UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
FACULDADE DE ESTUDOS SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CONTABILIDADE E
CONTROLADORIA
A CONTABILIDADE COMO MECANISMO DE AFERIÇÃO DA IMUNIDADE
TRIBUTÁRIA EM ENTIDADES DE EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS:
UM ESTUDO COM ASSOCIAÇÕES DE EDUCAÇÃO EM MANAUS
FRANCISCO MOREIRA FILHO
MANAUS
2009
FRANCISCO MOREIRA FILHO
A CONTABILIDADE COMO MECANISMO DE AFERIÇÃO DA IMUNIDADE
TRIBUTÁRIA EM ENTIDADES DE EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS:
UM ESTUDO COM ASSOCIAÇÕES DE EDUCAÇÃO EM MANAUS
Dissertação apresentada à Coordenação do Programa
de Pós-Graduação “Strito Sensu” em Contabilidade e
Controladoria da Universidade Federal do Amazonas,
como requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Contabilidade e Controladoria.
Orientadora: Profª Dr.ª Mariomar de Sales Lima
MANAUS
2009
Ficha Catalográfica
(Catalogação realizada pela Biblioteca Central da UFAM)
Moreira Filho, Francisco
M838c
A contabilidade como mecanismo de aferição da imunidade
tributária em entidades de educação sem fins lucrativos: um estudo
com associações de educação em Manaus / Francisco Moreira Filho. Manaus: UFAM, 2009.
116 f.; il.
Dissertação (Mestrado em Contabilidade e Controladoria) ––
Universidade Federal do Amazonas, 2009.
Orientador: Profª. Dra. Mariomar de Sales Lima
1. Contabilidade 2. Imunidade tributária I. Lima, Mariomar de
Sales II. Universidade Federal do Amazonas III. Título
CDU 336.2(811.3)(043.3)
FRANCISCO MOREIRA FILHO
A CONTABILIDADE COMO MECANISMO DE AFERIÇÃO DA IMUNIDADE
TRIBUTÁRIA EM ENTIDADES DE EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS:
O CASO DE UMA ASSOCIAÇÃO EM MANAUS
Dissertação apresentada à Coordenação do Programa
de Pós-Graduação “Strito Sensu” em Contabilidade e
Controladoria da Universidade Federal do Amazonas,
como requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Contabilidade e Controladoria.
Aprovada em:
BANCA EXAMINADORA:
Professora Dr.ª Mariomar de Sales Lima
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
Professora Dr. ª Fabiana Lucena Oliveira
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
Professor Dr. Milanez Silva de Souza
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
A DEUS.
Para os meus pais, Francisco (in memorian) e Tereza,
pelo amor, pelo esforço e determinação na minha
orientação como cidadão.
À France, minha esposa, pelo amor,
companheirismo e
apoio.
Aos meus filhos, Mateus, Fernanda e Rafaela,
pela compreensão quanto às minhas
ausências durante este estudo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Professora Doutora Mariomar de Sales Lima pelo auxílio e
orientação, sempre observando, com paciência, com olhar atento às dúvidas
suscitadas, fazendo sugestões que enriqueceram o estudo, incentivando a continuidade
e a conclusão deste trabalho.
Aos amigos que fiz neste período de Mestrado e os que me ajudaram,
envolvendo professores, os outros alunos, ao pessoal de apoio: o Luis, a Luciana e a
nossa saudosa Auxiliadora (in memoriam). Um obrigado especial ao Oswaldo, pelos
constantes incentivos em nosso local de trabalho, a Prefeitura de Manaus.
Obrigado a todos meus irmãos, sempre comigo em todos os momentos, seja na
alegria, seja na tristeza.
Agradeço aos meus vários amigos que sempre estiveram comigo me
incentivando para o crescimento profissional: o Celso Sato, o Dr. Celso Santos, o
Gilson, o Édson, o Jânio Guimarães, o Amauri, o Jansen, o Alípio.
Enfim, agradeço a todos os que contribuíram para o sucesso na conclusão deste
estudo.
Fica decretado que agora vale a verdade,
que agora vale a vida,
e que de mão dadas,
trabalharemos todos pela vida verdadeira.
Thiago de Mello
O que nos falta é a capacidade de traduzir
em proposta aquilo que ilumina a nossa
inteligência e mobiliza nossos corações: a
construção de um novo mundo.
Herbert de Souza (Betinho)
RESUMO
O presente trabalho centra-se em examinar a Contabilidade que vem sendo
praticada pelas associações de educação sem fins lucrativos, com vista a identificar se
elas atendem às determinações legais e contábeis, inerentes ao alcance dos benefícios
da imunidade tributária. Adotou-se como referencial teórico a contextualização do
Terceiro Setor no Brasil, os benefícios tributários concedidos e a Contabilidade
aplicável ao referido setor. Quanto aos aspectos metodológicos, adotou-se uma
abordagem qualitativa, realizando-se uma pesquisa exploratória e descritiva, por meio
de estudo de caso, além da pesquisa bibliográfica e documental, utilizando-se para fins
de análise de dados a análise documental e análise de conteúdo. Os dados foram
coletados junto à Contabilidade de duas Associações estabelecidas em Manaus. Os
resultados obtidos permitiram concluir que a Contabilidade tem os atributos necessários
para controlar o patrimônio das instituições sem fins lucrativos, possibilitando identificar
através da sua utilização o cumprimento, ou descumprimento, dos requisitos legais da
imunidade. As análises e interpretação dos dados obtidos levaram a conclusões de que
uma das associações está regular e a outra está irregular quanto aos requisitos da
Imunidade Tributária.
Palavras- chave: Imunidade Tributária; Requisitos legais; Contabilidade.
ABSTRACT
This study focuses on examining the accounts that have been practiced by the
associations of education nonprofit, to identify if they meet the accounting and legal
determinations, relating to scope of benefits of tax immunity. We adopted as reference
the theoretical context of the Third Sector in Brazil, the tax benefits granted and
applicable to the accounting of third sector. Regarding methodological aspects, it
adopted a qualitative approach, where an exploratory research and descriptive, using a
case study, in addition to the literature search and document, using for analysis of the
document analysis and analysis of content. Data were collected from the accounts of
two associations based in Manaus. The results indicated that the accounts have the
necessary attributes to control the assets of nonprofit institutions, enabling identification
by use compliance or noncompliance with the requirements of legal immunity. The
analysis and interpretation of data led to conclusions that an association is regular and
the other is irregular as the requirements of Tax Immunity.
Keywords: Tax immunity, legal requirements, accounting
LISTA DE FIGURAS
Figura 1:
A tríade entre o Estado, o mercado e o terceiro setor ................
22
Figura 2:
Relações entre a contabilidade financeira e gerencial................
51
Figura 3:
Representação gráfica do processo comunicação .....................
52
Figura 4:
Sistema de informações contábeis .............................................
55
Figura 5:
Denominações do patrimônio das entidades sem fins lucrativos
65
Figura 6:
Denominações do resultado das entidades sem fins lucrativos..
67
LISTA DE QUADROS
Quadro 1:
Modelo de definição para o terceiro setor ................................
22
Quadro 2:
Relação de impostos do Brasil .................................................
32
Quadro 3:
Principais usuários da informação contábil...............................
47
Quadro 4:
Modelo sintético de plano de contas para instituições do
54
terceiro setor – Ativo e Passivo ................................................
Modelo sintético de plano de contas para instituições do
terceiro setor – Parte das Receitas e Despesas ...................... 54
Quadro 5:
Quadro 6:
Representação do Balanço Patrimonial ...................................
64
Quadro 7:
Modelo sintético de um balanço patrimonial para entidades
sem fins lucrativos ....................................................................
66
Quadro 8:
Modelo sintético de uma DRE de uma entidade sem fins
lucrativos ................................................................................... 67
Quadro 9:
Modelo sintético de uma DMPS de uma entidade sem fins
lucrativos.................................................................................... 68
Quadro:10 Modelo sintético de uma DOAR de uma entidade sem fins
lucrativos ................................................................................... 69
Quadro:11 Cumprimento das Formalidades da Escrituração Contábil pela
Associação Delta ...................................................................... 87
Quadro:12 Transcrição dos saldos das contas contábeis do disponível no
último semestre de XB .............................................................. 89
Quadro:13 Balanço patrimonial da Associação Delta encerrado em 31 de
dezembro de XB ....................................................................... 92
Quadro:14 DRE do exercício do ano XB da Associação Delta ..................
93
Quadro:15 Cumprimento das Formalidades da Escrituração Contábil pela
Associação IBIN ....................................................................... 96
Quadro:16 Balanço patrimonial da Associação IBIN encerrado em 31 de
dezembro de XB .......................................................................
Quadro:17 DRE do exercício do ano XB da Associação IBIN ....................
Quadro:18 Quadro comparativo do cumprimento das práticas contábeis ..
98
99
101
Quadro:19 Quadro comparativo relativos a distribuição de lucros e
aplicação de recursos................................................................. 102
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 12
Tema e problema de pesquisa .......................................................................... 13
Objetivos da pesquisa ...................................................................................... 14
Justificativas da pesquisa ................................................................................. 15
1 FUNDAMENTAÇAO TEÓRICA ........................................................................ 17
1.1 Entidades do terceiro setor ......................................................................... 17
1.1.1 Breve contextualização das Entidades do terceiro setor no Brasil .............. 24
1.2 As entidades do terceiro setor em funcionamento no Brasil ................... 28
1.2.1 Associações ................................................................................................ 29
1.2.2 Fundações privadas ................................................................................... 30
1.3 Benefícios concedidos para as entidades do terceiro setor ................... 31
1.3.1 Imunidade tributária. .................................................................................... 31
1.3.2 A natureza jurídica da imunidade tributária ................................................. 32
1.3.3 Isenção versus imunidade tributária ............................................................ 36
1.3.4 Instituição de educação ............................................................................... 37
1.4 A comprovação dos requisitos “sem fins lucrativos” .............................. 40
1.5 A contabilidade das entidades do terceiro setor ....................................... 45
1.5.1 A Contabilidade financeira aplicável ao terceiro setor ................................. 51
1.5.2 Demonstrações contábeis .......................................................................... 62
1.6 Auditoria contábil ........................................................................................ 70
2 METODOLOGIA ............................................................................................... 75
2.1 Questões norteadoras .................................................................................... 75
2.2 Tipo de pesquisa ............................................................................................ 76
2.3 População ou Universo .................................................................................. 78
2.4 Procedimentos de coleta e análise de dados ................................................. 79
2.5 Limitação do estudo ....................................................................................... 81
3 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS .......................................................... 82
3.1 Apresentação das entidades pesquisadas ..................................................... 82
3.1.1 Associação Delta. ........................................................................................ 82
3.1.2 Instituto Batista Ida Nelson. ......................................................................... 83
3.2 Apresentação das categorias do estudo.................................................... 83
3.2.1 Análise geral das categorias da Associação Delta ...................................... 86
3.2.2 Análise geral das categorias da Associação Instituto Batista Ida Nelson.....95
3.2.3 Análise comparativa entre as unidades pesquisadas ................................101
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÃO................................................................104
Recomendação....................................................................................................106
REFERÊNCIAS...................................................................................................108
12
INTRODUÇÃO
O Terceiro Setor, ou organizações sem fins lucrativos, é atualmente um dos
temas que mais desperta interesse no Brasil. Este surpreendente interesse é reflexo de
um conjunto de tendências complexas e inter-relacionadas, que estão vinculadas ao
fortalecimento da cidadania e da responsabilidade social por parte das organizações do
setor privado.
A acentuada desigualdade na distribuição de renda no País gera múltiplas
demandas sociais. Conseqüentemente, há várias regiões com elevada carência dos
serviços públicos essenciais, tais como, saúde, educação e assistência social.
O poder público ainda não se encontra apto a resolver todas as questões sociais.
Por esse motivo, a própria sociedade vem buscando prover meios alternativos à
prestação de serviços públicos. Esse movimento é crescente, é organizado e
independente, que mobiliza a participação voluntária de diversos segmentos sociais,
alcançando considerável relevância, que repercute nos modos de pensar e agir da
comunidade.
No espaço vazio, em que o Estado deixa de atender necessidades sociais,
surgiu o chamado Terceiro Setor, também denominado, por alguns estudiosos, como
Entidades de Interesse Social, compostas por organizações estruturadas na sociedade
civil; independentes da máquina estatal, não distribuem seus lucros entre seus diretores
e acionistas, são autogovernadas, além de contarem com a participação do trabalho
voluntário (SALAMON,1993).
Essas organizações, quando estão constituídas formalmente, apresentam-se
personificadas como Associações, ou como Fundações. O modelo comumente adotado
no Terceiro Setor é a Associação, pois é o mais simples, com maior liberdade de
atuação, daí a escolha por estudá-la.
Ao reconhecer a importância dessas instituições, o Estado brasileiro procurou
fomentá-las, visando com isso, estimulá-las. Dentre as diversas formas de incentivos do
governo, encontramos os benefícios de ordem tributária, as imunidades tributárias e as
13
isenções. A Imunidade Tributária, por desonerar os impostos de toda a atividade de
uma organização, tornou-a o principal benefício financeiro do governo para as
organizações do Terceiro Setor.
A imunidade tributária contempla, basicamente, as instituições de assistência
social e as de educação. Para que tais organizações usufruam desse benefício, elas
devem estar caracterizadas como “sem fins lucrativos”.
Tema e problema de pesquisa
Conforme mencionado, as entidades de interesse social auxiliam o Governo na
prestação de serviços públicos e, em troca, recebem desonerações tributárias, doações
e subvenções governamentais. Dentre essas entidades, têm-se as educacionais, que
de acordo com o art. 150 da Constituição Federal de 1988 – CF/88, se executarem
suas atividades sem finalidade lucrativa serão consideradas imunes, desde que
prestem serviços dentro das finalidades para os quais foram constituídas, colocando-os
à disposição da sociedade, em caráter complementar às atividades do Estado.
Contudo, a finalidade não lucrativa deve ser comprovada consoante requisitos
estabelecidos em lei (art. 14 do da Lei n.º 5.172, de 25/10/1966, Código Tributário
Nacional – CTN), quais sejam: a) não distribuição de qualquer parcela do patrimônio ou
de rendas da entidade, a qualquer título; b) aplicação integral, no País, dos recursos da
entidade na manutenção dos seus objetivos institucionais; c) manutenção de
escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes
de assegurar sua exatidão.
Do exposto, deduz-se que o instrumento utilizado para fins de fiscalização e de
prestação de contas dessas entidades é a Contabilidade, cuja abordagem sociológica
enfatiza a sua importância para a sociedade, qual seja, suprir os seus usuários,
indistintamente,
com
as
informações
contábeis,
que
serão
empregadas
na
comprovação do comportamento regular das instituições.
Todavia, para o caso específico a que faz referência o dispositivo legal
supracitado, a escrituração dos fatos contábeis deve ser efetuada em conformidade
14
com as diretrizes inerentes aos Princípios Fundamentais de Contabilidade (PFC) e as
Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC).
Tal assertiva fundamenta-se no fato de que a legislação comercial não definiu
regras para a Contabilidade de instituições sem fins lucrativos. O Código Civil brasileiro,
Lei n.º 10.406, de 10/01/2002, em seu artigo 1.179, estabeleceu a obrigatoriedade da
contabilidade para o empresário e para as sociedades, mas não contemplaram, nesse
rol, as fundações e as associações. Isso torna a obrigação estatuída no artigo 14 do
CTN ser tão importante para essas instituições do terceiro setor.
Ante aos fundamentos apresentados, este estudo tomou em conta duas
entidades educacionais sediadas em Manaus, com vista a buscar resposta ao seguinte
questionamento: A Contabilidade que vem sendo praticada pelas entidades
educacionais sem fins lucrativos atende às determinações legais e contábeis
inerentes ao alcance dos benefícios da imunidade tributária?
Objetivos da pesquisa
O objetivo geral deste estudo consistiu em se examinar a Contabilidade que vem
sendo praticada pelas entidades educacionais pesquisadas, com vista a identificar se
elas atendem às determinações legais e contábeis, inerentes ao alcance dos benefícios
da imunidade tributária.
