de energia causada
pelo verão seco de 2001, em um contexto de paralisação dos investimentos públicos e
poucas definições quanto às garantias de retorno dos investimentos privados, levou à
escassez de oferta e um racionamento do consumo, e tudo isso exigiu mais tempo para
reavaliar o programa de privatização da energia.
No nível estadual, há vários arranjos reguladores. Alguns estados optaram por
ter agências específicas, enquanto outros decidiram criar uma única agência para
fiscalizar todas as atividades transferidas para empresas privadas em sua jurisdição. O
poder dos estados e municípios em áreas como transporte, água e saneamento
acrescenta mais dificuldades para o avanço da privatização nesses setores.
Embora a presença de investidores privados em transporte não seja nova, a
regulamentação estadual e municipal é ruim e as tentativas de criar uma única agência
42
federal independente em nível federal para fiscalizar todos os meios de transportes
encontrou oposição que bloqueou a idéia. São necessárias regras uniformes e
coordenação intergovernamental para melhorar a situação (Pires e Piccinini 1999).
Os conflitos de jurisdição são mais difíceis de resolver na área do saneamento. A
responsabilidade formal é dos municípios, mas a necessidade de coordenar o
fornecimento desses serviços em áreas metropolitanas e aglomerações urbanas pede um
papel maior dos governos estaduais para evitar ineficiências. As dificuldades para obter
um acordo satisfatório entre estados e municípios estão por trás dos problemas
enfrentados nessa área.
Do ponto de vista dos recursos investidos, da modernização nas áreas sob
administração privada e do acesso a serviços, bem como da contribuição do produto das
vendas de ativos públicos para reduzir a expansão da dívida pública, o programa de
privatização foi até agora descrito como um sucesso. Apesar disso, o recuo provocado
pela recente crise de energia lança algumas nuvens escuras sobre ele. Ao contrário do
que foi feito nas telecomunicações, setor em que as empresas públicas puderam investir
antes de ir a leilão para aumentar o valor dos ativos, as firmas de energia não tiveram
permissão para isso, pois o governo esperava avançar depressa para a privatização.
Desse modo, enquanto os investidores externos esperavam que os tribunais derrubassem
as contestações judiciais, a proibição dos investimentos públicos acabou por levar a uma
escassez de energia que provocará um atraso adicional no cronograma da privatização.
Um efeito colateral negativo da privatização da infra-estrutura foi seu impacto
sobre as perspectivas de desenvolvimento das regiões mais atrasadas. No passado, as
empresas estatais desempenharam um papel importante como veículo para explorar
melhor o potencial de crescimento de regiões atrasadas e de fronteira, ajudando a
construir e modernizar a infra-estrutura necessária para atrair atividades empresariais
modernas. Com as decisões sobre investimento em mãos privadas, a probabilidade de
que isso leve a um aumento das desigualdades regionais não pode ser ignorada, o que
43
fornece uma explicação para a abordagem mais agressiva recentemente adotada pelas
autoridades estaduais para atrair investimentos. 19
Devemos observar que a estabilização monetária conseguida na metade dos anos
90, junto com a consolidação da democracia e o avanço da privatização, levou à
retomada dos influxos de investimento externo direto, revertendo a tendência observada
no começo da década. Em média, o IED no período 1996-2000 foi dez vezes maior do
que o registrado em anos anteriores. Uma parte significativa desse investimento foi para
as aquisições de empresas estatais em leilões públicos, mas alguns empreendimentos
novos e importantes também foram feitos, principalmente nos setores automotivo e de
agronegócios.
Pela primeira vez na história recente do Brasil, o influxo de investimento externo
direto ocorreu no contexto de um mercado financeiro liberalizado e voltado não
somente para o mercado interno, mas também para o regional (Mercosul). Essa nova
rodada de investimentos estrangeiros deflagrou uma competição acirrada entre os
estados brasileiros para atrair os melhores projetos.
A assim chamada guerra fiscal lança suas raízes em um vácuo criado pela
ausência de uma política regional patrocinada pela esfera federal para contrabalançar a
tendência à concentração das atividades econômicas modernas no estado de São Paulo.
Sem ações fortes para promover o crescimento econômico das regiões menos
desenvolvidas, a tendência a reduzir a distância entre o PIB das cinco principais regiões,
que estava em andamento desde o final dos anos 70, parou na metade dos anos 80 e
permaneceu inalterada desde então. Um movimento ainda imperceptível na direção
oposta ameaça des encadear uma nova onda de aumento das desigualdades regionais
que, se concretizada, trará consigo instabilidade política.
O principal instrumento da nova rodada de competição por investimentos entre
os estados brasileiros é a concessão de benefícios fiscais, apoiados por generosas
concessões financeiras. Nessa guerra fiscal, os estados vêm concedendo vantagens cada
19
O controle do governo sobre investimentos em infra- estrutura – transporte, energia e telecomunicações
– bem como em insumos manufaturados básicos – aço – foi um instrumento importante para promover o
desenvolvimento regional quando as decisões de investimento podiam levar em conta as metas nacionais
44
vez maiores aos investidores estrangeiros e nacionais para sediar novas unidades
industriais. Esse processo provocou críticas severas, baseadas principalmente no
argumento de que o dinheiro público está sendo desviado para beneficiar o capital
externo, em detrimento de demandas atuais e futuras da população. Além disso, a
escalada da guerra fiscal é favorecida pelo princípio origem-destino misto, aplicado ao
imposto sobre valor agregado estadual. 20
Deve-se observar, no entanto, que outros elementos também desempenham um
papel nas decisões dos investidores sobre a melhor localização de suas fábricas. A
estabilidade política e a boa governança, por exemplo, estavam por trás da decisão de
indústrias manufatureiras tradicionais estabelecidas no sul do país de mudar-se para os
estados da Bahia e do Ceará, a fim de beneficiarem-se das melhores condições
encontradas nesses estados para seus negócios.
A nova onda de investimentos na indústria automotiva levou à instalação de
novas fábricas nos estados do Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do
Sul, não distantes do principal centro industrial de São Paulo, e a escolha de cidades
conhecidas pela qualidade de seu ambiente e de sua força de trabalho. Houve um único
caso de indústria automotiva que foi mais para o norte, para a Bahia, depois que o novo
governo estadual do Rio Grande do Sul rejeitou o acordo feito por seu antecessor, que
incluía um generoso apoio fiscal e financeiro.
