e!
Highlights do
Monotemático
de Cirrose
Sociedade Br
de Hepatolog
desde 1967
SIMPÓSIO I
SUMÁRIO
Avaliação não invasiva no diagnóstico da cirrose hepática.
Onde estamos e para onde vamos?.......................................................................................................................................4
Henrique Sergio M. Coelho
Rastreamento e vigilância epidemiológica na cirrose...............................................................................................5
Renata Perez
Impacto da terapia da etiologia da cirrose e da terapia antifibrótica
sobre a hipertensão portal..............................................................................................................................................................7
Juan Carlos Garcia-Pagán
SIMPÓSIO II
Encefalopatia hepática mínima...................................................................................................................................................8
Esther Buzaglo Dantas-Corrêa
Resistência à insulina, síndrome e diabetes mellitus na cirrose hepática ...............................................10
Edison R Parise
Microbiota intestinal e cirrose: aspectos clínicos.......................................................................................................11
Claudio Marroni
Aspectos atuais da resistência antimicrobiana na cirrose..................................................................................13
Edna Strauss
SIMPÓSIO III
Albumina na cirrose: as evidências.........................................................................................................................................14
José Eymard
Custo efetividade no tratamento da síndrome hepatorrenal...........................................................................16
Ângelo Zabam de Mattos
Ascite refratária: paracentese x TIPS....................................................................................................................................17
Aldo Torre
SIMPÓSIO IV
Insuficiência adrenal na cirrose: quando investigar e quando tratar..........................................................19
Gustavo Pereira
Gastropatia da hipertensão portal: conduta................................................................................................................20
Paulo Lisboa Bittencourt
Complicações pulmonares na cirrose hepática..........................................................................................................22
Mario Kondo
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
O
Monotemático de Cirrose ocorreu na Semana do Fígado do Rio de Janeiro
no dia 20 de maio de 2015, no Hotel Windsor. Foi organizado pelo Dr. Carlos
Terra e equipe com a participação de convidados estrangeiros: Dr. Juan
Carlos García-Pagan (Espanha) e Dr. Aldo Torre (México), além de inúmeros convidados
nacionais. Algumas palestras não puderam ser gravadas por motivos técnicos e, assim,
deixaram de ser reproduzidas nessa publicação que, no entanto, pode registrar grande
parte delas nesse Highlights.
SIMPÓSIO I
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Avaliação não invasiva no diagnóstico
da cirrose hepática.
Onde estamos e para onde vamos?
Henrique Sergio M. Coelho
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Incialmente é importante ressaltar que o diagnóstico de cirrose
é primeiramente clínico, ou seja, antes de lançar mão de exames
não invasivos ou biópsias devemos lembrar que o exame físico adequado pode fazer o diagnóstico da doença.
O diagnóstico histopatológico da cirrose apresenta diversos problemas. Os problemas de coagulação impedem que a biópsia seja
realizada em muitos pacientes. Outro ponto é que a cirrose histológica é estática, independe do quadro funcional, não define complicações, etc. Além disso, a biópsia é um gold standard muito criticado,
pois avalia 1/50.000 do fígado, a fibrose é irregular e existem diferenças na biopsia do lobo direito ou do lobo esquerdo do fígado, sem
falar da necessidade de internação e complicações. Em algumas doenças a biópsia ainda é importante, como na cirrose autoimune, para
avaliar o tratamento, na presença de doenças associadas.
Biomarcadores
Os escores de fibrose são simples de aplicar, mas uma parcela
é complicada e de difícil utilização na prática clínica, alguns são patenteados, sendo que aqui no Brasil são muito caros.
Os mais utilizados são: o APRI, escore que utiliza a AST e plaqueta, podemos dizer rapidamente que apresenta boa especificidade, mas a sensibilidade para identificar cirrose é muito pequena;
o FIB4 (idade, AST, ALT e plaquetas) é utilizado também e apresenta
melhor equilíbrio entre sensibilidade e especificidade; o Fibroteste
que é patenteado, tem sido largamente utilizado em outros países,
especialmente na França, mas aqui no Brasil tem um custo elevado.
Há diversos métodos mecânicos que podemos comparar, que
Exame clínico
Avaliação
laboratorial
Marcadores
séricos
Fígado
Normal
se baseiam na elastografia hepática, que são a elastografia transitória
pelo Fibroscan, e as elastografias acopladas ao ultrassom como o
ARFI e o Explorer e também elastografia pela ressonância magnética
(RM). Na elastografia a onda produzida vai atravessar o fígado com
uma velocidade que depende da elasticidade do tecido. Quanto
mais duro e fibroso for o tecido, maior vai ser essa velocidade. Isso
permite diferenciar os diversos graus de fibrose. O método melhor
avaliado e validado é a elastografia transitória que tem alta performance para o diagnóstico de cirrose, enquanto o ARFI e o Explorer são
menos validados ainda em termos de resultados e padrões. Entretanto são métodos interessantes e, provavelmente, terão lugar no futuro,
visto que acoplam ao ultrassom a própria máquina da elastografia
como “2 em 1”. A RM além de cara, é um exame mais demorado e
ainda está muito pouco validada.
A elastometria é um método que está bastante difundido em
nosso país. Há situações nas quais sua utilização é mais difícil, como
na obesidade, nas elevações das transaminases (se > 5 vezes o limite superior da normalidade, modifica o resultado e vai identificar
uma fibrose que, na realidade, não existe).1
O valor normal da elastometria transitória fica em torno de
5kPa, e entre 5 e 75kPa são os diversos graus de fibrose, sendo que o
diagnóstico para cirrose é um pouco variável dependendo da causa. Na hepatite C em torno de 12,5 a 14,5kPa, na hepatite B de 11
a 12,5kPa, na doença alcoólica é mais elevada, em torno de 17kPa.
Na hepatite C uma meta-análise avaliou que 13kPa seria um valor
médio confiável e para o diagnóstico e também demonstrou sua
utilidade no diagnóstico de cirrose.
15
27.5
37.5
49
54
63
75 kPa
Elastografia Hepática Transitória
Não - VE 2/3
Cirrose hepática
Não - Child-Pugh B ou C
Elasticidade
hepática
Biópsia
hepática
Não - carcinoma hepatocelular
Não - sangramento digestivo
Exames de imagem
(US, MRI, endoscopy)
Avaliação não invasiva da cirrose hepática.
4
Não - história prévia de ascite
Valor Preditivo
Negativo
> 90%
Modificado de Foucher J et al. Gut 2006; 55: 403-8.
Elastografia hepática transitória severidade da cirrose.
A cirrose tem uma morbidade e uma mortalidade elevada em relação ao controle, por isso é necessário ter o diagnóstico confirmado.
Esses marcadores são importantes para o manejo individual do
paciente. O diagnóstico de cirrose indica a necessidade de tratamento
e também de prevenção das complicações e, depois de um determinado momento, o screening para a presença de varizes e de carcinoma
hepatocelular. No Brasil ainda precisamos de valores de cut off para essas complicações da cirrose, já que os estudos são um pouco diversos.
Mas é possível notar que há uma relação entre a velocidade medida na
elastometria, o grau de fibrose e o prognóstico do paciente.2
Uma meta-análise analisou o desempenho diagnóstico da elastografia para prever a presença de hipertensão portal clinicamente
significativa em pacientes com doença hepática crônica compensada e mostrou uma área sob a curva (AUROC) de 0,93. O cut off
para a sensibilidade diagnóstica melhor foi 13 e o melhor cut off
para especificidade de 90% foi em torno de 21kPa.3
A elastografia também apresenta muito bem valor preditivo
negativo para as complicações da cirrose, ou seja, acima de 27kPa
é difícil não ter varizes de esôfago e se menor que 37kPa, é pouco
provável que o paciente tenha uma ascite importante.4
Pacientes com cirrose, com teste psicométrico positivo para
encefalopatia mínima, apresentaram à elastografia valores significantemente mais elevados que aqueles sem encefalopatia. O valor
de corte foi de 20,8kPa que apresentou sensibilidade em torno de
80%, e especificidade de 70%.5
A utilização do método na avaliação do carcinoma hepato-
celular (CHC) tem um problema sério porque em várias doenças
(hepatite C, NASH) podemos encontrar significativo número de pacientes com CHC sem cirrose. Para pacientes cirróticos um estudo
em portadores de hepatites B e C encontrou que valores de elastometria ≥ 23-25 kPa se associaram a maior risco do desenvolvimento
de carcinoma no follow up.6
Uma outra aplicação importante desses métodos não invasivos
é na avaliação do tratamento com drogas antivirais e, no futuro,
drogas antifibróticas, desde que o acompanhamento sequencial
seria possível, dispensando biópsias seriadas. Estudo de Ana Carolina Cardoso, feito na França, mostrou redução acentuada do grau
de fibrose, medida pela elastografia em pacientes com hepatite C
que tinham alcançado resposta virológica sustentada.7
Em resumo, o diagnóstico da cirrose começa pelo exame
clínico, passa para a avaliação laboratorial. A biopsia hepática é indicada apenas em situações muito especiais de dúvida
diagnóstica ou acompanhamento de hepatite autoimune. Os
biomarcadores importantes podem ajudar a elastografia, que é
mais utilizada.
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Qual a importância dos métodos não invasivos?
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
Sandrin et al. Ultrasound Med Biol. 2003.
Castera et al. Gastroenterology. 2005
Shi, 2013.
Foucher J et al. Gut. 2006.
Jung KS et al. Hepatology. 2011.
Masuzaki et al. Hepatology. 2009.
Cardoso et al. Hepatology. 2008.
Rastreamento e vigilância epidemiológica
na cirrose
Renata Perez
Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRJ - UERJ - IDOR
Uma vez estabelecido o diagnóstico de cirrose, temos que dar
início ao rastreamento do carcinoma hepatocelular (CHC) e à vigilância das varizes de esôfago.
A alfafetoproteína pode ser útil como exame adicional no diagnóstico de um nódulo em fígado cirrótico, mas é importante lembrar que nem todos os carcinomas hepatocelulares (CHC) produzem alfafetoproteína, mesmo aqueles tumores volumosos. Quando
seus valores estão elevados, ela pode ser útil na monitorização da
resposta ao tratamento do CHC.
Essa determinação, no entanto, não é recomendada pelos guidelines AASLD e EASL na vigilância do CHC, pois pode ocorrer tanto
falso positivo, quanto falso negativo. Além de não haver consenso
entre o valor de corte a ser empregado, se aumentarmos a sensibilidade, a especificidade diagnóstica ficaria comprometida.1
Estudos que avaliaram a acurácia do ultrassom no rastreamen-
to do CHC observam que a associação com a alfafetoproteína pouco ou nada acrescenta ao método de imagem isoladamente.2
Entretanto, nem sempre é possível realizar a vigilância por ultrassom em condições ideais, com um examinador experiente, bom
equipamento e com a regularidade desejada. Nestes casos, eventualmente a alfafeto poderia contribuir para o rastreamento. Para os que
ainda a utilizam, vale lembrar que o aumento progressivo deve ser
valorizado, aumentando a sensibilidade da detecção de CHC.
O risco do CHC define a indicação ou não de fazer screening e uma
vez que decidimos que aquele paciente tem indicação de screening,
o intervalo dos exames é definido pela taxa de crescimento tumoral e
pelo tempo médio que o tumor dobra de tamanho que no CHC é de
4-12 meses, o que define o intervalo ideal de exame a cada 6 meses. A
redução desse tempo para 3 meses não trouxe maior benefício para o
diagnóstico de CHC, mesmo para tumores < 3 cms.3
5
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
A
B
Estudo (ano)
Sensibilidade (95% CI)
Sensibilidade
Sensibilidade (95% CI)
Estudo (ano)
Sensibilidade
Sem evidência de aumento de sensibilidade quando associada ao US.
Sensibilidade do US com e sem AFP na detecção do CHC precoce.
com lesão
em atividade
sem lesão
sem cofator
EDA
sem varizes
2 / 2 anos
3 / 3 anos
EDA
VE peq. calibre
anual
2 / 2 anos
Vigilância em pacientes com cirrose compensada.
Por que rastrear as varizes esôfago-gastricas?
As varizes esôfago-gastricas têm uma prevalência significativa, o
sangramento é súbito, imprevisível, grave e potencialmente fatal. Existe um aumento de mortalidade de até 20% no primeiro sangramento
e a instituição de profilaxia pode reduzir o risco de sangramento.
Na avaliação global dos cirróticos estima-se que 40 a 60% tenham varizes de esôfago; com uma associação ao grau de disfunção hepática, ela está presente em 30 a 40% dos pacientes Child A
e em 70 a 80% dos pacientes Child C.