Em se tratando de objetivos específicos pretende-se:
•
Averiguar a operacionalidade dos registros contábeis, de modo a inferir
sobre a consistência e a integridade das informações produzidas pela
contabilidade das instituições em estudo, no que tange ao cumprimento
preceitos contábeis e legais para o alcance da imunidade tributária;
•
Verificar junto à Contabilidade das entidades pesquisadas se ocorreu
distribuição de resultado, rendas, ou qualquer parcela do patrimônio no
período pesquisado;
•
Identificar como foram aplicados os recursos das entidades no período
supramencionado;
15
•
Avaliar se a Contabilidade praticada pelas instituições pesquisadas
cumpre com a missão de comprovar o atendimento dos requisitos legais
para o alcance do benefício mencionado.
Justificativa da pesquisa
É visível a proliferação de entidades de interesse social no Brasil tendo em vista
a importância das mesmas para a satisfação dos interesses públicos. Algumas dessas
organizações recebem benefícios pecuniários a título de doação ou subvenção, ao
passo que outras gozam de isenções e imunidade tributárias.
Esses recursos que, na primeira hipótese, são repassados pelo Governo ou, no
segundo caso, deixam de ser arrecadados pelo Erário, conservam a natureza de bens
públicos, devendo, por isso, ser, constantemente, fiscalizados. Por esse motivo,
enfatiza-se a relevância desse estudo, no sentido de revelar se está ocorrendo o
atendimento dos requisitos contábeis estabelecidos em lei, a fim de se evitar o desvio
da finalidade não-lucrativa das instituições educacionais.
Ademais, embora o tema esteja em constante debate na imprensa, inclusive com
questionamentos relativos à regularidade na aplicação de recursos públicos por tais
entidades, há poucos estudos sobre assunto, o que resulta na escassez de material
bibliográfico, principalmente, com relação à prestação de contas e cumprimento dos
requisitos contábeis por parte dessas instituições. Este fato justifica a necessidade de
realização deste estudo em razão das possíveis contribuições teóricas que os seus
resultados poderão propiciar.
Sob o aspecto prático, o estudo se justifica, principalmente, do ponto de vista
operacional, para verificar se a Contabilidade dessas instituições está sendo elaborada
segundo o padrão das normas e princípios contábeis. Ademais, a Contabilidade
também possibilita identificar, com segurança, se uma entidade é sem fins lucrativos.
Do ponto de vista social, o estudo é importante para que toda a sociedade,
principalmente, o cidadão comum, conheça as ferramentas que a Contabilidade dispõe
e que servem como controle das operações das entidades do terceiro setor. Com isso,
16
se estaria fornecendo subsídios para que os cidadãos exerçam a função de agentes
fiscalizadores dos recursos públicos, uma vez que, quando gozam da imunidade
tributária, essas instituições estão usufruindo os recursos públicos que deixaram de ser
arrecadados. Esses valores devem ter a sua destinação fiscalizada. Tudo isso
possibilita a formação de uma consciência política, que estimulará um maior controle
social na administração dos bens públicos.
17
1 FUNDAMENTAÇAO TEÓRICA
Esta seção apresenta a base teórica que subsidiará este trabalho. Há a
abordagem sobre o espaço ocupado pelo Terceiro Setor na sociedade, a sua
contextualização no Brasil, a conceituação das personalidades jurídicas que o compõe
e os benefícios concedidos pelo governo para o setor. Além disso, há os conceitos da
imunidade e da isenção tributárias, a questão dos requisitos legais que condicionam o
gozo da imunidade, com foco nas instituições de educação sem fins lucrativos e, toda a
estrutura contábil aplicável ao Terceiro Setor.
1.1 Entidades do terceiro setor
Desde o início da sua existência, o homem sempre necessitou da presença do
Estado. Como não consegue viver, isoladamente, o indivíduo passou a constituir
sociedades para sobreviver. Assim, o Estado surge dessas formações de aglomerado
de indivíduos, para satisfazer os interesses comuns.
Tal necessidade natural de convivência, com os seus semelhantes, fez com que
o ser humano constituísse as sociedades. Elas se desenvolveram e se organizaram,
internamente, moldando-se aos interesses coletivos, para poder sobreviver. Daí nasce
o conceito de nação. Segundo Bacelar Filho (apud Violini, 2006, p. 26), “[...] o Estado é
uma nação politicamente organizada, composta pelo seu governo soberano”.
Para
Giddens (2005, p. 342), o Estado existe:
[...] onde há mecanismo político de governo (instituições como um Parlamento
ou Congresso, além de servidores públicos) controlando determinado território,
cuja autoridade conta com o amparo de um sistema legal e da capacidade de
utilizar a força militar para implementar suas políticas.
Em outras palavras, a formação do Estado já pressupunha a união das forças
dos seus membros, de seu povo, em torno de um bem comum. Os indivíduos, para
constituírem o Estado, renunciam aos seus poderes individuais em prol da consolidação
18
desse poder maior. A participação de todos na gestão da sociedade se faz presente
através dos seus representantes, os agentes políticos e, também, da participação
individual de cada um como cidadão.
Nas palavras de Meirelles (2000), o Estado é formado por três elementos
originais e indissociáveis: povo, território e governo soberano. Povo é o componente
humano; território é a sua base física e, governo soberano o elemento condutor do
Estado. Ele enfatiza que não pode haver Estado independente sem soberania, sem
poder absoluto, que é um poder indivisível e irrefutável de organizar-se e de dirigir-se
segundo a vontade de seu povo e, se necessário, o poder de utilização da força para a
consecução de seus objetivos, com o fim de defender o interesse público.
A organização de cada Estado está consubstanciada no texto da sua
constituição, ou seja, dada a sua importância, é matéria constitucional, que é,
hierarquicamente, o instrumento legal máximo de qualquer país. No Brasil, a
Constituição em vigência é a que foi promulgada em 1988. É nela que consta a divisão
política do território brasileiro, a estruturação dos poderes (executivo, legislativo e
judiciário), a forma de Governo, o modo da investidura dos governantes e,
principalmente, os direitos e deveres dos governados, o povo (MEIRELLES, 2000).
Assim, o Estado é responsável pela organização e pelo controle social em prol
do benefício e bem estar da população. O Estado possui o poder institucionalizado, de
modo a atender aos interesses da sociedade, assegurando as garantias constitucionais.
As suas ações materializam-se através dos seus vários órgãos, que nada mais é do
que o Governo.
Surgem, aí, as manifestações para conceituar o que é Governo. Para Meirelles
(2000, p. 59), “Governo, em sentido formal, é o conjunto de Poderes e órgãos
constitucionais; em sentido material, é o complexo de funções estatais básicas; em
sentido operacional, é a condução política dos negócios públicos”. Para Bobbio (apud
Viloni, 2006, p. 27), “Governo é o conjunto de pessoas ou complexo de órgãos que
exercem o poder político e que determina a orientação política de uma determinada
sociedade”. Configuram-se, assim, nesse processo, duas categorias de atores: os
governantes, que são as pessoas que detêm o poder de governar e os governados, que
são aqueles que estão sujeitos ao poder de governo na esfera estatal.
19
Na mesma medida em que as estruturas do Estado foram se consolidando,
novas necessidades sociais dos governados foram surgindo. Dentre as principais,
destacadamente, estão a saúde e a educação. Uma vez satisfeita as necessidades
mais básicas, a alimentação, a segurança, a moradia, foram aflorando outras
necessidades, que devido a sua natureza, a finalidade social, deveriam ser oferecidas
pelo poder público. Desse modo, a atuação do Estado passou a enfrentar um desafio
cada vez maior de atender uma maior diversidade de demandas por serviços de sua
população.
O Estado Liberal burguês, surgiu no final do século XVII e, consolidado nos
séculos XVIII e XIX, como reação ao Estado Absolutista. Trouxe um pensamento
individualista o qual determinou a abstenção do Estado de sua responsabilidade social
e, atribuiu-lhe o caráter policial. Deveria o Estado ser mínimo, o que não assegurava a
vida digna à grande maioria da população.
Nesse período, a democracia, o sistema representativo e o processo legislativo
ganham força e, solidificam-se. Da mesma forma, as garantias dos direitos individuais,
o limite do poder do Estado, a defesa das liberdades individuais, a garantia da
propriedade privada passaram a ser caracterizadas como vigas mestras de processo
democrático (VIOLIN, 2006).
Nessa nova fase de relacionamento do Estado versus povo, logo foi constado
que o Estado mínimo, pregado pelo liberalismo, deixava grande parte da população
desamparada. Por conseqüência, ficou evidente a necessidade de intervenção do
Estado para assegurar certos direitos aos cidadãos. Era imperioso, então, haver uma
reestruturação estatal, com uma atuação positiva do Governo, a proporcionar condições
mínimas, tais como: educação, saúde, cultura e moradia (FEVERSANI, 2007).
Segundo Rocha (apud Violin, 2006), em decorrência de todo o acontecido,
surgem os direitos fundamentais sociais. Assim, o principio da igualdade passa a
nortear tudo como principio fundamental. Os direitos individuais determinariam que o
Estado não poderia agir naqueles espaços, constitucionalmente, assegurados à
atuação da sociedade. Por outro lado, os direitos sociais determinariam que o Estado
deveria atuar naquele espaço constitucionalmente garantido a todos.
20
Em reação ao Estado Liberal, surgiu o Estado do bem-estar social, caracterizado
por trazer já no texto constitucional as obrigações de intervenção na ordem econômica
e social e de prestação de serviços públicos para todos, indistintamente. Dentro dessa
nova ordem, é que foi editada a Constituição Federal do Brasil em 1988 (CF/88). Por
isso, é que nessa Lei se relaciona o rol de serviços públicos garantidores dos direitos
fundamentais sociais, de forma bem detalhada (VIOLIN, 2006).
Na verdade, a CF/1988, em seu texto, personifica o Estado Democrático de
Direito, o que, conforme nos ensina Moraes (2002, p. 51), “[...] significa a exigência de
reger-se por normas democráticas, com eleições livres, periódicas e pelo povo, bem
como o respeito das autoridades públicas aos direitos e garantias fundamentais”. Desse
modo,
o
princípio
democrático
como
está
em
nossa
constituição
exprime
fundamentalmente a exigência da total participação de todos e de cada uma das
pessoas na vida política do país.
Toda sociedade, mesmo formando um mesmo país, é perceptível que é
constituída pelos mais diversos atores. A formação do povo, geralmente, é
heterogênea, o que nem sempre produz a sua representação adequada. Mas, para
Dallari (1980, p. 12), já que é necessária a presença do Estado, “[...] é melhor que todos
participem dele”. Como a atividade do Estado visa a atender ao bem comum, é
necessário que todos participem, ativamente, na construção desse rumo.
A participação de cada indivíduo, nesse processo, e o seu envolvimento na
dinâmica social, caracterizam muito bem o que é cidadania. A cidadania pode ser
definida como o direito a ter direito das pessoas, a capacidade que alguns possuem de
apropriarem-se dos bens socialmente criados e efetivar as potencialidades de
realização humana abertas pela vida social (TORRES, 2007).
Fleury (apud TORRES, 2007, p.27) enfatiza alguns valores da cidadania.
Destaca a dimensão cívica como a inclusão ativa dos cidadãos à comunidade política,
com seus direitos e deveres, atribuindo-se a condição de cidadão. No mesmo sentido, o
autor ressalta a dimensão pública, pressupondo, nesse caso, um modelo de integração
e sociabilidade.
Ao buscar seus direitos, não poucas vezes, o cidadão não vai ser atendido pelo
Estado. Daí decorre a insatisfação de grande parte da sociedade, que percebe essa
21
inoperância do poder público em buscar atender a satisfação de direitos básicos. É a
complexidade e o tamanho da estrutura do poder público que torna a ação estatal por
demais ineficiente, lenta.
É desse cenário que surge uma nova expressão da sociedade: o terceiro setor,
as chamadas entidades de interesse social. A expressão terceiro setor tem sido
utilizada, genericamente, para identificar às organizações formadas pela sociedade
civil, cujo objetivo não é o lucro, mas sim a satisfação do interesse público. Está situada
ao lado dos outros dois setores da sociedade: o primeiro setor, ocupado pelo estado, e
o segundo setor, do qual fazem parte todas as entidades privadas que têm a finalidade
lucrativa, as empresas (MANICA, 2005).
Segundo Coelho (2002, p. 58), o “Terceiro Setor” é um termo utilizado
recentemente no Brasil, nas obras de Leilah Landim e Rubem César Fernandes. A
autora comenta que a expressão foi utilizada pela primeira vez na década de 70 por
pesquisadores americanos e a partir da década de 80 por pesquisadores europeus,
uma vez que o termo expressa “uma alternativa para as desvantagens tanto do
mercado, associadas à maximização do lucro, quanto ao governo, com sua burocracia
inoperante”.
Relativamente ao assunto, destaca-se que o terceiro setor não pertence nem ao
governo e nem ao mercado. Ele nasce de vontade popular em ocupar um vácuo no
espaço social, onde a sociedade civil passa a ocupar uma atribuição de natureza
pública, mas sob a administração de uma instituição de direito privado. Sua função, em
princípio, é satisfazer as necessidades sociais básicas. Quando há a ação na
educação, por exemplo, vemos a atuação mais eficiente de entidade privada na
condução de uma função que, em principio, é função do Estado (TORRES, 2007).
Como não poderia deixar de ser, há uma cumplicidade, um estreito
relacionamento entre esses três setores. Conforme está representado na Figura 1 a
seguir, os três setores são indissociáveis, atuando em parceria, havendo, no entanto,
independência e autonomia entre os mesmos, mas sendo cada um livre no que se
refere à sua gestão e tomada de decisões.
22
Estado
Terceiro
Setor
Mercado
Fonte: Fonseca (2000, p.5)
Figura 1 – A tríade entre o Estado, o mercado e o terceiro setor.
De acordo com Fonseca (2000, p. 4), é uma relação íntima mesmo, “formando
uma tríade”, ou seja, há um inter-relacionamento entre os três setores, de sorte que
eles compartilham suas estruturas e suas operações. Assim, o Estado para atender as
diversas demandas sociais, permite a atuação do terceiro setor e, como contrapartida,
fomenta-lhe com recursos financeiros e com incentivos fiscais.
Por outro lado, o mercado além de fomentar o terceiro setor com recursos
financeiros, também o auxilia, seja com as suas estruturas, seja oferecendo os seus
modelos de gestão mais modernos e eficazes. E o terceiro setor procura atender aos
anseios públicos, buscando auxilio do Estado e do mercado.
Nessa mesma linha, Fernandes (apud De Luca e Brito, 2006, p. 3) define o
terceiro setor como uma alternativa lógica derivada de quatro combinações resultantes
da relação entre o público e o privado, “Ou seja, o conceito denota um conjunto de
organizações e iniciativas privadas que visam à produção de bens e serviços públicos”,
conforme está demonstrado no Quadro 1, na seqüência do texto:
AGENTES
Públicos
Para
Públicos
Privados
Para
Privados
Privados
Para
Públicos
Públicos
Para
Privados
Quadro 1 - Modelo de definição para o terceiro setor
Fonte: Fernandes (apud BRITO; DE LUCA, 2006).
FINS
=
=
=
=
SETOR
Primeiro setor
Segundo setor
Terceiro setor
(corrupção)
23
Segundo Brito e De Luca (2006), o terceiro setor desempenha o papel de
supridor das necessidades de uma parcela da sociedade, carente de assistência social,
educacional e cultural, não satisfeitas pelo Estado, através de organismos criados para
esse fim por grupos empresariais, comum no caso de fundações, ou por pessoas que
se reúnem para esse fim em defesa de um mesmo ideal, mais comum no caso de
associações.
Araújo (apud Ioschpe, 2000, p. 143), ao comparar as organizações do terceiro
setor com os outros tipos de organização relaciona as suas características particulares
e complementares:
a)
Não têm fins lucrativos, sendo organizações voluntárias;
b)
São formadas, total ou parcialmente, por cidadãos organizados
voluntariamente;
c)
O corpo técnico normalmente é constituído por cidadãos ligados à
organização por razões filosóficas;
d)
São orientadas para a ação; e
e)
Comumente são intermediárias entre o cidadão comum e entidades que
podem participar da solução de problemas identificados.
Segundo Torres (2007), essas organizações recebem diversas denominações,
tais como organização não-governamental - ONG, sociedade civil, terceiro setor, sem
fins lucrativos, filantrópicas, sociais, solidárias, independentes, caridosas, associativas.
Não há uma denominação clara quando a doutrina faz referência ao Terceiro Setor no
Brasil, ou entidades de interesse social. Ressalte-se que o termo ONG, atualmente,
passou a ser muito genérico, agrupando nesse conceito entidades formais ou informais,
lucrativas e não-lucrativas, por isso, não tem uma perfeita identidade com o termo
terceiro setor.
