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Sexta-feira 3.10.2014
O GLOBO
Bispo incita fiéis à boca de urna
Líder da Universal pede voto para Crivella e diz que ‘principado do inferno’ comanda o Rio
RAFAELA MARINHO
LEANDRA LIMA
[email protected]
Inflamado, o bispo Júnior Reis conduziu o culto da noite de quarta-feira, a
quatro dias das eleições, na Catedral da
Igreja Universal do Reino de Deus
(Iurd) de Nova Iguaçu, com ataques ao
governador e candidato à reeleição
Luiz Fernando Pezão (PMDB) e, na
mesma medida, pedindo votos para o
candidato ao governo pelo PRB, Marcelo Crivella. O líder incitou também os
cerca de 300 fiéis presentes a realizarem boca de urna.
— O principado do inferno é que comanda o estado, por isso que o estado
está nessa situação que está. Como o
rapaz lá perguntou, cadê o... Como é
que chama? O Amarildo, Pezão? Aí, o
Pezão vai e ri. Então, você vê que eles ficam rindo porque eles são os principados do demônio, que atuam agora no
governo, no presidencialismo — prega
Júnior Reis, citando o debate promovido pela TV Globo com os principais
candidatos ao governo do estado, na
última terça-feira. Na ocasião, Pezão
deu uma risada logo após a pergunta
feita pelo candidato Tarcísio Motta
(PSOL) sobre o sumiço do ajudante de
pedreiro Amarildo Dias de Souza.
Com 800 mil habitantes, Nova Iguaçu
é o quarto maior colégio eleitoral do
Rio, é um dos mais fortes redutos eleitorais do senador e bispo licenciado da
Iurd. Durante sua pregação, Júnior Reis
conclamou os evangélicos para se reunirem domingo, às 9h30m, na catedral,
para o grupo fazer boca de urna em favor dos candidatos da igreja, para, somente depois, irem votar. Ele pergunta:
— Quem vota no Centro? Quem vota
em São João de Meriti e Belford Roxo?
Lá, vocês também podem fazer boca de
urna. Quarenta porcento da população
não sabem em quem votar. É nessa indecisão que a gente vai fazer a diferença. Amém, gente?
E prossegue:
— Meu Deus, nesse domingo, principalmente às 9h30m, nós vamos receber
a água consagrada e todos os bispos do
Brasil. Vamos concentrar todas as nossas forças para amarrar todos os demônios que queiram atuar. Então, você,
que está com a sua oferta de R$ 100, de
R$ 50 ou de R$ 10, venha trazer aqui e
lavar as suas mãos.
Em seguida, Júnior Reis afirma que
Pezão comprará votos deliberadamente, de sábado para domingo:
— É isso o que eles fazem na madrugada de sábado para domingo. Vocês
sabem do que eu estou falando, não sabem? Voa dinheiro pelo céu, porque
eles saem comprando os votos das pessoas. E o que não falta para o Pezão é
dinheiro. A máquina está na mão dele.
Então, eles vão sair distribuindo dinheiro de sábado para domingo. Uma
senhora da igreja me procurou com R$
50 na mão: “Bispo, o que que eu faço?
Eu voto no cara ou não?”. Eu falei: “Você
l 11
Procuradoria
vai apurar
recrutamento
para o domingo
Moradores da Zona Oeste
receberiam até R$ 150
para fazer boca de urna
IGOR MELLO
[email protected]
Pedido de votos. A fachada da Catedral da Igreja Universal de Nova Iguaçu, onde o bispo Júnior Reis comandou culto na quarta-feira
“Eles vão sair
distribuindo
dinheiro de sábado
para domingo. Uma
senhora da igreja
me procurou com
R$ 50 na mão:
‘Bispo, o que que
eu faço? Eu voto no
cara ou não?’. Eu
falei: ‘Você vai no
altar, pede perdão e
vota no nosso.
Senão, a senhora
está fazendo que
nem Barrabás’”
Bispo Júnior Reis
vai no altar, pede perdão e vota no nosso. Senão, a senhora está fazendo que
nem Barrabás”. Quem entendeu?
Responsável por uma das maiores catedrais da Universal no Rio, o pastor
Reis concluiu sua pregação com uma
oratória inflamada em favor dos candidatos evangélicos:
— Agora é reta final, e a igreja precisa
de vocês. Deus, nós não podemos perder! Amarra o principado chefe que atua
no governo e está rindo agora! As nossas
mãos, que são a mão de Deus, vão fazer a
diferença! Nós vamos fazer a maior boca
de urna do Rio e da nossa Igreja Universal. Por isso, meu Pai, abençoa o Crivella,
10! Abençoa a Rosângela, 1033, e o Benedito Alves, 15789. Amanhã o Crivella vai
estar aqui às 10h.