Na história natural nos pacientes que não têm varizes, a incidência
é de 8% ao ano e está claramente associada a medida do gradiente
acima de 10. A progressão do pequeno para o grande calibre é estimada em 8 a 10% ao ano. Neste paciente que tem varizes, o risco de
sangramento é de 5 a 15% ao ano e os fatores relacionados ao sangramento são os mesmos relacionados a elas progredirem, a gravidade
da cirrose, a presença de sinais vermelhos e o calibre das varizes.
Com base nisso, o guideline da Sociedade Americana, recomenda que seja feita endoscopia em todos os pacientes no momento
do diagnóstico da cirrose e que, a partir daí, nos pacientes com cirrose compensada sem varizes seja repetida a endoscopia a cada 2 a 3
anos. Nos pacientes com varizes de pequeno calibre, deve-se repetir
a cada 1 a 2 anos. Nos pacientes com cirrose descompensada ela
deveria ser feita anualmente, a partir do momento em que houver
indicação de profilaxia (varizes de grosso calibre ou médio, em cirrose
compensada, ou de pequeno calibre em cirrose descompensada ou
com sinais vermelhos), a vigilância fica interrompida.
Recentemente tivemos o consenso de Baveno VI, publicado em
6
setembro de 2015.4 Em relação ao consenso anterior houve maior disponibilidade de testes não invasivos. A hipertensão portal clinicamente significativa é definida por um gradiente de pressão > 10mmHg.
Métodos não invasivos são considerados para excluir a HP significativa, uma vez que são considerados sugestivos de hipertensão portal
significativa a elastografia acima de 20 kPa isoladamente ou associada
à contagem de plaquetas e tamanho do baço e a presença de circulação colateral identificada por imagem. Baseado nisso, na recomendação atual de Baveno alguns pacientes cirróticos não teriam que fazer
endoscopia, que são os pacientes com elastografia hepática transitória
abaixo de 20kPa, associado a uma contagem de plaquetas acima de
150 mil. Esses pacientes devem ser seguidos com elastografia e contagem de plaquetas anualmente. Devem realizar endoscopia se houver
aumento de elastografia ou redução de contagem de plaquetas.
Em relação à vigilância em pacientes com cirrose compensada, há outra inovação; considerar além do calibre das varizes, a
presença de lesão hepática ativa, ou seja, a presença de atividade
necro-inflamatória persistente ou não, ou seja, pacientes que não
responderam ao tratamento antiviral na hepatite C, ou, por exemplo, pacientes que mantêm um consumo de álcool. A partir disso,
a vigilância recomendada nos pacientes com cirrose compensada
que tivessem endoscopia digestiva sem varizes, depende se ele
tem ou não lesão hepática ativa. Nos primeiros ela deverá ser recomendada a cada 2 anos e nos sem lesão ativa a cada 3 anos.
Nos pacientes com varizes de pequeno calibre com lesão hepática em atividade, a endoscopia deverá ser anual e sem lesão a
cada 2 anos. Isso também é um conceito novo que foi proposto na
recomendação Baveno VI.
Em resumo, o ultrassom de abdômen é o principal método de
vigilância de CHC e deve ser realizado a cada 6 meses. Na impossibilidade de vigilância regular por US, o uso de AFP deve ser considerado.
Métodos não invasivos não substituem a endoscopia na detecção de varizes, mas podem ser úteis na seleção de pacientes com
maior risco para o rastreamento endoscópico.
A periodicidade da vigilância endoscópica depende do estágio
da cirrose, do calibre das varizes e da presença ou não de lesão hepática ativa.
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
J Hepatol. 2001; 34: 570-575.
Aliment Pharmacol Ther. 2009; 30: 37-47.
Hepatology. 2011; 54: 1987-97.
R de Francis and Baveno VI group J. Hepatol. 2015.
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Impacto da terapia da etiologia da
cirrose e da terapia antifibrótica
sobre a hipertensão portal
Juan Carlos Garcia-Pagán
Hepatic Hemodynamic Laboratory. Liver Unit. IMDIM. Hospital Clinic. IDIBAPS. Ciberehd. Barcelona
O mais importante quando realizamos um tratamento em nossos pacientes com cirrose é reduzir a morbidade e complicações do
paciente e, ao mesmo tempo, reduzir sua mortalidade.
Observando a história natural da cirrose, sabemos que ela tarda
de 20 a 25 anos até que o paciente desenvolva complicações graves
da doença e, uma vez que as desenvolva, leva mais tempo, cerca de
2 a 5 anos, até que o paciente venha a óbito. Nessa história natural,
sabemos que o desenvolvimento de hipertensão portal é um evento
chave, pois a partir daí podem começar a aparecer às complicações,
o que vai ocorrer quando a pressão portal supera 10 mmHg.
Foi demonstrado pelos estudos farmacológicos e nos estudos com
doença alcoólica, que as mudanças no gradiente de pressão hepática
têm uma grande importância, pois se correlacionam com o prognóstico dos pacientes. Nas meta-análises de estudos com betabloqueadores
associados ou não a nitratos, reduções da pressão maiores que 20% do
valor basal ou para valores menores que 12 mmHg, se associaram claramente a menor risco de ter cirrose hepática e com melhor sobrevida.
Até agora, sabemos que o aumento da pressão portal nos pacientes com cirrose se deve a dois fatores fundamentais: um aumento da resistência intra-hepática e um aumento do fluxo sanguíneo.
Até recentemente, a única forma que poderíamos usar para reduzir
o gradiente de pressão portal nos cirróticos era reduzindo o fluxo
sanguíneo portal com os betabloqueadores. Atualmente há grandes
esforços para se começar a reduzir o outro componente que é o aumento da resistência intra-hepática. Temos que saber que existem
dois fatores fundamentais para provocá-lo. Um componente dinâmico sobre o qual não vamos falar, e um aumento secundário às alterações estruturais que representam o fígado cirrótico, fundamentalmente a fibrose. Ambos são potencialmente reversíveis.
Estudos experimentais com modelos murinos de cirrose, por
ligadura e secção do colédoco, com intoxicação por drogas como
o CCl4 que demonstravam a reversão no tecido fibroso.1
Tratamento da etiologia / Antifibróticos
Mecânico
Dinâmico
Aumento da
resistência
Aumento do
fluxo sanguíneo
Hipertensão Portal
O paralelo imediato seria com a cirrose alcoólica. Trabalho pioneiro com 30 cirróticos de etiologia alcoólica mostrou decréscimo
de, em média, 16% no gradiente de pressão portal nos que se abstiveram de álcool e ligeiro aumento do gradiente nos que permaneceram bebendo.2
Hoje, todo esse cenário que está mudando e a possibilidade de
regressão da fibrose tem sido confirmado em vários estudos, como
na hepatite C, onde pacientes com resposta virológica sustentada
(RVS) foram seguidos por 5 anos e o percentual de pacientes com
escore Ishak > 4 caiu de 38% para 12% no decorrer do seguimento,
enquanto que o percentual de cirrose caiu de 28% para 8%.3
Essas alterações da fibrose se refletem na pressão portal, estudos
em cirróticos pelo vírus da hepatite B com gradiente de pressão clinicamente significativo e que foram tratados com LAM, o gradiente
diminuiu mais de 20% ou abaixo de 12 mmHg em 10 a cada 13 pacientes, que tinham dados iniciais de pressão superior a 12 mmHg.4
Em trabalho multicêntrico realizado na Espanha, publicado recentemente, análise de 100 pacientes com cirrose hepática compensada, tratados com Peg + Riba e nos quais foi feita a avaliação
do gradiente de pressão portal (HVPG) antes e 24 semanas após
o final do tratamento, encontrou 74 pacientes com hipertensão
portal severa (HVPG>10mmHg) 35% dos pacientes tratados obtiveram RVS. Esses pacientes foram acompanhados em follow-up para
avaliar descompensação hepática, desenvolvimento de CHC, óbito ou transplante de fígado. Ao final do seguimento 19 pacientes
apresentaram descompensação hepática e essa descompensação
esteve relacionada aos valores de HVPG, mas não à RVS.5
Apesar de ter havido um decréscimo significativo do gradiente
nos pacientes com RVS, ela ocorreu em uma magnitude não demasiadamente importante (cerca de 14%) e apesar do tratamento,
muitos seguiam com um gradiente de pressão hepática acima ou
igual a 10 mmHg e, portanto com risco de complicações.
Esses são dados semelhantes aos que foram apresentados no
último Congresso de Viena. Um estudo multicêntrico internacional
no qual um grupo de 37 pacientes com cirrose foram tratados com
terapia antiviral durante 48 semanas, com SOF + RIB e 92% desses
pacientes tinham um gradiente igual ou superior a 10 mmHg ao
iniciar o tratamento. Ao final, não houve efeitos significativos sobre
o gradiente de pressão quando se analisaram todos em conjunto.
Em 9 pacientes, houve uma redução significativa do gradiente de
mais de 20% e em outros 14 pacientes, a redução foi superior a 10%.6
Quando estamos tratando com antivirais, em pacientes com
estágio avançado da doença, o tratamento etiológico pode não ser
suficiente, mesmo com tratamentos muito eficazes. Se tratarmos
nossos pacientes em fases avançadas, com claros sinais de hipertensão portal, provavelmente este tratamento ao menos em um
7
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
62 pacientes (71% com HVPG> 10 mmHg -CSPH).
HVPG basal e 24 semanas depois da prescrição antiviral
Ainda HVPG >10mmHg; risco de complicações no pH
SVR
30
(p=0,005)
mmHg
20
10
0
Basal
HVPG
FU24
não-SVR
30
(p=0,25)
mmHg
20
10
0
Basal
HVPG
FU24
O HVPG teve redução significante no grupo SVR
(n = 22 [35% dos pac.]; -14%), porém não no grupo não SVR (n = 40; NS)
Lens et al. Clin Gastro Hepatol 2015
*HVPG: Gradiente de pressão venosa hepática, SVR: resposta viral sustentada,
CSPH: hipertensão portal clinicamente significante.
HVPG e risco de descompensação hepática em pacientes com
cirrose por HVC recebendo peg+riba.
prazo de 3 a 4 anos não vai evitar que os pacientes desenvolvam
complicações da hipertensão portal (não sabemos que pode acontecer com esse gradiente ao final de 10 anos).
Sabemos que o desenvolvimento de fibrose está diretamente relacionado às manifestações da doença, por isso o interesse atual em
obter um tratamento não só do agente etiológico como também da
fibrose. Importante, por exemplo, o reconhecimento de que uma enzima, a LOXL2, responsável por fazer com que o tecido fibroso que se
acumula no fígado cirrótico tenha uma estrutura muito difícil de degradar posteriormente pelas enzimas hepáticas. A produção de anticorpos monoclonais contra essa enzima além de bloquear os fibroblastos
diminuiu a produção de citocinas resultando em redução da fibrose.7
Em resumo nos pacientes com cirrose o gradiente de pressão
venoso-hepático e suas alterações se correlacionam diretamente
com os resultados clínicos. Os tratamentos etiológicos são capazes
de diminuir o gradiente. Mas nos estágios avançados da doença, a
curto prazo, isso pode não ser suficiente para prevenir as descompensações. E a combinação dos tratamentos etiológicos quando
possível e os tratamentos antifibróticos podem reduzir mais o gradiente e esse é um objetivo a ser alcançado.
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
Issa. Gastroenterology. 2004.
Vorobioff. Gastroenterology. 1999.
Marcellin P. Lancet. 2013.
Manolakopoulos. J Hepatol. 2009.
Lens. Clin Gastro Hepatol. 2015.
Afdhal l. EASL. 2015.
Barry-Hamilton. Nature Med. 2010.
SIMPÓSIO II
Encefalopatia hepática mínima
Esther Buzaglo Dantas-Corrêa
Disciplina de Gastroenterologia, Universidade Federal de Santa Catarina, Serviço de Gastroenterologia – HU/UFSC
A Encefalopatia hepática (EH) é definida como um espectro de
anormalidades neuropsiquiátricas que são observadas em pacientes com disfunção hepatocelular ou shunt porto sistêmico, excluindo-se qualquer outra causa de lesão cerebral orgânica.1,2
Encefalopatia hepática associada à falência hepática aguda grave é denominada encefalopatia A; aquela causada por shunt porto
sistêmico é encefalopatia B, ou causada por cirrose hepática, que é
do tipo C. Esta última também pode ser classificada quanto à sua
evolução no tempo como: (a) episódica, quando aparece raramente no indivíduo, (b) recorrente, quando existe um ou mais episódios
no período de seis meses ou menos, (c) persistente, quando o paciente mantém anormalidades comportamentais neuropsicológicas que eventualmente se tornam mais evidentes.3,4
Ainda podemos classificar a EH quanto à presença ou não de fatores precipitantes identificáveis. Quando não é possível identificar
qualquer fator desencadeante a EH é denominada encefalopatia
8
espontânea, o que caracteriza provavelmente uma fase avançada
da doença hepática. Quanto à gravidade das manifestações, a encefalopatia hepática pode ser classificada pelos critérios de West
Haven ou pela classificação realizada pelo grupo ISHEN que é um
grupo de estudiosos de encefalopatia e de metabolismo.
