UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO Sobre a Incorporação RAMS no Desenvolvimento de Produtos de Base Tecnológica: Uma Abordagem Holística a Veículos Ferroviários Miguel Nuno da Silva Leocádio (Licenciado) Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia e Gestão de Tecnologia Orientador: Doutor Manuel Frederico Tojal de Valsassina Heitor Co-Orientadores: Doutor Francisco José Lamy Figueiras Doutor Manuel Correia Alves da Cruz Presidente: Doutor Manuel Frederico Tojal de Valsassina Heitor Vogais: Doutor Paulo Manuel Salgado Tavares de Castro Doutor Júlio Martins Montalvão e Silva Doutor Manuel Correia Alves da Cruz Doutor Francisco José Lamy Figueiras Maio de 2004 UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO Sobre a Incorporação RAMS no Desenvolvimento de Produtos de Base Tecnológica: Uma Abordagem Holística a Veículos Ferroviários Miguel Nuno da Silva Leocádio (Licenciado) Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia e Gestão de Tecnologia Orientador: Doutor Manuel Frederico Tojal de Valsassina Heitor Co-Orientadores: Doutor Francisco José Lamy Figueiras Doutor Manuel Correia Alves da Cruz Presidente: Doutor Manuel Frederico Tojal de Valsassina Heitor Vogais: Doutor Paulo Manuel Salgado Tavares de Castro Doutor Júlio Martins Montalvão e Silva Doutor Manuel Correia Alves da Cruz Doutor Francisco José Lamy Figueiras Maio de 2004 Sumário: Uma atenção crescente sobre a falta de Fiabilidade e os seus efeitos em produtos de base tecnológica tem levado à aplicação de técnicas de avaliação da Fiabilidade, na concepção e operação dos sistemas, e ao estabelecimento de condições legais, incluindo aspectos de responsabilidade sobre os produtos, numa perspectiva da sua Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança (cuja integração é referenciada como RAMS). Actualmente, no sector ferroviário, têm sido integradas condições sobre os factores RAMS nos contratos entre os operadores ferroviários e os fabricantes de veículos, com aplicação de penalidades. Para responder ao aumento do risco, a Bombardier Transportation Portugal (fabricante) tem desenvolvido a sua actividade com uma atenção crescente sobre os factores RAMS. Foram analisadas as mudanças e ajustes na sua actividade resultantes deste processo, o que, juntamente com o estado actual do conhecimento nesta temática, proporcionou a sistematização da incorporação RAMS em veículos ferroviários ao longo do seu ciclo de vida. Este processo teve como produto a proposta de um modelo base que caracteriza a incorporação RAMS na actividade da empresa que concebe e fabrica veículos ferroviários. Adicionalmente, foi encontrada evidência sobre o papel efectivo da cooperação em investigação e desenvolvimento na endogeneização do conhecimento que suporta a incorporação RAMS. Abstract: A growing focus has been placed on the non-Reliability and its effects in technologybased products, leading to the application of Reliability assessment techniques during the design and operation of systems and the establishment of legal conditions, including the liability of products, from a Reliability, Availability, Maintainability and Safety (RAMS) perspective. Presently, in the railways sector, several conditions concerning the RAMS factors have been included in the contracts between the transport operators and the manufacturers, including penalties. As a response to this risk increase, Bombardier Transportation Portugal (manufacturer) is developing its activities with an extra concern for the RAMS factors. The changes and adjustments on its activities arising from this new paradigm were analyzed which, in conjunction with the present pool of knowledge on this subject, led to the systematization of the RAMS incorporation on rolling-stock along its life-cycle. This process resulted in the creation of a model that characterizes the RAMS incorporation in the activity of a company that designs and manufactures rolling-stock. Also, evidence was found about the effective role of research and development cooperation in the knowledge absorption process that supports the incorporation of RAMS. Palavras Chave: RAMS, Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade, Segurança, veículos ferroviários. Key-words: RAMS, Reliability, Availability, Maintainability, Safety, Rolling Stock. I “ Sinais de Fogo, os homens se despedem, exaustos e tranquilos, destas cinzas frias, lançando ao mar os barcos de outra vida ” Sinais de Fogo, de Jorge de Sena. II Agradecimentos Gostaria de agradecer especialmente aos orientadores deste estudo, Prof. Dr. Manuel V. Heitor, do Instituto Superior Técnico, Eng.º Manuel Cruz e Eng.º Lamy Figueiras da Bombardier Transportation Portugal, bem como a toda a equipa da Bombardier Transportation Portugal, da fábrica da Amadora, que participou activamente neste trabalho, nomeadamente através das entrevistas realizadas e pela disponibilização de toda a informação utilizada, a saber: Eng. Manuel Norton, Eng. Mário Domingues, Eng. Santos Silva, Eng. Rui Loureiro, Eng. Bento Pereira, Eng.ª Célia Queirós, Eng.ª Dulce Vilaça, Eng.ª Manuela Cruz e Eng. João Magano. Adicionalmente, gostaria de agradecer a Cecília e Henrique Leocádio e, particularmente, a Paula Faria, pela compreensão e apoio durante a realização deste trabalho. Dedico este trabalho à memória de meu pai, Henrique Leocádio, sempre presente durante a sua consecução. III Índice Índice de Figuras..........................................................................................................3 Índice de Tabelas.......................................................................................................... 5 Definições ...................................................................................................................... 6 I. Problema em Análise e Pergunta de Investigação............................................... 10 I.I. Problema em análise .....................................................................................10 I.II. Origem histórica e evolução RAMS...........................................................12 I.III. A amplitude RAMS....................................................................................16 I.III.I. Introdução ................................................................................................16 I.III.II. Fiabilidade ..............................................................................................17 I.III.III. Disponibilidade .....................................................................................19 I.III.IV. Manutibilidade ......................................................................................20 I.III.V. Segurança ...............................................................................................21 I.III.VI. Os factores RAMS em veículos ferroviários e as suas consequências .23 I.III.VII. As técnicas e metodologias de suporte à aplicação RAMS.................28 I.IV. Pergunta e hipóteses de investigação........................................................35 I.V. Estrutura do estudo .....................................................................................40 II. O caso da Bombardier Transportation Portugal (BTP) ................................... 41 II.I. Introdução ....................................................................................................41 II.II. A evolução histórica da BTP .....................................................................43 II.III. Metodologia de análise .............................................................................49 III. Aplicação da metodologia de análise ao caso da BTP...................................... 59 III.I. Introdução...................................................................................................59 III.II. Fase 1 – Sistematização da Incorporação RAMS..................................60 III.II.I. Cadernos de Encargos e Condições Contratuais ....................................60 III.II.II. Concepção e Design..............................................................................71 III.II.III. Fabricação............................................................................................81 III.II.IV. Controlo da Qualidade.........................................................................84 III.II.V. Operação e Manutenção........................................................................87 III.II.VI. Mudança Organizacional.....................................................................93 III.III. Fase 2 – Projectos de Cooperação em I&D ..........................................96 III.IV. Conclusões..............................................................................................109 1 IV. Conclusões do estudo e sugestões para estudos futuros ................................. 114 IV.I. Proposta de um modelo RAMS para os veículos ferroviários .............114 IV.II. Conclusões Finais....................................................................................120 IV.III. Sugestões para estudos futuros ............................................................123 Referências................................................................................................................ 125 2 Índice de Figuras Figura 1 – Variação da taxa de falhas durante a vida de um sistema (Billinton e Allan, 1992)............................................................................................ 18 Figura 2 – Disponibilidade, MTBF e MDT................................................................ 20 Figura 3 – Abordagem RAM – Fiabilidade, Disponibilidade e Manutibilidade. ....... 21 Figura 4 – As relações entre os Factores R/A/M/S. ................................................... 25 Figura 5 – Configuração da estrutura de mercado dos veículos ferroviários em Portugal. .................................................................................................... 27 Figura 6 – RAMS e o Ciclo de Vida dos sistemas. .................................................... 35 Figura 7 – Fases do Ciclo de Vida de veículos ferroviários numa óptica RAMS. ...................................................................................................... 51 Figura 8 – Matriz de Comparação dos contratos Pré-RAMS e RAMS ao longo do Ciclo de Vida de veículos ferroviários................................................. 52 Figura 9 – Variação do Período de Garantia do estado Pré-RAMS para RAMS. ...................................................................................................... 61 Figura 10 - Variação das garantias particulares do estado Pré-RAMS para RAMS. ..................................................................................................... 61 Figura 11 - Variação das exigências dos contratos sobre os índices de Fiabilidade do estado Pré-RAMS para RAMS. ....................................... 65 Figura 12 - Variação das exigências dos contratos sobre os índices acumulados de Disponibilidade do estado Pré-RAMS para RAMS........ 66 Figura 13 - Variação das exigências dos contratos sobre os índices pontuais de Disponibilidade Ds, Df e DCR/AFE do estado Pré-RAMS para RAMS. ..................................................................................................... 66 Figura 14 - Variação das exigências dos contratos face a especificações técnicas sobre os sistemas críticos dos veículos, no âmbito da Segurança geral e Segurança Activa, do estado Pré-RAMS para RAMS. ..................................................................................................... 69 Figura 15 - Variação das exigências dos contratos sobre a definição do Sistema de Gestão da Segurança, do estado Pré-RAMS para RAMS. ..................................................................................................... 69 Figura 16 – Metodologia e análises efectuadas no âmbito da análise RAM (figura gentilmente cedida pela BTP). ..................................................... 73 Figura 17 – Metodologia e análises efectuadas no âmbito da análise de Segurança (figura gentilmente cedida pela BTP). ................................... 74 3 Figura 18 – Fases de fabricação da BTP. ................................................................... 81 Figura 19 – Tarefas realizadas pelos Serviços Técnicos. ........................................... 82 Figura 20 – Processo de Retroacção de informação RAMS nos veículos ferroviários............................................................................................... 95 Figura 21 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação SEM XXI................ 97 Figura 22 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação Safetrain ................. 98 Figura 23 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação Safetram ................. 99 Figura 24 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação PlatsubValidação ............................................................................................... 100 Figura 25 – Quadro de Dinâmica de Cooperação..................................................... 101 Figura 26 – Quadro de Dinâmica de Cooperação para a BTP no projecto SEM XXI. ....................................................................................................... 102 Figura 27 – Quadro de Dinâmica de Cooperação para a BTP nos projectos Safetrain e Safetram............................................................................... 103 Figura 28 – Quadro de Dinâmica de Cooperação para a BTP no projecto Platsub.................................................................................................... 104 Figura 29 – Modelo RAMS para o ciclo de vida completo de Veículos Ferroviários. ........................................................................................... 115 4 Índice de Tabelas Tabela 1 – Implicações dos factores RAMS na exploração dos veículos ferroviários.............................................................................................. 26 Tabela 2 – Matriz de comparação de contratos da BTP. .......................................... 50 Tabela 3 – Projectos de Cooperação em I&D (CI&D) com participação da BTP ......................................................................................................... 57 Tabela 4 – Implicações sobre os factores RAMS presentes nos cadernos de encargos e condições contratuais dos contratos BTP considerados no nível de comparação I........................................................................ 63 Tabela 5 - Implicações sobre os factores RAMS presentes nos cadernos de encargos e condições contratuais dos contratos BTP considerados no nível de comparação II. ..................................................................... 64 Tabela 6 – Processos, técnicas e metodologias aplicadas na concepção e design de veículos ferroviários pela BTP, resultantes da incorporação RAMS. .............................................................................. 80 Tabela 7 – Implicações da incorporação RAMS nos processos de controlo de qualidade na BTP.................................................................................... 86 Tabela 8 – Índices RAMS calculados na operação e manutenção dos veículos e dos seus sistemas. ................................................................................ 92 Tabela 9 - Matriz de Redução do Risco Parcial - perspectiva do Departamento de Marketing e Vendas da BTP .................................... 105 Tabela 10 - Matriz de Redução do Risco Parcial - perspectiva do Departamento de Engenharia da BTP ................................................. 106 Tabela 11 - Matriz de Redução do Risco Parcial - perspectiva da Administração da BTP.......................................................................... 107 Tabela 12 - Matriz de Redução do Risco Agregada............................................... 108 5 Definições CCV (Custo do Ciclo de Vida): o custo total para o consumidor de um produto ou sistema consiste no custo inicial de aquisição mais os custos de operação (nos veículos ferroviários essencialmente energia), custos de manutenção (preventiva e correctiva) e peças de reserva, custos de paragem e custos de suporte, durante a vida útil do produto (Kececioglu,1991). Controlo Estatístico da Qualidade: a medida da qualidade de produtos fabricados está sempre sujeita a uma determinada quantidade de variância como resultado do acaso. Um sistema estável de causas relativas ao acaso está normalmente inerente em qualquer esquema de fabricação e inspecção, sendo a variância dentro deste padrão estável é inevitável. No entanto, as razões da variância fora deste padrão estável podem ser descobertas e corrigidas através do acompanhamento e controlo estatístico da qualidade (Grant e Leavenworth, 1980). Controlo Estatístico do Processo: monitorização dinâmica do desempenho de um processo ao longo do tempo de forma a identificar a sua variância excessiva e a eliminar as suas causas (Anupindi et al., 1999). Disponibilidade: rácio entre o tempo efectivo de funcionamento regular de um sistema e o tempo total planeado para o seu funcionamento. Fiabilidade: é a probabilidade de um sistema desempenhar a sua operação adequadamente dentro de determinadas condições operativas e durante um período de tempo pretendido (ou outra variável de referência) e é identificada por R(t). Pode ser aferida deterministicamente, durante o desempenho dos sistemas, pelos índices MTBF, MDBF ou MKBF e nº total de falhas (incidências), entre outros (Billinton eAllan, 1992). Manutenção: Embora as actividades do serviço de manutenção variem com a dimensão e o tipo de empresa, bem como a política adoptada, é possível agrupar essas actividades em duas áreas funcionais: funções primárias, que estão relacionadas com o trabalho diário efectuado pelo serviço de manutenção, e as funções secundárias, que são adjudicadas ao serviço por razões de experiência precedente ou outras. As funções primárias incluem a manutenção dos equipamentos e instalações, incluindo as tarefas de planeamento, programação e controlo dos trabalhos de manutenção, quer seja na elaboração de planos ou na emissão de ordens de trabalho (OT´s), tendo ainda a função técnica do estudo dos processos de avarias no equipamento, a elaboração de registos históricos, a determinação de custos, a gestão e formação do pessoal afecto ao serviço, entre outros. As funções primárias incluem ainda a inspecção, lubrificação e limpeza dos equipamentos, a instalação de novos equipamentos e a participação na sua concepção e construção. Alguns exemplos de funções secundárias são os estudos e projectos, a protecção e Segurança industrial, a higiene e Segurança no trabalho, controlo das fontes de poluição, entre outros. Existem essencialmente dois tipos de intervenções de manutenção: manutenção correctiva e manutenção preventiva (Pinto, 1999). Manutenção Correctiva: conjunto das actividades realizadas após a verificação de uma falha/avaria ou degradação da função do sistema, para permitir a conclusão do serviço, pelo menos com carácter provisório. A manutenção correctiva compreende em particular a localização da avaria e seu diagnóstico, a reposição em funcionamento com ou sem modificação e o controlo de bom funcionamento. Manutenção Condicionada ou Predictiva: ver Manutenção Preventiva. 6 Manutenção Preventiva: manutenção que tem por objectivo reduzir a probabilidade de avarias ou de degradação de um bem ou do serviço por si prestado. Pode assumir a forma de (I) manutenção sistemática, que se refere a manutenção preventiva efectuada de acordo com um calendário estabelecido a partir de um número predeterminado de unidades de utilização (meses, dias, horas de utilização, rotações, etc.); (II) manutenção condicional, que se refere a manutenção preventiva subordinada ao estabelecimento de um ponto de regulação predeterminado e específico do estado de degradação do equipamento ou sistema, podendo o estabelecimento do ponto de regulação ser posto em evidência pela informação dada por um instrumento de medida (captor) ou por outro meio; manutenção predictiva: manutenção preventiva subordinada à análise da evolução de parâmetros significativos da degradação do equipamento ou sistema, permitindo retardar ou planear as intervenções. Esta manutenção é por vezes designada manutenção condicionada ou manutenção baseada na condição. Manutenção Centrada na Fiabilidade (RCM–Reliability Centered Maintenance): trata-se do método para determinar qual o tipo de manutenção que é mais apropriado para cada equipamento, com base nos seus mecanismos de falha e consequências. O ênfase recai sobre o que o sistema faz (do ponto de vista da sua função efectiva) e não no que o sistema é (do ponto de vista da sua capacidade inerente). Os objectivos da manutenção devem, pois, ser direccionados em termos das requisições dos utilizadores (Moubray, 2001). Manutibilidade: a Manutibilidade dos sistemas está directamente relacionada com a rapidez e facilidade com que as intervenções de manutenção podem ser realizadas (Pinto, 1999). Material Circulante: sinónimo de veículos ferroviários. Melhoria Contínua: a estabilidade dos processos e sistemas é uma condição necessária mas não suficiente para a melhoria destes, que envolve a redução da diferença entre o desempenho actual e o ideal. Este objectivo pode ser atingido pela constante implementação de melhorias incrementais, aproximando o desempenho do processo ou sistemas do seu ideal (Anupindi et al., 1999). MDBF (Mean Distance Between Failures): distância média entre falhas, referenciada à distância percorrida pelos veículos ferroviários. MDT (Mean Down Time): tempo médio de paragem (indisponibilidade). MKBF (Mean Kilometres Between Failures): quilómetros médios entre falhas, referenciados à distância percorrida pelos veículos ferroviários. MTBF (Mean Time Between Failures): tempo médio entre falhas, aplicado a componentes, sistemas e veículos. MTTR (Mean Time To Repair): tempo médio por reparação. MWT (Mean Waiting Time): tempo médio de espera (entre a avaria e o início da intervenção de manutenção correctiva. Produção Magra: é uma metodologia de melhoria do desempenho do processo, ao nível da fabricação, e de melhoria da sua cadeia de fornecimento integral, através da eliminação do desperdício (“waste”), na forma de produtos defeituosos, produtos excedentários, stocks, esperas devidas a cargas de trabalho não balanceadas, 7 processamento desnecessário, movimentos de trabalhadores desnecessários e transporte de materiais, que se reflectem em custos excessivos. Como resultado, assume o nome de produção ou fabricação magra (Anupindi et al., 1999). Reengenharia: Re-design radical ou mudança fundamental no conceito dos processos ou sistemas de forma a atingir melhorias muito significativas nas medidas criticas do seu desempenho: custo, qualidade, serviço e rapidez (Anupindi et al., 1999). Risco: característica de uma situação ou acção onde dois ou mais cenários resultantes são possíveis, o cenário resultante que irá ocorrer é desconhecido e pelo menos uma das possibilidades é indesejável (Covello e Merkhofer, 1993). Risco Operacional e de Manutenção: dependendo do tipo de produtos e do modelo de negócio e contratual, o risco operacional e de manutenção pode ser muito significativo, relacionado com possíveis desvios do nível de serviço das especificações acordadas no contrato (caso das penalidades por incumprimento dos índices de Fiabilidade e Disponibilidade acordados) (Lemos et al., 2001). Segurança: a Segurança dos sistemas está relacionada essencialmente com a gestão de dois aspectos fundamentais: (I) os mecanismos de protecção e garantia da funcionalidade regular dos sistemas que não represente ameaças à integridade humana e ambiental, e (II) a Fiabilidade e as consequências humanas, sociais e ambientais resultantes de falhas dos sistemas ou outras causas internas ou externas. A título de exemplo, podem-se considerar as especificações do sistema de travagem automática de um veículo ferroviário, para o primeiro caso, e os planos de emergência, associados a acidentes por descarrilamento de veículos ferroviários, para o segundo. Dentro da primeira vertente referenciam-se habitualmente os (a) sistemas relacionados com a Segurança (safety-related systems) e os (b) sistemas críticos de Segurança (safetycritical systems). Embora exista alguma confusão sobre a sua distinção, existe actualmente consenso na sua caracterização da seguinte forma: (a) sistemas que sozinhos ou em conjunto com outros sistemas relacionados com a Segurança providenciam ou mantêm a Segurança dos equipamentos sob o seu controlo; (b) sistemas que sozinhos providenciam ou mantêm a Segurança dos equipamentos sob o seu controlo. Segurança Activa: sistemas comandados electronicamente que proporcionam o aumento da Segurança na operação dos veículos. No caso de veículos ferroviários: sistema automático de controlo de velocidade, sistema de travagem automática e sistemas de actuação automática mediante análise de condição (por exemplo referente a temperatura). Segurança Passiva: características físicas dos veículos, sem necessidade de comando, que actuam ou são postas em evidência em caso de colisão. A Segurança Passiva distingue as colisões primárias das secundárias, influenciando as características físicas dos veículos segundo essas duas direcções, de forma a minimizar os efeitos sobre a integridade humana resultantes da colisão. Assim, a Segurança Passiva inclui a absorção de energia por deformação plástica da estrutura do veículo em caso de colisão com outra estrutura (colisões primárias) e a anulação ou suavização de arestas ou pontos de contacto potencialmente perigosos, no interior dos veículos, para os passageiros e tripulação, uma vez que estes ganham movimento em caso de colisão (colisões secundárias). 8 Sistemas: componentes com complexidade tecnológica significativa, equipamentos específicos ou grupos tecnológicos (caso dos veículos ferroviários). Transferência de Tecnologia: podem-se distinguir três formas de transferência de tecnologia, considerando os seus custos: (1) transferência material, (2) transferência de design e (3) transferência de capacidade. A transferência material é caracterizada pela simples importação de materiais, como sementes, máquinas ou mesmo fábricas inteiras. Adaptação local ou reengenharia da tecnologia não são empreendidos neste caso. A segunda forma de transferência de tecnologia é referente à transferência de design, na forma de blueprints, formulas, manuais, entre outros. Também a importação de equipamento estrangeiro pode ter propósitos de reengenharia ou adaptação, estando incluída neste grupo. Assim, este segundo tipo de transferência de tecnologia requer uma capacidade de engenharia mais avançada que a simples transferência material. A terceira forma de transferência de tecnologia envolve a transferência de conhecimento científico e capacidade ou aptidão técnica (Ruttan, 2001). 9 I. Problema em Análise e Pergunta de Investigação I.I. Problema em análise A falta de Fiabilidade dos produtos e sistemas, desde produtos simples até sistemas complexos, pode causar efeitos que vão desde a mera irritação e inconveniência a um impacto severo na sociedade e no ambiente (basta lembrar o caso da central nuclear de Chernobyl em 1986, o acidente da nave espacial Columbia em 2003, o “apagão” em vários estados dos EUA em 2003 ou os mais comuns acidentes ferroviários ou de aviação ao longo dos anos). Utilizadores, clientes e a sociedade em geral esperam que os produtos e sistemas sejam fiáveis e seguros. Em consequência, uma atenção crescente sobre estes aspectos tem levado à aplicação de técnicas de avaliação da Fiabilidade, na concepção e operação dos sistemas, e ao estabelecimento de condições legais, incluindo aspectos de responsabilidade sobre os produtos. Nos últimos anos, o sector ferroviário em Portugal, nomeadamente a operação de veículos ferroviários, tem sido alvo de privatizações, existindo actualmente algumas empresas privadas a operar no mercado nacional. A este facto não é alheia a própria reestruturação interna da CP e da formação de diversas empresas com áreas de negócio e competências bem demarcadas. Neste cenário, foi criado o INTF (Instituto Nacional de Transportes Ferroviários), entidade reguladora do sector em Portugal. A concepção e a operação de veículos ferroviários tem evoluído numa direcção que aponta e se baseia, cada vez mais, em factores como a Fiabilidade e a Disponibilidade, ao mesmo tempo que é salientado o papel da segurança. Actualmente, têm sido integradas condições sobre estes factores nos contratos entre as empresas que operam as linhas ferroviárias (para veículos de alta velocidade, veículos suburbanos, metropolitanos e veículos ligeiros de cidade) e os fabricantes de veículos, com aplicação de penalidades a estes aquando do seu incumprimento. A Bombardier Transportation Portugal (BTP), única empresa com uma unidade de concepção e fabricação de veículos ferroviários em Portugal, na fábrica da Amadora, tem estado empenhada numa optimização crescente destes factores nos seus produtos, incorporando os conceitos RAMS1 (Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança) na sua actividade no intuito de reduzir o seu risco contratual. Este processo tem levado a mudanças e ajustes nas suas actividades e funções base, sendo de esperar implicações nos seus produtos e tecnologias. A incorporação RAMS numa empresa como a BTP é um processo complexo, tanto ao nível das suas entradas como saídas, não existindo, aparentemente, linearidade entre estes. As implicações da incorporação RAMS para uma empresa, pela sua complexidade e, como quase sempre, pelo seu custo elevado, devem ser adequadamente aferidas e analisadas, de forma a, em primeiro lugar, se decidir sobre a viabilidade da 1 Acrónimo para Reliability, Availability, Maintainability and Safety. 10 implementação RAMS e, em segundo lugar, possibilitar a optimização da sua implementação, em termos da eficiência da utilização dos recursos e eficácia no cumprimento dos objectivos. As implicações da incorporação RAMS numa empresa estão, no entanto, longe de estarem sistematizadas e devidamente analisadas. A implementação RAMS é normalmente abordada, pela bibliografia existente, de uma forma parcelar, ou seja, caracterizando e analisando cada um dos factores RAMS (R, A, M ou S) isoladamente ou com breve referência aos restantes. Uma análise à incorporação RAMS na actividade da BTP e às suas consequências é sem dúvida um estudo de caso aliciante e desafiador, pela dimensão da empresa, pertencente ao Grupo Bombardier Transportation, pela história da fábrica da Amadora, antiga Sorefame, e pelo seu sector de actividade, o qual tem uma história muito recente na incorporação RAMS, não só a nível nacional como europeu e mundial. Estes factores indiciam claramente a representatividade deste estudo de caso e o seu valor para a compreensão geral da implementação RAMS numa empresa industrial. Por outro lado, sendo um processo novo e recente neste sector e na BTP e praticamente ainda desconhecido da quase totalidade da estrutura industrial e económica nacional, não só se classifica oportuno como urge a realização de estudos e análises que contribuam para a percepção adequada dos seus amplos contornos. Num futuro próximo, ou melhor, dentro de alguns anos, a evidência de resultados da incorporação RAMS na tecnologia estará à vista, assim que os veículos ferroviários tenham percorrido uma parte significativa do seu ciclo de vida. No entanto, antes, é essencial perceber como se estrutura a análise da incorporação RAMS numa empresa de base tecnológica, ou seja, dispor de um modelo que sistematize a sua implementação. Esta pretende ser uma primeira contribuição nesse sentido, aqui no âmbito de veículos ferroviários, identificando e estruturando o problema e lançando futuras vias e hipóteses de análise para a crescente compreensão dos factores RAMS. Juntamente com o desenvolvimento de estudos análogos noutras actividades de base tecnológica (outros sectores industriais) pretende-se viabilizar a construção de um modelo comum e integrador do processo de optimização RAMS em produtos de base tecnológica, transversal aos diversos sectores industriais. Este é um primeiro passo para essa missão. 11 I.II. Origem histórica e evolução RAMS A origem histórica e evolução do estudo da Fiabilidade e Manutibilidade, ou dos factores RAMS no geral, foi devidamente caracterizada por Dimitri Kececioglu, em várias publicações suas, mas essencialmente compiladas no seu “Reliability Engineering Handbook” (1991). D. Kececioglu participou, ele próprio, na história da Engenharia de Fiabilidade, desde o início da década de 60, essencialmente pela formação e desenvolvimento de cursos de Engenharia de Fiabilidade no Departamento de Engenharia Mecânica e Aerospacial da Universidade de Tucson, Arizona. De seguida apresenta-se um resumo dos momentos essenciais da história da Engenharia de Fiabilidade, com os seus contornos RAMS, segundo este autor, com excepções onde é notado. Segundo David J. Smith (2001), o sistema de produção anterior, até meio de século XX, era caracterizado pela produção integral dos sistemas e produtos, num ambiente artesanal, com pouco recurso a fornecimentos externos, pelo que a Fiabilidade de cada produto estava fortemente dependente do fabricante/artífice, sendo menos determinada pela combinação das Fiabilidades dos componentes. Nestes ambientes fabris, os constrangimentos em termos de custo e de prazos eram significativamente menores que os actuais, o que levava, em alguns casos, a um sobre-design dos sistemas, implicando uma Fiabilidade elevada destes. O advento da era electrónica, acelerado pela Segunda Guerra Mundial, levou à crescente produção em massa de componentes complexos com um elevado grau de variância dos seus parâmetros e dimensões. A experiência da pouca Fiabilidade no campo do equipamento militar na década de 40 focou a atenção na necessidade de se desenvolverem novos métodos de Engenharia de Fiabilidade, dando origem à recolha de informação de falhas, tanto a partir de dados de campo como da interpretação de dados de testes. A percepção de que a Fiabilidade é um factor crítico no ciclo de vida dos equipamentos e componentes, sobretudo quando se avaliava o seu desempenho, surgiu efectivamente durante a Segunda Guerra Mundial, nos E.U.A., associada ao deslocamento de equipamento aéreo para os locais longínquos onde decorria o cenário de guerra, onde 60% chegava estragado, à baixíssima Fiabilidade do equipamento e peças de reserva em armazém, que se tornava inoperacional antes de utilização, e ao equipamento electrónico dos bombardeiros, que dispunha de, no máximo, de 20 horas sem avarias. Paralelamente, Robert Lusser, que trabalhou no programa de teste do míssil alemão V-1, na Alemanha, foi o primeiro homem a reconhecer a necessidade de se entender a Engenharia de Fiabilidade como uma disciplina separada. Após a guerra, Robert Lusser emigrou para os E.U.A. entrando para a Divisão de Investigação e Desenvolvimento do Exército Americano. Escreveu, entretanto, numerosos artigos sobre a teoria da Fiabilidade e a sua aplicação. Durante a década de 40, passou a ser dada uma atenção especial às válvulas e a outros componentes electrónicos pelo Exército, Força Aérea e Marinha, de forma a melhorar o seu desempenho, tendo algumas entidades privadas e ligadas ao ensino iniciado a realização de estudos de análise às falhas de válvulas, resistências, 12 condensadores, transformadores, relés, entre outros. Em 1950, O Departamento de Defesa Americano estabeleceu um grupo Ad Hoc para o estudo da Fiabilidade e em 1951 o “Secretary of Defense” publicou uma directiva para todas as agências do Departamento de Defesa no âmbito de aumentarem o ênfase na Fiabilidade do equipamento electrónico militar. Em 1952, o grupo Ad Hoc passou a permanente (AGREE – Advisory Group on the Reliability of Electronic Equipment). Nesse ano, a Engenharia de Fiabilidade iniciou o seu desenvolvimento como uma disciplina separada. Em 1953, o Dr. R. R. Carhart da Rand Corporation preparou um inquérito à Fiabilidade patrocinado pela USAF Project Rand. Esse estudo baseou-se na revisão dos problemas e na análise do progresso até essa altura. Adicionalmente, listou sete factores que, estimados por si, determinavam a valia militar e económica de um sistema de armamento. Dois desses factores eram a Fiabilidade e a Manutibilidade. Na sequência deste estudo, a Radio Corporation of America tornou-se a primeira companhia industrial a estabelecer um programa organizado para a disciplina da Fiabilidade. Em 1954 efectuou-se o primeiro Simpósio Nacional em Fiabilidade e Controlo de Qualidade, patrocinado pelo I.E.E.E. (Institute of Electrical and Electronic Engineers), pela A.S.Q.C. (American Society for Quality Control) e pela I.E.S. (Illuminating Engineering Society), tendo sido publicados os procedimentos e conclusões deste simpósio. Em 1955 o I.E.E.E. criou a Sociedade da Fiabilidade e Controlo de Qualidade. Durante a década de 50 foram publicados diversos artigos sobre Fiabilidade e foi publicado o primeiro livro neste âmbito (editado por Keith Henney na McGraw-Hill). A AGREE continuou a sua actividade dando origem a várias normas militares e publicando, em 1957, o seu primeiro relatório sobre Fiabilidade. Em 1957, a Bell Aircraft Corporation, na sua divisão de voos espaciais, editou um dos primeiros livros sobre Fiabilidade na indústria aerospacial. Os principais conteúdos do livro foram posteriormente incorporados num boletim da Força Aérea, que representou a primeira tentativa do governo para ajudar a indústria a se organizar no sentido da Fiabilidade. Em 1959, a Força Aérea publicou um documento com um programa para a gestão da Fiabilidade, onde, pela primeira vez, foram estipuladas condições mínimas a cumprir pelos seus fornecedores. Um dos aspectos salientes do documento era a exigência aos fornecedores da demonstração da Fiabilidade especificada. Paralelamente, passava a ser requerido ao fornecedor a preparação de um plano escrito descrevendo o programa da Fiabilidade que este assumia durante o período contratual. Em 1960 foi publicado o primeiro livro que combinava a análise estatística e a Engenharia de Fiabilidade (D. N. Chorafas) e a U.S. Naval Post-Graduate School, em Monterey, California, tornou-se a primeira instituição a leccionar cursos de Engenharia de Fiabilidade, à qual se juntou a U.S. Army Management Engineering and Training Activity (AMETA) em Rock Island, Illinois, em 1961, com cursos de Engenharia de Fiabilidade e Manutibilidade. Em 1961 foi publicado o primeiro livro exclusivamente 13 sobre Engenharia de Fiabilidade (Igor Bazovsky) e as forças armadas continuaram a estabelecer uma série de normas no âmbito da Fiabilidade. Em 1962 o U.S. Air Force Institute of Technology (AFIT) em Dayton, Ohio, tornouse a primeira instituição educacional a iniciar um Programa de Mestrado em Engenharia de Fiabilidade de Sistemas, para pessoal afecto às Forças Armadas e ao Governo. O A.I.A.A. (American Institute of Aeronautics and Astronautics), a S.A.E. (Society of Automotive Engineers) e a A.S.M.E. (American Society of Mechanical Engineers) iniciaram a primeira Conferência Anual de Fiabilidade e Manutibilidade para dar ênfase à Fiabilidade mecânica, tendo publicado os procedimentos desta e das próximas conferências. Em 1963, o Departamento de Engenharia Mecânica e Aerospacial da Universidade do Arizona, em Tucson, passou a leccionar cursos de Engenharia de Fiabilidade, com coordenação do Dr. Dimitri Kececioglu. Nesse mesmo ano, a NASA adoptou uma série de linhas orientadoras para serem seguidas pelos fornecedores, de forma a assegurar a Fiabilidade dos equipamentos dos sistemas espaciais, incluindo os níveis de Fiabilidade dos componentes a serem utilizados, os testes a serem realizados e a apresentação de dados de aceitação de testes certificados. Em 1966, foi fundada, em Buffalo, Nova Iorque, a Sociedade dos Engenheiros de Fiabilidade. Em 1969, a Universidade do Arizona iniciou um Programa de Mestrado em Engenharia Aerospacial e Engenharia Mecânica com uma opção em Engenharia de Fiabilidade. Em 1972, a Conferência Anual de Fiabilidade e Manutibilidade do A.I.A.A., da S.A.E. e da A.S.M.E. fundiu-se com o Simpósio Anual em Fiabilidade, surgindo o actual Simpósio Anual em Fiabilidade e Manutibilidade (RAMS – Reliability And Maintainability Symposium), que assinala a sua quinquagésima edição em Janeiro de 2004 (www.rams.org). Até ao fim da década de 80 continuaram a ser estabelecidas normas no âmbito da Fiabilidade dos sistemas pelas Forças Armadas dos E.U.A.. Em termos de evolução da Fiabilidade dos sistemas salienta-se que: • Durante a 2ª Guerra Mundial, 60% do equipamento aéreo transportado para os locais longínquos de guerra chegaram estragados, 50% das peças de reserva e equipamento armazenado tornou-se inoperacional antes da sua utilização e o equipamento electrónico nos bombardeiros funcionava sem falhas durante um máximo de 20 horas. Em 1991, menos de 15% chegaria estragado e o equipamento electrónico funciona, em média, mais de 950 horas sem falhas. • Em 1958 apenas 28% de todos os lançamentos de satélites eram bem sucedidos. Em 1991, este valor foi aumentado para mais de 93%, aumentando anualmente. 