C a d e r n o s L i n k Opinião Novas tecnologias, comércio mundial e novos empresários António Neto da Silva A revolução actual na tecnologia e na economia exige um novo tipo de empresário, capaz de estar a par da velocidade da mudança e das oportunidades que se desenvolvem a nível global. O velho empresário, paroquial, fechado entre barreiras à concorrência, está historicamente condenado Presidente da Finanstar mudança radical que se está a operar nas vias através das quais as pessoas e as organizações se relacionam para trocar informações, mercadorias e serviços está a provocar uma revolução completa no conceito de empresa, de emprego, de comércio, de marketing, de qualificações, etc. Entrámos definitivamente na Sociedade da Informação. A estrutura teórica que explicava a interligação e o comportamento das diferentes variáveis está ultrapassada. É precisa uma nova teoria económica. A atitude dos agentes económicos foi sempre a grande determinante dos ciclos económicos. É ela que condiciona o sucesso com que as novas oportunidades são aproveitadas. Por simetria, a permanência em atitudes clássicas é, num período como o que vivemos, causa de graves roturas sociais e económicas. Por isso, o elemento-chave da Nova Economia é o Homem. Tal como nas revoluções industriais que precederam a revolução da informação. Dada a natureza diferente, contínua, da A 26 N1 - Novembro de 1999 actual revolução, a adaptação do Homem, do agente económico, à mudança permanente é decisiva. Até porque, até ver, não existe nenhum sistema teórico coerente que permita saber, com certeza, qual é o efeito provocado pela utilização dos novos instrumentos da política económica. As características do novo empresário Uma grande parte desses novos instrumentos ainda não está, sequer, identificada. O empresário é, então, a peça-chave cuja adaptação, em liderança, permitirá atingir os níveis superiores de bem-estar que a Sociedade da Informação necessariamente nos trará. As antigas características essenciais do empresário de sucesso mantêm-se: o gosto pelo risco; o sacrifício de não consumir hoje para ter mais amanhã; o apelo imparável à acumulação de capital e não apenas o desejo de ganhar mais dinheiro. Mas se estas características eram, muitas vezes, o bastante para dirigir uma empresa e, portanto, no seu somatório, a oferta nacional ou mundial, hoje não são suficientes, nem por si nem na intensidade em que são necessárias. A grande diferença está, então, no facto de esta revolução ser diferente das outras. As revoluções anteriores permitiram passos de gigante à humanidade. Eram, no entanto, grandes passos, mas dados de forma descontinuada, permitindo aos agentes económicos absorverem os novos conhecimentos, tratá-los, aplicá-los e viverem nesse mesmo enquadramento durante dezenas de anos. Nos dias de hoje, a mudança é contínua, feita de pequenos passos que ocorrem ao segundo. A estabilidade do conhecimento desapareceu – o que implica o desaparecimento, também, do status quo. Isto é: um génio hoje pode ser completamente ultrapassado no dia seguinte. Uma ideia de grande sucesso pode ser votada ao desaparecimento um mês depois, porque novos conhecimentos, novas técnicas surgiram, e um anónimo pode ter-se transformado no novo «génio» através da produção C a d e r n o s L i n k Opinião de uma ideia completamente inovadora. Esta concorrência na produção de ideias e na sua transformação em projectos ocorre a nível global, destruindo o proteccionismo que era permitido por uma concorrência personalizada, dentro das fronteiras de um país, cuja economia diminuía a sua exposição externa através de barreiras tarifárias ou não tarifárias. Os velhos empresários têm hoje dificuldade de adaptação, dado que o ambiente económico em que se formaram, labutaram e tiveram sucesso era caracterizado por valores como a estabilidade, a concorrência personalizada, os cartéis, as barreiras ao comércio e ao investimento, a demarcação da informática, as barreiras à entrada. O novo empresário é, por tudo isso, um ser diferente do velho, sendo que o sentido em que aqui se usam as designações «novo» e «velho» nada tem que ver com