Os graus de encefalopatia hepática pelos critérios de West
Haven, criados por Harold Conn, continuam sendo utilizados, com
algumas modificações recentes. A principal alteração inclui na classificação a encefalopatia mínima como um primeiro grau de encefalopatia antes da encefalopatia grau 1 de West Haven. Essa é a doença que se caracteriza pela ausência de anormalidades no exame
clínico e neurológico, mas são identificadas alterações nos exames
neuropsicométricos ou nos neurofisiológicos.5
Temos ainda o sistema Sonic que foi criado numa reunião da
ASHEN publicado pela primeira vez em 2011, que procura definir
a encefalopatia como uma situação clínica contínua e dinâmica,
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Testes
psicométricos
PSHE
ERP-300
auditivo
EHM
TC
CFF
(inibitório, Stroop Test)
(Critical Flicker Frequency)
Dantas Corrêa | 2015.
Diagnóstico da EHM.
em que as alterações podem atravessar graus variados em períodos curtos e que na maioria das vezes não se consegue individualizar a situação clínica. Principalmente com relação à encefalopatia mínima e grau 1. Atualmente é aceito para a diferenciação
de encefalopatia mínima e encefalopatia grau 1, a presença das
alterações neuropsicológicas e neurofisiológicas, frequentemente
difícil de serem separadas. Assim, a evolução para encefalopatia
grau 2 identifica melhor a desorientação, bem como o aparecimento do flapping. Essa é uma classificação que ganhou algum
espaço, mas ainda não há uma definição de como realmente
utilizar nessa mistura de encefalopatia mínima e encefalopatia
grau 1 como sendo uma alteração única.6-8 Assim, pelo sistema
Sonic, a encefalopatia mínima que seria a “encoberta” engloba
também alguma encefalopatia grau 1.9
Como se faz o diagnóstico de
encefalopatia mínima?
A partir de uma bateria de testes neuropsicométricos e/ou
outros, que veremos a seguir. Os testes neuropsicométricos mais
utilizados englobam o conjunto de 5 testes, como o trail making,
o teste de trilhas, que demanda pessoas que saibam aplicá-los, havendo certa dificuldade na compra destes testes. É preciso estabelecer uma normatização na população, e são poucos os testes que
existem com alguma normatização.10,11
Maior facilidade existe para a utilização dos testes computadorizados, como o teste inibitório computadorizado, o TC-Stroop
test, assim como o potencial auditivo P300 e o CFF- Critical Flicker
Frequency. Alguns testes psicométricos associados a outro tipo de
teste é preferencial para o diagnóstico de encefalopatia mínima. No
entanto, em alguns estudos não se utiliza duplicidade de metodologia e sim apenas um teste computadorizado.
Estudos mostram prevalência de EHM de 20% até 80% dos
pacientes hepatopatas crônicos e essa diferença na frequência
está muito ligada a diferentes métodos diagnósticos. A encefalopatia hepática mínima está presente, evolutivamente, em até
50% dos pacientes, sendo mais frequente naqueles pacientes
submetidos a TIPS.12,13
Os pacientes com diagnóstico de encefalopatia hepática mínima sobrevivem em torno de 23% após 3 anos de diagnóstico.14
Estudos antigos mostram mudança da qualidade de vida quando o paciente apresenta EHM identificável em testes neuropsico-
métricos. Eles perdem autonomia e capacidade laborativa, o que
indica que esses pacientes devam ser tratados. Mas como tratar esses pacientes? Existem tratamentos eficientes, mas de uso contínuo
e em um quadro de difícil diagnóstico.15
Vários estudos avaliaram a falta de habilidade desses pacientes em dirigir automóveis. Os pacientes com encefalopatia mínima
têm maior risco de acidente e maior risco de violação de leis de
transito do que os pacientes sem encefalopatia. De repente existe
uma perda de atenção e há uma situação grave como um paciente dirigindo e isso pode ter consequências.16 Mas, como fazer com
que esse paciente não dirija? Esta é uma condição de autonomia
do indivíduo!
Como conclusão eu diria que a encefalopatia hepática mínima
aumenta o risco do aparecimento da encefalopatia hepática manifesta e tem impacto negativo na sobrevida. Diminui a qualidade
de vida e diminui a capacidade laborativa. Aumenta os riscos de
acidente de transito e violação das leis de transito e embora reconhecidamente importante é pouco diagnosticada e, possivelmente, por isso não é tratada.
Não abordamos o tratamento, pois o maior foco do estudo da
encefalopatia hepática mínima ainda é o diagnóstico. O tratamento
é simples, eficiente e faz a reversão das alterações observadas nos
testes psicométricos e neurofisiológicos.
Referências recomendadas
1. Recommendation of Working Party on Hepatic Encephalopathy.World Congress
of Gastroenterology.
2. Ferenci P et al. Hepatology. 2000.
3. Vilstrup H et al. Hepatic Encefphalopathy in Chronic Liver Disease. 2014.
4. Practice Guideline AASLD and EASL. Hepatology. 2014.
5. Bajaj JS et al. Aliment Phamarcol. Ther 2011.
6. Bajaj JS. Hepatology. 2009.
7. Cordoba J. Gastroenterology. 2010.
8. Bajaj JS et al. Aliment Pharmacol Ther. 2011.
9. Bajaj J et al. Aliment Pharmacol Ther. 2011.
10. Weissenborn K et al. J Hepatol. 2001.
11. Ferenci P et al. Hepatology. 2002.
12. Muller KD, Prakash RK. Clin Liver Dis. 2012.
13. ajaj JS et al. Aliment Pharmacol Ther. 2011.
14. Bustamante AS et al. J Hepatol. 1999.
15. Prasad S et al. Hepatology. 2007.
16. Bajaj Js. Am J Gastroenterol. 2007.
9
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Resistência à insulina, síndrome e diabetes
mellitus na cirrose hepática
Edison R Parise
Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo
O primeiro conceito que vamos estabelecer, muito defendido
por hepatologistas, mas não por endócrinos, é o chamado diabete
hepatógeno decorrente de três fatores: (a) deficiente extração hepática da insulina, (b) hiperprodução ou falta de metabolização do
glucagon, do hormônio de crescimento, das citocinas anti-inflamatórias fatores que aumentam a resistência insulínica, (c) diminuição
funcional das células beta do pâncreas que vai ser desencadeada a
partir de fatores etiológicos e de complicações da doença hepática.
As características que diferenciariam esse tipo de diabetes seriam; a ausência de associação com fatores normalmente associados com o aparecimento de diabetes (principalmente ausência de
história familiar), maiores índices de resistência insulínica e menor
taxa de alteração da glicemia de jejum além de menor índice de
complicações típicas do diabetes como a microangiopatia. E uma
característica que marca esses pacientes é que o transplante hepático faz com que esse diabete regrida.
Finalmente, estudo anatomopatológico de amostras de tecido pancreático de pacientes em autópsia, mostrou diferenças
importantes na concentração de células positivas para insulina e
na expressão de fatores gênicos associados à secreção insulina nos
pacientes com diabete hepatógeno quando comparados aos diabéticos tipo 2.1
Diabetes mellitus tipo II (DM)
Deve ser ressaltado que os fatores anteriormente citados para
o desenvolvimento do diabetes hepatógeno, também tendem a
agravar a situação de indivíduos que apresentam tendência a apresentar DM no futuro. Além disso, alguns agentes etiológicos da cirrose são capazes de levar a alterações do metabolismo glicídico e o
melhor exemplo disso é o vírus da hepatite C. A incidência de diabetes (DM) em pacientes com hepatite C é 4 vezes maior que na população geral e mesmo quando comparados com pacientes com
Diabetes
Resistência à
insulina
Cirrose
Descompensação
hepatica
Carcinoma
hepatocelular
Paola Loria1, Amedeo Lonardo1 and Frank Anania2
Cirrose, RI e diabetes. Um circulo vicioso.
10
Hepatol Res. 2013 January.
<< Extração hepática insulina
>> shunt PS
Cirrose hepática
down regulation of
insulin receptors
Glucagon GH
Citocinas A
Graxo Livre
Hiperinsulinemia
Resistência insulina
Fígado
Diabetes
Alterações metabólicas
oxidativas e não
oxidativas
<< Função cels β
do pâncreas
Fatores Não
Hepáticos
Genéticos
Ambientais
Músculo
Intolerância glicose
Fatores Hepáticos
Álcool, Ferro,
HCV, CHC
Modificado de Garcia-Compear D et al, WJG,2009).
Fisiopatologia do diabetes hepatógeno.
outras hepatopatias crônicas, ainda que cirróticos. Isso tem sido
atribuído à capacidade do core do vírus em bloquear diretamente a
sinalização da insulina, o que levaria à resistência à ação da insulina
(RI), fator inicial no desenvolvimento do DM. Nesses pacientes a RI,
por si só, é capaz de induzir esteatose e promover a progressão da
doença hepática. A contraprova de que isso realmente se associa à
infecção viral é demonstrada nos casos com cura virológica, onde
há regressão da RI, ao contrário do que é observada nos pacientes
que não respondem ao tratamento. A regressão pode ser observada na quantificação do HOMA-IR, na dosagem do peptídeo-C e, nos
tecidos, com aumento na expressão dos receptores de insulina.2
Existem vários estudos que mostram que a RI acompanha a evolução da doença. Quanto mais grave for a doença (em termos de
fibrose), maior o HOMA-IR, independente do genótipo viral. Parte
dessa progressão pode ser atribuída ao estresse oxidativo um fator
de progressão importante nas doença hepática, que é encontrado
nos pacientes com hepatite C e RI.3 Finalmente em outras doenças
que não a hepatite C também existe uma associação clara entre
diabetes e progressão da doença, inclusive em trabalhos evolutivos
que acompanharam pacientes com diabetes recém instalados.
A associação de DM com evolução das hepatopatias para o
carcinoma hepatocelular tem sido demonstrada em várias doenças hepáticas como hepatites B e C, esteatoepatite não alcoólica,
hemocromatose, etc.
A associação de obesidade e DM está diretamente relacionados
à maior progressão tanto da hepatite C quanto na hepatite B para
cirrose hepática. Quando esses dois fatores se associam o aumento
no risco do desenvolvimento de carcinoma hepatocelular (CHC)
chega a ser quase 100 vezes maior do que o paciente não obeso
nem diabético.4 Também na hepatite B, estudo longitudinal acompanhando pacientes cirróticos por mais de 10 anos demonstrou
que pacientes que apresentaram DM ao longo desse acompanhamento tiveram maior incidência de CHC.5
rose, a sobrevida foi maior nos pacientes que continuaram a utilizar
a metformina após o diagnóstico de cirrose.9
Por outro lado, avaliando o risco de desenvolvimento de HCC
em portadores de DM, foi observado que aqueles que utilizaram
tiazolidinedionas, como é o caso da pioglitasona e rosiglitasona, a
incidência de câncer de fígado e de câncer colorretal nesses pacientes com DM foi significativamente menor do que aqueles que
utilizaram outras terapias no controle da doença.10
Como conclusão: a cirrose hepática através da resistência insulínica e das alterações das atividades das células beta do pâncreas
pode induzir ao aparecimento de diabetes com características diferentes do DM, que seria o chamado diabetes hepatógeno. Por
outro lado, DM e RI estão associados à evolução da doença hepática crônica, à descompensação hepática e ao aparecimento do
carcinoma hepatocelular. Estudos retrospectivos sugerem que o
tratamento com sensibilizadores de insulina possa ter efeito protetor sobre as complicações hepáticas determinadas pelo diabetes e
pela resistência à insulina.
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Em estudo que avaliou quase 35 mil pacientes que aguardavam transplante hepático o DM foi considerado fator de risco para
o desenvolvimento do carcinoma CHC, independente da etiologia
da cirrose. Nesse estudo foi desenvolvido um índice de risco para
o carcinoma hepatocelular (Address- CHC) que inclui idade, raça,
etiologia da cirrose, diabetes e gravidade da doença.6
O DM também tem impacto sobre outros fatores das doenças
hepáticas que impactam na descompensação funcional da doença, como a incidência de peritonite bacteriana espontânea e encefalopatia hepática que parecem ser mais comuns entre cirróticos
com DM. Não surpreendente também é a maior prevalência de disfunção renal nos pacientes com DM, que aumenta em mais de três
vezes o risco de insuficiência renal aguda em cirróticos.7
Embora baseado em estudos retrospectivos, tem sido observado que medicamentos que reduzem a resistência à insulina, poderiam ter efeito protetor na evolução das hepatopatias crônicas.