Sem contar com instrumentos suficientes, a competição na federação concentrouse em duas direções principais. Uma procurou benefícios fiscais e financeiros para atrair
investimentos. A outra deu destaque ao apo io político para ter acesso às fontes federais
de financiamento. No fim, esse tipo de competição pode levar a um jogo de soma
negativa. A fim de atrair investimentos, estados e municípios privaram-se de futuras
receitas orçamentárias que reduzem sua capacidade de responder às atuais necessidades
e às futuras que resultarão de um aumento da urbanização. Ao reduzir seus recursos no
futuro, tornam-se mais dependentes do acesso a recursos federais, perdendo autonomia
de redução das disparidades regionais. Depois da privatização, os investimentos de infra-estrutura em
regiões atrasadas terão de contar com o acesso a fundos públicos, que estão escassos.
45
em relação a políticas que criam uma ambiente favorável aos negócios. Desse modo,
benefícios de curto prazo podem se transformar em custos significativos no médio e
longo prazo, adicionando mais instabilidade nas relações federais.
______________________________________________________________________
Box 9
A guerra fiscal
A assim chamada guerra fiscal disseminou-se na esteira de um virtual abandono pelo governo
federal das políticas regionais do passado, tendo em vista o impacto da crise macroeconômica
sobre as finanças federais. Abandonados, os governos estaduais optaram por fazer uso de
benefícios fiscais para atrair investimentos privados e promover o desenvolvimento industrial.
A principal arma dessa guerra é o princípio misto de origem-destino aplicado ao imposto
sobre valor agregado estadual e a complexidade de situações envolvida. Quando a produção
ocorre em uma região menos desenvolvida e o bem é consumido em uma mais desenvolvida,
dois terços do imposto são arrecadados na origem e um terço no destino. Essas proporções são
invertidas quando os bens são produzidos em estados desenvolvidos para serem vendidos nos
mais atrasados.
Para atrair novos investimentos os estados produtores concedem descontos integrais do
imposto devido na origem. Além disso, quando a produção é vendida nos principais centros de
consumo, os investidores podem reivindicar crédito pelo imposto supostamente arrecadado na
origem. Assim, o peso financeiro imediato desses benefícios é suportado, de fato, pelo estado
onde o bem é consumido.
A nova onda de investimentos privados nacionais e estrangeiros que se formou no início dos
anos 90 deu ímpeto a essa guerra. O medo de perder terreno na disputa por esses
investimentos, tendo em vista as melhores externalidades encontradas nos principais centros
industriais, levou ao oferecimento de maiores vantagens por estados menos desenvolvidos.
Uma vez iniciada, a guerra fiscal tende a crescer, na medida em que os investidores
circulam em busca de concessões ainda melhores enquanto competidores em outros estados
exigem vantagens iguais para sustentar um campo de jogo nivelado. Aumentam os conflitos na
20
Todos os bens produzidos em outros estados e vendido em São Paulo trazem um crédito fiscal nominal
que reduz a arrecadação de impostos em São Paulo. Deve-se observar que o crédito é dado ainda que
exista um desconto total do tributo arrecadado na origem.
46
federação à medida que as ameaças de mudança de localização tendem a igualar as condições
em todos os lugares.
No fim, os benefícios fiscais podem sair pela culatra. Com todos engajados na guerra, os
benefícios tendem a se igualar, perdendo assim sua eficácia como instrumento para atrair
investimentos. A essa altura, as decisões sobre investimento voltam ao básico: boa infraestrutura e boas condições sociais. Como os incentivos reduzem a capacidade financeira dos
estados menos desenvolvidos para melhorar essas condições, eles estão fadados e perder a
guerra. As disparidades regionais podem aumentar na ausência de uma política regional
patrocinada pelo governo federal.
Fonte: Prado e Cavalcanti (1999 e 2000) e Varsano (1997).
______________________________________________________________________
A competição entre os estados membros de uma federação é considerada por
alguns benéfica do ponto de vista da eficiência. Dessa perspectiva, se os governos
estaduais e municipais usam recursos públicos para criar um ambiente econômico e
social melhor para pessoas e negócios, a competição promoverá a eficiência econômica
e a satisfação social. Evidentemente, isso implica que as autoridades subnacionais
tenham autonomia para decidir a alocação de seus recursos, sejam eles compostos de
receitas próprias ou transferências. Como foi dito antes, essa condição não existe
plenamente na federação brasileira, o que significa que, em nosso caso, a competição
provoca distorções econômicas e injustiça social.
5. Integração regional, tributação e antagonismos: de volta ao futuro?
5.1. Globalização, integração econômica e disparidades regionais internas
Junto com a globalização, os projetos de integração regional na América
representam mais desafios para a federação brasileira. Ao serem implementados numa
época de antagonismos exacerbados e governo federal fraco, esses projetos podem
incentivar esses antagonismos de uma forma que pode se assemelhar aos primeiros dias
do Império e às primeiras décadas republicanas.
Ao lado da globalização das atividades financeiras e comerciais, a consolidação
de blocos econômicos regionais impõe limites crescentes à autonomia dos Estados-
47
nações, como revelam o papel desempenhado pela OMC e a experiência da União
Européia. Esta última propicia o exemplo mais importante de submissão da soberania
nacional a um projeto comum de uma Europa poderosa. Passo a passo, a UE avança no
sentido de uma harmonização total das políticas econômicas. Com a união monetária,
serão necessários mais avanços na harmonização tributária, na área do imposto de
renda. As metas de déficit fiscal e endividamento público praticamente não deixam
espaço para a autonomia fiscal.
Os regimes federativos são duplamente afetados no processo de integração
regional. Do lado fiscal, a harmonização tributária implica perda de autonomia para
tributar no nível estadual, enquanto que os constrangimentos macroeconômicos
significam um controle mais rígido sobre o orçamento e o acesso ao crédito. Assim, a
noção de autonomia na federação tem de ser reinterpretada. Uma maior autonomia para
gastar, desde que observado o equilíbrio fiscal, poderia compensar os limites estreitos
para a autonomia de tributar no nível estadual. Além disso, um maior recurso à cobrança
de taxas de usuários de serviços públicos no nível local poderia aumentar a autonomia
dos governos municipais, beneficiando principalmente as grandes cidades.
