A IMPORTÂNCIA DO INTERVALO DE TEMPO NA SIMULAÇÃO DO FUNCIONAMENTO DE UM RESERVATÓRIO DE ÁGUA DE TELHADO Eduardo Cohim (1); Clériston Oliveira(2) (1) Prof. Mestre do Curso de Engenharia Ambiental da FTC e Pesquisador da Rede de Tecnologias Limpas UFBA; [email protected]. (2) Graduando em engenharia ambiental (Faculdade de Tecnologia e Ciências). Resumo O setor construtivo tem demonstrado elevada capacidade de resposta positiva, seja na redução de materiais, energia e resíduos, seja na adoção de tecnologias construtivas que proporcionem o consumo sustentável pós-construção. Dentre as diversas tecnologias, a captação de água de chuva deve ser considerada uma medida que contribui para a melhoria sustentabilidade. Impõe-se, portanto, a contínua investigação dos métodos de dimensionamento destes reservatórios, que resultem no volume adequado aos usos que se quer dar à água captada. Este trabalho analisou o modelo comportamental (MC) e seu algoritmo mais generalizado, aqui denominado comportamental genérico (CG), que descrevem a regra de produção antes (PAE) e depois (PDE) do enchimento do reservatório, considerando os fluxos de massa na operação do reservatório, utilizando dados tri-horários e diários de Salvador para vários cenários. Os resultados obtidos sugerem que a utilização de dados de precipitação inferiores a 24 horas somente seria necessária para pequenos volumes ou elevadas demandas e que a utilização do CG, utilizando dados de precipitação diária, além da confiança necessária, apresenta a vantagem de se manusear uma quantidade inferior de dados, que são, também, de fácil aquisição. Material e métodos Foram utilizados os dados pluviométricos de Salvador de uma série histórica de 9 anos (1999-2007), disponíveis no site do CPTEC. Esses dados são apresentados com os totais precipitados em intervalos de tres horas, cuja soma possibilitou a obtenção, também, de uma série com duração diária. Para a simulação utilizou-se o modelo comportamental. Esse modelo simula a operação do reservatório em um período de tempo, simulando fluxos de massas com algoritmos que descrevem a operação de um reservatório. Os dados de entrada são baseados em intervalos de tempo que podem ser de minutos, horas, dias ou meses [2] (ANNECCHINE, 2005). Neste modelo um algoritmo descreve a regra de produção antes do enchimento do reservatório (PAE) e o outro descreve a regra de produção depois do enchimento (PDE), conforme equações abaixo [3] (JENKISN, 1978 apud FEWKES, 1999): Produção antes do enchimento (PAE): Equação (1) Equação (2) Produção depois do enchimento (PDE): Equação (3) Equação (4) Introdução A água de chuva é uma importante fonte alternativa para abastecimento com um custo energético global inferior ao da água dos sistemas públicos, com resultados ambientais positivos diversos. Onde: Y, D, V, Q e S são, respectivamente: Produção de chuva no sistema, responsável por suprir a demanda (m3); Demanda (m3); Volume de chuva no reservatório de armazenamento (m3); Volume total de chuva coletado pelo sistema (m3); Volume do reservatório de armazenamento (m3). Dos itens que compõem um sistema de aproveitamento de água de telhado, o reservatório é, em geral, o item isolado responsável pelo custo final e definidor da eficiência de aproveitamento, já que o custo da calha de coleta é fixo independentemente do grau de aproveitamento pretendido. Latham (1983 apud FEWKES, 1999), utilizando o Modelo Comportamental, estabeleceu um outro modelo mais genérico para dimensionamento do reservatório, definindo um algoritmo mais generalizado para a operação do reservatório, conforme equações abaixo: Cumpre, portanto, investigar