Como as entidades do terceiro setor exprimem toda a ânsia da sociedade cível
por serviços de caráter público, vamos encontrar as suas atuações nos mais variados
campos sociais. Vamos identificar as suas atuações na arte e cultura, na educação, na
recreação, na saúde, na assistência social, nos direitos humanos e das minorias, no
feminismo, no ambientalismo, no desenvolvimento comunitário e no fortalecimento de
organizações de base (LANDIM, 1993).
24
Há muitas áreas de serviços sociais com carência na sociedade brasileira. Isso
tudo provocado pela acentuada desigualdade na sua estrutura social. Em parte, essas
instituições surgem em função da incapacidade da gestão estatal. Desse modo, elas
vão compartilhar com o governo a prestação de serviços públicos para atender essas
demandas sociais (TORRES, 2007).
1.1.1 Breve contextualização das entidades do terceiro setor no Brasil
No Brasil, esse setor enfrentou enormes dificuldades para se consolidar. Nosso
país é identificado pelos historiadores como uma sociedade que sempre teve uma forte
presença de um Estado autoritário, centralizador e patrimonialista. Qualquer
manifestação da sociedade no sentido de organizar e estruturar as instituições sociais
sofria logo a ação estatal, logo eram controladas ou cooptadas pelo governo e, com
isso, geralmente, eliminadas já em seu nascedouro (LANDIM, 1998).
O desenvolvimento da sociedade civil no Brasil foi muito prejudicado por essa
tutela do Estado. Isso acabou debilitando as estruturas desse setor no país. Com isso,
quase todas as ações no setor de assistência social até o final do século XIX, ficaram
restritas às ações da Igreja Católica, que recebia o mandato do Estado. Assim, o
Estado Oligárquico, presente até 1930, ficou indiferente aos diversos problemas sociais
brasileiros (LANDIM, 1998). Nesse sentido, conclui Panceri (2001, p. 116):
[...] Igreja e o Estado são as instituições pilares na gênese e configuração do
]universo de organizações sem fins lucrativos no Brasil. Na sociedade
brasileira foi muito lenta e tardia a conformação de um contexto propício à
permeabilidade e transparência de atuação das organizações da sociedade
civil e nas suas relações com o Estado, políticas públicas e mercado.
O final no século XIX e inicio do século XX é marcado pela crise das oligarquias
e pelo surgimento de vários movimentos sociais no Brasil. Dentre eles, podemos
destacar a fundação do Partido Comunista e o Movimento Tenentista. Isso vai fortalecer
as manifestações do povo, que passa a exigir mais atenção do Estado. Atento à
25
conjuntura, Getúlio Vargas utilizou tudo isso em favor de sua plataforma política,
investindo no desenvolvimento urbano-industrial (NASCIMENTO, 1999).
Dessa maneira, o Estado brasileiro passa a dar mais atenção aos anseios do
povo, expandindo os serviços públicos aos cidadãos. Por outro lado, ele passa a intervir
mais ainda na sociedade civil. Foi quando foram criados o SENAI, o SENAC e a LBA.
Ficou reconhecido também o papel do Estado na criação de associações organizativas,
tais como os sindicatos, e foram criadas as instituições previdenciárias, as leis
trabalhistas, a carteira de trabalho e o sufrágio universal (NACIMENTO, 1999).
Nesse período, houve uma forte atuação das instituições sem fins lucrativos,
ainda que com a forte presença e importância da igreja e sob a tutela do Estado. Todas
as iniciativas autônomas e emergentes da sociedade civil eram logo atreladas ao
aparato estatal. Os pobres continuavam sem direitos e boa parte da caridade cristã foi
deslocada para a caridade do Estado, de tal maneira que o clientelismo passa a ser a
política oficial (NASCIMENTO, 1999).
Ao final da Segunda Grande Guerra, houve o fortalecimento da indústria
brasileira provocado pela aliança do setor industrial nacional com o capital estrangeiro.
Os sindicatos também se robusteceram. Tais acontecimentos vieram a contribuir para
aumentar a pressão popular por reformas de base, fomentadas ainda mais pela
Constituição de 1946, que instaurou o regime democrático do país (NASCIMENTO,
1999).
Como o modelo até então adotado pelo Estado brasileiro mostrava-se superado,
claramente, houve uma transição para um estágio em que a sociedade civil passa a
ocupar mais espaços na execução dos serviços públicos. Segundo Coelho (2000), se
era forte e centralizada a ação do Estado, por outro lado, sempre foi conhecida a
ineficiência, seletividade e fragmentação do suposto Estado de Bem-Estar social, do
qual a maioria da população brasileira ficou de fora.
Nos anos 30-40, a despeito do projeto centralizador e autoritário ainda vigente, já
podiam ser identificadas inúmeras instituições sem fins lucrativos, as quais foram, em
grande parte, responsáveis pela prestação de serviços a amplas camadas da
população excluídas das políticas sociais (LANDIM, 1998).
26
Em 1964, inicia o período em que o Estado brasileiro rompe com a sociedade
civil. Com isso, ele passa a ter amplo controle não só da área social, como também as
demais áreas. Segundo Panceri (2001, p. 114), nesse momento, o Estado passa a
controlar todas as políticas sociais, sejam as compensatórias, sejam as distributivas,
sejam as de integração nacional e, para isso, “[...] criou uma grande estrutura
hierarquizada e centralizada para reduzir a pobreza e as diferenças regionais: INPS,
BNH, COBAL, CEME, Mobral, são algumas dessas estruturas”.
Nessa época, apoiados na estrutura da Igreja, os movimentos sociais autônomos
surgiram e cresceram com caráter politizador e libertador. A forte opressão do Estado
acabou por promover, incentivar e fortalecer os movimentos sociais no nosso país.
Houve também o financiamento externo de organizações estrangeiras que passaram a
fomentar as instituições sociais no Brasil, visando resgatar a democracia. Nesse
cenário, o sindicalismo assume o papel de ator principal nas lutas democráticas. Com
isso, a atuação na área social, tanto por parte do Estado quanto da sociedade, deixou
de ter um caráter meramente caritativo, para assumir uma função estratégica
(NASCIMENTO, 1999).
Isso acabou evidenciando que o modelo desenvolvimentista e centralizador
adotado pelo Estado brasileiro não conseguia atender, satisfatoriamente, às
reivindicações sociais. Na mesma medida em que foi reduzindo a capacidade de
investimento estatal, afloraram os movimentos que retratavam a insatisfação com o
modelo vigente (COELHO, 2000).
A partir da década de 80, os países em geral, passaram a ter problemas com as
suas contas, em face à escassez de recursos. Com o advento da globalização, países
em desenvolvimento, como o Brasil, tiveram queda na sua receita, sem que houvesse
redução de suas despesas. A globalização, tornando-se mais presente, exigia maior
competitividade, para o que o Brasil não estava preparado, vindo esse processo a
prejudicar a economia, reduzindo a arrecadação de impostos. Além da escassez de
recursos, o governo brasileiro se apresentava demais ineficiente nas ações que
desenvolvia.
O
modelo
desenvolvimentista
e
centralizado
mostrava
que,
gradativamente, reduzia a capacidade do Estado de cumprir com a sua missão
(FLEURY, 2003).
27
Então, o Estado brasileiro precisava reduzir o seu tamanho. Com o início do
processo de redemocratização a partir de 1985, começou uma nova fase de reformas,
visando adequar a organização estatal a um novo modelo, oferecendo uma maior
participação da sociedade no Estado. A Constituição de 1988 veio formalizar essa nova
configuração no Brasil, redefinido o papel do Estado como fomentador das políticas
sociais, mas não, necessariamente, como executor. O governo, então, procura diminuir
o seu tamanho, na medida em que adota os princípios neoliberais e amplia e fortalece
as organizações civis.
Dentro desse contexto é que as instituições da sociedade civil ganham espaço,
favorecidas por esse ambiente de maior liberdade. Segundo Panceri (2001, p. 116),
elas “[...] ganham visibilidade e colocam-se diante da necessidade de buscar um novo
posicionamento e uma nova institucionalidade frente à sociedade e ao Estado”.
A realização da Eco 92 na cidade do Rio de Janeiro reflete muito bem essa nova
ordem que se estabelece, em conformidade com a novo momento político-social. É o
que enfatiza Panceri (2001, p. 116):
A Eco 92 é um marco definitivo do reconhecimento, por parte do governo,
dessa institucionalidade, havendo uma mudança gradativa da agenda: nem
assistencialismo, nem revolução e sim, desenvolvimento sustentável, a partir
da construção de soluções locais.
Para Landim (1998), esse resgate da presença das organizações voluntárias no
Brasil permite concluir que em nosso país nunca houve políticas coerentes e contínuas
em relação a elas. Para a autora, embora marginalizadas, elas sempre estiveram
presentes, auxiliando o Estado brasileiro nas práticas das políticas públicas.
Essas instituições foram impulsionadas ainda mais em 1995 com a criação pelo
Governo Federal do Conselho da Comunidade Solidária. Esse órgão nasceu com a
finalidade de estabelecer um maior diálogo entre o Estado e o terceiro setor, buscando
concretizar parcerias para o enfretamento da pobreza e da exclusão social no país.
Esse Conselho teve como principal realização o estabelecimento da legislação para o
reconhecimento e a regulação das organizações que atuam no setor (BOSE, 2004).
Outro fator que contribuiu para o desenvolvimento do Terceiro Setor no Brasil foi
a redução da entrada de recursos financeiros internacionais. Esses valores que proviam
28
das organizações estrangeiras deixaram de vir para o nosso país e passaram a ser
alocadas para países mais pobres, mais carentes. Diante desse desafio de enfrentar a
redução de seus recursos, as entidades brasileiras acabaram sendo obrigadas a buscar
maior eficiência e a auto-sustentabilidade (BOSE, 2004).
1.2 As entidades do terceiro setor em funcionamento no Brasil
Em princípio, as ações do terceiro setor podem ser desenvolvidas por pessoas
físicas ou pessoas jurídicas. Até porque, a formação desse setor decorre da
manifestação natural dos indivíduos, o que dependendo da extensão ou complexidade
do serviço social que uma pessoa pode prestar, nem sempre se observa todo o
formalismo comum às instituições organizadas. Algumas pessoas físicas fazem
filantropia com recursos próprios, sem se preocupar em expandir ou formalizar o seu
raio de ação.
Quando essas atividades passam a se institucionalizar, a crescerem, elas
devem se constituir como pessoa jurídica, segundo a legislação vigente, para se
apresentarem, regularmente, perante a sociedade e, com isso, consolidar as suas
operações.
O Código Civil brasileiro, Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002, em seu artigo
44 enumerou as pessoas jurídicas de direito privado como sendo as associações, as
sociedades e as fundações. A Lei nº 10.825, de 22 de dezembro de 2003, incluiu na
relação as organizações religiosas e os partidos políticos. Por exclusão, eliminando as
sociedades, as demais pessoas jurídicas não têm finalidade lucrativa ou econômica.
Devido ao objetivo desse trabalho, que aborda a pesquisa sobre entidades do
terceiro setor que podem explorar a atividade de educação, a análise se restringirá às
fundações e às associações, que são as duas formas jurídicas em que podem se
revestir as organizações do terceiro setor, quando prestam serviços de cunho social.
29
1.2.1 Associações
A CF/88 garante a plena liberdade de associação, de tal forma que ninguém
poderá ser compelido a associar-se ou mesmo permanecer associado, desde que seja
para os fins lícitos, vedando a de caráter paramilitar. As associações, na CF/88, têm
reconhecido e preservado o princípio da livre associação.
Ao regulamentar o funcionamento de tais entidades, o Código Civil pátrio, em
seu artigo 53 dispôs que “[...] constituem-se as associações pela união de pessoas que
se organizam para fins não econômicos.” O Terceiro Setor aqui se acomoda quando
pessoas se unem e se organizam, voluntariamente, com objetivos de natureza social e,
assim, passam a atuar em complementação às atividades sociais do Estado.
A finalidade não-econômica, prevista na redação do artigo 53 do Código Civil
brasileiro, não expressa que a associação não possa desenvolver atividades
econômicas, mas tão somente que os lucros, eventualmente, auferidos não podem ser
distribuídos entre seus membros (LAURINDO, 2006).
Esse foi o propósito do legislador, o que se evidencia ainda mais quando o
Código Civil brasileiro, nos seus artigos 981 e seguintes, trata das sociedades, pessoas
jurídicas de direito privado com finalidade lucrativa, dispondo que nestas “[...] celebram
contrato as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços,
para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados”.
A principal distinção entre sociedade e associação, portanto, é a partilha dos
resultados auferidos no exercício da atividade econômica. Na associação não há que
falar em se distribuir os seus lucros. O contrário ocorre em relação à sociedade, que
tem toda a liberdade de distribuir o seu resultado, se houver lucro, aos seus sócios.
Uma
associação
é
constituída
através
de
um
estatuto,
que
deverá,
necessariamente, definir a composição e o funcionamento dos seus órgãos
deliberativos e administrativos. O órgão de deliberação máxima é a Assembléia Geral.
Esta possui as seguintes competências privativas: a) eleger os administradores; b)
destituir os administradores; c) aprovar as contas; d) aprovar e alterar o estatuto.
É também o estatuto que define os objetivos da associação. Ao se instituir uma
associação de educação, por exemplo, a sua direção deve sempre observar as
30
finalidades essenciais da instituição, canalizando todos os seus recursos tão somente
em favor de tal atividade.
1.2.2 Fundações privadas
As fundações são entes jurídicos que têm como fator característico a dotação do
seu patrimônio. As suas constituições sempre começam com a formação patrimonial,
que pode ser em dinheiro, imóveis, veículos, ou outros bens e as finalidades devem ser
sempre a de cumprir uma função social. Nesse sentido, o Código Civil brasileiro ao
regular o funcionamento das fundações, dispôs, em seu artigo 62, que elas “são
organizações dotadas de personalidade jurídica legalmente instituída, cujo patrimônio é
afetado para uma finalidade específica”.
Extrai-se dessa redação legal que para existir uma fundação no Brasil alguns
componentes precisam estar presentes, quais sejam, o patrimônio, a finalidade e o
vínculo. A dotação patrimonial é elemento nuclear sem a qual não será possível a
criação de uma fundação. O patrimônio deve ser composto por bens livres, ou seja, que
sobre eles não pairem quaisquer ônus.
A finalidade deve ser previamente estabelecida pelo instituidor da fundação,
porém, não é qualquer finalidade que poderá ser objeto de uma fundação. É necessário
que essa finalidade seja possível, não tendo espaço para finalidades utópicas. Deve
também ser lícita, isto é, permitida em conformidade com o ordenamento jurídico pátrio.
Ela deve ser determinável, ou seja, a especificação do fim a que deve destinar a
fundação deve ser certa para que não haja desvios e seja preservada a vontade do
instituidor (LAURINDO, 2006).
Como a finalidade não pode jamais ser alterada, isto se constitui no dizer de
Paes (2003, p. 136), “[...] verdadeira cláusula pétrea fundacional”, pois em havendo
desvio de finalidade na fundação, diz o art. 69 do Código Civil brasileiro, a mesma
poderá ser extinta com a transferência de seu patrimônio a outra fundação que
proponha fim igual ou semelhante, desde que não haja outra previsão no ato
constitutivo ou estatuto.
31
Para existir fundação, é necessário um vínculo, que está consubstanciada na
vontade do seu instituidor. Entretanto, essa vinculação deve também estar limitada às
permissões legais que, expressamente, prevê os fins a que uma fundação pode se
destinar, quais sejam, “fins religiosos, morais, culturais ou de assistência” (Parágrafo
Único do art. 62 do Código Civil).
As fundações podem ser constituídas para atuarem para um público específico,
como ocorre com as que são constituídas pelas grandes empresas que, às vezes,
atendem tão somente os familiares dos seus funcionários, como forma de
complementar os benefícios sociais. Podem, por outro lado, ser constituídas para
atender o público em geral, auxiliando o Estado na execução de suas atividades
(TORRES, 2007).
1.3 Benefícios concedidos às entidades de terceiro setor
Devido ao caráter social da atividade desenvolvida pelas entidades de interesse
social, o governo procura fomentar o setor com a concessão de benefícios financeiros e
fiscais. Há as doações, as subvenções e outras diversas formas de fomento financeiro.
Mas, é na parte fiscal que estão identificados os maiores benefícios para essas
instituições com a concessão das chamadas desonerações tributárias, mais,
especificamente, a imunidade tributária e a isenção.