Análise retrospectiva de pacientes com cirrose e hepatite C com
diabetes mellitus aonde foram comparados pacientes que controlavam diabetes apenas com dieta, aqueles com tratamento com
metformina ou com secretagogos de insulina ou ainda com insulina injetável, encontrou que tanto a descompensação, o carcinoma hepatocelular e necessidade de transplante nos pacientes que
usaram metformina foram significativamente inferiores do que nos
pacientes que usavam outro tipo de tratamento para o diabetes.8
Estudo mais recente de avaliação dos pacientes cirróticos e diabéticos que se mantinham em uso de metformina, independentemente de estar compensado ou descompensado e da etiologia da cir-
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
Sakata, et al. 2013.
Kawaguchi. 2007.
Oliveira AC. 2009.
Chen et al. Gastroenterology. 2008.
Fu SC et al. AP&T. 2015.
Flemming et al. Cancer. 2014.
Satapathy et a. 2014.
Nkontchou G 2011.
Zhang et al. Hepatology. 2014.
Chang et al. Hepatology. 2012.
Microbiota intestinal e cirrose:
aspectos clínicos
Claudio Marroni
Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre
A microbiota digestiva é a comunidade de micro-organismos
que vive no trato gastrointestinal, composto por bacteria, archaea,
eucarya e vírus, fazendo parte de um agregado de genomas e genes da microbiota digestiva. Podemos dizer que disbiose é o estado
de desbalanço microbiano digestivo com mudança de configuração estrutural e funcional da microbiota, com ruptura da homeostase entre hospedeiro e sua comunidade microbiana.
Os pré-bióticos são ingredientes alimentares com propriedades
biológicas benéficas ou propriedades de um ou mais simbiontes
digestivos. Pró-bióticos são micro-organismos vivos que ingeridos
causam benefícios ao hospedeiro distante por interação entre as
células do hospedeiro ou indiretamente por efeito em membros
da microbiota.
O trato gastrointestinal e a sua barreira epitelial têm superfície
de 200 m2 e é a área mais exposta do organismo ao meio externo.
Todo esse ecossistema age como uma unidade funcional. Há diversas espécies de bactérias que habitam essas áreas, sendo que
a maior quantidade está no cólon depois do íleo terminal. Esses
trilhões de bactérias que existem no intestino pesam de 1 a 2 quilos
e o genoma coletivo da microbiota tem uma quantidade 150 vezes
maior que o genoma humano.
O funcionamento desse ecossistema é dinâmico. Quando a
criança nasce, ela é estéril e durante toda a vida ela pode ter uma
evolução para uma microbiota adequada e saudável. Vários componentes podem interferir na alteração dessa microbiota com disfunção, como o efeito das substâncias químicas, infecção, alterações metabólicas e outras.1
A microbiota intestinal humana tem algumas funções: defesa
do hospedeiro contra patógenos e toxinas, desenvolvimento e
manutenção do sistema imune intestinal, manutenção da digestão
suplementar com capacidade enzimática suplementar.
A microbiota contém patógenos oportunistas e potenciais
agressores ao ser hospedeiro. Fundamentalmente, é importante
que haja uma homeostase da microbiota intestinal para o desenvolvimento de um sistema imune adequado especializado na mucosa intestinal.
11
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Dis
b
ios
e
Sim
bio
se
Pirâmide da doença crônica
Pirâmide da microbiota intestinal
Na caracterização da barreira intestinal, fundamental para o
desenvolvimento do homem, a microbiota está localizada numa
área de muco, atapetando a superfície do epitélio do intestino. Essa
barreira mecânica funciona muito bem. Depois, há uma barreira
imunológica relacionada com a produção de imunoglobinas e outras substâncias que protegem o intestino. Há uma outra barreira
relacionada com os linfócitos, com células dendríticas, monócitos e
que também protegem o intestino. E, além disso, existe uma barreira muscular, neurológica e vascular. É muito importante essa integridade da mucosa relacionada com a imunologia. A microbiota pode
desenvolver estímulos a certas interleucinas pró-inflamatórias. Esse
processo inflamatório é parcialmente abafado pela produção, por
essas mesmas células, de outras interleucinas (10, TNF, Gama) que
são as que protegem o intestino, dando uma possibilidade de um
equilíbrio relacionado com essa situação.2
Existe uma inter-relação muito grande entre células, sistema
de defesa, partículas alimentares, moléculas derivadas da digestão. Tudo isso é organizado em um sistema semipermeável que
permite a absorção de nutrientes e macromoléculas essenciais no
processo metabólico e ao mesmo tempo protege o organismo de
micro-organismos invasivos.
No triângulo de microbiota intestinal, impermeabilidade intestinal e imunologia da mucosa, ocorre uma boa saúde. A disbiose é um desequilíbrio bacteriano do intestino que compromete
o sistema imune. Isso está relacionado com inúmeras situações
clínicas e com o uso de antibióticos, de pesticidas e de fatores
ambientais e dietéticos.
Sabemos que a microbiota e as doenças hepáticas têm uma
relação cada vez mais evidente.
O fígado é um órgão central do metabolismo com funções de
remoção de substâncias tóxicas do sangue. Assim, é exposto a toxinas e bactérias intestinais e produtos bacterianos.
A microbiota é metabolicamente tão complexa quanto o fígado, com atividade metabólica importante, pois possibilita: prover
nutrientes essenciais e maximizar a eficiência da energia colhida
com o alimento ingerido.
Na fisiopatogênese, podemos demonstrar como na cirrose, a
hipertensão portal determina alterações no intestino, como edema, aumento da permeabilidade da mucosa e outras alterações
que favorecem a translocação bacteriana e determinam deficiências imunes nesses pacientes. Com a translocação bacteriana e os
12
shunts vasculares aumentam os níveis de LPS circulantes (as endotoxicinas). Assim, a superpopulação bacteriana e a alteração de permeabilidade intestinal aumentam os níveis plasmáticos de endotoxinas bacterianas, LPS, os peptidoglycan e os patógenos associados
a moléculas signal (PAMPs), gatilhos da cascata inflamatória que
precede a lesão hepática.
Em outra situação a doença gordurosa não alcoólica leva à progressão para a cirrose. É a dieta muito rica em gorduras que provoca
disbiose e a modificação das estruturas bacterianas no intestino,
determinando a possibilidade de alterações metabólicas, a diminuição do VLDL, esteatose hepática e o desenvolvimento de NASH.3
Da mesma maneira a ingesta de álcool faz com que exista uma
modificação da flora bacteriana com diminuição muito acentuada
dos lactobacilos, fazendo com que haja alterações de permeabilidade celular e desenvolvimento de doença hepática alcoólica.
O que podemos fazer para tentar melhorar isso? Podemos usar
probióticos, para manter a permeabilidade intestinal intacta e aumentar a integridade do lume e da parede do intestino, e podemos
usar prebióticos, que são alimentos que promovem uma modificação do lume e das características das bactérias. Podemos usar
antibióticos específicos que diminuem o crescimento bacteriano.
Existe atualmente a opção de transplante fecal que pode ser utilizado em alguns tipos de situações mais específicas, como diarreias
por clostridium.
Existe uma pirâmide alimentar compatível com a melhor ou
pior microbiota intestinal, com diferentes tipos de alimentos numa
sequência em que a ingestão maior ou menor, dá ideia de uma
boa microbiota, versus aqueles que têm uma disbiose, que é bem
o inverso, favorecendo o aparecimento de obesidade, fígado gorduroso, alterações metabólicas importantes e resistência à insulina.
Podemos dizer que a microbiota talvez seja uma das últimas grandes fronteiras para a medicina explorar.
Referências recomendadas
1. Kostic, A et al. The Microbiome in Inflammatory Bowel Disease: Current Status and the
Future Ahead. Gastroenterology. 2014;146:1489–1499.
2. Hollister, EB et al. Compositional and Functional Features of the Gastrointestinal Microbiome and Their Effects on Human Health Microbiome and Their Effects on Human
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HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Aspectos atuais da resistência
antimicrobiana na cirrose
Edna Strauss
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo-USP
O corpo humano alberga dez vezes mais bactérias do que células eucarióticas. As infecções bacterianas devem ser caracterizadas
em três tipos: (a) Infecções comunitárias – ocorrem na comunidade
ou são detectadas até 48 horas da internação, (b) Infecções nosológicas detectadas depois de 48 horas da internação, (c) infecções
relacionadas aos cuidados médico-hospitalares, que ocorrem em
menos de 48 horas após internação, em pacientes que tiveram procedimentos diagnósticos invasivos, cirurgia ou uso de antibióticos
até 6 meses antes.
O indivíduo com cirrose e hipertensão portal tem baixa defesa
imunológica. Ele tem disfunção da barreira intestinal, com supercrescimento bacteriano e alterações qualitativas da microbiota.
Isso vai fazer com que haja translocação bacteriana patológica que
leva à bacteremia e na presença de ascite, à peritonite bacteriana
espontânea. Assim, nosso paciente cirrótico passa de um microbioma sadio para uma disbiose, principalmente por fatores genéticos,
imunitários, pela maior permeabilidade do intestino e alterações no
seu pH. Estes fatores vão favorecer o transporte das bactérias ou
dos produtos microbianos para dentro da célula intestinal, podendo cair na circulação devido às alterações imunológicas.
Considerando as diferentes infecções bacterianas, a PBE é uma
das mais prevalentes, mas a infecção urinária e infecção de partes
moles também são eventualmente importantes. Lembramos que
as infecções do trato respiratório e as septicemias são as mais graves, com os maiores índices de mortalidade. Um trabalho nosso1
mostra a diminuição da PBE ao longo do tempo, confirmada por
outros estudos na literatura.
Quanto à resistência bacteriana, temos que o esquema antibiótico inicial inapropriado é um elemento importante para o aparecimento de resistência. Em Hepatologia, além do tratamento de
pacientes infectados, fazemos profilaxia com antibióticos. Devemos, entretanto, usar antibióticos com muito critério, somente
quando existe um motivo amplamente justificado para o uso. Na
PBE está comprovado que a recidiva é muito frequente: 70% depois de um ano e a descontaminação com antibióticos é eficaz,
melhorando a sobrevida. Esses indivíduos devem ser tratados por
tempo indeterminado.2,3
A outra condição para se fazer profilaxia é na hemorragia digestiva alta (HDA). Dentre os cirróticos que fazem HDA 20% já chega infectado, e outros 50% se contaminam durante as primeiras
horas de hospitalização. A antibiótico-profilaxia é fundamental para
esse indivíduo, caso contrário ele vai piorar a hipertensão portal e
seu quadro clínico. O re-sangramento é muito mais frequente no
indivíduo infectado.
No episódio de hemorragia digestiva de cirrótico compensado,
antibióticos orais como a norfloxacina podem ser utilizados, por
tempo limitado, geralmente até 7 dias. A vantagem das quinolonas
é que elas são cômodas, toleráveis, de amplo espectro, não tem
ação sobre anaeróbios, preservam a microbiota, teriam um menor
risco de superinfecção e de resistência. Mas se o cirrótico tiver pelo
menos duas destas complicações: ascite, desnutrição, encefalopatia ou bilirrubina aumentada é mais eficaz tratarmos com as cefalosporinas de segunda ou terceira geração.4
As quinolonas devem continuar sendo indicadas para infecções do trato urinário, para profilaxia da PBE, para infecções respiratórias dependendo dos fatores de risco e para as diarreias bacterianas. Entretanto, o aparecimento de resistência, por exemplo
de E. coli ao ciprofloxacino, vêm aumentando gradativamente ao
longo do tempo.
É muito importante nós entendermos quais são os mecanismos de resistência bacteriana, que podem ser intrínsecos ou extrínsecos. Os mecanismos de resistência intrínsecos estão muito bem
caracterizados, existindo por exemplo, um antibiótico (A) para uma
determinada infecção que entra na barreira da célula microbiana e
atinge o seu alvo. Um outro antibiótico (B) tem a capacidade de entrar na barreira, porém existe um mecanismo que se chama bomba
de efluxo que faz com que ele não consiga atingir o seu alvo e esse
antibiótico é expelido pela bactéria. Existe um terceiro tipo de antibiótico (C) que simplesmente não consegue ultrapassar a barreira.