A privatização da infra-estrutura e dos serviços urbanos também tira decisões
importantes das mãos de prefeitos e governadores, uma vez que a cobertura de serviços
públicos privatizados não tem de se conformar aos limites de cada jurisdição. Na
medida em que o Estado troca a intervenção direta pela regulação, ganha destaque a
necessidade de um aparato regulador eficiente, exigindo uma clara divisão de
responsabilidades para a regulamentação na federação, o que o Brasil ainda não
conseguiu resolver.
Um aspecto importante a ser considerado são as conseqüências regionais da
economia global. Não sem razão, a UE projetou desde o início uma política regional
abrangente baseada em fundos a serem usados para melhorar as perspectivas
econômicas de membros menos desenvolvidos do bloco. Receitas dos membros mais
ricos são transferidas para os mais pobres (e para zonas pobres dos não tão pobres) a fim
de incrementar sua infra-estrutura econômica, seus recursos humanos e padrões
48
tecnológicos, e dar a eles melhores condições para participar no mercado europeu, bem
como na economia global.
As disparidades regionais são objeto de grande preocupação no Brasil, bem
como em outras grandes economias menos desenvolvidas. Um estudo recente, realizado
pela Comissão Econômica para a América Latina, mostra que quatro dos seis setores
que mais investiram na expansão da capacidade produtiva no Brasil no período 1995-97
– automotivo, eletrônico, farmacêutico e alimentício – são dominados por empresas
multinacionais. O maior controle externo sobre decisões de investimento, baseadas em
considerações estratégicas de acesso a mercados regionais, levanta dúvidas sobre seu
impacto nas disparidades regionais internas. A probabilidade do estabelecimento de
laços mais estreitos entre os estados do Sul e os países do Mercosul contribui para
aumentar a preocupação nas regiões brasileiras menos desenvolvidas sobre as
perspectivas de distribuição regional de produção e renda. Vale a pena observar que as
novas fábricas de automóveis instaladas no Brasil nos anos 90 optaram por ficar mais
perto da fronteira sul.
Na economia global, a capacidade dos governos de tratar das desigualdades
regionais internas depende ainda mais da cooperação. Os fatores tradicionais de
localização industrial – mão-de-obra mal paga, disponibilidade de matéria-prima,
proximidade de mercados consumidores e baixo grau de organização sindical – perdem
força gravitacional numa época em que as facilidades para transportar bens e serviços a
longa distância, o crescimento do comércio eletrônico e o abandono do antagonismo
entre trabalho e capital tornam esses fatores obsoletos. A obsolescência dos fatores
tradicionais de localização torna também ineficaz o uso de incentivos fiscais. No
processo de harmonização tributária, não somente diminui o grau de liberdade para
conceder benefícios fiscais para propósitos de política regional, como o incentivo à
competitividade não permite a manutenção de soluções artificiais.
Há sólidas razões para dizer que a integração na economia global e em blocos
econômicos regionais poderia levar a maiores disparidades internas no Brasil, ao mesmo
tempo em que poderia criar condições para o enfraquecimento do grau de coesão
49
nacional, ao possibilitar relações econômicas externas mais intensas e laços mais
próximos com países vizinhos.
A Amazônia oferece um bom exemplo disso. A economia da Amazônia
brasileira já está conectada ao exterior. As relações econômicas da Amazônia com o
hemisfério norte tendem a andar em ritmo acelerado, tendo em vista o potencial para
exportar produtos derivados de seus recursos naturais – minérios, silvicultura e grãos,
para não mencionar a bem conhecida riqueza biológica – para mercados ansiosos por
consumir produtos naturais. As perspectivas de que os produtos da Zona Franca de
Manaus atinjam os mercados de países do Caribe e dos Andes ficam melhores à medida
que os investimentos em infra-estrutura facilitam o comércio no interior da bacia do
Amazonas e no Caribe.
A região nordeste também se defronta com novas possibilidades de cortar a
dependência dos insumos e bens de capital vindos do Sul. Uma parte significativa das
indústrias de manufatura tradicional já está se mudando para o Nordeste, a fim de se
beneficiar dos baixos custos de produção e da proximidade de mercados externos. Na
economia global, a industrialização do Nordeste não depende necessariamente dos
produtos do Sul, uma vez que ela ganha acesso a máquinas e outros insumos do
exterior, freqüentemente melhores em termos de qualidade e preço do que os
produzidos no resto do país.
Na região sul do Brasil, o Mercosul provoca expectativas pos itivas, enquanto
que outras regiões vêm a integração econômica no cone sul como uma ameaça concreta
ao objetivo nacional de um desenvolvimento regional menos desigual. O comércio no
Mercosul já se multiplicou várias vezes desde sua criação, para benefício dos estados
meridionais do Brasil.
Além de causar um impacto significativo no fluxo de bens e serviços dentro da
área, o Mercosul provocou um interesse crescente em investimentos cruzados na região.
Vale a pena mencionar as posições dos investidores brasileiros na Argentina, por meio
de investimentos diretos, aquisições e joint ventures, bem como de investidores
argentinos no Brasil. O Chile, que não é membro pleno do bloco, também tem feito
investimentos em ambos os países, especialmente na indústria da eletricidade. Alguns
50
sinais de outras melhoras nos laços culturais também se encontram na disseminação do
interesse em aprender espanhol no Brasil e português na Argentina.
A simulação do impacto regional interno da integração, em três cenários –
ALCA, livre comércio com a UE e livre comércio com todos os parceiros comerciais do
Brasil (IPEA 2001) – mostra que todas elas podem levar à concentração da atividade
econômica nas áreas já mais desenvolvidas do território brasileiro e oferece provas
empíricas para apoiar o argumento apresentado acima.