1.3.1 Imunidade tributária
Apresentadas as configurações do terceiro setor, identificadas as suas funções
complementadoras das atividades do Estado, passa-se a analisar as normas e a
aplicação da imunidade tributária. Se o objetivo do presente trabalho é compreender a
imunidade tributária das instituições sem fins lucrativos, há a necessidade que as
atenções sejam alocadas nela, para inferir-se a sua natureza jurídica, a regulamentação
constitucional e infraconstitucional, seu reflexo enquanto política pública.
32
1.3.2 A natureza jurídica da imunidade tributária
Ao Estado, é concedido o poder de tributar. Essa competência está disposta no
texto constitucional, onde estão relacionados todos os tributos que os entes
componentes da federação, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
podem instituir e cobrar.
Entretanto, o mesmo texto constitucional, em seu artigo 150, incisos VI, alínea c,
dispõe, expressamente, que é vedado à União, Estados, Distrito Federal e Municípios
instituir impostos sobre o “[...] patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos,
inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de
educação, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.
Pelo que ficou explicitado, a concessão do benefício da imunidade restringiu-se
aos impostos, não se aplicando às outras espécies de tributos, previsto na CF/88, quais
sejam: às taxas, as contribuições especiais, os empréstimos compulsórios e a
contribuições de melhoria.
É isso que nos ensina Martins (apud Mânica, 2005, p. 193) quando afirma que
“[...] a imunidade a que se refere o artigo 150, inciso VI, alínea ‘c’da Constituição
Federal abrange apenas os impostos e não as demais espécies”.
Desse modo, estariam abrangidos pela imunidade os seguintes impostos,
distribuídos por esfera de governo:
FEDERAL (UNIÃO)
Imposto de Renda (IR)
Imposto
sobre
Produtos
Industrializados (IPI)
Imposto Territorial Rural (ITR)
ESTADUAL (ESTADOS E
DISTRITO FEDERAL)
Imposto sobre a Circulação de
Mercadorias e sobre Prestação
de Serviços (ICMS)
Imposto sobre Propriedade de
Veículos Automotores
Imposto sobre a Transmissão
Causa Mortis ou Doação de
Bens e Direitos (ITCD)
Imposto sobre Exportação (IE)
Imposto sobre Importação (II)
Imposto
sobre
Operações
Financeiras (IOF)
Quadro 2 – Relação de impostos do Brasil
Fonte: Autor
MUNICIPAL (MUNÍCIPIOS)
Imposto sobre Serviço (ISS)
Imposto sobre a Propriedade
Territorial Urbana (IPTU)
Imposto sobre a Transmissão
Inter Vivos de Bens Imóveis
(ITBI)
33
A inintributabilidade das instituições do terceiro setor é uma das principais
garantias do Estado Democrático de Direito. A razão da imunidade é legítima na
medida em que seus bens e serviços são integralmente voltados para o custeio de
atividades essencialmente sociais, por isso, de caráter eminentemente estatal. Nesse
sentido, o Estado deve oferecer todas as condições e liberdade para o desenvolvimento
da sociedade civil. E, nesse caso, fala-se de desonerar dos impostos uma atividade de
natureza pública, permitindo à instituição maior robustez econômico-financeira para
permitir atingir a sua finalidade de fornecer bons serviços à comunidade, o que, em
princípio, é finalidade principal do Estado (FERVESANI, 2007).
Embora o assunto seja relevante, a doutrina brasileira ainda apresenta
divergências quando define a natureza jurídica da imunidade tributária. Esse trabalho
não pretender exaurir a matéria, mas tão somente fornecer os conceitos que se fazem
necessários para a correta compreensão do tema proposto, para, com isso, possibilitar
uma análise crítica-reflexiva sobre o assunto.
Desse modo, não há um conceito único para definir o que é imunidade tributária.
Vamos encontrar as mais diversas manifestações sobre o assunto, mas com definições
que guardam semelhanças.
Para Machado (2007), a imunidade constitui regra de limitação de competência
tributária, resultante de norma constitucional. Aquilo que é imune não pode ser
tributado. A Constituição distribui as competências tributárias, definindo quais impostos
poderão ser instituídos e cobrados por cada ente da federação brasileira, seja a União,
o Estado, o Distrito Federal ou os Municípios. Mas, ao mesmo tempo, exclui da
tributação algumas atividades.
Miranda (1999 p. 78) ao tratar da questão, traz à discussão uma outra
abordagem: “A regra jurídica de imunidade é regra jurídica no plano da competência
dos poderes públicos – obsta à atividade legislativa impositiva, retira ao corpo que cria
impostos qualquer competência para pôr na espécie”.
Para Amaro (2003, P. 149), a imunidade tributária é uma qualidade da situação
que não pode ser onerada pela tributação “[...] em razão de norma constitucional que, à
vista de alguma especificidade pessoal ou material dessa situação, deixou-a fora do
campo sobre que é autorizada a instituição do tributo”.
34
Borges (2001) define a imunidade tributária como a qualidade de norma
constitucional de limitação ao poder de tributar não podendo ser encarada como uma
simples vedação de tributar, impondo-se que seja definida como regra de exclusão de
competência tributária.
Barreto (1998) vê a imunidade como uma regra de exclusão de competência
tributária, vedando o exercício desta a determinados bens, pessoas e situações. Já
Nogueira (1992) define a imunidade como uma forma qualificada ou especial de nãoincidência, por supressão, na Constituição, da competência impositiva ou do poder de
tributar, quando se configuram certos pressupostos, situações ou circunstâncias
previstas pelo estatuto supremo.
A imunidade tributária das instituições de educação sem fins lucrativos ganha
força, nesse contexto, tendo em vista que estas instituições atuam de modo a efetivar
uma necessidade vital para o desenvolvimento da nação, suplementando a atividade
estatal.
Efetivamente, o que se tem é que a imunidade se relaciona às pessoas, já que
invariavelmente é a elas que beneficia, “[...] quer por sua natureza jurídica, quer pela
relação que guardam com determinados fatos, bens ou situações [...]” (CARRAZA,
1997, p. 399).
A conclusão a que se chega é que a imunidade tributária somente é alcançada
às instituições de educação e de assistência social devido à particularidade do serviço
que é por elas prestado, relacionando-se, pois, com suas características pessoais e
com sua natureza jurídica. Não fossem tais particularidades, por certo que a imunidade
tributária não lhes seria alcançada (FERVESANI, 2007).
Percebe-se, assim, que ao conferir a referida imunidade às instituições de
educação sem fins lucrativos, está o Estado fomentando a implementação de políticas
públicas pela própria sociedade civil. Tratam-se, pois, de políticas tributárias que visam
a inclusão social, através do reconhecimento estatal quanto à atuação do terceiro setor.
É exatamente pela natureza do serviço prestado pelas entidades assistenciais,
que o legislador constituinte as elevou à situação de imunes. É nesse aspecto que se
tem que a imunidade tributária, como norma constitucional, deve ser analisada com
35
vistas à sua concretização, de modo que se tenha a pré-compreensão do seu sentido,
primando-se o texto constitucional em face do problema (FERVESANI, 2007).
Pelo que se percebe, a concretização dos dispositivos constitucionais pressupõe
a compreensão de seu alcance, ou seja, do alcance dos termos empregados. Assim,
para que haja a devida concretização das imunidades tributárias das instituições de
assistência social, é imprescindível que se utilize a compreensão já realizada neste
trabalho no que se refere às organizações que podem ser consideradas como de
assistência social, para só então garantir-se às mesmas a tributação privilegiada.
É nesse sentido que a compreensão dos contornos constitucionais do direito à
educação faz-se importante, de modo a compreender-se que a imunidade tributária
somente pode ser alcançada àquelas instituições que estejam a implementar uma
efetiva política pública, concretizando essa parte dos direitos sociais e, em última
análise, os direitos individuais. A primeira compreensão é, pois, constitucional, sendo
que a análise quanto à satisfação dos requisitos infraconstitucionais somente deve ser
realizada quando a instituição contempla a vontade constitucional, agindo como um
verdadeiro braço do Estado (FERVESANI, 2007).
Este é o tema central das imunidades tributárias oferecidas às instituições de
educação sem fins lucrativos, sendo que sua concretização somente se faz possível em
um ambiente de comprometimento social.
A vontade constitucional é o verdadeiro contorno da imunidade tributária, sendo
que a discussão não pode ficar restrita à satisfação ou não dos requisitos
infraconstitucionais, a exemplo do que se tem visto na atividade jurisdicional. Não pode
a administração pública criar novas obrigações, o que cria restrições indevidas a direito
que é preceito constitucional.
De tudo isso, o que se pode concluir é que a regra constitucional exprime uma
regra estruturante pela qual os entes federativos, as pessoas tributantes, tornam-se
incompetentes para instituir imposto sobre as atividades relacionadas como imunes,
mais especificamente, sobre as atividades das instituições de educação sem fins
lucrativos, para limitar a atenção ao nosso objeto de estudo (DINIZ, 2007).
36
1.3.3 Isenção versus imunidade tributária
É comum a confusão que sempre ocorre entre a isenção e a imunidade. A
isenção é a inexigibilidade temporária do tributo, devido previsão em lei, mesmo com a
ocorrência do fato gerador e, em tese, da obrigação tributária. As isenções podem
alcançar todos os tipos de tributos: impostos, taxas, contribuições de melhoria,
empréstimos compulsórios e contribuições especiais. Cada esfera de Governo federal,
estadual e municipal legisla sobre a isenção dos tributos de sua competência.
A imunidade tem caráter permanente, somente podendo ser mudada com a
alteração da Constituição, enquanto a isenção é temporária, ou seja, já na sua
concessão pode-se delimitar prazo de vigência, pois decorre de lei. Na imunidade não
ocorre o fato gerador da obrigação tributária, diferentemente da isenção, onde ocorre o
fato gerador, mas a lei toma o crédito inexigível (MACHADO, 2007).
Amaro (2003) observa que a diferença fundamental entre a imunidade e a
isenção decorre dos diferentes planos em que elas operam. A primeira encontra-se no
plano da definição de competência, e a segunda, no plano do exercício dessa
competência. Em um caso, a própria constituição excepciona as situações que
permanecem imunes à tributação, fora do alcance do poder de tributar outorgado pela
norma constitucional e, no caso da isenção, a pessoa política competente para tributar
exclui determinadas situações da incidência tributária.
Na visão de Machado (2007), a imunidade está em patamar superior ao da
isenção, Segundo ele, a imunidade constitui uma limitação ao poder de tributar, que
não pode modificada por lei ordinária, como ocorre com a isenção. Por isso, não pode
sofrer qualquer restrição por leis ordinárias. Qualquer alteração dependeria de uma
alteração na Constituição, o que, geralmente, exige processos legislativos mais difíceis
e demorados.
Coelho (2002) ensina que ambas constituem categorias legislativas que
condicionam as normas tributárias, cooperando em sua formação, em que a primeira
habita na Constituição e a segunda resulta de lei menor, complementar ou ordinária,
sendo àquela voltada para valores caros, que se destinam a durar mais, enquanto
37
estas, as isenções, abrigam interesses mais comuns que por natureza se modificam
com maior freqüência.
Convém destacar, a essa altura, o diferencial que é ditado por Carvalho (2002),
quando afirma que as regras de imunidade são normas de estrutura, enquanto as de
incidência são preceitos de conduta. Nota-se, portanto, que a imunidade e a isenção
tributária são institutos que não se confundem. A primeira está prevista na norma
constitucional, como regra de estrutura, delimitando o campo das competências
tributárias, resguardando valores sociais e éticos.
A segunda, a isenção, está disposta na lei complementar ou lei ordinária e
viabiliza interesses mais comuns, consistentes, consubstanciando em regras de
conduta, situando-se, portanto, em patamares bem distintos.
Hierarquicamente, estão localizados em graus bem distintos, nesse caso, a
imunidade configura-se no patamar superior, principalmente, em razão da sua
importância de preservar algumas pessoas, bens, ou situações do ônus da tributação,
propiciando a cooperação dos entes estatais com os entes privados.
1.3.4 Instituição de educação
Inicialmente, para se definir os conceitos de educação, parte-se do conteúdo
estampado no artigo 6.º, inserido no capítulo II, "DOS DIREITOS SOCIAIS", da CF/88,
que prevê: "São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança,
a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desempregados, na forma desta Constituição".
No artigo 205, a CF/88 volta a enfatizar a educação como direito social,
afirmando que esse serviço deve ser promovido com a colaboração da sociedade, no
caso, com o apoio do terceiro setor:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
38
Bastos (1990) declara que a educação constitui um dever do Estado e da família
em contrapartida a um direito de todos os cidadãos, objetivando a sua evolução e
qualificação para o trabalho, primando, principalmente, pela gratuidade do ensino
público em instituições oficiais. Em face disso, surge o público e o privado como
sistemas de ensino regidos pelas normas gerais de educação sujeitas ao controle de
qualidade pelo Poder Público.
Ferreira (1995), escrevendo sobre esse tema, esclarece que a educação não
constitui um direito subjetivo oponível contra o Estado. Ela é um dever do Estado e da
família, devendo ser promovida com a colaboração da sociedade, tendo como
finalidade o desenvolvimento da pessoa humana, o exercício da cidadania e da
democracia.
Extrai-se, em princípio, do conteúdo das normas constitucionais sob análise,
somados aos ensinamentos doutrinários, que a educação constitui direito social de
todos os cidadãos brasileiros e dever do Estado e da família. Contudo, não se trata
propriamente de um direito subjetivo oponível contra o Estado, mas, sim, princípio
teleológico social, que visa assegurar o princípio maior, disposto no texto constitucional
no seu art. 1°, inciso III, que diz respeito à dignidade da pessoa humana.
Denota-se, assim, que a educação constitui direito social básico e prioritário para
o desenvolvimento da pessoa humana, que motiva a imunidade tributária outorgada
pelo Constituinte a todas as instituições que possuem essa finalidade político-social.
Em se tratando da tributação de entidades de educação, é importante entender a
vontade do legislador constituinte de manter estas entidades imunes ao recolhimento
de impostos incidentes sobre o patrimônio, a renda e os serviços, vontade essa
manifestada de forma semelhante e insistente, desde a democrática Constituição de
1946.
Verifica-se, assim, a necessidade do legislador constituinte de tutelar os bens de
entidades cujo objeto não é o lucro, dedicando-se ao desenvolvimento de atividades
educacionais. O patrimônio pertencente a estas instituições não tem a finalidade de
gerar lucros a quem quer que seja e, sim, propiciar ações em que o objetivo primordial é
atingir o bem comum.
39
A esse propósito, Barreto (1998) esclarece que essas entidades privadas,
educacionais e de assistência social, sem fins lucrativos, exercem atividades que
seriam, por princípio nas sociedades democráticas, atribuições do Estado, residindo aí
o objetivo do legislador constituinte em desonerá-Ias dos impostos, justamente, porque
desempenham papel fundamental, auxiliando o poder público no cumprimento de seus
objetivos políticos e sociais.
Pode-se dizer, então, que às entidades imunes é lícito comporem-se de
organizações representativas da sociedade, independentemente da forma de sua
constituição, se associativa ou fundacional, desde que tenham como objeto assistir as
áreas sociais, a exemplo da educação e da saúde, em colaboração com o Estado.
Há que se indagar, aqui, os significados da palavra instituição empregada no
texto constitucional desde a Constituição de 1946, como qualificação dessas entidades,
quando prevê a imunidade. Segundo os comentários manifestados por Braga (1971), a
palavra instituição empregada pelo constituinte brasileiro possui um sentido técnicojurídico específico, que se destina a certa categoria de pessoas que por serem
vocacionadas às atividades públicas, pairam acima das demais entidades privadas,
porque praticam atividades públicas não-lucrativas.
Segundo Carraza (2001), a palavra instituição empregada no texto constitucional
possui, também, uma acepção técnica. Segundo ele, trata-se de pessoas jurídicas
instituídas com o objetivo de servir ao bem comum, atendendo a finalidades públicas.
Procurando conceituar e definir a abrangência desta expressão, instituição
somada à educação, Baleeiro (1981) afirma que instituição de educação prevista na
norma constitucional não se limita àquelas com características, exclusivamente,
didáticas, aproveita tal expressão toda e qualquer atividade cultural que não objetive
lucro, a exemplo de laboratório, instituto, centro de pesquisas, o museu, o atelier de
pintura ou escultura, o ginásio de desportos, as academias de letras, artes e ciência.
