A perda de importância da música
na sociedade de consumo no início
do século XXI
Miriã Rosa da Paixão
Orientador Kleber Mazziero de Souza
Graduanda em Comunicação
Social pela Escola Superior
de Propaganda e Marketing –
Email: [email protected]
Paixão, Miriã R. da. A perda de importância da música na sociedade de consumo no início
do século XXI. São Paulo: Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM, 2012.
Resumo
O presente artigo faz uma análise do quadro social do princípio do século XXI no que tange à
“hipermidiatização” e à “desmidiatização” da música no contexto brasileiro. Partindo da metodologia
abordada pela técnica da Análise do Discurso, trazendo elementos históricos da arte – especificamente da
música – e apontando para elementos e índices do consumo de música na sociedade contemporânea, é
abordada a questão da transformação da música que, primordialmente, era uma forma de comunicação,
em seguida passou à categoria de Arte e, finalmente, vem a sugerir nova mudança, agora para a categoria
de produto de consumo; aborda-se, também, a questão do acesso à música que, tanto maior,
aparentemente menos qualificado, pois, aparentemente ganhando força mercadológica, vem perdendo
força estética.
Palavras-chave: Consumo, música, Análise do Discurso, hipermidiatização, desmidiatização.
Resumen
En este artículo se analiza la situación social del principio del siglo con respecto a la "hipermidiatización"
y la "desmidiatización" de la música en el contexto brasileño. Con base en la metodología discutida por la
técnica del análisis del discurso, con lo que los elementos históricos del arte – especialmente la música –
y apuntando a los elementos y las tasas de consumo de música en la sociedad contemporánea, se discute
si el tratamiento de la música que, sobre todo, era una forma de comunicación, luego fue a la categoría de
arte, y, finalmente, viene a sugerir nuevo turno ahora a la categoría de producto de consumo; se discute,
también, la cuestión del acceso a la música, mayor, pero aparentemente menos cualificados, pues, al
parecer,
ganando
el
impulso
de
marketing,
ha
ido
perdiendo
su
fuerza
estética.
Palabras clave: Consumo, música, el Análisis del Discurso, hipermidiatización, desmidiatización.
Abstract
This article analyzes the social situation of the beginning of the century with regard to music’s
“hipermidiatization” and to “unmidiatization” in the Brazilian context. Based on the methodology
discussed by the technique of discourse analysis, bringing the historic elements of art – especially music –
and pointing to elements and consumption rates of music in contemporary society, we discuss whether the
music process, primarily, was a communication form, then went to the category of Art, and finally comes
to suggest new shift now to the consumer product category. Consider, also, the access to music issue, that
bigger, apparently less qualified; therefore, apparently sronger marketing, has been losing aesthetics
strength.
Keywords: Consumption, music, Discourse Analysis, hipermidiatization, unmidiatization.
Introdução
Já no resumo do artigo intitulado Comunicação, cultura e arte contemporânea,
Fernando do Nascimento Gonçalves define a Arte como “um processo de produção
simbólica, é um espaço rico para questionamentos acerca da comunicação e da cultura
contemporâneas.” (Gonçalves, 2007).
Na qualidade de “produção simbólica”, a Arte traz signos para serem apreciados,
cujos significados são fruídos por apreciadores de manifestações artísticas,
estabelecendo o elo conceitual entre a instância da poética e da estética. Enquanto
poiésis, as formas de expressão artística partem do autor e completam seus caminhos de
produtos simbólicos quando sorvidas, enquanto objetos da aiesthésis, pelo espectador,
receptáculo da mensagem contida na obra de arte.
Entre as Artes, segundo Schopenhauer, a música é aquela cujo poder transmissor
de mensagens é mais avassalador.
De todas as artes, Schopenhauer exalta a música como sendo a mais
grandiosa e a mais majestosa, além disso, ela possui um poder especial,
devido ao fato de ter um aspecto universalizante que ultrapassa
qualquer tipo de individualidade. (Oliveira, 90).
De fato, os primeiros hominídeos não dominavam completamente os recursos da
fala. Desse modo, para exprimir seus sentimentos, utilizavam sons que os ajudavam a
exteriorizar os sentimentos de alegria, tristeza, raiva, crenças, entre outros; utilizavam
sonoridades como forma de expressão. Tal fato nos permite afirmar que a música
precede até mesmo a fala como forma de comunicação. Segundo Pagano, a música
coincide com o momento no qual o Homem se descobre como Ser capaz de se
comunicar: “A música começa no momento em que o homem se descobre a si mesmo,
como instrumento de música”. (Pagano, p. 11).
