ISBN 85-87943-31-6
9 788587 943316
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(Anvisa) e Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS).
Coordenação editorial: Adriana Mitsue Ivama (OPAS/OMS).
Tradução: Gladys Quevedo Camargo.
Revisão técnica: Murilo Freitas Dias; Márcia Santos Nogueira (Anvisa); Adriana Mitsue Ivama (OPAS/OMS).
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Ficha catalográfica elaborada pelo Centro de Documentação
da Organização Pan-Americana de Saúde – Representação do Brasil.
Organização Mundial da Saúde. Departamento de Medicamentos Essenciais e
Outros Medicamentos.
A importância da Farmacovigilância / Organização Mundial da Saúde –
Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2005. (Monitorização da
segurança dos medicamentos).
48p.
Título original: The importance of phamacovigilance.
ISBN 85-87943-34-0
1. Monitorização de Medicamentos 2. Preparações Farmacêuticas – efeitos
adversos 3. Notificação de reações adversas a medicamentos 4. Vigilância do
produto, Pós-comercialização 5. Legislação, Medicamentos I. Título II. Série III.
Organização Pan-Americana da Saúde
NLM: QV 38
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ou tradução total ou parcial de suas publicações. Pedidos e dúvidas devem ser enviados
ao Escritório de Publicações da Organização Mundial da Saúde, em Genebra, na Suíça,
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© Organização Mundial da Saúde 2002
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da Saúde 2005
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Tiragem: 5.000 exemplares.
Impresso no Brasil.
SUMÁRIO
....................................................................................................................................................................
PREFÁCIO
3
Capítulo 1
INTRODUÇÃO
4
Capítulo 2
BREVE HISTÓRIA DO ENVOL
ENVOLVIMENTO
VIMENTO DA OMS
COM A MONITORIZAÇÃO DA SEGURANÇA
DE MEDICAMENTOS
5
Capítulo 3
PARCEIROS DA FARMACOVIGILÂNCIA
9
Capítulo 4
A FARMACOVIGILÂNCIA NA REGULAÇÃO
DE MEDICAMENTOS
15
Capítulo 5
A FARMACOVIGILÂNCIA NA PRÁTICA CLÍNICA
24
Capítulo 6
A FARMACOVIGILÂNCIA NA SAÚDE INTERNACIONAL
28
Capítulo 7
CONCLUSÃO E CONSIDERAÇÕES P
ARA O FUTURO
PARA
35
GLOSSÁRIO
40
REFERÊNCIAS
43
PREFÁCIO
....................................................................................................................................................................
A equipe de Quality Assurance and Safety: Medicines (Garantia da Qualidade
e Segurança) da OMS tem como objetivo preservar a segurança dos medicamentos,
certificando-se de que haja troca confiável e oportuna de informações sobre questões
relacionadas à segurança dos medicamentos, promovendo atividades relativas
à farmacovigilância em toda a Organização e encorajando a participação no Programa
de Monitorização Internacional de Medicamentos da OMS. Essa equipe está
produzindo uma série de publicações sobre Monitorização da Segurança de
Medicamentos. Este texto foi elaborado com a contribuição do Centro Colaborador
para Monitorização Internacional de Medicamentos da OMS e os centros nacionais
de farmacovigilância que participam do Programa de Monitorização Internacional
de Medicamentos da OMS. Seu esboço foi lido e discutido amplamente, em duas
consultas informais com especialistas internacionais em farmacovigilância.
O Departamento de Medicamentos Essenciais da OMS, em Genebra, promoveu essas
consultas. Contribuições foram feitas por:
Sra. N Arthur, Comissão Irlandesa de Medicamentos, Dublin, Irlanda;
Dr. A Bentsi-Enchill, Avaliação e Monitorização de Vacinas, OMS, Genebra;
Dr.ª M R Couper, Quality Assurance and Safety: Medicamentos, OMS, Genebra;
Dr. P Duclos, Avaliação e Monitorização de Vacinas, OMS, Genebra;
Dr. I R Edwards Centro Colaborador da OMS para Monitorização Internacional
de Medicamentos, Uppsala, Suécia;
Sr. T Fushimi, Ministério de Saúde, Trabalho e Bem-estar, Tóquio, Japão;
Dr. K Hartigan-Go, Cidade de Makati, Filipinas;
Dr. P Folb, Universidade de Cape Town, Cape Town, África do Sul;
Dr.ª N A Kshirsagar, Faculdade Médica GS e Hospital KEM, Mumbai, Índia;
Dr. J K Lazdins-Helds, Pesquisa de Produtos e Desenvolvimento, OMS, Genebra;
Dr. V Lepahkin, Quality Assurance and Safety: Medicamentos, OMS, Genebra;
Dr.ª Y Maruyama, Medicina Tradicional, OMS, Genebra;
Dr.ª S Pal, Quality Assurance and Safety: Medicamentos, OMS, Genebra;
Sr. S Olsson, Centro Colaborador da OMS para Monitorização Internacional
de Medicamentos, Uppsala, Suécia;
Dr. P Olumese, Redução da Malária, OMS, Genebra;
Dr. L Rägo, Quality Assurance and Safety: Medicamentos, OMS, Genebra;
Sr. B Rowsell, Ontario, Canadá;
Dr. J S Schou, Charlottenlund, Dinamarca;
Dr.ª R Soulaymani-Bencheikh, Instituto National de Higiene, Rabat, Marrocos;
Dr. K Tamiya, Quality Assurance and Safety: Medicamentos, OMS, Genebra.
Agradecimentos especiais à Dr.ª U Mehta, da Universidade de Cape Town, Cape Town,
na África do Sul, que elaborou o texto e trabalhou como relatora durante as discussões.
Agradeço também ao Sr. B Hugman por sua ajuda inestimável na edição deste documento.
Prefácio
3
CAPÍTULO 1
....................................................................................................................................................................
INTRODUÇÃO
....................................................................................................................................................................
Os objetivos deste documento são:
• apresentar as razões por que a farmacovigilância é importante;
• registrar seu crescimento e potencial como disciplina significativa nas ciências
médicas; e
• descrever seu impacto no bem-estar dos pacientes e na saúde pública.
Este documento realça a necessidade de análise crítica dos pontos positivos e negativos
dos sistemas atuais de farmacovigilância, a fim de aumentar seu impacto. Antecipa
o desenvolvimento necessário para enfrentar os desafios dos próximos dez anos.
Argumenta que abordagens distintas, adotadas por países diferentes, com respeito às suas
necessidades individuais devem ser apoiadas e incentivadas. O documento também realça
a importância de colaboração e comunicação nos âmbitos local, regional e internacional,
para assegurar que a farmacovigilância proporcione o máximo de benefícios possível.
A farmacovigilância e todas as questões de segurança de medicamentos são pertinentes
a todos os que têm sua vida afetada, de uma forma ou de outra, por intervenções médicas.
Este documento destina-se a diversos tipos de leitores:
profissionais responsáveis pelo desenvolvimento de políticas em todas as esferas
da saúde, particularmente os que se ocupam das políticas de medicamentos;
equipes e consultores das autoridades regulatórias nacionais de medicamentos;
profissionais da saúde, incluindo-se médicos, enfermeiros e farmacêuticos;
executivos e cientistas de indústrias farmacêuticas;
equipe profissional dos centros nacionais de farmacovigilância;
editores de periódicos médicos e científicos;
epidemiologistas;
economistas da saúde;
equipes profissionais dos centros de intoxicação e centros de informações
sobre medicamentos;
administradores da saúde;
grupos de consumidores e grupos de apoio a pacientes;
advogados da área da Saúde;
faculdades de ciências de saúde; e
leigo interessado.
....................................................................................................................................................................
ABREVIAÇÕES COMUNS UTILIZADAS NESTE DOCUMENTO
RAM
Reação Adversa a Medicamentos.
ICH
International Conference on Harmonization (Conferência Internacional sobre Harmonização).
UMC
the Uppsala Monitoring Centre (Centro Colaborador da OMS para Monitorização Internacional
de Medicamentos).
Organização Mundial da Saúde.
OMS
Outras abreviações e termos especializados encontram-se no Glossário.
4 Introdução
CAPÍTULO 2
....................................................................................................................................................................
BREVE HISTÓRIA DO ENVOLVIMENTO DA OMS COM A MONITORIZAÇÃO
DA SEGURANÇA DE MEDICAMENTOS
....................................................................................................................................................................
Este capítulo introduz os acontecimentos e as idéias que embasaram o surgimento
e o desenvolvimento inicial da farmacovigilância ao longo dos últimos trinta anos,
sob a égide da Organização Mundial da Saúde. Em 2002, mais de sessenta e cinco
países tinham seu próprio centro de farmacovigilância. A participação no Programa
Internacional de Monitorização de Medicamentos da OMS é coordenada pelo Centro
Colaborador da OMS para Monitorização Internacional de Medicamentos, conhecido
como the Uppsala Monitoring Centre (UMC).
Descreve-se também a evolução da farmacovigilância nos últimos anos e sua importância
crescente como ciência crítica da prática clínica efetiva e da ciência da saúde pública.
Os centros nacionais de farmacovigilância tornaram-se influência significativa sobre
as autoridades regulatórias de medicamento num período em que as preocupações com
segurança de medicamentos tornaram-se cada vez mais importantes na saúde pública
e prática clínica. A farmacovigilância está agora firmemente apoiada em princípios
científicos e é parte integrante da prática clínica efetiva. A disciplina precisa se desenvolver
ainda mais para atender às expectativas públicas e às demandas da saúde pública moderna.
Antecedentes
De acordo com o artigo 2.o da sua constituição, a Organização Mundial da Saúde
tem autorização de seus Estados-membros
para desenvolver, estabelecer e promover padrões internacionais com respeito
a produtos alimentícios, biológicos, farmacêuticos e congêneres.
Há também uma cláusula no artigo 21 da constituição da Assembléia Mundial da Saúde
sobre a adoção de regulamentos relacionados a
padrões de segurança, pureza e potência de produtos biológicos, farmacêuticos
e congêneres existentes no comércio internacional.
Especialmente depois da tragédia causada pela talidomida, em 1961, foram feitos
os primeiros esforços internacionais sistemáticos para abordar questões de segurança
de medicamentos. Naquela época, nasceram milhares de crianças com má-formação
congênita como resultado da exposição, ainda no útero, a um medicamento inseguro
indicado para uso em mulheres grávidas. A décima-sexta Assembléia Mundial
da Saúde (1963) adotou uma resolução (WHA 16.36)(1) que reafirmou a necessidade
de ações imediatas em relação à disseminação rápida de informações sobre reações
adversas a medicamentos e que conduziu, posteriormente, à criação do Projeto
de Pesquisa Piloto para a Monitorização Internacional de Medicamentos da OMS
em 1968. Seu propósito era desenvolver um sistema aplicável na esfera internacional,
para identificar previamente efeitos adversos a medicamentos desconhecidos
ou pouco estudados. Em seguida, a OMS produziu um relatório técnico com base
na reunião consultiva realizada em 1971(2).
Breve história do envolvimento da OMS com a monitorização da segurança de medicamentos 5
Desse começo, emergiram a prática e a ciência da farmacovigilância. Sistemas foram
desenvolvidos nos Estados-membros para a coleta e avaliação de casos individuais
de RAMs. A junção das notificações internacionais de RAMs numa base central de dados
desempenharia a importante função de contribuir para o trabalho das autoridades regulatórias
nacionais de medicamentos, para melhorar o perfil de segurança dos medicamentos e ajudar
a evitar outras tragédias(3).
Do piloto para a permanência
As principais realizações da reunião consultiva da OMS em 1971 foram:
• defender o estabelecimento de centros nacionais para monitorização de medicamentos;
• fornecer diretrizes; e
• identificar a contribuição que os centros nacionais podem oferecer ao sistema
internacional.
Diante disso, esperava-se que o tempo necessário para reconhecer que um medicamento
produz uma reação adversa poderia ser reduzido, e a importância da reação, mais
prontamente avaliada. Percebeu-se que
• os dados coletados pelos profissionais da saúde,
• a monitorização sistemática das populações,
• a revisão das estatísticas da saúde e dos dados sobre consumo ou uso
de medicamentos e
• a análise efetiva de dados das notificações
eram elementos necessários para que os objetivos da farmacovigilância fossem alcançados.
Atenção especial precisaria ser dada aos medicamentos novos. Centros de referência
especializados seriam requisitados para fornecer dados adicionais aos centros nacionais
e para investigar problemas específicos de segurança de medicamentos.
Desde o começo do Programa Internacional, em 1968, muito já foi realizado:
• o projeto piloto estendeu seu âmbito de abrangência, compondo o Programa
Internacional de Monitorização de Medicamentos da OMS, ora coordenado
pelo the Uppsala Monitoring Centre (UMC) em Uppsala, Suécia,
com supervisão de um comitê internacional;
• o Programa expandiu-se para incluir mais de sessenta países-membros;
• em muitos países, desenvolveram-se centros de notificação, grupos interessados,
faculdades de medicina e departamentos de farmacologia locais, dedicados
à questão, centros de informações sobre medicamentos e centros de intoxicação
e outras organizações não-governamentais;
• a idéia de que centros de farmacovigilância eram um luxo restrito ao mundo
desenvolvido foi substituída pela consciência de que um sistema confiável
de farmacovigilância é necessário à saúde pública e ao uso racional, seguro
de medicamentos e custo-efetivo em todos os países. Onde não existe nenhuma
infra-estrutura regulatória estabelecida, um sistema de monitorização de
medicamentos é uma forma efetiva e custo-eficiente de identificar e minimizar
os danos aos pacientes e evitar tragédias em potencial.
Interesse profissional
A instituição da Sociedade Internacional de Farmacoepidemiologia (ISPE), em 1984,
e da Sociedade Européia de Farmacovigilância (ESOP), mais tarde ISoP (Sociedade
Internacional de Farmacovigilância), em 1992, marcou formalmente a introdução
da farmacovigilância na pesquisa e no mundo acadêmico e sua integração crescente
com a prática clínica. Surgiram periódicos médicos específicos, e vários países
6 Breve história do envolvimento da OMS com a monitorização da segurança de medicamentos
implementaram sistemas ativos de vigilância para complementar os métodos
convencionais de monitorização de medicamentos. São exemplos de tais sistemas:
• a monitorização de eventos relacionados a prescrição (Prescription Event
Monitoring - PEM) na Nova Zelândia e no Reino Unido;
• os sistemas de conexão de registros entre diferentes bases de dados (record linkage
systems) nos Estados Unidos da América e Canadá;
• os estudos de caso-controle nos Estados Unidos da América.
As atividades da Farmacovigilância também evoluíram como atividades regulatórias. No início
dos anos 80, em colaboração intensa com a OMS, o Conselho para Organizações Internacionais
das Ciências Médicas (the Council for International Organizations of Medical Sciences –
CIOMS) lançou seu programa de desenvolvimento e uso de medicamentos.
O CIOMS promoveu um fórum destinado a profissionais responsáveis pelo desenvolvimento
de políticas, empresas farmacêuticas, representantes do Governo e integrantes do meio
acadêmico, com a finalidade de fazer recomendações sobre a comunicação de informações
sobre segurança entre reguladores e a indústria farmacêutica. A adoção de muitas
das recomendações do CIOMS pela Conferência Internacional sobre Harmonização
(International Conference on Harmonization – ICH), nos anos noventa, teve impacto
notável na regulação internacional de medicamentos.
Ampliando horizontes
Na última década, houve conscientização crescente de que o escopo da farmacovigilância
deveria ser estendido além dos limites rígidos da identificação de novos sinais relativos
a segurança. A globalização, o consumismo, a explosão do livre comércio, a comunicação
entre fronteiras e o uso crescente da Internet resultaram numa mudança do acesso a todos
os medicamentos e às informações sobre eles. Essas mudanças fizeram surgir novos tipos
de questões relativas à segurança, como, por exemplo:
• venda ilegal de medicamentos e drogas de abuso pela Internet;
• prática crescente de automedicação;
• práticas irracionais e potencialmente inseguras de doação de medicamentos;
• ampla fabricação e venda de medicamentos falsificados e de baixa qualidade;
• uso crescente de medicamentos tradicionais fora do âmbito da cultura de uso
tradicional;
• uso crescente de medicamentos tradicionais e plantas medicinais com outros
medicamentos com potencial para interações medicamentosas adversas.