14 • Em 1959, as garantias de automóveis nos E.U.A. eram por um período de 90 dias ou para 4000 milhas (o que ocorresse primeiro). Em 1991, estas garantias foram aumentadas para 7 anos ou 70000 milhas (o que ocorresse primeiro). • Em 1985, os mísseis balísticos intercontinentais atingiram uma Fiabilidade acima dos 96%. Em termos de perspectiva futura, prevê-se que as empresas industriais que queiram sobreviver no mercado global terão de aprender a conceber, projectar, fabricar, testar, embalar e distribuir ao utilizador produtos que desempenhem a sua Fiabilidade desenhada para funcionamento, que sejam fáceis de manter (elevada Manutibilidade) ou que não necessitem de manutenção para a sua vida projectada, que sejam seguros na sua operação e utilização e que sejam de elevada qualidade. Segundo Smith (2001), o factor de mão-de-obra intensiva necessário à recolha de informação da operação é um obstáculo importante na obtenção de informação completa e fiável sobre a Fiabilidade dos sistemas. A motivação do pessoal, no sentido de elaborarem relatórios de campo com detalhes suficientes e relevantes, é presentemente um problema de gestão. A Disponibilidade crescente de software nesta área é um passo importante na melhoria deste processo, essencialmente pelas suas características interactivas e registo dos dados em tempo real, que podem estimular a recolha de dados de Fiabilidade e outros aspectos da Manutenção dos sistemas. Actualmente, vários sectores de actividade têm incorporado condições sobre os factores RAMS nos contratos com fornecedores de equipamento ou serviços, com especificação e quantificação do tempo médio entre falhas, tempos de reparação e Disponibilidade dos sistemas. Alguns exemplos são os sectores militar e espacial, o sector da aviação comercial e controlo de tráfego aéreo, o sector da produção de energia eléctrica, e, muito recentemente, o sector do transporte ferroviário, essencialmente no que compete aos veículos ferroviários (em termos nacionais mas também em termos europeus e mundiais). Neste último sector, foi criada em 1999 na Europa, pelo Cenelec, a EN 50126, que recai sobre a especificação e demonstração de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança (RAMS). O Simpósio Anual em Fiabilidade e Manutibilidade tem tido uma participação crescente por parte de empresas de relevo em cada um destes sectores, entre outros. Tem-se verificado, assim, tanto em instituições públicas como no sector privado, uma atenção crescente pelos factores RAMS, com base numa percepção crescente sobre o seu papel crítico no desenvolvimento da competitividade e da sociedade no geral. 15 I.III. A amplitude RAMS I.III.I. Introdução O conceito RAMS foca e enaltece os factores de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança na análise do desempenho de equipamentos ou sistemas2, considerando as suas implicações nos níveis técnico, social e económico. Ao mesmo tempo, possibilita o estabelecimento de métricas para a avaliação do desempenho de sistemas, através da utilização de índices que caracterizam cada um dos factores. Este processo transforma o conceito lato de funcionamento dos sistemas num conceito mais estrito e objectivo, lançando o que se pode denominar serviço dos sistemas, referenciado às suas prestações de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança. Estes factores, embora influenciados pela fase de exploração dos sistemas (pela sua utilização e manutenção) são intrínsecos a estes, pelo que a sua definição resulta, desde logo, da sua fase de concepção e design. Neste âmbito, é de alguma forma previsível que entidades que adquirem e/ou exploram sistemas de uma dimensão e complexidade significativos, com implicações técnicas, económicas e sociais de grande relevo na sua gestão, estejam cada vez mais sensíveis ao serviço proporcionado por estes, de acordo com a óptica RAMS, com objectivos concretos de redução de custos e risco. Por exemplo, no sector dos transportes ferroviários, um aumento da Fiabilidade e Disponibilidade dos veículos ferroviários leva a que com menos veículos (investimento menor na aquisição) se possa alcançar o nível de serviço pretendido. Por outro lado, uma melhor Manutibilidade implica uma redução dos tempos das intervenções de manutenção preventiva ou correctiva, ou a optimização do seu planeamento, o que confere um aumento na Disponibilidade dos veículos. Por último, mas não menos importante, pelo contrário, também a Segurança, tanto física como ambiental, é determinante no desempenho dos veículos, pelas implicações humanas, sociais e ambientais no caso de acidentes. Todos estes aspectos condicionam a gestão corrente da operação de veículos e o seu sucesso na satisfação dos seus utilizadores (clientes) e sociedade em geral, contribuindo adicionalmente para um efeito de médio ou longo prazo em termos da imagem que se forma da qualidade de serviço prestado, com as implicações comerciais óbvias daí decorrentes, para a empresa e para o sector. Mantendo o significado base, os índices que caracterizam cada um dos factores RAMS, ou simplesmente a sua métrica, podem variar consoante o caso em análise. A interpretação que os operadores de veículos ferroviários dão aos factores RAMS são, por vezes, diversas, embora o seu objectivo último seja similar. Posteriormente, esta questão será especificamente clarificada para cada caso em análise, sendo para já mais importante expor as definições gerais na base de todas as abordagens. 2 Doravante utiliza-se o conceito de sistemas tanto para um equipamento específico, ou um seu componente, como para grupos tecnológicos. 16 I.III.II. Fiabilidade A Fiabilidade dos sistemas assenta, numa primeira análise, na predição do seu desempenho e comportamento futuros, assumindo um papel crítico durante a fase de concepção e design dos sistemas. Segundo Bagowsky (1961), a Fiabilidade é a probabilidade de um sistema desempenhar a sua operação adequadamente dentro de determinadas condições operativas e durante um período de tempo pretendido (ou outra variável de referência) e é identificada por R(t). Em todos os casos, o comportamento de um sistema não pode ser visto numa perspectiva determinística mas sim numa perspectiva estocástica, isto é, varia ao acaso com o tempo. A análise completa de um processo estocástico pode ser conseguida através da aplicação da teoria da probabilidade. Esta é essencialmente uma ferramenta que permite a transformação do conhecimento de um sistema numa predição sobre o seu provável comportamento futuro. O processo de análise envolve a compreensão completa do sistema: o seu design, a forma como opera, a forma como pode falhar, a sua envolvente e as tensões a que está sujeito. A predição da Fiabilidade baseia-se no conhecimento do passado, utilizando, para tal, dados estatísticos. Nesse sentido, podem-se seguir diversos tipos de distribuições f(x), em função do tipo de sistema e das suas características (nomeadamente das fases da sua vida como ilustrado na Figura 1 – Variação da taxa de falhas durante a vida de um sistema). Algumas distribuições mais correntemente utilizadas são a distribuição de Poisson, a distribuição exponencial, a distribuição normal e a distribuição de Weibull. Está, no entanto, fora do âmbito desta análise detalhar esta temática, a qual encontra-se devidamente explorada por Billinton e Allan (1992). A evolução da Fiabilidade de um sistema pode ser associada à evolução da taxa de falhas ao longo da vida útil desse sistema [(λ(t)] da seguinte forma (Billinton e Allan, 1992): t R(t) = e - ∫0 λ(t) dt , onde e é o Número Naperiano (≈ 2,72) e t é o instante temporal. A Figura 1 ilustra a forma típica3 de λ(t) através do tempo de vida do sistema. É uma função densidade de probabilidade em função do tempo e não uma característica de desempenho real do sistema. Pela sua imagem típica, esta curva é normalmente conhecida como a Curva de Banheira, e consiste em três fases distintas (idem, ibidem): • 3 Fase Inicial ou de Infância – caracterizada pelas falhas que ocorrem no início de actividade de qualquer sistema, estando relacionadas com problemas de montagem e instalação ou com problemas de design e fabrico. Estas falhas surgem, por vezes, devido ao facto do equipamento necessitar de adaptar-se ao seu ambiente de trabalho. Que é característica de muitos componentes físicos. 17 • Fase de Vida Útil – caracterizada por uma taxa de falhas constante. A origem das falhas neste período deve-se, essencialmente, a factores como o excesso de carga e negligência na utilização dos sistemas ou a causas imprevisíveis (falhas aleatórias). • Fase Final ou de Fadiga – caracterizada por um aumento rápido da taxa de falhas com o tempo. As falhas são habitualmente devidas a envelhecimento e desgaste. Esta fase adivinha o fim de vida do sistema. λ (t) taxa de falhas Fase Inicial Fase de Vida Útil Fase Final tempo Figura 1 – Variação da taxa de falhas durante a vida de um sistema (Billinton e Allan, 1992). Embora a figura anterior exiba as características da maioria dos conjuntos de dados reais sobre sistemas, outros tipos de sistemas podem exibir variações à Curva de Banheira. É o caso dos sistemas electrónicos e dos sistemas mecânicos típicos, onde aos primeiros está normalmente associada uma vida útil relativamente longa e aos segundos uma vida útil bastante breve (idem, ibidem). Nos últimos, através de acções de manutenção preventiva ou melhoria pode-se conseguir que estes permaneçam na sua fase de vida útil durante uma grande parte da sua vida económica. Além do índice tradicional utilizado para medir a Fiabilidade – a sua probabilidade como descrita anteriormente – outros índices são frequentemente referidos e utilizados, sobretudo relacionados com os sistemas e os seus requerimentos ou especificações operacionais. Desta forma, o termo Fiabilidade passou a ser utilizado genericamente para descrever todos esses índices e não apenas relacionado com o conceito de probabilidade. Alguns exemplos típicos de outros índices são os seguintes: • O número total de falhas esperadas para um período de tempo específico; • O tempo médio entre falhas (MTBF – Mean Time Between Failures) • A duração média de paragem de um sistema (MDT – Mean Down Time) • A perda de receitas ou de produção derivada de uma falha 18 Normalmente, para a fase de operação ou exploração dos sistemas é estabelecido um indicador que afere o seu desempenho e definido o respectivo nível de aceitação. Historicamente, este indicador é uma variável determinística, especificada e calculada utilizando técnicas determinísticas. Um exemplo recorrente é a medição da Fiabilidade através do índice MTBF (Mean Time Between Failures), ou seja, o tempo médio entre falhas, assumindo a possibilidade da reparação dos sistemas após a ocorrência de uma falha. No caso dos veículos ferroviários, este índice assume frequentemente a denominação MKBF (Mean Kilometer Between Failures), ou seja, número de quilómetros médios percorridos entre falhas, sendo o quilómetro a variável de referência das falhas, uma vez que a operação dos veículos não é contínua no tempo (neste caso o número de Km percorridos é exacto na caracterização da operação do sistema). No contexto do sector ferroviário em Portugal, as falhas são identificadas como incidências, que significam em, termos gerais,: (I) um atraso na operação das composições superior a um determinado período de tempo (atraso face ao tempo previsto para o percurso) ou (II) a necessidade de reparação no local das causas da incidência ou (III) a supressão total da circulação em linha. A CP definiu e implementou uma norma neste âmbito, que aplica nos contratos que lança e adjudica: Norma CP 9209.35. I.III.III. Disponibilidade Embora o conceito de Disponibilidade possa seguir a análise probabilística de um sistema estar a funcionar ou não num determinado instante temporal, na abordagem determinística a Disponibilidade é habitualmente referida como o rácio entre o tempo efectivo de funcionamento regular de um sistema e o tempo total planeado para o seu funcionamento (Tempo Total de Carga). Em termos algébricos: Disponibilidade (D) = Tempo Total de Carga – Tempo Total de Paragens Tempo Total de Carga As paragens de um sistema referem-se ao período de indisponibilidade para operação regular desse sistema (dentro das suas especificações de funcionamento), resultante de uma incidência. Existe, assim, uma relação directa entre a Fiabilidade e a Disponibilidade de uma sistema, uma vez que as falhas de um sistema, ou mais exactamente, no contexto ferroviário, as suas incidências, poderão dar origem a períodos de indisponibilidade. Em termos algébricos a relação é a seguinte: MTBF D= MTBF + MDT Onde, MDT (Mean Down Time) é o tempo médio de paragens. 19 Salienta-se que o MTBF é medido entre o instante inicial de funcionamento e o instante de ocorrência de uma incidência que ocasione uma paragem no funcionamento regular desse sistema (indisponibilidade). Na Figura 2 ilustra-se este processo. Arranque após falha Falha Arranque tempo Tempo entre Falhas Tempo de Paragem Figura 2 – Disponibilidade, MTBF e MDT. No âmbito dos veículos ferroviários, os quilómetros percorridos são a referência para a Fiabilidade, pelo que os devidos ajustes deverão ser tidos em conta. A variável MDT será ajustada para o número de quilómetros que seriam percorridos por uma composição durante o seu tempo de paragem, ou que deixaram de ser percorridos devido à ocorrência dessa incidência (por ex. uma viagem que não se completou devido à incidência). O índice da Disponibilidade poderá, assim, ser referenciado ao número de quilómetros percorridos por um veículo ferroviário, num rácio entre os efectivamente percorridos e os programados. Neste âmbito, a CP definiu e implementou uma norma no âmbito da Disponibilidade dos veículos ferroviários, que passou a aplicar nos últimos contratos que lançou: Norma CP 9412.001. Mais à frente, na análise das condições contratuais do contrato CP2000 será analisada esta norma com mais detalhe. I.III.IV. Manutibilidade A Manutibilidade é relativa à rapidez e facilidade com que as intervenções de manutenção podem ser realizadas. Alguns factores críticos normalmente apontados são (Pinto, 1999): (I) a intermutabilidade dos componentes susceptíveis de desgaste ou avaria, (II) a normalização dos sistemas e componentes, (III) a possibilidade de inspecção, verificação e controlo dos componentes; e (III) a facilidade de montagem e afinação. É de salientar que estes factores críticos deverão ser assegurados durante a concepção e design dos sistemas, pois qualquer alteração a introduzir para melhorar a Manutibilidade dos sistemas, feita posteriormente, implica custos adicionais elevados. A Manutibilidade é habitualmente medida pelo índice MTTR (Mean Time To Repair), ou seja, o tempo médio para reparar. Cada um dos períodos de reparação é medido desde o instante em que a equipa de manutenção inicia a intervenção até à sua conclusão com reposição da funcionalidade regular do sistema. Convém salientar que o Tempo de Paragem é normalmente superior ao tempo de reparação, pois existe um período de espera (desde a ocorrência da incidência até ao início da reparação). O 20 período de espera é identificado pelo MWT (Mean Waiting Time), ou seja, o tempo médio de espera. Constata-se, assim, que a Manutibilidade (quanto menor for o MTTR maior é a Manutibilidade) está directamente relacionada com a Disponibilidade, existindo uma relação inversa entre o MTTR e a Disponibilidade. A equivalência de conceitos é a seguinte: D= MTBF MTBF + MDT = MTBF MTBF + MTTR + MWT Fazendo uma nova abordagem à Figura 2, pode-se ver agora a discriminação total dos períodos referidos, de acordo com uma abordagem RAM – Fiabilidade, Disponibilidade e Manutibilidade - na Figura 3. Falha Arranque Falha tempo Tempo entre Falhas Tempo de Reparação Tempo de Espera Figura 3 – Abordagem RAM – Fiabilidade, Disponibilidade e Manutibilidade. I.III.V. Segurança Segundo Smith (2001), da mesma forma que tem existido um foco de interesse nos acidentes de maior dimensão, existe uma percepção crescente de que muitas falhas relacionam-se com os sistemas de controlo ou Segurança utilizados para a operação e protecção dos sistemas. Exemplos deste tipo de equipamento são: sistemas de detecção de fogo, sistemas de paragem automática, sistemas de controlo distribuído, sinalização ferroviária, sistemas de controlo dos automóveis, sistemas de controlo de voo em aeronaves. Expressões como (I) sistemas relacionados com a Segurança (safety-related systems) ou (II) sistemas críticos de Segurança (safety-critical systems) passaram a fazer parte do vocabulário da engenharia. Embora exista alguma confusão sobre a sua distinção, existe actualmente consenso na sua caracterização da seguinte forma: (I) sistemas que sozinhos ou em conjunto com outros sistemas relacionados com a Segurança providenciam ou mantêm a Segurança dos equipamentos sob o seu controlo; (II) sistemas que sozinhos providenciam ou mantêm a Segurança dos equipamentos sob o seu controlo. 21 De uma forma geral, a Segurança dos sistemas está relacionada essencialmente com a gestão de dois aspectos fundamentais: (I) os mecanismos de protecção e garantia da funcionalidade regular dos sistemas que não represente ameaças à integridade humana e ambiental, e (II) a Fiabilidade e as consequências humanas, sociais e ambientais resultantes de falhas dos sistemas ou outras causas internas ou externas. A título de exemplo, podem-se considerar as especificações do sistema de travagem automática de um veículo ferroviário, para o primeiro caso, e os planos de emergência, associados a acidentes por descarrilamento de veículos ferroviários, para o segundo. Assim, o ciclo da Segurança inicia-se na concepção dos sistemas, nas suas características e mecanismos de desempenho, passando pela sua dependência da Fiabilidade dos sistemas e estendendo-se à gestão e minimização do risco inerente nas situações de perigo resultantes da falha dos sistemas ou de outras situações anómalas (causas externas ou má operação dos sistemas). Nesse sentido, é de certa forma clara a razão da inclusão da Segurança como factor RAMS, ao lado dos restantes factores RAMS – Fiabilidade, Disponibilidade e Manutibilidade. O factor de Segurança dos sistemas tem, desta forma, duas vertentes principais: • As especificações sobre os componentes e sub-sistemas que estejam directamente relacionados com a minimização dos riscos humanos e ambientais durante a operação dos sistemas (sistemas relacionados com a Segurança no geral). • A gestão das situações de perigo eminente ou emergência, resultantes de incidentes ou acidentes, e a respectiva minimização das consequências para a vida humana e ambiente. Mais importante do que referir índices normalmente utilizados para aferir a Segurança, os quais são tantas vezes referenciados no dia a dia (nº de acidentes, nº de óbitos resultantes de acidentes, entre outros), é identificar instrumentos e métodos para melhorar este factor. A primeira vertente referida aponta, em primeiro lugar, para mecanismos que tentam garantir a funcionalidade regular dos sistemas e que, pelo seu papel crítico, são normalmente referidos no âmbito da Segurança: sistema de freios, sistema de alarme e iluminação do veículo são alguns exemplos. Em segundo lugar, inclui a Segurança Activa dos veículos, ou seja, sistemas comandados electronicamente que proporcionam o aumento da Segurança na operação dos veículos, a saber: sistema automático de controlo de velocidade, sistema de travagem automática e sistemas de actuação automática mediante análise de condição (por exemplo referente a temperatura). No global, sistemas relacionados com a Segurança e sistemas críticos de Segurança. A segunda vertente refere-se também a dois aspectos principais. Por um lado a Segurança Passiva dos veículos, isto é, características físicas destes, sem necessidade de comando, que actuam ou são postas em evidência em caso de colisão. A Segurança Passiva distingue as colisões primárias das secundárias, influenciando as características 22 físicas dos veículos segundo essas duas direcções, de forma a minimizar os efeitos sobre a integridade humana resultantes da colisão. Assim, a Segurança Passiva incluí a: • Absorção de energia por deformação plástica da estrutura do veículo em caso de colisão com outra estrutura (colisões primárias). • Anulação ou suavização de arestas ou pontos de contacto potencialmente perigosos, no interior dos veículos, para os passageiros e tripulação, uma vez que estes ganham movimento em caso de colisão (colisões secundárias). Adicionalmente, a definição e estabelecimento de planos de Segurança, manuais de procedimentos de emergência e normas de Segurança são outras ferramentas essenciais à optimização do factor Segurança, na segunda vertente apresentada. I.III.VI. Os factores RAMS em veículos ferroviários e as suas consequências Os factores RAMS, através da análise anterior, encontram-se relacionados em termos causais ao longo da vida de um sistema. A Fiabilidade e a Manutibilidade são factores que nascem com os sistemas, isto é, são definidos e estabelecidos durante a fase de concepção e design dos sistemas. Incrementos nestes factores durante a operação dos sistemas são habitualmente muito onerosos, inviabilizando, numa perspectiva custo/benefício, a sua implementação. No entanto, as suas manifestações, em termos reais, apenas se verificam durante a fase de operação dos sistemas. A Disponibilidade de um sistema, sendo um factor inerente à operação dos sistemas, tem como constrangimentos a Fiabilidade e a Manutibilidade. São estes dois factores que a influenciam e condicionam: o primeiro através da taxa de falhas ou do MTBF e o segundo através do MTTR. Naturalmente, quanto maior for o número de falhas de um sistema reparável, com implicações em termos de paragem do sistema, menor é a sua Disponibilidade. Por outro lado, quanto menor for a sua Manutibilidade maior é o tempo necessário para a reposição da sua funcionalidade e maior é o tempo de paragem do sistema (no caso da falha implicar uma paragem na operação do sistema). É ainda de referir, para a análise ser completa, que o tempo médio de espera (MWT), conforme já foi abordado anteriormente, também condiciona a Disponibilidade. A Segurança, por seu lado, é definida e estabelecida, em grande parte, durante a concepção e design dos sistemas, nomeadamente no que confere ao seu design, concepção funcional, características dos materiais e procedimentos de Segurança. A aplicação dos procedimentos de Segurança ocorre, em casos de perigo ou acidente, durante a fase de operação, procurando salvaguardar a protecção dos operadores, utilizadores e outros intervenientes, directa ou indirectamente implicados pelo sistema, e do ambiente. Assim, a Segurança, embora projectada na fase de concepção e design, é directamente condicionada pela Fiabilidade, mais concretamente pela ocorrência de falhas, que põe à prova o desempenho, em termos de Segurança, dos sistemas. A 23 Segurança é, a par da Disponibilidade, um factor RAMS que, em muitas ocasiões, é salientado quando outro factor RAMS entra em evidência. Com base nas relações detectadas, sugere-se uma identificação dos factores RAMS de acordo com o seu papel ao longo da vida dos sistemas. Em termos conceptuais, podem-se agrupar os factores RAMS nos seguintes agrupamentos: 1. Factores originais: Fiabilidade e Manutibilidade; 2. Factor consequenciais: Segurança e Disponibilidade. A Figura 4 sintetiza todas estas relações e os agrupamentos propostos, sendo de referir que o factor Segurança, pelo o que se referiu atrás, possa ser considerado um factor híbrido. Convém ainda realçar que, embora a definição e estabelecimento dos factores RAMS sejam inerentes à fase de concepção e design, a manutenção dos seus níveis esperados é um aspecto crítico ao longo da vida dos sistemas. Nesse sentido, as intervenções de manutenção preventiva e melhoria dos sistemas devem ser devidamente planeadas, calendarizadas e realizadas. Existem, actualmente, diversas técnicas de apoio a este processo, de forma a garantir a sua eficiência e eficácia. No próximo capítulo serão abordadas algumas delas. De uma forma global e no âmbito do operador de veículos ferroviários, desde a aquisição à gestão da operação e do desempenho dos sistemas e à satisfação do cliente, podem-se caracterizar as implicações dos factores RAMS nos veículos ferroviários de acordo com a Tabela 1. É notória a ligação das implicações apresentadas com a vertente económica, tanto de uma forma directa, pelo investimento total na aquisição e pelos custos de exploração e manutenção, como indirecta, através da satisfação do cliente e pela imagem resultante para o mercado, que condicionam directamente a procura. 24 Vida de um Sistema Factores originais R: Fiabilidade MWT MTBF S: Segurança M: Manutibilidade MTTR A: Disponibilidade Factores consequenciais Figura 4 – As relações entre os Factores R/A/M/S. As implicações dos veículos em termos económicos podem ser referenciadas como o custo do ciclo de vida - CCV (CCV - Life Cycle Cost em inglês) – o qual reflecte todos os custos dos veículos durante a sua vida útil. Segundo Kececioglu (1991), o custo total para o consumidor (aqui concretamente para o operador de veículos ferroviários) de um produto consiste no custo inicial de aquisição mais os custos de operação (nos veículos ferroviários essencialmente energia), custos de manutenção (preventiva e correctiva) e peças de reserva, custos de paragem e custos de suporte, durante a vida útil do produto. Os factores RAMS influenciam, assim, o CCV: quanto maior for a Fiabilidade e a Manutibilidade de um sistema menores serão os custos após a aquisição; contudo, incrementos na Fiabilidade e na Manutibilidade supõem uma melhor e mais intensa engenharia de concepção e Investigação e Desenvolvimento (I&D), melhores componentes, mais redundância, melhor controlo de qualidade, entre outros, por parte do fabricante, o que se reflecte num preço de venda superior, ou seja, num custo de aquisição por parte do operador maior. O custo do ciclo de vida será claramente reduzido pela melhoria da Fiabilidade, Manutibilidade e Segurança mas será aumentado pelas actividades necessárias para a implementação dessa melhoria (Smith, 2001). Não existe, assim, uma relação directa, num único sentido, entre os factores RAMS e o CCV. A análise de como reduzir o custo de ciclo de vida de um sistema enquanto se aumenta a Fiabilidade, Manutibilidade e Disponibilidade e o estabelecimento do ponto óptimo encontra-se devidamente desenvolvida por Kececioglu (1991) e por Smith (2001). 25 FACTORES RAMS IMPLICAÇÕES Fiabilidade • • • • • Disponibilidade • Quantidade de veículos a adquirir • Cumprimento do serviço a prestar aos utilizadores • CCV Manutibilidade • Disponibilidade • Duração e Custo das intervenções de manutenção Disponibilidade Segurança Cumprimento das condições normais de transporte Realização de intervenções de manutenção CCV • CCV Segurança • Protecção dos utilizadores e tripulação • Protecção do ambiente Tabela 1 – Implicações dos factores RAMS na exploração dos veículos ferroviários. De acordo com esta conjuntura percebe-se a vantagem para os operadores de veículos ferroviários (ou, simplesmente, do transporte de passageiros) da optimização dos factores RAMS, o que tem levado cada vez mais a uma exigência destes face aos fabricantes dos veículos para que determinados índices sejam cumpridos. Por outro lado, a própria estrutura da empresa operadora de transportes ferroviários tem uma relação muito próxima com a viabilidade da aplicação das exigências face aos factores RAMS. Estes são, antes de tudo, características intrínsecas dos sistemas que compõem os veículos ferroviários, pelo que o seu estabelecimento deverá ser fruto da concepção do fabricante, ou seja do seu departamento de engenharia e das suas actividades de I&D. Assim, o projecto e a concepção deverão ser da total responsabilidade do fabricante e não impostos, em determinados níveis, pelo operador. Durante muitos anos essa realidade vigorou em termos internacionais, nomeadamente em Portugal através da CP. Durante esse período, os operadores produziram especificações fundamentais para a definição dos diferentes sistemas dos veículos, bem como condições de cálculo e ensaios. É também reconhecido que grande parte das configurações dos veículos, com algum pormenor dimensional, foram alvo de especificações técnicas a que os fornecedores e fabricantes estavam obrigados. Uma parte importante do que actualmente cabe à integração mecânica, eléctrica e funcional na concepção das novas unidades estava bastante aliviada por essas especificações. No entanto, a actividade dos gabinetes de estudos dos fabricantes, com todos os desenhos e especificações técnicas para cada uma das obras, foi sempre realizada independentemente dos operadores, assumindo estes, por inteiro, a responsabilidade contratual referente ao desempenho dos veículos. No entanto, prevê-se que nestas condições, para o fabricante, a gestão e controlo sobre os factores RAMS seria bastante mais diminuta. 26 Nos últimos anos, a situação tem-se transformado, podendo-se afirmar que os departamentos de engenharia dos fabricantes, sendo o caso da BTP, usufruem presentemente de uma elevada liberdade na concepção dos sistemas e do veículo no global. No entanto, tendo em consideração a relação da manutenção dos veículos com a sua Fiabilidade e Disponibilidade, interessa salientar que essa actividade continua a ser operada por entidades distintas dos fabricantes, numa grande maioria dos contratos existentes em Portugal, com a excepção da manutenção correctiva durante o período de garantia, o que constrange em elevado grau uma aplicação RAMS mais ampla e global no tempo e na sua caracterização. A estrutura de mercado actual em Portugal segue a configuração apresentada na Figura 5, salientando-se apenas algumas das empresas mais relevantes. Concepção e Fabricação • • • BTP Alstom Siemens RAMS Operação • • • CP Metro de Lisboa Fertagus RAMS Manutenção • EMEF “Fabricantes” RAMS • Figura 5 – Configuração da estrutura de mercado dos veículos ferroviários em Portugal. A partir da observação da estrutura de mercado dois aspectos evidenciam-se de imediato, resultando a sua conjugação num outro aspecto ainda mais significativo. Por um lado, como já referido, existe actualmente uma separação clara entre as actividades de concepção e fabricação, operação e manutenção, no que compete às empresas que as realizam. Enquanto que a concepção e fabricação é desenvolvida por empresas como a BTP, a operação é gerida por empresas como a CP – Caminhos de Ferro Portugueses e o Metropolitano de Lisboa (ML), só para citar os exemplos mais conhecidos, sendo a actividade de manutenção levada a cabo quase em exclusividade no território nacional pela EMEF – Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário, empresa do Grupo 27 CP 4, excluindo o ML que detém as suas próprias equipas de manutenção. Não faz parte desta abordagem analisar as causas desta situação, uma vez que está directamente relacionada com a estrutura passada e presente do mercado português, apresentando evidentes contornos políticos e sociais. Por outro lado, também como já devidamente explicitado, os factores RAMS coexistem e manifestam-se nas diferentes actividades apresentadas na Figura 5. A Fiabilidade, a Manutibilidade e a Segurança são projectados durante a concepção e design dos sistemas, manifestando-se durante a operação dos mesmos, pelo seu desempenho dentro das suas especificações, e tendo implicações na Disponibilidade e na Segurança resultantes das falhas dos sistemas e da sua Manutibilidade. Adicionalmente, através de intervenções de manutenção preventiva e melhoria procura-se manter os factores RAMS dentro dos níveis desejados ou mesmo aumentá-los, embora a sua viabilidade técnico-económica nem sempre o possibilite. Em termos globais, os factores RAMS são projectados na fase de concepção e design, manifestam-se na fase de operação e são mantidos através das actividades de manutenção. Este ciclo está devidamente abordado e descrito para aplicações ferroviárias, na Norma NP EN 50126: 2000 – Especificação e Demonstração de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança (IPQ, 2000). Daqui resulta o aspecto mais significativo que atrás se referia. Uma vez que conceito RAMS atravessa todas as actividades referidas, a sua aplicação total apenas poderá ser alcançada pela integração ou complementaridade dessas actividades, onde cada uma aproveita uma panóplia de entradas e devolve saídas para as restantes actividades do sistema. Esta concepção será abordada e analisada mais à frente neste estudo. Para já, interessa referir que a estrutura de mercado existente pode ser uma barreira à aplicação integral dos factores RAMS, por cada actividade do ciclo de vida ser executada por uma empresa distinta, o que poderá implicar que não exista uma transferência de informação adequada para as restantes. I.III.VII. As técnicas e metodologias de suporte à aplicação RAMS Já se constatou e referiu a presença dos factores RAMS na globalidade das actividades inerentes aos veículos ferroviários (concepção e design, fabricação, operação e manutenção). Em todas estas actividades são aplicadas metodologias e técnicas para definir, estabelecer, medir, analisar e manter os factores RAMS dos sistemas, 4 Actualmente a BTP dispõe na sua estrutura de equipas de manutenção que actuam durante o período de garantia dos veículos (normalmente de dois a cinco anos), na realização das intervenções de manutenção correctiva. Durante este período, a manutenção preventiva, baseada nos planos genéricos definidos e entregues pelo fabricante, é normalmente planeada e executada por outras empresas, independentemente da empresa que opera o serviço (CP, ML, MP), verificando-se apenas o acompanhamento das actividades pelo fabricante. De qualquer das formas, a BTP, actualmente a única empresa com capacidade de concepção e fabricação de veículos ferroviários em Portugal, está em condições de assegurar contratos integrais de manutenção de veículos ferroviários no futuro. 