28/05/2013
Leitores de livros digitais não têm imunidade
fiscal
Por Bárbara Mengardo | De São Paulo
Procurador Leonardo Curty: não é possível estender a imunidade prevista no artigo 150 da Constituição Federal aos
leitores de livros digitais
O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região entendeu que a imunidade fiscal garantida pela
Constituição Federal a livros, periódicos e papel não alcança os leitores de livros digitais (ereaders). Em um dos poucos processos sobre o tema, os desembargadores deram provimento a
um recurso contra liminar obtida pela Livraria Cultura, que isentava de impostos a importação do
e-reader Kobo.
Os contribuintes, porém, ainda contam com um precedente favorável à isenção. Uma sentença
beneficia um advogado paulista. No Legislativo, as atenções de fabricantes e importadores se
voltam para um projeto de lei que estende o benefício ao leitores de livros digitais, equiparando-os
aos exemplares em papel.
A rede havia conseguido uma liminar contra o pagamento de PIS, Cofins, Imposto de Importação
e IPI sobre a importação do e-reader Kobo. A ação foi ajuizada antes mesmo de autuação pela
Fazenda Nacional. No processo, alega que o leitor digital desempenha a mesma função do livro
convencional e, portanto, enquadraria-se no artigo 150 da Constituição Federal. A norma estipula
que é vedada a cobrança de tributos sobre "livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua
impressão".
Já em relação ao PIS e Cofins, que não são abrangidos pela Constituição, a Livraria Cultura
defende que o Kobo estaria contemplado pela Lei nº 10.865, de 2004. A norma estabelece que as
contribuições sociais não devem incidir sobre operações envolvendo livros.
Para a desembargadora Alda Basto, entretanto, a equiparação seria indevida. A magistrada
considerou que a Constituição traz de maneira expressa os produtos abarcados pela imunidade.
"Embora os leitores eletrônicos possam 'aparentemente' conter finalidade educativa, já que visam
a divulgação de informações de conteúdo educativo e científico, não há como se equiparar os ereaders ao papel destinado à impressão de livros", afirma a magistrada na decisão.
Para o procurador Leonardo Curty, não há urgência no pedido e não é possível estender a
imunidade aos leitores. "Alegamos que a empresa não demonstrou que o item serve única e
exclusivamente para leitura. Se for partir desse pressuposto, qualquer tablet também é um leitor",
diz Curty, que faz parte da Divisão de Acompanhamento Especial da Procuradoria da Fazenda
Nacional em São Paulo.
Procurada pelo Valor, a Livraria Cultura não quis comentar a decisão.
Uma ação semelhante foi analisada em 2010 pela 22ª Vara Federal de São Paulo, que decidiu de
forma favorável a um advogado. O profissional obteve o direito de importar o e-reader Kindle sem
o pagamento de impostos. Para o juiz José Henrique Prescendo, relator do caso, a Justiça não
deve analisar o artigo 150 da Constituição literalmente, e a isenção deve ser estendida a outros
produtos. "Assim há de ser interpretada a norma constitucional para que nossa Carta Magna
tenha vida longa, ou seja, que não precise ser emendada a cada evolução tecnológica que surja",
afirma o magistrado na decisão.
O advogado Fernando Ayres, do Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados,
concorda com a extensão da imunidade aos e-readers, desde que seja comprovado que a única
funcionalidade do produto é ler e-books. "O artigo 150 não pode ser interpretado literalmente,
mas com a finalidade que foi inserido na Constituição, de incentivo à leitura", diz.
"Se admitirmos que o leitor tem como função exclusiva permitir a leitura de obra literária, não
tenho dúvida alguma que deveria estar coberto pela imunidade", afirma o advogado Tácito Matos,
tributarista do L.O. Baptista, Schmidt, Valois, Miranda, Ferreira, Agel.
O assunto, porém, poderá ser resolvido pelo Legislativo. Tramita atualmente na Câmara dos
Deputados o Projeto de Lei (PL) nº 4.534, de 2012, que tem como autor o senador Acir Gurgacz
(PDT-RO). A proposta adiciona um inciso à Lei nº 10.753, de 2003, que instituiu a Política
Nacional do Livro, para equiparar os leitores digitais aos livros.
Para o senador, a isenção fiscal poderia estimular a compra de aparelhos, que hoje chegam muitas
vezes ao país de forma ilegal. "É importante que fique claro que a proposta não representa uma
queda de arrecadação. Serão vendidos mais aparelhos de forma legal."
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