Há necessidade de se reconsiderar a prática da farmacovigilância, observada a falta
de definição clara das fronteiras entre:
• alimentos;
• medicamentos (incluem-se medicamentos tradicionais, medicamentos
fitoterápicos e “produtos naturais”);
• produtos para a saúde; e
• cosméticos.
A crescente expectativa pública de segurança em relação a todos esses itens adiciona outra
dimensão de pressão para mudanças. Os centros nacionais de farmacovigilância não estão
em condições de tratar sozinhos todas essas questões de segurança, mas são especialmente
capazes de identificá-los e de se anteciparem ao impacto de tais problemas na segurança
dos pacientes. Por meio de fortes ligações com a autoridade regulatória nacional de
medicamentos, bem como com outros países, os centros nacionais estão em posição
de influenciar as decisões sobre medicamentos e outras políticas relacionadas à saúde.
Breve história do envolvimento da OMS com a monitorização da segurança de medicamentos 7
O propósito da farmacovigilância
A farmacovigilância consiste da ciência e das atividades relativas à detecção, avaliação,
compreensão e prevenção de efeitos adversos ou quaisquer outros possíveis problemas
relacionados a medicamentos. Recentemente, seu campo de atuação foi ampliado
para incluir(4):
• produtos fitoterápicos;
• medicamentos tradicionais e complementares;
• hemoterápicos;
• produtos biológicos;
• produtos para a saúde;
• vacinas.
Muitas outras questões também são de relevância para a ciência:
• medicamentos de baixa qualidade;
• erros de medicação;
• notificações de perda de eficácia;
• uso de medicamentos para indicações não aprovadas e para as quais não há base
científica adequada (off lable use);
• notificações de casos de intoxicação aguda e crônica;
• avaliação da mortalidade relacionada a medicamentos;
• abuso e uso indevido de medicamentos;
• interações medicamentosas adversas com substâncias químicas, outros
medicamentos e alimentos.
Os objetivos específicos de farmacovigilância são:
• melhorar o cuidado com o paciente e a segurança em relação ao uso
de medicamentos e a todas as intervenções médicas e paramédicas;
• melhorar a saúde pública e a segurança em relação ao uso de medicamentos;
• contribuir para a avaliação dos benefícios, danos, efetividade e riscos
dos medicamentos, incentivando sua utilização de forma segura, racional
e mais efetiva (inclui-se o uso custo-efetivo); e
• promover a compreensão, educação e capacitação clínica em farmacovigilância
e sua comunicação efetiva ao público (5) .
A farmacovigilância se desenvolveu e continuará a se desenvolver como resposta
a necessidades especiais, pautando-se nos pontos fortes específicos dos membros
do Programa da OMS e indo além deles. Tal influência ativa precisa ser encorajada
e nutrida; é uma fonte de vigor e originalidade que tem contribuído muito para a prática
e os padrões internacionais.
8 Breve história do envolvimento da OMS com a monitorização da segurança de medicamentos
CAPÍTULO 3
....................................................................................................................................................................
PARCEIROS DA FARMACOVIGILÂNCIA
....................................................................................................................................................................
Há relação complexa e vital entre uma ampla gama de parceiros na práticada
monitorização da segurança de medicamentos. Colaboração contínua e
comprometimento são vitais se se pretendem enfrentar os desafios futuros da
farmacovigilância e fazer com que a área continui a se desenvolver e desabroche.
Esses parceiros devem, em conjunto, antecipar-se às demandas continuamente
crescentes e às expectativas do público, dos administradores da saúde, profissionais
responsáveis pelo desenvolvimento de políticas, políticos e profissionais da saúde,
compreender essas demandas e responder a elas. Há poucas chances de que isso
ocorra na ausência de sistemas abrangentes e confiáveis que tornem tal colaboração
possível. Os parceiros envolvidos e as limitações presentes sob as quais funcionam
são descritos neste capítulo. As limitações incluem capacitação, recursos, apoio
político e, especialmente, infra-estrutura científica. Entender e trabalhar tais questões
prepararia o cenário para o desenvolvimento futuro da ciência e da prática da
farmacovigilância.
A equipe do The WHO Quality Assurance and Safety: Medicines (Garantia
de Qualidade e Segurança de Medicamentos da OMS)
A equipe do the WHO Quality Assurance and Safety: Medicines (Garantia de Qualidade
e Segurança de Medicamentos da OMS) é responsável por orientação e apoio aos países em
questões de segurança de medicamentos. A equipe é parte do Departamento de Medicamentos
Essenciais e Política de Medicamentos, dentro do conjunto Tecnologia da Saúde
e Medicamentos da OMS. O propósito do departamento é:
ajudar a salvar vidas e melhorar a saúde, diminuindo a enorme distância
entre o potencial que os medicamentos essenciais têm a oferecer
e a realidade de milhões de pessoas, particularmente os pobres
e desfavorecidos quanto a indisponibilidade, inacesibilidades, insegurança
ou uso indevido de medicamentos (6).
A OMS trabalha para cumprir essa missão, provendo orientação global sobre medicamentos
essenciais e trabalhando com os países para implementar políticas nacionais de medicamentos.
Tais políticas são elaboradas para assegurar:
• eqüidade de acesso aos medicamentos essenciais;
• qualidade e segurança de medicamentos;
• uso racional de medicamentos.
O objetivo explícito da equipe do Quality Assurance and Safety: Medicines é:
• preservar a qualidade, segurança e eficácia de todos os medicamentos, fortalecendo
e pondo em prática padrões regulatórios e padrões de garantia da qualidade.
Para que essa política atinja seus objetivos, o escopo da farmacovigilância precisa
ser expandido para envolver a segurança de todas as tecnologias relacionadas à saúde,
incluindo-se medicamentos, vacinas, hemoterápicos, medicamentos biotecnológicos,
medicamentos fitoterápicos e medicamentos tradicionais.
Parceiros da Farmacovigilância 9
the Uppsala Monitoring Centre
A função principal do the Uppsala Monitoring Centre é administrar a base de dados
internacional de notificações de RAM recebidas dos centros nacionais(7). Em 2002, essa
base de dados registrou quase três milhões de notificações de casos. A maioria dos centros
nacionais que contribuem tem fácil acesso eletrônico à base de dados. O UMC estabeleceu
notificações padronizadas para todos os centros nacionais e facilitou a comunicação
entre os países para promover a identificação rápida de sinais.
Um programa sofisticado, baseado em uma rede neural – Bayesian Confidence
Propagation Neural Network (BCPNN) – foi elaborado em 1998. Esse programa
automatiza parcialmente o sistema de detecção de sinal e fornece sinais de alerta
precocemente aos métodos anteriores(8).
A efetividade desse sistema depende:
• do tamanho da base de dados;
• da qualidade das notificações recebidas dos centros colaboradores;
• do momento (oportuno) em que tais notificações são feitas;
• cultura de notificação ativa e segura dentro dos países participantes.
Um painel de consultores internacionais, especialistas clínicos, determina a validade
e a importância clínica dos sinais gerados.
Nos últimos anos, o UMC ampliou seu papel como centro de comunicação e capacitação
e como sede de informações sobre segurança de medicamentos. Por meio de
• grupos de discussão (correio eletrônico e via postal),
• desenvolvimento de páginas eletrônicas da Internet,
• boletins informativos e
• reuniões anuais dos centros nacionais,
a equipe do UMC, em colaboração com a OMS, facilita e encoraja a colaboração
internacional, que foi considerada, em 1972, vital para o sucesso da farmacovigilância.
As terminologias desenvolvidas dentro do programa da OMS para codificar as reações
adversas e medicamentos foram adotadas amplamente pelos centros nacionais, indústrias
farmacêuticas e reguladores de medicamentos. Nos últimos anos, a introdução de nova
terminologia, conhecida como MedDRA (Medical Dictionary for Drug Regulatory
Activities – Dicionário Médico para Atividades Regulatórias de Medicamentos), substituiu
a Terminologia de Reações Adversas da OMS (WHO-ART) nos países desenvolvidos.
No entanto o WHO-ART permanece como o principal elemento da comunicação de reações
adversas na maioria dos países em desenvolvimento dentro do Programa Internacional.
Outro projeto do UMC é a criação de um sistema de monitorização de RAM para medicamentos
fitoterápicos e tradicionais. (A importância crescente de tal sistema é tratada no Capítulo 4,
que aborda Regulação de Medicamentos.)
Apesar de o UMC ter contribuído muito, melhorando as atividades, o apoio e o reconhecimento
dos centros nacionais em cada país, muito ainda poderia ser feito quanto a capacitação e estímulo
a especialização em âmbito nacional. Há necessidade de consultas e comunicação mais
bem qualificadas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento quando discussões
sobre harmonização internacional das questões da farmacovigilância estiverem em pauta.
A comunicação mais efetiva de informações está sendo promovida e encorajada pelo Programa
Internacional de Monitorização de Medicamentos da OMS e o UMC. Eles estão trabalhando
para desempenhar um papel mais pró-ativo no trabalho em conjunto com os países
na abordagem de questões específicas de segurança e estabelecendo um sistema
10 Parceiros da Farmacovigilância
que tornaria possível a avaliação das questões de segurança de importância
internacional por organismo supranacional de especialistas. Um exemplo
de tal sistema, como o aplicado à segurança das vacinas, é descrito no Capítulo 6
(página 30, nota de rodapé).
Centros Nacionais de Farmacovigilância
No momento, a vigilância pós-comercialização de medicamentos é coordenada,
principalmente, pelos centros nacionais de farmacovigilância. Em colaboração
com o UMC, os centros nacionais alcançaram muito quanto a:
• coleta e análise das notificações de casos de RAM;
• distinção de sinais advindos de rumores;
• decisões regulatórias na fase de fortalecimento de sinal;
• alerta aos prescritores, fabricantes e ao público sobre novos riscos de reações adversas.
O número de centros nacionais que participam do Programa Internacional de Monitorização
de Medicamentos da OMS aumentou de 10, em 1968, quando o Programa começou, para
67 em 2002. Os centros variam consideravelmente em tamanho, recursos, estrutura de apoio
e escopo das atividades. Sua atividade precípua é a coleta de notificações espontâneas
de suspeitas de RAMs.
Os centros nacionais tiveram papel significativo no aumento da conscientização pública quanto
à segurança dos medicamentos. Como resultado, a farmacovigilância, cada vez mais, é vista como
mais que uma atividade regulatória, tendo também papel importante a desempenhar na prática
clínica e no desenvolvimento de políticas de saúde pública. Esse desenvolvimento é, em parte,
atribuível ao fato de que muitos centros nacionais e regionais estão localizados dentro
de hospitais, faculdades de medicina ou centros de intoxicação e centros de informação
sobre medicamentos, em vez de estarem reservados à autoridade regulatória de medicamentos.
O escopo das atividades dos centros nacionais expandiu-se para incluir comunicação
de informações sobre benefícios, danos, efetividade e riscos aos profissionais da saúde,
aos pacientes e ao público. Os principais centros dos países desenvolvidos estabeleceram
programas de vigilância ativa, utilizando sistemas de conexão de registros entre
diferentes bases de dados (record linkage systems) e de monitorização de eventos
relacionados à prescrição (Prescription Event Monitoring – PEM) para coletar
informações epidemiológicas sobre reações adversas a medicamentos específicos.
Tais sistemas já foram implementados na Nova Zelândia, no Reino Unido, na Suécia
e nos Estados Unidos de América(9).
Na natureza do seu trabalho, os centros nacionais também já se familiarizaram com
as crises, reais ou criadas, de temor a medicamentos, as quais eles têm administrado
com sucesso variável. Alguns centros também estão envolvidos na capacitação, em
farmacovigilância e importância das notificações das RAMs, de estudantes universitários
e profissionais qualificados da saúde. A extensão de tais atividades varia entre os países.
A fonte e extensão dos recursos financeiros dos diferentes centros nacionais variam
significativamente. A maioria dos ministérios da saúde mantém seus centros nacionais
pelo menos em parte. O custo total de um sistema de farmacovigilância, comparado
com os gastos nacionais em medicamentos ou o custo das RAMs para a nação,
é certamente muito baixo(10).
Com a rápida divulgação das informações sobre medicamentos pelo mundo, há,
reconhecidamente, a necessidade de comunicação rápida e rotineira entre os centros
Parceiros da Farmacovigilância 11
nacionais e as autoridades regulatórias nacionais. Muitas autoridades regulatórias,
em diferentes regiões do mundo, desenvolveram laços, umas com as outras, para
discutir dados de segurança obtidos sobre medicamentos específicos e sobre
as decisões no campo regulatório tomadas em resposta a eles.
Políticas e diretrizes regulatórias são freqüentemente debatidas entre os centros nacionais.
A Conferência Internacional para Autoridades Regulatórias de Medicamentos (International
Conference for Drug Regulatory Authorities - ICDRA), as reuniões anuais dos centros nacionais
de farmacovigilância que participam do Programa Internacional de Monitorização
de Medicamentos da OMS e outras conferências semelhantes facilitam tais discussões.
O desenvolvimento da farmacoepidemiologia como disciplina não teria ocorrido sem
os esforços colaboradores da indústria farmacêutica e da universidade. A infra-estrutura
das bases de dados, registros e estudos publicados para apoiar as atividades de vigilância
pós-comercialização podem, em grande parte, ser atribuídas às necessidades da indústria
farmacêutica e das autoridades em medicamentos. Os conceitos de avaliação de risco
e gerenciamento de risco, emprestados do setor financeiro, foram modificados
para refletir as necessidades da assistência à saúde.
A indústria farmacêutica tem responsabilidade primordial pela segurança dos medicamentos.
Os fabricantes estão em posição privilegiada para monitorar a segurança dos medicamentos
no começo do desenvolvimento e ao longo da vida do medicamento. Muitas empresas
desenvolveram sistemas de monitorização inovadores e eficientes, que têm contribuído para
a identificação de novos sinais relativos a segurança. A indústria farmacêutica tem alcançado
grandes avanços tecnológicos no desenvolvimento de medicamentos, os quais melhoraram
a segurança desses novos produtos(11).
O número de profissionais na indústria farmacêutica envolvidos com a farmacovigilância
está crescendo. Isto se dá em resposta aos altos padrões regulatórios que foram
estabelecidos nas esferas nacional e internacional e à crescente exigência de
monitorização pós-comercialização do medicamento pelas autoridades regulatórias
nacionais de medicamentos. A comunicação e a troca de informações entre a indústria
e as autoridades regulatórias melhoraram como resultado da organização regional
e internacional de harmonização que emergiu em anos recentes. A educação profissional
continuada, a educação do paciente e o patrocínio da indústria às atividades relativas
à informação sobre medicamentos também contribuíram para o seu uso seguro.
Hospitais e universidades
Os esforços da farmacologia clínica e dos departamentos de farmácia ao redor do mundo
resultaram no desenvolvimento da farmacovigilância como disciplina clínica. Várias
instituições médicas desenvolveram sistemas de vigilância a reações adversas e erros
de medicação em suas clínicas, enfermarias e salas de emergência. Estudos caso-controle
e outros métodos farmacoepidemiológicos têm sido, cada vez mais, usados para estimar
os danos associados aos medicamentos durante sua comercialização.
A expansão do conhecimento científico sobre segurança de medicamentos pode ser atribuída
à maior conscientização e interesse acadêmico nesse campo. Centros universitários
de farmacologia e farmácia tem desempenhado papel importante por meio de ensino,
capacitação, pesquisa, desenvolvimento de políticas, investigações clínicas, comitês de ética
(conselhos institucionais de revisão) e dos serviços clínicos que proporcionam(12). Em muitas
instituições médicas, particularmente nos países desenvolvidos, a monitorização de RAMs
é reconhecida como uma atividade essencial de garantia da qualidade.