Portanto, o que está em jogo é a possibilidade de desintegração nacional no
processo de integração internacional. Para evitar essa resultado indesejável é necessário
implementar uma política regional voltada para red uzir a distância entre as regiões
brasileiras no que diz respeito a infra-estrutura, recursos humanos e acesso a tecnologias
modernas. Do lado fiscal, é preciso harmonizar o sistema tributário nacional e avançar
no sentido da harmonização tributária dentro do continente, substituindo velhos
antagonismos por bem definidas regras de cooperação.
5.2. Política regional e coesão federal
Uma conseqüência importante da integração econômica regional é a necessidade
de integração física. Até muito recentemente, as conexões físicas do Brasil com os
vizinhos de língua espanhola praticamente não existiam. As preocupações militares do
passado não permitiam que os trilhos brasileiros e argentinos se encontrassem,
bloqueando a utilização de ferrovias para transportar bens através das fronteiras. O
transporte terrestre dentro do Mercosul baseia-se em conexões rodoviárias cujas
condições elevam a níveis anormais o custo do transporte na região. Com exceção da
energia comprada do Paraguai, decorrência da construção da hidrelétrica de Itaipu,
totalmente financiada pelo Brasil, não havia intercâmbio de eletricidade. O mau
funcionamento dos sistemas de comunicação também induzia ao isolamento.
Os investimentos recentes, após a privatização da infra-estrutura na região,
começaram a mudar a situação, principalmente nas telecomunicações. Dependendo da
mobilização de recursos financeiros, um ambicioso projeto para melhorar as conexões
físicas na América do Sul, quando implementado, levará a uma realidade diferente. Em
51
1999, o governo brasileiro anunciou investimentos de US$ 125 bilhões destinados a
conectar as áreas mais dinâmicas do território brasileiro pelos “Eixos Nacionais de
Desenvolvimento”. Entrementes, alguns projetos regionais importantes como a rodovia
de Manaus para a Venezuela e o gasoduto Bolívia-Brasil já foram construídos. Com
apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento, estão em andamento estudos para
avançar rapidamente na integração física regional.
O levantamento das barreiras físicas ao movimento de bens dentro do Mercosul
e no continente como um todo terá importantes impactos geográficos. Embora a mão de-obra seja um fator perfeitamente móvel no Brasil, as diferenças marcantes na
qualidade da força de trabalho significam que atrair gente de outras regiões não vai
resolver facilmente a escassez de mão -de-obra qualificada no Sul moderno. Na verdade,
a mobilidade da mão -de-obra costuma contribuir para piorar as condições para a
competitividade global, ao aglomerar uma população mal preparada na periferia das
cid ades mais industrializadas.
À medida que as barreiras sociais e culturais também comecem a cair, a escassez
de mão-de-obra especializada no Sul do Brasil poderá ser suprida por trabalhadores
mais instruídos de países vizinhos, levando a ressentimentos e exigências de restrições
ao movimento da mão -de-obra no continente.
Se as conexões físicas avançarem em ritmo acelerado e a mobilidade da mão-deobra não sofrer restrições, talvez seja necessária uma abordagem comum da política
regional. À medida que começam a se concretizar para as regiões brasileiras e seus
respectivos estados as oportunidades de lucrar com a intensificação dos laços
econômicos com países vizinhos, as possibilidades de reduzir as diferenças regionais
ganham novas dimensões. O aumento da competição entre regiões e estados pode ser
um substituto para regras uniformes e políticas compensatórias do governo federal.
A principal meta da política regional deveria ser o apoio a políticas voltadas para
a criação de um ambiente econômico amigável e não a concessão de subsídios ou
isenção de impostos. Isso significa, como já observamos, um esforço conjunto do
governo federal e dos estados para criar uma infra-estrutura moderna, aumentar a
52
qualidade dos recursos humanos e investir na capacidade de gerar e aplicar
conhecimento científico aos objetivos econômicos e sociais.
Um passo no sentido de devolver o poder de tomar decisões em matérias
relacionadas com as relações trabalhistas no Brasil foi dado com a decisão de deixar que
os estados estabeleçam salários mínimos acima do teto federal. Como o salário mínimo
tem um impacto significativo nas contas públicas, principalmente na dívida da
previdência social, ele foi mantido em níveis muito baixos por motivos alheios aos
interesses tanto dos trabalhadores como dos empregadores dos setores econômicos
modernos. Desde que essa medida foi adotada, alguns estados aumentaram o salário
mínimo dentro de seu território.
Apesar do que foi dito acima, as propostas para enfrentar os desafios
apresentados pela globalização e a integração econômica regional apontam para uma
menor autonomia dos estados em questões fiscais e reguladoras. A maioria das
propostas de reforma tributária inclui uma lei federal para unificar as regras aplicadas ao
imposto estadual sobre valor agregado, ao mesmo tempo em que a tendência à
padronização dos critérios usados para transferir receitas do governo federal para cobrir
o financiamento dos serviços sociais também significa menos autonomia para os estados
na administração de seus orçamentos. O espaço para a interferência dos estados na
regulamentação também foi diminuído. A legislação federal relativa às duas áreas mais
importantes em processo de privatização – telecomunicações e eletricidade – dá aos
estados um papel apenas secundário na s upervisão das ações das empresas privatizadas,
deixando para órgãos federais as decisões mais importantes referentes ao funcionamento
dessas empresas.
Tendo em vista sua importância para o objetivo da autonomia federal e o sucesso
da integração regional, a reforma tributária tem estado na agenda nos últimos doze anos,
sem encontrar um modo de harmonizar os conflitos de interesse envolvidos em qualquer
tentativa de promover mudanças estruturais profundas no sistema tributário. Enquanto o
setor privado enfat iza a urgência de uma reforma para estabelecer um campo nivelado
para a competição com os estrangeiros, os estados e municípios temem que qualquer
53
mudança no regime atual invada sua autonomia de levantar receitas e dispor dos
recursos arrecadados em suas jurisdições.
5.3. Reforma tributária, integração e autonomia federativa
Há um amplo consenso sobre a inadequação do sistema tributário brasileiro. Ele
prejudica a competição nos mercados interno e externo, atrapalha a eficiência
econômica, representa um peso adicional sobre os investimentos, induz à evasão fiscal e
submete os contribuintes a uma legislação complexa. Apesar disso, fracassaram todas as
tentativas de reforma nos últimos quinze anos.
