l País l
Domingo 26 .10.2014
O GLOBO
l 33
FABIO SEIXO/12-10-2014
A bênção. Crivella em campanha em Campo Grande: o candidato que derrotou Garotinho (PR) transita pelas dádivas da Igreja Universal, adora pizza e acorda cedo para caminhar pelo Bosque da Barra (foto menor), seu local favorito
O encanto por
uma Barra
bucólica
Antes de mergulhar nas agendas de campanha feitas por todo o estado, o carioca
Marcelo Crivella, morador da Barra da Tijuca, tinha por hábito caminhar por espaços
abertos do bairro, como a praia e o parque Bosque da Barra, e, descendente de italiano
que é, saborear pizzas de restaurantes da região. Botafoguense, o candidato diz que,
antes das eleições, gostava de acompanhar os jogos do time alvinegro, costumes que
pretende retomar, saia ou não vitorioso nas urnas hoje.
LEANDRA LIMA
[email protected]
O dia para o senador e candidato a governador do Rio pelo PRB, Marcelo Crivella, começa cedo. Independentemente da hora que vai dormir, acorda
pontualmente às 5h para praticar atividades físicas. Quando a agenda é apertada, recorre à academia do condomínio onde mora, o Península, na Barra
da Tijuca. Quando há tempo, faz caminhadas pela orla ou parte para o Bosque da Barra, lugar apontado pelo senador como seu preferido. Bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de
Deus, nem sempre é reconhecido em
suas caminhadas por seu trabalho no
Congresso, mas por seus 12 álbuns de
música gospel. Na campanha, preferiu
ser vinculado à política e não à religião.
PURO-SANGUE DA UNIVERSAL
Com uma trajetória política independente dentro do PRB — companheiros
de partido afirmam que o senador tem
vida própria, não depende da legenda
para se eleger —, Crivella optou no primeiro turno por uma chapa puro-sangue. Mas a escolha não foi por acaso.
Embora repita que nenhuma outra sigla quis caminhar ao lado do PRB, seu
partido no Rio não traz um histórico de
alianças. Seus candidatos com chances
de vitória são, quase sempre, ligados à
Igreja Universal e têm reduto eleitoral
entre evangélicos.
Assim como aconteceu em disputas
para a prefeitura do Rio, em 2004 e 2008,
e ao governo do estado, em 2006, Crivella começou a atual corrida rumo ao Palácio Guanabara com bons índices de intenções de votos, que oscilaram em embates com o candidato derrotado do PR,
Anthony Garotinho. Com pouco tempo
de TV, surpreendeu ao conseguir se
manter bem avaliado, empatado muitas
vezes com Luiz Fernando Pezão (PMDB)
e, depois, com Anthony Garotinho (PR)
no segundo lugar. Até culminar com a
ida para o segundo turno, deixando para
trás o veterano Garotinho por apenas
42.608 votos de diferença, e o petista
Lindbergh Farias. Garotinho tornou-se
um aliado no segundo turno.
Vaidoso como todo libriano, Crivella
apareceu em suas agendas pelo estado,
ao longo dos 111 dias de campanha,
sempre bem vestido — com suas incontáveis camisas sociais ou polos
azuis — e com o cabelo cortado de maneira impecável. Apesar dos poucos fios brancos, o candidato jura nunca ter
pintado o cabelo:
— Nunca, jamais! Nunca, nunca,
nunca pintei o cabelo. Meu pai morreu
com 64 anos, e tinha o cabelo pretinho.
É de família.
Cantor e compositor de músicas
evangélicas, Crivella diz gostar de
canções regiliosas brasileiras e americanas. Para ele, “estão cada vez mais
bonitas”. O senador não toca nenhum
instrumento musical, mas diz ter no
celular muitas músicas populares
brasileiras, “que ama”. Escuta de Noite Ilustrada (pseudônimo de Mário
Sousa Marques Filho), Vicente Celestino e Ari Barroso até “os meninos” do
sertanejo universitário.
Pouco antes da campanha eleitoral, o
político leu os dois primeiros volumes da
trilogia da biografia do ex-presidente Getúlio Vargas escritos pelo jornalista e escritor Lira Neto: “Getúlio 1882 1930 — Dos
anos de formação à conquista do poder” e
“Getúlio 1930-1945: do governo provisório
à ditadura do Estado Novo”. Crivella aproveita e recomenda também os livros “Desafios brasileiros na era dos gigantes” e
“Quinhentos anos de periferia”, ambos sobre a posição do Brasil no contexto das relações internacionais, escritos por Samuel
Pinheiro Guimarães. O embaixador faz
parte da equipe que formulou o programa
de governo do Crivella para estas eleições.
Como de esperado, o bispo licenciado não
se furtou de lembrar que também tem, por
hábito, ler a Bíblia todos os dias antes de
sair de casa. O senador é sobrinho de Edir
Macedo, fundador da Igreja Universal.
Crivella tornou-se líder religioso da instituição nos anos 80. Tem cadeira no Senado Federal desde 2003, e seu atual mandato vai até 2019.