12 Parceiros da Farmacovigilância
É preciso que haja ainda maior integração da farmacovigilância com a prática clínica.
A segurança de medicamentos deveria constar dos currículos dos cursos de Medicina
e Farmácia. Atualmente o acesso a informações atualizadas, imparciais e clinicamente
relevantes sobre medicamentos é inadequado. A pesquisa e a capacitação em cursos
de pós-graduação nessa área permanecem negligenciadas por muitas escolas de Ciências
da Saúde. A crescente aliança entre a indústria, a universidade e as autoridades
regulatórias de medicamentos têm implicações para a farmacovigilância. Esses assuntos
são abordados nos Capítulos 4 e 5 (13).
Profissionais da saúde
O sucesso ou fracasso de qualquer sistema de notificação espontânea depende da participação
ativa dos notificadores. Embora esquemas limitados de notificações feitas por pacientes
tenham-se iniciado recentemente, os profissionais da saúde vêm sendo os principais provedores
de notificações de suspeita de casos de RAMs ao longo da história da farmacovigilância.
Originalmente, os médicos eram os únicos profissionais convidados a notificar,
na forma de julgamento, se uma doença ou medicamento causava certo sintoma
por sua habilidade de executar diagnóstico diferencial. Argumentou-se que o aceite
de notificações de RAMs somente de médicos asseguraria a obtenção de informações
de alta qualidade e minimizaria o número de notificações de associações irrelevantes,
aleatórias. Porém, estudos mostraram que diferentes categorias de profissionais da saúde
observam tipos diferentes de problemas relacionados a medicamentos (13, 14).
Somente com o estímulo das notificações de todos os profissionais envolvidos
no cuidado dos pacientes será possível identificar um amplo espectro de complicações
relacionadas ao tratamento medicamentoso. Se, por exemplo, só clínicos gerais
contribuírem para o conjunto de informações, os medicamentos usados principalmente
por especialistas não serão incluídos. Para se obter um quadro representativo
da realidade, todos os setores do sistema de assistência à saúde precisam ser envolvidos,
tais como hospitais públicos e privados, clínicos gerais, asilos, farmácias e clínicas
de medicina tradicional. Onde quer que os medicamentos estejam sendo usados deve
haver prontidão para observar e notificar eventos médicos indesejados e inesperados.
Pacientes
Só o paciente conhece os reais benefícios e danos dos medicamentos usados.
Observações e notificações feitas por profissional da saúde serão uma interpretação
da descrição originalmente feita pelo paciente, juntamente com mensurações
objetivas. Alguns acreditam fortemente que a participação do paciente na notificação
dos problemas relacionados a medicamentos aumentará a eficiência do sistema
de farmacovigilância e compensará algumas falhas do sistema, que recebe notificações
somente dos profissionais da saúde (15).
Normalmente, recomenda-se aos pacientes que suspeitem ter sido afetados
por uma RAM que notifiquem a seus médicos para que eles possam notificar ao centro
de farmacovigilância. Porém, uma vez que se estima que só 5% dos médicos participam
do sistema de farmacovigilância, esse processo não é eficiente para assegurar
que as preocupações do paciente estejam sendo registradas. Há estudos que indicam
que sistemas de registro de queixas dos pacientes poderiam identificar novos sinais
de segurança de medicamentos precocemente aos sistemas que contam somente
com a notificação do profissional (16).
Parceiros da Farmacovigilância 13
Outros parceiros
A contribuição de outros parceiros na segurança de medicamentos, incluindo-se
a mídia, grupos de defesa e advogados, precisa ser reconhecida. Esses parceiros da
farmacovigilância têm, direta ou indiretamente, facilitado o desenvolvimento de novas
e consistentes políticas de medicamentos e decisões, ao mesmo tempo em que realçam
as deficiências e fraquezas das políticas de segurança de medicamentos existentes.
Em muitos casos, esses grupos ou indivíduos têm a capacidade de se expressar e,
freqüentemente, mudar a opinião pública. Além disso, eles geralmente facilitam
o debate público ativo e a discussão de questões que têm relevância direta
para a sua saúde. Em muitos países, os responsáveis pela formulação de políticas
vinculam-se pró-ativamente a esses parceiros, quando questões importantes
de interesse público estão sendo tratadas. A cooperação e a manutenção de linhas
abertas de comunicação com organismos não-governamentais, incluindo-se a mídia
e os grupos de defesa dos consumidores, tendem a facilitar a criação de políticas
e legislação relativas à farmacovigilância, que desfrutarão de amplo apoio
e confiança públicos.
Muito precisa ser feito para melhorar as relações entre esses e outros parceiros
da farmacovigilância. A apresentação equivocada de dados e o sensacionalismo
das questões de segurança de medicamentos na mídia e nos tribunais provocaram
o surgimento de rumores infundados e preocupações despropositadas sobre
a segurança de medicamentos potencialmente valiosos.
Situações em que houve divergências quanto à perspectiva de questões específicas
de segurança entre esses e outros parceiros resultaram num impacto devastador
na confiança pública em relação aos organismos regulatórios e outras organizações.
É importante que todos os parceiros reconheçam a responsabilidade considerável, inerente
à condução de atividades relativas à farmacovigilância e à sua efetiva comunicação.
14 Parceiros da Farmacovigilância
CAPÍTULO 4
....................................................................................................................................................................
FARMACOVIGILÂNCIA NA REGULAÇÃO DE MEDICAMENTOS
......................................................................................................................................................................
Boas medidas regulatórias de medicamentos formam a base cultural em âmbito nacional,
para a segurança de medicamentos e para a confiança pública em medicamentos. As
questões com as quais as autoridades reguladoras de medicamentos têm de tratar, além
da aprovação de medicamentos novos, incluem:
•
•
pesquisas clínicas;
•
desenvolvimento de canais de comunicação entre todas as partes que têm interesse
em segurança de medicamentos, assegurando que eles estejam abertos e aptos a
funcionar de forma efetiva, particularmente em períodos de crise.
segurança de medicamentos complementares e tradicionais, vacinas
e medicamentos biológicos;
Os programas de farmacovigilância precisam de fortes ligações com os reguladores para
assegurar que as autoridades estejam bem informadas sobre questões de segurança na
prática cotidiana, que podem ser relevantes para as ações regulatórias futuras. Os
reguladores entendem que a farmacovigilância desempenha papel especializado e
fundamental na garantia contínua da segurança de medicamentos. Os programas de
farmacovigilância precisam ser adequadamente apoiados para alcançar seus objetivos.
Introdução
Um novo medicamento deve atender a três exigências antes de sua aprovação pela autoridade
regulatória nacional . Exige-se a demonstração de evidências suficientes de que o novo
medicamento seja
• de boa qualidade;
• eficaz; e
• seguro para o objetivo ou objetivos para os quais é proposto.
Enquanto os primeiros dois critérios devem ser atendidos antes que qualquer consideração
possa ser feita quanto à aprovação, a questão da segurança é menos exata. A segurança não
é absoluta e pode ser julgada somente em relação à eficácia, necessitando-se de análise
por parte dos reguladores para decidir quanto aos limites aceitáveis de segurança.
Há possibilidade de que eventos adversos raros, porém graves (como os que ocorrem
com a freqüência de, digamos, um em cinco mil), não sejam identificados
no desenvolvimento do medicamento anterior ao registro. Por exemplo, discrasia
sanguínea fatal, que ocorre em um de cada 5.000 pacientes tratados com um
medicamento novo, só é provável que seja identificada depois que 15.000 pacientes
tenham sido tratados e observados, contanto que a incidência prévia de tal reação
seja zero ou que haja uma associação causal clara com o medicamento.a
......................................................................................................................................................................
a
Essa “regra do três” arbitrária se baseia na experiência de que, para qualquer efeito adverso determinado,
aproximadamente o triplo do número de pacientes precisa ser tratado e observado para que o efeito
colateral possa manifestar-se e ser relacionado, de forma confiável, ao medicamento, assumindo-se
a incidência prévia zero do efeito em observação.
A Farmacovigilância na regulação de medicamentos 15
Regulação de pesquisas clínicas
Nos últimos anos, houve aumento significativo no número de pesquisas clínicas nos
países desenvolvidos e em desenvolvimento. Somente nos Estados Unidos da América,
as pesquisas clínicas quase dobraram entre 1990 e 1998(17). Com o seqüenciamento
do genoma humano, as pesquisas clínicas sobre terapias potenciais com novos
medicamentos provavelmente aumentarão.
Há também uma crescente aliança entre as universidades e as indústrias farmacêuticas
e de biotecnologia. Isto tem causado o surgimento de graves e difundidas questões
com respeito a assuntos éticos e científicos como(18-21):
• o potencial para conflitos de interesse;
• práticas não-éticas de recrutamento de pacientes;
• inadequação do consentimento escrito;
• falta de capacidade para assegurar monitorização contínua das pesquisas clínicas
e adesão aos princípios de práticas clínicas éticas e idôneas;
• baixo número de notificações e gerenciamento inadequado de eventos adversos.
Para reguladores de medicamentos, as tendências de mudança na conduta de pesquisas
clínicas durante os últimos anos apresentam desafios especiais e urgentes, particularmente
quanto ao asseguramento de que os direitos e a saúde dos pacientes e suas comunidades
sejam protegidos. Para a aprovação de pesquisas clínicas, os organismos regulatórios
analisam a segurança e eficácia dos novos produtos sob investigação. Eles também
têm de prestar atenção aos padrões gerais de assistência e segurança dos sujeitos
de pesquisa juntamente com os conselhos institucionais de revisão (Institutional
Review Boards - IRBs) apropriados.
Os medicamentos necessários a doenças como tuberculose, malária, HIV/AIDS e meningite
meningogócica do tipo A e aqueles que tenham perfil de efetividade/segurança
questionável ou incerto requerem vigilância cuidadosa quando introduzidos em grande
escala nas comunidades(22).
A complexidade crescente das pesquisas clínicas apresenta desafios adicionais aos reguladores(23).
A elaboração de estudos freqüentemente exige grandes grupos de participantes. Em muitos casos,
as pesquisas são conduzidas em vários locais de diversos países. Os comitês locais de ética
e reguladores de medicamentos nem sempre estão cientes das experiências de pacientes e
investigadores em outros locais internacionais. As pesquisas clínicas estão cada vez mais
limitadas às organizações de pesquisas clínicas e agências de recrutamento de pacientes, as quais
atuam como intermediárias entre os patrocinadores do estudo, os investigadores e os pacientes.
A responsabilidade em assegurar conduta apropriada de pesquisa clínica pode, em tais
circunstâncias, ser dividida entre as partes. Informações pedidas por comitês de ética
e reguladores podem ser de difícil obtenção num curto período de tempo. Os reguladores
e comitês de ética nem sempre têm capacidade para desempenhar efetivamente essas
funções. Isto pode acarretar graves implicações para a segurança dos pacientes.
A monitorização da segurança durante pesquisas clínicas é agora reconhecida como uma
das preocupações principais no desenvolvimento de um novo medicamento. Essa questão
está sendo tratada, atualmente, por um grupo de trabalho do CIOMS. Três tópicos
principais estão sendo abordados:
1) a coleta de informações de experiências adversas;
2) avaliação e monitorização de dados clínicos;
3) notificação e comunicação de dados clínicos.
16 A Farmacovigilância na regulação de medicamentos
Um sistema padronizado para notificação de questões de segurança surgidas durante
as pesquisas clínicas pode servir como ferramenta útil para as agências regulatórias e para
os comitês de ética (conselhos institucionais de revisão), desde que haja troca plena de
informações entre eles e os investigadores e patrocinadores. O envio rápido de notificações
de segurança por meio eletrônico em países do ICH tem facilitado o processo de notificação
até certo ponto. Porém a revisão rotineira de informações de segurança requer recursos
consideráveis, conhecimento, apoio e compromisso dos envolvidos.
Uma vez que as pesquisas sobre novos medicamentos estejam na fase de pós-comercialização
(Estudos da Fase IV), a segurança pode ser monitorada para se fazerem cumprir as condições
do registro, particularmente quando há questões não resolvidas. Isso pode conduzir a
melhorias e mudanças mais rápidas nas informações de registro ou, até mesmo, à retirada de
um novo medicamento do mercado(24). A aplicação rotineira dos princípios de boas práticas
clínicas que preserve a segurança do paciente e o cumprimento rigoroso das exigências
regulatórias prescritas melhoraria substancialmente os padrões das pesquisas clínicas (25) .
Monitorização da segurança pós-comercialização
É consenso, atualmente, que parte do processo de avaliação da segurança dos medicamentos
precisa ocorrer na fase pós-comercialização (aprovação), para não perder inovações importantes
numa rede regulatória indevidamente restritiva. A decisão de se e como isso deve ser feito
está nas mãos dos reguladores.
Quanto mais forte for o sistema nacional de farmacovigilância e de notificações de RAMs,
mais provável será que decisões regulatórias equilibradas sejam tomadas para uma pronta
liberação de novos medicamentos, com a promessa de avanços terapêuticos. A legislação
que governa o processo regulatório, na maioria dos países, permite o estabelecimento
de condições para registro, tal como a exigência de que deve haver farmacovigilância
minuciosa nos primeiros anos da liberação do medicamento para o mercado.
Porém a monitorização cuidadosa da segurança não está limitada aos novos
medicamentos ou aos avanços terapêuticos significativos. Ela tem papel importante
a desempenhar na introdução de medicamentos genéricos e na revisão do perfil
de segurança de medicamentos mais antigos já disponíveis, em que novas questões
de segurança podem ter surgido. Em um país em desenvolvimento, estas últimas
considerações são, provavelmente, mais importantes que os benefícios que uma entidade
terapêutica moderna possa trazer a um serviço de saúde já limitado.
Enquanto a notificação espontânea permanece como pedra fundamental da farmacovigilância no
ambiente regulatório e é indispensável para a identificação de sinais, a necessidade de uma
vigilância mais ativa também tem-se tornado cada vez mais clara. Sem informação sobre o uso
e a extensão do consumo, as notificações espontâneas não possibilitam determinar a freqüência
de uma RAM atribuível a um produto ou sua segurança em relação a um produto comparável(26).
Métodos epidemiológicos mais sistemáticos e consistentes que levem em conta as limitações da
notificação espontânea são necessários para que essas questões importantes da segurança sejam
trabalhadas. Eles precisam ser incorporados aos programas de vigilância pós-comercialização.
Há outros aspectos da segurança de medicamentos que têm sido bastante negligenciados
até então, que deveriam ser incluídos na monitorização dos efeitos latentes e de longo
prazo dos medicamentos. Incluem:
• identificação das interações do medicamento;
• medição do impacto ambiental dos medicamentos utilizados em grandes
populações;
A Farmacovigilância na regulação de medicamentos 17
•
•
•
avaliação da contribuição dos “componentes inativos” (excipientes) para o perfil
de segurança;
sistemas para comparar perfis de segurança de medicamentos da mesma classe
terapêutica;
vigilância dos efeitos adversos à saúde humana de resíduos de medicamentos
em animais, e.g., antibióticos e hormônios.
Uma questão mais difícil é se a farmacovigilância tem resultado na remoção imprópria
do mercado de medicamentos potencialmente úteis, como resultado de temores
infundados ou falsos sinais.
O relatório do CIOMS(27) sobre avaliação do benefício-risco de medicamentos após
registro tem contribuído para a abordagem mais sistemática que determine o mérito dos
medicamentos disponíveis. Sistemas de conexão de registros médicos e relacionados à
prescrição entre diferentes bases de dados operados sistematicamente (record linkage),
com dados sobre consumo ou uso de medicamentos, contribuiriam para maior precisão.
Essa é uma responsabilidade que vai além das rígidas atividades tradicionais de
referência dos centros nacionais de farmacovigilância.