28 habitualmente pela entidade que leva a cabo a actividade. Embora exista uma miríade de metodologias e técnicas directa ou indirectamente relacionadas com os factores RAMS, cabe aqui evidenciar algumas das mais utilizadas e, também, mais caracterizadas na bibliografia existente, muitas das quais integradas na NP EN 50126: 2000 (IPQ, 2000). Procura-se, assim, fazer uma caracterização genérica sobre as metodologias e técnicas suporte aos factores RAMS mais significativas. Não se pretende, pois, desenvolver particularmente cada uma delas, nem caracterizar o seu processo de aplicação (ver bibliografia sugerida). De forma a atender aos factores RAMS, os fabricantes de veículos ferroviários que concebem e projectam os seus veículos têm à sua disposição diversas técnicas para definir e estabelecer os índices de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança. Convém reter que, dadas as relações já apresentadas entre os factores RAMS, a aplicação de uma metodologia no sentido de definir e estabelecer um índice poderá ter implicações em outros. O cálculo da Fiabilidade, subjacente à definição e estabelecimento dos índices de Fiabilidade dos sistemas, depende, num primeiro nível, de metodologias que sistematizam a constituição dos sistemas e as suas relações. Normalmente, formaliza-se a constituição dos sistemas através de Árvores de Eventos, que são basicamente uma representação em árvore de todos os eventos que podem ocorrer num sistema (por exemplo o sucesso ou falha de cada componente). As Árvores de Falhas, por seu lado, são uma representação análoga com uma lógica diferente: o evento de topo é uma condição de falha particular que se desdobra em árvore identificando as diversas combinações e sequências de outras falhas que estão na sua origem. O processo inicia-se com a identificação de um modo de falha de um sistema que se quer analisar. As causas da falha do sistema são desdobradas num número crescente de níveis hierárquicos sempre que o comportamento ou efeitos da falha dos seus componentes possam ser identificados. Esta metodologia pode ser utilizada tanto numa perspectiva de avaliação qualitativa como quantitativa. Na avaliação quantitativa, os dados de Fiabilidade dos componentes são associados ao último nível da estrutura hierárquica e combinados, utilizando a lógica da árvore, de forma a proporcionarem uma avaliação global da Fiabilidade do sistema. Para uma abordagem detalhada sugerem-se as referências bibliográficas de Billinton e Allan (1992), Kececioglu (1991) e Krasich e Gallardo (2002). Ainda no âmbito da análise da Fiabilidade dos sistemas, outra técnica tem sido bastante utilizada. Trata-se da FMECA (Failure Mode, Effects and Criticality Analysis), ou simplesmente FMEA. O A.I.A.G.5 descreve o FMEA como um grupo sistemático de actividades que procuram: 5 Automotive Industry Action Group. 29 • Reconhecer e avaliar a falha potencial de um produto ou processo e os seus efeitos; • Identificar acções que podem eliminar ou reduzir a probabilidade de ocorrência de uma falha potencial; • Documentar o processo. Da mesma forma que as Árvores de Eventos e Falhas, a aplicação do FMEA deverá ocorrer durante a fase de concepção e design dos sistemas, onde as alterações ao processo e ao design são mais fáceis e menos onerosas de ser implementadas. Para uma abordagem detalhada sugerem-se as referências bibliográficas de Kececioglu (1991) e Bowles (2002). Existem outras técnicas de cálculo da Fiabilidade na vertente analítica, entre as quais a Modelação de Markov (vide Billinton e Allan, 1992), que tem recebido bastante atenção recentemente. Esta técnica resolve o problema de normalmente se assumir, em sistemas reparáveis, que o tempo de reparação é insignificante relativamente ao tempo de operação (condição para a aplicação das distribuições de probabilidade). Tendo em consideração a importância da manutenção na vida útil dos sistemas, que tem como um dos seus objectivos principais manter a funcionalidade dos sistemas dentro das suas especificações, é evidente a relevância de se aplicarem critérios de Manutibilidade na concepção e design dos sistemas. A análise de Manutibilidade encontra-se directamente relacionada com a Disponibilidade dos sistemas e com os seus componentes ou sub-sistemas, dependendo também da sua Fiabilidade (Fratianne e Burrows, 2002). Adicionalmente, a facilidade de manutenção interfere directamente nos custos das intervenções de manutenção. Os critérios de Manutibilidade acabam por ser suportados nos processos FMEA, através da identificação dos modos de falha, dos seus efeitos e da sua criticidade, podendo recorrer adicionalmente a dados históricos da operação de sistemas idênticos para a identificação das suas intervenções de manutenção críticas e mais comuns. A abordagem FMEA é também habitualmente seguida do ponto de vista da Segurança, sendo os efeitos considerados como os perigos resultantes em termos de Segurança. Trata-se de uma análise ao cenário dos perigos potenciais resultantes da operação ou utilização dos sistemas (Hazzard Analysis). Este tipo de abordagem aplicada à Segurança, tendo também em consideração os modos de falha exteriores aos sistemas ou decorrentes da sua utilização inadequada, fornece informação muito importante para a concepção dos sistemas, no seu dimensionamento e arquitectura de funcionamento (através da aplicação de redundâncias, de mecanismos de controlo ou pelo aumento da sua Fiabilidade) e para a definição de normas de Segurança, procedimentos de emergência e planos de Segurança. Ainda no âmbito do factor Segurança, é de salientar o papel da Segurança Passiva que pretende minimizar as consequências humanas e ambientais resultantes de colisões. A análise de absorção de impacto pela estrutura do veículo e o design e configuração interiores dos veículos são algumas das metodologias utilizadas nesse sentido. Existem 30 actualmente várias publicações, essencialmente artigos publicados, e seminários nesta área, sendo de realçar o “Passive Safety of Railway Vehicles Symposium” que ocorreu em Berlim, na Alemanha, em 1999, no qual foram apresentados diversos artigos nesta temática. A Fiabilidade definida durante a concepção e design dos sistemas apenas pode ser materializada, na fabricação dos sistemas, através de um controlo de qualidade adequado e eficaz. Um controlo de qualidade insuficiente ou desajustado pode degradar seriamente a Fiabilidade inerente dos sistemas6. É, assim, evidente que a Fiabilidade e o controlo de qualidade estão bastante relacionados. Convém notar que existem diversas abordagens para o controlo de qualidade, as quais preconizam diferentes métodos formais para a sua aplicação. Uma das mais conhecidas é a abordagem de Taguchi (Taguchi, 1992). Outras seguem métodos estatísticos, como é o caso do controlo estatístico da qualidade e controlo estatístico do processo (SPC – Statistic Process Control). Para uma abordagem inicial sugerem-se as referências bibliográficas de Chase e Aquilano (1997) e Anupindi et al (1999) e, mais especificamente, E.L. Grant e R.S. Leavenworth (1980). Adicionalmente, para uma abordagem global ao sistema de qualidade sugere-se a referência bibliográfica de Joseph M. Juran e A. Blanford Godfrey (1998). Mesmo após a fabricação, a Fiabilidade inerente pode ser facilmente degradada devido a má operação ou utilização ou manutenção ineficaz, neste último caso, por exemplo, devido a procedimentos ou tarefas de manutenção desenquadradas da realidade particular do sistema. A Fiabilidade e a sua sustentação devem ser uma preocupação de todos os engenheiros responsáveis por um sistema, desde a sua fase inicial até à sua obsolescência. A Manutenção dos sistemas é, portanto, um ponto crítico na sustentação dos factores RAMS, com incidência directa na manutenção da Fiabilidade e Manutibilidade inerentes dos sistemas e consequentemente na sua Disponibilidade e Segurança. Esta actividade tem sido, por vezes, algo conservadora e o seu papel tem sido encarado, erradamente, como periférico ou secundário no ciclo de vida dos sistemas. Esta não é certamente a direcção que se pretende para esta análise, pelo que interessa aqui essencialmente salientar algumas das técnicas actuais de suporte a uma manutenção eficaz e eficiente aos sistemas. Uma das técnicas que tem sido utilizada para optimizar a manutenção preventiva é a Manutenção Condicionada (também referida como Predictiva)7. A manutenção preventiva sistemática, baseada em acções programadas e executadas periodicamente, apresenta a dificuldade em se estabelecer correctamente o intervalo entre as intervenções. Em muitas circunstâncias, por não se atender à Fiabilidade dos diferentes 6 No entanto, um controlo de qualidade perfeito não aumenta o nível de Fiabilidade definido na fase de concepção e design. 7 É, na realidade, uma política de manutenção, que utiliza várias técnicas na sua aplicação. 31 componentes de um sistema, as substituições são efectuadas sem nenhuma justificação. Outras vezes, porque não se detectou a falha numa fase incipiente a avaria ocorre antes da intervenção preventiva prevista. Para além destes inconvenientes, interessa referir que a manutenção preventiva sistemática obriga, em muitos casos, a paragens prolongadas dos sistemas, diminuindo, assim, a sua Disponibilidade. Através da recolha e registo sistemático de parâmetros convenientes procura-se ter o conhecimento sobre o estado actual dos sistemas, ou seja, diagnosticar as anomalias ainda em fase incipiente, determinando-se a altura ideal para se proceder à intervenção de manutenção preventiva. Trata-se de um tipo de manutenção baseada na condição e para os casos em que a sua aplicação é viável8 apresenta os seguintes objectivos principais: • Melhoria da Segurança • Aumento da Disponibilidade dos sistemas (pela redução dos seus tempos de paragem) • Redução dos custos do ciclo de vida (CCV) dos sistemas (pela optimização das intervenções de manutenção preventiva e redução dos custos de paragens imprevistas) Algumas das técnicas utilizadas são: análise de vibrações, termografia, análise de óleos lubrificantes, detecção de fugas ou folgas, medidores de espessura por ultra-sons, entre outras. Para uma abordagem mais detalhada à manutenção condicionada sugeremse as referências bibliográficas de J. H. Williams et al (1994) e R. Keith Mobley (2002). Uma das técnicas cada vez mais recorrentes na manutenção de sistemas actual é o RCM (Reliability Centered Maintenence), ou seja, a Manutenção Centrada na Fiabilidade. Esta técnica tem como objectivo último determinar qual o tipo de manutenção que é mais apropriado para cada equipamento (correctiva, preventiva sistemática ou condicionada), com base nos seus mecanismos e dinâmica de falhas e efeitos na sua função efectiva9. O principal objectivo do RCM é preservar a funcionalidade de um sistema produtivo, em oposição à funcionalidade de um equipamento específico e isolado. Segundo John Moubray (2001), o principal percursor do RCM, o ênfase deverá recair sobre o que o sistema faz (do ponto de vista da sua função efectiva) e não no que o sistema é (do ponto de vista da sua capacidade inerente). Os objectivos da manutenção devem, pois, ser direccionados em termos das requisições dos utilizadores. Por fim, não faria sentido deixar de fora a referência a um processo sem dúvida crucial em todos os mecanismos de aplicação RAMS. Trata-se da recolha de 8 A aplicação da manutenção condicionada é dependente do tipo de comportamento em termos de avarias dos sistemas, fazendo sentido a sua aplicação quando as avarias se manifestam com um tempo de progressão (sendo observáveis). Caso contrário, quando as avarias não têm tempo de progressão, surgindo “instantaneamente”, apenas se pode actuar por acções programadas de substituição de componentes (muitas vezes em acções de manutenção correctiva). 9 A técnica FMEA suporta a aplicação de RCM. 32 informação e o seu tratamento mediante a utilização de sistemas de informação. A recolha de informação e disponibilização de um histórico de falhas é um processo chave na previsão futura da Fiabilidade dos sistemas, durante a sua concepção e design, bem como na aferição da Fiabilidade durante a operação dos sistemas. Estes processos são actualmente facilitados pela existência de software específico, tanto no âmbito dos cálculos FMEA, Árvores de Falhas e Cadeias de Markov, como no tratamento histórico das falhas, paragens e intervenções de manutenção, entre outros. O controlo da qualidade tem também disponíveis diferentes sistemas de software que suportam a sua aplicação (software genérico de Gestão da Qualidade, software de Controlo Estatístico da Qualidade e Processo). No âmbito da manutenção, tanto a Manutenção Condicionada como a Manutenção Baseada na Fiabilidade suportam-se em software específico ou em aplicações GMAC (Gestão de Manutenção Assistida por Computador). Os sistemas GMAC suportam a globalidade da gestão da função de manutenção e sistematizam bases de dados com o histórico da Fiabilidade, Manutibilidade e Disponibilidade dos sistemas, promovendo o incremento da Disponibilidade, a diminuição dos custos de manutenção, o aumento da Fiabilidade e do domínio das instalações, a melhoria do serviço e a redução das tarefas administrativas (Elejabarrieta, 1996). Note-se que para os dados históricos serem tratados e disponibilizados por um software é necessária a sua recolha e registo, pelo que a sua realização idónea é efectivamente um factor crítico no processo. Nesse sentido, segundo Smith (2001), é fundamental a utilização de um documento formal para a recolha de todos os dados de campo, nomeadamente: tempo de reparação, tipo de falha (primária ou secundária, induzida ou resultante do acaso), natureza da falha (curto circuito, desgaste, deficiência de design, etc.), localização da falha, condições funcionais, acção correctiva implementada, pessoal envolvido, equipamento utilizado, peças de reserva utilizadas, tempo de operação, entre outros. Estes dados têm diversas aplicações, sendo as principais a retroacção, que resulta em modificações para prevenir mais defeitos, e a aquisição de dados estatísticos de Fiabilidade e reparação (Smith, 2001). Em detalhe, os dados servem os seguintes propósitos: • Indicar as deficiências de design e de fabricação, podendo ser utilizadas na implementação de programas de incremento da Fiabilidade • Indicar as tendências de Fiabilidade e Qualidade • Identificar a fase de desgaste e taxas de falhas decrescentes • Fornecer avaliação de fornecedores de serviços • Contribuir com dados estatísticos para futuras predições de Fiabilidade e tempos de reparação • Assistir a Manutenção de segundo nível • Optimizar a Manutenção Preventiva e a gestão das peças de reserva • Controlar os custos de Manutenção e de Qualidade 33 Um sistema para reportar falhas deverá, assim, ser estabelecido para cada projecto e produto. A cooperação do cliente com o sistema de recolha de dados é essencial pela necessidade de recolha de dados de campo (da utilização ou operação dos sistemas). Este aspecto pode ser utilizado pelo fornecedor, durante a negociação do contrato, como contraponto a outras concessões que este tiver de aceitar. 34 I.IV. Pergunta e hipóteses de investigação A aplicação dos factores RAMS, parcial ou integralmente, aos sistemas e produtos de base tecnológica tem, considerando os diversos aspectos focados na análise já efectuada, uma amplitude que preenche todo o seu ciclo de vida: desde a sua concepção ao seu fim de vida. Na análise anterior, sugere-se que a incorporação dos factores RAMS ao longo do ciclo de vida dos sistemas promove a ocorrência de sinergias na sua aplicação, embora não exista nada que impeça a sua aplicação isolada numa fase particular. A Figura 6 sintetiza as fases que constituem o ciclo de vida dos sistemas. RAMS Concepção e Design RAMS Fabricação RAMS Controlo de Qualidade RAMS Operação e Manutenção Fim de Vida Figura 6 – RAMS e o Ciclo de Vida dos sistemas. A aplicação RAMS traduz-se pela utilização e sistematização de uma série de técnicas e metodologias complementares que procuram fornecer valor acrescentado a um sistema, em termos da sua Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança, desde a sua fase de concepção, onde se estabelecem os factores RAMS inerentes, passando pela sua fabricação e controlo de qualidade, até à sua operação e manutenção, onde se tentam manter os factores RAMS inerentes. Será de supor que a linearidade da figura anterior não caracteriza o processo RAMS, no seu global, sendo de prever que a sua aplicação seja complexa e caracterizada por fluxos de informação em sentidos opostos e variáveis entre as diversas fases do ciclo de vida dos sistemas. A definição do âmbito e objectivo deste estudo baseou-se na identificação das prioridades actuais de análise à aplicação RAMS, em termos gerais e, especificamente, aos veículos ferroviários e às diversas actividades que constituem o seu ciclo de vida. Sendo a aplicação RAMS bastante recente no sector ferroviário, nomeadamente em Portugal10, não existem estudos ou publicações que reflictam a incorporação RAMS, em termos parciais dos seus factores ou integralmente, em sistemas ou produtos. O que se encontra disponível, quer através de referências bibliográficas, quer através de publicações académicas ou periódicas, são caracterizações específicas da aplicação de técnicas e metodologias de suporte a factores RAMS, de uma forma genérica ou com aplicação a casos específicos. Algumas referências foram e vão sendo apresentadas ao 10 Com excepção do sector da aviação, não são conhecidos até à data outros casos de incorporação RAMS em Portugal. 35 longo deste estudo, no entanto convém salientar as abordagens de Kececioglu (1991) e Smith (2001), abordagens mais integradoras da aplicação do conceito RAMS. Assim, considerou-se que existe uma premência em caracterizar e sistematizar a aplicação RAMS em sistemas e nas organizações que suportam ou se relacionam com essa aplicação, de forma a se constituir uma base de conhecimento integrada, estruturada e sistémica que possa servir de referência e orientar o desenvolvimento e alargamento do conhecimento nesta área. A estruturação e sistematização do processo de aplicação RAMS aos veículos ferroviários, através da construção de um modelo RAMS para este sector, será um primeiro passo para a construção e validação de um modelo global e integrador, transversal aos produtos de base tecnológica. Daí resultou o estabelecimento das prioridades deste estudo, que utiliza a BTP como estudo de caso, pela disponibilidade de informação e por se considerar um caso representativo na aplicação RAMS com uma abordagem holística, uma vez que a sua actividade percorre as diversas fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários. A sua missão principal é, assim, caracterizar e sistematizar o conhecimento existente nesta área, constituindo um modelo de referência que desempenhe um papel chave no futuro aprofundamento do conhecimento RAMS em veículos ferroviários ou noutros sectores que integrem produtos de base tecnológica. Pretende, nesse sentido, ter um papel estruturante e orientar o estabelecimento de novas hipóteses de investigação e o desenvolvimento de novos estudos que permitam o alargamento do conhecimento nesta área. A aplicação RAMS aos veículos ferroviários é recente em termos globais. Em Portugal, a estrutura de mercado é ainda bastante marcada pela estrutura que vem do passado, embora esteja no início a sua abertura em todas as fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários, realçada pela privatização da operação de determinadas linhas e trajectos, dando origem à criação do INTF (Instituto Nacional de Transportes Ferroviários), e pela incorporação de serviços de pós venda e manutenção na actividade dos fabricantes. Todas estas fases coexistem em Portugal, com empresas bastante representativas, sobretudo pela sua história e papel na evolução do sector ferroviário em Portugal. A BTP, sendo a única empresa que concebe e fabrica veículos ferroviários em Portugal, é uma das empresas com maior amplitude em termos de intervenção no seu ciclo de vida. Actualmente, a empresa faz parte de um consórcio que efectua a operação de veículos em linha e é responsável por parte da manutenção dos mesmos, embora por um período de tempo limitado que está associado à sua garantia (de 2 a 5 anos). A incorporação RAMS11 na sua actividade, desde 1998, esteve directamente relacionada com as especificações para os veículos lançadas pelos clientes (Metro do Porto e CP), que, no essencial, passaram a incluir índices de Fiabilidade e 11 A incorporação RAMS refere-se à utilização e ao tratamento de uma forma sistemática e complementar dos factores de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança desde a concepção e design à exploração e manutenção dos sistemas, visando a sua optimização. 36 Disponibilidade mínimos para os veículos, com aplicação de penalidades ao fabricante no caso dos valores reais desses índices, durante a operação dos veículos no período de garantia, serem inferiores aos valores mínimos definidos. No entanto, o mercado internacional já apontava essa direcção para o tipo de contratos relativamente aos veículos ferroviários, sendo ainda de salientar que a BTP seguia a direcção estratégica de entrar no mercado da manutenção ferroviária, o que implicava uma atenção reforçada nos factores RAMS na concepção dos veículos (pelas suas implicações futuras). Estes dois aspectos estiveram na origem da promoção e participação, pela BTP, juntamente com outras entidades de referência em Portugal (EMEF, Efacec, ISQ, IST, entre outros), do projecto mobilizador SEM XXI, com início em 1999, que promovia a modernização do Sistema Ferroviário Português e do tecido industrial de material circulante através do desenvolvimento e implementação de um sistema de exploração e manutenção, com base nos factores RAMS. A aplicação das penalidades sobre os índices RAMS apenas durante o período de garantia, de acordo com as especificações dos clientes, é facilmente justificada pelo facto de após a recepção definitiva dos veículos (fim do período de garantia) a operação e a manutenção destes ficarem a cargo e da responsabilidade do cliente, não podendo (ou devendo) o fabricante, agora sem conhecimento ou domínio destas actividades, ser responsável pela manutenção dos índices de Fiabilidade e Disponibilidade inerentes. Tendo a BTP12 um passado muito longo e uma experiência sólida na fabricação de veículos ferroviários, será de esperar que a incorporação RAMS na sua actividade tenha sido e esteja a ser um processo complexo com implicações directas na sua actividade, com reflexos: • Na tecnologia e nos seus processos, ao nível dos veículos ferroviários; • Na estrutura organizacional. A percepção destes aspectos passa, assim, por analisar como se estrutura a incorporação RAMS numa empresa de base tecnológica, ou seja, como se sistematiza a incorporação RAMS na sua actividade. Nesse sentido e como já referido, o objectivo último deste estudo é, através da análise das implicações da incorporação RAMS na actividade de uma empresa, em termos das suas implicações para a tecnologia e para os seus processos13 e também do ponto de vista organizacional14, apresentar, estruturar e sistematizar o processo de aplicação RAMS. Como resultado e tendo como base o estado actual do conhecimento no âmbito dos factores RAMS, será construído e proposto um modelo RAMS para o ciclo de vida completo dos veículos ferroviários. 12 A referência é à fábrica da Amadora, antiga Sorefame, pois uma grande parte da sua estrutura humana e de capital manteve-se na passagem a BTP. 13 Desde a concepção à sua operação e manutenção, daí a abordagem holística. 14 Em termos da organização interna da empresa que concebe, fabrica, explora e mantém os veículos ferroviários. 37 De forma a suportar esse modelo e facilitar a sua construção serão consideradas as seguintes hipóteses iniciais como directrizes de análise: • A incorporação RAMS resulta do tipo de vínculo contratual entre o fabricante de veículos e o cliente (normalmente o operador), existindo um aumento do risco para o fabricante. • São aplicadas novas técnicas, metodologias e processos na incorporação RAMS durante a concepção e design dos veículos ferroviários. • A gestão da qualidade do processo produtivo é crítica na garantia dos factores RAMS inerentes dos sistemas. • Existe uma mudança organizacional como resultado da incorporação RAMS no fabricante de veículos ferroviários. • Existe transbordo da incorporação RAMS para entidades cuja actividade se relaciona directamente com a BTP. • Existe uma nova abordagem na exploração e manutenção dos veículos ferroviários pela incorporação RAMS. • Existem sinergias, em termos de valor acrescentado, resultantes da aplicação RAMS em todas as fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários. • A optimização contínua dos factores RAMS depende de um mecanismo de retroacção do desempenho real dos sistemas. As fronteiras do estudo são claras e estão perfeitamente estabelecidas. Não é objectivo deste estudo: • Desenvolver e caracterizar a aplicação das técnicas e metodologias referidas, na base da incorporação RAMS, em termos genéricos ou reais no estudo de caso presente. • Generalizar, desde já, a aplicação RAMS a sistemas e produtos, embora se pretenda dar um primeiro passo nesse sentido (caminhar para a construção de um modelo RAMS transversal às diversas áreas de base tecnológica). • Identificar e caracterizar a totalidade de factores que estão na origem e viabilizaram a incorporação RAMS na actividade da empresa. • Avaliar os resultados da incorporação RAMS em termos do desempenho dos veículos ferroviários durante a sua operação. Sobretudo pelo seu período de operação ser ainda muito breve. • Quantificar em detalhe as implicações da incorporação RAMS na actividade da BTP, nomeadamente em termos dos custos resultantes para a empresa. 38 Adicionalmente, assumindo a extrema relevância da endogeneização do conhecimento necessário à incorporação RAMS numa empresa, ou seja, os mecanismos que estão na base da absorção do conhecimento necessário para a incorporação RAMS, procurou-se comprovar a relevância das actividades de cooperação em investigação e desenvolvimento (I&D), com outras entidades, para esse processo. A cooperação em actividades de I&D tem sido amplamente estudada por diversos autores, nomeadamente por Cassiman e Reinhilde (1998), Ávila (2003) e Leocádio (2003). Embora não seja considerada a única via para a absorção de conhecimento novo ou desenvolvimento de conhecimento existente, é uma das formas a que as empresas habitualmente recorrem nesse sentido. Segundo Cassiman e Reinhilde (1998), a cooperação entre empresas em actividades de I&D, incluindo as parcerias em projectos específicos, tem sido cada vez mais utilizada pelas empresas. As vantagens da cooperação em I&D, de acordo com a literatura de gestão de tecnologia [Porter e Fuller (1986), Hagedoorn e Schakenraad (1991), Tyler e Steensma (1995)], são extremamente cativantes: permite o acesso a aptidões e tecnologias, atingir economias através da exploração da complementaridade, partilhar custos e riscos e controlar as forças competitivas. As empresas expõem, transferem e desenvolvem conhecimento valioso dentro destas parcerias. Não é objectivo deste estudo analisar as diversas formas de absorção de conhecimento que possam estar na base da incorporação RAMS, além da cooperação em I&D. Um estudo integral sobre os factores que viabilizaram a absorção de conhecimento sobre os factores RAMS é entendido como importante mas transpõe o estudo presente. Aqui, será apenas analisado o papel da cooperação da BTP com outras entidades em actividades de I&D, pela sua previsível relevância no processo de incorporação RAMS. Não se pretende, directamente, que o modelo RAMS proposto para o ciclo de vida completo dos veículos ferroviários represente ou possa representar a incorporação RAMS em termos genéricos, ou seja, noutro tipo de produtos, sistemas ou organizações. Contudo, pela universalidade dos conceitos na base dos factores RAMS, prevê-se e sugere-se que esta análise seja o início de outras abordagens RAMS, quiçá noutros sectores ou tipo de sistemas, para que num futuro próximo o seu conjunto possa complementar e validar um modelo RAMS transversal aos sistemas de base tecnológica. Por outro lado, no que compete ao estudo de caso presente, algum tempo deverá passar (uma parte significativa da vida útil dos sistemas), para que os resultados da incorporação RAMS já efectuada sejam visíveis e avaliados na operação dos veículos ferroviários. 39 I.V. Estrutura do estudo Depois de apresentada a problemática de análise, foram devidamente caracterizados os conceitos de Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança, incluindo a origem do reconhecimento da sua importância e do seu papel na sociedade e a sua evolução histórica. De seguida, enquadraram-se os factores RAMS na estrutura do sector ferroviário em Portugal, explorando-se as suas implicações e contornos actuais. Foram então exploradas algumas das técnicas e metodologias frequentemente aplicadas no âmbito dos factores RAMS, segundo bibliografia seleccionada, representando o estado de conhecimento actual sobre esses factores. O estudo inicia-se com a apresentação do caso da BTP, na evolução histórica da fábrica da Amadora e da sua actividade, desde a Sorefame, passando pela ADtranz e actualmente BTP, apresentando-se e caracterizando-se de seguida a metodologia de análise a aplicar neste caso de estudo. A aplicação da metodologia de análise encontra-se dividida em duas fases. Na fase 1 analisam-se, em primeiro lugar, as condições contratuais que estiveram na origem da incorporação RAMS e a sua relação com a gestão do risco que a empresa enfrenta. De seguida, analisa-se a sistematização da incorporação RAMS na BTP, segundo os contratos do MP e CP2000, ao longo das seguintes fases da sua actividade: concepção e design, fabricação, controlo da qualidade, operação e manutenção. Adicionalmente, avalia-se a mudança organizacional imposta pela incorporação RAMS, os seus contornos e a sua amplitude. Na fase 2 estudam-se os projectos de cooperação em I&D que a BTP coordenou, no sentido de validar o seu papel na absorção de conhecimento efectivo para a incorporação RAMS, no processo de endogeneização de conhecimento RAMS. No final tiram-se as conclusões sobre a aplicação da metodologia ao caso de estudo. O estudo de caso da BTP e as conclusões sobre a incorporação RAMS na sua actividade, confrontados com o conhecimento existente no âmbito dos factores RAMS, leva de seguida à apresentação de uma proposta para um modelo RAMS para o ciclo de vida completo dos veículos ferroviários, que sistematiza e integra o estado de conhecimento actual nesta área. Este modelo preenche a missão principal do estudo conduzindo ao desenvolvimento das conclusões finais. A partir das conclusões e de aspectos aí identificados, no final, expõem-se orientações e sugestões para estudos futuros a realizar nesta área, de forma a contribuir para a extensão lógica do conhecimento aqui reunido e explorado. 40 II. O caso da Bombardier Transportation Portugal (BTP) II.I. Introdução A grande indústria portuguesa de material hidro-mecânico e material circulante ferroviário Sorefame foi, em 1994, adquirida pela empresa multinacional ABB, passando em 1996 a designar-se ADtranz pela associação desta ao grupo Daimler-Benz. Em 2001, a multinacional Bombardier Transportation, oriunda do Canadá, comprou a totalidade do grupo ADtranz, herdando a ADtranz portuguesa, que a partir dessa data se passou a designar Bombardier Transportation Portugal (BTP), detendo a unidade de produção da Amadora. Esta unidade de produção nacional foi, contudo, fundada algumas décadas antes, tendo ao longo do seu percurso uma actividade cada vez mais ampla e especializada, sobretudo baseada na absorção e desenvolvimento do conhecimento base à concepção e design dos sistemas. Esta tem sido a realidade no seu sector de veículos ferroviários, salientando-se a mudança organizacional na segunda metade da década de 90, aquando da incorporação no Grupo ADtranz, pela absorção e aplicação de novas técnicas de fabricação, de alteração profunda na orgânica estrutural da empresa e pelo desenvolvimento significativo do Departamento de Engenharia da empresa. Para se compreender adequadamente a evolução histórica da Fábrica da Amadora e a sua contribuição para a sua situação actual, em 2.2. apresenta-se um desenvolvimento da evolução histórica desta fábrica, desde a sua fundação até à actualidade, salientando os aspectos mais significativos da sua história, de alguma forma ligados directa ou indirectamente a esta análise. No fim da década de 90 os principais clientes nacionais da Fábrica da Amadora, numa tendência a nível global, iniciaram alterações muito significativas no modelo de negócio base dos seus contratos. A nova abordagem seguida pela CP (numa adaptação permanente e sequencial dos seus cadernos de encargos) e pela recém criada empresa Metro do Porto (MP), actualmente os principais clientes da BTP, apontou para uma atenção redobrada para factores como a Fiabilidade e a Disponibilidade dos veículos, impondo condições contratuais para níveis mínimos a observar na operação dos veículos, com aplicação de penalidades muito significativas ao fabricante no caso do seu incumprimento. Como resposta, a BTP terá alterado a sua perspectiva na concepção, fabricação e operação e manutenção da sua tecnologia e sistemas, de forma a melhorar a gestão do risco inerente à nova realidade. Aos contratos da CP e do MP nessa nova abordagem foi, por motivos de análise, dada a nomenclatura de contratos RAMS, por oposição a contratos anteriores sem as especificações mencionadas no âmbito RAMS, aos quais foi atribuída a referência de PRÉ-RAMS. O caso de estudo da BTP é, assim, um caso representativo da aplicação RAMS a produtos de base tecnológica, neste caso veículos ferroviários. Considerando o objectivo deste estudo, a comparação entre os contratos RAMS e os contratos PRÉ-RAMS permite retirar conclusões sobre a origem da incorporação RAMS na actividade da empresa e os principais factores que estão na sua 41 origem e sobre o reflexo da incorporação RAMS na actividade da empresa, essencialmente na sua estruturação qualitativa. Adicionalmente, considerando a necessidade da existência de conhecimento específico para a incorporação RAMS na actividade da empresa, o facto da empresa ter empreendido em diversos projectos de I&D, relacionados com os factores RAMS, em cooperação com outras entidades, permite, através da sua análise, avaliar o seu produto e compreender o seu papel na endogeneização do conhecimento base à incorporação RAMS. Não se considerando a única forma de absorção de conhecimento, parece ser uma das formas essenciais de absorção de conhecimento codificado e, paralelamente, tácito. Em 2.3. apresenta-se a metodologia seguida para a realização de todo o estudo. 42 II.II. A evolução histórica da BTP Dentro do enquadramento estratégico preconizado pelo Eng.º Ferreira Dias15 para a industrialização de Portugal, e com a materialização de planos concretos para a sua execução, o Eng.º Ângelo Fortes fundou, em 1943, a Sorefame – Sociedades Reunidas de Fabricações Metálicas, através da reunião de pequenas empresas metalomecânicas então existentes na Porcalhota16 e com capital maioritário da Neyrpic17. O início da sua actividade envolvia o fabrico de equipamentos hidromecânicos para aproveitamentos hidroeléctricos e hidroagrícolas, respondendo à crescente procura destes equipamentos pelo início da construção das centrais hidroeléctricas em Portugal, e viabilizava-se segundo a transferência de tecnologia da Neyrpic. Nesse sentido, diversos elementos desta empresa deslocavam-se amiúde à Amadora, paralelamente com a realização de estágios de engenheiros e técnicos portugueses em Grenoble. No início dos anos 50, quando se deu a electrificação da linha de Sintra, a CP optou pela continuação da utilização do aço inox na estrutura das carruagens (caixas). Foi quando se criou a fábrica para a produção de caixas, no complexo da Sorefame na Amadora, e se produziram 3 composições de UTE´s (unidades Triplas Eléctricas) para a linha de Sintra. Para tal, a Sorefame associou-se à Budd Company, empresa detentora da tecnologia nos EUA, para a transferência de tecnologia e conhecimento, pagando a licença de produção a esta e concedendo uma participação no seu capital (embora simbólica). No início dos anos 50 um conjunto de engenheiros da Sorefame estagiaram na fábrica da Budd em Red Lion, Philadelphia, onde se localizava a sede desta, existindo depois um acompanhamento da Budd à produção da Sorefame mediante deslocações periódicas de engenheiros americanos à Fábrica da Amadora. Saliente-se que existiam poucas empresas no mundo a produzir carruagens em aço inox. Invariavelmente, todas elas com licença da Budd. Aquando da electrificação da linha de Sintra foi formado um agrupamento internacional para o fornecimento das composições ferroviárias, onde a Sorefame se incluía. Este grupo denominava-se “Agroupement d’Étude et d’Électrification de Chemin de Fer en Monophasé 50 Hz” e incluía, além da Sorefame, a AEG, a Siemens, a Alsthom, a Brown Boveri Company e a Schindler. Este consórcio detinha o monopólio de fornecimento de material circulante ferroviário de tracção eléctrica à CP, fazendo a Sorefame a montagem final, pelo qual se deslocavam à Amadora diversos especialistas estrangeiros, em cada uma das áreas/empresas, os quais faziam também os ensaios 15 Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria desde 1940, lançou, durante os quatro anos que ocupou o cargo, o enquadramento legal da electrificação e da industrialização do País. Em 1958 foi nomeado Ministro da Economia. 16 Porcalhota é o nome porque era então conhecida a actual freguesia da Falagueira no Concelho da Amadora, onde actualmente se encontram as instalações da Bombardier Transportation Portugal. 17 Grande empresa metalomecânica francesa de Grenoble. 