A origem da música é incerta, pois tamanhamente remota, não é possível
precisar a data em que nasceu; não sendo possível também saber quando surgiu e como
se desenvolveu nos primórdios das civilizações, afinal, as primeiras manifestações
musicais não deixaram vestígios e, uma vez que a música não é registrada em formato
impresso ou sonoro, passa a ter documentada sua evolução apenas a partir do século IV.
Entretanto, a música está presente na natureza antes de que existissem ouvidos para
escutar. “A própria natureza é que nos dá a música; o que dela fazemos varia, conforme
o temperamento, a educação, o povo, a raça e a época”. (Pahlen, p. 13).
A natureza fornece, também, a aguçada capacidade de percepção auditiva para o
Homem, transformando-o num ser naturalmente musical.
A vida é som. Continuamente estamos cercados de sons e ruídos
oriundos da natureza e das várias formas de vida que ela produz. O
homem fala e canta há incalculáveis milhares de anos e graças ao seu
ouvido maravilhosamente construído que se parece a uma harpa com
infinidade de cordas, percebe sons e ruídos, embora apenas uma parte
insignificante da imensidão de tudo quanto soa.” (PAHLEN p.13)
A mais antiga das formas de comunicação, portanto, conheceu seu pleno
desenvolvimento a partir dos registros impressos na Idade Média. A partir da construção
da documentação acerca da manifestação sonora, finalmente a música se constituiu mais
como arte, menos como forma de expressão semi-verbal, meramente representativa –as
primeiras civilizações davam significados para os sons, por exemplo, os ecos eram
oráculos; o trovão, símbolo dos poderes celestiais – ou ligada visceralmente a
ritualizações em cultos de devoção.
Um breve histórico
A partir da grafia musical em partituras, com início no século IV, muito se
conhece da evolução da música. Toda a trajetória dos primeiros documentos impressos
das partituras do papa Ambrósio (que batizou Agostinho de Hipona, Santo Agostinho),
a construção do magnífico repertório do Canto Gregoriano pelo século VI, a definição
de uma grafia única dos neumas, pelo século VII.
O efeito da música sobre o homem diminui no decorrer dos milênios;
apesar disso, podem ser encontrados nos tempos históricos e até na
atualidade interessantes exemplos do seu poder. Davi toca harpa para
afugentar os maus pensamentos do Rei Saul; Farinelli, com o auxílio da
música, cura a terrível melancolia de Filipe V. Timóteo provoca, por
meio da certa melodia, a fúria de Alexandre, o Grande, e acalma-o por
meio de outra. Os sacerdotes celtas educam o povo com a música;
somente eles conseguem abrandar os costumes selvagens. Diz-se que
Terpandro, tocando flauta, abafou a revolta dos lacedemônios. Santo
Agostinho conta que um pastor foi, em virtude de suas melodias, eleito
imperador. (PAHLEN, p. 14).
Após estabelecida a grafia definitiva, a Idade Média conheceu os grandes
compositores da música instrumental, da música cantada pelos trovadores, da música
sacra das missas de Josquin des Prez, da música que precedeu os corais renascentistas
do século XVI.
A Idade Média, pautada pela música modal, na qual ainda não se
estabelecera o conceito da tonalidade (ao invés dos tons Maior e
Menor, as composições eram estruturadas sobre as escalas modais
herdadas da música da Grécia antiga) e a música Renascentista (na qual
o conceito de tonalidade apontava para a delimitação do que viria a se
chamar harmonia) conheceram grandes compositores: Guillaume de
Machaut, Josquin des Prez, Juan del Encina, Pierluigi da Palestrina;
porém a música produzida ao longo de todo esse longo tempo estava a
preparar a chegada do pai da música tonal do Ocidente. (Mazziero, p.
26).
Aprimorada e definida perfeita e completamente, a linguagem gráfica da música,
impressa em partituras, conheceu, a partir do século XVIII seu esplendor com o
surgimento do Barroco de Bach.