Um dos pontos em disputa é uma associação incorreta entre harmonização e
unificação. Os governos estaduais opõem-se às tentativas de retirar sua competência
para instituir o imposto sobre valor agregado que eles administram desde 1965. Um
forte temor de encarar a necessidade de mudar a espinha do federalismo fis cal
estabelecida há 35 anos é outro motivo para o fracasso. Sem a coragem de redesenhar os
mecanismos de participação na receita consagrados na Constituição, são poucas as
chances de resolver os conflitos de interesse.
Não é necessário unificar, mas sim harmonizar. A harmonização requer uma
base comum do imposto sobre consumo, mas não necessariamente alíquotas uniformes.
Ampliar a base da tributação e aplicar bases uniformes em todo o país é a maneira de
conseguir a harmonização tributária. Isso coloca novos desafios para garantir o
equilíbrio fiscal em regimes federais com grandes desigualdades regionais. A
combinação tradicional de dar poder de tributar aos estados e municípios e criar
transferências compensatórias para atender às necessidades dos economicamente
atrasados não se sustenta. A necessidade de partilhar uma ampla base do imposto sobre
consumo precisa ser examinada agora.
Compartilhar o imposto não é o mesmo que compartilhar seu produto. Neste
último caso, o sistema fiscal é totalmente centralizado e as receitas do imposto federal
são divididas de acordo com uma fórmula específica. Quando o imposto é
compartilhado, ambos os governos, central e estadual, têm o direito de explorar a
54
mesma base tributária, sob uma legislação comum. A autonomia para estabelecer as
regras da tributação é posta conjuntamente nas mãos do Parlamento nacional, mas
ambos os parceiros retêm a capacidade de estabelecer alíquotas, arrecadar e dispor de
sua parte.
Uma base tributária comum e uma legislação nacional formam um poderoso
incentivo para a cooperação intergovernamental no campo da administração tributária,
trazendo benefícios para os contribuintes e administradores. Do lado do contribuinte,
uma regra uniforme para o cumprimento de suas obrigações fiscais significa menores
custos administrativos e ausência da necessidade de recorrer a jurisdições distintas para
solucionar divergências de interpretação. Do lado dos administradores de impostos, a
unificação dos registros tributários e auditorias conjuntas aumentam a eficiência,
reduzem a evasão fiscal e minimizam os custos administrativos.
Com um imposto sobre consumo harmonizado e aplicado segundo o princípio de
destino, a competição para atrair atividades econômicas mediante benefícios fiscais terá
impacto somente sobre as receitas daqueles que fazem essas concessões, removendo o
principal motivo da guerra fiscal. O desenvolvimento econômico terá de se basear mais
nos meios de melhorar a infra-estrutura, os serviços urbanos e os programas sociais,
com ênfase na educação básica e na saúde. A cooperação intergovernamental nos gastos
públicos, para implementar essas políticas, é a contraparte da partilha do imposto. Ao
compartilhar uma ampla base de imposto sobre consumo, a distribuição de receita na
federação mantém uma associação estreita com o nível de renda e consumo em cada
membro da federação. Desse modo, as transferências compensatórias podem ser
reduzidas a níveis exigidos para manter um padrão mínimo de serviços em todo o país,
possibilitando um papel maior dos go vernos locais na provisão de serviços urbanos e
sociais.
A estabilidade no sistema tributário é outra vantagem importante da partilha do
imposto. Quando uma ampla base tributária é compartilhada numa federação, é menos
provável que ocorram mudanças freqüentes na legislação, pois as propostas exigirão
apoio suficiente para superar as reações daqueles que podem não estar de acordo com a
modificação pretendida. Vale a pena observar que a estabilidade das regras fiscais
55
torna-se ainda mais importante com o avanço da globalização e da integração regional,
tendo em vista sua importância para atrair investimentos e para as decisões de aumentar
a capacidade produtiva.
As oportunidades para aplicar o princípio do benefício da tributação também
aumentam com a possib ilidade de exercer maior autonomia no nível local. As grandes
cidades desempenham um papel importante na economia global, ao mesmo tempo em
que enfrentam dificuldades crescentes para casar receitas e despesas. Os impostos locais
sobre propriedade e sobre vendas ao consumidor não criam distorções econômicas e
podem assim ser usados. As taxas impostas aos beneficiários de serviços públicos
municipais também podem ser importantes para melhorar as finanças públicas locais.
Por outro lado, a ênfase na microeconomia deixa de lado considerações de
eqüidade na tributação. A progressividade na tributação da renda é afetada pela
crescente mobilidade do capital e dos empregos mais bem pagos. A aplicação de
impostos seletivos sobre consumo também é constrangida pela competição nos
mercados interno e internacional. Desse modo, uma melhor maneira de alcançar a
eqüidade pode ser por meio da concessão de prioridade a programas públicos destinados
a igualar oportunidades de mobilidade social no uso de recursos públicos.
A carga tributária total também está submetida a constrangimentos
internacionais e a padrões macroeconômicos de política fiscal saudável. A eficiência
nos gastos públicos é o único meio para manter um nível adequado de serviços públicos
sem ultrapassar os limites para tributar.
No Brasil, e provavelmente em outras federações, os antagonismos entre os
estados ganharam novo ímpeto, como demonstra a guerra fiscal. Os antagonismos
manifestam-se também por meio de crescentes ressentimentos dos contribuintes dos
estados mais ricos com relação à alta carga tributária exigida para sustentar generosos
incentivos fiscais e transferências que, com freqüência, beneficiam as pessoas mais ricas
que vivem nas regiões mais pobres do país.
A predominância de antagonismos ainda não favorece a instalação de um
federalismo cooperativo.
Ao contrário, a busca de ganhos individuais, inclusive
mediante a melhoria das relações econômicas externas, às custas de um maior
56
intercâmbio com outras regiões do país, pode ser considerada, à primeira vista, mais
lucrativa do ponto de vista de cada estado em particular da federação. A probabilidade
de uma desintegração econômica nacional junto com o aprofundamento da integração
internacional não deve, portanto, ser descartada.