O microbiologista conhece o tipo de resistência intrínseca dos diferentes antibióticos.5
Além desses mecanismos de resistência intrínseca, existem
resistências adquiridas, de extrema importância. Um deles é a inibição enzimática, como ocorre nas resistências à penicilina, à cefalosporina e aos carbapenemicos.5
Através do desenvolvimento das β-lactamases eles adquirem
resistência, já que esses antibióticos têm em comum o núcleo
β-lactâmico. Ao longo dos últimos anos se conseguiu inibidores de
Antibiótico A
Antibiótico B Antibiótico C
glicopeptídeos
Blair JMA, et al. Molecular mechanisms of antibiotic resistence.
Nat Rev Microbiol 2015; 13; 42-51.
Mecanismos de resistência intrínseca .
13
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
TEM, SHV: penicilina, ampicilina
ESBL: 3ª geração de cefalosporina
carbapenemase: carbapenemicos
modificação enzimática: aminoglicosideos gentamicina = tobramicina
≠ amicacina
Inibição
enzimática
Modificação
enzimática
Blair JMA, et al. Molecular mechanisms of antibiotic resistence.
Nat Rev Microbiol 2015; 13; 42-51.
Mecanismos de resistência adquirida.
β-lactamase como o ácido clavulânico e o tazobactam, que funcionam contra as hoje conhecidas como velhas β-lactamases. Entretanto têm surgido algumas resistências que são as β-lactamases
de espectro estendido e as carbapenamases. Para esses dois tipos
de resistência existe um novo medicamento, o avibactam, também
inibidor de β-lactamase que age sobre esse tipo de enzima, que
está sendo incorporado ao tratamento.
Um outro tipo de resistência que precisamos avaliar está ligado
à barreira mucosa natural de nossa flora intestinal, também cha-
mada flora predominante. O uso de antibióticos nos últimos 3 a 6
meses, assim como a permanência em hospital faz que nosso paciente desenvolva uma flora menor, específica para cada ambiente
hospitalar e conhecida como flora exógena resistente. Quando o
sistema imunológico é suficientemente hígido pode não haver colonização dessa flora. Porém, toda vez que o paciente apresentar alguma morbidade como sangramento digestivo, cirurgia, qualquer
condição mórbida ou tiver feito uso de antibiótico ele pode fazer a
colonização com essa flora exógena, que já é resistente a uma série
de antibióticos, complicando muito seu tratamento.
Como se desenvolve a resistência bacteriana? Existem dois fatores fundamentais para o desenvolvimento da resistência bacteriana: a) densidade ou concentração de bactérias exigindo quantidade maior de antibiótico e b) concentração inibitória mínima
(MIC). Quando a MIC for baixa o antibiótico age com eficácia. Mas à
medida que essa concentração aumenta criam-se condições para
o surgimento de resistência. O fundamental, portanto, é selecionar
a droga mais ativa e combinar duas a três drogas com diferentes
mecanismos de resistência.
ReferÊncias recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
Strauss, E & Ribeiro MFGS, Ann. Hepatol. 2003.
Tito, L et al. – Hepatology. 1988.
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Fernandez et al. Hepatology. 2005.
Blair JMA et al. Nat Rev Microbiol 2015;13; 42-51.
SIMPÓSIO III
Albumina na cirrose: as evidências
José Eymard
Hospital Universitário Lauro Wanderley Universidade Federal da Paraíba
A administração de albumina apresenta custo elevado e esse
talvez seja o único ou mais importante fator para discutirmos sua
indicação, uma vez que do ponto de vista da toxicidade e efetividade praticamente, não há contraindicação ao seu uso. Também é
preciso lembrar da fisiopatologia da disfunção cardiocirculatória da
cirrose, iniciada pela vasodilatação esplâncnica, que se traduzirá por
redução do volume sanguíneo arterial efetivo que, junto com disfunção miocárdica presente nesse paciente cirrótico vai impactar
na perfusão sistêmica, com a necessidade de ativação dos sistemas
vasoconstritores que vão levar à retenção de sódio e de água tentando reestabelecer essa hemodinâmica. Que com a progressão da
disfunção hepatocelular, vai caminhar para ascite refratária, hiponatremia dilucional e se traduzir na vasoconstrição máxima que vai
levar a insuficiência renal funcional que é a síndrome hepatorrenal.
A partir desse cenário vamos buscar justificar porque deveríamos prescrever albumina para o nosso paciente em três condições
ao menos: a situação pós-paracentese; na prevenção da disfunção
renal que sucede a peritonite bacteriana espontânea (PBE) e no tra-
14
tamento de pacientes já com disfunção renal funcional na tentativa
de revertê-la com a utilização de albumina e de vasopressores.
O paciente cirrótico à medida que vai ficando vasodilatado
tenta compensar sua hemodinâmica aumentando sua volemia
pela liberação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA).
Após a retirada de grande volume pela paracentese, o paciente
desenvolve uma hipovolemia efetiva que repercute na perfusão
tecidual renal, que ativa o SRAA numa tentativa de melhorar a perfusão através do aumento da volemia, na tentativa de manter uma
taxa de filtração glomerular constante. Entretanto esta ativação
acarreta vasoconstrição renal associada ao aumento da atividade
da renina plasmática.1 Essa disfunção pós-paracentese que ocorre
nos pacientes sem reposição de albumina, repercute na sobrevida
do paciente. O paciente que tem disfunção pós-paracentese é um
paciente mais grave. Isso demonstra que esses pacientes com disfunção sistêmica são pacientes que já estão com hiperexpressão
de seus sistemas compensatórios, o que vai impactar na disfunção
hepatocelular mais grave e uma evolução menos satisfatória.2 A re-
Albumina: sim vs. não
Atividade de Renina
plasmática(ng/ml.h)
Insuficiência renal/
hiponatremia
%
12
20
8
p= NS
p<0.01
15
0
albumina sim albumina não
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
*
*
*
cefotaxima +
albumina
cefotaxima
1
3
6
*p<0.05
9
Dias
Sort et al, N Engl J Med 1999.
Peritonite bacteriana espontânea.
10 anos que se demonstrou que a expansão intravascular com albumina associada a vasoconstritores melhorava a perfusão glomerular,
o débito urinário e os níveis de ureia e creatinina desses pacientes,
afetando diretamente sua sobrevida. Obviamente não cura a doença,
sendo isso uma ponte para ganhar tempo e realizar um tratamento
definitivo para esse paciente que seria o transplante ortotópico de fígado. Além disso, pode ser evidenciado que a utilização de albumina
por dias consecutivos, associada a vasoconstritor aumenta em mais
de três vezes a probabilidade de resposta, quando comparada à utilização isolada dos vasoconstritores dos pacientes com hepatorrenal.6
A dose ótima de albumina seria a administração de 1,0 g de
albumina por quilo de peso do paciente. Deste modo dois protocolos principais padronizam do ponto de vista da prescrição médica a utilização da albumina nesse grupo de pacientes com o uso
de vasoconstritor e a utilização em dias sequenciais de doses de
albumina já estabelecidas em torno de 100 gramas no 1º dia e em
torno de 25g nos dias subsequentes por, em média, duas semanas para podermos ter melhor benefício observado nesse grupo
de pacientes.7,8 A albumina em infecções outras, não relacionadas
à PBE, também poderia ter efeito benéfico sobre a função renal de
pacientes cirróticos, porém mais estudos são necessários.9
Tudo o que foi discutido está relacionado ao efeito expansor plasmático da albumina. Mas a albumina molécula é muito mais complexa que isso. Apresenta um papel importante também como agente
anti-inflamatório como modulador da resposta imune. Isso é explicável pela sua capacidade de ligação e transporte de várias substâncias
potencialmente tóxicas, funções inclusive hemostáticas de estabilidade da função endotelial, funções imunomoduladoras modificando a
atividade do fator de necrose tumoral. Tudo isso justifica alguns pontos onde ela pode agir na cascata de eventos relacionados à progressão da doença hepática. Esse é o motivo pelo qual a albumina tem
sido utilizada como mecanismos de detoxificação da albumina no
tratamento de pacientes críticos em suporte artificial hepático.
Referências recomendadas
5
Antes Depois Antes Depois
126 pacientes com PBE tratados com cefotaxima 2 g/8 h apenas ou
asociado a albumina EV (1,5 g/Kg no D1, 1 g /Kg no D3)
p<0.01
10
4
Suporte circulatório com albumina
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
posição da albumina nesses pacientes pode prevenir esse colapso
circulatório. Se o paciente for submetido à paracentese superior a
5 litros e depois receber infusão adequada de 6 a 8 g de albumina
por litro de ascite, não existirá uma variação significativa na atividade renina plasmática. E não haverá variação importante na hemodinâmica desse paciente. Ao contrário, o paciente que não recebeu
albumina tem quase o dobro da sua atividade renina plasmática e
isso repercute também na evolução de complicações relacionadas
a essa hipovolemia efetiva que seria a disfunção renal e a hiponatremia que é um marcador grave de prognóstico, um marcador de
atividade de liberação da ADH por um mecanismo não osmótico.3
Essa ação preventiva da albumina é superior à de qualquer outro expansor plasmático. A utilização de outros expansores como o
dextran e outros coloides sintéticos foi testada, mas ela não é tão
eficaz como a albumina na prevenção da disfunção cardiocirculatória relacionada à paracentese. 2
Pacientes em risco de PBE são taquicardíacos, hipotensos, com
resistência vascular sistêmica reduzida e aumento da atividade do sistema simpático e do SRAA. Quando a infecção se instala acentuam-se
todas essas características. Aumentam os mecanismos vasoconstritores que não necessariamente serão funcionais, com maior secreção de noradrenalina e atividade renina plasmática.4 Com isso
temos uma evolução menos favorável, agravada pelo surgimento
da disfunção renal. A atividade endoplasmática é um marcador de
mortalidade porque ela demonstra que o paciente acentua a sua
disfunção cardiocirculatória, sendo um dos principais fatores precipitantes para a síndrome hepatorrenal.5
A albumina pode ser protetora nesse grupo de pacientes quando associada à antibioticoterapia que combate a infecção. Pacientes tratados com mesmo esquema antibiótico, mas submetidos ou
não a expansão plasmática com albumina, apresentam diferenças
na sua evolução. Com albumina há melhora dos marcadores de
disfunção cardiocirculatória e redução da mortalidade intra-hospitalar, o que comprova que a albumina também é adequada na
prevenção da disfunção renal relacionada à PBE e evitando com
isso a maior mortalidade nesse grupo de pacientes.5
O terceiro ponto que nos propusemos a trazer evidências que
comprovem o benefício da albumina é a sua utilização associada a
vasoconstritores esplâncnicos na prevenção e tratamento da síndrome hepatorrenal.
Há alguns anos a síndrome hepatorrenal era um processo irreversível culminando com a morte do paciente. Foi somente há cerca de
0
albumina sim albumina não
Ginès et al, Gastroenterology 1988.
Disfunção circulatória induzida por paracentese.
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
Salo et al. J Hepatol. 1997.
Gines et al. Gastroenterology. 1996.
Gines et al. Gastroenterology. 1988.
Ruiz del Arbol et al. Hepatology. 2003.
Sort et al. N Engl J Med. 1999.
Ortega et al. Hepatology. 2002.
Marthin-Lali et al. 2008.
Sanyal et al. 2008.
Guevara & Terra. J Hepatol. 2013.
15
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Custo efetividade no tratamento da
síndrome hepatorrenal
Ângelo Zabam de Mattos
Serviço de Gastroenterologia Clínica e Cirúrgica da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre
A síndrome hepatorrenal (SHR) apresenta incidência de quase
20% em um ano e quase 40% em cinco anos na evolução da cirrose. Apresenta menor sobrevida quando comparada à outras causas
de insuficiência renal com nefropatia intrínseca.
O diagnóstico pelos critérios publicados pelo Clube Internacional de Ascite: elevação da creatinina em 0,3 mg/dl ou mais acima
de valores basais ou em 50% sobre aqueles valores basais em que
não há uma melhora da creatinina depois de 48 horas de suspensão dos diuréticos e de expansão volêmica com albumina. Além
disso, devem ser descartados os choques, o uso de drogas nefrotóxicas e as nefropatias intrínsecas.1
O tratamento definitivo da síndrome hepatorrenal é o transplante hepático. A sobrevida para pacientes com SHR do tipo 1 ao
final de 6 meses, foi de 4% naqueles sem resposta ao tratamento
quase 50% de sobrevida nos que responderam e quase 100% nos
transplantados. Infelizmente o transplante hepático não está disponível para todos os cirróticos no momento em que se gostaria e
daí a importância do tratamento clínico da síndrome hepatorrenal.
Esse tratamento atualmente é calcado no uso de vasoconstritores
e albumina que comprovadamente reduzem a mortalidade da
síndrome hepatorrenal como foi apontado por meta-análise de 10
estudos publicada em 2010.