43 necessários. Aos poucos a Sorefame foi-se libertando da necessidade de acompanhamento, até que começou a fazer a operação de montagem sozinha, a partir de desenhos fornecidos, mas já sem o apoio prático e no terreno. Propositadamente, este processo acabou por decretar outra transferência de tecnologia, ao nível das montagens finais. Antes de 1960 a Sorefame deu um outro salto qualitativo quando criou o seu próprio banco de ensaios (de compressão) de caixas, permitindo ensaiar estas e analisar o seu comportamento sob diversas situações de compressão, levando a conclusões sobre o seu desempenho ao longo da sua vida útil. No sector ferroviário, as primeiras composições do Metropolitano de Lisboa foram compradas integralmente à Linke Hofmann Bush, da Alemanha. O Metropolitano de Lisboa, querendo dar continuidade a este tipo de carruagens, encomendou à Sorefame as novas composições e foi aí que esta iniciou a produção de caixas em aço carbono, com licença da empresa alemã e utilizando o seu conhecimento. A Sorefame trabalhava assim, maioritariamente com aço inox, onde se distinguia claramente pela sua excelência, mas também com aço carbono18, sobretudo para locomotivas (embora tenham existido umas locomotivas em aço inox produzidas pela Sorefame) e para as caixas do Metropolitano de Lisboa. Posteriormente o Metropolitano de Lisboa optou também pelo aço inoxidável para as novas carruagens a adquirir. Durante 1974, era tal a confiança na tecnologia e domínio de conhecimento da Sorefame no aço inox que a Boing encomendou cerca de 200 caixas para o Metropolitano de Chicago, sendo a Boing responsável pelo projecto. No início dos anos 80, quando a Budd se encontrava à beira da falência e foi comprada pela Bombardier Transportation, a Sorefame já dominava por completo a tecnologia de aço inox e não se ressentiu da falta de apoio da Budd. O posicionamento da Sorefame era tal que concorria internacionalmente a bastantes concursos, para a produção de caixas em aço inox, sempre de igual para igual com os seus concorrentes. O seu currículo era muito apreciável, sobretudo depois da exportação de caixas para os EUA. Um outro salto qualitativo no sector ferroviário verificou-se pela produção de mais de trinta locomotivas de grande potência para a Rodésia, encomendadas pela Alsthom em 1974. As caixas das locomotivas foram produzidas pela Sorefame, realizando também a integração do sistema de tracção e restantes acabamentos fornecidos pela Alsthom. Com o apoio na montagem da Alsthom, este projecto veio dar um desenvolvimento adicional à empresa, ao nível da montagem final de locomotivas. 18 O aço carbono, sendo mais leve que o aço inox, tem uma desvantagem: a necessidade de manutenção, nomeadamente no que confere à sua pintura. 44 No inicio dos anos 70, com a crise da energia, os governos começaram a dar mais relevo aos transportes colectivos de passageiros, nos quais o comboio era o mais importante, em detrimento dos individuais (o transporte automóvel parecia estar a ficar condenado). Neste cenário, surge o contrato com os Ministérios das Comunicações e da Indústria, incluindo a CP, a Sorefame e também a Equimetal. O objecto deste contrato era a produção faseada de novos comboios de passageiros para as linhas nacionais, através da Sorefame, e também vagões de mercadorias, através da Equimetal. Este facto levou a Sorefame a reorganizar-se internamente, sobretudo ao nível da sua capacidade de produção (nível tecnológico e essencialmente mão de obra)19, efectuando investimentos avultados, uma vez que tinha paralelamente em carteira diversas encomendas para o estrangeiro. No entanto, em 1976 e 1977 a CP entra num período bastante difícil, marcado por uma forte crise financeira, que a leva a não obter financiamentos, tanto a nível nacional como internacional, por falta de garantias, colocando em risco todo o investimento material e humano efectuado uns anos antes pela Sorefame. Como uma parte significativa das encomendas foi cancelada, o investimento da Sorefame acabou por não ter o retorno esperado, abalando de forma relevante a estrutura financeira da empresa. O 25 de Abril de 1974, levando à instabilidade social, trouxe também uma série de convulsões sociais na empresa, que até então tinha conseguido gerir e controlar a sua força de trabalho, o que levou sistematicamente a reduções na produtividade fabril, pelas muitas greves ocorridas ao longo de vários anos. Este facto parece ter estado relacionado com as sucessivas reduções de pessoal resultantes dos investimentos que se tinham consumado anteriormente e, como referido, não tinham tido o retorno almejado. Adicionalmente, as subidas dos salários dos trabalhadores após 1974 tiveram efeitos bastante significativos, uma vez que a empresa era caracterizada por mão de obra intensiva. Por fim, um outro aspecto não menos relevante, talvez até mais determinante que os anteriores, deve-se à forte quebra nas exportações de material hidromecânico, que ocupavam uma parte muito relevante no volume de negócios da Sorefame, no fim da década de 70. Esta diminuição drástica verificou-se porque o mercado externo cessou, substancialmente devido à mudança de posição do Banco Mundial, que financiava os investimentos de grande porte nos países sub-desenvolvidos (que representavam o grande mercado internacional), e que passados bastantes anos concluiu que na realidade esses investimentos apenas serviam para delapidar mais a sua situação económica20, contribuindo sim para o desenvolvimento dos países exportadores (o Banco Mundial 19 A Sorefame chegou a ter uma capacidade de produção de uma carruagem por dia, na década de 70. 20 Após a instalação das grandes infra-estruturas hídricas, a exploração e a sua manutenção ficavam nas mãos de povos muito debilmente preparados para esse desempenho, com carências de conhecimento muito grandes e orçamentos limitados, atendendo aos elevados custos de manutenção deste tipo de instalações. Existem vários casos de abandono parcial, ou mesmo total, destas centrais. 45 inverteu nesta altura a sua estratégia de financiamentos começando a optar por investimentos ligados a outras áreas, nomeadamente a saúde e alimentação). Esta situação levou ao desaparecimento, já na década de 80, destas fontes “fictícias” de mercado. Em 1990, a Sorefame ganhou o contrato para a produção de 113 UME (unidades múltiplas eléctricas) para o Metro de Lisboa (ML), cujo fornecimento seria faseado durante a década de 1990, com algumas melhorias nos veículos. Adicionalmente, em 1991, foi-lhe adjudicado o contrato para o fornecimento de 56 UME para a linha de Sintra, operada pela CP. Estes veículos ficaram conhecidos como as UQEs (Unidades Quádruplas Eléctricas) de Sintra. Até esta altura, a Sorefame efectuava a concepção mecânica dos veículos e a sua integração mecânica (integração das tubagens para os cabos eléctricos no veículo, armários eléctricos, entre outros), sendo a concepção eléctrica (concepção dos esquemas eléctricos, dimensionamento de cabos, relés, contactores, etc.) e a sua integração (comunicação e integração dos sistemas eléctricos) realizada por parceiros de contrato. Até esta altura, a responsabilidade pós-venda da Sorefame residia nos períodos de garantia que assumia perante o cliente, sendo responsável pelas reparações e/ou substituições a efectuar em avarias com causas imputadas aos seus sistemas. Numa perspectiva RAMS, pode-se considerar que apenas os factores Fiabilidade e Segurança se encontravam presentes nesta abordagem: o primeiro relacionado com a responsabilidade que o fabricante detinha na manutenção correctiva dos sistemas que incorporava nos veículos, durante o período de garantia, e o segundo pela incorporação nos veículos dos sistemas relacionados com a Segurança presentes nas especificações do cliente. No entanto, desde a década de 70, diversos acontecimentos ocorreram na Sorefame, alterando-lhe diversas vezes o destino e rumo: • Em 1977, o capital detido pelo Banco de Fomento foi transferido para o IPE. • Em 1990, no quadro da reestruturação do sector da Metalomecânica Pesada Portuguesa, que se impunha em virtude da crise internacional que atingiu este tipo de actividade e obrigou a numerosas fusões e ainda pelos desafios criados pela integração europeia, foi criado o Grupo Senete (Sistemas de Energia, Transportes e Equipamentos), sendo os sócios o IPE, a Mague e a ABB, no qual a Sorefame foi integrada e cindida em duas empresas: a Sorefame, para material circulante ferroviário; e a Hidrosorefame, para os equipamentos de produção de energia. • Em 1994 a ABB torna-se o accionista maioritário do Grupo Senete, pela venda do IPE da sua participação. • Em 1996 a ABB e a Daimler-Benz Transportation juntaram as suas posições no campo da engenharia eléctrica e mecânica e formaram, ambas com uma participação de 50%, o Grupo ADtranz – ABB Daimler-Benz Transportation, o 46 maior e mais completo fornecedor mundial no sector dos transportes ferroviários. Em 1999 a ABB vendeu a sua participação na empresa à DaimlerChrysler, dando origem ao Grupo DaimlerChrysler Rail Systems, que assumiu o controlo total da empresa, mantendo ainda o nome ADtranz para o sector do material circulante ferroviário. Em 1996 deu-se uma expansão significativa nas competências da Engenharia da empresa, com a integração na ADtranz, pela incorporação da concepção e integração eléctrica e também através do desenvolvimento do conhecimento na área mecânica e em quase tudo o que representa a Engenharia do veículo. Foi iniciada formação com alguns dos seus fornecedores principais, essencialmente de componentes críticos: freios e portas por exemplo. O conhecimento em dinâmica ferroviária foi bastante desenvolvido nesta fase, através de projectos. Nesta altura, deu-se também uma alteração importante no sistema de produção da fábrica, pelo abandono do modelo de fabricação tradicional e pela implementação do modelo de Produção Magra. Enquanto que o modelo antigo se baseava na fabricação integral da estrutura do veículo, o novo modelo assentava na fabricação como processo de montagem de partes e componentes fabricados por fornecedores especializados (actividades de menor valor acrescentado), daí a denominação de fabricação magra (apenas constituída por actividades de elevado valor acrescentado, basicamente a montagem de partes e dos veículos). Esta alteração foi muito significativa, implicando o abandono de processos de fabricação e o desaparecimento de equipamentos como serras, máquinas de furar, prensas, calandras, entre outros, da fábrica. Consequentemente, deuse uma redução da força de trabalho de aproximadamente 1500 pessoas para 500. Em 1996 o Departamento de Engenharia era constituído por cerca de 60 pessoas com mais alguns elementos subcontratados. Em 1998, a ADtranz ganhou o contrato para o fornecimento de 72 veículos de metro ligeiro para o Metro do Porto, inserida num consórcio para instalação da infra-estrutura, fornecimento dos veículos e operação e manutenção dos mesmos. Este contrato foi o primeiro onde a concepção eléctrica e integração eléctrica foram desenvolvidas integralmente na fábrica da Amadora, pelo seu Departamento de Engenharia e onde se aplicaram pela primeira vez condições contratuais no âmbito da Fiabilidade e Disponibilidade dos veículos. No ano seguinte, foi lançado pela fábrica da Amadora o projecto mobilizador SEM XXI, que propunha a modernização do Sistema Ferroviário Português e do tecido industrial de material circulante através do desenvolvimento e implementação de um sistema de exploração e manutenção integrados, seguindo os fundamentos RAMS. Este projecto teve a cooperação de diversas entidades públicas e privadas (EMEF, IST, INETI, MIIT, ISQ). Em 2000, a ADtranz ganhou o contrato para fornecimento de 34 UME para as linhas suburbanas da área do Porto, operadas pela CP, o qual passou a ser habitualmente referenciado como CP2000. Neste contrato a concepção eléctrica ficou a cargo da 47 Siemens, por motivos contratuais, e de forma semelhante ao contrato com o MP, foram incluídas condições contratuais no âmbito da Fiabilidade e Disponibilidade a cumprir na operação dos veículos. Em Maio de 2001 a canadiana Bombardier Transportation adquiriu o Grupo ADtranz, formando assim o maior grupo mundial do sector ferroviário, passando a deter cerca de 24% do mercado mundial e herdando e mantendo a Fábrica da Amadora como uma das suas unidades de produção. 48 II.III. Metodologia de análise Sendo o estudo presente baseado na actividade da BTP, o processo de análise das implicações para a tecnologia e para a organização da incorporação RAMS na sua actividade passa, inicialmente, por uma identificação de contratos que apliquem e se baseiem nos factores RAMS e de contratos que, por oposição, careçam dessa abordagem. Estes últimos são, assim, como que uma referência para a aferição das alterações e implicações da incorporação RAMS nos contratos, por comparação. Os processos de comparação são tradicionalmente recorrentes na investigação científica. Segundo Swanson (1971), “Pensar sem comparação é impensável. E, na ausência de comparação, também o é o pensamento científico e a investigação científica”. Tendo em consideração que aspectos como as políticas de grupo corporativas (neste caso da Bombardier Transportation), a estratégia comercial da empresa ou a sua política de Investigação e Desenvolvimento (I&D) e cooperação podem influenciar o desenvolvimento dos factores RAMS, a mudança das cláusulas contratuais não é compreendida como a única causa da incorporação RAMS na actividade da BTP, embora seja considerada aquela que mais influência exerceu no curto prazo (pela necessidade de responder aos contratos respectivos). Assim, o processo de comparação segue a metodologia de comparação baseada em dois instantes: antes e depois. Em cada um desses instantes são identificados contratos representativos. A incorporação RAMS na actividade da BTP deu-se, em termos de implicação directa, pelas condições contratuais vigentes nos últimos dois contratos assumidos pela BTP21: Metro do Porto (MP) e CP2000. Estes contratos incluem a concepção e o fornecimento dos veículos de metro ligeiro para a cidade do Porto, no primeiro caso, e dos veículos ferroviários suburbanos da região do Porto, operados pela CP, no segundo. Por outro lado, identificaram-se dois contratos antigos da BTP, considerando a Disponibilidade de informação e uma proximidade no tipo de veículos, que reflectiam configurações contratuais tradicionais, com ausência de factores RAMS explícitos: Metropolitano de Lisboa (ML) e UQEs (Unidades Quádruplas Eléctricas) da linha de Sintra, operada pela CP. Para estabelecer uma matriz de comparação explicativa, definiram-se os estados denominados Pré-RAMS e RAMS e identificaram-se os contratos da BTP pertencentes a cada um deles, recorrendo-se ao estabelecimento de dois níveis de comparação, de acordo com o tipo de veículos e o seu objectivo. A Tabela 2 ilustra a matriz de comparação resultante. 21 Que incluem índices de Fiabilidade e Disponibilidade mínimos, sujeitos a penalidades (aplicadas ao fabricante) durante a operação dos veículos no seu período de garantia. Vide Capítulo 3.2.1. 49 NÍVEL DE NÍVEL DE COMPARAÇÃO I COMPARAÇÃO II ML e UQEs Sintra ML UQEs Sintra MP e CP2000 MP CP2000 ESTADOS CONTRATOS Pré-RAMS RAMS Tabela 2 – Matriz de comparação de contratos da BTP. A utilização de uma matriz orientada ao estudo de casos (cada um dos contratos) traduz-se, assim, numa abordagem holística, uma vez que trata os casos como um todo e não como uma soma de partes ou variáveis (normalmente associada a abordagens quantitativas). Os casos são encarados como configurações, ou seja, combinações de características. A comparação na tradição qualitativa envolve, assim, a comparação de configurações. O processo de comparação segue os princípios da Investigação Qualitativa (Strauss e Corbin, 1998). Trata-se de um processo não matemático de interpretação, desenvolvido com o propósito de descobrir conceitos e relacionamentos entre os dados e organizá-los num esquema teórico explicativo (processo de sistematização). A aplicação do processo de comparação baseia-se e influencia-se no Método Comparativo (Ragin, 1987), o qual tem sido tradicionalmente tratado como o método central das ciências sociais comparativas. No geral, a sua técnica de ilustração comparativa sistemática envolve a aplicação dos métodos de Mill (1843): Método da Concordância (Method of Agreement) e Método Indirecto da Diferença (Indirect Method of Difference). No seu trabalho inicial, Smelser (1973) chamou a esta análise sistemática de similaridades e diferenças o Método Comparativo, contrastando-o e distinguindo-o com o Método Estatístico. O Método Comparativo não trabalha com amostras ou populações mas sim com todas as instâncias relevantes do fenómeno ou caso em estudo. A aplicação do Método da Concordância baseia-se no seguinte: se um investigador procura saber a causa de um fenómeno, deverá inicialmente identificar as instâncias do fenómeno e depois determinar quais as circunstâncias que invariavelmente precedem a sua aparição. As circunstâncias que satisfazem esta condição são as causas. Essencialmente, o Método da Concordância traduz-se na procura por padrões de invariância. Mill acreditava que o problema principal deste método era a sua inabilidade para estabelecer qualquer ligação necessária entre causa e efeito, uma vez que o facto de determinadas circunstâncias estarem sempre presentes na ocorrência de um fenómeno não garantir que estas causam efectivamente esse fenómeno. O Método Indirecto da Diferença é, por seu lado, a aplicação dupla do Método da Concordância. Após a aplicação inicial deste, para se validar a causa/efeito volta-se a aplicar o método nos casos onde as instâncias do fenómeno não estão presentes, verificando-se a ausência das circunstâncias causais. Se todos os casos seguirem os binómios presente/presente e ausente/ausente, em termos de instâncias do fenómeno e 50 circunstâncias precedentes, então o argumento de que as últimas são a causa das primeiras é suportado. O estudo analisa a evolução do estado Pré-RAMS para o estado RAMS, ou seja, as consequências da incorporação RAMS na actividade da BTP. As variáveis a analisar são todos os aspectos relacionados, directa ou indirectamente, com os factores RAMS: evidência das condições contratuais para caracterização da incorporação RAMS e, em termos de instâncias do fenómeno, processos, metodologias e técnicas aplicadas na óptica RAMS, mudanças organizacionais decorrentes e aplicação de novas tecnologias. A complexidade causal não é considerada no estudo, como referido no início deste capítulo, dada a especificidade das instâncias do fenómeno em análise, directamente associadas com os factores RAMS (Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança) e o período temporal reduzido entre os dois estados (os contratos RAMS são imediatamente posteriores aos contratos Pré-RAMS considerados). Assume-se, assim, que a incorporação RAMS na BTP resulta exclusivamente das condições contratuais dos novos contratos da BTP. De forma a se proceder à sistematização da incorporação RAMS nos veículos ferroviários ao longo do seu ciclo de vida é fundamental que, em primeiro lugar, se defina precisamente o significado de ciclo de vida e se identifiquem as fases que o constituem. No âmbito deste estudo consideraram-se algumas fases que são essencialmente actividades, mais do que propriamente fases do ciclo de vida. É o caso da definição e estabelecimento dos cadernos de encargos e respectivas condições contratuais de cada contrato, fase que se assume como a origem directa da incorporação RAMS na actividade da BTP (pelo que é importante detalhar todos os seus aspectos), e a actividade de controlo da qualidade, após a fabricação e montagem dos veículos, pelo seu carácter de relevo e pelas suas particularidades na gestão dos factores RAMS (como já foi salientado anteriormente). A Figura 7 resume todas as fases identificadas para o ciclo de vida dos veículos ferroviários, na óptica RAMS. Cadernos de Encargos e Condições Contratuais Concepção e Design Fabricação Controlo de Qualidade Operação e Manutenção Figura 7 – Fases do Ciclo de Vida de veículos ferroviários numa óptica RAMS. A identificação das fases do ciclo de vida leva ao estabelecimento de níveis, onde a matriz de comparação vai ser aplicada. A Figura 7 pode ser novamente representada da seguinte forma – Figura 8. 51 NC 1 NC 2 ML + UQEs Sintra CONTRATOS RAMS: MP + CP2000 Cadernos de Encargos e Condições Contratuais Concepção e Design Fabricação Controlo de Qualidade Fases CONTRATOS PRÉ-RAMS: Operação e Manutenção Figura 8 – Matriz de Comparação dos contratos Pré-RAMS e RAMS ao longo do Ciclo de Vida de veículos ferroviários. A metodologia de análise utilizada neste estudo assenta na comparação, em cada uma das fases do ciclo de vida, entre os contratos em cada um dos dois níveis de comparação (NC). Existem, assim, dois níveis de comparação entre os estados PréRAMS e RAMS ao longo das diversas fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários. A comparação será baseada em instâncias do fenómeno como: processos, metodologias e técnicas aplicadas na óptica RAMS, mudanças organizacionais decorrentes e aplicação de novas tecnologias. As fontes de informação na base do estudo são de dois tipos: 1. Documentação disponível na BTP, essencialmente: programas de concurso e cadernos de encargos dos contratos em análise, condições contratuais dos contratos em análise, relatórios de contas da BTP, catálogos e documentação específica de cada departamento envolvido nas fases do ciclo de vida consideradas. 2. Entrevistas individuais, seguindo a metodologia apresentada por Schutt (1999) intensive interviewing - a elementos da BTP envolvidos directamente nos contratos em análise e, também, a elementos não envolvidos directamente nestes, mas cuja visão e compreensão do fenómeno em análise é muito relevante. As direcções e divisões da Bombardier Transportation (BT) envolvidos são: • Direcção de Engenharia da Divisão Industrial da Amadora (BTP) • Direcção de Serviços Técnicos da Divisão Industrial da Amadora (BTP) • Direcção de Qualidade da Divisão Industrial da Amadora (BTP) • Direcção de Vendas da Divisão LRV • Direcção de Gestão de Projectos – Metro do Porto – da Divisão LRV • Direcção de Gestão de Projectos – CP2000 – da Divisão de Veículos Suburbanos e Regionais 52 • Administração da Divisão Industrial da Amadora (BTP) 3. Uma sessão de Focus Group, seguindo a metodologia apresentada por Morgan (1996) e Schutt (1999), com presença de elementos das divisões referidas, excluindo a Administração, considerando-se que diferentes níveis hierárquicos podem condicionar a participação efectiva dos elementos com níveis hierárquicos inferiores. Adicionalmente, são referenciadas diversas obras bibliográficas ao longo do estudo, as quais dão suporte aos temas abordados e desenvolvidos. A partir dos resultados da matriz de comparação será constituído o modelo resultante da incorporação RAMS na actividade da BTP, ao nível das técnicas e metodologias aplicadas, mudanças organizacionais e implicações na tecnologia. Este modelo será confrontado com outros factores cuja implementação não se tenha ainda verificado mas que, pela sua relevância global na óptica RAMS ou para a BTP, devam ser considerados. Esta confrontação leva a um processo de integração que estará na base da constituição e proposta de um modelo RAMS para o ciclo de vida completo dos veículos ferroviários. Na segunda fase da análise, tem-se como objectivo analisar uma das formas de absorção de conhecimento, relativa às actividades de cooperação em I&D, aqui no âmbito dos factores RAMS. Nesse sentido, foram identificados e caracterizados quatro projectos de cooperação em I&D com a participação da BTP e de outras entidades privadas e públicas (algumas ligadas ao ensino). Na Tabela 3, apresentam-se esses projectos e a sua caracterização. A metodologia de análise baseia-se na identificação do papel de cada entidade integrada no grupo de cooperação, caracterizado pelas tarefas por si desenvolvidas e nos resultados obtidos no processo (produtos de cooperação em I&D). A confrontação destes dois vectores permite compreender, por um lado, o papel específico de cada entidade no grupo de cooperação, que potencia a absorção de conhecimento por parte das outras entidades (transbordo de saída), e, por outro lado, a absorção de conhecimento de cada entidade (transbordo de entrada), resultante do acesso e da ligação à actividade das restantes. A absorção de conhecimento produz normalmente efeitos globais a dois níveis: (I) expandindo o conhecimento em temáticas já com algum desenvolvimento prévio (que se decidiu denominar efeito de expansão) ou (II) iniciando ou habilitando o desenvolvimento de conhecimento em áreas desconhecidas ou com baixo grau de desenvolvimento (que se denominou efeito de habilitação). Com este objectivo foram concebidos os mapas de tarefas e produtos para cada um dos projectos de cooperação em I&D considerados. Nestes mapas podem-se verificar as tarefas desenvolvidas por cada entidade ao longo do projecto de I&D, bem como os produtos resultantes para cada uma delas. 53 Após se analisar o modelo dos fluxos de transbordo nos grupos de cooperação procede-se, de seguida, à análise dos produtos (resultados), para a BTP, dos diversos projectos de cooperação em I&D considerados com o objectivo de verificar o seu papel na redução do risco da empresa, ao nível da Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança dos veículos, nos contratos com imposições sobre os factores RAMS. Para clarificar melhor esta temática e o seu enquadramento recorreu-se à taxonomia proposta por Lemos, Betts, Eaton e Almeida (2001) para a gestão do risco, a qual é baseada no ciclo de vida completo da incerteza do risco em projectos do tipo PFI (Private Finance Initiative), isto é, parceria publico-privada. Nesta abordagem, os riscos globais são: • • • • • • • • • • • • Políticos e de Regulamentação Sociais Económicos e Financeiros Legais Comerciais Negociais De Design De Construção Operacionais e de Manutenção De Valor residual De Força Maior Humanos A cooperação entre empresas em actividades de I&D assenta essencialmente na gestão do risco de design (concepção), embora outros também possam adquirir um papel relevante (nomeadamente a gestão dos riscos sociais e humanos que não vai ser aqui desenvolvida pela menor relevância para o estudo presente). Não faz parte desta análise o desenvolvimento de cada um dos níveis de risco, mas é importante compreender a relação das actividades de cooperação em I&D com alguns desses níveis. O risco associado ao design ou concepção do produto é o risco que o design deste não cumpra com o desempenho de qualidade pretendido, não correspondendo assim com as especificações do produto pretendidas para o seu posicionamento no mercado. Nesta análise no âmbito da Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança. A cooperação entre empresas durante a fase de concepção de produtos, em I&D, poderá potenciar a inovação e o desenvolvimento tecnológico, pela complementaridade de valências entre as empresas e pela partilha dos custos de investimento. Através da cooperação a empresa pretende reduzir o seu risco de desajuste tecnológico e design, face à vanguarda do mercado, partilhando informação e controlando as forças competitivas. 54 Este tipo de risco está intimamente relacionado com outro tipo de risco – o risco comercial – na medida em que as suas implicações podem afectar as receitas da empresa, pela redução da procura dos seus produtos em prol de bens substitutos. Por outro lado, no modelo de negócio implícito aos contratos RAMS, o risco operacional e de manutenção pode ser muito significativo, relacionado com possíveis desvios do nível de serviço das especificações acordadas no contrato (é o caso das penalidades aplicadas ao incumprimento da Fiabilidade e Disponibilidade acordadas). Desta forma, a cooperação em I&D entre empresas pode ser empreendida com o objectivo de redução deste tipo de risco, na procura da excelência do produto e/ou serviço, minimizando a probabilidade de ocorrência desses desvios. De acordo com esta abordagem para a gestão do risco, considerou-se a incerteza e o risco resultante fundamentalmente a estes três níveis: risco comercial, risco de design e risco operacional e de manutenção. Estes níveis são condicionados pela função de concepção do produto e a sua optimização, através da melhoria e/ou intensificação das actividades de I&D. O objectivo último desta abordagem é compreender a validade das actividades de cooperação em I&D para a redução do risco, ao nível dos factores RAMS, que a BTP enfrenta, considerando-se que a I&D não se desenvolveria da mesma forma e com os mesmos resultados isoladamente, em períodos temporais razoáveis e com custos viáveis. Caso se verifique uma redução do risco relativo à Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança, nos contratos RAMS, como resultado da cooperação em I&D, conclui-se que esta, pela absorção de conhecimento específico, teve um papel efectivo na incorporação RAMS. A metodologia seguida consiste em confrontar os produtos dos diversos projectos de cooperação em I&D com cada um dos níveis de risco mencionados, numa óptica RAMS. Esta confrontação procura salientar os efeitos produzidos pelos produtos da cooperação em I&D em cada um desses níveis, isto é, as proporções da redução que lhe impinge. A métrica utilizada não tem dimensões absolutas, mas sim relativas, baseando-se no modelo desenvolvido por Bana e Costa (2001) para os modelos de apoio à decisão: Macbeth. O processo consiste no estabelecimento de duas alternativas fictícias, aqui no âmbito das configurações dos produtos da cooperação em I&D: alternativa boa e alternativa neutra. A primeira é considerada produzir uma redução do risco muito significativa sobre cada um dos níveis considerados. A segunda é considerada indiferente na actuação sobre cada um desses níveis, ou seja, produz uma redução nula em cada um deles. Estas alternativas servem de referência para a atribuição de um valor relativo à redução, em cada um dos níveis de risco, imposta pelos produtos da cooperação em I&D em cada projecto. As reduções foram classificadas segundo vários níveis, definidos segundo o modelo Macbeth: sem redução (referenciada pela alternativa neutra), redução muito pequena, redução pequena, redução moderada, redução forte 55 (referenciada pela alternativa boa), redução muito forte, redução extrema e, redução positiva (é prevista uma redução mas com dificuldade de quantificação relativa). O processo continua com a atribuição dos efeitos provocados pelos produtos da cooperação em I&D de cada projecto da BTP em cada nível de risco considerado, numa óptica RAMS, assumindo-se como referência as duas alternativas/projectos fictícios (com uma configuração de resultados fictícia mas clara e exemplificativa). Este enquadramento, dada a forte relação da gestão de risco, nos três níveis considerados, com o mercado e a sua percepção, foi efectuado separadamente pelas Direcções apresentadas de seguida, através de entrevistas, no intuito de se obter uma matriz de resultados finais validada por cada uma dessas funções da empresa: • Direcção de Engenharia da Divisão Industrial da Amadora (BTP) • Direcção de Vendas da Divisão LRV • Administração da Divisão Industrial da Amadora (BTP) No processo de agregação, quando as três matrizes não apresentam resultados iguais, decidiu-se considerar o pior resultado verificado em termos de redução desse nível de risco (i.e. uma redução pequena com uma redução moderada e mais uma redução forte dá origem na matriz agregada a uma redução pequena). Uma redução positiva não é considerada para a matriz agregada, pois tanto poderia ser forte como pequena, dando-se benefício a classificações relativas exactas (apenas a agregação de três classificações de redução positiva levaria a esse resultado na matriz agregada). A construção da Matriz de Redução do Risco Agregada, a partir das Matrizes de Redução do Risco Parcial, viabiliza o desenvolvimento das conclusões. 56 Identificação do projecto de cooperação em I&D SEM XXI Safetrain Promotores 1. ADtranz – Sorefame 2. Efacec – Serviços de Manutenção e Assistência 3. EMEF - Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário 4. MIIT – Manutenção Industrial Informatizada e Tecnologia 5. IST - IDMEC 6. INETI – Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial 7. ISQ – Instituto da Soldadura e Qualidade 8. INEGI – Instituto de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial 9. FEUP – Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto 1. ADtranz 2. Bombardier Transportation Berlin 3. Alstom Transport de Dietrich et Valenciennes 4. Siemens T. Systems 5. Deutsche Bahn AG 6. Société National de Chemin de Fer 7. AEA Technology Rail 8. Centrum Naukowo – Techniczne Kolejnictwa 9. Cranfield Impact Centre 10. European Rail Research Inst. 11. Instituto Superior Técnico 12. Faculdade Motricidade Humana 13. Technische Universitat Dresden 14. University of Valenciennes and Hainaut Cambresis Coordenador Anos de desenvolvimento ADtranz 1998-2000 Entidades subsidiadoras POE / Projecto Mobilizador Âmbito Modernização do Sistema Ferroviário Português e do tecido industrial de material circulante através do desenvolvimento e implementação de um sistema de exploração e manutenção. Não houve registo de patentes. BT 1997-2001 Comunidade Europeia Atingir o estabelecimento de normas e códigos gerais quanto à segurança e ao comportamento do material circulante relativamente à segurança passiva. Foi registada uma patente – Sliding Driver’s Seat - pela Deutsche Bahn AG e pela Bombardier Transportation Berlin. Tabela 3 – Projectos de Cooperação em I&D (CI&D) com participação da BTP 57 Identificação do projecto de cooperação em I&D Safetram Platsub - Validação Promotores 1. BT 2. Bombardier Transportation Nuremberg 3. Alstom Transport - ALS 4. Deutsche Bahn AG 5. Société National de Chemin de Fer 6. Berliner Verkehrsbetriebe- BVG 7. Alcan Alesa Engineering LTD. 8. Breda Costruzioni Ferroviarie 9. Centrum Naukowo – Techniczne Kolejnictwa 10. Régie Autonome des Transports Parisiens 11. Motor Industry Research Association 12. IST - IDMEC 13. Technische Universitat Berlin 1. BT 2. IST - IDMEC 3. INEGI - Instituto de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial 4. Escola Superior de Tecnologia de Setúbal 5. Fernando J. F. Vazão, Lda. Coordenador Anos de desenvolvimento Entidades subsidiadoras BT 2001-2004 União Europeia Âmbito Definição das condições de segurança passiva para os metros ligeiros urbanos (city trams) e suburbanos (periurban trams) na Europa. Está previsto o registo de patentes. BT 2000-2001 União Europeia Validação da Plataforma de Unidades Múltiplas para Serviço SuburbanoPlatsub (tipo CP2000). Não houve registo de patentes. Tabela 3 (continuação) - Projectos de Cooperação em I&D (CI&D) com participação da BTP 58 III. Aplicação da metodologia de análise ao caso da BTP III.I. Introdução No âmbito da sistematização da problemática da incorporação RAMS na actividade da BTP, inicia-se a análise comparativa entre os estados Pré-RAMS e RAMS nas diversas fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários. O processo de análise baseia-se na metodologia descrita anteriormente e é identificado como a Fase 1 da análise. Salienta-se que os contratos utilizados nesta análise (ML, UQE’s Sintra, MP e CP2000) apresentam algumas características base, do seu modelo contratual, semelhantes: • Testes e ensaios estáticos dos veículos validados antes da autorização de saída da fábrica dos veículos (efectivada pelo boletim de saída da fábrica do cliente) • Testes e ensaios dinâmicos dos veículos em linha, para validar as especificações funcionais • Recepção provisória dos veículos pelo cliente, através da validação dos testes referidos no ponto anterior, com início do período de garantia dos veículos (também chamado período de demonstração) • Operação dos veículos durante o período de garantia, com a manutenção correctiva da responsabilidade do fabricante • Recepção definitiva dos veículos pelo cliente e fim da garantia destes, com a validação da demonstração dos sistemas. Nesta fase é terminado o vínculo global do fabricante aos veículos (com excepção dos sistemas dos veículos com garantias particulares e do fornecimento de peças de reserva para os veículos). As diferenças entre as condições contratuais ocorrem essencialmente na forma, condições e características de cada uma destas etapas. É de referir que a operação dos veículos durante o período de garantia é, normalmente, da responsabilidade dos clientes da BTP. No entanto, o contrato do MP segue outros contornos, tendo sido adjudicado ao consórcio onde se inclui a BTP um pacote global para a construção e fornecimento de todo o sistema de transporte, incluindo a construção das infra-estruturas de suporte à operação, o fornecimento dos veículos e a sua operação durante o período de garantia. O processo de análise seguinte explora as diferenças significativas, numa óptica RAMS, entre os contratos do estado RAMS e os contratos do estado Pré-RAMS, nas fases do ciclo de vida consideradas para os veículos ferroviários. Na Fase 2 deste estudo aplica-se a metodologia de análise exposta para testar a hipótese de as actividades de cooperação em I&D empreendidas pela BTP promoverem a absorção de conhecimento específico RAMS necessário para a adequada incorporação RAMS na actividade da empresa. Embora assumindo-se que este processo não representa a única forma de endogeneização de conhecimento RAMS é, como já referido, uma das formas mais habitualmente referenciadas pela literatura com esse propósito. 