métodos de dimensionamento que resultem no volume adequado aos usos que se quer dar à água captada. Diversos autores [1](PHILIPPI et al., 2006, por exemplo) sugerem que o uso de intervalos de tempo menores na modelagem do funcionamento do reservatório leva a resultados mais confiáveis e econômicos. Este artigo pretende analisar o comportamento do método comportamental para dimensionamento de reservatórios, usando como intervalo de tempo para o balanço de massa três horas, comparando os resultados com os obtidos com a utilização do intervalo de um dia. Equação (5) Equação (6) Onde: θ é um parâmetro entre 0 e 1. Utilizando θ= 0 o algoritmo descreve a regra de operação de PDE e com θ= 1 o algoritmo descreve a regra de operação de PAE. 70 60 Percentual de atendimento (%) Nesse último modelo, aqui denominado de Comportamental Genérico (CG), utilizou-se o método de Monte Carlo para simular os valores de θ entre 0 e 1. Foram feitas, para a série de chuvas, seis grupos de simulação: tri-horários PAE, PDE e CG; diários PAE, PDE e CG. Em todos os casos, adotou-se demandas constantes, médias, ao longo do tempo. Para as simulações com dados diários, foram utilizadas demandas de 80, 100 e 120 L/pessoa.dia, verificando-se o percentual da demanda anual atendida com água de chuva. Para as simulações com dados tri-horários, essas demandas foram distribuídas ao longo do dia, em intervalos de 3 horas conforme percentuais mostrados no Quadro 1. Em todos os casos, adotou-se uma taxa de ocupação de 4 pessoas por residência. 50 PDE-H: Produção depois do enchimento (dados tri-horários) PDE-H: Produção antes do enchimento (dados tri-horários) 40 PDE-H: Produção depois do enchimento (dados diários) PDE-H: Produção antes do enchimento (dados diários) 30 CG (dados diários) 20 10 0 3a6 6 a 9 9 a 12 12 a 15 15 a 18 18 a 21 21 a 24 24 a 3 Percentual 3,4% 4,6% 19,0% 18,3% 13,6% 13,8% 15,9% 11,3% Na simulação, variou-se a área de captação de 40 a 140 m2 em intervalos de 20 m2. Os volumes simulados foram de 250 a 10.000 litros. Resultados e discussão Os resultados podem ser observados na Figura 1 e no Quadro 2. Observa-se que, com dados diários, o algoritmo PAE resulta na super-estimativa da eficiência de aproveitamento enquanto que o algoritmo PDE resulta em sub-estimativa. A diferença relativa entre os resultados obtidos pelos dois algoritmos cresce com o crescimento da demanda e com a área de captação e com a redução do volume do reservatório, podendo chegar a mais de 200%, ficando sempre abaixo de 10% para volumes superiores a 3.000 L. Comportamento similar é observado quando são utilizados intervalos de três horas para o balanço. Entretanto, nesse caso, as diferenças são menores, limitando-se, no caso extremo a 20%, o que é indicador de maior confiabilidade dos resultados. Para volumes de 500 l, a diferença entre os resultados obtidos com os dois algoritmos é inferior a 10% em todos os casos. Tais resultados sugerem a utilização de intervalos de balanço com duração inferior a 1 dia quando se quer simular o uso de reservatórios de pequeno volume ou grandes demandas para se obter resultados confiáveis. Isso representaria um ônus de tempo no manuseio de uma quantidade maior de dados. Observa-se na Figura 01 e no Quadro 02 que o Modelo Comportamental Genérico, utilizando dados diários (GD), produz resultados de eficiência de atendimento mais próximos dos resultados obtidos com dados tri-horários e algoritmos PAE e PDE. Quando se comparam os resultados obtidos pelo método CG com dados tri-horários ou diários, observam-se diferenças inferiores a 5% para qualquer situação das que foram simuladas. 