Atividades promocionais
A segurança de medicamentos na fase de desenvolvimento é cada vez mais afetada
pelas limitações impostas pelos patrocinadores no plano de estudo, programa
de laboratório e no compartilhamento explícito de informações, enquanto a programação
da pesquisa é negociada com colaboradores clínicos(28). Há preocupação pública
crescente de que a colaboração íntima entre as universidades e a indústria farmacêutica
possa afetar adversamente a prática médica e as pesquisas clínicas(17, 29 & 30).
Preocupante para a segurança dos medicamentos é o desenvolvimento da propaganda
“direta ao consumidor”, feita por fabricantes farmacêuticos, outros vendedores
de medicamentos e outras partes com interesses específicos. Os gastos nessa atividade
dobraram nos E.U.A. nos últimos quatro anos(19). Apesar da possibilidade de tais
propagandas melhorarem a compreensão dos pacientes e de estarem de acordo
com a necessidade de melhorar o acesso às informações sobre os medicamentos, a ausência
de confiabilidade e precisão pode comprometer a assistência e segurança do paciente.
Mesmo nos lugares em que a propaganda direta de medicamentos para consumidores
é ilegal, a Internet possibilita a comunicação além das fronteiras. Isso pode fazer com
que as regulações nacionais sobre propagangas se tornem inefetivas. Atualmente
as páginas eletrônicas tornam possível comprar e vender medicamentos sem controle,
como os benzodiazepínicos. Todo esse desenvolvimento em comunicação tem impacto
na segurança dos medicamentos(31).
Todas essas questões sugerem a necessidade de monitorização mais completa da segurança
de medicamentos e o exame minucioso das propagandas. Recursos e conhecimento são
necessários para assegurar que materiais promocionais contenham informações precisas
e equilibradas, e que as práticas sejam éticas. A auto-regulação feita pela indústria é,
provavelmente, insuficiente em muitos países. A colaboração regional ou internacional
na implementação de um código regulatório de práticas para propagandas de medicamentos,
vigiado por um organismo consultivo imparcial, ajudaria nessa questão.(32) A apresentação
equivocada e a falta total de transparência podem igualmente ter implicações de segurança
importantes e potencialmente graves. Certos periódicos médicos internacionais
desenvolveram uma política uniforme, que lhes reserva o direito de se recusarem a publicar
18 A Farmacovigilância na regulação de medicamentos
estudos patrocinados por empresas de medicamentos, a menos que os investigadores
tenham garantia de independência científica. Um editorial conjunto, que delineia
o embasamento teórico dessa política, afirma que essa ação é uma resposta ao controle
cada vez mais rígido da indústria sobre as pesquisas, resultados e, em muitos casos, sobre
se e como os resultados são levados a público(33). Maior colaboração com os jornalistas
e a mídia precisa ser incentivada para assegurar a objetividade e confiabilidade
da publicação de informações médicas.
Harmonização internacional das exigências regulatórias de medicamentos
A harmonização de vários elementos das atividades regulatórias de medicamentos foi
empreendida na última década por várias organizações intergovernamentais nos âmbitos
regionais e inter-regionais. A força motriz desses esforços foi o aumento de comércio
global de medicamentos e o crescimento, em complexidade, de regulações técnicas
relacionadas à segurança e qualidade dos medicamentos.
Atividades de harmonização relacionadas à regulação de medicamentos estão sendo
estimuladas em todas as regiões da OMS. A iniciativa da ICH, que começou em 1990,
é uma empreitada inter-regional, que abrange dezessete países de renda elevada.
As diretrizes produzidas por esses grupos de especialistas, provenientes das autoridades
regulatórias e empresas farmacêuticas membros do ICH, representam as idéias mais recentes
e estão tendo impacto em todos os países(34, 35).
A OMS tem o papel de observadora em todas as atividades do ICH. Discussões estão em
desenvolvimento para considerar as implicações do processo do ICH e da globalização
de suas diretrizes. Isso inclui a descrição dos benefícios do processo e a explicação de
preocupações com a expansão de sua influência em países que não fazem parte do ICH.
Se o ICH passar para o campo da farmacovigilância, o grupo deverá ser encorajado
a aproveitar o trabalho já desenvolvido pela OMS nessa área. Todos os países da ICH
devem ser encorajados a participar ativamente do Programa Internacional de
Monitorização de Medicamentos da OMS.
Promovendo a comunicação na área de segurança de medicamentos
A sociedade tem grande preocupação com os perigos da vida moderna. Os medicamentos
estão entre os avanços tecnológicos que proporcionaram grandes benefícios e riscos
adicionais à sociedade. O conhecimento da percepção que o público tem desses riscos
é essencial se houver a intenção de gerenciá-los efetivamente. Até onde o seguro
é seguro o bastante? Que riscos são aceitáveis? Essas são duas questões críticas
que os provedores de medicamentos precisam considerar ao se comunicarem
com os pacientese com o público. Reconhecendo que há discrepância entre a visão
que os especialistas têm de risco e a percepção pública, há necessidade de se analisarem
e entenderem as diferenças de modo muito mais abrangente. Não é suficiente, para
os especialistas, estar satisfeito com as evidências de segurança. A indústria farmacêutica,
governos e provedores de assistência à saúde têm de construir a confiança pública
por meio de comunicações efetivas dos riscos. Isto só pode ser alcançado quando
a mentalidade pública for examinada e compreendida(36, 37).
Algumas autoridades regulatórias estão intensificando a transparência com que
conduzem seu trabalho. Porém, muitas autoridades continuam sendo restringidas por
cláusulas sigilosas reais, cuja intenção é proteger os direitos de propriedade intelectual
dos fabricantes farmacêuticos. O problema com o sigilo é que ele cria um ambiente de
desconfiança e mal-entendidos.
A Farmacovigilância na regulação de medicamentos 19
Espera-se, agora, dos reguladores, que eles tratem da regulação de medicamentos,
incluindo questões de segurança, com novo comprometimento com a abertura, com
a participação de pacientes e seus representantes no processo. Em relação a isso, progresso
considerável tem sido alcançado em muitos países, particularmente quanto à regulação
de medicamentos para HIV/AIDS e câncer.
Tem havido tendência de que as questões de segurança de medicamentos sejam tratadas
de forma que se protejam, em primeiro lugar, os interesses dos fabricantes farmacêuticos (5) .
Os centros nacionais de farmacovigilância, desde que tenham conhecimento e recursos
necessários, estão particularmente bem posicionados para coletar, avaliar e fazer
recomendações sobre segurança de medicamentos, livres de influências limitadoras.
Deve haver a possibilidade de se proteger o sigilo do paciente por meio da aplicação
de cuidadosos procedimentos operacionais padronizados.
O maior desafio para os Centros Nacionais e para as autoridades regulatórias de medicamentos
é promover e manter a comunicação efetiva e aberta de informações relativas aos benefícios,
danos, efetividade e riscos dos medicamentos, incluindo-se a incerteza de conhecimentos nessa
área, com o público e os profissionais da saúde. A Declaração de Erice, de 1998, sobre
Comunicação de Informações sobre Segurança de Medicamentos, solicitava esforço unificado
por parte de todos os interessados para estabelecer nova cultura de transparência, eqüidade
e responsabilidade na comunicação de informações sobre segurança de medicamentos. Muito
já foi realizado internacionalmente nesse sentido. Desde a Declaração de Erice, muitas
autoridades regulatórias ampliaram suas atividades de comunicação, desenvolveram páginas
eletrônicas e boletins informativos e se engajaram ativamente com a mídia para fornecer
informações atualizas sobre segurança ao público.
Os princípios de boa comunicação e até que ponto eles foram alcançados e são alcançáveis
são considerados no Capítulo 5.
Riscos e gerenciamento de crise
A importância de sistema eficiente para tratar dos riscos e das crises relacionadas à segurança
de medicamentos tornou-se cada vez mais evidente nos últimos anos. As questões de
segurança tendem a assumir importância internacional rapidamente. A velocidade com
que as informações se alastram no mundo moderno significa que as questões de segurança
de medicamentos já não se limitam aos países individualmente. Freqüentemente, a mídia
e o público geral são informados ao mesmo tempo, ou, até mesmo, antes que as autoridades
regulatórias nacionais. Quando as crises surgem, sejam elas reais ou imaginárias, questões
ou preocupações com a segurança local surgem no exterior, e se espera que as autoridades
regulatórias as enfrentem de forma aberta, eficiente, rápida e abrangente.
Muitas autoridades nacionais identificaram a necessidade de desenvolver um plano
organizacional para gerenciar riscos e para a comunicação e ação durante as crises(38).
Os próprios reguladores, freqüentemente, reagem sob pressão numa crise de segurança
de medicamentos inserida numa estrutura legislativa ou administrativa que seja inadequada
ou excessivamente restritiva. Deve haver procedimentos operacionais claros, porém flexíveis,
de forma que suas reações não sejam demoradas, desnecessariamente complicadas ou
indevidamente cautelosas (a precaução imprópria pode resultar na remoção de um produto
do mercado, até mesmo quando não houver nenhuma justificativa possível e uma reação mais
racional e menos drástica seja apropriada). Em tais circunstâncias, quanto maior a disparidade
nas informações sobre segurança entre a avaliação pré-registro e a real situação na prática,
maior a probabilidade de a reação regulatória ser inapropriada. Quando as crises surgirem,
a autoridade regulatória terá poderes para suspender o registro, impor condições especiais
20 A Farmacovigilância na regulação de medicamentos
ou restringir severamente o uso por determinados pacientes ou profissionais. A autoridade
pode exigir que os fabricantes mudem a informação do produto de uma maneira específica.
Essas decisões, normalmente, são comunicadas por alertas de medicamentos, cartas gerais
a médicos e farmacêuticos, declarações na imprensa, páginas eletrônicas, boletins informativos
e periódicos, publicações, dependendo do tipo e urgência da mensagem e a quem ela se dirige.
A Farmacovigilância e a autoridade regulatória nacional de medicamentos
As limitações dos dados de segurança de medicamentos na fase pré-comercialização são bem
conhecidas(39). Elas são agravadas pela crescente pressão exercida sobre os reguladores
de medicamentos por parte da indústria farmacêutica para abreviar o tempo de revisão para
a liberação de medicamentos novos. A aprovação do registro de um medicamento novo será,
provavelmente, seguida por intensa propaganda e exposição rápida de milhares ou até milhões
de pacientes a ela(40). As implicações do desenvolvimento gradual dessa situação para
a segurança dos medicamentos precisam ser analisadas.
A farmacovigilância se tornou componente essencial na regulação de medicamentos(41).
Futuramente, nos países em desenvolvimento, é provável que ela assuma a forma
convencional de notificação espontânea, embora esteja longe de ser um sistema perfeito.
Muitos países em desenvolvimento não têm sistemas básicos organizados para tal
propósito, e, até mesmo nos locais em que os sistemas de farmacovigilância existem,
é provável que falte apoio e participação ativa dos profissionais da saúde, reguladores
e administradores. A subnotificação de RAMs por parte dos profissionais da saúde
permanece como o problema principal em todos os países.
Para a autoridade nacional regulatória de medicamentos, a vigilância pós-comercialização,
normalmente, representa uma função distinta, separada do processo de avaliação e registro
de novos medicamentos. A vigilância pós-comercialização utiliza suas próprias fontes
especiais de informação, infra-estrutura e conhecimento, embora haja boas razões para
esses sistemas e recursos serem compartilhados com outras disciplinas.
Por exemplo, é necessário que, na própria conduta da farmacovigilância, haja acesso
à informação sobre a qual foi feita a determinação original de riscos e danos. Arquivos
pré-registro, incluindo-se as orientações e opiniões dos analistas originais dos dados,
são essenciais para decisões equilibradas e clinicamente pertinentes. Além da reação
aos eventos e dos relatos da mídia, a investigação ativa e exame clínico detalhado
são ferramentas essenciais desse trabalho.
Em muitos países, a farmacovigilância e os registros regulatórios de medicamentos
estão unidas por um comitê consultivo de RAMs, designado pela autoridade regulatória
nacional (42, 43), à qual se reporta diretamente. O comitê se compõe de profissionais
independentes, especialistas em medicina clínica, epidemiologia, pediatria, toxicologia
e farmacologia clínica, entre outros. Tal combinação inspira confiança aos profissionais da
saúde, e pode-se esperar que sejam feitas contribuições significativas para a saúde pública.
Medicamentos fitoterápicos e tradicionais
O uso de medicamentos fitoterápicos e tradicionais traz preocupações quanto à sua
segurança(44, 45). Há uma concepção equivocada, amplamente difundida, de que “natural”
significa “seguro”. Há a crença comum de que o uso prolongado de um medicamento,
baseado na tradição, assegura sua eficácia e segurança. Há exemplos de medicamentos
tradicionais e fitoterápicos que foram adulterados ou contaminados com medicamentos
A Farmacovigilância na regulação de medicamentos 21
alopáticos, substâncias químicas como corticosteróides, agentes antiinflamatórios
não-esteroidais e metais pesados. Muitos medicamentos tradicionais são fabricados
para uso global e vão além do cenário cultural e tradicional para o qual foram
originalmente destinados. A automedicação agrava os riscos aos pacientes. Quando
medicamentos tradicionais e fitoterápicos são usados juntamente com outros
medicamentos, há o potencial para graves interações adversas entre medicamentos.
Da mesma forma que outros produtos destinados a consumo humano (medicamentos,
suplementos dietéticos e alimentos), os medicamentos fitoterápicos deveriam ser incorporados
a um esquema regulatório. Esses produtos deveriam ser governados por padrões de segurança,
qualidade e eficácia, que são equivalentes aos exigidos para outros produtos farmacêuticos.
As dificuldades para que isto seja alcançado advém do surgimento de uma zona ambígua entre
alimentos e medicamentos, em que se enquadra um número crescente de produtos fitoterápicos.
O perfil regulatório dos produtos fitoterápicos difere significativamente de país para país.
Atualmente, menos de setenta países regulam os medicamentos fitoterápicos, e poucos países
têm sistemas organizados para a regulação de profissionais tradicionais da saúde.
Essas disparidades na regulação entre países têm graves implicações para o acesso
internacional e distribuição de tais produtos. Em um país, por exemplo, um produto
fitoterápico só pode ser obtido sob prescrição e em farmácia autorizada, enquanto que,
num outro país, pode ser obtido em loja de alimentos naturais, ou até mesmo, como
já se tornou comum, pelo correio ou pela Internet.
Por todas essas razões, a inclusão de medicamentos fitoterápicos e tradicionais em programas
nacionais de farmacovigilância tornou-se importante e inevitável. Os profissionais da saúde,
até mesmo os profissionais tradicionais, reguladores e fabricantes, e o público, compartilham
a responsabilidade pelo uso seguro e informado de tais produtos. A Organização Mundial da
Saúde produziu diretrizes para avaliação da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos
fitoterápicos (46) .
Novas abordagens sistemáticas para a monitorização da segurança de medicamentos derivados
de plantas estão sendo desenvolvidas(47). Vários centros nacionais de farmacovigilância estão,
agora, monitorando a segurança de medicamentos tradicionais. Para que isso seja bem sucedido,
a colaboração e o apoio de consumidores, profissionais tradicionais da saúde, fornecedores
de medicamentos tradicionais e fitoterápicos e outros especialistas são necessários. Mais atenção
precisa ser dada à pesquisa e à capacitação de profissionais da saúde e consumidores nessa área.
Vacinas e medicamentos biológicos
Por várias razões, as vacinas e os medicamentos biológicos requerem sistemas
modificados de monitorização da segurança. Eles são, freqüentemente, administrados
a crianças saudáveis. Isso se aplica, particularmente, às vacinas usadas em programas
nacionais de imunização. Em muitos países, aqueles expostos a uma determinada vacina
representam todo um grupo etário e, portanto, uma parte considerável da população
inteira. As expectativas das pessoas em relação à segurança são altas, e elas relutam em
admitir até mesmo um pequeno risco de eventos adversos. As preocupações relativas à
segurança das vacinas, reais ou imaginárias, podem ocasionar a perda da confiança em
todo o programa de vacinação. Isso pode resultar em baixa aceitação e no conseqüente
ressurgimento da morbidade e mortalidade causadas por doenças que podem ser
prevenidas por vacinas.