40
1.4 A comprovação dos requisitos “sem fins lucrativos”
O Estado brasileiro contempla com a imunidade as instituições de educação
desde a Constituição de 1946. O direito imunizador de então alcançava todos os
impostos suportados por essas organizações com finalidade lucrativa, ou não. O direito
à imunidade para a educação era bem amplo. O único requisito era que as rendas
auferidas fossem aplicadas no país e para os seus respectivos fins. O benefício na
Constituição estava previsto, em seu artigo 31, V, “b”:
Art. 31. A União, aos estados, ao Distrito Federal e aos Municípios é vedado:
[...]
V – lançar impostos sobre:
[...]
b) templos de qualquer culto, bens e serviços de partidos políticos,
instituições de educação e de assistência social, desde que as suas
rendas sejam aplicadas integralmente no País para os respectivos fins;
(grifo nosso)
A partir da Emenda Constitucional n.º 18 de 1965 (EC n.º 18/65), o texto
constitucional passou a prever e conceder a imunidade apenas para os impostos
incidentes sobre o patrimônio, renda ou serviços das instituições. Além disso, os
requisitos adicionais que deveriam ser cumpridos foram remetidos para regulamentação
através de lei complementar. Assim, ficou disposta a imunidade na Emenda:
Art. 2 º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
IV – cobrar impostos sobre:
a)
o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros;
b)
templos de qualquer culto;
c)
o patrimônio, a renda ou serviços de partidos políticos e de
instituições de educação ou de assistência social, observados os
requisitos fixados em lei complementar; (grifo nosso)
Já na Constituição de 1967, foi mantida a imunidade sem alteração, havendo tão
somente a descrição do instrumento legal, o qual deveria regulamentar os requisitos
obrigatórios, que passou a ser lei e não mais lei complementar. Desse modo, o
benefício no texto constitucional passou a ter a seguinte descrição:
41
Art. 20 É vedado à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
III – criar imposto sobre:
[...]
d)
patrimônio, a renda ou os serviços de partidos políticos e de
instituições de educação ou de assistência social, observados os
requisitos fixados em lei: (grifo nosso)
Nesse formato, a imunidade das instituições de educação ficou mantida, a
despeito da edição da Emenda Constitucional n. º 1, em 17.10.1969 – (EC n.º 1/69).
Ressaltando-se que o benefício havia sido instituído com abrangência bem maior em
1946, quando contemplava a educação nacional com a imunidade, sem excluir as
instituições lucrativas.
Porém, desde a edição da EC n º 18/65 passou-se a impor algumas restrições,
algumas obrigações, que estariam dispostas em lei, que as entidades deveriam cumprir.
Na seqüência desse trabalho, ver-se-á que essas restrições são aquelas contidas no
art, 14 Código Tributário Nacional - CTN.
Com a promulgação da CF/88, novas restrições passam a delimitar o benefício
da imunidade. Nesse novo contexto, a imunidade contemplaria somente os impostos
incidentes sobre o patrimônio, renda ou serviços relacionados com as finalidades
essenciais das entidades imunes. Além disso, a instituição deveria ser sem fins
lucrativos. É o que dispõe o artigo 150, VI, “c”, da CF/88:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]0
VI - instituir impostos sobre:
[...]
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas
fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de
educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos
da lei;
[...]
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem
somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades
essenciais das entidades nelas mencionadas.
De acordo com a constituição atual, as instituições de educação e de assistência
social que não tenham fins lucrativos estão livres de exação tributária dos impostos.
42
Segundo Amaro,(2003), quando interpreta o referido dispositivo, a lei que se
refere a alínea c, “sem fins lucrativos” deve ser entendida como lei complementar e não
lei ordinária. Para ele, duas assertivas corroboram para isso. Primeiro porque a CF/88
determina que cabe a lei complementar dispor sobre imunidade, que é uma limitação do
poder de tributar (art. 46, II, CF/88). Segundo porque a imunidade abrange vários
tributos, de competência de diferentes entes federativos, portanto é natural que seja lei
complementar, pois a ela cabe, por determinação constitucional, tratar de normas gerais
de direito tributário brasileiro.
Carvalho (2002) segue esse mesmo entendimento de que a mencionada norma
é a lei complementar em face da orientação contida no art. 146 da CF/88,
reconhecendo o art. 14 do CTN como diploma legal competente para a previsão dos
requisitos exigidos para a consecução da imunidade.
De fato, o instrumento legal a ser observado pelas instituições de educação é o
CTN, mais, especificamente, as disposições estabelecidas no art. 14.
Isso se
configurou desde a edição da EC 18/65, quando passou a ser inserida a cláusula “[...]
atendidos os requisitos de lei”. Essa é a interpretação pacificada pelos tribunais
superiores e consolidada em toda a doutrina do direito do Brasil (MÂNICA, 2005).
Assim, faz- se necessário apresentar toda a descrição do art. 14 do CTN, que
são os requisitos legais que as instituições de educação devem obedecer para que
possam usufruir da imunidade tributária:
Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à
observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas
rendas, a qualquer título;
II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção
dos seus objetivos institucionais;
III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros
revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo
9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.
§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são
exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais
das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou
atos constitutivos.
De acordo com Chiesa (2002), as obrigações dispostas no art. 14 CTN são
regras de conduta destinadas a impor os procedimentos a serem observados para o
43
gozo da imunidade. Entretanto, segundo o autor, elas não complementam as regras
imunizantes, apenas a regulamentam. As regras da imunidade, que são estruturantes,
são aquelas contidas na CF/88.
Da análise do inciso I do artigo 14 do CTN, percebe-se que tal dispositivo legal
explicita o requisito constitucional da finalidade não lucrativa. Nesse sentido, Machado
(2007) orienta que a imunidade concedida no texto da CF/88 para as instituições de
educação é condicionada e só existe para as instituições sem fins lucrativos. Segundo o
autor, a lei não pode estipular outros requisitos, senão os que servem para caracterizar
e identificar entidade como “sem fins lucrativos”.
Vale ressaltar que a vedação de que a instituição assistencial possua fins
lucrativos não a impede de apresentar superávit em sua Contabilidade, visto que isso
será em decorrência da boa administração da organização. Toda e qualquer instituição
deve buscar ter uma situação financeira positiva. Nada mais saudável que no final de
um exercício as receitas suplantem as despesas, resultando daí o lucro, ou superávit no
caso de entidades do terceiro setor.
Por outro lado, a exigência da ausência de fins lucrativos, conforme lição de
Carraza (2001), não implica a prestação gratuita de serviços, sendo esse também o
entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal – STF. Não é a cobrança por seus
serviços que vai identificar uma instituição com fins lucrativos.
Como já mencionado, não é o lucro propriamente dito que caracteriza uma
instituição sem fins lucrativos, mas sim o objetivo da instituição, que não pode se
confundir com o de uma empresa. Qualquer entidade, constituída com ou sem objetivo
de lucro, deve procurar prover as suas atividades de modo eficiente, buscando a sua
auto-suficiência. É assim que conclui Machado (2007, p. 310):
Não ter fins lucrativos não significa, de modo nenhum, ter receitas limitadas
aos custos operacionais. Elas na verdade podem e devem ter sobras
financeiras, até para que possam progredir, modernizando e ampliando suas
instalações. O que não podem é distribuir lucros. São obrigadas a aplicar todas
as suas disponibilidades na manutenção dos seus objetivos institucionais.
Para Amaro (2003), a inexistência de fim lucrativo foi corretamente traduzida
pelas disposições do art. 14 do CTN, ao determinar a não-distribuição de patrimônio ou
44
renda. Para ele, quando se fala em entidade sem fins lucrativos significa que o seu
criador não deve objetivar lucro para si. Mas, isso não impede que a instituição tenha
resultados positivos, um superávit como resultado do confronto de suas receitas com as
suas despesas. Para o autor esse superávit não é lucro. Assim, que ele conclui
(AMARO, 2003, p. 154):
Lucro é conceito afeto à noção de empresa, coisa que a entidade nas referidas
condições, não é, justamente porque lhe falta o fim do lucro (vale dizer, a
entidade foi criada, não para dar lucro ao seu criador, mas para atingir
finalidade altruísta).
Da análise do inciso II do mesmo art. 14 do CTN, conclui-se que ele estabelece
critérios objetivos que concretizam a disposição constitucional em dois sentidos: a
exigência de aplicar de todos os recursos obtidos pela entidade dentro do território
brasileiro; a manutenção dos objetivos institucionais.
O inciso III do multicitado art. 14 do CTN determina à entidade a obrigação de
escrituração de receitas e despesas em livros aptos a comprovar a exatidão do
atendimento do que prescreve os incisos I e II do referido artigo. O caso aqui está
relacionado aos meios instrumentais que a entidade imune deve dispor para
proporcionar aos agentes fiscais da Administração Pública a auditoria cumprimento dos
requisitos imunitórios. O que está se falando nada mais é do que da obrigação de
elaborar a Contabilidade.
Nesse sentido, Machado (2007, p. 310) ensina que essa exigência é de cunho
meramente instrumental e “[...] o meio para comprovar o cumprimento dessas
exigências legais é a escrituração contábil” (grifo nosso).
A Contabilidade recebe essa incumbência de referir a caracterização das
entidades para os seus usuários. Ela utiliza uma metodologia que registra todas as
ocorrências, a partir do qual produz relatórios sintetizados para, com isso, bem informar
os seus usuários. No caso sob análise, o poder público reconhecendo a sua
fidedignidade e credibilidade a reconhece como instrumento necessário para servir de
aferição das condutas das entidades que estão gozando da imunidade.
Em os procedimentos de auditorias fiscais, os agentes públicos, com base no
que está registrado e demonstrado pela Contabilidade, vão confrontar com as
45
disposições do art. 14 do CTN as condutas dos dirigentes da entidade. Verificada a
desobediência do que prescreve as referidas regras, o poder público descaracterizará a
organização como entidade sem fins lucrativos e cobrará os impostos, que passam a
ser devidos.
É importante ressaltar que a Contabilidade, para ser instrumento válido, precisa
estar regular quanto ao que determina a legislação contábil. Fora isso, os gestores
dessas entidades devem estar preocupados também em prover-se de documentos
idôneos que retratem, efetiva e fielmente, todos os seus eventos da administração da
organização.
Há de se considerar que a exigência por parte dos órgãos de fiscalização, do
Fisco, do atendimento a qualquer outro requisito que não os expressos nas normas
constitucionais e no Código Tributário Nacional não se coaduna com o sistema
constitucional vigente, razão pela qual as tantas exigências trazidas em lei ordinária, e,
até mesmo, através de decretos, não merecem aplicação para o reconhecimento da
imunidade (FERVERSANI, 2007).
Dessa forma, os órgãos de fiscalização do governo devem respeitar os exatos
termos da Constituição Federal, tanto no que concerne ao instrumento legislativo a ser
utilizado infraconstitucionalmente, quanto no que se refere às exigências do critério de
não lucratividade trazidas na própria norma constitucional (FEVERSANI, 2007).
1.5 A Contabilidade das entidades do terceiro setor
Conforme foi exposto anteriormente, o CTN atribui à Contabilidade a
responsabilidade de comprovar o atendimento dos requisitos que caracterizam a
instituições sem fins lucrativos. Isso corrobora para provar a sua importante função na
sociedade.
A Contabilidade é hoje essencial para desenvolvimento de qualquer organização,
seja ela com ou sem fins lucrativos. Isso porque, utilizando metodologia própria, ela
capta e processa os fatos econômico-financeiros, produz informações, possibilitando os
julgamentos, as decisões, o conhecimento e, principalmente, o controle das entidades
por parte de seus diversos usuários.
46
Do processo de escrituração contábil, que é a forma como a Contabilidade capta
e registra todos os fatos contábeis de uma organização, resultam os relatórios
contábeis, tais como, o balanço patrimonial, a demonstração do resultado, os
balancetes de verificação entre outros relatórios contábeis.
A constituição dos agentes decisórios nos mais diversos níveis e setores fica
dependente desses relatórios. Em decorrência da multiplicidade de eventos que uma
organização pode apresentar durante o exercício das suas atividades, surge a
necessidade de processar todos esses dados, para com isso produzir informação
econômica, física, de produtividade e social (IUDÍCIBUS, 2006). Isso é tarefa da
Contabilidade. É o que ensina Iudícibus, Martins e Carvalho (2005, p. 8):
A capacidade de capturar, primeiro, a ocorrência dos eventos econômicos que
impactam em um determinado estado de riqueza, depois a de precificá-lo e,
por último, de comunicar seus efeitos, é o desafio a que a Contabilidade está,
não apenas preferencialmente, mas de fato unicamente, habilitada a enfrentar,
apoiando-se sempre em disciplinas afins dentre as quais o Direito, a Economia,
os Métodos Quantitativos e a Ciência da Informação.
Por se tratar de sistema de informações, as transações efetuadas pela empresa
alimentam o sistema contábil, o qual codifica e retorna com o resultado das operações,
através da emissão de relatórios. Faz-se necessário então uma correta entrada de
dados, embasada em documentos escorreitos, retratando com todas as operações
realizadas pela organização, para a efetivação de relatórios corretos, para bem como
informar aos usuários a respeito do andamento da organização. “A ênfase da análise de
sistemas contábeis recai sobre o uso da informação contábil, sobre as necessidades de
seus clientes” (GONÇALVES, 2000, p. 5).
Em adição ao que foi mencionado, salienta-se que os gestores não devem se
limitar apenas à execução das atividades sob sua responsabilidade, mas também
planejá-las e controlá-las. Eles devem se envolver com todas as etapas do processo
decisório, não podem furtar-se aos três aspectos intrínsecos a qualquer atividade, qual
seja, o operacional, o econômico e o financeiro. Para exercerem tudo isso com
eficiência, eles necessitam de informação.
Assim, nenhuma entidade jurídica, seja ela pública ou privada, consegue
prescindir da informação contábil. No setor público, atualmente, ela é indispensável
47
como ferramenta principal de planejamento, da democracia, do exercício da cidadania.
Se não fosse ela, ficaria impossível verificar a execução do orçamento público e o
controle sobre a gestão dos recursos públicos.
Desse modo, no mundo dos negócios, obter informações é fundamental para
que as entidades possam se manter ativas no mercado. Como instrumento de
divulgação das informações econômicas e sociais das empresas, os demonstrativos
contábeis tradicionais e não tradicionais são as peças mais importantes para efeitos de
prover a gestão de uma instituição (BRITO; DE LUCA, 2006).
Diversos podem ser os usuários da Contabilidade. Eles podem ser identificados
de acordo com a natureza básica das informações requisitadas, dos dados que cada
um necessita. Iudícibus (2006, p. 23) enumera os principais, contemplando em seu
trabalho, como se observa, a identificar mais os usuários das sociedades com fins
lucrativos, uma empresa:
Usuários da Informação
Contábil
Acionista minoritário
Acionista majoritário ou com grande participação
Meta que Desejaria Maximizar ou Tipo de
Informação mais Importante
fluxo regular de dividendos.
fluxo de dividendos, valor de mercado da ação,
lucro por ação.
Acionista preferencial
Fluxo de dividendos mínimos ou fixos.
Emprestadores em Geral
Geração de fluxos de caixa futuros suficientes
para receber de volta o capital mais os juros,
com segurança.
Entidades governamentais
Produtividade, lucro tributável, prestação de
contas.
Empregadores em geral, como assalariados
Fluxo de caixa futuro capaza de assegurar bons
aumentos ou manutenção de salários, com
segurança; liquidez.
Média e alta administração
Retorno sobre o ativo, retorno sobre o patrimônio
líquido; situação de liquidez e endividamento
conformtáveis.
Quadro 3 – Principais usuários da informação contábil
FONTE: Adaptado de Iudícibus (2006 p.23).
Nas entidades sem fins lucrativos, as do terceiro setor, por terem finalidades que
nascem da ânsia da sociedade civil por serviços públicos, destacam-se como usuário
os seus fomentadores e instituidores. No quadro 3 eles não aparecem, pois, como já
exposto, o quadro especifica os usuários de uma empresa, sendo substituídos, nesse
caso, pelos financiadores. Boa parte dos recursos canalizados para as instituições sem
48
fins lucrativos provêm de seus fundadores ou contribuições de associados, seus
fomentadores. Os gestores dessas organizações precisam prestar contas da correta
aplicação desses recursos, até para que elas possam ter credibilidade na busca mais
recursos, e, com isso, garantir a sua manutenção.
