A Propriedade Horizontal
Assunção Cristas
Direitos Reais 2006/07
1. Noção e relevância
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Forma mais importante (mas não única) de organizar
propriedade colectiva privada sobre edifícios
Edifício pertencente a uma pluralidade de pessoas: titulares
individualmente de partes específicas (fracções autónomas),
titulares em conjunto das partes restantes (partes comuns)
 História antiga, mas desenvolvimento no séc. XX; entre nós chamase propriedade horizontal, que rigorosamente mais significa
“propriedade parcelar ou fraccionária”, pois são naturalmente
admissíveis “cortes verticais” – cfr. art.1414.º; mas nem todos os
edifícios podem ser constituídos em propriedade horizontal…
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Fontes: CC; DL 268/2004 e 269/2004, de 25 Out.
Natureza do direito de condomínio
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Propriedade individual sobre as fracções +
compropriedade sobre as partes comuns (HM, PL/AV,
MP), embora não se resuma a esta soma: é direito real
novo, que combina formas do direito de propriedade
Tipo de direito real distinto do direito de propriedade, é
um direito real de gozo autónomo (CF)
É diferente da compropriedade: o condómino tem um
direito de propriedade exclusivo sobre a fracção
(1420.º/1); propriedade horizontal é indivisível (1423.º);
poderes distintos quanto às partes comuns;
condóminos não têm direito de preferência (1423.º,
1409.º); o condomínio tem um mínimo de organicidade,
é rudimentarmente um centro diverso de imputação de
efeitos jurídicos
2. Questões centrais
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Divisória entre o que é individual e o que é
colectivo
Modo de exercício dos direitos dos condóminos
mesmo sobre as suas fracções autónomas
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Organização do conjunto dos condóminos
para tratamento das assuntos que devam
tratar em conjunto
Fracções autónomas e partes comuns
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Para ser possível a constituição da propriedade
horizontal é necessário que as partes destinadas a
fracções autónomas possam ser: unidades
independentes, distintas e isoladas entre si, com
saída própria para uma parte comum do prédio ou
uma via pública
Partes obrigatoriamente comuns: art.1421.º/1, por
ex. solo onde o edifício está implantado; elementos
estruturais do edifício – alicerces, colunas, pilares…,
cobertura (telhado, terraço); zonas de passagem
(entrada, escadas, corredores…); instalações gerais
de água, electricidade, gás, a/c, etc.
cont.
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Partes presumivelmente comuns (título constitutivo
pode fixar como comuns ou integrar nas fracções
autónomas): art.1421.º/2, por ex. pátios e jardins
anexos ao edifício, elevadores, casa do porteiro,
garagens, tudo o que em geral não está afecto ao
uso exclusivo de um dos condóminos.
Não se trata de regra supletiva, mas sim de
presunção ilidível nos termos gerais (particularmente
relevante no caso da al.e)…)
Direito de propriedade é diferente de direito de uso:
título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um
condómino certas zonas das partes comuns (1421.º/3)
cont.
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Mas subsistem dúvidas: por ex. fachadas;
varandas afectas ao uso exclusivo de uma
fracção; o que entender por instalações de
água…e outros serviços “gerais”?
Como se constitui a propriedade
horizontal?
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Por negócio jurídico (ex. testamento; n.j unilateral
inter vivos, por escritura pública), usucapião,
decisão administrativa (novo!), decisão judicial
(proferida em processo de inventário ou de divisão
de coisa comum) – 1417.º/1 - através de um título
constitutivo
documento onde estão especificadas
as partes correspondentes às
fracções autónomas e é atribuído
valor a cada fracção; pode conter
regulamento do condomínio, atribuir
fins, estabelecer compromisso arbitral
(cfr.1418.º)
Nota: necessidade de
instrução do processo
notarial com documento da
CM comprovativo de que
as fracções autónomas
satisfazem os requisitos
legais
Título constitutivo e regulamento de
condomínio
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2 instrumentos centrais, porque fixam o fim a que se
destinam as fracções dos prédios - cfr.1418.º/3 e
1422.º/4 – e definem relações entre condóminos
(“estatuto regulador do condomínio”)
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obrigatoriedade de elaboração de regulamento,
caso não conste do título constitutivo, se os
condóminos forem mais que 4 – cfr. 1429.º-A: neste
caso o regulamento não abrange o uso, fruição e
conservação do edifício no seu todo, mas só as
partes comuns
Alteração ao título constitutivo
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Regra: necessidade de acordo de todos os condóminos
(1419.º/1 in fine)
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Excepções:
- junção de duas ou mais fracções contíguas – 1422.º-A, n.ºs 1,
4e5
- divisão de uma fracção (permitida no título constitutivo ou por
deliberação dos condóminos aprovada sem oposição)
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Forma: escritura pública
Regulamento do condomínio:
problemas
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Lei não prevê forma de publicidade, contudo, é oponível a
todos os condóminos, nomeadamente a quem adquira as
fracções em qualquer conhecimento desse regulamento (RPD
entende que há aqui uma potencial violação do princípio da
confiança)
Dúvidas:
- se o regulamento constar do título constitutivo da propriedade
horizontal, como pode ser alterado? Cfr. 1419.º/1 vs. 1432.º/3
- é possível o regulamento derrogar, para mais ou menos, as
regras legais sobre maiorias - cfr. 1422.º/3 e 1425.º/1?
Autonomia privada vs. tipicidade dos direitos reais
- regulamento pode dispor sobre outras matérias para além das
previstas na lei (ex. funcionamento assembleia de condóminos,
exercício do cargo de administrador)? Cfr. 1418.º e 1419.º-A
(não) vs. 1345.º/4 (sim).