6. Conclusão
Desde o início da década passada, o Brasil esteve engajado num esforço de
realizar reformas institucionais para se integrar melhor na economia global. A agenda
dessas reformas era ampla, incluindo privatização de empresas públicas, abolição de
monopólios estatais, reforma do setor financeiro, modernização da administração
pública, reforma da previdência social e modernização do sistema tributário. Muitas
delas têm implicações importantes do ponto de vista da federação que não receberam
atenção. Suas maiores prioridades eram a conquista e a sustentabilidade da estabilização
macroeconômica.
Nesse processo de enfatizar a estabilidade da moeda, o desenvolvimento
econômico e a autonomia federal foram negativamente afetados. Como mencionado
anteriormente, os estados foram forçados a privatizar os bancos estaduais como parte de
um acordo para renegociar suas dívidas para com o governo federal. Ao mesmo tempo,
estabeleceram-se condições mais duras para bloquear o acesso dos estados e municípios
ao crédito, inclusive empréstimos privados e multilaterais. Com sua capacidade de
arrecadar impostos prejudicada por uma taxa de crescimento lenta e a disseminação das
atividades informais, eles se tornaram mais dependentes dos recursos federais para
financiar até mesmo seus gastos sociais básicos. Enquanto o esforço nacional estava
centrado na manutenção das metas estabelecidas para o superávit primário, os serviços
públicos se deterioraram em detrimento dos pobres, que dependem deles para suprir
suas necessidades básicas.
A agenda das reformas esqueceu um aspecto importante para tratar melhor das
questões federativas , a saber, a política regional. No contexto de uma economia fechada
57
e um estado fortemente intervencionista, que prevalecia nos anos 80, a política regional
se b aseava nos benefícios fiscais federais para investimentos privados em regiões menos
desenvolvidas e em pesados investimentos públicos financiados pelo orçamento federal
ou comandados por empresas públicas, principalmente em infra-estrutura. Ambos
desaparec eram em conseqüência da crise fiscal e do programa de privatização, deixando
a questão regional nas mãos dos estados.
Apesar de sua necessidade, uma nova política regional ainda não foi considerada
prioridade na agenda do governo federal. Sem ações combinadas para criar condições
favoráveis à descentralização da produção e da renda, o antagonismo na federação
certamente crescerá, criando instabilidade política e tornando mais difícil avançar
rapidamente na implementação da agenda de reformas.
Embora no topo dessa agenda, a mudança do sistema tributário fracassou por
não dar a devida atenção a fatores que apontam para um maior desequilíbrio regional. A
ênfase na competição mundial e as forças centrífugas que se desenvolvem na esteira da
integração regional exigem a inserção da questão regional interna no processo de
criação de um novo sistema tributário, a fim de remover os obstáculos que impedem o
avanço da reforma tributária.
Para atingir o duplo objetivo de competitividade e equilíbrio regional, a reforma
tributária deve enfrentar
questões controvertidas embutidas nos arranjos federais
estabelecidos na metade dos anos 60 e intocados em 1988. Nessa revisão, deve-se obter
um equilíbrio apropriado entre competição e cooperação na federação. A autonomia
para estabelecer alíquotas e a liberdade para dispor de receitas permitem que os estados
compitam para atrair investimentos privados por meio da prudência fiscal e da
qualidade dos serviços públicos oferecidos. Porém, uma competição justa não exclui a
necess idade de cooperação. A fim de evitar um aumento das disparidades regionais e
dos antagonismos, é necessária a cooperação intergovernamental para reduzir as
distâncias internas em infra-estrutura, recursos humanos e capacidades tecnológicas.
58
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64
APÊNDICE ESTATÍSTICO
TABELA A. 1
BRASIL – Dados gerais da economia, 2000
PIB
US$ 593,8 bilhões
169,8 milhões
População
Renda per capita
3,5 mil
Inflação
9,81% IGP _DI
Taxa de câmbio
1,83 (média/2000)
Dívida líquida do setor
49,5% do PIB (dec./2000 )
público
4,50% do PIB
Déficit público 1/
Carga tributária
32,7% do PIB
Fonte: IBGE, Bacen e Araújo (2001).
1/ Inclui governos subnacionais e empresas estatais.
65
TABELA A. 2
Brasil: Indicadores socioeconômicos selecionados, 1999
População 1/
PIB 2/
% Total
% Total
PIB per
capita
US$
Mortalidade
Taxa de
infantil
analfabetismo
4/
Taxa 3/
Habitação
satisfatória
Condições 5/
% Total
Brasil
100,0
100,0
3.154
34,6
13,3
62,3
Norte
Rondônia
Acre
Amazonas
Roraima
Pará
Amapá
Tocantins
Nordeste
Maranhão
Piauí
Ceará
Rio Grande do
Norte
Paraíba
Pernambuco
Alagoas
Sergipe
Bahia
Sudeste
Minas Gerais
Espírito Santo
Rio de Janeiro
São Paulo
Sul
Paraná
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
Centro Oeste
Mato Grosso do
Sul
Mato Grosso
Goiás
Distrito Federal
7,6
0,8
0,3
1,6
0,2
3,6
0,3
0,7
28,2
3,3
1,7
4,4
1,6
4,4
0,5
0,2
1,6
0,1
1,7
0,2
0,2
13,1
0,8
0,5
2,0
0,8
1.857
2.009
1.548
3.064
1.405
1.486
1.864
1.007
1.468
770
912
1.446
1.515
34,1
31,6
44,2
31,8
38,3
34,6
31,7
33,0
53,0
54,2
45,3
52,4
48,7
11,6
9,6
15,5
8,8
8,6
12,4
9,5
21,0
26,6
28,8
31,6
27,8
25,5
13,6
6,7
22,7
27,5
11,5
11,4
1,3
2,4
32,5
11,1
5,7
26,3
31,2
2,0
4,7
1,7
1,0
7,7
42,6
10,5
1,8
8,5
21,8
14,8
5,6
3,2
6,0
6,8
1,2
0,8
2,7
0,7
0,6
4,3
58,3
9,6
1,9
11,7
34,9
17,7
6,3
3,7
7,7
6,4
1,1
1.262
1.802
1.250
1.679
1.762
4.309
2.879
3.342
4.366
5.060
3.779
3.542
3.668
4.307
2.880
2.887
60,3
58,2
66,1
45,5
45,4
24,4
26,3
26,0
24,4
21,9
20,7
24,3
22,2
18,4
24,5
24,4
25,9
24,7
32,8
23,9
24,7
7,8
12,2
11,1
6,0
6,2
7,8
10,2
6,8
6,1
10,8
10,9
40,6
36,5
19,3
36,5
44,3
85,5
82,4
71,7
77,3
91,1
53,5
46,9
51,8
60,1
40,5
9,8
1,5
2,9
1,2
1,2
1,8
2,3
2.580
1.980
6.008
27,5
25,0
22,6
11,8
12,5
5,1
24,0
38,6
89,9
Fonte: IBGE (Contas Regionais do Brasil, 1999 e Síntese dos Indicadores Sociais, 2000).