O governo destaca-se como um dos usuários da Contabilidade dessas entidades
do terceiro setor, porque, além de ser um dos principais fomentadores de recursos
dessas organizações, ele também utiliza as informações contábeis para controlar a
continuidade da condição “sem fins lucrativos” daquelas que estão em gozo da
imunidade tributária.
As instituições de educação sem fins lucrativos geralmente se financiam com os
valores que cobram a título de mensalidades de seus alunos. Daí surge um usuário,
mais particular, o aluno, que vai interessar-se por acompanhar onde estão aplicados os
valores auferidos com essas receitas, até porque a qualidade do ensino que será
oferecido pela instituição está diretamente vinculada ao modo como estão sendo
aplicados tais valores.
Conforme ensina Olak (apud Brito; De Luca Brito, 2006, p.3), há três elementos
que caracterizam uma nova postura gerencial e de controle aplicável às entidades sem
fins lucrativos, que são: “transparência (accountability), relatórios de avaliação
(desempenho) e instrumentos de comunicação (relatórios contábeis)”.
Esses três elementos, em conjunto, caracterizam a função da Contabilidade na
vida real das organizações, resolvendo as questões práticas das entidades, provendolhes as informações. Ressalte-se que o aspecto relativo ao termo accountability
corresponde, no caso de entidades do terceiro setor, à obrigatoriedade de as entidades
prestaram conta das suas atividades, dos resultados obtidos, e das disposições do art.
14 de CTN, em função das responsabilidades decorrentes de uma delegação de poder
(BRITO; DE LUCA, 2006). Nesse sentido, pontificam Iudícibus, Martins e Carvalho
(2005, p. 8):
Não se pode esquecer que a Contabilidade, genuína e amplamente explicada
por teorias de caráter científico, tem sua faceta prática, extremamente
importante, que é a de servir como instrumento de accountability, de avaliação
da entidade e de seus gestores, da prestação de contas destes e como insumo
básico para a tomada de decisões dos agentes econômicos, tanto internos
quanto externos à entidade.
49
Além disso, dentro da ótica de que o Estado detém o poder de arrecadar tributos,
ele necessita de instrumentos para poder identificar os fatos econômicos tributáveis.
Com isso, ele passa a ser um dos principais interessados, um stakeholder natural, da
informação contábil.
No Brasil, identificam-se muitos instrumentos legais determinando a obediência
de certos critérios contábeis. Alguns autores criticam essa postura muito presente do
Estado brasileiro na regulação de dispositivos contábeis. Conforme a manifestação de
alguns deles, isso acaba travando o desenvolvimento da ciência contábil no país.
Nesse sentido, conclui Iudícibus, Martins e Carvalho (2005, p. 10 e 11):
No entanto, embora seja inegavelmente nobre a função arrecadadora do
Estado para que possa cumprir o mandato que a Sociedade lhe confere, há
que se seguir contestando e refutando o excesso de intromissão
governamental determinando à contabilidade práticas, métodos e regras que,
para atingir o objetivo admitido – computar a base de arrecadação – resvale
ferindo objetivos que não lhe são próprios, como a medição do desempenho
empresarial na ótica do sócio ou do credor.
Entretanto, ao atribuir à Contabilidade a responsabilidade de aferir o quesito sem
fins lucrativos, nos termos do artigo 14 do CTN, vê-se presente um dispositivo legal em
que o Estado acaba reconhecendo quão é importante a Contabilidade no controle da
gestão das entidades que gozam da imunidade tributária. Nesse caso, a lei atribui uma
obrigação, não para limitar a atuação da Contabilidade, mas sim para confirmar como
necessária no fortalecimento do reconhecimento dos direitos do terceiros setor.
Desse modo, o Estado, como usuário externo, tem à sua disposição as
informações contábeis de todas as entidades sem fins lucrativos. Isso lhe permite
fiscalizar tais organizações para comprovar as condições de regulares ou irregulares,
cobrando os impostos quando não estiverem conforme prescreve o art. 14 do CTN.
Conforme já foi exposto, no Brasil, a Contabilidade é norteada por uma forte
regulamentação pelos vários órgãos do Estado, principalmente, pelas normas da
Secretaria da Receita Federal do Brasil - SRF, responsável pela arrecadação e
fiscalização dos tributos da União.
50
Essa forte presença do governo serve muito bem para caracterizar a Teoria
Normativa
e
Positiva
da
Contabilidade.
A
Teoria
Normativa
é
apoiada,
preferencialmente, no método dedutivo, faz hipóteses sobre o universo contábil, procura
prescrever como a Contabilidade deveria proceder para maximizar a utilidade da
informação para os variados tipos de usuários (LOPES; MARTINS, 2005).
Já a Teoria Positiva, ao contrário, procura descrever como a Contabilidade é.
Procura entender por que ela é, não como ela deveria ser. Neste caso, oferece uma
maior liberdade de atuação na elaboração da informação, sem estar atrelada a modelos
pré-determinados (LOPES; MARTINS, 2005).
Observa-se que em países, como nos Estados Unidos, onde a Contabilidade é
norteada segundo o que prescreve a Teoria Positiva, as práticas contábeis têm se
desenvolvido muito mais. A liberdade de atuação dos profissionais e dos pesquisadores
da Contabilidade acaba por propiciar-lhe um maior desenvolvimento e aperfeiçoamento
(LOPES; MARTINS, 2005).
Dentro desse prisma, pode-se enfatizar o desenvolvimento de duas ramificações
da Contabilidade. Uma com mais identidade na Teoria Positiva e a outra na Teoria
Normativa. Uma delas, a Contabilidade gerencial, que se caracteriza por focar nos
usuários internos e que tem ampla liberdade na elaboração dos seus relatórios para
satisfazer seus usuários com informações.
Já a Contabilidade financeira é voltada aos usuários externos, tais como o
governo, os acionistas ou sócios e os credores e é constituída dentro de modelos já
pré-determinados. Ela é orientada pelos princípios contábeis e está sujeita a obedecer
toda a normatização do governo e dos órgãos reguladores da Contabilidade. Desse
modo, ela obedece a padrões, modelos e regras estabelecidos (FREZATTI; AGUIAR;
GUERREIRO, 2007).
51
CONTABILIDADE FINANCEIRA
Usuários:
Características:
CONTABILIDADE GERENCIAL
Usuários Internos e
Externos
Usuários Internos
Objetivo
Objetivo e Subjetivo
Elaborados conforme a
Legislação e Princípios
contábeis
Elaborado conforme
necessidades gerenciais
Preparado
periodicamente
Preparado
periodicamente e quando
necessário
Figura – 2 Relações entre a contabilidade financeira e gerencial
Fonte: Autor
Desse modo, é a Contabilidade financeira, tida como a Contabilidade formal, que
subsidia as ações dos agentes do governo, nas suas tarefas de fiscalização tributária,
servindo, assim, para verificar o cumprimento pelas instituições sem fins lucrativos dos
requisitos legais exigidos para o usufruto da imunidade.
1.5.1 A Contabilidade financeira aplicável às entidades do terceiro setor
O principal objetivo da Contabilidade é fornecer informação estruturada de
natureza econômico-financeira, física, de produtividade e social relevante para que
cada usuário possa, com a segurança necessária, tomar as suas decisões e realizar
seus julgamentos (IUDÍCIBUS, 2006).
Por outro lado, o objeto da Contabilidade é o patrimônio das entidades e “[...]
suas variações quantitativas e qualitativas, é a resposta ou a forma mais inteligente,
conforme a aceitação da própria sociedade de se atingirem os objetivos” (IUDÍCIBUS;
MARTINS; CARVALHO, 2005, p. 12).
52
Assim, a comunicação das entidades entre seus usuários se faz através dos
relatórios contábeis. Segundo Costa (apud Bettiol Júnior, 2005, p.60) “[...] ao
comunicar, estamos tentando estabelecer um campo comum de experiência, transmitir
informações, idéias, trocar impressões, solucionar problemas”. Dessa forma, para o
autor o processo de comunicação pressupõe três elementos básicos:
•
Transmissor: pessoas, ou grupo de pessoas responsáveis pela transmissão da
informação, utilizando, para isso, da fala, escrita ou gestos;
•
mensagem: conjunto de sinais cujo significado é passível de interpretação,
podendo ser a palavra escrita, falada, cores, formas e os gestos;
•
receptor: pessoa ou conjunto de pessoas que recebem a informação.
Nesse sentido, na Contabilidade o processo de comunicação pode ser muito
bem representado da seguinte forma:
TRANSMISSOR
CODIFICAÇÃO
MENSAGEM
DECODICAÇÃO
RECEPTOR
FLUXO DE RETORNO DE FEEDBACK
Figura 3 – Representação gráfica do processo de comunicação
Fonte: Costa (1992, p. 55).
Destaca-se na ilustração, Figura 3, o feedback. Esse retorno é necessário em
qualquer processo de comunicação. Qualquer informação contábil repassada precisa
ser útil aos seus usuários. Para saber se uma informação é útil nada melhor do que
receber uma avaliação de quem vai utilizá-la, o seu receptor. Se houver necessidade de
adequação, ela deve ser procedida, para com isso otimizar o processo e evitar
desperdícios de tempo com a elaboração de relatórios inúteis.
Essa função, a Contabilidade cumpre perfeitamente. Daí dizer-se que ela é um
instrumento primordial na comunicação das entidades do terceiro setor com a
sociedade. Assim, ela pode exercer suas atividades com transparência, prestando
contas, demonstrando onde e como está aplicando os seus recursos.
53
O processo contábil que produz as informações, os relatórios contábeis, é
caracterizado por três fases: reconhecimento, mensuração e evidenciação. A fase do
reconhecimento é aquela em que ocorre a classificação do fato econômico dentro dos
modelos e especifica e qualifica a informação de acordo com a sua natureza.
Posterior a fase do reconhecimento, vem a fase da mensuração quando se
define como avaliar o fato, tais como, quais os critérios de avaliação na ocorrência dos
eventos, como reconhecer a receita. Já a fase de evidenciação, envolve a vocação
natural da informação contábil de demonstrar para os usuários externos como o
processo de reconhecimento e mensuração foram realizados, buscando potencializar o
processo de comunicação (LOPES; MARTINS, 2005).
Em princípio, a Contabilidade do terceiro setor adota as mesmas regras
aplicáveis a Contabilidade das sociedades comerciais, vez que, conforme se comentou
anteriormente o Código Civil brasileiro ao dispor sobre a obrigatoriedade da
contabilidade fez menção apenas ao empresário e as sociedades, deixando de lado as
fundações e as associações.
Diante dessa lacuna, as entidades do terceiro setor devem obedecer as regras
que estão estabelecidas nas Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs), que seguem
os modelos trazidos pela referida Lei. Além disso, elas devem observar requisitos
inerentes aos Princípios Fundamentais de Contabilidade (PFCs) (TORRES, 2007).
Relativamente, ao assunto, salienta-se que a NBC T 10.19 (Entidades sem
finalidade de lucros) reconhece que essas entidades são diferentes das demais e
recomendam, inclusive, a adoção de terminologias específicas para as contas de
Lucros ou Prejuízo e Capital, com a finalidade de adequação dessas terminologias ao
contexto dessas instituições.
Assim, para iniciar o processo contábil, torna-se indispensável elaborar o Plano
de contas, contendo as indicações necessárias à classificação e registro dos fatos
contábeis. Ele é composto por um elenco de contas, contendo a relação ordenada e
codificada de todas as contas utilizadas pela entidade. De forma vinculada, deve ser
elaborado um manual com a função e o funcionamento de cada uma dessas contas,
tornando-se um guia de procedimentos de classificação contábil para as organizações
(ARAÚJO, 2006).
54
ATIVO
ATIVO CIRCULANTE
DISPONÍVEL
Caixa
Bancos Conta Movimento
Aplicações de Liquidez Imediata
OUTROS CRÉDITOS
Adiantamentos de Salários
Adiantamentos de Férias
ESTOQUES
Almoxarifado
ATIVO REALIZÁVEL A LONGO PRAZO
Duplicatas a Receber
ATIVO PERMANENTE
IMOBILIZADO
Terrenos
Prédios
Máquinas e Equipamentos
PASSIVO
PASSIVO CIRCULANTE
Fornecedores
Financiamentos
Obrigações Fiscais e Trabalhistas
Salários a Pagar
Provisões Trabalhistas
Contas a Pagar
PASSIVO EXIGÍVEL A LONGO PRAZO
Financiamentos
RESULTADO DE EXERCÍCIOS FUTUROS
Receita de Mensalidades Antecipadas
PATRIMÔNIO SOCIAL
PATRIMÔNIO SOCIAL
Patrimônio Social
Doações de Pessoas Físicas
Doações de Pessoas Jurídicas
Superávit/Déficit do Exercício
Móveis e Utensílios
Veículos
Depreciação Acumulada
Quadro 4 - Modelo sintético de plano de contas para instituições do terceiro setor – Ativo e Passivo
Fonte: Araújo, 2006
DESPESAS E CUSTOS
DEDUÇÃO DAS RECEITAS
COFINS
ICMS
PIS
CUSTOS DE SERVIÇOS PRESTADOS
Custos de Serviços Prestados
DESPESAS OPERACIONAIS
DESPESAS DE VENDAS
RECEITAS
RECEITA BRUTA OPERACIONAL
RECEITA COM VENDA DE SERVIÇOS
Receitas de Mensalidades
RECEITAS FINANCEIRAS
Rendimento de Apli. Financeiras
RECEITA DE DOAÇÕES
Receita de Doações PJ
Receita de Doações PF
DESPESAS ADMINISTRATIVAS
DESPESAS FINANCEIRAS
Quadro 5 - Modelo sintético de plano de contas para instituições do terceiro setor – Parte das Receitas e
Despesas
Fonte: Araújo, 2006
Em seus aspectos fundamentais, como já foi exposto, a Contabilidade de uma
instituição sem fins lucrativos não difere da Contabilidade das outras, principalmente,
55
quando se trata da técnica de registro baseada no método do débito e crédito
(ARAÚJO, 2006). Pode-se, assim, sugerir um modelo de plano de contas sem grandes
alterações em relação ao que é adotado pelas empresas em geral, conforme disposição
nos quadros 4 e 5:
Documentação
Contábil
Conferência e
Classificação
Registro
Diário
Livros Fiscais e
Societários
Razão
Cálculo dos Impostos
Relatórios Gerenciais
Fluxo de Caixa
Análise Econômica e
Financeira
Balancete
Demonstrações
Contábeis
Critério de Avaliação
USUÁRIOS
(Internos e Externos)
Figura 4 – Sistema de informações contábeis
Fonte: Peyon, (2004)
A Figura 4 retrata o sistema de informações contábeis. Seus principais
elementos são: documentação contábil, compreendendo todos os livros fiscais, papéis
e outras peças que compõem a escrituração, comprovando os fatos que originam os
lançamentos contábeis; registro, que é o ato descrever através dos lançamentos
56
contábeis os fatos da entidade no livro Diário; Diário, livro onde se consignam os
registros contábeis da entidade; razão, livro permanente que registra a movimentação
ocorrida, individualmente, em cada conta, evidenciando a qualquer momento os saldos
das contas; balancete, é a relação das contas com os seus respectivos saldos, extraída
dos registros contábeis em determinada data; as demonstrações contábeis, são os
relatórios sintéticos produzidos a partir dos dados acumulados na escrituração, são a
base da informação contábil; livros fiscais e os cálculos dos impostos, servem para
atender as obrigações das fazendas públicas, têm o condão de facilitar a comunicação
com esses órgão; critérios de avaliação, significa a tarefa que a Contabilidade tem de
selecionar e definir os métodos de valorização dos eventos, os fatos contábeis; os
relatórios gerenciais, como já exposto, servem para atender a administração nas suas
tarefas de gestão; análise econômica e financeira, técnica contábil que consiste na
decomposição, comparação e interpretação das demonstrações contábeis.
Normatizando a Contabilidade, temos as NBCs, que estabelecem regras de
conduta profissional e procedimentos técnicos a serem observados quando da
realização dos trabalhos contábeis, em consonância com os PFCs, classificando-se em
Normas Profissionais (NBCPs) e Normas Técnicas (NBCTs). Tudo isso decorre de
imposição do Conselho Federal de Contabilidade – CFC, órgão de classe responsável
por regulamentar e fiscalizar a atividade de Contabilidade no Brasil.