É essencial que haja vigilância adequada da segurança, apoiando-se os programas de
imunização. As habilidades e infra-estrutura para lidar com eventos adversos genuínos
22 A Farmacovigilância na regulação de medicamentos
são essenciais para prevenir ou administrar temores indevidos causados por falsos sinais
ou sem fundamento de pacientes e profissionais da saúde que podem afetar adversamente
a cobertura da imunização. Por exemplo, preocupações com a segurança da Pertussis
de célula inteira resultou em reduções dramáticas na cobertura de vacinas
e no ressurgimento da Pertussis em muitos países (48) .
As dificuldades em monitorar e tratar da segurança das vacinas são intensificadas
por problemas inerentes à determinação da ligação causal entre um evento adverso
após imunização e uma vacina (49, 50). Por exemplo, freqüentemente faltam informações
sobre suspensão do uso (dechallenge) e readministração (rechallenge), e vacinas são
aplicadas à maioria das pessoas de um grupo etário da população de um país, numa idade
em que doenças coincidentes são prováveis. Várias vacinas, certamente, serão administradas
concomitantemente. A possibilidade de erros programáticosb nunca deve ser negligenciada.
Porém, a responsabilidade da autoridade regulatória não está, de modo algum, limitada
à segurança de vacinas utilizadas em programas de imunização. Vários produtos biológicos
são usados em populações específicas de pacientes como medida preventiva ou curativa.
A regulação eficiente desses produtos é crucial para evitar danos potenciais ao público
como resultado de fabricação de baixa qualidade ou transporte e armazenamento
impróprios de vacinas e produtos biológicos importados.
Nos últimos anos, a segurança de produtos biológicos e derivados do sangue sofreu
exame apurado pelo público(51). Surgiram preocupações com a segurança
de medicamentos de origem animal em relação à doença variante Creutzfeldt-Jacob
(vCJD) e com a contaminação do sangue e derivados do sangue por organismos
infecciosos como HIV e hepatite B(52). A qualidade dos procedimentos de análise
e esterilização e a seleção apropriada de doadores está vinculada aos riscos
de contaminação. Tais questões de segurança, relacionadas ao uso de medicamentos
derivados de plasma sangüíneo, deveriam estar sob a égide do programa
de farmacovigilância. Para que isso ocorresse, os centros de farmacovigilância teriam
de considerar as questões especiais concernentes à segurança desses produtos.
Seria necessário conhecimento especializado sobre produtos biológicos, virologia
e microbiologia médica.
Novas vacinas para doenças pandêmicas - como HIV/AIDS e malária - estão em fase mais
avançada de desenvolvimento. Pesquisas clínicas em grandes populações de pacientes
estão sendo conduzidas para testar a eficácia e a segurança dessas vacinas. Desafios
éticos, legais e regulatórios específicos estão surgindo na conduta de tais pesquisas
clínicas, particularmente as implicações que as vacinas podem ter para a epidemiologia
da doença e os possíveis riscos diretos e indiretos de danos associados com a introdução
de vacinas em grandes comunidades.
Outros produtos que provavelmente serão regulados pela autoridade competente
são medicamentos veterinários, produtos de biotecnologia e medicamentos
geneticamente derivados ou modificados. Todos esses produtos podem representar
desafios incomuns para a monitorização da segurança. Eles exigirão conhecimentos
específicos, possivelmente de vários tipos, para que se possam avaliar as questões
de segurança decorrentes do seu uso. Tais conhecimentos podem não estar disponíveis
no âmbito da autoridade regulatória. Podem ser necessárias adequadas colaborações
e consultas com especialistas no país ou em outros países.
.....................................................................................................................................................................
b
Um erro programático é um incidente médico que foi causado por algum erro no transporte,
armazenamento, manuseio ou na administração de vacinas.
A Farmacovigilância na regulação de medicamentos 23
CAPÍTULO 5
....................................................................................................................................................................
A FARMACOVIGILÂNCIA NA PRÁTICA CLÍNICA
....................................................................................................................................................................
A monitorização da segurança de medicamentos de uso comum deveria ser parte
integrante da prática clínica. A forma com que os clínicos gerais são informados sobre
os princípios da farmacovigilância e o quanto tais profissionais atuam de acordo com
eles tem um grande impacto na qualidade da assistência médica. A educação e a
capacitação dos profissionais da saúde com respeito à segurança de medicamentos, a
troca de informações entre centros nacionais, a coordenação de tais trocas e a conexão
de experiências clínicas sobre segurança de medicamentos com pesquisas e políticas de
saúde, tudo serve para tornar efetiva a atenção ao paciente. Programas nacionais de
farmacovigilância estão perfeitamente posicionados para identificar pesquisas necessárias
à melhor compreensão e tratamento de doenças induzidas por medicamentos.
Introdução
A monitorização da segurança de medicamentos é elemento essencial para o uso
efetivo de medicamentos e para a assistência médica de alta qualidade. Ela tem
a capacidade de inspirar segurança e confiança de pacientes e profissionais da saúde
em relação aos medicamentos e contribui para elevar os padrões da prática médica.
A farmacovigilância é uma disciplina clínica por direito - ela contribui para a ética
de segurança e serve como indicador dos padrões de assistência clínica praticados
dentro de um país. Os profissionais da saúde estão em condições de fazer bom uso
das experiências positivas e negativas de tratamento de seus pacientes para contribuir
com a ciência médica e melhorar a compreensão das doenças e seus medicamentos.
Há três abordagens que podem servir para aumentar a conscientização e o interesse
pela segurança de medicamentos entre clínicos gerais e para tratar de questões de pesquisa.
Essas abordagens são descritas nas seções seguintes.
Educação, capacitação e acesso a informações confiáveis
As reações adversas tendem a ser vistas, incorretamente, como “efeitos colaterais” e, sendo
assim, como desvios das prioridades de pacientes e médicos. Aprender sobre a extensão e a
severidade das RAMs deveria começar cedo na capacitação profissional. A boa monitorização
da segurança encoraja os profissionais da saúde a assumir responsabilidade mais completa
pelos medicamentos que usam. Ela melhora a efetividade clínica e aumenta a confiança
com que eles e seus pacientes utilizam medicamentos.
Para se alcançar algo mais próximo da prática ideal, é necessário mais atenção na capacitação
dos profissionais da saúde no que se refere a diagnóstico, gerenciamento e prevenção
de RAMs. Nem todos os sinais são tão específicos, dramáticos e prontamente diagnosticados
como foram a focomelia e micromelia causadas pela talidomida. O reconhecimento de efeitos
adversos menos óbvios requer atenção, agilidade, diagnóstico preciso e compreensão
dos princípios da avaliação da causalidade(53).
É mais provável que os profissionais da saúde identifiquem e informem RAMs importantes
se eles tiverem confiança na sua habilidade para diagnosticar, gerenciar e prevenir tais reações.
Os centros nacionais de farmacovigilância e as instituições de capacitação desempenham
24 A Farmacovigilância na prática clínica
papel central nesse contexto, com o encorajamento da inclusão dos princípios e métodos
da farmacovigilância e do estudo de doenças iatrogênicas nos cursos de graduação
e pós-graduação em escolas de Medicina, Farmácia e Enfermagem.
Os currículos de farmacologia deveriam dar a mais alta prioridade ao estudo da segurança
de medicamentos. Isto conduziria a maior conscientização do equilíbrio entre os benefícios
e danos dos medicamentos. Uma abordagem integrada à tomada de decisões no âmbito
terapêutico poderia ser encorajada. O uso excessivo e irracional de medicamentos contribui
para as reações adversas(54, 55). O uso equivocado de medicamentos é, em grande parte,
causado pela baixa qualidade e inacessibilidade de informações sobre medicamentos
disponíveis aos profissionais da saúde. Esses problemas são agravados por:
• divulgação e propagandas imprecisas e agressivas;
• uso de medicamentos sem a informação devida por parte do paciente e sua demanda
por medicamentos mais recentes;
• falta de informações precisas sobre o medicamento.
Indicadores sobre uso impróprio de medicamentos podem ser obtidos a partir de notificações
espontâneas de RAMs. Exemplos de casos podem servir como ferramentas pedagógicas úteis
para intensificar o uso seguro de medicamentos. Em alguns países, um volume avassalador
de informações (em vez de comunicação efetiva de informação crítica) pode servir como
impedimento ao uso racional.
Erros de medicação e RAMs em pacientes hospitalizados e não-hospitalizados têm sido
bastante documentados e contribuem substancialmente para a morbidade e mortalidade(56, 59).
Eles também contribuem para o aumento do número de internações hospitalares, e se sabe
que ocorrem no ambiente da comunidade. Muitos são previsíveis e evitáveis(60).
Isso sugere a existência de oportunidade considerável para minimizar os riscos de RAMs
com o uso racional, monitorização e acompanhamento. A identificação precoce é importante,
particularmente em hospitais, em que os sistemas de identificação de RAMs e erros
de medicação pouparão vidas e dinheiro. Tais sistemas podem estar ligados a conselhos
institucionais, regionais ou nacionais de farmácia e terapêutica, de forma que as informações
possam ser utilizadas para educar os profissionais sobre uso seguro de medicamentos(61, 62).
A vigilância prospectiva, baseada em hospitais, reduz o risco e a severidade das RAMs(63).
Além disso, há a necessidade de se propiciarem aos profissionais da saúde as habilidades
necessárias para que eles possam avaliar criticamente as informações sobre medicamentos
e decidir como o perfil de segurança de um medicamento (por exemplo, desenvolvido
a partir dos dados de uma população) poderia ser aplicado a um paciente em particular.
Freqüentemente, as informações sobre o produto e os materiais promocionais fornecidos
pelo fabricante são as únicas informações disponíveis ao profissional. Fontes abrangentes
e baseadas em evidências podem não estar disponíveis. A disponibilidade de informações
equilibradas e seguras sobre medicamentos possivelmente melhora os padrões de uso e reduz
a freqüência das reações adversas. Informações que incluem experiências subjetivas
de pacientes com reações adversas seriam muito úteis a pacientes e prescritores de
medicamentos. As informações sobre a segurança do produto, do modo que são apresentadas
atualmente, quase sempre consistem em uma lista de reações adversas, talvez arroladas
em ordem de freqüência, sem real descrição de como elas poderiam afetar a qualidade
de vida. Além do mais, os prescritores devem ser livres para desenvolver seu trabalho, sem
estar sujeitos aos interesses específicos de fabricantes ou a qualquer conflito de interesses.
Também há outras oportunidades para integrar a farmacovigilância à prática clínica por
intermédio da capacitação e da educação. A participação da equipe do Centro Nacional
A Farmacovigilância na prática clínica
25
em programas continuados de educação, conferências, publicações científicas e grupos
de discussão por correio eletrônico contribuem para isso. O Centro Nacional pode servir
como base de ensino e como centro de capacitação para estudantes de medicina e farmácia,
estudantes de pós-graduação, médicos residentes e para a equipe de informações sobre
medicamentos. As pesquisas sobre RAMs e farmacoepidemiologia devem ser incentivadas
e promovidas dentro dos departamentos de Medicina Interna e Farmacologia.
Na capacitação de profissionais da saúde(64), é importante desenvolver competência na
avaliação e comunicação de informações sobre os benefícios, danos, efetividade e riscos
para o paciente. Dificuldades de comunicação entre os pacientes e profissionais da saúde
representam uma fonte potencial importante e evitável de problemas. Os elementos
seguintes apresentam a probabilidade de reduzir significativamente os riscos dos efeitos
adversos e sua severidade:
• anaminese farmacológica dos medicamentos usados pelo paciente;
• prescrição e dispensação racionais;
• orientação apropriada;
• fornecimento de informações claras e compreensíveis sobre medicamento.
A comunicação com os profissionais da saúde
Uma estratégia adicional para integrar a farmacovigilância à prática clínica é a criação
de linhas abertas de comunicação e colaboração mais amplas entre profissionais da saúde
e centros nacionais. Para que isto ocorra, o centro nacional ou os regionais precisam
ser preparados de forma que a comunicação em mão-dupla entre os profissionais da saúde
e a equipe profissional do centro seja fácil. Os centros de informações sobre medicamentos
e intoxicação são locais ideais para esse propósito, uma vez que muitas notificações de
intoxicação e dúvidas sobre informações de medicamento são, na realidade, RAMs(65). As
equipes desses centros estão em posição ideal para apoiar o trabalho da farmacovigilância.
Os centros de farmacovigilância devem propiciar acesso imediato ao conhecimento clínico
e compartilhar os recursos, até mesmo as bases de dados. Os materiais de comunicação
desenvolvidos pelos centros de informações sobre medicamentos e intoxicação, com inclusão
de boletins informativos e outras publicações, podem ser utilizados para disseminar alertas sobre
medicamentos e outras informações de segurança de medicamentos aos diversos profissionais.
Os departamentos acadêmicos e hospitais universitários têm-se revelado bem sucedidos
como centros nacionais e regionais de farmacovigilância por vários razões. Estas incluem:
(i) a farmacovigilância pode ser unida prontamente à farmacologia experimental
e clínica e à epidemiologia naquele ambiente;
(ii) a localização faz com que a revisão em grupo das notificações de reações adver
sas seja mais fácil e mais eficiente e provê acesso imediato a especialistas
hospitalares em departamentos universitários. A partir dessa base, uma banca
consultiva, composta por especialistas das áreas médica e científica, pode ser
formada para o Centro Nacional;
(iii) as informações obtidas de notificações espontâneas podem ser incorporadas
no ensino de graduação e pós-graduação das ciências da saúde;
(iv) os profissionais da saúde provavelmente se sentirão mais confiantes
em notificar problemas e dilemas terapêuticos a uma unidade acadêmica
com a qual estão familiarizados e que sabem que considerará suas notificações
de forma completa e hábil;
(v) dadas essas circunstâncias, estratégias efetivas de educação médica como
detalhamento(66), feedback de casos individuais, lembretes e solicitação de apoio
de especialistas reconhecidos são prontamente realizáveis (67) .
26 A Farmacovigilância na prática clínica
Os clínicos gerais que fazem notificações esperam acesso imediato ao centro
e a orientações especializadas e feedback. Eles deveriam ser encorajados a publicar
notificações de casos interessantes ou incomuns sem retardar a submissão de tais
notificações ao Centro Nacional. Boletins informativos, publicações e respostas por
carta ou telefone incentivam o diálogo com esses profissionais. A colaboração com
organismos de credenciamento profissional e associações, instituições acadêmicas,
organizações de educação continuada, outras instituições mantenedoras (por exemplo,
instituições de assistência, companhias de seguro-saúde) e outras organizações
não-governamentais somam à extensão e qualidade do trabalho do Centro Nacional.
Relacionando descobertas clínicas com pesquisa e política
O estudo cuidadoso de eventos adversos de medicamento pode identificar características
diagnósticas, síndromes ou mecanismos patogênicos. Além disso, informações clínicas,
patológicas e epidemiológicas, relativas a reações adversas, são necessárias à completa
compreensão da natureza de uma reação adversa e à identificação de pacientes em risco.
Embora a notificação espontânea seja o esteio da vigilância passiva, as informações
obtidas são inerentemente limitadas e provavelmente insuficientes para a tomada
de decisões clínicas e regulatórias. Programas ativos ou intensivos de vigilância(68), por
tratarem de graves questões de segurança, tiveram sucesso na identificação e quantificação
de questões de segurança de medicamentos, utilizando:
• redes de caso-controle;
• sistemas de monitorização intensiva baseados em hospitais;
• sistemas de conexão de registros entre diferentes bases de dados (record
linkage systems);
• estudos epidemiológicos.