1/ População total = 167.909.738 habitantes.
2/ PIB = US$ 529, 6 bilhões.
3/ Por mil nascidos vivos.
4/ Pessoas com 15 anos ou mais.
5/ Moradias urbanas ligadas a
sistemas de água e esgoto (ou fossa
séptica) e acesso a serviços de
coleta de lixo.
66
TABELA A. 3
Participação de cada nível de governo na arrecadação dos próprios impostos
1960, 1965, 1970/2000e
1960
1965
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Receita
tributária
total
% do PIB
17,4
19,0
26,0
25,3
26,0
25,0
25,1
25,2
25,1
25,6
25,7
24,7
24,5
25,3
26,3
27,0
24,3
24,1
26,2
23,8
22,4
24,1
28,8
25,2
25,0
25,8
29,8
29,4
29,1
29,6
29,6
31,7
32,7
Federal
Total
64,0
63,6
66,7
68,7
69,7
71,1
72,3
73,7
75,4
76,0
75,1
74,8
74,7
75,4
75,9
76,5
73,6
72,7
70,5
72,3
71,7
67,5
67,0
63,4
66,1
68,6
67,9
66,0
65,3
66,2
67,0
68,1
67,3
Estadual
Local
31,3
30,8
30,6
28,6
27,7
26,3
25,4
23,5
21,6
21,1
22,2
21,8
21,6
21,3
21,4
20,6
23,7
24,9
27,0
25,2
25,6
29,9
29,6
31,2
29,1
26,6
27,1
28,6
29,6
28,8
27,5
26,9
27,7
4,7
5,6
2,7
2,7
2,6
2,5
2,3
2,8
3,0
2,9
2,8
3,4
3,7
3,3
2,7
2,8
2,7
2,4
2,5
2,5
2,7
2,7
3,4
5,4
4,8
4,7
5,1
5,4
5,1
5,0
5,5
5,0
5,0
Impostos Contribuições
1/
Sociais 2/
64,0
63,6
66,7
67,9
67,6
68,0
68,5
69,4
70,7
71,1
70,1
70,1
70,5
71,2
71,1
70,7
68,0
66,8
63,8
66,1
66,8
59,3
55,8
52,1
54,9
55,4
48,8
51,5
51,9
50,9
52,4
50,0
47,2
0,8
2,1
3,1
3,8
4,3
4,7
4,9
5,0
4,7
4,2
4,2
4,8
5,8
5,7
5,9
6,7
6,2
4,9
8,1
11,2
11,4
11,3
13,2
19,0
14,5
13,5
15,4
14,6
18,1
20,1
Fonte: Varsano et allii (1998) e Araújo(2001).
1/ Impostos, contribuições para a previdência social e seguro desemprego.
2/ Impostos sobre transações, sobre transações financeiras e sobre lucro
líquido.
67
TABLE A. 4
Participação de cada nível de governo nas receitas tributárias disponíveis:
1960, 1965, 1970/2000e
1960
1965
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Receita
tributária
total
% do PIB
17,4
19,0
26,0
25,3
26,0
25,0
25,1
25,2
25,1
25,6
25,7
24,7
24,5
25,3
26,3
27,0
24,3
24,1
26,2
23,8
22,4
24,1
28,8
25,2
25,0
25,8
29,8
29,4
29,1
29,6
29,6
31,7
32,7
Federal
Total
59,5
54,8
60,8
62,8
63,8
64,5
66,4
68,0
68,1
69,1
68,1
68,0
68,2
68,4
69,0
69,8
65,8
62,7
60,9
64,1
60,1
61,1
58,9
54,6
56,9
57,8
59,3
56,2
56,0
56,2
56,2
57,0
56,7
Estadual Local
Imposto Contribuições
s 1/
Sociais 2/
59,5
54,8
60,8
62,1
61,8
61,4
62,6
63,7
63,5
64,2
63,1
63,3
64,0
64,3
64,1
64,0
60,1
56,7
54,2
58,0
55,2
52,9
47,7
43,2
45,6
44,6
40,3
41,7
42,6
40,9
41,6
38,9
36,7
0,8
2,1
3,1
3,8
4,3
4,7
4,9
5,0
4,7
4,2
4,2
4,8
5,8
5,7
5,9
6,7
6,2
4,9
8,1
11,2
11,4
11,3
13,2
19,0
14,5
13,5
15,4
14,6
18,1
20,1
34,1
35,1
29,2
27,3
26,9
26,3
25,2
23,3
23,1
22,3
23,3
22,7
23,3
22,3
22,1
21,3
24,1
26,2
27,0
23,3
26,6
25,0
27,6
29,6
28,1
26,4
25,1
27,2
27,6
27,7
26,6
26,0
26,4
6,4
10,1
10,0
9,9
9,2
9,2
8,4
8,7
8,8
8,6
8,6
9,3
8,6
9,3
8,9
8,9
10,1
11,1
12,1
12,6
13,3
13,9
13,5
15,7
14,9
15,8
15,6
16,6
16,3
16,1
17,2
17,0
16,9
Fonte: Varsano et allii (1998) e Araújo(2001).
1/ Impostos, contribuições para a previdência social e seguro desemprego.
2/ Impostos sobre transações, sobre transações financeiras e sobre lucro
líquido.