As primeiras, as NBCPs, estabelecem regras de exercício profissional enquanto
que as segundas, as NBCTs estabelecem conceitos doutrinários, regras e
procedimentos aplicados de Contabilidade
A seguir, apresenta-se a cronologia da legislação contábil editada pelo CFC para
as entidades sem fins lucrativos. Essas normas são a base do processo contábil dessas
instituições:
28/10/1983 - Resolução CFC N° 563 - NBC T 2.1 - Das Formalidades da
Escrituração contábil.
14/06/1985 - Resolução CFC N° 597 - NBC T 2.2 - Da Documentação contábil.
14/12/1990 - Resolução CFC N° 686 - NBC T 3 - Conceito, Conteúdo, Estrutura
e Nomenclatura das Demonstrações Contábeis.
57
28/07/1995 - Resolução CFC N° 785 - NBC T 1 - Das características da
Informação Contábil.
22/02/1999 - Resolução CFC N° 837 – NBC T 10 - Dos Aspectos Contábeis
Específicos em Entidades Diversas. Item NBC T 10.4 – Fundações.
18/04/2000 - Resolução CFC N° 877 - NBC T 10 - Dos Aspectos Contábeis
Específicos em Entidades Diversas. Item NBC T 10.19 - Entidades Sem Finalidade de
Lucros.
15/04/2005 - Resolução CFC N° 1026 - NBC T 19.4 - Incentivos Fiscais,
Subvenções, Contribuições, Auxílios e Doações Governamentais.
Dentre estas, destaca-se a NBC T-2 que trata da escrituração contábil,
formalidades,
documentação,
temporalidade
dos
documentos,
retificação
de
lançamentos, entre outros.
A NBC T 2.1 define as formalidades da escrituração contábil de observância
obrigatória por todas as entidades, seja as com fins, ou sem fins lucrativos. Em função
da sua importância na consecução da Contabilidade de qualquer instituição, cabe
transcrever seus principais itens:
2.1.1 – A Entidade deve manter um sistema de escrituração uniforme dos seus
atos e fatos administrativos, através de processo manual, mecanizado ou
eletrônico.
2.1.2 – A escrituração será executada:
a) em idioma e moeda corrente nacionais;
b)em forma contábil;
c)em ordem cronológica de dia, mês e ano;
d)com ausência de espaços em branco, entrelinhas, borrões, rasuras,
emendas ou transportes para as margens;
e)com base em documentos de origem externa ou interna ou, na sua falta, em
elementos que comprovem ou evidenciem fatos e a prática de atos
administrativos.
2.1.2.1 – A terminologia utilizada deve expressar o verdadeiro significado das
transações.
2.1.2.2 – Admite-se o uso de códigos e/ou abreviaturas, nos históricos dos
lançamentos, desde que permanentes e uniformes, devendo constar, em
elenco identificador, no “Diário” ou em registro especial revestido das
formalidades extrínsecas.
2.1.3 – A escrituração contábil e a emissão de relatórios, peças, análises e
mapas demonstrativos e demonstrações contábeis são de atribuição e
responsabilidade exclusivas do Contabilista legalmente habilitado.
O item 2.1.4 da referida norma, NBC T 2.1 trata da obrigação de transcrever no
livro diário os relatórios contábeis, as Demonstrações Contábeis, fornecendo com isso
58
um aspecto normativo quanto à concretização da função da Contabilidade de
disponibilizar a informação aos seus usuários:
2.1.4 – O Balanço e demais Demonstrações Contábeis, de encerramento de
exercício serão transcritos no “Diário”, completando-se com as assinaturas do
Contabilista e do titular ou de representante legal da Entidade. Igual
procedimento será adotado quanto às Demonstrações Contábeis, elaboradas
por força de disposições legais, contratuais ou estatutárias.
Já o item 2.1.5 trata de fornecer formalismos aos livros Diário e Razão, atribuindo
regras que obrigatoriamente dever ser respeitada quando da elaboração da
Contabilidade:
2.1.5 – O “Diário” e o “Razão” constituem os registros permanentes da
Entidade.
Os registros auxiliares, quando adotados, devem obedecer aos preceitos
gerais da escrituração contábil, observadas as peculiaridades da sua função.
No “Diário” serão lançadas, em ordem cronológica, com individuação, clareza e
referência ao documento probante, todas as operações ocorridas, incluídas as
de natureza aleatória, e quaisquer outros fatos que provoquem variações
patrimoniais.
2.1.5.1 – Observado o disposto no caput, admite-se:
a)
a escrituração do “Diário” por meio de partidas mensais;
b)
a escrituração resumida ou sintética do “Diário”, com valores totais que
não excedam a operações de um mês, desde que haja escrituração analítica
lançada em registros auxiliares.
2.1.5.2 – Quando o “Diário” e o “Razão” forem feitos por processo que utilize
fichas ou folhas soltas, deverá ser adotado o registro “Balancetes Diários e
Balanços”.
2.1.5.3 – No caso de a Entidade adotar para sua escrituração contábil o
processo eletrônico, os formulários contínuos, numerados mecânica ou
tipograficamente, serão destacados e encadernados em forma de livro.
2.1.5.4 – O livro Diário será registrado no Registro Público competente, de
acordo com a legislação vigente.
Como se observa, a NBC T 2.1 detalha todas as formalidades que devem ser
observadas, quando da elaboração da escrituração contábil pelas organizações. Tudo
que está prescrito é para prover aos usuários com informações contábeis seguras.
Como ficou estabelecido na norma, depreenderam-se as seguintes conclusões:
a) a escrituração contábil deve ser elaborada por profissional da Contabilidade
habilitado, devidamente, regular com o conselho de classe;
b) o livro diário é obrigatório por ser exigido para todas as entidades. É principal
pois registra todos os fatos contábeis. Deve ser cronológico e deve respeitar uma
escrita padrão e uniforme;
59
c) o livro diário admite lançamento por partidas mensais, ou seja, podem-se
consolidar várias ocorrências de uma mesma natureza, de um mesmo mês, em um só
registro contábil, desde que a entidade tenha registros auxiliares que detalhem os
dados totalizados;
d) as demonstrações contábeis devem ser transcritas no livro diário.
Outra importante NBC para a atividade das entidades do terceiro setor é a que
trata de documentação contábil. Isso porque os dados que alimentam o sistema
contábil provêem daquilo que está retratado nos documentos da entidade.
Assim
prescreve a NBC T 2.2:
2.2.1 – A Documentação Contábil compreende todos os documentos,
livros,papéis, registros e outras peças, que apóiam ou compõem a escrituração
contábil.
2.2.1.1 – Documento contábil, estrito-senso, é aquele que comprova os atos e
fatos que originam lançamento (s) na escrituração contábil da Entidade.
2.2.2 – A Documentação Contábil é hábil, quando revestida das características
intrínsecas ou extrínsecas essenciais, definidas na legislação, na técnicacontábil ou aceitas pelos "usos e costumes".
2.2.3 – A Documentação Contábil pode ser de origem interna quando gerada
na própria Entidade, ou externa quando proveniente de terceiros.
2.2.4 – A Entidade é obrigada a manter em boa ordem a documentação
contábil.
Desse modo, documentos contábeis são todos aqueles que servem de base
para a escrituração contábil. São exemplos: os comprovantes de receitas e despesas,
as notas fiscais, os livros fiscais, os recibos, as folhas de pagamento, as cópias de
cheques, os depósitos bancários, entre outros.
Para as entidades do terceiro setor, a documentação contábil é de grande
relevância porque para receber recursos e incentivos do governo, para ser fomentada
pela sociedade, ela precisa ter os elementos de comprovação da correta aplicação de
recursos. Decerto, os documentos dão fidedignidade aos relatórios contábeis, servindo,
assim, para oferecer segurança, tanto para os gestores como para os que
acompanham e fiscalizam a instituição. Até porque é através dos documentos que se
vai possibilitar a descoberta de fraudes ou os desvios de recursos.
Como já explicitado, além das normas específicas aplicáveis ao setor, as
entidades sem fins lucrativos estão sujeitas a obedecerem aos Princípios Fundamentais
de Contabilidade.
60
Nos ensinamentos de Iudícibus e Marion (2000, p. 89), os Princípios
Fundamentais da Contabilidade são “[...] os conceitos básicos que constituem um
núcleo essencial que deve guiar a profissão da consecução dos objetivos da
Contabilidade”. Os princípios visam ao tratamento contábil uniforme dos atos e fatos
administrativos e das demonstrações dele decorrentes.
Neste sentido, ressalta-se a Resolução n. 750, de 29/12/83, do CFC, que dispõe
sobre os Princípios Fundamentais de Contabilidade no Brasil, determinando a todos os
profissionais do ramo contábil a sua observância, constituindo condição de legitimidade
das NBCs.
O art. 3.º da referida resolução do CFC enumera como Princípios fundamentais
de Contabilidade: a da entidade, da continuidade, da oportunidade, do registro pelo
valor original, da atualização monetária, da competência e da prudência.
Cabe destacar a importância de três desses princípios para as entidades sem
fins lucrativos: o da entidade, o da oportunidade e o da competência. Isso porque dado
o caráter social das suas atividades, ganha importância a função controle que a
Contabilidade exerce sobre o patrimônio dessas instituições. Os referidos princípios
estão dispostos nos artigos 4º, 6º e 9º da Resolução CFC n. 750/83:
Art. 4º - O Princípio da ENTIDADE reconhece o Patrimônio como objeto da
Contabilidade e afirma a autonomia patrimonial, a necessidade da
diferenciação de um Patrimônio particular no universo dos patrimônios
existentes, independentemente de pertencer a uma pessoa, um conjunto de
pessoas, uma sociedade ou instituição de qualquer natureza ou finalidade, com
ou sem fins lucrativos. Por conseqüência, nesta acepção, o Patrimônio não se
confunde com aqueles dos seus sócios ou proprietários, no caso de sociedade
ou instituição.
[...]
Art. 6 O princípio da OPORTUNIDADE refere-se, simultaneamente, à
tempestividade e a integridade do registro do patrimônio e das suas mutações,
determinando que este seja feito de imediato e com a extensão correta,
independentemente das causas que as originaram.
[...]
O PRINCÍPIO DA COMPETÊNCIA
Art. 9º As receitas e as despesas devem ser incluídas na apuração do
resultado do período em que ocorrerem, sempre simultaneamente quando se
correlacionarem, independentemente de recebimento ou pagamento.
O princípio da entidade impõe que a Contabilidade deve considerar o patrimônio
da entidade como distinto do patrimônio dos sócios que a compõe. Desse modo, o
61
patrimônio das instituições sem fins lucrativos não deve se confundir com o patrimônio
de seus instituidores ou com o de seus dirigentes (BETTIOL JÚNIOR, 2005).
No estreito relacionamento do gestor com a entidade sem fins lucrativos, ele
deve tomar todo o cuidado em observar a separação do seu patrimônio daquele que é o
da instituição. A Contabilidade deve ser orientada a observar essa distinção, mas não
deve omitir no registro contábil se ela ocorrer. No caso das instituições sem fins
lucrativos, a utilização indevida do patrimônio pelos sócios e dirigentes vai
descaracterizá-la como instituição sem fins lucrativos e caracterizá-la como empresa,
com finalidade lucrativa, não estando ela mais sujeita a gozar da imunidade tributária.
Em se tratando do Princípio da Oportunidade, também é de fundamental
importância, em razão de preocupar-se com a matéria relativa ao registro contábil e as
características precisas das dimensionalidades relativas aos diversos fatos patrimoniais
tais como, tempo, causam qualidade e quantidade (SÁ,1995). Ressalta-se que para
efeito desse princípio, tempestividade não está associada à temporalidade, pois mesmo
no campo tecnológico tais expressões significam coisas distintas.
Assim, a tempestividade diz respeito à oportunidade do registro, ou seja,
escriturá-lo no momento em que ocorre ou em que é percebido, enquanto que
temporalidade é o limite de tempo que regula a ocorrência do fenômeno patrimonial.
Assim, a tempestividade não deve ser confundida com os tempos dos fenômenos, pois,
muitas vezes, um fato registrado em um tempo, pode não ser mais pertinente para
efeitos de apurações e de outros gêneros de considerações.
Nesse sentido Sá (1995), afirma que o fato de haver-se realizado um registro em
determinada data não significa que ele pertença àquele exercício nem que o exercício é
competente para apurar-se o resultado. Portanto, tempestividade se refere à exigência
de que o registro do fato contábil seja realizado tão logo ocorra e não no tempo
oportuno.
Tratando-se da integridade do registro do patrimônio, contabilmente essa
expressão diz respeito a dimensionalidade plena e fiel do fenômeno patrimonial, ficando
implícito no conceito a condição de sinceridade, o que significa dizer que não basta
considerar o fato no tempo, sendo necessário que se faça com propriedade ou
adequação. Dessa forma, a integridade diz respeito à necessidade de as variações
62
serem reconhecidas na sua totalidade, isto é, sem qualquer falta ou excesso (SÁ,
1995).
Já o princípio da competência trata dos aspectos das variações patrimoniais no
que diz respeito à confrontação das despesas com as receitas e ao seu
reconhecimento, a partir do período de sua geração, independentemente, de
recebimentos e pagamentos, ou das diminuições ou aumentos do Patrimônio Líquido
da entidade.
Ao apurar os resultados de um exercício, devem ser observadas as realizações
das despesas e das receitas. As entidades devem observar se as transações ocorridas
em sua atividade operacional estão sendo registradas e reconhecidas no momento de
sua ocorrência.
Além disso, todos os recebimentos a título de doações, subvenções (subsídio
feito pelo Estado) e contribuições para custeio, devem ser registrados em conta de
receitas. As receitas e despesas devem ser registradas de forma segregada e
seccionadas de acordo com os tipos de atividades, como educação, alimentação e
saúde. Quando houver receitas com aplicabilidade específica, devem ser registradas
em contas correspondentes, que identifiquem a natureza de tais valores.
Por outro lado, ao fim de cada exercício, sendo apurados os resultados, a conta
Superávit ou Déficit receberá esses valores, a débito ou a crédito, dependendo dos
resultados positivos ou negativos, para serem apresentados aos associados para
aprovação. Em seguida, registrados na conta do Patrimônio Social.
1.5.2 Demonstrações Contábeis
A estrutura conceitual oferecida pelo CFC contribui para a confiabilidade das
informações divulgadas, pois, assim, elas são elaboradas de acordo com os critérios e
normas previamente e claramente definidos, o que permite a comparação econômicofinanceira entre entidades diferentes, ou até da mesma entidade, em momentos
distintos.
63
Nesse sentido, houve mais uma importante colaboração do CFC ao disciplinar as
qualidades da informação contábil através da Resolução n.º 785, de 28/07/1995. Assim
dispõe o seu item 1.3:
1.3 – DOS ATRIBUTOS DA INFORMAÇÃO CONTÁBIL
1.3.1 – A informação contábil deve ser, em geral e antes de tudo, veraz e
eqüitativa, de forma a satisfazer as necessidades comuns a um grande número
de diferentes usuários, não podendo privilegiar deliberadamente a nenhum
deles, considerado o fato de que os interesses destes nem sempre são
coincidentes.
1.3.2 – A informação contábil, em especial aquela contida nas demonstrações
contábeis, notadamente as previstas em legislação, deve propiciar revelação
suficiente sobre a entidade, de modo a facilitar a concretização dos propósitos
do usuário, revestindo-se de atributos, entre os quais, são indispensáveis os
seguintes:
- confiabilidade;
- tempestividade;
- compreensibilidade; e
- comparabilidade.
A confiabilidade é a qualidade que faz com que os usuários aceitem a
informação para as suas avaliações e tomada de decisões. Segundo os ensinamentos
de Iudíbus (2006, p. 85), para serem confiáveis, as informações contábeis “além de sua
Integralidade ou completeza, devem ser baseadas nos Princípios Fundamentais de
Contabilidade [...] e, em geral, nos preceitos da doutrina contábil”.
A tempestividade diz respeito ao tempo hábil em que a informação deve ser
disponibilizada. A demora na elaboração e divulgação dos relatórios contábeis pode
prejudicar o processo de avaliação e decisão por parte dos usuários. Por ser
informação útil para a sociedade, a informação das instituições sem fins lucrativos deve
ser elaborada e divulgada de forma rápida (IUDÍBUS, 2006).
A compreensibilidade está centrada na qualidade da informação contábil. Ela
dever ser exporta, divulgada da forma mais compreensível possível, para que
efetivamente se possa entendê-la e utilizá-la, pois a sua função é bem informar seus
usuários (IUDÍCIBUS, 2006).