As drogas vasoconstritoras utilizadas no tratamento da SHR disponíveis no mercado nacional são terlipressina e noradrenalina. A
terlipressina é análogo sintético da vasopressina que age fundamentalmente sobre os receptores V1 esplâncnicos e menos sobre os V2 renais. É utilizada em dose de 0,5 a 1 mg a cada 4 a 6 horas podendo-se
chegar a 12 mg/dia, em associação com albumina por até 2 semanas.2
A capacidade desse tratamento em reverter a SHR foi atestada
em quatro diferentes meta-análises3-6 e de redução da mortalidade
em outras três.7-9 Já a noradrenalina é uma catecolamina com atividade alfa-adrenérgica que produz vasoconstrição arterial e venosa
e que poderia aumentar a resistência vascular sistêmica que está
diminuída na SHR. Ela é utilizada em doses de 0,5 a 3mg por hora
também em associação com albumina.10
Existem 4 ensaios clínicos randomizados que comparam as duas
drogas e nenhum deles evidencia diferença estatística em relação à
síndrome hepatorrenal ou à sobrevida dos pacientes tratados.11-14
Em relação aos custos temos que comparar os dois tratamentos,
com a terlipressina que é uma droga de alto custo e menos disponível, e com a noradrenalina que é mais barata e amplamente disponível, mas que requer administração em ambiente de UTI. E isso sempre nos pareceu bastante importante e indica que pode impactar na
decisão em relação a qual estratégia terapêutica optar.15
Na ausência de estudos na literatura a esse respeito, realizamos
uma avaliação econômica completa com o intuito de comparar essas estratégias terapêuticas, sob a perspectiva de um hospital geral
tratando pacientes pelo Sistema Único de Saúde e sob as perspectivas de um plano de saúde privado.
Primeiramente conduzimos uma revisão sistemática de estudos
clínicos randomizados de cirróticos com síndrome hepatorrenal, 1
ou 2 com comparação entre os dois vasoconstrictores, avaliando o
desfecho na sobrevida em 30 dias dos pacientes e reversão da SHR.
Do ponto de vista da avaliação econômica os custos avaliados
foram os médicos diretos através de hospitalizações hipotéticas em
pacientes com SHR onde avaliou-se que pacientes tratados com
tarlipressina internavam na enfermaria e os com noradrenalina internavam em UTI.
Na revisão sistemática identificamos 130 estudos dos quais 126
foram excluídos e outros quatro foram avaliados e posteriormente
incluídos na análise. Em relação ao desfecho sobrevida, em 30 dias
não há evidência de diferença entre as drogas, tampouco existe heterogeneidade entre os estudos até onde se pode identificar. Do
ponto de vista da regressão da síndrome hepatorrenal, novamente
Revisão sistemática e metanálise
Metanálise – reversão da SHR
terlipressina
estudo e subgrupo
noradrenalina
Eventos Total Eventos Total
M-H, Random, 95%CI
Alessandria, 2007
10
12
7
10
24.9%
1.19 [0.74, 1.92]
2007
10
20
10
20
14.8%
1.00 [0.54, 1.86]
2008
Singh, 2012
9
23
10
23
11.9%
0.90 [0.45, 1.80]
2012
Ghosh, 2013
17
23
17
23
48.3%
1.00 [0.71, 1.41]
2013
76
100.0%
1.03 [0.81, 1.31]
Total eventos
78
46
44
Heterogeneidade: Tau2 = 0.00; Chi2 = 0.56, df = 3 (P = 0.90); I2 = 0%
Teste do efeito global: Z = 0.25 (P = 0.80)
Avaliação Econômica - Resultados.
M-H, Random, 95%CI
Ano
Sharma, 2008
Total (95% CI)
16
Razão de risco
Razão de risco
Peso
0.01
0.1
terlipressina
1
10
100
noradrenalina
Perspectiva
Tratamento
terlipressina
Tratamento
noradrenalina
Diferença
de custos
SUS
Int$ 287,77
Int$ 2960,45
Int$ 2672,68
Hospital geral
Int$ 7437,04
Int$ 8406,41
Int$ 969,37
Plano de
saúde privado
Int$ 13484,57
Int$ 15061,01
Int$ 1576,43
Avaliação econômica: resultados.
não existe evidência de diferença entre as drogas ou de heterogeneidade entre os estudos.
Foram identificadas doses de 3,92 mg por dia de terlipressina e
de 0,74 mg por hora de noradrenalina. Uma duração do tratamento
com terlipressina de 8,18 dias e para noradrenalina de 8,46 dias.
Para cada paciente tratado com terlipressina para a SHR o gestor
do SUS economizaria US$ 2.600 o hospital economizaria mais de US$
900 e o plano de saúde privado economizaria mais de US$ 1.500.
A dose utilizada das drogas e a duração do tratamento podem
impactar nesses custos e na análise de sensibilidade e nós exploramos esse fato. Sob a perspectiva do SUS como o reembolso de
internações em enfermaria é fixo não haveria impacto na variação
das doses ou do tempo de tratamento no que diz respeito ao tratamento com terlipressina. Mas sim em relação à noradrenalina
que teria um custo que variaria de US$ 2.600 a US$ 3.200. Para as
outras duas perspectivas tanto a terlipressina quanto a noradrenalina teriam os custos variáveis. A terlipressina sob a perspectiva do
hospital tratando os pacientes pelo SUS variaria de US$ 3.600 a US$
11.300 e a noradrenalina de US$ 7.500 a US$ 9.200. E sob a perspectiva do plano privado a terlipressina variaria de US$ 7.900 a US$
19.000 e a noradrenalina de US$ 13.500 a US$ 16.500.
Assim concluímos que, embora não haja evidência de diferença significativa entre a eficácia da terlipressina ou da noradrenalina
para desfechos de sobrevida em 30 dias ou de reversão de síndrome hepatorrenal, os custos médicos diretos de tratar pacientes
com síndrome hepatorrenal com terlipressina são inferiores aos
custos desse tratamento com noradrenalina sob essas três perspectivas estudadas.
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Avaliação econômica
Caso-base
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
Angeli et al. J Hepatol. 2015.
Salerno et al. Gut. 2007.
Fabrizi et al. Aliment Pharmacol Ther. 2006.
Sagi et al. J Gastroenterol Hepatol. 2010.
Fabrizi et al. Int J Artif Organs. 2009.
Dobre et al. Int Urol Nephrol. 2011.
Gluud et al. Hepatology. 2010.
Gluud et al. Cochrane Database Syst Rev. 2012.
Hiremath et al. Indian J Pharmacol. 2013.
Duvoux et al. Hepatology. 2002.
Alessandria et al. J Hepatol. 2007.
Sharma et al. Am J Gastroentero. 2008.
Singh et al. J Hepatol. 2012.
Ghosh et al. Liver Int. 2013.
Nassar Junior et al. Plos One. 2014.
Ascite refratária: paracentese x TIPS
Aldo Torre
Departamento de Gastroenterología Instituto Nacional de Ciencias Médicas y Nutrición Salvador Zubirán
Cerca de 60% dos cirróticos compensados desenvolvem ascite
depois de 10 anos do início da doença. A sobrevida após o surgimento da ascite entre 1 e 5 anos é de 50% a 20%. Destes, cerca de 5
a 10 % desenvolverão ascite refratária e a sobrevida média cai para
6 meses, sendo, assim, há indicação primária de transplante.1
A definição de ascite refratária segundo o Clube Internacional de
Ascite se divide em duas: aquela que é resistente a diuréticos, ascites
que não podem ser mobilizadas ou que são recorrentes precocementes devido a uma resposta inadequada à restrição de sódio e ao tratamento com doses top de diuréticos com 400 mg/dia de espironolactona e furosemida 160 mg/dia e aquelas onde as complicações induzidas
por diuréticos não permitem alcançar doses efetivas da medicação.2
Dentre as complicações induzidas por diuréticos temos a encefalopatia, insuficiência renal, com aumento de creatinina >100%
do basal ou maior que 2 mg/dl; hiponatremia com queda de sódio
sérico>10 mEq/l ou abaixo de 125 mEq/l, ou hipo ou hipercalemia
definida pelo potássio abaixo de 3 mEq/l ou acima de 6 mEq/l.
A paracentese evacuadora foi a primeira terapêutica invasiva
utilizada na ascite refratária, porém abandonada em função do risco de desenvolvimento de insuficiência renal, mais que foi poste-
Definição (Club International Ascite)
• Resistência à diuréticos
Ascite que não pode ser mobilizada ou apresenta recidiva precoce devido
a resposta inadequada à terapia de restrição de sódio e tratamento diurético (espiro-nolactona 400 mg / dia e furosemida 160 mg / dia).
• Intratável aos diuréticos
Ascite não pode ser mobilizada ou recidiva precoce que não pode ser
evitada devido ao desenvolvimento de complicações induzidas por diuréticos que não permitem alcançar doses eficazes de diurético.
Arroyo V et al. Hepatology 1996
Departamento de Gastroenterología
Instituto Nacional de Ciencias Médicas y Nutrición Salvador Zubirán
Ascitis refractaria.
riormente reabilitada com a associação de infusões de albumina. É
procedimento fácil, disponível praticamente em todos os serviços
de urgências, não tem tanta incidência de encefalopatia, poucos
efeitos colaterais. Como desvantagem há alta recorrência de ascite,
requer o uso de albumina e o ingresso frequente a hospitais.
Já foi demonstrada a necessidade da reposição de albumina
17
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
TIPS para
Estudo e subgrupo
Log (HR)
SE
Total
Total
Peso
HR, 95%CI
Rössie, 2000
-0.52
0.32
29
31
20.7%
0.59 [0.32, 1.11]
Ginès, 2002
-0.21
0.32
35
35
20.7%
0.81 [0.43, 1.52]
Sanyal, 2003
-0.9
0.31
52
57
22.0%
0.91 [0.50, 1.68]
Salerno, 2004
-0.80
0.35
33
33
17.3%
0.45 [0.23, 0.89]
-0.92
0.33
Narahara, 2011
Total
Estável
30
30
19.4%
0.40 [0.21, 0.76]
179
186
100.0%
0.61 [0.46, 0.82]
150
155
100.0%
0.62 [0.45, 0.85]
13
12
5.9%
3.29 [1.05, 10.24]
192
198
100.0%
0.68 [0.51, 0.89]
M-H, Random, 95%CI
Heterogeneidade: x2 = 4.91; df = 4 (P = 0.30); I2 = 19%
Teste do efeito global: Z = 0.25 (P = 0.80)
Without Rössie, 2000
Estável
Sensitivity analysis
including the study by
Lebroc, et al.
1.19
Lebroc, 1996
0.58
0.01
Estável
Random
Heterogeneidade: x2 = 12.79; df = 5 (P = 0.03); I2 = 61%
Teste do efeito global: Z = 2.75 (P = 0.06)
0.1
TIPS
1
10
Para
100
0.72 [0.46, 1.13]
Bai M et al WJG 2014.
Departamento de Gastroenterología, Instituto Nacional de Ciencias Médicas y Nutrición Salvador Zubirán.
TIPS melhor SV livre de THO.
para prevenir a disfunção circulatória pós-paracentese, no entanto,
um estudo recente sugere que se possa reduzir a dose de albumina
pela metade (de 8 para 4 gramas de albumina por litro evacuado). 3
Outra alternativa, foi o emprego de shunts peritoneo-venoso
que acabou abandonada pela alta incidência de complicações e
pelos melhores resultados com o shunt hepático transjugular (TIPS).
O TIPS diminui a atividade dos sistemas antinatriuréticos, melhora
a resposta ao diurético e a função renal nos pacientes com síndrome
hepatorrenal. Como desvantagem do desenvolvimento de encefalopatia e o custo elevado. As contraindicações absolutas para a colocação de TIPS são: insuficiência cardíaca, cistos hepáticos múltiplos,
sepses descontrolada, obstrução biliar não resolvida e hipertensão
pulmonar severa. As contraindicações relativas são: presença de hepatocarcinoma principalmente central que impeça a manipulação, a
trombose venosa portal, a coagulopatia severa- plaquetas abaixo de
20.000, hipertensão pulmonar moderada Child-Pugh >11, bilirrubina> 3 mg/dl e creatinina> 1,9 mg/dl. Deve-se lembrar que a obstrução da prótese deixou de ser problema com os TIPS ditos revestidos.
Várias meta-análises compararam a paracentese com o TIPS. Em
2005 duas meta-análise concluíram que o TIPS apresentava melhor
controle da ascite, mas aumentava o risco de encefalopatia, sem haver
melhor sobrevida quando comparada à paracentese com albumina.4,5
Outra meta-análise demonstrou que o TIPs melhora a a sobrevida livre de transplante hepático em pacientes que estão na lista de
espera para esse procedimento.6
Sem dúvida as possibilidades de resolução ou controle da ascite e a sobrevida após 2 anos parecem mais favoráveis ao TIPs, assim
como o desenvolvimento de encefalopatia severa.7
Outro ponto que merece discussão é o custo, no México a colocação de um TIPS em dólares está em torno de 26 mil e no hospital
privado esse o valor dobra. O custo da paracentese é de 315 dólares
e deve ser levado em conta em países em desenvolvimento.