As informações recebidas dos centros de farmacovigilância devem ser diretamente
incorporadas à política de medicamentos e à prática de consumo e uso de medicamentos.
As informações sobre segurança dos centros nacionais têm influência nos programas de
medicamentos essenciais, nas diretrizes padronizadas de tratamento e nos compêndios
médicos nacionais e institucionais.
A mensuração do impacto de tais informações no consumo e uso de medicamentos e na
qualidade da atenção ao paciente tem potencial considerável para pesquisas. É necessário
que as decisões sobre regulação de medicamentos estejam pautadas em informações sobre
segurança, que reflitam experiências nacionais bem como internacionais, e que isto seja
revisto de forma completa e hábil. Os padrões de consumo e uso de medicamentos também
precisam ser levados em conta.(53)
As RAMs têm o potencial de propiciar idéias sobre relação estrutura-atividade, fatores
farmacocinéticos, farmacodinâmicos e genéticos que afetam a ação dos medicamentos.
Elas podem sinalizar outras novas indicações. Por isso é importante que a conotação
negativa de uma RAM seja removida, e que sistemas sejam desenvolvidos para possibilitar
que as informações médicas, farmacêuticas e químicas sejam aplicadas construtivamente,
para melhor entendimento de como os medicamentos funcionam (69) .
A Farmacovigilância na prática clínica
27
CAPÍTULO 6
....................................................................................................................................................................
A FARMACOVIGILÂNCIA NA SAÚDE INTERNACIONAL
....................................................................................................................................................................
A farmacovigilância é uma atividade que tem significação internacional. A atual rede de
centros de farmacovigilância, coordenada pelo the Uppsala Monitoring Centre, seria
fortalecida por um sistema independente de revisão. Tal sistema consideraria questões
contenciosas e relevantes de segurança de medicamentos que têm potencial para afetar
adversamente a saúde pública além das fronteiras nacionais.
A Declaração de Érice fornece um arcabouço de valores e práticas para coleta, análise e
comunicação subseqüente de questões de segurança de medicamentos. Ao fazê-lo, ela
corrobora questões científicas e clínicas por um lado e, por outro, o direito que o público
tem de ser informado de forma aberta e completa. É um processo que requer o
comprometimento efetivo de todos os envolvidos – reguladores, profissionais da área de
desenvolvimento de políticas, profissionais da saúde, jornalistas e (nada menos que) as
empresas farmacêuticas. Minuciosa atenção é necessária na prática da farmacovigilância,
em assuntos relativos a confidencialidade do paciente.
Introdução
Até pouco tempo, a farmacovigilância estava limitada, principalmente, à identificação
de eventos adversos a medicamentos, que eram previamente desconhecidos
ou insuficientemente compreendidos. Seu propósito específico era contribuir para
a compreensão científica do perfil de segurança de um número bastante pequeno
de medicamentos e orientar as autoridades regulatórias nacionais. Nesse documento,
propõe-se que a farmacovigilância tenha potencial para ir além dos seus limites,
anteriormente muito restritos, e servir a uma prioridade maior dentro da saúde pública.
Como isso pode ocorrer é o assunto deste capítulo.
O impacto das RAMs na saúde pública
Apesar do progresso que ocorreu na farmacovigilância, o fardo das RAMs na saúde
pública pernamece significativo(60). Estudos farmacoeconômicos sobre os custos das
reações adversas sugerem que os governos gastam quantias consideráveis do orçamento
da saúde para cobrir os custos associados a elas(70). Na maioria dos países, a extensão
dessas despesas não foi avaliada.
A relação entre os padrões de consumo e uso de medicamentos e a freqüência de RAMs
é mal compreendida. Porém tem-se tornado cada vez mais claro que o perfil de segurança
dos medicamentos está diretamente ligado a fatores sócio-políticos, econômicos
e culturais, que, por sua vez, afetam o acesso a medicamentos, seus padrões de consumo
e uso e a percepção que o público tem deles(71, 72).
Utilização de medicamentos
Os padrões de consumo e uso de medicamentos são um determinante fundamental na segurança
de medicamentos. Por exemplo, o uso de medicamentos injetáveis é mais comum em países
em desenvolvimento(73). A via parenteral está, provavelmente, associada a alto risco de efeitos
adversos, quando as injeções são administradas por equipamentos inadequadamente esterilizados
ou funcionários insuficientemente capacitados. Estima-se que a prática insegura de injeções pode
28 A Farmacovigilância na saúde internacional
conduzir a 780.000 a 1,56 milhões de casos de hepatite B, 250.000 a 500.000 casos de hepatite C
e 50.000 a 100.000 casos de HIV na África anualmente (74) .
A automedicação e a falta de medidas regulatórias de controle da venda de medicamentos
aumentam ainda mais o risco de reações adversas. O número de medicamentos em cada
prescrição é mais alto em países em desenvolvimento(73). Fatores como ignorância, uso
concomitante de medicamentos tradicionais e a disponibilidade continuada de preparados
farmacêuticos impuros e irracionais contribuem ainda mais para o risco.
Uma legislação de medicamentos abrangente, uma política e um programa de medicamentos
essenciais que incluam a educação dos profissionais da saúde e pacientes quanto ao uso
racional de medicamentos são medidas que devem assegurar melhor assistência à saúde
em todos os países. Os programas de farmacovigilância podem aprender a partir das práticas
de mobilização social que foram introduzidas em programas de prática segura de injeções
durante a imunização(74).
A mobilização social inclui a abordagem tríplice de:
• elevar a conscientização pública;
• assegurar a defesa para responsáveis pela tomada de decisões; e
• sensibilizar os profissionais da saúde.
Isso encoraja a demanda, baseada no consumidor, por medicamentos seguros, vinda de
um público que está informado sobre o perfil de segurança dos medicamentos que usa.
A incorporação da farmacovigilância nessas atividades deve assegurar que tais medidas
sejam pertinentes ao local, e que elas promovam confiança pública no processo.
Uma parceria com os pacientes
A disponibilidade imediata de medicamentos mais seguros e mais efetivos, de boa qualidade,
inspira confiança e segurança entre os pacientes. A farmacovigilância é parte essencial
dos programas públicos que subjazem à disponibilidade confiável de bons medicamentos
e precisa ser compreendida, apoiada e promovida nos planos mais elevados.
Para que isso seja alcançado, é necessário que as informações sobre os programas de
segurança de medicamentos estejam facilmente disponíveis ao público, de forma que o
papel central do paciente no uso seguro e racional de medicamentos seja compreendido.
Nos últimos anos, o público tem, cada vez mais, influenciado a prescrição por parte dos
profissionais da saúde e os padrões de consumo e uso de medicamentos. Essa influência
e a maior conscientização por parte do público são, em parte, atribuíveis ao papel
da mídia e da Internet. Expectativas elevadas de todos os prestadores de serviços
e instituições médicas têm-se desenvolvido.
Nem sempre as informações disponíveis são confiáveis ou cientificamente válidas.
Propagandas de medicamentos feitas diretamente ao consumidor tornaram-se comuns
em muitos países. Com essas informações, os pacientes se sentem mais capazes de tomar
as próprias decisões terapêuticas, sem assistência de médico ou farmacêutico. O resultado
é a automedicação crescente, venda lícita e ilícita de medicamentos pela Internet
e excesso de prescrições por parte dos médicos devido à exigência dos pacientes.
Isso tem provocado aumentado considerável das prescrições(75,76).
Se as variações no modo como os medicamentos são usados alterarem seu perfil
de segurança, então há necessidade de se conduzirem pesquisas sobre como o processo
funciona. Também precisa ser determinado como o acesso às informações sobre
medicamentos pode influenciar a segurança dos pacientes, incluindo-se a percepção
A Farmacovigilância na saúde internacional 29
que os pacientes têm de segurança e os danos que eles estão preparados a aceitar
para diferentes medicamentos. Os aspectos sociais e culturais de uso farmacêutico
e as expectativas e preocupações dos pacientes precisam ser estudados profundamente.
Os resultados de tais pesquisas devem possibilitar melhor formulação de políticas,
com o objetivo de reduzir os riscos aos pacientes (77) .
Programas de saúde pública e a cobertura responsável da mídia, objetivando ao acesso crescente
a informações sobre medicamentos, possibilitaram aos pacientes, em muitos países, assumir maior
responsabilidade quanto à sua própria saúde e às decisões que tomam e maior participação dos
pacientes nas decisões. Isso se reflete na elaboração de documentos e estatutos sobre os direitos
dos pacientes(75) e no trabalho de grupos de defesa dos pacientes. Por exemplo, pacientes com
HIV/AIDS foram essenciais na conscientização internacional do impacto da doença, no
aprimoramento do acesso a terapias e na comunicação dos riscos associados. Em alguns lugares,
é muito bem-vinda a idéia de que as preocupações dos pacientes são agora reconhecidas como
algo que tem papel legítimo a desempenhar no centro do processo de decisão.
Porém, tais programas de saúde pública não precisam enfocar somente os pacientes, mas
poderiam ser usados para benefício do público geral. A construção dessa conscientização
e as iniciativas educacionais deveriam incluir as crianças e populações idosas e poderiam
ser fortemente facilitadas por parcerias com a mídia, instituições educacionais e outras
organizações governamentais e não-governamentais.
A Declaração de Érice
A Declaração de Érice (1997) representou progresso significativo à luz dessas mudanças(5).
A Declaração desafia todos os envolvidos:
• a administração da saúde pública;
• os profissionais da saúde;
• a indústria farmacêutica;
• o Governo;
• os reguladores de medicamentos;
• a mídia;
• os consumidores
a se esforçarem para obtenção dos mais altos padrões éticos, profissionais e científicos
na proteção e promoção do uso seguro de medicamentos. A Declaração compele os governos
e demais envolvidos a desenvolver políticas relativas aos benefícios, danos, efetividade e riscos
dos medicamentos para responder pelo que comunicam ao público e aos pacientes. Ela exige
honestidade na comunicação de informações referentes à segurança de medicamentos, mesmo
quando tais informações estejam incompletas e as investigações ainda estejam sendo conduzidas.
Ela requer, ainda, que os pacientes sejam informados abertamente dos fatos, suposições e
incertezas dos perfis de segurança dos medicamentos que eles usam.
Alguns esforços foram feitos subseqüentemente para se alcançarem as metas estabelecidas
na Érice. Muitas agências regulatórias têm páginas eletrônicas para manter o público informado
sobre suas decisões quanto a regulação e questões de segurança de medicamentos. Nas Filipinas
e na Austrália, vídeos e programas de televisão sobre RAMs são utilizados para incentivar
as notificações. Boletins informativos, noticiários e listas de distribuição eletrônica são cada
vez mais usados para comunicar, de forma global, informações sobre segurança. A OMS tem feito
esforços consideráveis para treinar reguladores de medicamentos e equipes nacionais de imunização
na transmissão de informações sobre efeitos adversos decorrentes da imunização para a mídiac.
..........................................................................................................................................................................
c
Detalhes sobre a capacitação em segurança de vacinas podem ser obtidos na seguinte página eletrônica:
http://www.who.int/vaccines-access/quality/gtn/aefi.htm
_____________________________________________________________________________________
30 A Farmacovigilância na saúde internacional
Porém, há vários desafios a serem enfrentados pelo programa de farmacovigilância
para alcançar as aspirações da Declaração de Érice. Eles incluem o seguinte:
(i) as dificuldades e riscos em comunicar mensagens contraditórias ou contenciosas
ao público. Por exemplo, durante o curso de um programa de imunização,
a comunicação de novas preocupações de segurança associadas a vacina(s)
ou a erros programáticos pode resultar numa queda dramática na cobertura vacinal.
No entanto, é provável que a abordagem confidencial, em tais circunstâncias, afete
a confiança pública e não respeite os direitos do público em participar da tomada
de decisões. Não só fatos e números precisam ser compartilhados com o público,
mas também se deve compartilhar abertamente o processo pelo qual os dados
são avaliados e a forma como são tomadas as decisões;
(ii) a comunicação entre as autoridades regulatórias nacionais de medicamentos
e os centros nacionais de farmacovigilância precisa ser melhorada, de maneira
que as decisões sobre regulação com possíveis implicações internacionais
sejam comunicadas rapidamente aos reguladores para evitar o alastramento
de preocupações ou pânico no público.
A indústria farmacêutica compartilha da responsabilidade pela comunicação adequada
com o público e os profissionais da saúde para assuntos de segurança de medicamentos.
Isso seria melhorado se os fabricantes comunicassem habitualmente informações novas
de segurança a reguladores e centros de farmacovigilância em todos os países em que
o medicamento em questão é comercializado.
Reguladores e fabricantes deveriam ter procedimentos acordados mutuamente para administrar
uma crise e para lidar com qualquer informação nova a respeito de segurança. O fabricante
e o regulador precisam ter uma visão comum estabelecida e estar em acordo sobre o que eles
consideram ser uma questão nova de segurança e o que constitui uma crise, de forma que
problemas de comunicação e falta de confiança sejam minimizados quando as crises surgirem.
Um elo crítico na cadeia do gerenciamento de uma crise de segurança de medicamentos
é o conhecimento, a competência e a abordagem dos jornalistas. Para um relato equilibrado,
eles dependem da compreensão de como os medicamentos funcionam, dos benefícios, dos
danos, da efetividade e dos riscos e da capacidade de distinguir entre risco relativo e absoluto.
Isso requer instruções específicas perspicazes e cuidadosas por parte do profissional
responsável pelas notificações no ministério de saúde ou na autoridade regulatória e habilidade
e compreensão por parte dos repórteres da saúde. Uma plataforma que incentivasse o debate
e a discussão entre reguladores, fabricantes, consumidores e a mídia contribuiria muito
para o alcance desses objetivos. Isto se aplica tanto às investigações em progresso, quanto
às conclusões que são obtidas.
O custo real, tempo, habilidades e recursos humanos necessários para comunicar assuntos
relativos à segurança de medicamentos pró-ativamente à mídia, ao público e aos profissionais
da saúde precisam ser cuidadosamente considerados. Tais recursos e planejamento precisam
receber prioridade maior do que no passado. Questões locais como cultura, alfabetização
e a condição sócio-econômica da população sob o risco podem influenciar o modo como
a mensagem é apresentada. A comunicação de informações deve assegurar que os direitos
do paciente a confidencialidade estejam protegidos.
Os custos dos problemas relacionados aos medicamentos para a sociedade
Ao considerar o custo de uma doença para a sociedade, as RAMs e o que é gasto para
identificá-las, preveni-las e gerenciá-las precisa ser incluído na análise. À medida que
os medicamentos se tornam itens mais proeminentes nos orçamentos da saúde e que
A Farmacovigilância na saúde internacional 31
se deposita confiança nos médicos para controlar os custos e reduzir suas práticas prescritivas,
a farmacovigilância tem importância crescente no tratamento de questões relativas aos custos
da saúde. O gerenciamento do HIV/AIDS em países em desenvolvimento ilustra essas questões.
Dentro do debate sobre preços de medicamentos e direitos de propriedade intelectual,
há também preocupações importantes com respeito ao uso difundido de medicamentos
potencialmente tóxicos em países em desenvolvimento, com poucos recursos. Regimes
de tratamento anti-retroviral comumente envolvem dois ou três agentes potencialmente
tóxicos. A monitorização da segurança e eficácia nessa situação envolve testes laboratoriais
regulares da função renal, hematologia, resistência viral por contagem da célula CD4 e carga
viral. Além disso, o tratamento dos efeitos adversos graves e não incomuns de tal tratamento –
que incluem distúrbios dermatológicos, hepáticos, hematológicos, metabólicos e neurológicos
– aumenta ainda mais o orçamento da saúde.