4000 6000 Volume do reservatório (L) 8000 10000 12000 Figura 01 – Exemplo de comportamento para os diversos modelos Quadro 1 – Distribuição percentual de consumo Hora 2000 Quadro 2 – Alguns resultados dos modelos V (l) 250 500 1000 3000 5000 10000 V (l) 250 500 1000 3000 5000 10000 V (L) 250 500 1000 3000 5000 10000 60m2 - 80l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 28,0 31,0 29,7 17,0 36,0 28,9 36,0 37,0 36,7 28,0 41,0 36,2 44,0 45,0 44,3 39,0 46,0 43,9 56,0 56,0 56,4 54,0 57,0 55,8 61,0 61,0 61,3 60,0 61,0 60,8 67,0 67,0 67,3 66,0 67,0 66,3 100m2 - 80l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 32,0 36,0 34,6 19,0 43,0 34,4 42,0 45,0 43,9 32,0 49,0 43,3 53,0 54,0 54,0 48,0 57,0 53,6 70,0 70,0 69,8 68,0 70,0 69,3 76,0 76,0 76,0 74,0 75,0 75,0 84,0 84,0 84,2 83,0 83,0 83,2 140m2 - 80l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 35,0 39,0 37,4 20,0 47,0 37,6 46,0 49,0 47,7 35,0 54,0 47,6 58,0 59,0 58,8 52,0 62,0 58,8 76,0 76,0 75,9 73,0 76,0 75,3 83,0 83,0 83,3 81,0 83,0 82,0 90,0 91,0 90,6 89,0 89,0 89,2 60m2 - 100l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 24,0 27,0 25,5 14,0 32,0 24,7 30,0 32,0 31,3 22,0 35,0 30,7 37,0 38,0 37,4 32,0 39,0 37,1 48,0 48,0 47,8 46,0 48,0 47,3 52,0 52,0 52,1 51,0 52,0 51,6 56,0 56,0 56,1 55,0 55,0 55,2 100m2 - 100l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 27,0 32,0 30,1 15,0 39,0 29,9 37,0 39,0 38,2 26,0 44,0 37,5 46,0 48,0 47,1 40,0 50,0 46,6 61,0 62,0 61,7 59,0 62,0 61,2 68,0 68,0 68,0 66,0 68,0 67,2 75,0 75,0 75,4 74,0 75,0 74,5 140m2 - 100l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 30,0 34,0 32,8 16,0 43,0 33,2 40,0 43,0 42,1 28,0 49,0 41,7 51,0 53,0 52,3 44,0 56,0 51,9 69,0 69,0 69,1 66,0 70,0 68,8 76,0 76,0 75,9 74,0 76,0 75,2 84,0 84,0 84,0 82,0 83,0 82,9 60m2 - 120l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 20,0 24,0 22,4 11,0 28,0 21,7 26,0 28,0 27,4 19,0 31,0 26,6 32,0 33,0 32,6 28,0 35,0 32,2 41,0 41,0 41,3 39,0 42,0 40,9 45,0 45,0 44,8 43,0 45,0 44,2 48,0 48,0 47,6 47,0 47,0 46,9 100m2 - 120l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 24,0 28,0 26,8 13,0 36,0 26,6 32,0 35,0 33,8 22,0 40,0 33,1 41,0 42,0 41,6 34,0 45,0 41,2 54,0 55,0 54,8 52,0 55,0 54,2 61,0 61,0 60,7 59,0 61,0 60,1 68,0 68,0 67,6 66,0 67,0 66,8 140m2 - 120l/hab.dia TRI-HORÁRIOS DIÁRIOS PDE PAE CG PDE PAE CG 26,0 31,0 29,4 13,0 40,0 29,8 36,0 39,0 37,7 24,0 45,0 37,1 46,0 48,0 47,0 38,0 51,0 46,4 62,0 63,0 62,7 60,0 64,0 62,4 69,0 70,0 69,5 67,0 70,0 68,9 77,0 78,0 77,5 76,0 77,0 76,5 Conclusões O Modelo Comportamental Genérico é suficientemente confiável para a escolha do volume de reservatórios de armazenamento de água de chuva utilizando-se dados de precipitação diária. O mesmo não acontece com o Modelo Comportamental nos seus algoritmos PAE e PDE cujos resultados levam a valores super-estimados ou sub-estimados da eficiência de aproveitamento, respectivamente. O uso do modelo comportamental genérico, conforme proposto aqui, apresenta a vantagem de gerar resultados confiáveis com dados de fácil obtenção e requerer o manuseio de uma quantidade inferior de dados. Referências Bibliográficas [1] PHILIPPI, L. S. et al. Aproveitamento da Água de Chuva. In GONÇALVES, R. F. (Coord.). Uso racional de água em edificações. Rio de Janeiro: ABES, 2006. v.5. 352 p. (Projeto PROSAB, Edital 4). [2] ANNECCHINI, K. P. V. Aproveitamento da água da chuva para fins não potáveis na região metropolitana de Vitória (ES). Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental). Vitória: 2005. [3] FEWKES, A. Modelling the performance of rainwater collection systems: towards a generalized approach. Urban Water v.1, n. 4, p. 323-333,1999.