59 III.II. Fase 1 – Sistematização da Incorporação RAMS III.II.I. Cadernos de Encargos e Condições Contratuais Tendo-se salientado o facto que os cadernos de encargos e as condições contratuais dos contratos do MP e CP2000 terem estado na origem da incorporação RAMS na actividade da BTP, convém agora caracterizar exactamente essa implicação para se perceber o seu alcance e os seus contornos globais. Para tal, foram analisados os documentos de base dos contratos, tendo sido reunida toda a informação com relação directa ou indirecta com os factores RAMS. Na Tabela 4 e na Tabela 5 sintetiza-se todos os aspectos com ligação aos factores RAMS no nível de comparação I e II respectivamente. Estes aspectos referem-se não só a índices mas também a outros parâmetros ou condições que estejam directa ou indirectamente relacionados com os factores RAMS. No que confere a índices, as condições contratuais apresentam, em alguns contratos, penalidades para o incumprimento de determinados níveis pré-definidos. Embora não esteja no âmbito deste estudo a quantificação exacta das penalidades aplicáveis em função do incumprimento das exigências de cada contrato face a esse índices, salienta-se que estas são relevantes e atingem valores proporcionalmente muito significativos face ao valor global dos contratos (vide tabelas). Existe, assim, uma transferência do risco22 do cliente (operador) para o fabricante. Segundo a taxonomia proposta por Lemos, Betts, Eaton e Almeida (2001) para a gestão do risco, a qual é baseada no ciclo de vida completo da incerteza do risco em projectos do tipo PFI (Private Finance Initiative), a BTP absorveu uma parte dos riscos operacionais e de manutenção habitualmente associados aos clientes (operadores). Este nível de risco está relacionado com possíveis desvios do nível de serviço das especificações acordadas no contrato. De seguida referem-se os aspectos mais significativos da análise comparativa efectuada nos dois níveis de comparação. No âmbito da Fiabilidade, tradicionalmente todos os contratos, incluindo os actualmente em estudo, incluem um Período de Garantia para os sistemas a fornecer, durante o qual a reparação e substituição de componentes e a reposição das condições regulares de funcionamento estão a cargo e são da responsabilidade do fabricante, assumindo este todos os custos daí decorrentes. É um aspecto que está directamente relacionado com a Fiabilidade dos sistemas pois o seu objectivo está direccionado para as situações de ocorrência de falhas nos sistemas. Adicionalmente, alguns contratos incluem Garantias Particulares aplicadas a alguns componentes ou sub-sistemas, normalmente críticos para o funcionamento regular do sistema, as quais têm um período de garantia mais amplo que o período de garantia global dos sistemas. Em ambos os 22 O significado de risco utilizado nesta abordagem segue a definição de Covello e Merkhofer (1993), segundo a qual o risco é a característica de uma situação ou acção onde dois ou mais cenários resultantes são possíveis, o cenário resultante que irá ocorrer é desconhecido e pelo menos uma das possibilidades é indesejável. 60 níveis de comparação o Período de Garantia dos Sistemas aumentou do estado PréRAMS para o estado RAMS. No que compete às garantias particulares estas apresentam uma evolução diversa: no nível de comparação I, o contrato Pré-RAMS apresentava garantias particulares significativas enquanto que o contrato RAMS não inclui esse tipo de garantias; no nível de comparação II, pelo contrário, o contrato Pré-RAMS não apresentava garantias particulares enquanto que o contrato RAMS passou a incluir diversas garantias. Na Figura 9 e na Figura 10 ilustram-se estas tendências, salientandose que ao nível do período de garantia normal dos veículos existe uma clara transferência de parte do risco associado à operação e manutenção dos veículos do operador para o fabricante. Período de Garantia (anos) 5 Nível de Comparação I 3 Nível de Comparação II 2 Risco de Operação e Manutenção para o fabricante Pré-RAMS RAMS estados Figura 9 – Variação do Período de Garantia do estado Pré-RAMS para RAMS. Nível de Comparação I 1 Nível de Comparação II Risco de Operação e Manutenção para o fabricante 0 Pré-RAMS RAMS estados Figura 10 - Variação das garantias particulares do estado Pré-RAMS para RAMS. 61 Um outro aspecto relacionado com a Fiabilidade, referido habitualmente nos contratos, é a possibilidade de incorporação de técnicos do cliente (operador) durante as inspecções, verificações e ensaios durante a fabricação, montagem e instalação dos veículos, efectuando o acompanhamento destas actividades, podendo o cliente, em qualquer altura, solicitar melhorias na Fiabilidade ou qualidade global dos sistemas se estes não estiverem em conformidade com as suas especificações. Uma vez que esta situação está prevista em todos os contratos em análise (Pré-RAMS e RAMS), com os mesmos contornos globais, não se vai aprofundar aqui este tema. É de salientar ainda que, durante os períodos de garantia dos sistemas (durante a sua operação), a Fiabilidade destes é acompanhada e analisada pelo cliente, devendo ser coerente com o planeado e definido originalmente para os sistemas. No caso contrário, o cliente tem o direito de reivindicar a substituição dos sistemas ou a sua respectiva correcção. Esta condição está também presente em todos os contratos em análise (Pré-RAMS e RAMS), com os mesmos contornos globais. Por fim, sendo, no entanto, o aspecto mais significativo no que respeita ao factor Fiabilidade, é de referir a inclusão, nas condições contratuais dos contratos considerados no estado RAMS, de indicadores de Fiabilidade com níveis a cumprir durante a operação dos veículos no seu período de garantia. A não conformidade com estes limites mínimos leva à aplicação de penalidades pelo cliente ao fabricante. Estas penalidades são muito significativas e podem ameaçar a viabilidade comercial do contrato, do ponto de vista do fabricante. Existe, assim, como resultado, uma transferência do risco de operação e manutenção do cliente (operador) para o fabricante. Convém, no entanto, salientar que o caso do MP é muito particular, pois existe um consórcio de empresas para a Operação e Manutenção dos veículos durante o período de garantia, no qual se inclui o fabricante. O Cliente é o MP que paga uma prestação mensal pela operação e manutenção do serviço de transporte de pessoas. Nesta perspectiva, a transferência do risco é do MP (cliente) para o consórcio que opera e mantém o serviço de transporte. Os índices de Fiabilidade referidos são o MDBF (Mean Distance Between Failures), sendo a distância em Km, e o Nº de Incidentes por Milhão de Km. As especificações detalhadas destes índices estão na Tabela 4 e na Tabela 5. Na Figura 11 ilustra-se o efeito das exigências contratuais segundo estes índices e a potencial aplicação de penalidades durante o período de garantia, o que se reflecte numa transferência de parte do risco associado à operação e manutenção dos veículos do operador para o fabricante. O índice de Fiabilidade da CP está caracterizado na sua norma CP 9209.35. 62 FACTORES RAMS ÍNDICES E CONDIÇÕES RAMS PRÉ-RAMS RAMS Contrato UQEs Sintra Contrato CP2000 PENALIZAÇÕES - 95.000 / MDBFreal ≤ 1 ou MDBFreal ≥ 95.000 Penaliz. = = (95.000/MDBFreal - 1) * factura mensal MKBF ou MDBF Apresentado pelo fabricante na proposta para os sistemas mais críticos. Apresentado pelo fabricante na proposta para os sistemas mais críticos. Não existem. MKBF: Mean Kilometer Between Failures . A falha (failure) é considerada uma perturbação na exploração com uma penalização igual ou superior a 2 minutos ou que implique a retirada da composição de serviço. Garantia dos sistemas 2 anos 5 anos Custos de reparações , modificações e substituições O período de garantia inicia-se após a recepção provisória de cada composição. Entre 3 e 10 anos. A maioria das partes dos sistemas consideradas no CE tem uma garantia particular de 4 ou 5 anos. Apenas os bancos têm uma garantia de 3 anos e a estrutura das caixas de 10 anos. - Custos de reparações , modificações e substituições O período de garantia inicia-se imediatamente após a recepção provisória de cada UQE. Garantias particulares de partes dos sistemas: • Caixas; • Bogies; • Equipamento de produção de ar; • Equipamento eléctrico e electrónico; • Cablagem. Percentagens da factura mensal: Ds ∈ [97,50; 97,99] => 98% Ds ∈ [97,00; 97,49] => 95% Ds (disponibilidade do serviço) - Ds ≥ 98% Ds ∈ [96,50; 96,99] => 90% Ds ∈ [96,00; 96,49] => 80% Ds ∈ [95,50; 95,99] => 60% DISPONIBILIDADE SEGURANÇA MDBF: Percurso médio entre falhas, considerando como falha uma avaria do material circulante, atribuída a causas técnicas, que provoque interrupção na circulação superior a 5 minutos, evacuação ou transbordo de passageiros ou supressão de um serviço. MDBFcont: MDBF contratual definido em 95.000 Km. MDBFreal: MDBF real acumulado, calculado com base nos relatórios de ocorrências diárias. MDBFcont/MDBFreal Com MDBFcont=95.000Km FIABILIDADE MANUTIBILIDADE OBSERVAÇÕES Ds ∈ [95,00; 95,49] => 30% Ds abaixo de 95,00 => 0% Penaliz. = (98-Df)*factura mensal / 100 Máximo: 20% da factura mensal Ds: (Horas de Operação Programadas – Horas de Interrupção de Operação) / Horas de Operação Programadas Horas de Operação Programadas: Tempo total, em horas, que o sistema está programado para que proporcione serviço aos passageiros, em regime de exploração normal. Horas de Interrupção de Operação: Tempo total ponderado (de acordo com ponderações estabelecidas no caderno de encargos para diferentes períodos do dia), em horas, de todas as interrupções de serviço que ocorrem enquanto o sistema está programado para proporcionar serviço em regime de exploração normal, devida a falha nas instalações ou equipamentos. Df: Comboios em serviço x 100 / Comboios programados. As medidas são diárias mas avaliam-se mensalmente. Df (disponibilidade da frota) - Df ≥ 98% Tempo Paragem - T paragem mensal ≤ 100 h (Relacionada com a Disponibilidade) - - - - Especificações sobre Segurança Activa Sim Sim - - Especificações sobre Segurança Passiva Não Não - - Sistema de Gestão da Segurança Não Sim - - Penaliz.= T paragem mensal: Tempo total ponderado (de acordo com = (Tpar. mens. -100) / 100]*factura mensal ponderações estabelecidas no caderno de encargos para diferentes períodos do dia) de paragem real. Máximo: 10% da factura mensal Tabela 4 – Implicações sobre os factores RAMS presentes nos cadernos de encargos e condições contratuais dos contratos BTP considerados no nível de comparação I. 63 FACTORES RAMS FIABILIDADE ÍNDICES E CONDIÇÕES RAMS PRÉ-RAMS RAMS Contrato UQEs Sintra Contrato CP2000 PENALIZAÇÕES OBSERVAÇÕES Incidente: qualquer evento que corresponda a uma das seguintes definições: • Incidente com perda de tempo de operação superior a 5 minutos; • Incidente com assistência; • Incidente com supressão da circulação. Incidentes / Milhão Km da frota - < 4 O nº de Incidentes actual da frota, para o total de Km percorridos pelos veículos, é extrapolado para um milhão de Km. Em caso de incumprimento a garantia é incrementada pelo período respectivo. Garantia dos sistemas 2 anos 3 anos Custos de reparações , modificações e substituições O período de garantia inicia-se imediatamente após a recepção provisória de cada UQE. - 5 anos ou 800 000 Km (o que ocorrer primeiro) Custos de reparações , modificações e substituições O período de garantia inicia-se imediatamente após a recepção provisória de cada UQE. Garantias particulares dos sistemas: • Motores de tracção; • Redutores e transmissões; • Rodados completos; • Pintura exterior da caixa; • Conversores electrónicos potência. 0,2 %ο do valor actualizado da primeira UQE DCR / AFE - = 100% recepcionada provisoriamente por dia de incumprimento. Máximo: 10% do valor actualizado da UQE DISPONIBILIDADE AFE: Veículos ferroviários associados. No total de 22 UMEs (unidades múltiplas eléctricas) neste contrato. DCR: Disponibilidade Corrigida. É a quantidade de UMEs calculada pela formula: DCR = Dix + (UMEs sob manutenção programada de nível 3 ou acima + UMEs fora de serviço por causa não imputável ao fornecedor). Dix: Disponibilidade imediata. Quantidade de UMEs efectivamente disponíveis, em termos das suas condições operacionais, que permitam a sua operação pelo cliente. A disponibilidade imediata é aferida às 8H e às 16H de cada dia. O DCR / AFE tem de ser 100% em pelos menos um desses instantes diários. São consideradas imobilizadas (paradas) as UQEs que por MANUTIBILIDADE SEGURANÇA 1 %ο do valor actualizado da respectiva UQE /dia. motivo de defeito de responsabilidade comprovada do fabricante Tempo Paragem Total por UQE (durante o período de garantia) ≤ 30 dias ≤ 30 dias Máximo: 10% do valor actualizado da UQE. Máximo: 15% da soma dos valores actualizados (índice anterior e o presente) (Relacionada com a Disponibilidade) - - - - Especificações sobre Segurança Activa Sim Sim - - Especificações sobre Segurança Passiva Não Não - - Sistema de Gestão da Segurança Não Não - - se encontrem imobilizadas durante um dia completo (das 0 às 24h), excepto as UQEs que se encontrem em revisão programada. Tabela 5 - Implicações sobre os factores RAMS presentes nos cadernos de encargos e condições contratuais dos contratos BTP considerados no nível de comparação II. 64 MDBF real mínimo (Km) Nº Incidentes por M.Km 95.000 Nível de Comparação I 4 Nível de Comparação II Risco de Operação e Manutenção para o fabricante 0 Pré-RAMS RAMS estados 0 Figura 11 - Variação das exigências dos contratos sobre os índices de Fiabilidade do estado Pré-RAMS para RAMS. Passando, agora, para a análise do factor Disponibilidade, salienta-se que, por um lado, no nível de comparação I, de uma inexistência absoluta em termos de exigências contratuais sobre este factor, no estado Pré-RAMS, passou-se para um enfoque muito significativo sobre este factor, no estado RAMS, onde sobressaem diversos indicadores de Disponibilidade com níveis mínimos a cumprir durante a operação no período de garantia (Ds, Df e Tparagem mensal). Por outro lado, no nível de comparação II, o índice Tempo Total de Paragem por UQE existe em ambos os estados, Pré-RAMS e RAMS, com o mesmo significado e níveis exigidos pelos contratos, surgindo, no entanto, um novo índice no estado RAMS: a Disponibilidade dos Veículos (DCR/AFE) medida em dois instantes diários (durante a operação no período de garantia). Este índice, quando abaixo de 100%, implica a aplicação de penalidades ao fabricante. Distinguem-se, assim, dois tipos de índices de Disponibilidade, acumulados e pontuais: os índices Tempo de Paragem Total por UQE e Tparagem mensal pertencem ao primeiro, enquanto que os índices Ds, Df e DCR/AFE pertencem ao segundo. É de salientar um acréscimo muito significativo do risco assumido pelo fabricante, transferido do seu cliente (operador), no âmbito da aplicação dos índices pontuais de Disponibilidade, medidos durante a operação dos veículos no período de garantia, com aplicação de penalidades ao fabricante por incumprimento dos níveis definidos nos contratos. Efectivamente, passou-se de um estado Pré-RAMS onde a Disponibilidade era medida e tinha implicações em termos de penalidades apenas na vertente acumulada (com base no nível de comparação II) para uma situação RAMS (com evidência nos dois níveis de comparação) onde a Disponibilidade, além da sua vertente acumulada, envolve medições em contínuo durante a operação dos veículos no seu período de garantia, com aplicação de penalidades sempre que os níveis assumidos no contrato não são verificados. A Figura 12 e a Figura 13 caracterizam estes processos. 65 T total paragem/UQE (dias) T par. Mens. (horas) 100 Nível de Comparação I 30 Nível de Comparação II Risco de Operação e Manutenção para o fabricante 0 RAMS estados Figura 12 - Variação das exigências dos contratos sobre os índices acumulados de Disponibilidade do estado Pré-RAMS para RAMS. DCR/AFE Ds (%), Df (%) (%) 100 98 Nível de Comparação I Nível de Comparação II Risco de Operação e Manutenção para o fabricante 0 Pré-RAMS RAMS estados 0 Figura 13 - Variação das exigências dos contratos sobre os índices pontuais de Disponibilidade Ds, Df e DCR/AFE do estado Pré-RAMS para RAMS. A Disponibilidade é, pelas implicações elevadas e amplas dos índices aplicados nos contratos RAMS para o fabricante, com um reflexo contínuo durante a operação em todo o período de garantia dos veículos, o factor RAMS mais saliente na incorporação RAMS na actividade da BTP. Convém referir que as penalidades apenas são aplicadas durante o período de garantia, uma vez que apenas durante este período as actividades de manutenção dos sistemas são executadas (no caso da manutenção correctiva) ou acompanhadas (essencialmente a manutenção preventiva) pelo fabricante, as quais são essenciais para a manutenção dos índices de Fiabilidade (e Disponibilidade) inerentes dos sistemas. O índice de Fiabilidade utilizado pela CP está caracterizado na sua Norma CP 9412.001. Abordando agora o factor da Manutibilidade, é de referir que em todos os cadernos de encargos e contratos considerados, nos estados Pré-RAMS e RAMS, não é exigido 66 em concreto o cumprimento de aspectos ou índices relacionados com este factor RAMS. Contudo, a Manutibilidade dos veículos ferroviários encontra-se, como já salientado, associada à Disponibilidade dos mesmos. Quanto maior a Manutibilidade, menor é o tempo necessário para repor a operacionalidade (Disponibilidade) em caso de intervenções de manutenção, pelo que a Disponibilidade é maior. Nesse sentido, o factor Manutibilidade aplicado aos veículos ferroviários passa a ser crucial em contratos com condições no âmbito do cumprimento de índices de Disponibilidade. Embora não aferidos directamente por imposições dos contratos, os índices de Manutibilidade são fulcrais na gestão da Disponibilidade dos veículos. Assim, o factor Manutibilidade assume-se como um factor crítico nos contratos RAMS, embora não explícito nas condições contratuais, na gestão do risco do fabricante durante a operação dos veículos no período de garantia. É ainda de salientar que, no nível de comparação I, os cadernos de encargos e as condições contratuais do contrato do ML (estado Pré-RAMS) referem a necessidade dos sistemas terem uma elevada Manutibilidade, além de alguns sistemas electro-mecânicos estarem preparados para a aplicação de Manutenção Condicionada. Embora sem o estabelecimento ou referência a quaisquer índices nas condições contratuais, estes factores são aferidos globalmente durante a operação dos veículos no período de garantia, podendo o cliente (operador) reivindicar a sua correcção ou optimização durante este período, só efectuando a recepção definitiva quando verificados os valores definidos e estabelecidos inicialmente. De qualquer das formas, o risco inerente à operação dos veículos, por incerteza no factor Manutibilidade, estava essencialmente do lado do cliente (operador). O último dos factores RAMS, embora naturalmente não menos importante, é a Segurança. Este factor tem sido abordado tradicionalmente no sector ferroviário, como noutros sectores de transporte, nomeadamente a aviação, pela dimensão das implicações que a não Segurança pode originar, considerando o transporte de um número de pessoas muito elevado. Desta forma, há muito que a concepção e operação de veículos ferroviários entra em linha de conta com critérios de Segurança. No entanto, algo de novo tem-se verificado nesta área, basicamente no que compete à gestão da Segurança durante a operação dos veículos. O factor de Segurança não é seguido com base numa métrica de análise, com recurso a índices, em qualquer caderno de encargos Pré-RAMS ou RAMS. As considerações dos cadernos de encargos sobre a Segurança sempre estiveram, no estado Pré-RAMS, associadas a especificações técnicas sobre os sistemas críticos dos veículos para a Segurança destes e pela necessidade de caracterização pormenorizada desses sistemas pelo fabricante, com referência também aos sistemas de Segurança Activa dos veículos: caixas com materiais não inflamáveis, tipos de freios, circuito de Segurança, sinais de alarme e dispositivos de “homem-morto”, são exemplos de sistemas críticos de Segurança dos veículos, enquanto que o dispositivo de travagem automática e/ou 67 controlo de velocidade são sistemas no âmbito da Segurança Activa. Estas especificações técnicas são comuns em todos os contratos da BTP em análise (estado Pré-RAMS e RAMS), com os mesmos contornos de uma forma global, pelo que não se faz aqui a sua distinção pormenorizada. Por outro lado, como já assinalado, a segunda vertente da Segurança é a gestão das situações de perigo eminente ou emergência decorrentes de incidentes ou acidentes e a respectiva minimização das consequências para a vida humana e ambiente. Este aspecto, embora omisso nos contratos Pré-RAMS, é observado no contrato RAMS do ML, onde existem várias condições e solicitações para a definição e disponibilização de documentos pelo fabricante no âmbito da Segurança dos veículos e sistemas (Sistema de Gestão da Segurança), nomeadamente o Plano de Garantia da Segurança da Operação, que inclui: plano de Segurança, manual de procedimentos de emergência e normas de Segurança. Trata-se de uma novidade introduzida num contrato RAMS, pelo que convém especificar em detalhe o seu significado. A estrutura de um plano de Segurança inclui normalmente os seguintes aspectos: • Identificação da Política de Segurança relativamente à saúde e à Segurança de todos os que podem ser afectados pelo exercício das actividades de operação do sistema • Incluir disposições visando a avaliação e o controlo de riscos • Explicitar os procedimentos a seguir em casos de avaria ou acidente • Incluir indicações quanto à velocidade e número de passageiros a serem transportados • Referir aspectos que podem afectar a Segurança, descrevendo em geral os relativos ao material circulante e referindo especialmente as disposições relativas ao acesso e à saída de passageiros • Incluir referências às especificações técnicas dos veículos a aos padrões de manutenção a observar. Por outro lado, o manual de procedimentos de emergência indica o papel a desempenhar e as responsabilidades de cada entidade face a eventuais incidentes ou acidentes, enquanto as normas de Segurança estabelecem a regulamentação ou normalização necessárias, úteis ou essenciais em termos de Segurança ferroviária. Existe, assim, uma mudança na forma em que a Segurança é encarada no estado RAMS, embora apenas confirmada no nível de comparação I. Pela colaboração e vínculo na definição do sistema global de Segurança e na sua gestão, o fabricante assume responsabilidades adicionais em caso de situações de perigo, acrescidas pela colagem das implicações à sua imagem e ao seu desempenho. É de referir que esta novidade no factor Segurança poderá estar directamente relacionada com o formato do contrato em si, pois como já referido, o contrato do MP inclui também a operação e 68 manutenção dos veículos durante o período de garantia. A Figura 14 e a Figura 15 retratam estes processos (1: sim; 0: não). Segurança Geral e Segurança Activa 1 Nível de Comparação I Nível de Comparação II 0 Pré-RAMS RAMS estados Figura 14 - Variação das exigências dos contratos face a especificações técnicas sobre os sistemas críticos dos veículos, no âmbito da Segurança geral e Segurança Activa, do estado Pré-RAMS para RAMS. Sistema de Gestão da Segurança 1 Nível de Comparação I Nível de Comparação II 0 Pré-RAMS RAMS estados Figura 15 - Variação das exigências dos contratos sobre a definição do Sistema de Gestão da Segurança, do estado Pré-RAMS para RAMS. Um último aspecto de relevo na análise das condições contratuais está relacionado com o custo do ciclo de vida (CCV). A abordagem do custo do ciclo de vida faz sentido neste estudo dada a sua dependência significativa dos factores RAMS, essencialmente a Fiabilidade e a Manutibilidade. Como tal, não sendo uma variável cuja optimização implique directamente e apenas a incorporação RAMS per si, pois depende de outros factores, é significativamente dependente dos factores RAMS referidos. Nesse sentido, é de salientar que os programas de concurso e os cadernos de encargos de ambos os contratos considerados no estado RAMS exigiam a apresentação do CCV para os 69 veículos a fornecer, passando a ser um critério de apreciação durante a fase de análise e avaliação das propostas pelos potenciais fornecedores23. Naturalmente, CCV inferiores serão, do ponto de vista do operador, mais vantajosos para si. A definição e estabelecimento do CCV dos veículos pela BTP baseou-se, em parte, nos cálculos da Fiabilidade e Manutibilidade destes. Embora não seja o objectivo deste estudo desenvolver esta temática, salienta-se que, como já referido na apresentação inicial, a optimização da Fiabilidade e da Manutibilidade ao longo do ciclo de vida dos veículos tem implicações no seu CCV, as quais não são directamente proporcionais24. 23 O CCV não tem, contudo, inerentes penalidades para o seu incumprimento durante a vida útil dos veículos. 24 Fiabilidade e Manutibilidade inerentes mais elevadas podem obrigar a um aumento do preço de venda (pela Engenharia e I&D envolvidos), aumentando o CCV. Por outro lado, Fiabilidade e Manutibilidade inerentes mais baixas podem fazer aumentar o CCV através do aumento dos custos de manutenção e peças de reserva ao longo da operação dos sistemas. 70 III.II.II. Concepção e Design Já se referiu e salientou aqui, diversas vezes, a importância da fase de Concepção e Design nos factores RAMS, fase em que são definidos e estabelecidos os factores RAMS inerentes dos sistemas. Naturalmente, espera-se que a incorporação RAMS na actividade de uma empresa que concebe e fabrica os seus produtos seja caracterizada pela aplicação de novas técnicas ou metodologias às suas tecnologias e produtos e por uma mudança organizacional. A incorporação RAMS assumida pela BTP, numa primeira análise como resposta às condições contratuais dos contratos do MP e CP2000, terá tido implicações na forma como esta organizou e realizou as suas actividades de concepção e design, fabricação e controlo de qualidade e apoio pós-venda dos veículos ferroviários. Para já, inicia-se a análise à fase de concepção e design, desenvolvida pelo Departamento de Engenharia da BTP, para ambos os contratos referidos (estado RAMS). A análise é essencialmente comparativa, salientando apenas as instâncias dos factores RAMS exclusivas dos contratos RAMS (inexistentes nos contratos Pré-RAMS). Não se pretende, desta forma, efectuar uma descrição geral do processo de concepção dos veículos, nem caracterizar em detalhe as diversas técnicas ou metodologias aplicadas nem o seu processo de implementação25. Convém, no entanto, identificar as principais actividades envolvidas normalmente na fase de concepção e design na BTP: • Concepção mecânica dos veículos • Concepção eléctrica dos veículos • Concepção global dos veículos A concepção eléctrica é uma actividade que tem sido efectuada, em alguns contratos, por outras entidades, dentro de um consórcio. Este será um dos aspectos em análise. Outro aspecto a realçar é a recorrência a subcontratação para o fornecimento de componentes específicos dos veículos, por ex. as portas, os sistemas de ar condicionado, os sistemas de travagem, os assentos, entre outros. Esta política, muito recorrente noutros sectores industriais, sendo o automóvel uma referência, tenta evitar a dispersão da actividade da empresa do seu negócio central ganhando com a forte especialização dos fornecedores nesses componentes (sua actividade central). Seguindo a metodologia de análise deste estudo, inicia-se a análise pelo nível de comparação I, analisando o estado RAMS face ao estado Pré-RAMS. Os contratos em análise são o MP e a ML respectivamente. 25 Os quais estão devidamente caracterizados em diversas referências bibliográficas disponíveis, algumas das quais referidas no capítulo 1.3.7. deste estudo. 71 A resposta da BTP ao concurso para o fornecimento dos veículos para o MP foi integrada num consórcio com outras empresas, pois o contrato com o MP é global, incluindo nomeadamente a construção da infra-estrutura, o sistema de sinalização, a fabricação dos veículos e a sua operação por uma período de cinco anos (período de demonstração ou garantia). A BTP assegurou a globalidade da concepção dos veículos e a sua fabricação. Em função das condições impostas no contrato sobre a Fiabilidade e a Disponibilidade dos sistemas, foi inicialmente elaborado um documento de consórcio onde se definiram as metodologias e os documentos que se iam preparar de forma a garantir os índices de Disponibilidade e Fiabilidade que eram exigidos. Neste documento foram também definidos os níveis de responsabilidade que passariam aos fornecedores de componentes. Este processo é normalmente referido como Alocação, ou seja, divisão da responsabilidade em porções. Adicionalmente, foi elaborado um documento no âmbito da Segurança, onde se definiam os potenciais cenários de acidente e as suas consequências. Estes documentos são denominados como (I) Plano RAM e (II) Plano de Segurança. A Figura 16 e a Figura 17 descrevem, no global, estes processos. Durante a fase denominada JDDP26 (Fase de Definição Conjunta do Design), as especificações da Fiabilidade e Segurança dos sistemas foram apresentadas aos diversos fornecedores de componentes, de forma a servirem de base aos processos de concepção de cada um deles. Os fornecedores em questão são os responsáveis pelo fornecimento de componentes com implicações RAMS ao nível dos veículos. Os principais sistemas são: portas, sistema de freios, sistema de tracção, alimentação eléctrica, sistema de engate, compressão pneumática, iluminação, sistema de informação do comboio e ar condicionado. Os fornecedores foram então solicitados a apresentar, para componentes a fornecer, um estudo de Segurança (Análise Preliminar das Situações Potencialmente Perigosas - PHA), uma análise FMECA e uma análise de Fiabilidade onde demonstrassem a Fiabilidade dos seus componentes. Paralelamente, a BTP preparou dois documentos na óptica RAMS, para os veículos finais no seu global: • FFMEA27 (Análise dos Modos Funcionais de Falha e dos seus Efeitos) – onde se analisou o comboio, como veículo, e identificaram-se quais as funções deste que podem potencialmente falhar, ex. a porta não abre, tendo em consideração o seu papel crítico, sob vários pontos de vista, e tendo em atenção as soluções de projecto existentes para evitar essas consequências. • Análise Preliminar das Situações Potencialmente Perigosas (Documento de Segurança) - semelhante ao anterior do ponto de vista da Segurança. 26 Joint Design Definition Phase. 27 Functional Failure Modes and Effect Analysis. 72 Actividades de projecto Actividades RAM Verificação dos índices RAM do veículo da fase de proposta FFMEA preliminar (identificação de items críticos) Concepção principal Requisitos R&M sub-sistemas Gestão RAM sub-fornecedores FMECA FTA Concepção de detalhe Minimarvel (análise R&M, Manut. preventiva e correctiva VEÍCULO FTA Índices RAM Revisão de projecto FFMEA (final) Verificação interna da Manutibilidade Fabrico 1ª unidade Relatório RAM Entrega 1ª unidade Entrega n-ésima unidade Base de Dados RAMS Operação em garantia Período de verificação dos Índices R&A - Recolha de dados de campo Figura 16 – Metodologia e análises efectuadas no âmbito da análise RAM (figura gentilmente cedida pela BTP). 73 SHA FMECA Requisitos dos subsistemas FTA O&SHA DEFLOG (fecho) PHA FFMEA Estudo resist. fogo e Evacuação DEFLOG Estudo Interface Homem-Máq. Estudo Segurança passageiros O&SHA Inspecção de segurança Figura 17 – Metodologia e análises efectuadas no âmbito da análise de Segurança (figura gentilmente cedida pela BTP). 74 Relatório de Segurança Através de tratamento em software28, as análises FMECA dos diversos fornecedores são associadas e anexadas à análise FFMEA dos veículos e, através, da incorporação das árvores de falhas (FTA – Fault Tree Analysis) dos diversos componentes e sistemas, dispondo-se da Fiabilidade global desses componentes, calculou-se a Fiabilidade global do veículo. No processo, consideram-se os papeis críticos dos componentes, na vertente RAMS, pois existem componentes cuja Fiabilidade não se reflecte na Fiabilidade global do veículo (por ex. a falha de um televisor das carruagens não é crítica para o funcionamento do comboio). Trata-se de um processo globalmente complexo, pelo que a sua descrição sumária não traduz convenientemente a sua amplitude. Os estudos de Fiabilidade abordaram as avarias críticas e as suas consequências, também em termos da quantificação das penalidades decorrentes. É de salientar que durante este processo verificou-se muita discussão e ajustes, redesign e nova definição de configurações, de forma a se atingirem os objectivos finais dos factores RAMS. Os fornecedores apresentaram ainda os planos de manutenção preventiva para os sistemas que fornecem e, para cada falha considerada, as intervenções de manutenção correctiva respectivas, com a sua caracterização e quantificação, informação necessária para o cálculo da Manutibilidade dos veículos e, consequentemente, da sua Disponibilidade. Adicionalmente, foi solicitado aos fornecedores a apresentação do custo do ciclo de vida (CCV) dos componentes, para cálculo posterior do CCV dos veículos (a ser apresentado e demonstrado ao cliente). A Manutibilidade dos veículos foi analisada e calculada pela BTP entrando em consideração com informação sobre a Manutibilidade de outros veículos, já em operação, casos do Metropolitano de Milão e do Metropolitano de Estrasburgo, embora não tenha existido uma recolha de dados sistemática29. No âmbito da Segurança, a BTP efectuou a construção de cenários de acidente com caracterização das suas consequências e soluções possíveis (Análise Preliminar das Situações Potencialmente Perigosas). Já existem, há muito tempo, um conjunto de especificações de Segurança activa de materiais (não inflamáveis, etc.), no entanto no contrato do MP houve a construção de cenários, com base numa metodologia “e se” (what if). Basicamente, no caso de (I) descarrilamento ou (II) fogo, o objectivo foi responder às seguintes questões base: • o que pode provocar estas situações? • o que se pode fazer para evitar? 28 Uma aplicação comercial para a análise de falhas e folhas Excel para a compilação FMECA. 29 Essencialmente pela participação de elementos em ambos os projectos e pela incorporação de conhecimento tácito. 75 • Como é que se podem evacuar as pessoas do comboio, dada a altura do comboio? - Estudo de evacuação. • Qual a resistência dos materiais ao fogo? – Estudo de resistência ao fogo. Adicionalmente foi efectuado um estudo ao Interface Homem-Máquina, que se baseou nos aspectos que podem ameaçar a Segurança baseados na relação entre o operador e os comandos do veículo, ou seja, erros humanos facilitados pela configuração da tecnologia30. Embora não relacionados directamente com a factor Segurança, para o MP foi desenvolvido um Estudo de Ergonomia da cabina do condutor, numa parceria com a Faculdade de Motricidade Humana. Um dos exemplos resultantes deste estudo foi a especificação para a altura do assento do condutor, com o objectivo de aumentar a sua visibilidade, essencialmente a curtas distâncias, de forma a poder visualizar objectos que tenham surgido na frente do veículo imediatamente antes do arranque. O desenvolvimento e realização das diversas análises, metodologias e técnicas RAMS ocorreram durante toda a fase de concepção e design, cerca de dois anos e meio (desde o início de 1999 até meio de 2001), sendo um processo iterativo e integrado, pelo que não foi possível especificar tempos acumulados por cada nível de análise. Durante este período um elemento da BTP (da área da Engenharia) esteve afectado a tempo inteiro a todo o processo RAMS, juntamente com um consultor externo a tempo parcial (cerca de 50%) e com a colaboração de elementos da Direcção de Engenharia da BTP. Aplica-se agora a mesma metodologia de análise para o nível de comparação II, analisando o contrato CP2000 (RAMS) face ao contrato das UQEs de Sintra (PréRAMS). A resposta da BTP ao concurso para o fornecimento dos veículos para o CP2000 deu-se em consórcio com outra empresa, ficando a cargo desta a concepção eléctrica e o respectivo fornecimento dos sistemas. A BTP assegurou as restantes actividades de concepção, incluindo a integração dos sistemas. Em função das condições impostas no contrato CP2000 sobre a Fiabilidade e a Disponibilidade dos sistemas, foi inicialmente elaborado um documento de consórcio onde se definiram as metodologias e os documentos que se iam preparar de forma a garantir os índices de Disponibilidade e Fiabilidade que eram exigidos. Neste documento foram também definidos os níveis de responsabilidade que passariam aos fornecedores de componentes. Este processo é normalmente referido como Alocação, ou seja, divisão da responsabilidade em porções. Adicionalmente, foi elaborado um documento no âmbito da Segurança, onde se 30 Por exemplo o caso do botão de abrir as portas e do botão de habilitação da abertura das portas, a sua localização e a possibilidade de erro humano. 