POLÊMICAS AO LONGO DA CAMPANHA
Ao longo da campanha, viu-se envolvido
em polêmicas, como no episódio em que
disse que os miseráveis da Baixada Fluminense roubariam na capital, caso não
houvesse investimento naquela região, e
que considera homossexualidade pecado.
O GLOBO mostrou que, na sua primeira
prestação de contas de campanha, Crivella declarou que um de seus doadores foi
Maurício Albuquerque Braga, que contribuiu com R$ 15 mil, mesmo tendo sido lotado na Liderança do PRB do Senado somente em abril deste ano e tendo sido
contemplado com uma casa do programa
de habitações populares Minha Casa Minha Vida, no Distrito Federal. Maurício e
uma assistente parlamentar júnior do gabinete de Crivella no Senado, que doou R$
5 mil, foram dois dos cinco funcionários
de políticos do PRB que fizeram caixa para
o início da campanha de Crivella.
O GLOBO publicou também duas reportagens que denunciaram a ação de
bispos da Igreja Universal do Reino de
Deus (Iurd) que pediram votos para Crivella e seus correligionários durante cultos realizados nos templos ao longo do
primeiro turno. Para uma das reportagens, a equipe do GLOBO acompanhou
um dos atos religiosos na Catedral da
Universal de Nova Iguaçu, no qual o bispo incitou os fiéis a fazerem boca de urna para o senador, e ainda proferiu que
Pezão seria “o principado do inferno”.
Em ambos os casos, Crivella disse desconhecer a prática dos líderes da igreja
da qual faz parte.
Crivella nasceu na Policlínica de
Botafogo, em outubro de 1957, ano
em que, durante o governo desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek, foi aprovado o plano-piloto
de autoria urbanista Lúcio Costa
para a construção de Brasília, em
concurso organizado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. No mesmo
ano, a Seleção Brasileira convocou Pelé pela primeira vez, e,
aqui no Rio, o baiano João Gilberto treinava por horas a fio o dedilhado no violão que seria, um ano
depois, o marco da revolucionária
bossa nova.
Admirador de teatro, Crivella diz ter
achado ótimo o último espetáculo a
que assistiu na companhia de sua mulher, Silvia Jane Crivella: “À beira do
abismo me cresceram asas”, dirigido e
interpretado por Maitê Proença,
quando esteve em cartaz no teatro do
Shopping Fashion Mall. Apesar de ser
mais afeito ao teatro do que ao cinema, o candidato diz não se esquecer
do filme “Os grandes debatedores”, no
qual o protagonista (e diretor do filme), Denzel Washington, treina, nos
anos 20 e 30, uma turma de uma instituição apenas para negros a participarem dos tradicionais debates entre
alunos que acontecem nos Estados
Unidos. Como viveu na África como
missionário da Igreja Universal durante o apartheid, regime de segregação racial adotado de 1948 a 1994 na
África do Sul, o senador diz ter se
emocionado com o filme “Invictus”,
dirigido por Clint Eastwood e baseado
na história de Nelson Mandela.
Pessoas próximas ao político falam
que o prato que mais lhe agrada é pizza,
talvez pela sua ascendência italiana. Não
à toa, perguntado sobre o restaurante
que mais gosta de frequentar, a resposta
foi a pizzaria Fiammetta da Barra, em
cujo site está dito tratar-se da primeira
pizzaria gourmet do Rio, que elevou a receita de pizza à categoria de alta gastronomia. Ex-ministro da Pesca durante o
governo Dilma, Crivella costuma perguntar a eleitores nas ruas se eles sabem
preparar alguma receita com peixe, e, a
partir dali, usa a conversa como gancho
para falar de seus feitos à frente do ministério e, normalmente, justificar por
que, mesmo sendo engenheiro civil, foi
administrar políticas de produção pesqueira. Coincidência ou não, outro restaurante que o candidato diz ter costume de frequentar com sua mulher é o
Rei do Bacalhau, também no bairro nobre da Zona Oeste do Rio.
Mesmo afeito às conversas de culinária com os seus eleitores, Crivella não sabe cozinhar. Diz que, em casa, a sua parte se restringe a tirar a mesa, e frisa:
“Sempre. Almoço e jantar”. l
NA WEB
http://glo.bo/1wwZiL2
Candidato do PRB explica em
vídeo suas principais propostas
“Quando podemos,
vamos ao teatro. O
último espetáculo
foi ótimo: ‘À beira
do abismo me
cresceram asas’,
com Maitê Proença,
no teatro do
Fashion Mall”
“Gosto muito das
músicas gospel
brasileira e
americana. Estão
cada vez mais
bonitas. Mas tenho
no celular muita
música popular
brasileira que amo.
Escuto de Noite
Ilustrada, Vicente
Celestino e Ari
Barroso, até os
meninos do
sertanejo
universitário”
“Nunca, jamais!
Nunca pintei o
cabelo. Meu pai
morreu com 64
anos, e tinha o
cabelo pretinho. É
de família”
Marcelo Crivella
Candidato ao governo do Rio pelo
PRB
Download

Marcelo Crivella