Quais as opções no controle da
ascite refratária?
Existem estudos pilotos com a utilização de midodrine ou da
associação midodrine + clonidina e terapia standard versus terapia
standard (com melhor controle da ascite no grupo da midodrine e
18
da midodrina mais clonidina em relação ao tratamento standard) e
com Octreotide 600 microgramas/dia por duas semanas, três vezes
por semana até completar 5 meses mostrou a diminuição da necessidade de diurético e serviu de ponte ao transplante.8
Algumas outras derivações pouco habituais já foram testadas,
como a safeno-peritoneal evidenciando melhora no gasto urinário,
no estado nutricional e no estadio Child.9 e a derivação peritoneal
-bexiga com mobilização de 90% da ascite e diminuição significativa do números de paracenteses.10
Falta reavaliar a real efetividade dos aquaréticos que no início,
talvez por querer ser muito abrangente, tinham muitos efeitos colaterais, mas com indicações precisas provavelmente ressurjam com
indicações muito precisas no manejo da ascite.
Não se pode esquecer que o transplante hepático é a indicação
principal para a ascite refratária com sobrevivência em 5 anos de
70 a 80% na comparação com pacientes sem transplantes que só
sobrevivem em 20% dos casos. Os fatores prognósticos do transplante são os que estão relacionados à hemodinâmica renal com
diminuição da excreção renal de água, hiponatremia dilucional,
uma pressão arterial média abaixo de 80 mmHg, filtração glomerular diminuída e um sódio urinário abaixo de 10 mEq/dia.
Em conclusão, a ascite refratária é uma complicação frequente da
cirrose. A paracentese com albumina é a primeira opção terapêutica,
especialmente em países em desenvolvimento em razão dos custos.
O TIPS recoberto demonstrou impactar favoravelmente a sobrevida
dos pacientes em lista de espera para transplante, além de diminuir
recorrência e o risco de SHR. A adequada seleção de candidatos para
esse procedimento deve incluir BT < 3, Cr < 1.9, Child-Pugh < 11.
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
Salerno Am J. Gastroenterol. 1993.
Arroyo V et al. Hepatology. 1996.
Alessandria. Dis Liv Dis. 2011.
Deltenre. Liver International. 2005.
Albillos. J Hepatol. 2005.
Bai. WJG. 2014.
Siramolpivat S et al. WJG 2014.
Torre A. Endoscopia. 2013.
Kalambokis, Scan, J Gastrol. 2006.
Bellot P. J Hepatol. 2013.
SIMPÓSIO IV
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Insuficiência adrenal na cirrose: quando
investigar e quando tratar
Gustavo Pereira
Serviço de Gastroenterologia e Hepatologia Hospital Federal de Bonsucesso Rio de Janeiro
A Insuficiência adrenal (IAdr) decorre de redução na produção
de hormônios ou de ação tissular ineficaz nos hormônios mineralocorticoides, produzidos pelo córtex da suprarrenal, sendo o mais
importante, o cortisol. Além de ações conhecidas sobre o metabolismo, atua sobre o sistema cardiovascular (sobre a contratilidade
miocárdica, assim como o tônus vascular) e imunológico (com aumento na atividade das citocinas anti-inflamatórias e redução nas
pró-inflamatórias). 1
Os níveis séricos de cortisol são regulados pelo eixo hipotálamo–hipófise–suprarrenal. Cerca de 90% do cortisol, irá permanecer
ligado a uma proteína que é produzida no fígado. Diversas condições na cirrose, em especial na cirrose descompensada, podem
levar a alterações no eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal e, consequentemente, na produção e ação dos glicocorticoides. É frequente o fenômeno da translocação bacteriana com aumento nas
citocinas e presença de lipopolissacarídeos bacterianas na circulação sistêmica que podem exercer efeitos deletérios no eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal. Nessa condição também é frequente
a presença de vasoconstrição em leitos extra-esplâncnicos com
redução na produção do cortisol. Mais ainda, há redução na síntese
do colesterol em pacientes com cirrose que é o principal precursor
da síntese dos mineralocorticoides.
Na prática clínica o teste mais utilizado para avaliar a função
adrenal é o teste da cortrosina, quer em doses habituais (250ug) ou
em doses baixas (1ug). Após coleta basal administra-se de forma
endovenosa análogo de ACTH. Após 60 minutos é realizada uma
nova determinação de cortisol, o chamado pico de cortisol. A diferença entre o pico e o cortisol basal é chamado delta de cortisol.
O diagnóstico de IAdr baseia-se em um delta de cortisol inferior
Avaliação da função suprarrenal
ACTH IV
SST – 250μg
LDSST – 1 μg
Pico de
cortisol
Δ cortisol
cortisol
basal
0
60
Diagnóstico de insuficiência adrenal com ACTH.
minutos
a 9 microgramas/dL. Ele pode ser combinado ainda a valores de
cortisol basal menores que 9ug ou 15 ug, conforme seja paciente
cirróticos criticamente enfermos ou cirrótico descompensado.
A cirrose é uma condição de risco para a IAdr. Dados de mais de
400 pacientes avaliando prevalência de diversas doenças crônicas
em populações de indivíduos com e sem IAdr mostram que as doenças hepáticas estão presentes em 20% dos pacientes com IAdr,
um número mais de duas vezes superior àquele encontrado em
pacientes com função suprarrenal normal. Também a prevalência
de IAdr é maior em indivíduos transplantados de fígado, mas não
transplantados de rim.2
A IAdr em pacientes com cirrose descompensada ocorre em
torno de 25% a 40% dos casos e esse valor é claramente superior
aquele encontrado em populações gerais. A correlação entre a função hepática e a prevalência de insuficiência suprarrenal, é no mínimo questionável, não sendo possível e estabelecer uma relação segura entre essa condição e os escores Child-Pugh ou Meld. Estudo
com número reduzido de pacientes ambulatoriais com cirrose descompensada observou ao final de 12 meses de seguimento clara
redução na probabilidade de sobrevida em pacientes com função
adrenal alterada e, o delta de cortisol, foi preditor independente de
mortalidade nesta população de cirróticos.3
Outro estudo, com mais de 1000 cirróticos, observou que a
probabilidade de desenvolvimento de sepse grave ou choque séptico foi cerca de três vezes maior no grupo de pacientes com IAdr
quando comparado com aqueles com função adrenal normal. A
sobrevida ao final de 90 dias dos cirróticos com IAdr foi cerca de
15 a 20 pontos percentuais menor do que com os cirróticos com
função suprarrenal normal.4
Na hemorragia digestiva varicosa a probabilidade de ressangramento foi maior no grupo com IAdr (62% x 25%) que também teve
menor probabilidade de permanecer livres de ressangramento ao
final de 45 dias.5
Outra situação estudada foi do choque séptico em cirróticos
onde a prevalência de IAdr ficou em torno de 66 a 68%, número
duas vezes maior do que a prevalência encontrada em cirróticos
descompensados sem choque séptico, indicando que provavelmente existe um efeito potencializador entre a cirrose e o choque séptico no desenvolvimento IAdr. Nesses pacientes há clara
relação entre a função hepática e IAdr, que também apresentam
pior resposta hemodinâmica com maior necessidade de aminas
vasoativas e menores valores de pressão arterial média quando
comparados aos pacientes com função suprarrenal normal. Finalmente, a IAdr esteve claramente correlacionada com prognóstico.
Ao final de 90 dias a probabilidade de sobrevida nos pacientes
com IAdr foi da ordem de 20%, contra 65% a 70% daqueles com
função adrenal adequada.6
19
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Correlação com prognóstico
P < 0.001
Sobrevida
17.51 (95% CI, 3.373-82.22; P < 0.001).
Com RAI
Sem RAI
Controlado
Follow-up (meses)
Pacientes (N)
Com RAI
Sem RAI
41
13
40
13
23
5
15
4
RAI: Relative Adrenal Insufficiency
9
3
9
1
9
0
Jang, APT 2014
Epidemiologia Cirróticos descompensados.
O tratamento da IAdr tem sido feito através da reposição dos
mineralocorticoides. Estudos administraram hidrocortisona em
portadores de cirrose com choque séptico. Houve claro efeito benéfico na melhora na função circulatória, com maior probabilidade
de reversão do choque assim como uma reversão em tempo mais
precoce. A reposição foi segura e não houve uma incidência particularmente aumentada de novas infecções bem como de hemorragia digestiva no grupo no qual a proposta foi realizada a reposi-
ção de hidrocortisona. A probabilidade de sobrevida do grupo foi
maior que nem grupo controle histórico.7
Entretanto estudo controlado em portadores de cirrose descompensada em sepsis não mostrou diferenças em sobrevida de
28 dias entre pacientes com ou sem IAdr, a despeito de haver diferenças consideráveis entre os grupos. O grupo que recebeu hidrocortisona estava utilizando uma dose quase duas vezes superior de
noradrenalina no momento da inclusão e apresentavam relação
PO2 / FO2 (que avalia a função respiratória) inferior que a dos que
não receberam hidrocortisona. A questão do efeito benéfico da reposição dos glicocorticoides em pacientes cirróticos com choque
séptico ainda permanece em aberto.8 É possível que parte desse
mistério seja solucionada com o estudo Scocth que esta em marcha atualmente no contexto do Consórcio Europeu Cliff de Insuficiência Hepática Crônica.
A reposição de esteroides não demonstrou ainda de forma clara efeitos benéficos em populações de cirróticos, novos estudos
são aguardados para uma conclusão mais definitiva.
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Mesotten. Nat Clin Pract End Met. 2008.
Bem-Shlomo. Am J Med. 2014.
Jang. APT. 2014.
Acevedo. Hepatology. 2014.
Graupera. Liv Int. 2015.
Tsai. Hepatology. 2006.
Fernandez, Hepatology. 2006.
Arabi. CMAJ. 2010.
Gastropatia da hipertensão
portal: conduta
Paulo Lisboa Bittencourt
Unidade de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital Português, Bahia
Hospital Universitário Prof. Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia
A gastropatia é uma complicação da hipertensão portal, habitualmente diagnosticada durante o rastreamento de varizes de
esôfago do cirrótico.
O substrato anatomo-patológico para a gastropatia na biopsia
hepática é a presença de dilatação, irregularidade, tortuosidade dos
capilares e vênulas na mucosa e submucosa.1
Na endoscopia o padrão mosaico é o mais característico, com
sensibilidade de 93% e especificidade de 99% para o diagnóstico
de gastropatia.2 Geralmente a gastropatia é classificada de acordo
com características do padrão mosaico, como leve, quando a aréola
é uniformemente rósea e moderada, e acentuada de acordo com
a presença na aréola de uma coloração avermelhada só no centro,
ou se uniformemente avermelhada. Uma classificação muito empregada pelos endoscopistas que é a de McComarck, que caracteriza a gastropatia leve quando existe apenas um pontilhado fino de
20
coloração rósea intensa ou escarlatiniforme, enantema ou padrão
reticular fino, e grave quando ele observa a presença de manchas
vermelhas semelhantes às descritas para as varizes gástricas ou a
presença de sangramento espontâneo ou evidências recentes de
sangramento digestivo, a gastrite hemorrágica difusa.
Podem ser observadas manchas vermelhas e mesmo sangramento espontâneo ou ao toque. Estima-se que cerca de 20 a 80%
dos pacientes possam apresentar essa alteração que pode acometer tanto pacientes com hipertensão cirrótica quanto não cirrótica.
É mais frequente nos pacientes Child C quando comparados com
o Child A (87 % vs. 13%). Está associada à gravidade da hipertensão
portal com a presença e calibre das varizes de esôfago e com a
antecedência de tratamento endoscópico prévio.3
A hemorragia digestiva manifesta tem sido relatada em 1%
a 5% dos casos. No entanto, a anemia por sangramento oculto é
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
muito mais prevalente ocorrendo em cerca de 3% a 12% dos casos,
devido à presença de sangramento crônico. Quando leva a sangramento digestivo geralmente está associada à enteropatia por
hipertensão portal em cerca da metade dos casos e à colopatia por
hipertensão portal em cerca de um terço dos casos.