A técnica de composição do Canto Gregoriano, o cantochão, o
“canto a uma só voz”, foi sucedido pela música dos trovadores,
pelas missas cantadas, pelo Coral Renascentista. No entanto,
nenhuma dessas manifestações fez uso tão amplo e preciso da
linguagem do contraponto (técnica de composição para mais de
uma voz, todas elas executando melodias interligadas) quanto a
música de Bach. Por sua extensa obra instrumental, da qual
constam peças solo para cravo, alaúde, órgão, música de câmara,
tocatas, concertos para vários instrumentos e orquestra e
sinfonias, pode-se entender seu profundo domínio da linguagem
do contraponto – e, por conseguinte, da harmonia – que pautam
cada uma de suas partituras: as construções melódico-harmônicas
revelam a estrutura técnica montada pelo compositor, de modo a
estabelecer toda a linguagem da música que seria feita a partir de
ali. (Mazziero, p. 26).
O neoclassicismo de Mozart e o Romantismo de Beethoven e Brahms levaram a
linguagem musical ao seu apogeu nos 150 anos que varrem a segunda metade do século
XVIII e todo o século XIX.
Beethoven, nas composições do início de carreira, revela uma
influência muito nítida da obra de Mozart; não apenas no uso dos
recursos de linguagem instrumental mas, sobretudo, no uso da
Forma na estruturação das peças [...] No entanto, após a fase
jovem de sua obra, Beethoven trouxe à linguagem musical a
possibilidade de rompimento com a Forma e de uma espécie de
“possibilidade de arroubo criativo” nunca dantes imaginado. É a
fase madura do compositor. Finalmente, naquela a que se chama
de “fase tardia”, Beethoven se mostra o compositor completo,
domina a Estrutura e a Forma, apresenta ao mundo peças que
figuram entre as mais importantes da História da Música.
(Mazziero, p. 18).
A chegada do século XX trouxe consigo uma espécie de “esgotamento da
linguagem” e a música dodecafônica de Arnold Schöenberg, de certa forma, decretou o
fim a música tonal, com a qual os ouvidos da humanidade se acostumaram ao longo de
15 séculos. “A música, tal qual a conhecemos, é a grafada no período entre Bach e
Brahms. Agora proponho uma nova linguagem.” (Schöenberg, p. 53).
A música no século XX
A música, no século XX, assistiu à migração geopolítica do centro do mundo. O
conglomerado de forças histórico-políticas centrado na Europa desde há muito,
deslocou-se para os Estados Unidos da América do Norte.
Sem tradição de música grafada, sem a tradição da chamada “Música erudita”, a
cultura americana apresentou ao mundo a cultura musical ali produzida: a cultura da
música popular. As principais formas de música popular norte-americanas foram, então,
disseminadas pelo mundo e começaram a ser grafadas, impressas, documentadas. Há
pouco mais de 100 anos, portanto, o jazz e o blues percorrem o mundo em registros
impressos e sonoros, pois logo no princípio do século XX as casas de gravações
começaram a surgir e, com elas, a indústria da gravação da música em discos, a
indústria da reprodução em série das obras musicais interpretadas, gravadas e
consumidas por um grande – e cada vez mais crescente – público. Vale sempre recordar
o alerta proferido por W. Benjamin, no ano de 1955.
Em sua essência, a obra de arte sempre foi reprodutível. O que os
homens faziam sempre podia ser imitado por outros homens. Essa
imitação era praticada por discípulos, em seus exercícios, pelos
mestres, para a difusão das obras, e finalmente por terceiros,
meramente interessados no lucro. Em contraste, a reprodução técnica
da obra de arte representa um processo novo, que se vem
desenvolvendo na história intermitentemente, através de saltos
separados por longos intervalos, mas com intensidade crescente.
(Benjamin, p. 2).
Desde o instante em que a música passa a ser gravada e transformada numa
espécie de produto que pode ser comercializado, inevitavelmente ela ganha um caráter
que pode ser ligado ao consumo. Se a música, pelo século IV, ao ser grafada, deixou de
ser apenas uma manifestação ritualística ou comunicacional para ser arte, pelo século
XX, ao ser gravada, ela deixou de ser apenas uma manifestação artística e passou a ser,
também, um produto. Como tal, produzido também para ser consumido.
A música e o consumo no século XX
Ao longo de todo o século XX o mercado consumidor de música fez expandirse. As gravadoras proliferaram ao redor de todo o mundo, as grandes corporações
multinacionais determinaram a produção e o consumo da música em larga escala. As
cifras alcançaram montantes de lucros extraordinários e a música, a mais antiga das
formas de comunicação, de fato, “falou” com o mundo todo.