76 definiam os potenciais cenários de acidente e as suas consequências. Estes documentos são denominados como (I) Plano RAM e (II) Plano de Segurança. Os seus processos de desenvolvimento seguem, no global, a Figura 16 e a Figura 17, com algumas excepções (com omissão na descrição seguinte). Durante a fase JDDP (Fase de Definição Conjunta do Design), as especificações da Fiabilidade e Segurança dos sistemas foram apresentadas aos diversos fornecedores de componentes, de forma a servirem de base aos processos de concepção de cada um deles. Os fornecedores em questão são os responsáveis pelo fornecimento de componentes com implicações RAMS ao nível dos veículos, a saber: portas, sistema de freios, sistema de tracção, alimentação eléctrica (ligação à catenária e sistema de conversão de energia), sistema de engate, iluminação, sistema de informação do comboio e ar condicionado. Os fornecedores foram então solicitados a apresentar um estudo de Segurança e uma análise FMECA para os sistemas que forneciam, juntamente com uma árvore de falhas com as respectivas probabilidades de falha (conduzindo à Fiabilidade inerente dos sistemas). Paralelamente, a BTP preparou dois documentos na óptica RAMS, para os veículos finais no seu global: • FFMEA (Análise dos Modos Funcionais de Falha e dos seus Efeitos) – onde se analisou o comboio, como veículo, e identificaram-se quais as funções deste que podem potencialmente falhar, ex. a porta não abre, tendo em consideração o seu papel crítico, sob vários pontos de vista, e tendo em atenção as soluções de projecto existentes para evitar essas consequências. • Análise Preliminar das Situações Potencialmente Perigosas (Documento de Segurança) - semelhante ao anterior do ponto de vista da Segurança. Através de tratamento em software, as análises FMECA dos diversos fornecedores são associadas e anexadas à análise FFMEA dos veículos e, através, da incorporação das árvores de falhas (FTA – Fault Tree Analysis) dos diversos componentes e sistemas, dispondo-se da Fiabilidade global desses componentes, calculou-se a Fiabilidade global do veículo. No processo, consideram-se os papeis críticos dos componentes, na vertente RAMS, pois existem componentes cuja Fiabilidade não se reflecte na Fiabilidade global do veículo (por ex. a falha de um televisor das carruagens não é crítica). A análise de Integração é feita pela BTP. Trata-se de um processo globalmente complexo, pelo que a sua descrição sumária não traduz convenientemente a sua amplitude. Dada a concepção e fornecimento do sistema eléctrico serem exteriores à BTP neste contrato, a análise de integração foi efectuada pela BTP (por ex. as implicações da instalação do sistema eléctrico com outros sistemas vizinhos). É de salientar que durante este processo verificou-se muita discussão e ajustes, redesign e nova definição de configurações, de forma a se atingirem os objectivos finais dos factores RAMS. 77 Os fornecedores apresentaram ainda os planos de manutenção preventiva para os sistemas que fornecem e, para cada falha considerada, as intervenções de manutenção correctiva respectivas, com a sua caracterização e quantificação. Fornecem, assim, parte da informação necessária para o cálculo do custo do ciclo de vida (CCV), da Manutibilidade e, em consequência, da Disponibilidade dos veículos. A Manutibilidade dos veículos foi analisada e calculada pela BTP durante a Engenharia de Integração. Nesta vertente entraram em consideração com informação sobre a Manutibilidade de outros veículos, já em operação. A informação foi solicitada à EMEF (empresa de serviços de manutenção da CP) sobre os comboios pendulares da ligação Lisboa-Porto. O âmbito de análise foi a identificação de problemas tipo dos veículos e as suas falhas, sobretudo ao nível da integração. No âmbito da Segurança, a BTP efectuou a construção de cenários de acidente com caracterização das suas consequências e soluções possíveis (Análise Preliminar das Situações Potencialmente Perigosas). Já existem, há muito tempo, um conjunto de especificações de Segurança activa de materiais (não inflamáveis, etc.), no entanto no contrato CP2000 houve a construção de cenários, com base numa metodologia “e se” (what if). Basicamente, no caso de (I) descarrilamento ou (II) fogo, o objectivo era responder às seguintes questões base: • O que pode provocar estas situações? • O que se pode fazer para evitar? • Como é que se podem evacuar as pessoas do comboio, dada a altura do comboio? - Estudo de Evacuação. Por exemplo, no CP2000 foi realizado o estudo de evacuação com o comboio deitado de lado. Ainda no âmbito da Segurança, no contrato CP2000 foi efectuado o estudo de Análise das Situações Potencialmente Perigosas na Operação e Manutenção (O&SHA Operation and Support Hazzard Analysis), dando resposta a uma das condições do Caderno de Encargos deste contrato, que se traduz pela análise aos perigos potenciais que existem para o condutor, durante a operação dos veículos, e para os intervenientes na manutenção dos mesmos, durante as intervenções de manutenção correctiva ou preventiva, essencialmente riscos associados à alta tensão. O desenvolvimento e realização das diversas análises, metodologias e técnicas RAMS ocorreram durante toda a fase de concepção e design, cerca de um ano e meio, sendo um processo iterativo e integrado. Para alguns níveis de análise foram detalhados pela BTP os tempos acumulados necessários (vide Tabela 6). Durante este período um elemento da BTP (da área da Engenharia) esteve afectado a tempo inteiro a todo o processo RAMS, com a colaboração constante de elementos da Direcção de Engenharia da BTP. 78 Em ambos os níveis de comparação, pelo forte envolvimento dos fornecedores de componentes na abordagem RAMS dos contratos do MP e CP2000 durante a concepção dos seus sistemas, considerando a transferência de parte do risco de operação e manutenção da BTP para os fornecedores (segundo a Alocação), são esperadas implicações e mudanças significativas na sua actividade e organização, com resultados na tecnologia. Contudo, não será aqui testada essa hipótese, pelo âmbito deste estudo e também pela impossibilidade actual da sua realização. Todas os processos, metodologias e técnicas referidas são exclusivas do estado RAMS (instâncias do fenómeno RAMS), nos contratos dos níveis de comparação I e II, estando ausentes nos contratos do estado Pré-RAMS considerados. Segundo o Método da Concordância e o Método Indirecto da Diferença estabelece-se, assim, a causa e o efeito, validando-se que a aplicação de tais processos decorrem da incorporação RAMS na actividade de concepção e design da BTP. Na Tabela 6 resumem-se os processos, metodologias e técnicas aplicadas na actividade de concepção e design da BTP, resultantes da incorporação RAMS. 79 Processos, técnicas e metodologias aplicadas na concepção e design dos veículos Nível de comparação I - Estado RAMS Contrato MP Observações RAM Plan Nível de comparação II - Estado RAMS Contrato CP2000 Observações Tempo Total para o seu desenvolvimento Elaborado pela BTP RAM Plan Elaborado pela BTP 60h FMECA Elaborado pelos fornecedores de componentes com papel crítico RAMS FMECA Elaborado pelos fornecedores de componentes com papel crítico RAMS - Árvores de Falhas Elaborado pelos fornecedores de componentes com papel crítico RAMS Árvores de Falhas Elaborado pelos fornecedores de componentes com papel crítico RAMS - Demonstração da Fiabilidade dos componentes Elaborado pelos fornecedores de componentes com papel crítico RAMS - - - FFMEA Elaborado pela BTP FFMEA Elaborado pela BTP Durante a fase de projecto (1 ano e meio) Análise da Fiabilidade global dos veículos Elaborado pela BTP Análise da Fiabilidade global dos veículos Elaborado pela BTP Durante a fase de projecto (1 ano e meio) Análise de Disponibilidade Resultante das técnicas de análise de Fiabilidade e Manutibilidade Análise de Disponibilidade Resultante das técnicas de análise de Fiabilidade e Manutibilidade Durante a fase de projecto (1 ano e meio) Análise de Manutibilidade Desenvolvida pela BTP, incluindo a engenharia de integração de sistemas Safety Plan Elaborado pela BTP Durante a fase de 1 pessoa a tempo inteiro, projecto (1 ano e meio) com a colaboração de elementos da Engenharia da BTP 60h Estudo de Seguraça Elaborado pelos fornecedores de componentes com papel crítico RAMS - Análise de Manutibilidade Safety Plan Estudo de Seguraça Tempo Total para o seu desenvolvimento Número de pessoas envolvidas Durante toda a fase de projecto, cerca de 2 anos e meio (desde o início de 1 pessoa a tempo inteiro Desenvolvida integralmente pela BTP 1999 até meio de 2001), e 1 consultor externo a sendo um processo tempo parcial (cerca de iterativo e integrado, pelo 50%), com a colaboração que não foi possível de elementos da Elaborado pela BTP especificar tempos Engenharia da BTP acumulados por cada Elaborado pelos fornecedores de nível de análise. componentes com papel crítico RAMS Preliminary Hazzard Analysis Desenvolvida pela BTP Preliminary Hazzard Analysis Desenvolvida pela BTP 150h Estudo de evacuação do comboio Desenvolvida pela BTP Estudo de evacuação do comboio Desenvolvida pela BTP 100h Estudo de resistência dos materiais ao fogo Desenvolvida pela BTP Operation and Support Hazzard Analysis Desenvolvida pela BTP 100h Interface Homem-Máquina Desenvolvido pela BTP - - - Análise de Ergonomia da cabina do condutor Desenvolvido pela BTP em cooperação com a Faculdade de Motricidade Humana - - - Cálculo do CCV Desenvolvido pela BTP e pelos fornecedores de componentes Cálculo do CCV Desenvolvido pela BTP 60-80h Número de pessoas envolvidas Tabela 6 – Processos, técnicas e metodologias aplicadas na concepção e design de veículos ferroviários pela BTP, resultantes da incorporação RAMS. 80 III.II.III. Fabricação O processo de fabricação é organizado e planeado pelos Serviços Técnicos da BTP, através da interpretação das especificações e desenhos técnicos concebidos pela Engenharia. Foi referido que a organização da produção está muito pouco relacionada com o contrato em si, pois o produto é, no essencial, o mesmo. Não existem variações de produto significativas que obriguem a modificar a tecnologia de fabricação. As principais fases de fabricação dos veículos ferroviários encontram-se ilustradas na Figura 18, até à entrega final. Materials Materiais Sub-Montagem Bodysh Caixa Assembly Montagem Testing Ensaios Entrega Resources Recursos Figura 18 – Fases de fabricação da BTP. (Figura gentilmente cedida pelos Serviços Técnicos da BTP). A organização da produção segue sempre este modelo. O tipo de contrato pode influenciar apenas a incorporação ou não incorporação de algumas actividades destas fases no processo de fabricação da BTP. Trata-se de decidir se determinadas actividades serão desenvolvidas e executadas internamente ou sub-contratadas a fornecedores externos. São essencialmente actividades que se incluem na fase de submontagem e referem-se à fabricação de componentes específicos. Consoante a direcção a seguir, a fabricação desses componentes será considerada como actividade de submontagem, se efectuada internamente, ou materiais, se efectuada por fornecedores31. O critério principal utilizado na tomada de decisão está relacionado com a adopção ou não de uma filosofia de Produção Magra (Womack et al., 1990). Em caso afirmativo é assumido que o negócio central da empresa é apenas fabricar/montar os comboios, sendo os componentes específicos fornecidos por empresas externas (que têm o seu 31 Esta decisão é normalmente referida em inglês como make or buy. 81 negócio central e conhecimento orientados para esses sistemas). A aplicação da filosofia Magra depende da capacidade actual da fábrica. Se existe capacidade interna (mão de obra livre) produz-se internamente alguns componentes (por exemplo as cablagens). Caso contrário a mão de obra é transferida para fora (comprando as cablagens já prontas a incorporar no veículo). A organização da produção depende, assim, de factores exógenos ao tipo de contratos, pelo que a incorporação RAMS nos contratos não teve implicações directas e evidentes ao nível da fabricação. As tarefas subjacentes à fabricação são regulares e constantes no essencial e incluem, de acordo com a Figura 19: • A definição da qualidade da produção • O planeamento da produção (actividades, layout fabril) • A definição da logística (recursos, materiais) • As indicações para o Departamento de Compras • A definição dos níveis de inspecção dos materiais Marketing (Definição do produto) Engenharia Compras Métodos (Planeamento dos processos) Controlo de produção Inspecção (Planeamento) Qualidade Logística Produção Legenda Materiais/ Produto Final Informação Processo CLIENTE Fabrico Figura 19 – Tarefas realizadas pelos Serviços Técnicos. (Figura gentilmente cedida pelos Serviços Técnicos da BTP). 82 Não existe evidência sobre alterações significativas na organização e planeamento da produção do estado Pré-RAMS para o estado RAMS, devido a circunstâncias relacionadas com a incorporação RAMS na actividade da BTP. Naturalmente, pelas especificações dos sistemas serem pontualmente diferentes é de esperar que exista uma alteração ao nível das instruções de trabalho em determinadas actividades do processo de fabricação, mas essa alteração está basicamente relacionada com o design e as especificações dos sistemas serem diferentes e não com a incorporação RAMS per si. Pela dimensão da análise necessária a este nível e por se ter considerado essa análise menos relevante, esta não foi realizada neste estudo. 83 III.II.IV. Controlo da Qualidade O controlo da qualidade da fabricação é desenvolvido e realizado pelo Departamento de Qualidade da BTP. Este processo tem como objectivo garantir que as características e especificações dos veículos fabricados sejam coerentes com as definidas pelo Departamento de Engenharia durante a fase de concepção e design, ou seja, verificar o cumprimento das especificações inerentes definidas para os veículos e seus componentes. Para tal, o controlo da qualidade acompanha todo o ciclo de fabricação e montagem dos veículos, até à entrega ao cliente. O elemento central nesta actividade é o Plano de Inspecção e Ensaios, que é elaborado no início do cada projecto com a colaboração do Departamento de Engenharia, no qual são definidos: • Quais as inspecções e testes a efectuar ao longo do ciclo de fabricação • Quais os componentes que serão inspeccionados • Qual o método a utilizar (amostragem, inspecção integral) • Quais os atributos a inspeccionar e resultados expectáveis O controlo de qualidade, sendo aplicado ao ciclo completo de fabricação, é composto pelas seguintes tarefas principais: 1. Inspecção de Recepção 2. Inspecção durante a fabricação e inspecção final 3. Ensaios finais A inspecção de recepção refere-se à inspecção de componentes adquiridos a fornecedores, a serem incorporados nos veículos. Na recepção dos componentes o Departamento de Qualidade analisa se estes cumprem as características e especificações técnicas definidas pelo Departamento de Engenharia da BTP e acordadas com os fornecedores, nomeadamente os requisitos em termos RAMS. Um método frequentemente utilizado é o denominado inspecção da primeira peça, o qual se baseia numa inspecção detalhada do primeiro componente recebido e que, de acordo com a sua conformidade, funciona como protótipo para o fornecedor que, assim, referencia toda a fabricação desse componente ao protótipo aprovado. Os restantes componentes são, normalmente, inspeccionados por amostragem pelo Departamento de Qualidade da BTP. A inspecções durante a fabricação e a inspecção final estão previstas no Plano de Inspecção e Ensaios. O controlo de qualidade é efectuado durante diversas fases de produção: desde a construção da caixa, passando pela montagem dos componentes até aos acabamentos finais. Durante o ciclo de fabricação, cada veículo, inicialmente apenas a sua estrutura (também referida como caixa), passa por várias estações de trabalho. O controlo de qualidade é programado para ser efectuado antes da saída de cada estação. Adicionalmente, existem alguns pontos onde o cliente final tem de 84 aprovar as inspecções, de acordo com os contratos. São os chamados pontos de paragem obrigatória. Foi salientado o interesse, por parte da BTP, em que o cliente final esteja presente nas inspecções em cada estação, dando a sua aprovação, com resultados positivos para ambas as partes. Por várias razões, alheias ao tema central desta análise, essa não é a realidade presente, embora fosse desejável. No final da montagem dos veículos é realizada a inspecção final a estes, que antecede os testes e ensaios finais. Os ensaios finais, também especificados no Plano de Inspecção e Ensaios e respeitando a Norma Europeia EN 5021532 (Cenelec, 1999), são realizados depois da saída dos veículos das linhas de produção. Em primeiro lugar são efectuados os ensaios estáticos no banco de ensaios da BTP, seguindo o protocolo da norma sobre (I) quais os ensaios a efectuar, (II) quais os procedimentos para os ensaios e (III) quais os resultados expectáveis para cada ensaio. Se todos estes ensaios verificam a conformidade do material circulante é esperado que estes cumpram, durante a sua operação, as suas especificações técnicas inerentes. É de referir que todos os ensaios referidos anteriormente são reportados ao cliente. No final, são efectuadas duas acções juntamente com o cliente final: (I) uma inspecção visual e (II) alguns dos ensaios finais já realizados anteriormente (também referido como exame técnico), essencialmente ensaios ao funcionamento dos veículos. Saindo das instalações industriais da BTP, após a autorização pelo cliente da saída de fábrica, os veículos são posteriormente ensaiados em linha (ensaios dinâmicos), normalmente durante dois dias. Se o seu comportamento em linha é o esperado dá-se então a Recepção Provisória do veículo ensaiado, o qual entra, assim, no seu período de garantia (o cliente assina o auto de recepção provisória). Nas situações em que existem algumas substituições a fazer, se estas não forem críticas para a operação dos veículos, ficam registadas na chamada lista de reservas, e serão efectuadas posteriormente. A recepção definitiva dos veículos só ocorre quando a lista de reservas está totalmente resolvida. Em termos dos factores RAMS e dos seus requisitos, a intervenção do Departamento de Qualidade ocorre essencialmente na inspecção de recepção. Foi referido que, no âmbito dos contratos RAMS tem existido um cuidado e esforço mais intensos durante a inspecção de recepção dos componentes a serem incorporados nos veículos, relativamente ao passado. Tratou-se sobretudo de um acompanhamento mais intenso dos fornecedores, não só nas inspecções de recepção mas também durante todo o processo de produção dos componentes, através de visitas às instalações dos fornecedores. No início dos contratos RAMS, elementos do Departamento de Qualidade da BTP efectuaram diversas visitas às instalações dos fornecedores para avaliar (I) a sua 32 A Norma Europeia EN 50215 refere-se ao teste do material circulante após conclusão da sua construção e antes de sua entrada em serviço. 85 organização, (II) o seu sistema de qualidade, (II) o que executam, (III) situações em que recorrem à subcontratação, (IV) que ensaios fazem e com que meios, entre outros. Este foi o aspecto central nas implicações da incorporação RAMS na actividade de controlo de qualidade da BTP. Nas restantes tarefas realizadas pelo Departamento de Qualidade (inspecção durante a fabricação, inspecção final e ensaios finais) não foram assinaladas, pelo Departamento de Qualidade, alterações significativas na forma estas foram realizadas. No âmbito dos ensaios finais é de referir que algumas alterações têm ocorrido nos últimos anos devido à actualização da Norma Europeia referente aos ensaios do material circulante, sobretudo pela evolução da tecnologia incorporada nos veículos (por exemplo o peso crescente dos sistemas electrónicos e software nos veículos). A Tabela 7 resume os resultados evidenciados. PRINCIPAIS TAREFAS DE CONTRATOS PRÉ-RAMS CONTRATOS RAMS CONTROLO DA QUALIDADE (NÍVEIS DE COMPARAÇÃO I E II) (NÍVEIS DE COMPARAÇÃO I E II) Inspecção de Recepção Sim Sim (com reforço do cuidado e esforço aplicados) Inspecção durante a fabricação e inspecção final Ensaios Finais Sim Sim Sim Sim (de acordo com a norma EN 50215) (de acordo com a norma EN 50215) Tabela 7 – Implicações da incorporação RAMS nos processos de controlo de qualidade na BTP. 86 III.II.V. Operação e Manutenção Com a denominada Recepção Provisória dos veículos, após a validação pelo cliente dos ensaios dinâmicos finais, estes entram no seu período de garantia, também referido como período de demonstração. O fabricante fica associado aos veículos durante este período tendo a responsabilidade de resolver quaisquer problemas que surjam na operação destes com causa técnica imputável ao desempenho dos sistemas (excluindo má utilização ou operação ou motivos de força maior). Este vínculo aos veículos é basicamente caracterizado a dois níveis: 1. Acções de Manutenção Correctiva (Garantia); 2. Acções de Melhoria e Reengenharia. Dependendo dos contratos, a BTP pode ter afectadas no local equipas próprias para cada um destes níveis. Após a entrega dos veículos ao cliente final (incluindo a recepção provisória), este procede, numa fase inicial, a diversos testes e opera os veículos sem passageiros durante um período definido (incluindo a formação de condutores). Após este período, os veículos entram em operação comercial. Para as acções de Manutenção Correctiva resultantes de ocorrências ou avarias ocorridas nos veículos com origem técnica e com imputação de responsabilidade à BTP, esta pode afectar, ao local, uma equipa própria, também referida como equipa de garantia. Por outro lado, para as acções de melhoria e reengenharia, isto é, alterações a determinados componentes dos comboios que manifestem um desempenho desviado do esperado, em termos da concepção e design dos componentes, a BTP pode afectar ao local uma equipa que seja responsável pela substituição de sistemas e componentes e pela implementação de melhorias a estes. Inicia-se esta análise pelo contrato do MP, caracterizando-se a organização funcional da BTP durante a fase de garantia dos veículos ferroviários. O contrato do MP teve e tem a particularidade dos veículos serem deslocados para o seu local de operação por transporte rodoviário, o que impediu que o comissionamento e testes (ensaios dinâmicos) dos veículos fossem realizados em linha logo à saída da fábrica e completados na marcha para o local da entrega final (caso habitual com o cliente CP). Estes ensaios finais foram e são realizados localmente no Porto, existindo uma equipa da BTP no local para o seu desenvolvimento e acompanhamento, juntamente com o cliente. Esta equipa pertence à Direcção de Gestão da Qualidade da BTP mas é gerida localmente pela equipa da unidade de negócio que gere o contrato. Até à data de realização deste estudo foram entregues quarenta e nove comboios33. Encontram-se no local três equipas, com base nas acções descritas inicialmente mais a 33 Cerca de 18 a operar diariamente, com cerca de 28 prontos a operar e os restantes cumprindo outras funções, por ex. formação. 87 equipa de comissionamento e testes, com 25 pessoas no total. Com a aproximação da entrega final de todos os veículos, os elementos afectos às equipas de comissionamento e testes e reengenharia vão transitando para a Equipa de Garantia. O operador reporta tudo o que se passa na operação, isto é, todo o tipo de ocorrências, com ou sem imputação de responsabilidade à BTP, mediante o relatório de falha, o qual é posteriormente registado numa base de dados comum do consórcio (através do software Win Mac). Os dados registados são: • Data e instante da falha • Identificação e Localização do veículo • Horas de operação e quilómetros do veículo • Módulo, zona, sistema e subsistema da ocorrência da falha • Descrição e consequências da falha para a operação, incluindo o modo de operação aquando da ocorrência da falha, as consequências para o serviço actual (nenhuma, paragem em linha superior a três minutos, tempo total de atraso, evacuação de passageiros, necessidade de recolha para as oficinas, entre outros) • Indicação da necessidade de intervenção por parte da BTP • Referência para a base de dados As intervenções de Manutenção Correctiva e Melhoria da BTP são registadas na mesma base de dados comum do consórcio (através do software Win Mac), que o cliente final pode consultar em tempo real, ficando a conhecer o estado actual dos veículos e o seu histórico de manutenção. Paralelamente, a intervenção é registada, com maior extensão, numa base de dados da BTP, actualmente em Excel. Os principais dados registados são: (I) com reparação em linha: • Início da intervenção, tempo de reparação, descrição da acção correctiva executada, elemento da BTP responsável (II) com reparação nas oficinas: • Instante de chegada do veículo • Início da intervenção • Conclusão da intervenção • Tempo morto • Causa da falha • Responsabilidade da falha (BTP, fornecedor, má utilização ou outros) • Identificação do equipamento que falhou 88 • Descrição da acção executada (verificação, reparação e substituições efectuadas) • Referência para a base de dados A base de dados da BTP alimenta o processo de reengenharia, ou seja, proporciona retroacções para o Departamento de Engenharia. Estas informações, salientando os componentes com um desempenho mais significativamente fora das suas especificações projectadas, ou simplesmente com maior repetição de avarias, são a base da reengenharia desses componentes e implementação das melhorias. Ou seja, o mau desempenho em serviço dá origem a planos de modificações em todos os equipamentos e todos os veículos. Um exemplo deste processo teve por base a unidade de produção de ar, na qual se está a proceder à troca de alguns componentes tais como os secadores de ar. Adicionalmente à análise aos indicadores de desempenho dos veículos, na óptica dos factores RAMS, é emitido e entregue periodicamente ao Grupo Bombardier Transportation um relatório com os seguintes indicadores: • Taxas de avaria de todos os equipamentos e componentes do veículo considerados críticos (óptica RAMS) • Taxas de avaria do veículo (totais e críticas para o serviço) • Comparação com os índices alvo contratuais • Nº de saídas de linha (serviço) e tempo de interrupção do serviço De seguida, efectua-se a mesma análise para o contrato CP2000. Até à data de realização deste estudo foram entregues 23 comboios, de um total de 34. No local (Oficinas da CP em Contumil) a BTP tem uma equipa responsável pela garantia dos veículos (manutenção correctiva) e pelas acções de melhoria e reengenharia, num total de 4 pessoas (3 são operacionais). É de salientar que a garantia da componente eléctrica, para componentes Siemens, é da responsabilidade desta. No entanto, como a montagem final foi da BTP esta tem de prestar assistência em problemas eléctricos gerais, existindo, neste caso, cooperação entre a Siemens e BTP (incluindo a cedência de recursos materiais). As acções de comissionamento e testes (ensaios dinâmicos) são efectuadas por elementos da fábrica, normalmente durante dois dias. No primeiro dia são efectuadas duas marchas entre a estação do Oriente em Lisboa e Santarém. De imediato, as anomalias detectadas são alvo de correcções. Normalmente, caso não exista um atraso significativo pela implementação das correcções, com um dia de intervalo é efectuada uma marcha até ao Porto. As correcções a efectuar depois deste segundo dia são efectuadas localmente, com a deslocação, na maior parte dos casos, de uma equipa da fábrica, dada a escassez de recursos localmente (humanos e materiais), afectos à 89 garantia. Apenas após a execução de todas as correcções a efectuar se dá a recepção definitiva do comboio. Após a recepção definitiva, a equipa local da BTP apenas é responsável pelos (I) ensaios de acoplamento e pela (II) limpeza dos veículos, disponibilizando-os para o início da operação comercial. Ao nível das acções de reengenharia saliente-se que as primeiras acções são efectuadas em comboios ainda na fábrica. Apenas após a execução destas acções nestes comboios, são efectuadas as alterações nos comboios no local. A equipa que efectua a acção de reengenharia na fábrica desloca-se ao local (pelo menos uma pessoa) para efectuar e demonstrar a execução. As mesmas acções de reengenharia noutros veículos em operação passam a ser da responsabilidade da equipa da BTP no local. De seguida identificam-se alguns exemplos de reengenharia realizada: 1. Alteração no degrau de acesso para o condutor, nas portas de acesso de passageiros ao veículo, uma vez que o veículo não se encontra numa plataforma. 2. Alteração do posicionamento das válvulas dos degraus, pela sua proximidade aos rodados e a consequente projecção de água. 3. Troca de tubagem no sistema pneumático. 4. Reposicionamento de uma válvula (da horizontal para vertical) de indicação do estado do freio. Diariamente, de manhã, a equipa da BTP recebe um documento com informação sobre os problemas dos veículos das últimas 24 horas, emitido pela EMEF. Este documento sintetiza todas as ocorrências verificadas até às 8H00 de cada dia (desde as 8H00 do dia anterior), identificando o comboio, o seu estado (em serviço ou parado) e, se em serviço, a marcha onde foi detectada a ocorrência. Trata-se de um registo diário dos problemas detectados pelos maquinistas e pelas inspecções da EMEF. Adicionalmente, é entregue um documento pelo operador com os problemas detectados pelos maquinistas no período anterior. Este documento tem, muitas vezes, o mesmo conteúdo que o documento da EMEF. Por fim, embora menos frequentemente, o cliente informa a equipa da BTP, via telefone, de eventos surgidos durante a operação dos veículos, susceptíveis de darem origem a uma verificação ou intervenção de manutenção correctiva. Após cada intervenção, a equipa da BTP reporta a intervenção à EMEF através de um relatório de intervenção baseado num impresso fornecido pela EMEF, para cada intervenção. A informação reportada é a seguinte: identificação do veículo e unidade, descrição da intervenção, identificação do componente ou peça avariada e peças de reserva aplicadas. Paralelamente, a BTP efectua um registo das intervenções internamente, com recurso ao software Excel, baseado essencialmente na informação incluída no relatório 90 de intervenção entregue à EMEF. A utilização deste software, permite efectuar uma análise estatística mínima aos problemas mais frequentes, embora, reconhecidamente, o seu potencial seja reduzido e pouco sistemático. Esta base de dados alimenta, assim, o processo de reengenharia, ou seja, proporciona retroacções para o Departamento de Engenharia. Estas informações, salientando os componentes com um desempenho mais significativamente fora das suas especificações projectadas, são a base da reengenharia desses componentes e implementação das melhorias. Ao longo do fornecimento dos veículos, têm existido diversos exemplos deste processo de retroacção e da sua efectivação. Um exemplo tem sido a frequente adaptação e melhoria dos mecanismos de isolamento das portas pelo maquinista, com implicações no software associado, de forma a reduzir o tempo necessário para o isolamento destas e diminuir o tempo de imobilização do veículo (o veículo não pode circular com problemas nas portas). Em termos de resultados do desempenho do sistemas, a BTP reúne e envia os índices de evolução de Fiabilidade (Incidências) e da Disponibilidade periodicamente para a Bombardier Transportation. A Tabela 8 resume os índices RAMS, obtidos pelo tratamento dos dados que são recolhidos da operação e manutenção pela BTP, exclusivamente nos contratos do estado RAMS. A análise ao histórico dos sistemas permite, assim, identificar as tendências dos índices RAMS que caracterizam o desempenho dos sistemas. Esta análise promove a melhoria e a reengenharia dos sistemas e seus componentes, durante a fase de concepção e design (processo de retroacção). A recolha de dados de campo tem sido expandida no sentido de se reunir dados que permitam calcular os índices de Fiabilidade e Disponibilidade dos veículos, implicando a recolha e registo efectivos das falhas (avarias), com a sua caracterização, e do tempo de paragem não programada dos veículos, respectivamente. A recolha detalhada dos dados referidos e o seu tratamento para a obtenção dos índices RAMS (instâncias do fenómeno RAMS) são exclusivos do estado RAMS, nos contratos dos níveis de comparação I e II, estando ausentes nos contratos do estado Pré-RAMS considerados. Segundo o Método da Concordância e o Método Indirecto da Diferença estabelece-se, assim, a causa e o efeito, validando-se que a recolha desses dados decorre da incorporação RAMS na fase de operação e manutenção dos veículos. Como nota adicional, resta referir que as acções de manutenção preventiva levadas a cabo em cada contrato RAMS, pela EMEF no CP2000 e pela Transdev (Portugal) no MP não têm sido optimizadas com base na óptica RAMS, através da aplicação de uma Manutenção Baseada na Fiabilidade (RCM – Reliability Based Maintenance). As acções de manutenção preventiva têm consistido em respeitar os planos standard e gerais apresentados pelo fabricante para os seus sistemas. Não existe, a este nível, qualquer tipo de processos ou metodologias que tenham sido aplicados em função das características RAMS destes contratos. 91 ÍNDICES RAMS CONTRATO DO MP CONTRATO DO CP2000 (NÍVEL DE COMPARAÇÃO I) (NÍVEL DE COMPARAÇÃO II) • Taxas de avaria dos • Taxas de avaria dos sistemas e componentes sistemas e componentes críticos RAMS dos críticos RAMS dos veículos veículos Fiabilidade • Taxas de avaria totais dos veículos (críticas para o serviço) • Nº de Incidências e quilómetros percorridos pelos veículos • Comparação com os • Comparação com os índices alvo contratuais índices alvo contratuais • Nº de saídas de serviço dos veículos Disponibilidade • Tempo de interrupção do serviço • Disponibilidade da frota de veículos • Comparação com os índices alvo contratuais • Comparação com os índices alvo contratuais Tabela 8 – Índices RAMS calculados na operação e manutenção dos veículos e dos seus sistemas. 92 III.II.VI. Mudança Organizacional Segundo A. Caetano (Carvalho, Neves e Caetano, 2001), a mudança organizacional está na ordem do dia, através da mudança nos processos de gestão, mudança nos procedimentos e na organização do trabalho, mudança das estruturas, mudança na relação com o cliente e com o mercado, mudança nas atitudes e nos valores dos colaboradores das organizações, entre outros. Embora a incorporação RAMS seja caracterizada pela mudança organizacional na relação com o cliente, como já constatado neste estudo, no âmbito das condições contratuais dos contratos RAMS, interessa analisar se existe paralelamente uma mudança na organização do trabalho e nas estruturas da organização. Nesse sentido, analisaram-se as alterações ocorridas, nesse âmbito, dos contratos Pré-RAMS para os contratos RAMS, não se fazendo a distinção entre os níveis de comparação uma vez que as alterações são genéricas. Em primeiro lugar, salienta-se que não existiu uma mudança ao nível da estrutura da empresa, resultante, directa ou indirectamente, da incorporação RAMS. A fábrica da Amadora foi efectivamente alvo de mudanças estruturais, mas estas ocorreram em função da sua integração nos grupos ADtranz e Bombardier Transportation. Em 1996, passando a ADtranz, a sua estrutura funcional foi alterada para uma estrutura próxima da matricial, onde cada um dos projectos integrava a amplitude completa de funções. Em 2001, com a passagem a BTP, verificou-se o regresso a uma estrutura maioritariamente funcional, em termos da sua diferenciação horizontal ou departamentalização. Contudo, estas mudanças organizacionais em nada estiveram ligadas à incorporação RAMS. Por outro lado, no âmbito da mudança na organização do trabalho existem alguns pontos que merecem uma atenção particular. Existe evidência sobre mudanças organizacionais pontuais, a este nível, resultantes da incorporação RAMS. Estas ocorreram ao nível da: (I) concepção e design , (II) gestão dos aprovisionamentos e compras, (III) garantia dos veículos. Durante a concepção e design dos veículos ferroviários dos contratos RAMS, o Departamento de Engenharia da BTP aplicou a denominada Alocação da Fiabilidade, ou seja, a divisão da Fiabilidade dos veículos pelos diversos sistemas e componentes críticos e a sua especificação para os fornecedores respectivos, com atribuição de responsabilidade pelo seu cumprimento. Adicionalmente, no estabelecimento das especificações para os sistemas dos veículos e na concepção geral dos veículos foi efectuada a incorporação de dados da manutenção de veículos, essencialmente na vertente da Fiabilidade e da Manutibilidade. Além de uma recolha de dados sobre a manutenção de veículos análogos, junto das entidades que executam a manutenção desses veículos, no caso do contrato CP2000 foi formalizada a colaboração da EMEF (empresa de manutenção do Grupo CP) através da emissão, por parte desta, de um documento com considerações e sugestões sobre a Manutibilidade dos veículos projectados, com base em desenhos e modelos 3D. O que caracteriza esta mudança organizacional é a integração de conhecimento do desempenho real dos veículos na fase 93 de concepção e design dos mesmos, pelo envolvimento directo de elementos da manutenção de veículos (actividade a jusante) na concepção destes (actividade a montante). Este processo de retroacção para melhoria da Manutibilidade dos veículos é claramente um novo processo de organização do trabalho. Contudo, foi considerado pela BTP que os resultados deste processo foram incipientes, embora não existam dúvidas sobre a sua relevância. O documento final, emitido pela EMEF, acrescentou muito pouco valor na fase de concepção e design dos veículos, tendo sido referido que era muito pouco prático, com soluções não viáveis para o veículo já escolhido. Uma das razões apontadas relaciona-se com o facto das “linguagens” da manutenção e da engenharia não serem as mesmas. Os elementos da manutenção apresentam alguma dificuldade em perceber os desenhos técnicos e os modelos 3D dos veículos e componentes, pelo que se torna mais difícil imaginarem e proporem melhorias para um comboio já projectado. Nos contratos RAMS em estudo, a gestão dos aprovisionamentos e das compras passou a incluir a definição de especificações RAMS para cada um desses níveis: especificações RAMS para o aprovisionamento e especificações RAMS para a compra (aqui com mais detalhe). Estas especificações resultam do já mencionado processo de Alocação. Por fim, nos contratos RAMS a organização do trabalho sofreu algumas alterações durante o período de garantia. Neste período, pelas condições RAMS a serem cumpridas, foi e é necessário o acompanhamento e recolha de dados sobre os factores RAMS, essencialmente a Fiabilidade e a Disponibilidade, de forma a, por uma lado, aferir o desempenho dos sistemas e enquadrá-lo na condições contratuais e, por outro lado, sistematizar os dados e produzir informação útil a ser utilizada pelo Departamento de Engenharia em acções de melhoria dos sistemas ou reengenharia. Este processo é referenciado aqui como a retroacção de informação do desempenho dos sistemas e traduz uma colaboração mais intensa entre a Função de Manutenção e a Engenharia da empresa, essencialmente caracterizada pela transformação da recolha de dados de campo, pelas equipas de manutenção, em informação útil, compreendida pelo departamento de Engenharia. A aproximação destas funções, embora não quantificada aqui, indicia uma mudança organizacional ao nível da organização do trabalho. Estas mudanças organizacionais, ao nível da organização do trabalho e dos seus procedimentos, são de dimensão limitada, logo incrementais (como oposição a radicais), não deixando, contudo, de conter um papel relevante na percepção das mudanças organizacionais directamente relacionadas com a incorporação RAMS. A Figura 20 sintetiza o aspecto mais significativo desta análise, os processos de retroacção. Os cenários finais em termos da organização do trabalho decorrentes das mudanças referidas são exclusivos do estado RAMS (instâncias do fenómeno RAMS), nos contratos dos níveis de comparação I e II, estando ausentes nos contratos do estado Pré-RAMS considerados. Segundo o Método da Concordância e o Método Indirecto da Diferença estabelece-se, assim, a causa e o efeito, 94 validando-se que a configuração da organização do trabalho dos contratos RAMS decorrem da incorporação RAMS na actividade da BTP. Retroacção para melhoria da Fiabilidade e Manutibilidade (reengenharia) Cadernos de Encargos e Condições Contratuais Concepção e Design Fabricação Controlo de Qualidade Operação e Manutenção Retroacção de veículos análogos para melhoria da Manutibilidade Figura 20 – Processo de Retroacção de informação RAMS nos veículos ferroviários. 