a idade fisiológica. O novo empresário, além das características fundamentais a todos os empresários, enumeradas no início, precisa também de: uma cabeça aberta à mudança permanente; possuir um grau substancial de «loucura»; ser capaz de se relacionar mundialmente; ter qualidade de conhecimento que lhe permita identificar oportunidades com sucesso onde outros só vêm informática; ser capaz de agir em concorrência global, sem qualquer tipo de proteccionismo; dominar as situações de carência passada que possam ser hoje respondidas pelas novas possibilidades abertas pelas modernas tecnologias, nomeadamente pela Internet; ter a determinação e a capacidade organizativa suficientes para ser, por si próprio, um núcleo empresarial; estar disposto a ser rico ou pobre em função da sua capacidade de deixar morrer ideias ultrapassadas, substituindo-as por novas. Exigindo aos empresários características especiais, as novas tecnologias permitem, por outro lado, enormes ganhos de produtividade e a redução de custos. Áreas de negócio de eleição De acordo com um estudo muito recente (1998) realizado pelo Departamento de Comércio dos EUA sobre a economia digital emergente, as áreas onde é mais evidente o contributo das novas tecnologias para uma mais eficiente afectação de recursos são as seguintes: custos de abastecimento; nível de stocks mais reduzido; ciclos de produção mais curtos; serviços ao consumidor mais eficientes e mais rápidos; custos de marketing e de vendas mais baixos; novas oportunidades de vendas. Os progressos nas telecomunicações e na informática, que até recentemente foram realizados de forma separada, estão agora a convergir na Internet. O avanço de um é necessariamente secundado pelo avanço do outro. Por isso, em breve, todas as tecnologias de informação serão parte de sistemas de comunicação interligados, sejam internos a uma empresa ou negócio, sejam entre empresas ou negócios, entre indivíduos e empresas ou entre indivíduos. Para responder a esta procura crescente, empresas dos mais diversos ramos têm acolhido as oportunidades que se abrem, investindo fortemente. As mais activas são empresas nos seguintes sectores: electrónica de consumo; media; telecomunicações; software; construção de satélites; telefones celulares; fornecedores de acesso à Internet; TV cabo; artigos eléctricos em geral. Muitas empresas de outras áreas, dada a saudável existência de barreiras à entrada, estão a nascer como cogumelos, pres- tando serviços no domínio da utilização empresarial da Internet. São empresas de desenhadores e programadores de sites, de construtores de catálogos virtuais, de sistemas de segurança para pagamentos, de organizadores de campanhas de marketing directo, de consultadoria electrónica, de incrementadores de tecnologias que permitem aumentar a velocidade de transmissão de dados e de informação na rede, etc. A ausência de regulação O advento da Nova Economia tem sido acompanhado, particularmente nos EUA, pelo interesse crescente dos investidores. Em 1996 e 1997, só as empresas de capital de risco aplicaram cerca de 12 mil milhões de dólares em projectos de criação de empresas de tecnologias de informação do tipo acima referido. Tendo em conta que as empresas de capital de risco só raramente comparticipam em mais do que 20% do capital social das empresas, isto poderá significar que o investimento potenciado por este capital terá rondado os 60 mil milhões de dólares, o equivalente a 20 projectos da AutoEuropa. O comércio electrónico é um grande passo para a humanidade. O futuro é de quem tem ideias fora do comum. É nesse terreno que a concorrência se fará. O mais valioso factor de produção são as ideias invulgares mas que funcionam. Este novo factor tem que ser incorporado nos modelos para podermos estudar quais são as novas determinantes da competitividade e que instrumentos de política económica urge criar. Se é que urge. Porque podemos chegar à conclusão de que os países (ainda existem?) serão tanto mais competitivos quanto mais permitirem a livre criatividade dos seus cidadãos. E isto significa, precisamente, a ausência de regulação. ¶ N1 - Novembro de 1999 27