Em primeiro lugar aparece a banda The Beatles, do Reino Unido, com
1 bilhão de discos vendidos mundialmente, dos quais 190 milhões só
nos Estados Unidos. Também em primeiro lugar aparece o cantor Elvis
Presley, dos Estados Unidos, com estimativas de mais de 1 bilhão de
discos vendidos mundialmente, dos quais mais de 176 milhões só nos
Estados Unidos. Na terceira posição aparece o cantor de música pop
Michael Jackson, também natural dos Estados Unidos. Além de ser o
autor do álbum mais vendido da história da indústria fonográfica,
Thriller, suas vendas alcançaram aproximadamente 750 milhões de
álbuns comercializados em todo o mundo, após sua morte, em 2009. A
extinta banda ABBA, da Suécia, também registra vendas superiores a
370 milhões de cópias no planeta. Em quinto lugar há o empate entre a
banda britânica Queen, atualmente também fora de atividade, e a
cantora Madonna, que também se destaca por ser a mais vendida entre
as mulheres, ambos com mais de 300 milhões de discos
comercializados. Dentre os brasileiros, a dupla de música sertaneja
Tonico & Tinoco, que vendeu 150 milhões de cópias. Em segundo está
o cantor Roberto Carlos, que iniciou sua carreira na Jovem Guarda nos
anos 50 na Rede Record e tem mais de 120 milhões de discos vendidos
no mundo, segundo estimativas da ABPD e de sua atual gravadora
Sony BMG. (Wikipédia, 2012)
Dentre tantas espécies de músicas ligadas ao consumo no século XX, uma das
facetas mais caracteristicamente ligadas ao ramo da comunicação é a produção de
jingles para comerciais de televisão.
O jingle publicitário e a música do século XXI
A definição de Armando Sant’anna permite aqui delimitar precisamente a que o
termo jingle se refere:
Mensagem publicitária em forma de música, geralmente simples e
cativante, fácil de recordar e cantarolar. Criada e composta para a
propaganda de uma determinada marca, produto, serviço etc. Tem a
mesma duração do spot. (SANT’ANNA, 2009, p. 178).
Ainda para delimitar mais precisamente como uma espécie de música-paraestimular-o-consumo, vale a pena trazer em coleção a definição de Carlos Manhanelli:
O jingle é uma música feita para vender, que, aparentemente sem
grandes pretensões, mas na realidade repleta delas, comunica conceitos
e provoca emoções, permitindo que se transmitam valores diversos
almejados por sua “audiência”, como o status, a juventude e o prazer. O
objetivo é fazer com que o público alvo veja de forma positiva o
consumo do produto em questão. Suas armas de sedução? Em primeiro
lugar, a fantasia e a imaginação, vocações fundamentais do rádio;
depois, o encanto, a alegria e a magia da música, unida a argumentos
simples da vida (MANHANELLI, 2011, p. 16).
Devidamente definido, é preciso situar o jingle publicitário no tempo.
Evidentemente atrelado ao Rádio, pois música composta especificamente para
veicular a imagem de um produto, o jingle publicitário tem no princípio da década de
1930 seu momento inicial de veiculação.
No Brasil, especificamente a partir de 1932, o jingle publicitário concretizou seu
discurso persuasivo nos comerciais veiculados pelo Rádio e, a partir de 1950, com a
chegada da televisão, sistematizou seu discurso sonoro-imagético proporcionando aos
comerciais veiculados na segunda metade do século momentos de acuro composicional
e plenitude comunicacional.
Contudo, a primeira década do século XXI acompanhou um decréscimo
vertiginoso da importância do jingle publicitário. A dissertação de mestrado “O jingle
publicitário e sua curva de importância” aponta para uma preocupante diminuição no
tempo médio destinado ao jingle na peça publicitária veiculada pelo Rádio e pela
televisão, no comercial.
O tempo médio destinado ao Jingle dentro do complexo
expressivo do comercial foi reduzido de 76,5% em comparação à
média de tempo destinado ao Jingle pela primeira metade do
século XX, naquela a que aqui denominamos Era do Rádio, e de
74,8% em comparação à média de tempo destinado ao Jingle pela
segunda metade do século XX, naquela a que aqui denominamos
Era da Televisão. (Mazziero, p. 601).