95 III.III. Fase 2 – Projectos de Cooperação em I&D Para a identificação do papel de cada entidade integrada no grupo de cooperação, caracterizado pelas tarefas por si desenvolvidas, e dos resultados obtidos no processo (produtos de cooperação em I&D), foram construídos os mapas de tarefas e produtos para cada um dos projectos de cooperação em I&D considerados, os quais se encontram ilustrados na Figura 21, Figura 22, Figura 23 e Figura 24 respectivamente. A confrontação destes dois vectores permite compreender, por um lado, o papel específico de cada entidade no grupo de cooperação, que potencia a absorção de conhecimento por parte das outras entidades (transbordos de saída), e, por outro lado, a absorção de conhecimento de cada entidade (transbordos de entrada), resultante do acesso e da ligação à actividade das restantes. Como já salientado, a absorção de conhecimento produz normalmente efeitos globais a dois níveis: (I) expandindo o conhecimento em temáticas já com algum desenvolvimento prévio (que se decidiu denominar efeito de expansão) ou (II) iniciando ou habilitando o desenvolvimento de conhecimento em áreas desconhecidas ou com baixo grau de desenvolvimento (que se denominou efeito de habilitação). A partir de uma análise inicial aos mapas de tarefas e produtos várias conclusões podem ser retiradas: • A BTP assumiu o papel de coordenador na grande maioria dos projectos de cooperação em I&D em que participa; • Existem tarefas desenvolvidas especificamente por determinadas entidades, de acordo com a natureza da sua actividade; • Existem recursos materiais que são específicos de determinadas entidades, pela sua actividade, por exemplo os operadores de caminho de ferro; • Distinguem-se dois tipos distintos de tarefas, no que compete à sua natureza, aos quais foi atribuída a seguinte denominação: tarefas activas e tarefas passivas. O primeiro remete para a realização efectiva de acções de I&D, enquanto que o segundo remete para acções de disponibilização de dados, colaboração pontual e disponibilização de meios. • Os projectos apresentam complementaridade. características evidentes de exploração de • Os produtos da cooperação são maioritariamente de expansão de conhecimento, viabilizada pelas tarefas das outras entidades do grupo de cooperação (normalmente relacionadas com a sua actividade principal ou conhecimento base) ou pelo simples acesso a dados e informação por si disponibilizados. Ambas as situações remetem para a verificação de transbordos, tanto de entrada como de saída. 96 ADtranz • • • • • • • • Tarefas no Projecto Estrut. do projecto de veículos ferroviários (RAMS, modelo fiabilístico, impactes ambientais e ciclo de vida) Aplicação de técnicas de controlo da condição na manutenção de veículos ferroviários Desenvolvimento de documentação de suporte à manutenção e operação interactivas Desenvolvimento de sistema informático de identificação e requisição electrónica de peças sobressalentes Desenvolvimento de modelo e sistemas de recolha e report de incidentes, avarias e dados de Fiabilidade Proj. de reengenharia dos pontos críticos do projecto Apoio ao desenvolvimento do sistema de gestão da manutenção (RCM) e ao sistema de apoio à decisão Apoio ao desenvolvimento de técnicas e sistemas de manutenção, ao desenvolvimento do modelo de reutilização e reciclagem de materiais, componentes e consumíveis e ao desenvolvimento de regras de boa prática na estruturação de novos veículos Efacec – Serviços de Manutenção e Assistência, S.A. • • • • • Produtos da Cooperação em I&D Aproximação às vertentes operação e manutenção, permitindo a colheita de informação vital para o desenvolvimento de novos produtos (melhoria do custo do ciclo de vida, assegurando a sua competitividade) – regras de boa prática Obtenção de ferramentas de apoio à manutenção e operação, que farão parte da nova área de negócios de Assistência e Apoio ao Cliente Obtenção de modelo de reutilização / reciclagem, útil para o desenvolvimento de novos veículos Obtenção de um modelo de base de dados Obtenção de sistemas de gestão da manutenção e de apoio à decisão na manutenção, para a nova área de negócios de Assistência e Apoio ao Cliente vida do produto • Avaliação dos impactes ambientais resultantes das operações acessórias • Desenvolvimento de modelo heurístico nas ocorrências ambientais das operações acessórias, sua aplicação e validação vida de sistemas de transporte, da qual resultará um conjunto de regras e boas práticas ambientais condição dos problemas de manutenção e das condições de intervenção • Recolha, análise e tratamento dos parâmetros característicos destinados à modelização das leis da degradação do ciclo de vida Produtos da Cooperação em I&D • Formação de pessoal a nível de mestrados • Aquisição de conhecimento prático • Aplicação de técnicas de medição e análise de vibrações • Desenvolvimento de novas técnicas pontos fracos no projecto e no projecto mecânico de componentes Tarefas no Projecto • Validar o modelo operacional de manutenção a implementar • Analisar a adequabilidade das técnicas de CBM • Contribuir para a definição do modelo de análise do custo Fiabilidade e manutibilidade • Ajudar a melhoria do impacto ambiental ao longo do ciclo de vida dos produtos • Racionalização do apoio logístico de manutenção como meio de atingir um aumento de disponibilidade do produto Produtos da Cooperação em I&D • Diminuição do custo de ciclo de vida e aumento da disponibilidade do material circulante utilizado no Metro do Porto de ciclo de vida MIIT – Manutenção Industrial Informatizada e Tecnologia • • • • • • Tarefas no Projecto Definição da estrutura arborescente do projecto do veículo e modelo de Fiabilidade (FMEA) Definição de indicadores e forma de reporte de informação Definição da aplicabilidade e extensão das técnicas de controlo de condição por análise de vibrações Execução de medições de vibrações e respectiva análise Definição do modelo de manutenção e colaboração na definição das preparações de trabalho Definição da base de dados de informação do projecto Desenvolvimento de software para apoio à decisão Análise de resultados reportados Produtos da Cooperação em I&D • Alargar e promover os seus conhecimentos na área de monitorização de veículos ferroviários Produtos da Cooperação em I&D • Obtenção da estrutura da base de dados e do sistema de recolha de informação com foco na disponibilidade e Fiabilidade • Desenvolvimento do modelo fiabilístico de suporte de RCM • Desenvolvimento do modelo de gestão global da manutenção para a área dos transportes • Apuro na aplicação de técnicas de CBM por análise de vibrações INETI – Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial Tarefas no Projecto • Inspecção visual automatizada (visão por computador e processamento de imagem) Produtos da Cooperação em I&D • Valorização da instituição numa área tecnológica de futuro com aplicações em todos os sectores industriais tradicionais e ligados às novas tecnologias FEUP – Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto INEGI – Instituto de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial Tarefas no Projecto • Análise de lubrificantes • Colaboração na fase de projecto para definição de pontos de recolha manutenção • Obtenção de aumento de segurança, EMEF - Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário • • IST - IDMEC • Modelação da aplicação das técnicas • Análise dos resultados das medições de vibrações • Apoio na determinação do modelo fiabilístico e dos meios técnicos e minimizador do custo e ciclo de vida • Criação de grupos de estudo e reflexão destinados à análise Produtos da Cooperação em I&D • Redução dos custos de exploração e • Optimizar em tempo real o modelo de manutenção ISQ – Instituto da soldadura e Qualidade Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D • Análise e avaliação dos impactos ambientais do ciclo de • Aumento da experiência na análise de ciclo de Tarefas no Projecto • Definição da aplicabilidade de técnicas de controlo de Tarefas no Projecto • Implementação de um modelo de gestão maximizador dos Tarefas no Projecto • Colaboração na definição do sistema de informação e na estruturação do projecto • Recolha e tratamento estatístico de dados fiabilisticos Figura 21 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação SEM XXI 97 Produtos da Cooperação em I&D • Coadunar a modelização matemática fiabilística com a realidade industrial GEC / Metro-Cammell ADtranz • • • • Tarefas no Projecto Coordenação geral do projecto Design detalhado das partes terminais dos veículos, tipos 2e3 Produção e integração das partes finais tipo 2 e 3 nos veículos para serem testadas Testes de colisão estática Produtos da Cooperação em I&D • Participação na definição de novas regras de design da estrutura e interior de veículos ferroviários • Participação na definição dos diferentes níveis de requisitos de segurança passiva, para o design da estrutura e interior • Envolvimento na validação das medidas de segurança teóricas, através do fabrico, modelação numérica e teste de protótipos Tarefas no Projecto • Modelação matemática da parte terminal tipo 2 do veículo, sua fabricação e teste de componentes Deutsche Bahn AG Tarefas no Projecto • Testes de impacto dinâmico e compressão de veículos de acordo com a norma UIC566 • Fabricação de veículos para os testes de validação dinâmica e partes finais para os testes de impacto estático European Rail Research Institute Tarefas no Projecto • Ligação entre as normas existentes (UIC) e o caminho de ferro, sobretudo para a colecta de estatísticas de acidentes e análise e estabelecimento de versões preliminares de normas e códigos de conduta • Exploração de trabalho através das normas UIC e CEN e ligação com os membros UIC na Europa (não identificados) Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Faculdade da Motricidade Humana – Departamento Ergonomia Tarefas no Projecto • Determinação e especificação dos critérios de ergonomia para tripulação e passageiros Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) University of Valenciennes and Hainaut Cambresis Tarefas no Projecto • Análise das diversas configurações de pára choques Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) GEC / CIMT / Alstom Transport de Dietrich et Valenciennes Tarefas no Projecto • Envolvimento nas especificações de design de veículos e de testes e proposta final de normas • Fornecimento de equipamentos para a fabricação de veículos Tarefas no Projecto • Desenvolvimento e aplicação de análise dinâmica e ferramentas de design na optimização da colisão do pára choques do comboio • Modelação matemática da parte terminal tipo 3 do veículo Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Siemens Polskieb Koleje Panstwowe (Caminhos de Ferro Polacos) Tarefas no Projecto • Modificação de veículos e execução de testes de impacto dinâmico Produtos da Cooperação em I&D • Registo da patente sliding driver’s seat IST - IDMEC Produtos da Cooperação em I&D British Rail Research Tarefas no Projecto • Design inicial das partes terminais • Testes aos componentes da parte terminal 2 • Análise dos testes Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Figura 22 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação Safetrain Tarefas no Projecto • Design detalhado do veículo de teste com parte terminal tipo 1 (absorção elevada de energia) Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) DWA Tarefas no Projecto • Fabricação do veículo de teste com parte terminal tipo 3 (absorção intermédia de energia) Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Cranfield Impact Centre Tarefas no Projecto • Determinação dos impulsos de colisão representativos sobre os passageiros e tripulação • Determinação de critérios sobre ferimentos • Modelação matemática dos passageiros Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Société National de Chemin de Fer Tarefas no Projecto • Análise de acidentes • Análise do design das partes terminais tipo 1 inicialmente produzidas e estabelecimento de especificações de teste Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Technische Universitat Dresden Tarefas no Projecto • Revisão e escolha de acidentes representativos Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) IFS Tarefas no Projecto • Envolvimento no design de veículos com comportamento de absorção 98 de energia e nos testes de impacto dinâmico Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Centrum Naukowo – Techniczne Kolejnictwa BT • • • • Tarefas no Projecto Coordenação geral do projecto Inquérito de acidentes e estatísticas Design da estrutura de impacto dos veículos, sua fabricação e teste dinâmico dos seus componentes principais Modelação do layout interior dos veículos Produtos da Cooperação em I&D • Participação na definição de novas regras de design da estrutura e interior de veículos de cidade e suburbanos • Participação na definição dos diferentes níveis de requisitos de segurança passiva, para o design da estrutura e interior, de acordo com o tipo de veículo e suas condições operacionais • Envolvimento na validação das medidas de segurança teóricas, através do fabrico, modelação numérica e teste de protótipos Breda Costruzioni Ferroviarie Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D • Análise dos procedimentos actuais de segurança passiva (não identificados) nos veículos do tipo tram • Especificação do design da estrutura de impacto e teste • Fabricação da estrutura de impacto dos veículos suburbanos • Participação na síntese de resultados Produtos da Cooperação em I&D • Configurações das linhas para veículos • Coordenação de tarefas específicas (WP4) • Participação na especificação do design das estruturas de (não identificados) (não identificados) Deutsche Bahn AG • • • • Tarefas no Projecto Análise de acidentes para os veículos suburbanos Análise do estado da arte da segurança passiva de veículos suburbanos e sua compatibilidade com os comboios Especificações e ferramentas de medida para testes de dinâmica de colisão Síntese de resultados Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) IST - IDMEC Tarefas no Projecto • Análise da dinâmica global de veículos suburbanos • Proposta de standards Tarefas no Projecto • Estudo da compatibilidade com a legislação de automóveis • Estudo de layout interior: cenários de colisão, modelação de ocupantes e testes Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Régie Autonome des Transports Parisiens Produtos da Cooperação em I&D Tarefas no Projecto impacto • Seguimento dos testes de choque dinâmico e propostas • Análise dos procedimentos actuais de segurança passiva de standards Alstom Transport Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D Motor Industry Research Association Bombardier Transportation Nuremberg Tarefas no Projecto Tarefas no Projecto • Especificações e realização de testes de dinâmica de choque Produtos da Cooperação em I&D • Modelação das estruturas de impacto dos veículos de (não identificados) cidade e suburbanos. • Síntese de resultados (não identificados) em veículos de cidade e autocarros • Especificação para o design e teste da estrutura de impacto de veículos de cidade • Síntese de resultados e propostas para standards Société National de Chemin de Fer Alcan Alesa Engineering Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D • Disponibilização de dados sobre as características (não identificados) dinâmicas de veículos de cidade e suburbanos • Design, testes dinâmicos dos componentes e fabricação da estrutura de impacto dos veículos de cidade Berliner Verkehrsbetriebe Tarefas no Projecto • Participação na análise de acidentes e proposta de standards Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Figura 23 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação Safetram • • • • • Tarefas no Projecto Análise de acidentes de comboios suburbanos Especificações de design para a estrutura de impacte Desenvolvimento da dummy numérica para um passageiro em pé e validação através de testes Especificação para modelação de ocupantes e testes Propostas para standards Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) Technische Universitat Berlin Tarefas no Projecto • Análise ao estado de arte da segurança passiva de veículos de cidade • Análise da dinâmica global de veículos de cidade 99 Produtos da Cooperação em I&D (não identificados) IST - IDMEC BT Tarefas no Projecto • Concepção dos sistemas de medição • Especificações de ensaios dos sistemas individualizados • • • • • • • nas instalações dos fornecedores respectivos Especificações de ensaios dos sistemas já montados no veículo, na fábrica da BT Especificações de ensaios e verificações a nível do veículo na fábrica da BT Especificações de ensaios dos sistemas já montados no veículo, com este a circular em linha Especificações de ensaios e verificações a nível do veículo, com este a circular em linha para a versão 25kV/50Hz Realização de ensaios dos sistemas individualizados nas instalações dos fornecedores respectivos Realização de ensaios dos sistemas já montados no veículo, na fábrica da BT Elaboração de relatórios e análise de resultados de ensaios Produtos da Cooperação em I&D • Validação da Plataforma de Unidades Múltiplas para serviço Suburbano – Platsub, onde se integra o fornecimento da nova geração de unidades múltiplas para a CP na versão 25kV/50Hz para a rede suburbana do Grande Porto e na versão 1,5 kV DC para a linha de Cascais da rede suburbana da Grande Lisboa. Este projecto completa o ciclo de desenvolvimento da plataforma Platsub, pois é necessária uma fase final de validação do produto para detectar e corrigir deficiências que só mediante a realização de ensaios nesta fase previstos se tornam evidentes, permitindo uma eliminação muito completa dessas situações. ferramentas para o estabelecimento dos procedimentos de concepção e desenvolvimento do produto diversas facetas: condições de manutenção, reparação, desmontagem e montagem, respectivos tempos de intervenção e facilidades oficinais e sobressalentes disponíveis para o efeito • Confirmação/revisão dos valores da disponibilidade e custo do ciclo de vida calculados nas fases de concepção e desenvolvimento • Elaboração de relatório sobre a análise objectiva da manutibilidade • Revisão dos cálculos de RAMS e LCC compósitos da resistência ao fogo e da emissão de fumos tóxicos e opacos • Análise da resistência ao fogo e da emissão de fumos tóxicos e opacos • Elaboração de relatório (não identificados) Produtos da Cooperação em I&D • Extensão do conhecimento no âmbito RAMS com a sua validação prática INEGI - Instituto de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D • Definição e Realização de ensaios aos materiais Fernando J. F. Vazão, Lda. Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D • Apoio ao desenvolvimento de metodologias e Tarefas no Projecto • Análise objectiva da manutibilidade prevista, nas suas (não identificados) Escola Superior de Tecnologia de Setúbal Tarefas no Projecto Produtos da Cooperação em I&D • Análise de extensometria • Elaboração de relatório Figura 24 - Mapa de tarefas e produtos: Grupo de Cooperação Platsub-Validação 100 (não identificados) De acordo com estes factores e de forma a clarificar a dinâmica dos projectos de cooperação em I&D apresenta-se um quadro que cruza informação referente ao tipo de transbordos de entrada e ao tipo de tarefas desenvolvidas por cada entidade cooperante. Este quadro, representado na Figura 25 com as quatro possibilidades associadas à verificação de transbordos de entrada, denominou-se Quadro de Dinâmica de Cooperação. De seguida, aborda-se especificamente a dinâmica de cada um dos projectos de cooperação em I&D, fazendo o respectivo enquadramento no Quadro de Dinâmica de Cooperação para a actividade da BTP. Tipo de Spillovers de Entrada Expansão Habilitação x Passivas Activas Tipo de Tarefas Figura 25 – Quadro de Dinâmica de Cooperação O projecto mobilizador SEM XXI teve como objectivo o desenvolvimento do sistema ferroviário português. Nesse sentido, foram envolvidas nove entidades, com a coordenação a cabo da ADtranz, com actividades diversas nesse sistema (manutenção, consultoria, investigação). Os produtos da cooperação para a ADtranz indiciam a verificação de transbordos de entrada, basicamente nos níveis da melhoria do ciclo de vida do produto (efeito de expansão) e da criação de competências ao nível da manutenção de veículos ferroviários (efeito de habilitação), no âmbito da então nova área de negócios de assistência e apoio ao cliente. Esta absorção de conhecimento está directamente relacionada com os factores RAMS, essencialmente no que confere à integração de conhecimento relativo à Fiabilidade e à Manutibilidade de veículos. Os transbordos de saída respectivos são essencialmente oriundos das entidades ligadas à manutenção e investigação da Fiabilidade e análise de condição. Na Figura 26 ilustra-se a dinâmica de cooperação neste projecto para a BT. 101 Por outro lado, a colaboração com a ADtranz permitiu às restantes entidades expandirem o seu conhecimento base (efeito de expansão), maioritariamente pela aplicação e confirmação prática de modelos e metodologias. Tipo de Spillovers de Entrada Expansão Habilitação Passivas Activas Tipo de Tarefas Figura 26 – Quadro de Dinâmica de Cooperação para a BTP no projecto SEM XXI. Os projectos de cooperação internacional Safetrain e Safetram apresentam ambos, até pela proximidade do tema em análise, características globais análogas no que compete às tarefas e aos produtos da cooperação e, consequentemente, no sistema de transbordos de entrada e saída. Pela dimensão dos projectos e os seus objectivos é notória a procura do envolvimento de um número elevado de entidades, desde operadores, fabricantes e institutos de investigação e universidades, no intuito de promover as vantagens da cooperação sobretudo ao nível da complementaridade. A participação de cada entidade no grupo de cooperação está essencialmente associada à sua actividade base, perspectivando-se, como tal, o acrescento de valor. Veja-se o papel do European Rail Research Institute, do IST/IDMEC, da Faculdade da Motricidade Humana/Dep. Ergonomia ou do Cranfield Impact Centre. A ADtranz foi a coordenadora de ambos os projectos, tendo adicionalmente desenvolvido as tarefas de design da estrutura de impacto dos veículos, sua fabricação e testes. Os transbordos de entrada resultantes destes projectos, para a ADtranz, apontam para o conhecimento, através de um envolvimento directo, de novas regras de design da estrutura e interior de veículos ferroviários, cujo corolário será a proposta para novas normas de Segurança passiva na Europa. Este conhecimento pode-se caracterizar segundo duas vertentes: pelo efeito de habilitação, na medida que reflecte a percepção de novas regras e especificações de Segurança passiva, mas também pelo efeito de expansão, pela ampliação do conhecimento existente em design de estruturas de 102 impacto (através da sua concepção e ensaios). Neste projecto, dos factores RAMS, é claramente o factor da Segurança que se encontra em evidência. Na Figura 27 caracteriza-se a dinâmica de cooperação neste projecto para a BT. Estes transbordos são viabilizados pelas participações específicas das restantes entidades cooperantes (que emitem os seus transbordos de saída). Tipo de Spillovers de Entrada Expansão Habilitação Passivas Activas Tipo de Tarefas Figura 27 – Quadro de Dinâmica de Cooperação para a BTP nos projectos Safetrain e Safetram. No projecto Platsub-validação da BTP, a participação de outras entidades deu-se a níveis muito específicos, com base nas tarefas executadas por cada uma, proporcionando à BTP a validação da plataforma de unidades múltiplas Platsub (efeito de extensão), onde se integrava o fornecimento à CP das unidades múltiplas conhecidas como CP2000. Este projecto permitiu, através da cooperação com outras entidades, efectuar diversas análises e validar aspectos relacionados com a Segurança e com a Manutibilidade dos veículos, além de ter incluído a revisão dos cálculos RAMS. Além deste transbordo de entrada, também se podem constatar os transbordos de saída, considerando que as entidades cooperantes beneficiaram do projecto de validação, através de medições, ensaios e testes, confirmando e dando consistência aos seus modelos e metodologias (efeito de extensão). Na Figura 28 salienta-se a dinâmica de cooperação mais evidente neste projecto para a BTP. Tendo-se analisado e validado o modelo dos fluxos de transbordos nos projectos de cooperação em I&D (CI&D) em que a BTP participou, com fortes ligações a conhecimento numa perspectiva RAMS, procedeu-se de seguida à análise dos produtos (resultados) dos diversos projectos de cooperação em I&D considerados, também numa óptica RAMS. 103 Tipo de Spillovers de Entrada Expansão Habilitação Passivas Activas Tipo de Tarefas Figura 28 – Quadro de Dinâmica de Cooperação para a BTP no projecto Platsub. Analisando-se a Matriz de Redução do Risco Agregada, ilustrada na Tabela 12, obtida através da composição das Matrizes de Redução do Risco Parciais, segundo a Tabela 9, Tabela 10 e Tabela 11, constata-se que todos os projectos de cooperação em I&D identificados apresentam reduções significativas, numa óptica referente à Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança dos sistemas, em pelo menos um dos níveis de risco. Todos apresentam reduções significativas em pelo menos dois dos níveis de risco, com excepção do projecto Platsub-validação (que apenas apresenta uma redução significativa no risco de design). Salienta-se a importância do projecto SEM XXI que, pelo menos no médio ou longo prazo, apresenta uma redução significativa de todos os níveis de risco considerados, o que se reflecte numa muito significativa redução do risco global RAMS que a empresa enfrenta. É de salientar que este projecto esteve directamente relacionado com uma abordagem RAMS aos veículos ferroviários e ao sistema ferroviário no geral, tentando envolver todas as entidades ligadas a este de uma forma directa. 104 Projecto CI&D SEM XXI Safetrain Safetram Platsub - Validação Risco de Design Redução Moderada* Redução Forte Redução Forte Redução Forte Risco Comercial Redução Positiva Redução Positiva * Redução Positiva * Redução Moderada Redução Muito Forte Sem Redução Sem Redução Redução Pequena Nível de Risco Risco de Operação e Manutenção Tabela 9 - Matriz de Redução do Risco Parcial - perspectiva do Departamento de Marketing e Vendas da BTP * Efeito previsto no médio / longo prazo (entre 3 a 10 anos) Classificação das reduções baseada no modelo Macbeth: • Sem Redução (referenciada pela alternativa neutra) • Redução Muito Pequena • Redução Pequena • Redução Moderada • Redução Forte (referenciada pela alternativa boa – o entrevistado define o que para si representa uma alternativa boa em termos da redução do risco) • Redução Muito Forte • Redução Extrema • Redução Positiva (é prevista uma redução mas com dificuldade de quantificação relativa) 105 Projecto CI&D SEM XXI Safetrain Safetram Platsub - Validação Risco de Design Redução Forte Redução Forte Redução Forte Redução Forte Risco Comercial Redução Moderada Redução Moderada * Redução Moderada * Redução Pequena Risco de Operação e Manutenção Redução Muito Forte Redução Moderada Redução Moderada Redução Pequena Nível de Risco Tabela 10 - Matriz de Redução do Risco Parcial - perspectiva do Departamento de Engenharia da BTP * Efeito previsto no médio / longo prazo (entre 3 a 10 anos) Classificação das reduções baseada no modelo Macbeth: • Sem Redução (referenciada pela alternativa neutra) • Redução Muito Pequena • Redução Pequena • Redução Moderada • Redução Forte (referenciada pela alternativa boa – o entrevistado define o que para si representa uma alternativa boa em termos da redução do risco) • Redução Muito Forte • Redução Extrema • Redução Positiva (é prevista uma redução mas com dificuldade de quantificação relativa) 106 Projecto CI&D SEM XXI Safetrain Safetram Platsub - Validação Risco de Design Redução Muito Forte Redução Forte Redução Forte Redução Forte Risco Comercial Redução Forte Redução Muito Forte * Redução Muito Forte* Redução Muito Forte Redução Muito Forte* Redução Muito Fraca Redução Muito Fraca Redução Positiva Nível de Risco Risco de Operação e Manutenção Tabela 11 - Matriz de Redução do Risco Parcial - perspectiva da Administração da BTP * Efeito previsto no médio / longo prazo (entre 3 a 10 anos) Classificação das reduções baseada no modelo Macbeth: • Sem Redução (referenciada pela alternativa neutra) • Redução Muito Pequena • Redução Pequena • Redução Moderada • Redução Forte (referenciada pela alternativa boa – o entrevistado define o que para si representa uma alternativa boa em termos da redução do risco) • Redução Muito Forte • Redução Extrema • Redução Positiva (é prevista uma redução mas com dificuldade de quantificação relativa) 107 Projecto CI&D SEM XXI Safetrain Safetram Platsub - Validação Risco de Design Redução Moderada* Redução Forte Redução Forte Redução Forte Risco Comercial Redução Moderada Redução Moderada* Redução Moderada* Redução Pequena Redução Muito Forte* Redução Muito Fraca Redução Muito Fraca Redução Pequena Nível de Risco Risco de Operação e Manutenção Tabela 12 - Matriz de Redução do Risco Agregada * Efeito previsto no médio / longo prazo (entre 3 a 10 anos) Classificação das reduções baseada no modelo Macbeth: • Sem Redução (referenciada pela alternativa neutra) • Redução Muito Pequena • Redução Pequena • Redução Moderada • Redução Forte (referenciada pela alternativa boa – o entrevistado define o que para si representa uma alternativa boa em termos da redução do risco) • Redução Muito Forte • Redução Extrema • Redução Positiva (é prevista uma redução mas com dificuldade de quantificação relativa) 108 III.IV. Conclusões Existe evidência de que a incorporação RAMS na actividade da BTP, caracterizada pela adopção e desenvolvimento de diversas metodologias, processos e técnicas RAMS ao longo de várias fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários, teve origem nas condições contratuais vigentes nos contratos do MP e CP2000, denominados contratos RAMS em oposição aos contratos do ML e UQEs de Sintra, denominados Pré-RAMS. As condições contratuais dos contratos RAMS definem índices para os factores RAMS e estabelecem valores limite a cumprir durante a fase de demonstração dos veículos (período de garantia), com a aplicação de penalidades nos casos de incumprimento, as quais são muito significativas em termos absolutos e face aos valores dos contratos. Embora concebidos de forma a respeitar esses limites, é na fase de operação dos veículos que o seu desempenho reflecte e confirma os seus factores RAMS inerentes. Neste sentido, existe um aumento do risco de operação e manutenção para a BTP34, com implicações consequentes para o risco global que a empresa enfrenta na sua actividade. Para gerir o aumento do risco, a BTP desenvolveu e aplicou pela primeira vez diversas metodologias, processos e técnicas em algumas fases cruciais do desenvolvimento e produção dos veículos ferroviários, a saber: 1. Concepção e Design; 2. Ensaios e testes de qualidade à fabricação; 3. Operação e Manutenção. Na fase de Concepção e Design a BTP desenvolveu e aplicou diversas metodologias e técnicas, de acordo com a caracterização efectuada em III.II., de forma a definir, coordenar e estabelecer os factores RAMS inerentes para os veículos, considerando a sua relação com os diversos fornecedores de componentes e sistemas críticos na perspectiva RAMS. Estas actividades assumiram um papel muito significativo, pela afectação de recursos que implicaram e pelo tempo envolvido na sua consecução (vide Tabela 6). Pode-se, assim, concluir que, para conceber a tecnologia seguindo uma orientação RAMS bem definida, a BTP necessitou de investir tempo adicional e mais recursos, essencialmente humanos, durante a fase de concepção dos veículos (um ano e meio no caso do contrato CP2000 e dois anos e meio no MP). Tendo em atenção que um controlo de qualidade insuficiente ou desajustado pode degradar seriamente os factores RAMS inerentes dos sistemas (projectados), a BTP reforçou a sua atenção e o seu esforço nas inspecções de recepção, no intuito de aumentar a garantia de que os componentes e sistemas adquiridos a fornecedores respeitam os factores RAMS acordados. Adicionalmente, foi verificado que a BTP 34 O risco de operação e manutenção é um dos níveis da gestão do risco global (Lemos et al., 2001). 109 passou a acompanhar a actividade dos fornecedores, procurando mais informação sobre estes e sobre os processos de concepção e fabricação da sua tecnologia. Convém referir que, considerando e assumindo a política de Produção Magra, a BTP produz um transbordo da incorporação RAMS para os seus fornecedores de componentes e sistemas, críticos na óptica RAMS. Este transbordo, referenciado como Alocação, poderá ter implicado uma mudança organizacional, com características análogas, em algumas empresas fornecedoras de componentes, dependendo da organização, metodologias e técnicas na base da sua actividade anterior. A análise e confirmação desta hipótese não foi, neste estudo, desenvolvida, pelas implicações e dimensão do processo de análise necessário. De forma a efectuar um acompanhamento do desempenho dos veículos na sua operação, nomeadamente no que confere à evolução aos factores RAMS, a BTP tem durante o período de garantia elementos no campo, que, sendo responsáveis pela garantia dos veículos (manutenção correctiva), recolhem e alimentam uma base de dados com elementos detalhados para o cálculo dos índices de Fiabilidade e Disponibilidade previstos em termos contratuais, além da possibilidade de análise dos restantes factores RAMS, nomeadamente a Manutibilidade. A recolha e tratamento, segundo software, dos dados recolhidos produzem informação fundamental para a concepção dos veículos, viabilizando acções de melhoria e reengenharia de componentes e sistemas que levam à aplicação de correcções, substituições ou modificações tanto nos veículos já produzidos como nos que se encontram em produção. Dada a especificidade dos dados a recolher, bem como o seu tratamento, nos contratos RAMS (em ambos os níveis de comparação), salienta-se que ao nível das equipas da BTP no campo apenas o contrato do MP apresenta um reforço significativo de elementos, essencialmente ao nível das acções de garantia (manutenção correctiva) e de reengenharia (implementação de substituições e/ou modificações nos veículos). Este facto poderá estar relacionado com a peculiaridade do contrato do MP, onde a BTP se insere num consórcio global para a instalação das infra-estruturas ferroviárias, fabricação, operação e garantia dos veículos ferroviários. Pelas implicações de certa forma evidentes desta estrutura, sobretudo ao nível do risco35, pode-se esperar que a estrutura de recursos no campo da BTP seja, no contrato do MP, uma resposta efectiva para a gestão do risco que a empresa e o consórcio levam a cabo neste contrato. O contrato do MP assume, assim, uma configuração diferente dos restantes contratos considerados, incluindo o contrato RAMS do CP2000, a qual parece levar a uma abordagem mais fina dos factores RAMS, evidenciada sobretudo na fase de operação e manutenção dos veículos. 