As atividades da farmacovigilância estão se expandindo ao redor do mundo. Isto
se reflete no número crescente de centros nacionais de farmacovigilância que foram
estabelecidos nos últimos anos. Ainda há muitos países em que nenhum sistema formal
de farmacovigilância foi organizado. Para assegurar que os centros existentes sejam
efetivos, seu impacto na saúde pública e nos custos da saúde deve ser mensurável,
e os benefícios, demonstráveis. Só então amplo apoio e sustentabilidade, a longo prazo,
dos centros de farmacovigilância serão assegurados.
Estimulando a certificação do produto
A certificação de um produto pode ser definida como:
• o processo demonstrável pelo qual uma empresa pode identificar e gerenciar sua
segurança, saúde e desempenho ambiental quando aplicado ao desenvolvimento,
fabricação, comercialização, uso e descarte de seus produtos (incluindo-se
a embalagem) d.
O princípio exige que as empresas farmacêuticas assumam responsabilidades
sobre o impacto de suas atividades “de ponta a ponta”, até mesmo nas considerações
relativas a influências-chave nos contextos da comunidade, dos reguladores
e dos consumidores. A principal preocupação subjacente dos fabricantes
é a responsabilidade legal pelo produto, comandada por uma legislação que requer
que os produtos tenham um perfil de segurança que atenda às exigências estatutárias
e às expectativas públicas. Ela objetiva encorajar os fabricantes a aspirar a um novo
plano de responsabilidade pela integridade dos seus produtos.
A responsabilidade por seus produtos estende-se a todos os fabricantes (mesmo aqueles
que produzem medicamentos genéricos) e fornecedores de matérias-primas. Mais
amplamente, a idéia de certificação é aplicável a todas as indústrias. Os princípios
da certificação na indústria farmacêutica incluem:
• cumprimento de políticas e legislação que assegurem a confiança dos pacientes
e do público em seus medicamentos;
• pesquisas cientificamente embasadas, éticas e seguras para os sujeitos de pesquisa;
• determinação do impacto do processo industrial na segurança de um medicamento,
para o paciente e o ambiente (isto inclui adesão aos princípios de conservação
e proteção do ambiente e de reciclagem de recursos);
• capacitação e educação de pessoal e pacientes para o uso otimisado de medicamentos.
..........................................................................................................................................................................
d
Modificado de: Gibson B, Product Stewardship in the Chemical Industry. ATSE Focus 1997 (98):
http://www.atse.org.au/index.php?sectionid=372
32 A Farmacovigilância na saúde internacional
•
•
•
•
armazenamento e transporte de medicamentos, de modo que se assegure a qualidade
no momento em que forem usados por pacientes;
descarte seguro de resíduos, matérias-primas e restos do produto e sua embalagem
(por exemplo, injeções, agentes quimioterapêuticos);
uso racional e apropriado de medicamentos por pacientes e profissionais
da saúde, exigência de informações bem embasadas sobre o medicamento,
boas informações sobre o produto (inserção de ficha técnica na embalagem),
com inclusão de informações sobre benefícios, danos, eficácia e risco, e como
o pacote total de informações pode ser comunicado de forma mais eficaz;
asseguramento de que as vendas e a comercialização observam os mais altos
padrões éticos que inspirarão confiança e confiabilidade públicas.
A adoção da idéia de certificação teria implicações importantes para as atividades
dos fabricantes farmacêuticos. Muitos já adotaram parcialmente os princípios, mas
ainda resta muito a ser feito antes que se possa dizer que a indústria concorda com
esses padrões e os cumpre totalmente. Os padrões não podem ser alcançados somente
pela indústria. Uma legislação bem fundamentada, uma autoridade regulatória nacional
de medicamentos competente e prescritores e consumidores informados são necessários
para que a idéia de certificação seja bem sucedida.
Protegendo a confidencialidade do paciente
Quando os pacientes recebem a prescrição de medicamentos para prevenção ou cura
de doenças, eles têm o direito, do qual deveriam ser informados, de decidir se aceitam
ou não o que lhes é oferecido. Eles também têm direito a confidencialidade. Os médicos
têm o dever de proteger tal direito e utilizar as informações sobre o tratamento somente
em relação ao cuidado daquele paciente, a menos que eles tenham, anteriormente,
permissão expressa, na forma de consentimento escrito.
Esses direitos e deveres não são absolutos. Em alguns casos prevalece a necessidade
de proteção à saúde pública sobre a proteção da confidencialidade individual do paciente.
As exigências da saúde pública, como a notificação obrigatória de certas doenças, podem
justificar a divulgação das informações do paciente. Mas mesmo quando tal divulgação
é pertinente devido às necessidades da saúde pública, permanece como responsabilidade
do profissional da saúde proteger a confidencialidade do paciente o máximo possível.
Na maioria dos países, legislações não exigem que as RAMs sejam notificadas, e,
nessas circunstâncias, os centros nacionais não têm a proteção legal disponível,
em que há sistemas obrigatórios de notificação. É essencial que os profissionais
da saúde obtenham o consentimento do paciente quando sua identidade for divulgada
num formulário de RAM ou em um estudo de vigilância de medicamentos.
Afinal, é do interesse do paciente que os profissionais da saúde tenham acesso a boas
informações de outros pacientes que foram expostos ao medicamento. Só por meio
do incentivo de notificações, as agências regulatórias e os fabricantes poderão ser levados
a assumir responsabilidade pela segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos
que eles aprovaram ou comercializaram para consumo público.
Os centros nacionais têm de manter elevados padrões de proteção dos dados quando
forem recebidas informações de pacientes que não tiverem dado seu consentimento
por escrito. Os pacientes também devem ser auxiliados a entender que a informação
que eles fornecem provavelmente contribuirá para a compreensão internacional
da segurança de um medicamento (78).
A Farmacovigilância na saúde internacional 33
Resposta internacional às questões relativas à segurança de medicamentos
Determinadas questões de segurança provavelmente têm impacto global com graves
conseqüências para a saúde pública. Quando isso acontece, há necessidade de coesa
resposta e avaliação intencional (79). Tal sistema precisa ser apoiado pelos países-membros.
Seus termos de referência devem estar bastante claros e acordados de forma geral.
É preciso ter acesso a todos os dados relativos ao produto em consideração, mesmo
das informações do produto que estejam protegidas por leis de sigilo e registros de casos
de pacientes, quando necessário.
A comercialização agressiva de medicamentos novos por empresas farmacêuticas
e a conseqüente rápida exposição a eles de um grande número de pacientes num curto
período de tempo corrobora a necessidade da elaboração de um sistema global
de avaliação de questões de segurança de medicamentos. A OMS apoiou a criação
de um comitê acessor independente de consultores, formada por amplo espectro
de disciplinas médicas que incluem farmacologistas clínicos, reguladores, cientistas
e epidemiologistas. A função desse comitê será aconselhar a OMS em assuntos
de segurança relativos a medicamentos, incluindo-se seu Centro Colaborador para
Monitorização Internacional de Medicamentos (the UMC), e, por intermédio dele,
orientar os estados-membros da OMS.
34 A Farmacovigilância na saúde internacional
CAPÍTULO 7
....................................................................................................................................................................
CONCLUSÃO E CONSIDERAÇÕES PARA O FUTURO
....................................................................................................................................................................
Para todos os medicamentos, há relação entre os benefícios e o potencial para danos.
Para minimizar os danos, é necessário que medicamentos de boa qualidade, segurança
e eficácia sejam usados racionalmente, e que as expectativas e preocupações do paciente
sejam levadas em conta quando decisões terapêuticas são tomadas. Alcançar isso é servir
à saúde pública e alimentar o senso de confiança em pacientes nos medicamentos que
utilizam, que se estenderia para confiança no serviço de saúde em geral.
A disciplina da farmacovigilância desenvolveu-se consideravelmente, desde o relatório
técnico da OMS, em 1972, e permanece como disciplina clínica e científica dinâmica.
Tem sido essencial para se enfrentarem os desafios da crescente gama e potência
dos medicamentos (vacinas inclusive), que carregam consigo um inevitável e, às vezes,
imprevisível potencial para dano.
Porém o risco de danos é menor quando os medicamentos são usados por profissionais
da saúde informados e por pacientes que, por si mesmos, entendem e compartilham
a responsabilidade por seus medicamentos. Quando efeitos adversos e toxicidade
aparecem – em particular quando previamente desconhecidos em associação com
o medicamento – é essencial que eles sejam analisados e comunicados efetivamente
a uma audiência que tenha o conhecimento para interpretar a informação. Esse
é o papel da farmacovigilância. Muito já foi alcançado.
Mas muito mais é necessário para a integração da disciplina com a prática clínica
e a políticas públicas.
O que se segue é um resumo de alguns dos graves desafios a serem enfrentados pelos programas
de farmacovigilância nos próximos dez anos, descrevendo as possíveis implicações
de tais tendências na evolução da ciência.
Os principais desafios são:
1) Globalização. A globalização da distribuição de medicamentos e a crescente
exposição de grandes populações a grandes volumes de medicamentos. Isso inclui
novas substâncias químicas utilizadas para alívio sintomático e modificação
de estilo de vida bem como medicamentos usados em países em desenvolvimento
para restringir a prevalência de doenças pandêmicas como HIV/AIDS, malária
e tuberculose. O uso de medicamentos em escala tão grande, num período curto
de tempo, exige um padrão melhor e mais eficiente de farmacovigilância
internacional.
2) Vendas e informações pela Internet. A Internet, além dos seus muitos
benefícios, facilitou a venda descontrolada de medicamentos (incluindo-se
os medicamentos fitoterápicos e tradicionais) além das fronteiras nacionais.
Informações sobre medicamentos de todas as formas e com graus de precisão
variados são distribuídas internacionalmente por esse meio. Tais informações
cobrem: medicamentos de venda sob prescrição médica, medicamentos
sem registro, substâncias de controle especial, medicamentos tradicionais
e fitoterápicos de segurança, eficácia e qualidade questionáveis. As decisões
no campo regulatório sobre segurança de medicamentos, tomadas nos países
Conclusão e considerações para o futuro 35
mais distantes, estão disponíveis ao público internacional, ao mesmo tempo em
que são disponibilizadas às autoridades nacionais regulatórias de medicamentos.
A comercialização agressiva pela Internet por parte dos fabricantes e distribuidores
resulta, em geral, num uso excessivo e, provavelmente, irracional dos
medicamentos. Todas essas mudanças no uso de medicamentos possivelmente
acarretam conseqüências importantes para a segurança e saúde pública.
3) Ampliação do interesse com a segurança. O escopo da farmacovigilância continua
a se ampliar à medida que a variedade de medicamentos cresce. Há a percepção
de que a segurança de medicamentos é maior do que a monitorização, identificação
e avaliação de RAMs que ocorrem sob condições claramente definidas e dentro de
uma gama de doses específicas. Na verdade, ela está intimamente ligada aos padrões
de consumo e uso de medicamentos na sociedade.
Problemas resultantes de:
• uso irracional de medicamentos;
• superdoses;
• polifarmácia e interações;
• uso crescente de medicamentos tradicionais e fitoterápicos com outros
medicamentos;
• venda ilegal de medicamentos e drogas de abuso pela Internet;
• práticas crescentes de automedicação;
• medicamentos de baixa qualidade;
• erros de medicação;
• perda de eficácia,
• estão todos dentro do domínio da farmacovigilância. Os sistemas atuais precisam
evoluir, a fim de lidar adequadamente com esse amplo espectro.
Um outro aspecto desse escopo ampliado é a falta de limites claros entre:
• produtos derivados do sangue;
• produtos biológicos;
• produtos para a saúde;
• cosméticos;
• aditivos de alimentos;
• vacinas.
4) Saúde pública versus crescimento econômico da indústria farmacêutica.
Pode haver problemas e, às vezes, interesses contraditórios no âmbito
da indústria farmacêutica, quando se trata das preocupações da saúde pública,
oriundas das questões de segurança de medicamentos. A indústria precisa
superar as falhas na monitorização da segurança durante as pesquisas clínicas(80)
e na vigilância pós-comercialização(81). Os fabricantes devem adotar uma
abordagem pró-ativa em relação à segurança dos medicamentos, em vez
de se manterem em táticas defensivas. Isso exige um elevado padrão de
certificação do produto e o reconhecimento da responsabilidade com a saúde
pública e ambiental.
5) Monitorização de determinados produtos. O setor de medicamentos genéricos
da indústria farmacêutica não reconheceu completamente sua responsabilidade
pela monitorização contínua da segurança de seus produtos em todo o mundo.
Há a convicção errônea de que medicamentoss genéricos são inerentemente
seguros, até mesmo quando interagirem com outros medicamentos. O setor
de genérico é o maior fornecedor dos medicamentos essenciais.
36 Conclusão e considerações para o futuro
6) Países emergentes e em desenvolvimento. Fora dos países da OECD (Organização
para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento – Organisation for Economic
Co-operation and Development), a indústria farmacêutica não tem-se comprometido
com as atividades da farmacovigilância, particularmente com as questões de segurança
de medicamentos, em que se envolvem medicamentos usados em comunidades
com sistemas sobrecarregados de assistência à saúde, padrões diferentes de consumo
e uso de medicamentos e condições co-mórbidas diferentes. Outros problemas
a serem tratados incluem:
• práticas potencialmente inseguras e irracionais de doação de medicamentos;
• ampla fabricação e venda de medicamentos falsificados e de baixa qualidade.
7) Atitudes e percepções quanto aos benefícios e danos. Essas tendências têm mudado
dramaticamente o modo como os medicamentos são usados pela sociedade. Profissionais
da saúde, pacientes e o público têm reagido de formas diferentes a essas tendências
de mudança, como foi descrito nos capítulos anteriores. Sua percepção dos benefícios
e danos e o grau aceitável de riscos para medicamentos diante desse desenvolvimento
rápido não foram considerados de modo significativo. Os danos causados por
medicamentos têm-se mostrado significativos. A morbidade e a mortalidade causadas
por doenças induzidas por medicamentos só recentemente estão sendo reconhecidas
como um item importante na agenda de trabalho de saúde pública em países
desenvolvidos e em desenvolvimento.
8) Resultados e impacto. Juntamente com a conscientização pública crescente sobre
a segurança de medicamentos, a atenção pública está cada vez mais focada no
desempenho das profissões, indústrias e reguladores ligados à saúde. A responsabilidade
crescente deve conduzir a mais pesquisas sobre a efetividade da farmacovigilância e
seu papel no aprimoramento da percepção pública. Um foco principal deve ser munir os
profissionais da saúde e os próprios pacientes de informações úteis, que melhorem
a terapia individual, ajudem o diagnóstico e o gerenciamento de doenças induzidas
por medicamentos e que conduzam, de forma geral, à redução das doenças iatrogênicas.
Os sistemas atuais de farmacovigilância precisam ser revistos e mais desenvolvidos ante
esses importantes desafios futuros. O que se segue resume algumas das áreas prioritárias
que precisam ser trabalhadas em esfera nacional ou internacional.
Identificação de RAMs
1) Aprimorar a identificação e preciso diagnóstico de RAMs por parte dos profissionais
da saúde e pacientes.
2) Incentivar a vigilância ativa de questões específicas da segurança de medicamentos,
por meio de métodos epidemiológicos como estudos de caso-controle, conexão
de registros entre diferentes bases de dados e estudos epidemiológicos.
3) Considerar atividades especiais e conhecimentos necessários para a identificação
de questões de segurança relacionadas a vacinas, produtos biológicos,
medicamentos veterinários, medicamentos fitoterápicos, produtos de
biotecnologia e medicamentos investigacionais.
4) Melhorar os sistemas de identificação de sinais, facilitando a rápida
disponibilização de dados de RAMs que podem ter relevância internacional.
5) Rever as definições dos termos usados no campo da farmacovigilância, incluindo
as definições de RAMs específicas, para assegurar a confiabilidade e compreensão
universal dos dados obtidos por meio dos sistemas de notificação de RAMs.
6) Desenvolver e implementar sistemas de identificação de RAMs que possam
beneficiar populações com acesso restrito à assistência à saúde.
Conclusão e considerações para o futuro 37
Avaliação de RAMs
7)
Maior desenvolvimento de sistemas automatizados de identificação de sinais
usados em programas de monitorização espontânea.