Este fenômeno pode dever-se a inúmeros fatores, tais como a mudança do
discurso para adequar-se ao ritmo frenético de emissão e absorção de mensagens por
parte do público consumidor, a dificuldade em prender a atenção do receptor da
mensagem no tempo em que este se encontra exposto a uma quantidade abundante de
mensagens, a fragmentação de mensagens estruturadas para atingir públicos específicos
aculturados em espécies de guetos ideológicos. Porém, não deve ser descartada a
hipótese mais “apocalíptica”: a perda de importância do jingle no complexo expressivo
do comercial pode significar a perda de importância da música no contexto do interesse
social por esta arte.
É fato que as artes passam por ciclos de importância ao longo da história da
humanidade: a extrema importância da pintura pelo século XV não é encontrada pelo
século VII tampouco pelo século XXI; a importância da arquitetura no século XIII não
se repete pelo século IV ou mesmo pelo século XIX.
É possível, portanto, que a música popular esteja a deixar a protagonia de
importância social que conquistou pelo século XX justamente por conta de uma espécie
de “importância cíclica de uma determinada arte” e esteja, dessa forma, sendo sucedida
por outra arte em sua posição de protagonista. Porém, é possível – e temeroso – que a
música esteja a perder importância no contexto social do século XXI por um par de
fatores.
A perda de importância da música na sociedade de consumo
Por um lado, encontramos uma espécie de “hipermidiatização” da música:
programas de televisão e atrações musicais que se sucedem uma a outra; programas de
rádio com extensas horas de música ao longo do dia; sites da Internet que permitem o
download de uma infinidade de músicas em poucas horas; sites de música na Internet
que facilitam a disseminação de músicas em tempo real para o mundo todo; Ipods,
Ipads, aparelhos de MP3, MP4, fones de ouvido com vedação completa de som externo,
que permitem o acesso à música em deslocamentos do ouvinte.
Por outro lado, uma espécie de “desmidiatização” de uma espécie de arte a que
podemos chamar de “música de alguma qualidade”. Note-se que este não há referência à
música chamada “erudita” – não é o caso de se cobrar que o cidadão leve em seu Ipod
para o deslocamento entre as estações do Metrô uma sinfonia de Gluck –; mas à música
chamada “popular”. Os grandes artistas não mais fazem parte da grade de programação
das televisões e das rádios e dão lugar a fenômenos mercadológicos adorados e
consumidos pelo público com a voracidade que não permite sua longevidade enquanto
artistas. Assim, sem o artista longevo não há uma arte duradoura. Em contrapartida, um
produto consumido de modo voraz gera e estimula uma sucessão de “febres de
consumo”.
Considerações finais
Ao notarmos a amedrontadora possibilidade de a música vir a perder sua
importância enquanto manifestação artística e ganhar características de elemento de
consumo, estamos a observar a possibilidade de a mais nobre das artes, de a mais antiga
das formas de comunicação humana, ser reduzida a mero produto de consumo,
fabricado, industrializado e comercializado num mercado que visa a atender as
necessidades primais da sociedade, não a um mercado que visa a atender as
necessidades estéticas da sociedade.
O alerta pronunciado por dois dos mais importantes membros da Escola de
Frankfurt, chamados posteriormente de “apocalípticos”, ainda hoje tem forte apelo pela
atualidade da questão trazida à tona. O texto faz referência específica à arte
cinematográfica, mas pode ser perfeitamente adequado à arte da música:
Ultrapassando de longe o teatro de ilusões, o filme não deixa mais à
fantasia e ao pensamento dos espectadores nenhuma dimensão na qual
estes possam, sem perder o fio, passear e divagar no quadro da obra
fílmica permanecendo, no entanto, livres do controle de seus dados
exatos, e é assim precisamente que o filme adestra o espectador
entregue a ele para se identificar imediatamente com a realidade.
Atualmente, a atrofia da imaginação e da espontaneidade do
consumidor cultural não precisa ser reduzida a mecanismos
psicológicos. Os próprios produtos (...) paralisam essas capacidade em
virtude
de
sua
própria
constituição
objetiva
(ADORNO
&
HORKHEIMER, p. 119).
Aparentemente o quadro apocalíptico se concretiza de modo dolorosamente real
neste princípio de século XXI, quando a arte passa a dar lugar ao mercado; as obras dão
lugar aos produtos; a fruição da mensagem artística dá lugar ao consumo.
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