PARA MP, INDÍCIO DE ABUSO DE PODER
A candidata Rosângela Gomes (PRB),
citada por Júnior Reis, almeja uma cadeira na Câmara dos Deputados e é a
principal cabo eleitoral do Crivella na
Baixada Fluminense. Momentos antes
de começar o último culto daquela noite, duas mulheres distribuíam na calçada em frente à catedral um jornal com
prestação de contas de Rosângela e de
Crivella, além de diversos santinhos.
Segundo o procurador eleitoral auxiliar Sidney Madruga, da Procuradoria
Regional Eleitoral, houve diversas irregularidades na mesma noite. O magistrado afirma que, para o Ministério Público, o discurso do bispo em favor dos
candidatos e a panfletagem na calçada
da igreja são, juntos, um indício de abu-
so de poder político e econômico, que
pode resultar na cassação de um eventual mandato dos candidatos beneficiados. Madruga lembra também que
boca de urna é crime.
— A propaganda de boca de urna é crime desde 2006 e pode resultar em pena
de seis meses a um ano de prisão para
quem for condenado. No caso do bispo
Júnior Reis, pode-se dizer que houve uma
incitação ao crime eleitoral, previso no
artigo 286 do Código Penal. Isso não pode
acontecer. Precisamos ter acesso à gravação do culto — enfatiza Madruga.
De acordo com as normas para as eleições (Lei 9.504/97), é proibida a propaganda em bem de uso comum, como
templos, centro comerciais e cinema:
— Para mim, está bem caracterizado o
ilícito eleitoral da propaganda irregular,
que pode render multa de R$ 2 mil a R$ 8
mil ao infrator — explica o procurador.
Marcelo Crivella se defende, dizendo
que, durante seus 12 anos de vida pública, nunca pediu voto dentro da igreja e,
diz ainda, que não tomou conhecimento
do fato abordado pela reportagem. Rosângela Gomes afirma que desconhece a
atitude tomada pelo pastor citado, tampouco sua campanha tinha em sua agenda qualquer ação de propaganda dentro
da igreja. Pezão não quis comentar o caso. (Colaborou Rafaela Marinho) l
NA WEB
http://glo.bo/1vWvzYy
Ouça trechos do culto em que o
pastor convoca fiéis para boca
de urna
O procurador regional eleitoral,
Paulo Roberto Berenguer, afirmou ontem que abrirá investigação para apurar denúncias de
que cabos eleitorais recrutaram
dezenas de pessoas anteontem,
em Campo Grande, para realizar boca de urna em favor de
Anthony Garotinho (PR) e do
candidato a deputado estadual
Almir Rangel (PTdoB), conforme noticiado pela rádio CBN.
Segundo a reportagem, aliados
dos candidatos ofereceram de
R$ 100 a R$ 150 para que moradores fizessem boca de urna para os candidatos no domingo e
votassem neles.
— Se isso realmente ocorreu,
configura corrupção, além de
dar origem a uma ação civil
eleitoral, por captação ilícita de
sufrágio (compra de votos). Essa ação civil pode ter como consequência a cassação do mandato ou do diploma — disse Berenger, que prometeu abrir um
procedimento administrativo
que pode resultar ainda em um
inquérito policial.
DICA PARA DRIBLAR FISCALIZAÇÃO
De acordo com a denúncia,
cerca de 200 pessoas estiveram
no encontro. Na gravação, um
cabo eleitoral chega a ensinar
como escapar da fiscalização
do Tribunal Regional Eleitoral
(TRE-RJ) no dia da eleição. “Fica a 500 metros fora da boca de
urna”, diz o homem, que se
identificou como Iranir.
Segundo Berenger, o esquema de fiscalização, que envolverá um esforço conjunto do
Ministério Público Eleitoral
(MPE), do TRE-RJ e da Polícia
Militar, terá agentes atuando
na região e no restante do estado para coibir esse tipo de prática, que é considerada ilegal:
— Fiscais do TRE-RJ e policiais vão estar nas ruas, além de
promotores.
Por e-mail, via assessoria de
imprensa, Anthony Garotinho
afirmou que “desconhece o assunto (...) e que, em período de
campanha, é natural aparecerem
pessoas utilizando nomes de políticos de forma indevida”, lembrando que ninguém está autorizado a falar em seu nome. l
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