Proporcionalidade: Limite à supremacia do interesse público Afirmar que, num conflito entre interesse público versus interesse privado, o que há de prevalecer é o interesse público não seria justificativa aceitável para a aplicabilidade do princípio em comento. Esse raciocínio não procede. Convém, desde logo, acentuar que nesses tipos de conflito é de suma relevância consignar que ambos os interesses são igualmente amparados pelo ordenamento jurídico brasileiro, ao contrário, seria dizer que não há no direito respaldo e tutela para o interesse privado quando este se deparar com o interesse público. Fala-se, desde os primórdios, que os indivíduos, a fim de facilitar a obtenção de moradia, alimento, bem-estar e segurança, se viram compelidos a se reestruturar nos moldes de uma sociedade para se protegerem de ataques de animais e até mesmo de outros indivíduos. Assim, a imposição de limitações aos interesses individuais em benefício da coletividade teve a sua gênese a partir do momento em que os indivíduos passaram a enxergar a necessidade de viver em grupos, ou seja, em sociedade, objetivando, a partir de então, a convivência social. A imposição de limitação alcançou robustez no momento em que o Estado fora instituído como administrador, passando a tutelar conforme o interesse público a fim de preservar a harmonia e o interesse da sociedade. A problemática maior dessa exteriorização encontra-se exatamente no modo pelo qual se tem aplicado a imposição de limitações, visto que o Estado tem atuado e manifestado suas vontades de forma arbitrária, executando atos com características do Estado absolutista, atos de superioridade, tais como o de organizar, de punir e de fiscalizar, situação em que o Estado passou a disseminar o seu poder desenfreado com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade “atropelando” os indivíduos e seus direitos fundamentais. O direito moderno vincula-se às fontes de integração social, visando desrespeitar minimamente os interesses públicos e particulares, valorando-os ponderadamente. O Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição de 1988 elegeu o princípio da proporcionalidade, devendo este ser aplicado com o escopo de impedir restrições a determinado direito fundamental ou um conflito entre distintos princípios constitucionais, de modo a exigir que se estabeleça o peso relativo de cada um dos princípios em busca da melhor solução. Com efeito, o princípio da supremacia do interesse público não coaduna com as nuances do Estado Democrático de Direito devido à tamanha negligência em não valorar os mandamentos consagrados constitucionalmente. Tudo isso implica na proposta de “reconstrução da supremacia do interesse público” sob a ótica da proporcionalidade. Firmados estes pontos, impende observar que o princípio da supremacia do interesse público deve-se guiar pelo postulado da proporcionalidade, avaliando os meios utilizados para melhor adequação à promoção do resultado fim, visando desrespeitar o mínimo possível os interesses particulares. A convicção de que o princípio da supremacia do interesse público deve ser reconstruído sob a ótica da proporcionalidade é reforçada pelo meio utilizado para a desapropriação, relativizando sua prevalência absoluta. Interessante observar que o próprio constituinte antecipou o juízo de ponderação acerca da desapropriação, que mormente é tido como um direito fundamental, conforme dispõe o art. 5º, XXII, CF/88. Veja-se que os meios ora utilizados para a desapropriação parecem abarcar tanto a satisfação do interesse público, quanto do interesse privado, mecanismo este pelo qual ambos os interesses são preservados, sem que haja a sobreposição total de qualquer um dos interesses. Cuida-se, portanto, definir que a proporcionalidade deve ser prestigiada nos atos que envolvam a atividade administrativa, sendo compreendida como método essencial a estabelecer não mais prerrogativas absolutas, mas relativas. Enfim, o princípio da supremacia do interesse público tem sido reconhecido desde os primórdios, como exigência para a mantença da vida em sociedade, visando o bem-estar de todos. O fato é que, com o advento do Estado Democrático de Direito, a vantajosidade que outrora fora concedida à Administração Pública, e que ainda permanece em relação ao particular, já não pode mais ser vista e aceita de forma absoluta, o que logo implica na relativização das “vontades do Estado” segundo a ótica da proporcionalidade.