8) Aprimorar a avaliação de questões de segurança de medicamentos
que são de relevância internacional.
9) Incentivar colaboração, tanto em âmbito local como internacional,
que possibilite aos países avaliar e responder adequadamente às crises
de segurança de medicamentos.
10) Considerar métodos pelos quais as informações sobre os padrões locais
de consumo e uso de medicamentos possam ser integradas com informações
da farmacovigilância durante a avaliação de benefícios e danos em âmbito
nacional.
Prevenção
11) Melhorar o acesso a informações seguras e imparciais sobre medicamentos
em todos as esferas da assistência à saúde.
12) Melhorar o acesso a medicamentos mais seguros e efetivos para prevalentes
doenças negligenciadas em países em desenvolvimento.
13) Encorajar a conscientização sobre segurança e uso racional de medicamentos
entre os profissionais da saúde e o público.
14) Integrar as atividades da farmacovigilância com as políticas nacionais
de medicamentos e as atividades que elas originam (por exemplo, protocolos
clínicos padrão, listas de medicamentoss essenciais etc.).
15) Incorporar com mais vigor os princípios da farmacovigilância na prática clínica
e nos cursos de graduação em medicina.
16) Encorajar os princípios de certificação de produtos entre os vários parceiros
no âmbito da assistência à saúde.
17) Aprimorar a regulação e a farmacovigilância de medicamentos tradicionais
e fitoterápicos.
18) Desenvolver sistemas que avaliem o impacto de ações preventivas, executadas
em resposta aos problemas de segurança de medicamentos.
Comunicação
19) Melhorar a comunicação e a colaboração entre parceiros-chave
da farmacovigilância, tanto local quanto internacionalmente.
20) Encorajar os princípios de boas práticas de comunicação em farmacovigilância
e a regulação de medicamentos e produzir, em conjunto, recursos
e conhecimentos para tal. Soluções diferentes serão, provavelmente,
desenvolvidas em países e regiões diferentes, e a experiência deve ser
compartilhada.
21) Desenvolver melhor compreensão dos pacientes, suas expectativas sobre os
medicamentos e sua percepção de risco associado ao uso de medicamentos, para
facilitar os programas que informarão melhor o público a respeito dos benefícios
e danos associados a medicamentos.
22) Desenvolver relações contínuas e ativas com a mídia para facilitar a comunicação
efetiva e precisa de informações sobre medicamentos ao público.
23) Encorajar a harmonização de atividades regulatórias e de farmacovigilância
de medicamentos por meio da incorporação mais ampla da comunidade
internacional no desenvolvimento de políticas de harmonização.
38 Conclusão e considerações para o futuro
Resultados e impacto
24) Conduzir pesquisas contínuas para avaliar a relação custo-efetividade dos
sistemas contemporâneos de farmacovigilância na contribuição com o bem-estar
do paciente e saúde pública.
25) Considerar a sensibilidade e especificidade da atual identificação de sinais
e métodos de avaliação e até que ponto os sistemas contemporâneos
de farmacovigilância têm tido êxito na identificação e prevenção de tragédias
potenciais, ao mesmo tempo em que evitam a retirada prematura de medicamentos
seguros e úteis do mercado.
Usar medicamentos e prescrevê-los está entre as atividades mais comuns das pessoas
que não se sentem bem e aqueles que se importam com elas. Faz sentido que esses
medicamentos sejam mantidos sob vigilância em padrões de exigência iguais aos
medicamentos em desenvolvimento e sob avaliação, e que os hábitos de prescrição,
extensão do uso racional e seu custo-efetivo sejam revistos.
A responsabilidade pela abordagem holística da segurança de medicamentos adotada
na ciência e prática da farmacovigilância, como reflete esta publicação, tem de ser
compartilhada se se quiser alcançar a prática ideal. Os cientistas, clínicos gerais,
empresas farmacêuticas, pesquisadores de medicamentos, reguladores, responsáveis
por políticas públicas, pacientes e o público em geral, todos têm seus próprios papéis
complementares a desempenhar no alcance do que se pretenda. Entre as questões
importantes, estão a informação, o compartilhamento da informação e a comunicação
mais ampla. Precisamos de desenvolvimento dinâmico e continuado da prática
profissional moderna. Devemos reconhecer que as soluções para os desafios virão dos
indivíduos e instituições ao redor do mundo, inspirados e comprometidos, com visão
aprimorada da saúde pública e da segurança do paciente. Mais importante nessa
empreitada é a necessidade de novo espírito de partilha de informações e inteligência
em sintonia com a visão e as aspirações da Declaração de Érice.
Conclusão e considerações para o futuro 39
GLOSSÁRIO
......................................................................................................................................................................
Alerta de Medicamento: a ação de notificar, a uma audiência maior que a dos detentores
iniciais da informação, uma suspeita de associação entre um medicamento e uma reação
adversa. Observe que o termo é usado em contextos diferentes. Por exemplo, um alerta
pode ser de um fabricante para um regulador ou de um regulador para o público.
Avaliação do risco: é o processo complexo de determinar o significado ou valor dos perigos
identificados e estimar os riscos para aqueles interessados ou afetados pelo processo.
Bayesian confidence propagation neural network (BCPNN): sistema computacional
que imita a rede de neurônios cerebrais (rede neural) e usa uma lógica que determina a
desproporcionalidade das relações entre quaisquer dos itens da base de dados, incluindo-se
itens complexos, comparados com uma linha de base de itens remanecentes ou
selecionados. As mudanças na desproporcionalidade podem ser monitoradas à medida
que novos dados sejam acrescentados ou padrões diferentes de itens sejam selecionados.
Benefício: ganho estimado para um indivíduo ou uma população. Ver também:
Efetividade/risco; benefício/dano.
Benefício/dano: benefício e dano são as experiências qualitativas subjetivas, positivas
e negativas, dos pacientes. Elas, normalmente, não são avaliadas, exceto nos estudos
modernos de qualidade de vida ou em notificações de casos. Pode-se também considerar
benefício e dano no plano da sociedade, porém devem-se incluir efetividade e risco
relativos, o impacto de todos os resultados na sociedade e a análise de custo.
Centro Nacional de Farmacovigilância: centro único, reconhecido pelo Governo
(ou sistema integrado) de um país, com conhecimento clínico e científico para coletar,
ordenar, analisar e orientar toda a informação relacionada à segurança de medicamentos.
Certificação de produto: processo demonstrável, pelo qual uma empresa pode identificar
e gerenciar sua segurança, saúde e desempenho ambiental no que se aplica ao
desenvolvimento, fabricação, comercialização, uso e descarte de seus produtos
(embalagem inclusive).
Comitê de ética: organismo independente (conselho de revisão ou comitê institucional,
regional ou nacional), composto de profissionais da saúde e membros de outras áreas,
cujas responsabilidades são proteger a segurança, integridade e direitos humanos
dos sujeitos participantes numa determinada pesquisa clínica e cuidar das questões
éticas gerais da pesquisa, promovendo, assim, a confiança pública. Os comitês de ética
devem ser constituídos e funcionar de forma que suas tarefas possam ser executadas
livres de parcialidades e de qualquer influência daqueles que conduzem a pesquisa.
Conexão de registros entre diferentes bases de dados (record linkage): método
de agrupar informações contidas em dois ou mais registros. Por exemplo, em diferentes
grupos de protuários médicos e registros oficiais, como certidões de nascimento e óbito.
Isso possibilita relacionar eventos de saúde significativos que estejam distantes
um do outro no tempo e no espaço.
Conferência International sobre Harmonização (ICH): a Conferência Internacional
sobre Harmonização de Exigências Técnicas para o Registro de Medicamentos para
Uso Humano é um projeto que reúne as autoridades regulatórias da Europa, do Japão
40 Glossário
e dos Estados Unidos e especialistas da indústria farmacêutica das três regiões
para discutir aspectos científicos e técnicos do registro de produtos.
Efeito colateral: qualquer efeito não-intencional de um produto farmacêutico, que ocorre
em doses normalmente utilizadas por um paciente, relacionadas às propriedades
farmacológicas do medicamento.
Efetividade/risco: é a relação entre a taxa de efetividade de um medicamento e o risco de dano
é uma avaliação quantitativa do mérito de um medicamento, utilizada em práticas clínicas
rotineiras. Informações comparativas entre terapias são extremamente úteis. Elas são mais
úteis que as previsões de eficácia e predição de risco das informações pré-comercialização,
que estão limitadas e se baseiam em sujeitos de pesquisa selecionados.
Estudo Caso-controle: estudo que identifica um grupo de pessoas que apresentam o efeito
não-intencional de um medicamento de interesse e um grupo de pessoas apropriado para
comparação, sem o efeito não-intencional. A relação de um medicamento com um evento
do medicamento é examinada, comparando-se os grupos que exibem ou não o evento
do medicamento com respeito à freqüência da presença do medicamento.
Evento adverso/Experiência adversa: qualquer ocorrência médica desfavorável,
que pode ocorrer durante o tratamento com um medicamento, mas que não possui,
necessariamente, relação causal com esse tratamento.
Farmacoepidemiologia: estudo do uso e dos efeitos de medicamentos em um grande
número de pessoas.
Farmacovigilância: ciência e atividades relativas à identificação, avaliação, compreensão
e prevenção de efeitos adversos ou qualquer outro problema relacionado a medicamentos.
Gerenciamento de risco: é a tomada de decisões relativas aos riscos ou a ação para reduzir
as conseqüências ou probabilidade de ocorrência.
Fármaco: qualquer substância em um produto farmacêutico que é usada para modificar
ou explorar os sistemas fisiológicos ou estados patológicos em benefício do receptor.
O termo medicamento é usado num sentido mais amplo, para incluir o produto
formulado e registrado como um todo, até mesmo a apresentação, a embalagem
e as informações que o acompanham.
Medicamento falsificado: medicamento que tem sea rotulagem deliberada e
fraudulentamente adulterada com respeito à sua identidade, e/ou conteúdo, e/ou fonte.
Medicamento fitoterápico: inclui plantas, insumos fitoterápicos, preparações fitoterápicas
e produtos fitoterápicos finalizados.
Medicamento Genérico: o termo “medicamento genérico” tem significado ligeiramente
diferente em cada país. Os medicamentos genéricos podem ser comercializados com
denominação genérica ou com novo nome de marca. Em geral, há a intenção de que eles
sejam intercambiáveis com o produto original, e normalmente são fabricados sem licença
da empresa detentora de registro do medicamento de referência e comercializados depois
que a patente ou outros direitos de exclusividade expiram.
Medicina complementar/alternativa: esses termos são utilizados de forma equivalente
ao termo medicina tradicional em alguns países. Eles se referem a um amplo conjunto
Glossário 41
de práticas de assistência à saúde que não fazem parte da tradição daquele país
e não estão integradas ao sistema de saúde dominante. Em geral, elas não foram
testadas em indicações clínicas específicas por uma disciplina científica objetiva.
Medicina tradicional: é a soma total do conhecimento, habilidades e práticas, baseada nas
teorias, convicções e experiências locais de diferentes culturas, explicáveis ou não, usadas
na manutenção da saúde bem como na prevenção, no diagnóstico, aprimoramento ou
tratamento de doenças físicas e mentais. Os termos “medicina complementar”, “medicina
alternativa” e “medicina não-convencional” são usados de forma equivalente ao termo
medicamento tradicional em alguns países.
Monitorização de eventos relacionados à prescrição (Prescription Event Monitoring –
PEM): sistema criado para monitorar eventos adversos a medicamentos numa população.
Os prescritores são requisitados a informar todos os eventos, independentemente do fato
de serem eventos adversos suspeitos, que ocorram com pacientes identificados, que
estejam recebendo um determinado medicamento.
Notificação espontânea: sistema em que notificações de casos de eventos adversos a
medicamentos são submetidas espontaneamente pelos profissionais da saúde e empresas
farmacêuticas à autoridade regulatória nacional.
Perda de eficácia: falha inesperada de um medicamento em produzir o efeito planejado
como determinado por investigação científica prévia.
Pesquisa clínica: estudo sistemático sobre medicamentos em sujeitos humanos (pacientes
e outros voluntários), com a finalidade de descobrir ou verificar seus efeitos e/ou identificar
qualquer reação adversa ao produto sob investigação, e/ou estudar a absorção, distribuição,
metabolismo e excreção dos produtos com o objetivo de averiguar sua eficácia e segurança.
As pesquisas clínicas são, geralmente, classificadas em fases de I a IV. As pesquisas da fase IV
são os estudos executados após a comercialização do medicamento. Elas são desenvolvidas
com base nas características do produto para o qual a autorização de comercialização
foi concedida e normalmente estão na forma de vigilância pós-comercialização.
Produtos biológicos: medicamento preparado a partir de material biológico humano,
animal ou de origem microbiológica (como derivados do sangue, vacinas, insulina).
Reação adversa: reação a um medicamento que é nociva e não-intencional e que ocorre
nas doses normalmente usadas no homem para profilaxia, diagnóstico, terapia da doença
ou para a modificação de funções fisiológicas.
Reação adversa inesperada: uma reação adversa cuja natureza ou severidade
não são coerentes com as informações constantes na bula do medicamento
ou no processo do registro sanitário no país, ou que seja inesperada de acordo
com as características do medicamento.
Sinal: informação notificada sobre possível relação causal entre um evento adverso e um
medicamento, sendo que tal relação é desconhecida ou foi documentada previamente,
de forma incompleta. Normalmente, mais de uma única notificação é necessária para
gerar um sinal, dependendo da gravidade do evento e da qualidade da informação.
Sistema ativo de vigilância: a coleta de informações sobre a segurança de um caso como
um processo contínuo e pré-organizado.
42 Glossário
REFERÊNCIAS
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(Phase IV) studies. http://www.citizen.org/hrg/Publications/1520.htm
A quinta ementa da Declaração de Helsinki contém uma nova disposição sobre a
importância de se fazer com que a elaboração e as descobertas de estudos de pesquisas
clínicas sejam abertas ao público. Editorial: A fifth amendment for the Declaration of
Helsinki. Lancet 2000. 356 (9236): 1123. Ela inclui implicitamente a comunicação
de questões de segurança que surgem durante pesquisas clinicas. Isto estimularia maior
comunicação entre as agências reguladoras em diferentes países, com respeito a
preocupações de segurança, levando em consideração o melhor gerenciamento dos
pacientes e de decisões a serem tomadas que minimizariam riscos futuros. Onde há
notificação de riscos inesperados e graves, a suspensão ou descontinuidade da pesquisa
pode ser a única opção.
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– estas diretrizes estão incluídas em: Quality assurance of pharmaceuticals:
A compendium of guidelines and related materials. Volume 1, WHO Geneva, 1997;
Good manufacturing practices (GMP): supplementary guidelines for the manufactureof
herbal medicinal products, estas diretrizes suplementares estão incluí das em:
Qualityassurance of pharmaceuticals: A compendium of guidelines and related
materials. Volume 2: Good manufacturing practices and inspection, WHO Geneva, 1999;
General guidelines for methodologies on research and evaluation of traditionalmedicine,
WHO/EDM/TRM/2000.1, WHO Geneva, 2000.
Diretrizes para a monitorização de preparações fitoterápicas estão sendo desenvolvidas.
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Um exemplo de tal esforço colaborativo é o Comitê Consultivo para Segurança
Global de Vacinas da Organização Mundial da Saúde. Esse comitê tem o objetivo
específico de conduzir avaliação científica independente das associações causais
entre a administração de vacinas e a ocorrência de reações específicas. Foi destinado
ao Comitê um fundo de contingência para a condução de estudos de emergência, se
necessários, para determinar se as associações causais existem. O Comitê foi
estabelecido em resposta aos temores e rumores sobre vacinas, que haviam afetado
dramaticamente a cobertura da imunização em muitos países. Anon. Vaccine Safety:
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9 788587 943316
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A importância da farmacovigilância