35 Considerando os riscos comerciais adjacentes à operação dos veículos e a sua relação com o desempenho dos factores RAMS. 110 Em ambos os contratos RAMS existiu, assim, uma mudança organizacional como resultado da incorporação RAMS na actividade da BTP. A mudança organizacional ocorreu e é caracterizada pela mudança em alguns processos de gestão, mudança nos procedimentos e na organização do trabalho e pela mudança na relação com o cliente. Um dos aspectos que se decidiu salientar está relacionado com o processo de retroacção para a fase de concepção da tecnologia, a partir do desempenho real desta no seu ambiente de operação, ou seja, a optimização contínua dos factores RAMS depende, para quem concebe e desenvolve a tecnologia, de um mecanismo de retroacção do desempenho real dos sistemas. Este processo indicia uma mudança organizacional significativa no relacionamento entre a Função de Manutenção e a Função de Engenharia da empresa, assente no estabelecimento de uma base de informação comum e compreendida por ambas. Em termos globais, a visão RAMS integrada ao longo das fases referidas do ciclo de vida dos veículos ferroviários foi a principal via para a gestão do aumento do risco introduzido pelos contratos RAMS, pelas relações dos factores RAMS em cada uma das fases. Como salientado anteriormente, os factores RAMS inerentes dos veículos (projectados durante a sua concepção) apenas serão confirmados através de um controlo de qualidade à produção adequado e só se convenientemente aferidos durante a operação poderão identificar situações de desvio viabilizando a melhoria ou a reengenharia dos sistemas, de forma a se respeitarem integralmente as condições contratuais para os factores RAMS. Contudo, é de salientar que este processo integral apenas será aplicado, contratualmente, durante o período de garantia dos veículos (cinco anos no MP e três anos no CP2000). Após este período, todas as actividades de operação e manutenção dos veículos passam a ser geridas e executadas por outras entidades, sem relação com a BTP. Neste cenário, dois aspectos adquirem relevo: (I) os circuitos de retroacção da operação e manutenção podem deixar de ocorrer, limitando o histórico do desempenho dos sistemas ao período de garantia, e (II) a BTP deixa de poder assegurar a manutenção dos índices RAMS, uma vez que as actividades de operação e manutenção lhe são totalmente alheias e não tendo qualquer tipo de controlo sobre estas. Tendo em atenção o perfil de falhas dos sistemas ao longo da sua vida útil (vide Figura 1), o primeiro aspecto parece restringir em grande parte a contribuição do histórico de desempenho real dos sistemas para a concepção e engenharia dos sistemas, pois o conhecimento prático do perfil de falhas destes, durante a fase final da sua vida útil, é sem dúvida essencial para as acções de melhoria e reengenharia dos sistemas, ou seja, para o desenvolvimento da tecnologia. Nesse sentido, uma solução poderá passar por, mesmo sem um vínculo contratual formal, as entidades operadoras dos veículos e responsáveis pela sua manutenção continuarem a reportar dados sobre o desempenho dos veículos, essencialmente na óptica RAMS, até ao seu fim de vida. O segundo aspecto mencionado está, em parte relacionado com o anterior, representando aparentemente uma das suas causas. A estrutura de mercado existente em 111 Portugal, onde os operadores dos veículos ou têm recursos próprios de manutenção ou empresas associadas de manutenção, tem limitado a entrada para esta actividade dos fabricantes, nomeadamente a BTP. Em termos globais, a integração da actividade de manutenção nos contratos de concepção e fornecimento de veículos ferroviários, até ao fim de vida dos sistemas, tornaria viável a imposição por parte dos clientes, durante esse período, de condições RAMS limite a cumprir. Nesta perspectiva, os mecanismos de melhoria e reengenharia, levados a cabo pelo fabricante, seriam muito mais longos, esperando-se implicações visíveis para o desenvolvimento e inovação da tecnologia36. Adicionalmente, existiria uma motivação extra para a aplicação de uma Manutenção Baseada na Fiabilidade (RCM – Reliability Centered Maintenance) pelo fabricante, de forma a garantir ao máximo e durante um maior período de tempo, incluindo a fase final de vida dos sistemas, as características RAMS inerentes dos seus veículos. A análise efectuada promove a sistematização do problema da incorporação RAMS numa empresa associada à concepção e fabricação de veículos ferroviários, não prevendo, no entanto, uma análise quantitativa da incorporação RAMS, em termos do balanço entre os seus custos associados e a análise de risco adjacente (de acordo com o exposto em I.III.VI.). Uma análise dessa índole, pelo seu valor e complexidade, deverá ser objecto de um estudo específico e detalhado. Na segunda fase da análise, não se pretendeu concluir sobre a quantificação detalhada da redução do risco global RAMS imposta pelos produtos das actividades de cooperação em I&D da BTP, mas sim se essa redução existe e é significativa. Da análise à Matriz de Redução do Risco Agregada constata-se que os produtos dos projectos de cooperação em I&D considerados, em que a BTP participou, reduziram os seus riscos comerciais, de design e de operação e manutenção, em conjunto ou, no mínimo, a um desses níveis, impondo uma redução no risco global RAMS que a empresa enfrenta na sua actividade industrial de concepção e fabricação de material circulante ferroviário (pelo somatório dos efeitos de redução em cada um dos níveis de risco considerados). Através da análise de vários projectos de cooperação em I&D em que a BTP participou, constatou-se a existência de uma dinâmica de grupo em termos de aquisição e transferência de conhecimento, representada por transbordos de entrada (conhecimento absorvido a partir da colaboração com as outras entidades do grupo de cooperação) e por transbordos de saída (conhecimento transferido para outras entidades 36 Como exemplo de referência pode-se considerar o sector automóvel, onde a manutenção integral dos veículos é executada pelos fabricantes e seus representantes, numa primeira fase inserida num período de garantia, e após esse período por uma quase obrigatoriedade relacionada cada vez mais com a complexidade tecnológica particular dos sistemas e com a garantia extra de cada reparação dada pelo fabricante. Os fabricantes dos veículos tentam, assim, garantir a endogeneização do conhecimento sobre o desempenho dos seus veículos, ao longo de toda a sua vida útil, o qual está na base do desenvolvimento dos seus veículos e das suas inovações. 112 do grupo de cooperação). Esta dinâmica corrobora as vantagens resultantes, nestes projectos, da cooperação em I&D, face a posicionamentos solitários e isolados, sobretudo pela exploração da complementaridade. Os resultados obtidos pela BTP através destes projectos (produtos da cooperação), pela absorção de conhecimento RAMS, são claramente fruto da cooperação em I&D e nunca poderiam ser obtidos pela BTP através de actividades de I&D solitárias num período de tempo razoável e com custos viáveis. Constatou-se, assim, que essa absorção de conhecimento específico teve um papel efectivo na redução do risco RAMS, ou seja, na incorporação RAMS operada pela BTP. A cooperação em actividades de I&D tem sido, em termos históricos, uma direcção adoptada pela BTP para o acesso a aptidões e tecnologias, atingindo economias através da exploração da complementaridade, no sentido de optimizar a sua função de concepção e o seu departamento de engenharia. 113 IV. Conclusões do estudo e sugestões para estudos futuros IV.I. Proposta de um modelo RAMS para os veículos ferroviários As conclusões da análise efectuada ao caso da BTP reflectem a forma como a incorporação RAMS nesta empresa foi orientada e estruturada. Ambos os contratos RAMS identificados (MP e CP2000) foram desenvolvidos e são actualmente operados numa óptica RAMS, ou seja, com critérios sistematizados sobre a Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança dos veículos. Foram aplicadas diversas técnicas e metodologias, com recurso a informação RAMS, desde a fase de concepção e design dos veículos ao controlo de qualidade da sua fabricação. Adicionalmente, durante a operação dos veículos tem sido seguido o seu desempenho baseado em índices de Fiabilidade e Disponibilidade, identificando a repetição de problemas e avarias nos diversos sistemas e componentes. Contudo, é de considerar o facto dos dois contratos referidos terem sido os primeiros desenvolvidos numa óptica RAMS pela BTP e, como já mencionado, existirem algumas barreiras a uma implementação RAMS mais longa no tempo, aparentemente pela estrutura do mercado do sector ferroviário em Portugal. No início deste estudo efectuou-se uma revisão das principais e mais utilizadas técnicas e metodologias de apoio ao desenvolvimento de produtos de base tecnológica com critérios RAMS. No estudo do caso da BTP foi encontrada evidência sobre a aplicação de alguns destes processos nos contratos do MP e CP2000 (que por motivos da análise foram denominados RAMS), ao longo das diversas fases do seu desenvolvimento. Por outro lado, não foi verificada a aplicação de outros processos RAMS (por razões não identificadas neste estudo) que, no entanto, são habitualmente referidos pela literatura [Instituto Português da Qualidade (2000), Billinton e Allan (1992), Kececioglu (1991), Smith (2001)] como parte complementar de uma abordagem RAMS global e integrada. Adicionalmente, a aplicação integrada dos factores RAMS ao longo da vida útil dos veículos ferroviários encontra nos modelos contratuais actuais um constrangimento importante. Os condições contratuais face aos factores RAMS têm a duração do período de garantia dos veículos, pois a manutenção destes (actividade crítica na preservação dos factores RAMS inerentes), após o termo deste período, deixa de ser seguida e realizada pela entidade que concebe e fabrica os veículos, não sendo lógico esta obedecer a condições para as quais não pode contribuir ao longo de uma grande parte da vida útil dos veículos. Este aspecto, cuja envolvente passa também por questões políticas e sociais baseadas na estrutura de mercado deste sector em Portugal, poderá ser um constrangimento no curto e médio prazo a uma evolução mais profunda na incorporação RAMS nos veículos ferroviários, desde o ponto de vista do operador como do fabricante que concebe os veículos. Na sequência da análise efectuada, constata-se claramente que a incorporação RAMS nos veículos ferroviários tem como fulcro a concepção da tecnologia, fase onde se definem e estabelecem a Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança 114 inerentes dos sistemas e dos veículos no seu global. A influência ou melhoria dos factores RAMS posteriormente à sua concepção tem invariavelmente custos muito elevados, os quais inviabilizam esta solução para o controlo dos factores RAMS [Billinton e Allan (1992), Kececioglu (1991), Smith (2001)]. Os custos de melhoria e reengenharia dos sistemas, com resultados em termos de incremento dos factores RAMS, são habitualmente muito significativos, o mesmo aplicando-se ao recurso a acções de manutenção preventiva com o mesmo fim. No percurso normal do ciclo de vida, a actividade de controlo de qualidade actua essencialmente como garantia de que a fabricação dos sistemas e dos veículos no global respeita os factores RAMS definidos durante a sua concepção (factores inerentes), enquanto que as actividades de manutenção preventiva são orientadas para a preservação dos factores RAMS durante a operação dos veículos. Com base no estudo do caso da BTP e na revisão da literatura efectuada no âmbito RAMS, procedeu-se à construção de um modelo que estrutura a incorporação RAMS nos veículos ferroviários ao longo do seu ciclo de vida, ou seja, seguindo uma abordagem holística aos veículos ferroviários. Todas as técnicas e metodologias identificadas de seguida estão associadas à aplicação de critérios RAMS a produtos de base tecnológica, de acordo com a literatura revista. A Figura 29 ilustra o modelo proposto. Actividades ao longo do tempo Condições Contratuais Informação RAMS Concepção e Design Fabricação Controlo de Qualidade Retroacção de informação RAMS simples Retroacção de informação RAMS multi-estágio Operação e Manutenção Processo de iteração Técnicas, Metodologias e Processos RAMS Figura 29 – Modelo RAMS para o ciclo de vida completo de Veículos Ferroviários. 115 Este modelo, caracterizado de seguida, descreve na óptica RAMS cada uma das fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários no que compete a: • Entradas e fluxos de informação • Técnicas e metodologias aplicadas • Processo de iteração (seguindo o modelo de Holman et al., 2003) As condições contratuais são apresentadas como a origem da incorporação RAMS, influenciando a amplitude no tempo e a profundidade dos critérios RAMS na concepção, fabricação e operação da tecnologia. As condições contratuais com contornos RAMS implicam, como no caso da BTP, um aumento do risco de operação e manutenção dos veículos para os fabricantes destes, sendo a incorporação RAMS (desenvolvimento, fabricação e operação dos veículos com base em critérios RAMS sistematizados) uma resposta para o seu controlo. Em cada fase do ciclo de vida dos sistemas e dos veículos ferroviários verifica-se a entrada de informação específica para o seu desenvolvimento, a partir de uma base de dados própria ou externa. A informação no âmbito RAMS está presente em todas as fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários. Na fase de concepção e design é incorporada informação sobre a Fiabilidade e Manutibilidade dos sistemas e componentes (probabilidade de falha e tempos de reparação de falha), a qual é disponibilizada pelos respectivos fornecedores (que concebem e fabricam esses sistemas e componentes) ou constituída a partir de dados históricos do desempenho real dos sistemas, pela aplicação de modelos estatísticos apropriados. Na fase de fabricação, a organização e o processo de produção devem obedecer aos requisitos RAMS dos veículos no que compete à integração dos sistemas e componentes no veículo final. Durante a fase de controlo de qualidade, a informação sobre os valores de referência dos factores RAMS inerentes dos veículos é a base da supervisão e controlo da fabricação, de forma a garantir o seu cumprimento efectivo. Por fim, durante a operação dos veículos, a informação sobre as condições RAMS a cumprir no contrato é essencial para se optimizar o desempenho dos veículos e as intervenções de manutenção, evitando a aplicação de penalidades sobre o incumprimento das condições contratuais RAMS. O tratamento da informação RAMS em cada uma das fases do ciclo de vida é efectuado através da aplicação de diversas técnicas e metodologias. Estas foram já devidamente identificadas e apresentadas no capítulo I.III.VII. deste estudo. Durante a fase de concepção e design dos sistemas e dos veículos no seu global são aplicadas técnicas como as árvores de eventos e/ou árvores de falhas e as cadeias de Markov e metodologias como a FMEA. A aplicação destas técnicas e metodologias permite calcular os índices de Fiabilidade, Disponibilidade e Manutibilidade dos sistemas, a partir dos índices elementares dos seus componentes, e, através da sua 116 integração, dos veículos no global. A Fiabilidade e a Disponibilidade dos componentes são normalmente calculadas com base numa análise estocástica, segundo modelos estatísticos apropriados (Billinton e Allan, 1992), sobre dados históricos do desempenho de componentes semelhantes. Adicionalmente, estas técnicas e metodologias são aplicadas na análise e nos estudos de Segurança dos veículos, sistematizando os riscos de acidente, as suas consequências e as soluções para a minimização do perigo. Através do cálculo e estabelecimento dos factores RAMS inerentes, em conjunto com informação sobre os custos regulares de operação dos sistemas e as actividades de manutenção preventiva a aplicar a estes, é possível calcular e definir o CCV (Custo de Ciclo de Vida) dos veículos ferroviários. Trata-se, portanto, de um processo iterativo, que visa a definição e o estabelecimento dos factores RAMS inerentes dos veículos e o cálculo do CCV destes. Durante as fases de fabricação e controlo de qualidade dos sistemas e dos veículos globais fabricados, as técnicas e metodologias habitualmente seguidas nestas funções passam a incidir paralelamente sobre os factores RAMS, nomeadamente o controlo estatístico da qualidade e o respectivo controlo estatístico do processo. Trata-se de um processo iterativo no que confere à repetição de várias acções análogas, com incidência nos diversos sistemas constituintes dos veículos e finalmente nos veículos completos. Durante a fase de operação dos veículos, são aplicadas metodologias no que compete à recolha sistemática de dados sobre o desempenho dos sistemas e dos veículos no global, sendo aplicadas técnicas e tecnologias para o seu tratamento e transformação em informação útil numa perspectiva RAMS, nomeadamente segundo a utilização de software específico, caso dos sistemas GMAC (Gestão de Manutenção Assistida por Computador). Paralelamente, as actividades de manutenção, tanto correctiva como preventiva, críticas na preservação dos índices RAMS inerentes durante a operação dos sistemas, podem ser programadas e optimizadas numa óptica RAMS através de uma política de Manutenção Condicionada e da metodologia RCM (Manutenção Centrada na Fiabilidade), reduzindo custos enquanto se preserva e melhora os índices RAMS. A incorporação destas técnicas e metodologias segue, assim, um processo iterativo, de repetição e de construção de novos resultados a partir de acções anteriores. A aplicação das técnicas e metodologias numa determinada fase utiliza, em diversos casos, informação proveniente de outras fases, distinguindo-se a retroacção de informação RAMS simples e a retroacção de informação RAMS multi-estágio para estes fluxos de informação. O primeiro refere-se à incorporação de informação proveniente da fase imediatamente posterior, enquanto que o segundo está relacionado com transferências de informação entre fases não imediatamente sequenciais. No modelo proposto existem quatro tipos de retroacção de informação RAMS simples: (I) da operação e manutenção dos sistemas para o controlo de qualidade da fabricação, (II) deste para a fabricação, (III) da fabricação para a concepção e design dos sistemas e (IV) da concepção e design dos sistemas para as condições contratuais. A transferência de informação da operação e manutenção dos sistemas e dos veículos no global para o controlo de qualidade ocorre na perspectiva de identificar, numa primeira abordagem, 117 eventuais falhas no sistema de controlo de qualidade que possam comprometer o desempenho dos veículos em termos das suas condições contratuais RAMS, a partir de situações específicas de desvio verificadas. Por outro lado, as acções de controlo de qualidade evidenciam problemas verificados na fabricação dos sistemas e veículos, com consequências sobre os índices RAMS inerentes, fornecendo, assim, informação útil para a correcção desses problemas. Noutra vertente e de uma forma natural, a capacidade e potencialidade técnica e tecnológica do sistema de fabricação condicionam a concepção da tecnologia. Neste processo de permanente supervisão, controlo e melhoria dos factores RAMS existe ainda um outro fluxo de informação com um papel determinante em todo o processo. Trata-se, no entanto, de uma retroacção de informação RAMS multi-estágio, considerando a transferência de informação da operação e manutenção dos veículos para a fase de concepção e design dos mesmos. Este processo, habitualmente referido como reengenharia assume um papel de enorme relevo pelos resultados da sua aplicação: verificação prática dos factores RAMS inerentes com incorporação de melhorias ou reengenharia dos sistemas nos aspectos onde ocorrem desvios. Assemelha-se a um processo de auto-regulação, por analogia com outras áreas da engenharia. O seu papel de relevo é reforçado pelo facto dos factores RAMS apenas poderem ser efectivamente testados pela operação efectiva e em condições envolventes reais dos sistemas. Estes fluxos de informação são importantes ao longo de todo o ciclo de vida dos veículos, não só durante o seu período inicial de vida, normalmente sob garantia. A sua manutenção é particularmente importante durante a fase final da vida dos sistemas, quando estes passam a exibir problemas resultantes do seu desgaste (vide I.III.II.). Noutro âmbito, existem ainda dois fluxos de informação RAMS a salientar em todo o sistema. Esses fluxos são responsáveis, em parte, pela caracterização e evolução das condições contratuais sobre a concepção, fabricação e operação dos veículos ferroviários. Por um lado, a informação sobre o desempenho real dos veículos e as suas consequências, disponível para a entidade que presta o serviço de transporte de pessoas, influencia o estabelecimento das condições contratuais de contratos futuros e, assim, a sua evolução no tempo. A evolução dos cadernos de encargos para o fornecimento de veículos ferroviários da CP são um exemplo claro deste processo, tendo em consideração as últimas condições contratuais apresentadas para o fornecimento dos veículos do CP2000, face a contratos anteriores (nomeadamente as UQE’s Sintra). Por outro lado, a informação sobre os factores RAMS inerentes dos diversos sistemas dos veículos e a sua potencialidade, pode levar a uma tentativa de influência sobre as condições contratuais e a uma renegociação destas, sobretudo por iniciativa do fabricante. É ainda de considerar que a informação sobre o estado do conhecimento tecnológico actual dos sistemas delimita e condiciona o estabelecimento das condições contratuais, evitando cenários inviáveis ou com uma muito baixa probabilidade de serem respeitados. 118 É de referir que as diversas fases apresentadas no modelo não são normalmente desenvolvidas por uma única entidade. As condições contratuais são habitualmente estabelecidas pela entidade que vai adquirir os veículos ou apenas operá-los em linha (ou que, no mínimo, tenha a missão de prestar o serviço de transporte de pessoas). A concepção e fabricação dos veículos é da responsabilidade de um construtor ou fabricante, que poderá, consoante o modelo de negócio, operar os veículos em linha, prestando um serviço ao cliente, ou realizar a sua manutenção, mediante contratos especificados para esse fim. Adicionalmente, a Manutenção dos veículos poderá ser efectuada pelos próprios operadores, que detêm equipas próprias ou empresas associadas nessa área, o que representa a situação tradicional, ou por empresas específicas de serviços de Manutenção privadas. 119 IV.II. Conclusões Finais A incorporação RAMS em produtos de base tecnológica, pelas entidades que concebem e fabricam a tecnologia, é, em parte, uma resposta ao aumento do risco que interiorizam em contratos com condições a cumprir sobre a Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança. A incorporação RAMS é caracterizada pela aplicação de metodologias, técnicas e outros processos de gestão de informação relativos aos factores RAMS, de uma forma sistemática, sendo habitualmente acompanhada de uma mudança organizacional e de um investimento adicional em recursos (essencialmente humanos) e tempo. O caso da BTP confere evidência empírica sobre o processo de incorporação RAMS referido, sendo uma resposta clara às condições contratuais dos contratos do CP2000 e do MP, onde vigoram penalidades para o incumprimento da Fiabilidade e Disponibilidade inerentes dos veículos, ao longo do seu período de demonstração (garantia), o que se traduz num aumento do risco para a empresa. O processo de incorporação RAMS segue um modelo (vide capítulo IV.I.) que engloba e ilustra as entradas e fluxos de informação, as técnicas e metodologias aplicadas e o processo de iteração adjacentes a cada actividade da empresa, ao longo do ciclo de vida dos veículos ferroviários. Todos estes processos encontram-se individualmente explorados na literatura actual, embora muitas vezes dispersos e sem uma visão integradora RAMS. A inclusão de condições relativas aos factores RAMS nos contratos de fornecimento de veículos ferroviários, pelos operadores dos veículos ou serviço de transporte de pessoas, é recente e denota uma atenção crescente destes sobre esses factores e sobre o seu papel crítico no desempenho dos veículos e, consequentemente, na sua actividade de prestação de um serviço de transporte. As condições contratuais RAMS encontram-se, no entanto, circunscritas ao período de garantia dos veículos, no qual os fabricantes supervisionam a execução da manutenção preventiva por si definida e executam a manutenção correctiva de incidentes e avarias ocorridos nos sistemas. No final deste período, verificando-se a conformidade dos veículos com os seus factores inerentes, resultantes da sua concepção, é efectuada a sua recepção definitiva pelo cliente e, a partir daí, com excepção das garantias particulares de alguns sistemas, o fabricante deixa de estar vinculado aos veículos. Naturalmente, sem a responsabilidade pela sua manutenção, os fabricantes nunca poderão assegurar e se responsabilizar pelo cumprimento dos factores RAMS durante todo o seu ciclo de vida, além de os circuitos de retroacção da operação e manutenção poderem deixar de ocorrer, limitando o histórico do desempenho dos sistemas ao período de garantia. Neste último aspecto, uma solução possível passa por, mesmo sem um vínculo contratual formal, as entidades operadoras dos veículos e responsáveis pela sua manutenção continuarem a reportar para o fabricante dados sobre o desempenho dos veículos, essencialmente na óptica RAMS, até ao seu fim de vida, disponibilizando informação para o processo de optimização constante dos sistemas. 120 Esta realidade é justificada pela estrutura de mercado passada e presente em Portugal, onde as empresas operadoras dos veículos e do serviço de transporte de pessoas sempre detiveram departamentos próprios ou empresas afiliadas para a actividade de gestão e execução da manutenção. Numa perspectiva histórica, é de salientar que empresas como a CP, que se manteve em monopólio até à década de 80 na operação das linhas ferroviárias nacionais, ou o Metropolitano de Lisboa detinham estruturas próprias de engenharia, para a definição pormenorizada das especificações técnicas e funcionais dos veículos que pretendiam adquirir, e de manutenção, que asseguravam o seu funcionamento durante o seu ciclo de vida. Praticamente apenas não detinham a capacidade de fabricação dos veículos. Este facto inviabiliza a aplicação do modelo RAMS proposto ao longo de todo o ciclo de vida dos veículos ferroviários, sendo, como tal, um dos aspectos críticos a considerar na evolução dos contratos no sector ferroviário e na expansão da incorporação RAMS, essencialmente no que confere ao seu cariz temporal. Esta realidade tem claramente contornos políticos, pelo cariz monopolizador da actividade de Manutenção após o período de garantia dos veículos, quase sempre realizada por empresas incumbentes de capitais públicos (por imperativos de forte componente política), e apenas poderá ser modificada por iniciativa do próprio estado, através da separação e abertura da actividade de Manutenção dos veículos ao mercado livre, com critérios de selecção claros e efectivos. O modelo RAMS proposto para os veículos ferroviários reforça o papel da concepção e design da tecnologia como fulcro da incorporação RAMS, pela definição e estabelecimento, nessa fase, da Fiabilidade, Disponibilidade, Manutibilidade e Segurança inerentes dos veículos. A concepção inclui a concepção mecânica, a concepção eléctrica e a concepção global dos veículos e as respectivas integrações. Integra informação sobre a operação de sistemas análogos, informação intrínseca dos sistemas, aplica técnicas (estatísticas e determinísticas) e metodologias numa óptica RAMS, segue um processo iterativo no desenvolvimento da tecnologia e está relacionada com as restantes fases do ciclo de vida da tecnologia que promove. A definição dos factores RAMS inerentes passa por uma análise de risco face às implicações do seu não cumprimento efectivo, tendo paralelamente em consideração os custos crescentes resultantes do seu incremento. Trata-se, no essencial, de um processo de análise de optimização custo/benefício, o qual deverá ser sempre o ponto de partida para a definição e, posteriormente, implementação dos factores RAMS inerentes de produtos de base tecnológica. Contudo, a fabricação dos veículos ferroviários baseia-se num modelo de subcontratação da produção de sistemas e componentes, como é actualmente comum na indústria automóvel, assumindo o fabricante dos veículos o papel de integrador de diferentes tecnologias no seu produto final. Este facto está directamente relacionado com a, cada vez mais comum, impossibilidade orgânica das empresas em se especializarem em diversas tecnologias (basta lembrar a diversidade de tecnologias envolvidas num veículo, desde as suas portas, passando pelo sistema de freios, até ao sistema eléctrico), ganhando com a especialização de empresas que concebem e 121 fabricam tecnologias específicas. Esta política está em consonância com uma abordagem de Produção Magra, que se afirmou e divulgou inicialmente no sector automóvel. Neste sentido, a incorporação RAMS é alargada aos fornecedores de componentes, através da transferência de parte do risco do fabricante dos veículos para o fornecedor de componentes, segundo a Alocação dos factores RAMS. Este processo consiste na imputação de responsabilidade ao fornecedor pelo desempenho dos seus componentes. Será, assim, de esperar que a incorporação RAMS pelos fornecedores tenha implicações na sua actividade e organização e resultados sobre as suas tecnologias. O modelo RAMS proposto tem subjacente a aplicação de conhecimento específico na gestão dos fluxos de dados e na sua conversão em informação, na utilização das técnicas, metodologias e outros processos RAMS e na efectivação dos mecanismos de retroacção entre as diversas fases do ciclo de vida dos veículos ferroviários. Este processo indicia uma mudança significativa no relacionamento entre a Função de Manutenção e a Função de Engenharia da empresa, assente no estabelecimento de uma base de informação comum e compreendida por ambas. A aplicação do modelo é, como tal, condicionado pela existência de conhecimento específico no interior da entidade que segue e aplica o modelo. Pelo seu carácter neófito, é de considerar a necessidade desta empreender um processo de endogeneização desse conhecimento, ou seja, absorver o conhecimento necessário à incorporação RAMS. O caso da BTP evidencia a cooperação em Investigação e Desenvolvimento, com entidades públicas e privadas de actividades diversas, como uma das formas efectivas de absorção de conhecimento específico. O papel destas actividades de cooperação é salientado pela redução do risco que impõem, face aos factores RAMS, comprovando-se, assim, o seu papel efectivo no processo de incorporação RAMS. A incorporação RAMS no desenvolvimento de produtos de base tecnológica é, no global, um processo essencialmente estruturante, embora complexo, na base da optimização do desempenho da tecnologia e dos sistemas. Procura integrar e sistematizar a concepção, a fabricação e a operação e manutenção dos sistemas, afectando, assim, transversalmente todas as entidades que participam directamente no seu ciclo de vida, naturalmente de diferentes formas. Este estudo procurou, de uma forma objectiva, salientar a vertente da concepção e fabricação dos sistemas, apresentando a problemática da incorporação RAMS de uma forma estruturada e sistémica, de forma a se constituir uma base de conhecimento integrada e sistematizada que possa servir de referência e orientar o desenvolvimento e alargamento do conhecimento nesta área. A construção de um modelo RAMS para os veículos ferroviários propõe ser um primeiro passo, um estudo precursor para a construção e validação de um modelo global e integrador, transversal aos produtos de base tecnológica. 122 IV.III. Sugestões para estudos futuros Pela complexidade da incorporação RAMS e as suas implicações ao longo do ciclo de vida dos veículos ferroviários, considerando as barreiras de análise do estudo presente, é de referir alguns aspectos com uma relevância significativa, no âmbito global RAMS, que ganham imediatamente forma a partir deste estudo e cujo desenvolvimento, através de estudos específicos, urge para a clarificação e percepção global e integrada deste tema. Sendo um estudo sobre a incorporação RAMS em produtos de base tecnológica, vista como uma resposta para a gestão do risco inerente à operação destes e ao seu desempenho, será importante avaliar as consequências práticas ocorridas. Naturalmente, no caso da BTP, será necessária a passagem de alguns anos, em cada contrato RAMS considerado, de forma a reunir informação suficiente para uma análise comparativa efectiva com os contratos denominados PRÉ-RAMS e se avaliar a existência de melhoria no desempenho global dos veículos ferroviários. Esta análise tem uma importância crescente com a dimensão temporal considerada (período de análise), à medida que se caminha para a fase final da vida dos sistemas (pela crescente probabilidade de falha, nessa fase, de uma grande parte dos sistemas). A partir da estruturação da incorporação RAMS em produtos de base tecnológica efectuada neste estudo, baseada no ciclo de vida dos veículos ferroviários, estão reunidas as condições para se efectuar um estudo de quantificação, particularmente em termos dos custos resultantes, das implicações da incorporação RAMS na actividade de uma empresa que atravessa transversalmente esse ciclo, nomeadamente a BTP. Este estudo especificaria as implicações de ordem qualitativa e quantitativa globais na organização, métodos e estrutura da empresa. Este estudo poderá ser complementar ou o início de um estudo de aprofundamento do processo de optimização do risco RAMS (custo/benefício), normalmente o ponto de partida para o desenvolvimento de tecnologia. Relativamente à aplicação das diversas técnicas e metodologias habitualmente identificadas na literatura para tratamento da informação RAMS e considerando que algumas destas técnicas foram aplicadas pela primeira vez muito recentemente, a procura de um melhoramento prático desses processos, com as especificidades do sector ferroviário e a sua orgânica de mercado, é sem dúvida pertinente e importante (por exemplo a recolha de informação de campo durante a operação dos veículos e o seu tratamento na retroacção para o desenvolvimento e melhoramento das tecnologias). Considerando que a incorporação RAMS se baseia na melhoria do desempenho dos sistemas, numa óptica RAMS, interessará analisar de que forma este processo se relaciona com a inovação, na perspectiva da tecnologia e do ponto de vista organizacional. Será, no essencial, testar a hipótese da incorporação RAMS ser um factor de inovação, com reflexos no valor acrescentado dos produtos de base tecnológica. 123 Por outro lado, considerando que a fabricação dos veículos ferroviários se baseia num modelo de subcontratação da produção de sistemas e componentes, é de supor que a incorporação RAMS tenha sido alargada aos fornecedores de sistemas (considerando a Alocação da responsabilidade RAMS) com implicações na sua actividade e organização e resultados sobre as suas tecnologias. Contudo, pelas fronteiras deste estudo, não foi analisada e estruturada a incorporação RAMS nestas empresas, pelo que será importante efectuar-se um estudo semelhante ao presente aplicado a casos de fornecedores de sistemas e componentes com significância RAMS. Esse estudo teria uma índole complementar ao estudo presente. No que confere à estrutura de mercado do sector ferroviário nacional e à evolução histórica da orgânica das empresas neste sector, é pertinente a questão sobre se existe evidência sobre uma relação entre a crescente preocupação sobre o desempenho dos veículos ferroviários, numa óptica RAMS, e a extinção ou redução significativa dos departamentos de Engenharia dos operadores do transporte ferroviário, que promove a ideia de um enfoque crescente no seu negócio central (prestar um serviço de transporte). Considerando o tema abordado da endogeneização do conhecimento necessário ao desenvolvimento da incorporação RAMS, será de enorme relevo para a percepção global desta área de análise a compreensão dos diversos mecanismos na sua base, além das actividades de cooperação em investigação e desenvolvimento, abordadas neste estudo. Este estudo específico poderá investigar o tipo de conhecimento em questão, as suas fontes e os requisitos internos necessários à sua efectivação, incluindo o perfil dos elementos dos departamentos de Engenharia envolvidos na sua absorção e utilização. A construção de um modelo RAMS para os veículos ferroviários propõe ser um primeiro passo, um estudo precursor para a construção e validação de um modelo global e integrador, transversal aos produtos de base tecnológica. Nesse sentido, a existência de estudos análogos noutros sectores (por exemplo o sector aeronáutico, já com um historial RAMS bastante fundamentado, e o sector dos moldes, onde existem vestígios de uma possível abordagem RAMS) será fundamental para a construção e validação de um Modelo RAMS global e transversal a todos os produtos de base tecnológica. 124 Referências Anupindi, Ravi, Sunil Chopra, Sudhakar D. Deshmukh, Jan A. Van Mieghem e Eitan Zemel. “Managing Business Process Flows”. Prentice Hall, Inc., New Jersey, 1999. Ávila, Nuno. “Partnerships for Innovation”. Dissertação para obtenção de grau de Mestre em Engenharia e Gestão de Tecnologia, Instituto Superior Técnico, Lisboa, 2003. Billinton, Roy e Ronald N. Allan. “Reliability Evaluation of Engineering Systems – Concepts and Techniques”. Plenum Press, Second Edition, New York, 1992. Bowles, John B. “Failure Modes and Effects Analysis”. 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