Sabe-se que a gastropatia se correlaciona com o gradiente
de pressão na veia hepático, acima de 12mmHg, o mesmo gradiente associado a sangramento varicoso e com gravidade da
doença hepática. Sua ocorrência se relaciona com a presença de
circulação hiperdinamica e ao aumento do fluxo sanguíneo para
a mucosa gástrica, daí alguns autores também a chamarem de
gastropatia congestiva. Alguns trabalhos experimentais sugerem
que isquemia da mucosa e aumento da atividade da síntese de
óxido nítrico possam ser outros mecanismos para a gastropatia
de hipertensão portal.4-6
Na história natural da doença, um estudo de três anos de seguimento mostrou que o aspecto endoscópico ficou estável em 1/3
dos pacientes, enquanto no restante dos casos houve distribuição
semelhante entre melhora, piora ou períodos intercalados de melhora e piora do aspecto endoscópico. Nessa série de três anos, o
sangramento agudo foi observado em apenas 2,5% dos pacientes
e anemia por sangramento oculto em 11% dos casos.7
A gastropatia tende a aparecer no curso da erradicação das varizes. Não se sabe se esse é um efeito do tratamento endoscópico
ou paralelo à progressão da doença hepática. Uma entidade que
deve ser diferenciada obrigatoriamente da gastropatia da hipertensão portal é a ectasia vascular antral. Habitualmente não está
associada à hipertensão portal, e diferente da gastropatia da hipertensão portal, é uma lesão passível de tratamento endoscópico por
termocoagulaçao particularmente com plasma de argônio.8
Os dados referentes à conduta da gastropatia por hipertensão
portal geralmente se baseiam em estudos pouco robustos, séries de
casos, poucos estudos controlados. Como o risco de sangramento é
muito pequeno, a profilaxia primária não é recomendada tanto com
betabloqueadores quanto com qualquer outra droga, para evitar o
primeiro sangramento da gastropatia da hipertensão portal.
Em relação ao tratamento do sangramento agudo e crônico,
existem medidas gerais, particularmente a suplementação com
sulfato ferroso, e o tratamento farmacológico, endoscópico ou
TIPS. Na profilaxia secundária os betabloqueadores não seletivos
e o TIPS. Em uma série de pacientes com cirrose e sangramento
agudo ou crônico por gastropatia, houve redução de 27% na frequência de sangramento recorrente ou persistente em 12 meses
com o uso de betabloqueadores, e uma redução de 45% nesse
• Profilaxia primária
Risco sangramento pequeno.
Não recomendada (BAVENO V/ VI).
• Tratamento sangramento agudo e crônico
Medidas gerais.
Tratamento específico (Farmacológico / Endoscópico / TIPS).
• Profilaxia secundária
Medidas gerais
Betabloqueadores não-seletivos (BBNS) / TIPS.
Conduta da gastropatia hipertensiva.
tipo de sangramento em 30 meses mostrando que os betabloqueadores são muito efetivos tanto na profilaxia secundária do
sangramento agudo quanto na prevenção de sangramento persistente por anemia crônica. 9
Após o controle adequado do sangramento, é importante
manter betabloqueadores não seletivos e suplementação com ferro, e naqueles pacientes que não se consegue um controle efetivo,
com necessidade de transfusões frequentes, deve-se considerar
outras alternativas, particularmente o TIPS, mas também existem
possibilidades cirúrgicas (shunts cirúrgicos) e endoscópicas (métodos térmicos, com plasma de argônio, e o hemospray).10-12
A conduta no sangramento agudo é semelhante a do sangramento varicoso, mas com pouca evidência científica. Além da
ressuscitação volêmica e hemotransfusão criteriosas, emprega-se
tratamento farmacológico (somastotatina, octreotide ou terlipressina), com resposta hemostática em praticamente 100% dos casos.13
O tratamento endoscópico pode ser aventado no encontro de lesões focais com sangramento ativo. A antibioticoprofilaxia tem sido
geralmente indicada na hemorragia aguda.
No consenso de Baveno ficou estabelecido que não existe recomendação para profilaxia primária do sangramento por gastropatia da hipertensão portal. O tratamento de primeira linha para o
sangramento crônico é o uso de betabloqueadores não seletivos
e suplementação de ferro. O tratamento do sangramento agudo
deve ser realizado com drogas vasoativas e após o controle do episódio deve-se realizar o uso de betabloqueadores não seletivos. O
tratamento endoscópico não tem papel preponderante na gastropatia da hipertensão portal. O TIPS e a cirurgia de derivação portal
devem ser considerados terapias de resgate para a gastropatia de
hipertensão portal ou para aqueles pacientes com sangramento
crônico que não conseguem ser abordados por betabloqueadores
e necessitam de transfusões repetidas.14
Referências recomendadas
O aspecto mais característico é o padrão mosaico com pequenas áreas
poligonais de mucosa, delimitadas por bordas levemente deprimidas,
de coloração branco-amarelada com aréola central uniformemente rósea, avermelhada ou hemorrágica que conferem ao órgão, particularmente no fundo e no corpo do estômago.
Gastropatia da hipertensão portal.
1.
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3.
4.
5.
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8.
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21
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Complicações pulmonares na
cirrose hepática
Síndrome hepatopulmonar, hipertensão porto-pulmonar
e insuficiência respiratória restritiva
Mario Kondo
Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo
A Síndrome hepatopulmonar é definida pelo encontro de dilatação capilar intrapulmonar, na presença de um aumento do gradiente alvéolo-arterial do oxigênio em paciente que seja portador
de cirrose ou de hipertensão portal, desde que excluídas outras
causas de insuficiência respiratória.1
A dilatação capilar intrapulmonar pode ser diagnosticada pelo
emprego de um exame de albumina marcada e o ecocardiograma
com contraste (bolhas).2 O ecocardiograma com contraste é o exame mais empregado, e a avaliação transtorácica é considerada o
padrão-ouro para o diagnóstico.
O gradiente alvéolo-arterial de oxigênio é definido pela fórmula
(FiO2*(PB-47)-(PaCO2/R)-PaO2), o que indica que a frequência respiratória e a hiperventilação podem influenciar esse resultado e que
grande número de pacientes apresentam hipocapnia no momento
da coleta do sangue, o que é corrigido pela medida da PaCO2.3
No diagnóstico diferencial lembrar sempre da possibilidade
dos shunts direita-esquerda especialmente os shunts intracardíacos
(como o foramem oval patente) e o shunt intrapulmonar, que acomete poucos pacientes, mas pode ser a causa de hipoxemia em
cirróticos. Essa diferenciação é importante porque nesses casos de
shunts a embolização ou sua correção cirúrgica resolve o problema.
Em termos de prevalência a síndrome hepatopulmonar pode
chegar até 40 % quando se fala na definição purista: dilatação vascular intrapulmonar com gradiente aumentado, mas ainda sem ter
hipóxia. Quanto a esses achados incluímos a hipóxia como fator
diagnóstico, a prevalência descrita é de 10 a 15%.4
O quadro clínico da síndrome hepatopulmonar pode se compor de dispneia, platipneia e nos casos mais avançados cianose de
extremidades e eventualmente baqueteamento digital. Não é sempre que se encontra o quadro clínico porque ele é muito dependente do grau de hipóxia. Para procurar a síndrome hepatopulmonar temos que fazer uma busca ativa com a pesquisa da saturação
periférica de oxigênio.
Outra forma de distúrbio de oxigenação que sempre acontece
nesses pacientes é a ortodeóxia quando paciente fica em pé e a pressão parcial de oxigênio diminui, diferente da maioria das pessoas.
Em termos de fisiopatologia, a Síndrome reflete um desbalanço entre vasodilatadores e vasoconstritores com predomínio dos
vasodilatadores a nível pulmonar. E daí a fisiopatologia da doença
que se correlaciona com a gravidade da doença. O tratamento adequado é o transplante de fígado porque é o único que vai conseguir resolver os fatores hemodinâmicos que estão na gênese ou no
princípio da doença.5,6
22
Lembrar que os transplantes quando feitos em pacientes que
tem ar ambiente PaO2< 50mmHg o resultado não é tão razoável
e um outro grupo de pacientes são aqueles onde a PaO2 é menor
do que o normal e que não respondem à prova da hiperóxia, que
apresenta oxigenação menor do que 350 quando respirando oxigênio a 100%. Esse é um grupo que particularmente tem resposta
inferior ao transplante.
A hipertensão portopulmonar é definida como o encontro
de uma pressão média da artéria pulmonar maior do que 25
mmHg, na vigência de hipertensão portal, desde que se excluam
todas as outras causas de hipertensão pulmonar primária diopática ou secundária.7
A fisiopatologia está ligada à arteriopatia pulmonar com desbalanço entre vasodilatadores e vasoconstritores, levando a uma hiperplasia endotelial ou arterites necrotizantes e tromboses que são
achados especialmente de necropsias, sem explicação fisiopatológica. Está intimamente ligada à circulação hiperdinâmica e, também,
ao predomínio dos vasoconstritores sobre os vasodilatadores.8
Sangue
venoso misto
Ventilação
uniforme
Alvéolo
Alvéolo
Sangue arterial
oxigenado
Perfusão uniforme
Sangue
venoso
misto
Shunt da
direita para
a esquerda
Ventilação
uniforme
Limitação
de difusão
Alvéolo
Sangue
Perfusão não arterial
hipóxica
uniforme
Ventilação-perfusão
Síndrome Hepatopulmonar.
Síndrome hepatopulmonar ecocardiograma com contraste.
O quadro clínico quando presente pode se caracterizar por
dispneia de esforços, dor torácica, pré-síncope ou em casos já
bem adiantados de insuficiência cardíaca direita. O ecocardiograma é o exame de screening que estima a pressão sistólica ou a
pressão média da artéria pulmonar desses pacientes, deve-se levar em conta a possibilidade de falsos positivos. O método ouro
será o cateterismo direito. Naqueles pacientes onde a estimativa
ecocardiografica da pressão for > 50mmHg, está recomendado
formalmente o cateterismo direito para a medida real da pressão
e o diagnóstico vai ser feito quando a resistência intrapulmonar
exceder 240 na ausência de hipervolemia.
O tratamento pode ser farmacológico ou o transplante de fígado. O prognóstico desses pacientes é insatisfatório. A sobrevida
estimada em 5 anos é de 25% dos casos, se não forem transplantados e pode superar um pouco esse valor se forem transplantados.
A mortalidade pós-operatória e precoce do transplante de fígado
está intimamente ligada ao valor da pressão média da artéria pulmonar, se > 50mm a mortalidade estaria entre 60 e 100 %. Quando
entre 50-35 melhora o prognóstico e o adequado é que tenham
pressão inferior a 35.
HIGHLIGHTS DO MONOTEMÁTICO DE CIRROSE
Presença de bolhas em ambas
câmaras cardíacas (D e E)
após a injeção de solução
salina/ar (20 μm)
O tratamento farmacológico inclui drogas inalatórias de difícil
uso que apresentam meia-vida curta e as inalações devem ser tão
frequentes como a cada hora ou a cada duas horas no máximo.
Uma alternativa, seria sildenafil oral associado ou não a bosentan e
ambrisentan, todos em doses escalonadas.
No paciente com uma pressão arterial pulmonar > 50mmHg
com insuficiência cardíaca direita, raramente haverá resultados
com drogas e, possivelmente, a única solução seria um transplante triplo de fígado, coração e pulmão simultâneos o que foi muito
pouco feito no mundo de maneira geral. Se a pressão tiver acima
de 50, sem insuficiência cardíaca direita, pode-se tentar tratamento farmacológico e, no caso de não resposta, eventualmente um
transplante duplo fígado e pulmão.
Naqueles pacientes com pressão < 35mmHg, mas >
25mmHg, se normalizar, podemos insistir no uso de drogas por
um prazo mais longo. Mas se não normalizar a pressão não dará
certo ao longo do tempo, sendo uma hora ideal para transplantar o fígado desses pacientes e ter uma grande possibilidade de
solução dos casos.
Lembrar do hidrotórax hepático levando a insuficiência respiratória restritiva, que acontece mais frequentemente só a direita,
mas pode acontecer em uma fração dos casos à esquerda ou ser
bilateral. O tratamento do hidrotórax hepático deve ser feito como
o tratamento da ascite, mas sempre tenha em mente a possibilidade de outros diagnósticos, porque infecção pulmonar, empiema
ou tuberculose, por exemplo, se não diagnosticados corretamente
além de agravarem o estado funcional hepático, podem piorar o
quadro pulmonar se tratados tardiamente.
Referências recomendadas
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Kennedy e Knudson. Chest 1977.
ABRAMS et al. Gastro. 1995.
Barbosa. 2003.
Krowka e Cortese. Chest. 1994.
Zang. Gastro. 2009.
Degano. Eur Resp J. 2009.
Rodrigues-Roisin. Eur Resp J. 2004.
Rockey. Hepatol. 2003.
23
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