XI Salão de Iniciação Científica PUCRS A política instrumentalizando a religião, ou a religião instrumentalizando a política? Bolsista: Rômulo Estevan Schembida de Oliveira; Orientador: Prof. Dr. Ricardo Mariano Faculdade de Ciências Sociais, PUCRS, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Resumo A pesquisa faz parte do projeto “A atuação política no Brasil: um balanço bibliográfico”. Tem como objetivo analisar a atuação política do senador Marcelo Crivella PRB/RJ, bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus e sobrinho de Edir Macedo. Crivella ascendeu à carreira política instrumentalizando sua identidade religiosa. Como bispo da Universal, missionário na África e cantor gospel conquistou fama entre os evangélicos. Já na sua primeira disputa eleitoral, em 2002, conseguiu ser eleito senador pelo estado do Rio de Janeiro. Desde então, teve que enfrentar pela frente uma dura oposição a sua ação política, sob a acusação da imprópria mistura entre política e religião num Estado laico. Introdução A vida pública de Marcelo Crivella está dividida em duas partes. A primeira foi construída através de sua trajetória como bispo da Universal, contribuindo para a expansão da igreja atuando como missionário e fundando centenas de templos na África. No retorno ao Brasil, Crivella iniciou sua carreira como cantor gospel, obtendo mais de 1,6 milhões de CDs vendidos, em uma discografia que conta com 10 CDs lançados. Segundo afirma, todo dinheiro arrecado através da venda de CDs fora revertido para projetos sociais, dentre os quais se destaca o Projeto Nordeste. Esse projeto social teve início em 1999, com o objetivo de estabelecer alternativas econômicas para a fome e seca no sertão baiano. Para colocá-lo em prática, Crivella fundou a Fazenda Nova Canaã, no município de Irecê, na Bahia. Seguindo o modelo do kibutz israelense, introduziu um sofisticado sistema de irrigação do solo, escolas, creches, padaria e farmácia a serviço da comunidade de aproximadamente 500 famílias que vivem na região. Os XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010 1761 feitos realizados na Fazenda Canaã foram ostensivamente noticiados na Rede Record, empresa que pertence à Universal, o aparato midiático ligado à igreja não poupou esforços para mostrar que Crivella era o seu principal idealizador. Isso contribuiu para que alavancasse a fama como líder de causas sociais e, com isso, preparar “seu terreno” para lançá-lo à política partidária. Em 2002 concorreu ao Senado Federal pelo Partido Liberal, no estado do Rio de Janeiro. Com base no slogan: “Se deu certo no sertão vai dar certo no Rio”, a campanha de Crivella foi fortemente associada a sua ação como idealizador do Projeto Nordeste. No término do pleito surpreendeu a todos desbancando nomes consagrados da política nacional, como Leonel Brizola, ao obter mais de 3 milhões de votos (quase a metade de evangélicos, segundo as pesquisas de intenção de voto realizadas dias antes da eleição), ocupando a segunda cadeira do estado no Senado. Mas sua ambição política não parou por aí, pois também foi marcada pelas disputas dos anos de 2004, quando concorreu à prefeitura carioca; em 2006, já filiado pelo PRB, pleiteou o governo estado fluminense e em 2008, quando novamente concorreu para a prefeitura do Rio de Janeiro. Nestas disputas, não conseguiu se quer chegar ao segundo turno, por conta do alto índice de rejeição que o acompanhou de forma crescente ao longo de cada eleição. Metodologia A pesquisa sociológica, de caráter qualitativo, foi baseada em levantamento bibliográfico de textos de Ciências Sociais sobre a relação entre política, Estado e religião no Brasil. O trabalho também está baseado na coleta de diversas fontes documentais, como: material escrito de jornais, revistas e diversos sites, seculares e religiosos, sobre a atuação política de Marcelo Crivella. Resultados e Discussão A atuação política de Marcelo Crivella tem forte ligação com sua identidade como líder religioso. Embora essa ligação tenha alavancado sua carreira política, seu vínculo religioso com a Universal tem sido determinante para afastá-lo, até o momento, de alçar vôos mais elevados na política. Seu altíssimo índice de rejeição decorre do pesado estigma resultante de sua ligação com a Universal e da oposição radical das Organizações Globo às suas candidaturas. XI Salão de Iniciação Científica – PUCRS, 09 a 12 de agosto de 2010 1762 Por mais que Crivella tentasse dissociar a imagem de líder religioso da imagem de político, a oposição impossibilitou essa dissociação. Além disso, o que facilitou muito o trabalho dos opositores de Crivella foi o fato de, na sua atuação política, também estar presente a voz do homem religioso. Isso fica claro quando assume posição contraria aos direitos dos homossexuais ou quando toma uma postura mais conservadora frente a outros temas de ordem moral, temas que evidentemente são do interesse da sua igreja. O ponto mais polêmico da atuação política do bispo (agora licenciado) da Igreja Universal decorre do caráter laico do Estado brasileiro. Embora Crivella alegue não misturar política com religião, a sua trajetória como bispo e cantor gospel, somada ao contexto em que a sua imagem pública foi construída e planejada para que se lançasse como político. Além da sua própria atuação no campo político onde, indubitavelmente, está presente a sua moral religiosa e conservadora, no que se refere principalmente aos seus posicionamentos sobre o campo moral. São questões que reforçam ainda mais a idéia de que Crivella também atua, a serviço de sua religião, na esfera política. Conclusão A atuação política de Crivella está intrinsecamente associada a sua atuação como líder religioso. Esse fato faz com que seja crescente sua rejeição tanto entre os defensores do Estado laico, como entre os homossexuais e outros grupos (como a Rede Globo) que vêem Crivella como uma ameaça aos seus direitos ou interesses. Por fim, a oposição atua no sentido de deslegitimar suas candidaturas baseadas na instrumentalização do rebanho religioso, valendo-se de todo o seu carisma religioso para obter poder político. Referências BAPTISTA, Saulo de Tarso Cerqueira. Cultura política brasileira, praticas pentecostais e neopentecostais. A presença da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do Reino de Deus no congresso nacional. São Bernardo do Campo, UMESP, Doutorado em Ciências da Religião, 2007. GIUMBELLI, Emerson. 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