68
TABELA A. 5
Composição da receita tributária - 1980/2000e
(% da carga tributária total)
Bens e Serviços
Carga
tributá
Folha de
Imposto
Comércio
Imposto Proprieda- Renda/ pagamen
ria total
sobre
exterior
de
Lucros
Total
sobre
Outros
(% do
to
valor
transações
PIB)
agregado
1980
22,8
3,1
43,7
31,0
12,7
1,2
13,2
28,2
10,7
1981
23,3
2,5
43,9
30,6
13,3
1,4
14,4
29,7
8,0
1982
24,7
2,0
42,1
29,5
12,6
1,3
14,0
32,9
7,7
1983
25,0
1,8
41,0
28,6
12,4
0,9
17,0
29,7
9,6
1984
24,1
1,7
39,9
27,7
12,2
0,9
19,7
27,2
10,6
1985
24,1
1,7
41,7
30,2
11,5
0,7
21,3
26,4
8,2
1986
26,3
1,8
44,9
32,4
12,5
1,2
19,1
27,2
5,8
1987
23,8
1,7
45,6
33,3
12,4
1,0
18,1
26,9
6,7
1988
22,4
1,9
44,0
33,6
10,4
0,9
20,9
25,7
6,5
1989
24,1
1,8
45,3
35,7
9,6
0,5
21,4
27,1
3,9
1990
28,8
1,3
48,9
33,5
15,4
1,0
19,7
25,4
3,7
1991
25,2
1,6
49,7
35,3
14,4
2,1
16,5
24,1
5,9
1992
25,0
1,6
47,4
34,9
12,4
1,4
19,6
25,2
4,8
1993
25,8
1,7
47,5
32,9
14,6
1,0
18,0
26,9
4,8
1994
29,7
1,7
51,6
32,1
19,5
1,3
16,1
24,6
4,6
1995
29,4
2,6
46,7
31,9
14,8
2,7
19,3
24,4
4,3
1996
29,1
1,9
45,4
31,6
13,8
2,9
16,3
27,0
6,5
1997
1998
29,6
29,6
2,0
2,4
45,3
43,8
29,5
28,3
15,9
15,5
3,2
3,3
15,5
17,5
26,2
26,9
7,8
6,0
1999
31,7
2,6
46,8
27,5
19,2
3,0
17,0
25,1
5,5
2000
32,7
2,4
48,4
28,1
20,3
3,0
16,0
23,7
6,5
Fonte: Varsano et allii (1998) e Araújo(2001).
e/ e/ preliminar.
69
TABELA A. 6
Itens selecionados de gastos dos governos estaduais e municipais: 1996 e 2000
Estados 1/
1996 2000
Pessoal
Salários
Pensões 3/
Encargos sociais
Formação de capital fixo
Financeiros
Juros
Amortizações
Outros
Total
6,8
4,2
1,8
0,9
0,8
2,3
0,6
1,1
0,5
9,8
6,2
3,9
2,0
0,2
0,9
1,8
0,7
0,6
0,5
9,0
Municípios 2/
1996 2000
% PIB
2,4
3,0
2,1
2,4
0,3
0,3
sd
0,3
1,1
0,7
0,4
0,2
0,1
0,1
0,2
0,1
0,0
0,0
4,0
3,9
Total
1996 2000
9,2
6,3
2,1
0,9
1,9
2,7
0,8
1,3
0,6
13,8
9,2
6,3
2,3
0,5
1,7
2,0
0,8
0,7
0,5
12,9
1/ Dados de 1996 de IBGE, “Despesas Públicas por Funções, 1996-1998”. Para 2000 a
fonte é a Secretaria do Tesouro Nacional – STN.
2/ Dados de pessoal, formação de capital fixo e outras despesas financeiras são de STN,
“Finanças do Brasil, 1996”. Juros e amortização da dívida pública vêm de IBGE
“Regionalização das Transações do Setor Público 1991-1998” Todos os dados para
2000 são da STN.
3/ 1996 o número de funcionários municipais aposentados é uma estimativa baseada
em transferências municipais reais para indivíduos. Para 2000, este item inclui
pensões pagas a servidores públicos aposentados e beneficiários dos funcionários
falecidos.
70
TABELA A. 7
Necessidades de empréstimos do setor público: 1995 – 2001
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
3/
Nominal (% PIB)
Gov.Federal & BancoCentral
Estados 2/
Municípios
Empresas estatais
7,2
2,3
3,6
5,9
2,6
2,7
6,1
2,6
3,0
1,3
0,6
0,4
8,0
5,5
1,8
0,2
0,5
10,5
7,4
2,7
0,5
-0,1
4,5
3,1
1,8
0,3
-0,7
7,5
5,6
2,0
0,1
-0,1
Primário (% PIB)
Gov.Federal & BancoCentral
Estados 2/
Municípios
Empresas estatais
-0,4
-0,6
0,2
0,1
-0,4
0,6
1,0
0,3
0,7
0,1
-0,1
-0,1
0,0
-0,6
0,4
-0,2
0,3
-3,3
-2,4
-0,2
-0,1
-0,7
-3,5
-1,9
-0,4
-0,1
-1,1
-4,7
-2,9
-0,8
-0,3
-0,8
Taxa de juro nominal (%
PIB)
Gov.Federal & BancoCentral
Estados 2/
Municípios
Empresas estatais
7,6
5,8
5,1
8,0
13,8
7,9
12,2
2,9
3,4
2,9
2,2
2,3
2,3
1,3
0,7
0,5
6,0
1,4
0,4
0,2
9,8
2,9
0,5
0,6
5,0
2,2
0,4
0,3
8,4
2,7
0,4
0,6
PIB (US$ bilhões) 4/
702,4 778,9 806,2 787,7 529,6 593,8
Fonte: Bacen (Banco Central do Brasil).
Superávit (valores negativos); Déficit (valores positivos). Não inclui receitas da privatização.
2/ Governos estaduais e municipais até 1997. A partir de 1998, somente governos estaduais.
3/ Resultados para janeiro-julho.
4/ Taxa de câmbio média usada para estimar valores em US$.
71
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1 A FEDERAÇÃO BRASILEIRA: FATOS, DESAFIOS E