Direitos dos condóminos
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Direito sobre a fracção autónoma – 1414.º e
1420.º/1
Direito sobre as partes comuns – 1420.º/1
Direito de participar na administração do condomínio
– 1430.º e ss.
Direito de promover reparações indispensáveis e
urgentes das partes comuns – 1427.º
Em caso de destruição do edifício ou de parte dele
que represente três quartos ou mais do seu valor,
direito de exigir a venda do prédio e participar na
partilha do produto da venda – 1428.º/1
Obrigações dos condóminos
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Afectar a fracção apenas ao fim a que esteja destinada – 1422.º/2
Suportar as despesas necessárias à conservação da fracção autónoma –
1420.º/1
Contribuir para as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes
comuns e para os serviços de interesse comum – 1424.º
No caso de não habitar no prédio, comunicar o seu domicílio ou o do seu
representante – 1432.º/9
Contribuir, em proporção dos valores das fracções, para as despesas com
obras que não sejam de mera conservação – 1426.º
Efectuar seguro contra incêndio da fracção autónoma e das partes comuns –
1429 e art.5.º do DL 268/94, de 25 de Outubro
Contribuir para o fundo de reserva do condomínio – 4.º do DL 268/94, de 25 de
Outubro
Respeitar o título constitutivo – 1422.º/2/d)
Não praticar quaisquer actos ou actividades que seja proibidos por deliberação
da assembleia de condóminos sem oposição – 1422.º/2/d)
Não prejudicar, por acção ou omissão, a segurança, a linha arquitectónica ou o
arranjo estético do edifício – 1422.º/2/a)
Obras
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Obras destinadas à conservação e fruição das partes comuns:
competem ao condomínio, devem ser suportadas pelos
condóminos em proporção do valor das suas fracções
Obras que modifiquem a linha arquitectónica e/ou arranjo
estético do edifício – 1422.º/2/a) e 1422.º/3.
Obras “inovadoras” nas partes comuns só são permitidas se
não prejudicarem a utilização pelos condóminos quer das
fracções autónomas quer das partes comuns e dependem da
aprovação da maioria dos condóminos, devendo representar
2/3 do valor total do prédio; são suportadas nos mesmo moldes
que as anteriores; mesma regra é acolhida
O art.1425.º aplica-se a inovações nas fracções? Creio que
não!
Administração do condomínio
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Compete à assembleia de condóminos e a um administrador
Administrador: eleito e exonerado pela assembleia (1435.º/1, 2
e 3); elegíveis condóminos e terceiros (1435.º/4); pode ser
remunerado; supletivamente de 1 ano (1435.º/4)
- competente para representar os condóminos (ex. legitimidade
judicial activa contra terceiros ou condómino – 1437.º. Cfr. tb.
6.º/2 do FL 168/94, de 25 de Outubro -; legitimidade passiva
nas acções respeitantes às partes comuns – 1437.º/2);
excepção 1437.º/3
- funções: 1436.º (mas há dúvidas, v.g. pode realizar obras
urgentes extraodinárias?); 1429.º; 1429.º-A; art,8.º DL 269/94,
de 25 de Outubro
- dos actos do administrador cabe recurso para a assembleia,
que pode ser convocada pelo condómino recorrente (1438.º)
cont.
Assembleia de condóminos: art.1.º/2 do DL 268/94, de 25 de Outubro:
deliberações vinculativas para condóminos e terceiros titulares de
direitos relativos à fracções (ex. arrendatário, comodatário)
 São lavradas actas das reuniões (1..º/1 DL 268/94)
- funções: arts.1422.º/3, 1425.º/1, 1428.º/2, 1429.º-A, 1431.º/1,
1435.º/1, 1438.º; art.5.º/2 DL 268/94, de 25 de Outubro etc.
- reunião, no mínimo, anual – 1431.º/1; mas sempre que seja
convocada pelo administrador ou por condóminos representativos de
25% valor – 1431.º/2
- poder de voto proporcional ao capital investido – 1430.º
…………regras sobre convocatória, representação – cfr. 1431.º, 1432.º
- quorum constitutivo? Lei não refere; entendimento comum é de que
na 1.ª convocatória tem de estar mais de metade do valor
- quorum deliberativo: por regra, por maioria (1432.º/3); casos em que
é necessário 2/3 (1422.º/3 e 4 e 1425.º) ou que não haja qualquer
oposição (1422.º/2/d) e 1422.º-A/3); regulamento pode exigir
unanimidade dos condóminos (entende-se dos presentes)- cfr.
requisitos do 1432.º/ 5 a 8
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Invalidade de deliberações
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São anuláveis (só?) se contrárias à lei ou
regulamento – 1433.º/1 e 4; pode haver providência
cautelar de suspensão de execução (1433.º/5 e
398.º CPC)
Assembleia pode revogar deliberações inválidas ou
ineficazes (1433.º/2 e 3)
Para os aspectos lacunosos há que aplicar
analogicamente regras sobre assembleias gerais de
associações e de sociedades comerciais
Natureza jurídica do condomínio
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Não tem personalidade jurídica, mas tem alguma
organicidade
Esses órgãos têm poderes nomeadamente ao nível
da capacidade judiciária activa e passiva; o próprio
CPC atribui personalidade judiciária ao condomínio
relativamente às acções que se inserem no âmbito
dos poderes do administrador
RPD: personalidade jurídica rudimentar
(personalidade jurídica limitada ou fraccionária – na
esteira de P.Cunha e M. Andrade)
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Fracções autónomas e partes comuns