Já a comparabilidade é relativa à viabilidade que pode ser oferecida de comparar
a informação contábil da entidade, demonstrando a sua evolução no decorrer do tempo,
ou até mesmo a sua confrontação com os dados de outras organizações. Essa
comparação é possível devido ao padrão em que é elaborada a informação contábil,
64
em que há o respeito à uniformidade e a consistência no processo de mensurar os
eventos na identificação dos eventos. (HENDRIKSEN; BREDA,1999).
As informações das organizações são disponibilizadas e divulgadas através das
demonstrações contábeis. Conforme já mencionamos, as entidades do terceiro setor
utilizam as mesmas estruturas previstas na lei n.º 6.404/76, Lei aplicável às sociedades
anônimas. O CFC, através da NBC T 3, Resolução n.º 686, de 14/12/1990, aprovou o
conteúdo, a estrutura e a nomenclatura das Demonstrações Contábeis, critérios que
devem ser observadas por todas entidades. Todavia, as entidades sem fins lucrativos
devem observar as especificadas a Contabilidade desse setor pela NBC T 10.19.
Não há a obrigação para as Associações de adotar todas as demonstrações
contábeis, mas para, suficientemente, comunicar seus usuários elas deveriam ser
elaboradas. Importante ressaltar, que, uma vez elaboradas, elas devem respeitar as
orientações fornecidas pela NBC T 3, Resolução n.º 686.
As demonstrações previstas na referida Resolução são: o Balanço Patrimonial, a
Demonstração do Resultado do Exercício, a Demonstração de Lucros ou Prejuízos
Acumulados, a Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido e, por fim, a
Demonstração das Origens e aplicações de Recursos.
Balanço Patrimonial (BP) – O BP é a representação patrimonial e financeira de
uma organização, em uma determinada data, contendo as contas patrimoniais, de
caráter permanente, classificadas em grupos por ordem de liquidez. São três os seus
elementos: Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido. No Ativo estão apresentados todos os
bens e direitos da entidade, retratando as aplicações dos recursos. No Passivo estão as
suas obrigações, os capitais de terceiros, retratando as origens de recursos. O
Patrimônio Líquido é o capital próprio da organização. Por convenção, o Ativo é alocado
no lado direito e o Passivo e o Patrimônio Líquido do lado esquerdo:
BALANÇO PATRIMONIAL
ATIVO
PASSIVO
Obrigações
Bens e Direitos
PATRIMÔNIO LÍQUIDO
Capital Próprio
Quadro n.º 6 – Representação do Balanço Patrimonial
Fonte: Autor
65
O Balanço é distribuído entre esses três elementos. O Ativo é subdividido em
Ativo Circulante, que compreende os ativos de curto prazo; o Ativo Realizável a Longo
Prazo, que compreende os ativos de longo prazo; e o Ativo Permanente, que se
compõe em Investimentos, Imobilizado e Diferido.
Já o Passivo é subdivido em Passivo Circulante, em que estão dispostas as
obrigações de curto prazo, e Exigível a Longo Prazo, onde são estruturadas as dívidas
que não forem de curto prazo.
O Patrimônio Líquido é composto do Capital Social, dos Lucros ou Prejuízos
Acumulados e das Reservas, quando sociedade comercial. Quando entidade sem fins
lucrativos o Patrimônio Líquido, por força do que dispõe o item 3.2 da NBC T 10.19, e
em função da destinação social da entidade, a denominação do Capital Social passa a
ser Patrimônio Social e os Lucros ou Prejuízos Acumulados passa a Superávit ou
Déficit do Exercício, conforme demonstrado na figura e quadros a seguir:
ENTIDADES COM FINS
LUCRATIVOS
ENTIDADES SEM FINS
LUCRATIVOS
Patrimônio Líquido
Patrimônio Líquido
Capital Social
Patrimônio Social
Lucros ou Prejuízos Acumulados
Superávit ou Déficit do
Exercício
Figura 5 – Denominações do patrimônio das entidades sem fins lucrativos
Fonte: Fonte: Camargo e Leite (p. 191, 2005)
66
ATIVO
2006
2007 PASSIVO
Circulante
Circulante
Realizável a Longo Prazo
Exigível a Longo Prazo
Permanente
Patrimônio Líquido
2006
2007
Patrimônio Social
Superávit/Déficit do Exercício
Total do Ativo
Total do Passivo
Quadro 7 – Modelo sintético de um balanço patrimonial para entidades sem fins lucrativos
Fonte: Camargo e Leite (p. 191, 2005)
Deve-se ressaltar que, enquanto nas empresas o Balanço Patrimonial o
componente Patrimônio Líquido demonstra os valores pertencentes aos sócios, aos
empresários, nas entidades do terceiro setor o patrimônio líquido representa “[...] a
capacidade que a entidade tem de manter-se no mercado, oferecendo seus serviços à
comunidade, com eficiência e qualidade sem, contudo, comprometer sua continuidade”
(NASCIMENTO; OLAK, 2000, p. 5).
Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) - A DRE é a representação
resumida das operações realizadas pela entidade durante o exercício social,
demonstrada de forma a destacar o resultado líquido do período, relacionando e
especificando todas as despesas (aplicação de recursos) e todas as receitas (origens
de recursos).
Nas Associações sem Fins Lucrativos, por força das especificadas trazidas pela
NBC T 10.19, o Lucro ou Prejuízo na DRE passa a ser denominado de Superávit ou
Déficit, em função da natureza do resultado dessas entidades. Nessa configuração as
estruturas passam a ter as seguintes denominações:
67
ENTIDADES COM FINS
LUCRATIVOS
ENTIDADES SEM FINS
LUCRATIVOS
Demonstração do Resultado do
Demonstração do Resultado do
Exercício
Exercício
Lucro ou Prejuízo do Exercício
Superávit ou Déficit do
Exercício
Figura 6 – Denominações do resultado das entidades sem fins lucrativos
Fonte: Camargo e Leite (p. 192, 2005)
Demonstração do Resultado do Exercício
2006
Receita Operacional Bruta
Receita de Serviços A
Receita de Serviços B
Receita Operacional Líquida
(-) Custos Operacionais
(-) Despesas Administrativas
(-) Despesas Financeiras
Superávit/Déficit Operacional
(+) Subvenções
Federal
Estadual
Municipal
(+) Doações
Pessoas Jurídicas
Pessoas Físicas
Superávit/Déficit do Exercício
Quadro 8 – Modelo sintético de uma DRE de uma entidade sem fins lucrativos
Fonte: Camargo e Leite (p. 192, 2005)
2007
68
Assim, a DRE comunica qual o resultado, receitas menos despesas, que uma
organização obteve durante um período refletindo o empenho dos gestores na
utilização dos recursos de uma entidade. No caso em estudo, a descrição das
despesas serve para identificar se todos os gastos em despesas estão relacionados a
finalidade educação.
Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL) - A DMPL evidencia
as alterações do Patrimônio Social em termos globais, demonstrando as mutações
internas, como as transferências de valores de Superávit do Exercício para as contas
de Reservas. A intenção dessa demonstração é explicitar como os saldos das contas
do patrimônio de uma entidade se alteram durante um determinando exercício.
Demonstração das Mutuções do
Patrimônio Líquido
Patrimônio
Social
Superávit/Déficit
do Exercício
Patrimônio
Social
Saldo em 31 de dezembro de 2003
(+/-) Variações
Saldo em 31 de dezembro de 2004
(+/-) Variações
Saldo em 31 de dezembro de 2005
Variações no Capital Circulante Líquido
Quadro 9 – Modelo sintético de uma DMPS de uma entidade sem fins lucrativos
Fonte: Camargo e Leite (p. 192, 2005)
Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos (DOAR) – Esse relatório
tem como objetivo principal demonstrar as fontes dos seus recursos e a forma de
aplicação de recursos obtidos por uma entidade, durante o processo de manutenção de
suas atividades operacionais.
Segundo Iudícibus et al.(2003, p. 31), a DOAR [...] procura evidenciar as origens
de recursos que ampliam a folga financeira de curto prazo e as aplicações de recursos
que consomem essa folga”. Assim, a divulgação das variações ocorridas no Capital
Circulante Líquido - CCL (ativo circulante – passivo circulante), de um período para o
outro, também se apresenta como uma finalidade dessa demonstração.
Para as entidades sem fins lucrativos, essa demonstração ganha importância,
uma vez que um dos requisitos obrigatórios para a manutenção desse benefício é a
69
aplicação de seus recursos em seus objetivos institucionais. E esse relatório contábil
atende perfeitamente essa finalidade.
Demonstração das Origens e aplicações de recursos
2006
Origens de recursos
Das próprias operações
De terceiros
Total das origens de recursos
Aplicações de recursos
Aquisições de imobilizado
Adições ao realizável a longo prazo
Total das aplicações de recursos
Variações no capital circulante líquido
Ativo circulante no início do exercício
Ativo circulante no final do exercício
Variação
Passivo circulante no início do exercício
Passivo circulante no início do exercício
Variação
Aumento ou redução no capital circulante líquido
Quadro 10 – Modelo sintético de uma DOAR de uma entidade sem fins lucrativos
Fonte: Camargo e Leite (p. 193, 2005)
2007
Notas Explicativas (NEs) - As NE’s servem para esclarecer alguns elementos das
demonstrações contábeis que necessitam de maior detalhamento para o suficiente
esclarecimento do usuário externo. Desse modo, elas devem evidenciar os critérios de
avaliação patrimonial, as práticas contábeis adotadas, os ajustes referentes aos
exercícios anteriores, as reavaliações, os detalhamentos das dívidas de longo prazo, os
eventos subseqüentes importantes ocorridos após a data do balanço, entre outros.
No caso das entidades sem fins lucrativos é a NBC T 10.19 que orienta o que as
demonstrações contábeis devem esclarecer através das notas explicativas:
a) o resumo das principais práticas contábeis;
b) os critérios de apuração das receitas e das despesas, especialmente com
gratuidades, doações, subvenções, contribuições e aplicações de recursos;
c) as contribuições previdenciárias, relacionadas com a atividade assistencial
devem ser demonstradas como se a entidade não gozasse de isenção,
conforme normas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS);
d) as subvenções recebidas pela entidade, a aplicação dos recursos e as
responsabilidades decorrentes dessas subvenções;
e) os fundos de aplicação restrita e as responsabilidades decorrentes
desses fundos;
f) evidenciação dos recursos sujeitos a restrições ou vinculações por parte do
doador;
70
g) eventos subseqüentes à data do encerramento do exercício que tenham, ou
possa vir a ter, efeito relevante sobre a situação financeira e os resultados
futuros da entidade;
h) as taxas de juros, as datas de vencimento e as garantias das obrigações a
longo prazo;
As notas explicativas são excelentes fontes de informação daqueles eventos que
não têm como serem detalhados nas demonstrações contábeis. Elas podem explicitar,
por exemplo, os detalhes dos processos subvenções e doações que fomentam as
entidades.
Dentre as doações, existem aquelas que trazem consigo cláusula de condição,
ou seja, o doador disponibiliza o recurso desde que sejam atendidas certas condições.
Tais informações devem ser evidenciadas em nota explicativa específica, para que,
com isso, possibilite acompanhamento das variações nestes itens do patrimônio da
entidade.
Pelo que está disposto na NBC T 10.19, observa-se uma forte preocupação em
evidenciar os recursos destinados às instituições na forma de gratuidade, em doações,
subvenções, ou, para resumir, o fomento em geral. Destaque-se que as entidades
devem demonstrar os benefícios fiscais recebidos do governo, seja em forma de
isenção, seja em forma de imunidade.
1.6 Auditoria contábil
Conforme mencionado, as entidades sem fins lucrativos que usufruem a
imunidade tributária estão obrigadas a escrituração contábil, por imposição do art. 14 do
CTN. Por outro lado, na elaboração da Contabilidade, as entidades devem obediência
ao que prescreve as NBCs.
Desse modo, a escrituração contábil das entidades encerra-se ao final de cada
exercício, quando há a elaboração das peças contábeis abaixo, que são transcritas no
livro Diário:
a) Balanço Patrimonial;
b) Demonstração de Resultado do Exercício;
c) Demonstração de Lucros ou Prejuízos Acumulados;
71
d) Demonstração de Origens e Aplicações de Recursos;
e) Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido.
Por outro lado, o CTN, quando trata da escrituração, estabelece em seu art. 195
que todos os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal, bem como os
comprovantes de lançamentos neles efetuados, sejam conservados em boa ordem até
que prescrevam as obrigações tributárias.
Isso é o reconhecimento da necessidade e da importância que os livros e
documentos contábeis representam para a sociedade. Isso se potencializa quando o
assunto é o controle social de entidades do terceiro setor. Nesse contexto, afirma
Fazzio Júnior (2003, p.72):
A escrituração é a radiografia da empresa. Por isso, a lei impõe ao empresário
o dever de manter a escrituração em ordem. É de seu próprio interesse, seja
para atender os ditames legais, seja para propiciar a fiscalização tributária, seja
para eventualidade de fazer prova em juízo.
Decerto que a Contabilidade é um importante meio de controle fisco-tributário.
Carrazza (2001, p.437) ao tratar da Contabilidade, ele a referencia como o principal
instrumento de controle, que auxilia o Estado nas suas tarefas de arrecadar os e
fiscalizar os tributos:
Os deveres instrumentais tributários são, (...), relações jurídicas, de conteúdo
não-patrimonial, que têm por objetos um fazer (‘facere’), um não-fazer (‘non
facere’) ou um suportar (‘patere’), sempre no interesse da Administração
Tributária.
Tais deveres só podem ser criados por meio de lei (editada pela pessoa
política tributante) e visam a controlar a correta arrecadação dos tributos –
impende dizer, assegurar o perfeito cumprimento das obrigações consistentes
na entrega de dinheiro ao Fisco.
Assim, é a Contabilidade que serve para comprovar a regularidade fiscal das
associações sem fins lucrativos. Para assegurarem de que estão cumprindo
satisfatoriamente as obrigações legais e fiscais, as entidades do terceiro setor devem
se utilizar da auditoria contábil. Isso vai preveni-las quanto à detecção de possíveis
irregularidades quando das auditorias tributárias pelos agentes do governo.
A auditoria é a técnica contábil utilizada para avaliar a informação contábil e é
complemento indispensável para que a Contabilidade atinja, plenamente, a sua
finalidade. A auditoria compreende o exame de documentos, livros e registros,
72
inspeções e confirmações, internas e externas, relacionados com o controle do
patrimônio, objetivando mensurar a exatidão desses registros e das demonstrações
contábeis dele decorrentes.
Manter registros contábeis, além de ser obrigatório pela legislação fiscal, é de
real interesse para que se possa acompanhar a evolução patrimonial de qualquer
organização. Será através da auditoria, usando suas técnicas e procedimentos, que os
registros contábeis, bem como as demonstrações financeiras deles emanadas, serão
validados quanto à observância nas NBCs e dos Princípios Fundamentais da
Contabilidade. Franco e Marra (2001, p.28) definem a auditoria como:
A técnica contábil que – através de procedimentos específicos que lhe são
peculiares, aplicados no exame de registros e documentos, inspeções e na
obtenção de informações e confirmações, relacionados com o controle do
patrimônio de uma entidade - objetiva obter elementos de convicção que
permitam julgar se os registros contábeis foram efetuados de acordo com os
princípios fundamentais e as normas de Contabilidade e se as demonstrações
contábeis deles decorrentes refletem adequadamente a situação econômicofinanceira do patrimônio, os resultados do período administrativo examinado e
as demais situações nelas demonstradas.
Para Attie (1998, p.25) “[...] a auditoria é uma especialização contábil voltada a
testar a eficiência e eficácia do controle patrimonial implantado com o objetivo de
expressar uma opinião sobre determinado dado”. Sá (2002, p.25), após analisar
diversos conceitos emitidos por ilustres estudiosos internacionais, apresenta a sua
definição:
Auditoria é uma tecnologia contábil aplicada ao sistemático exame dos
registros, demonstrações e de quaisquer informes ou elementos de
consideração contábil, visando apresentar opiniões, conclusões, críticas e
orientações sobre situações ou fenômenos patrimoniais da riqueza aziendal,
pública ou privada, quer ocorridos, quer por ocorrer ou prospectados e
diagnosticados.
Franco e Marra (2001) relacionam as técnicas de auditoria, que segundo eles
são: a confirmação externa (circularização); a inspeção física; a contagem dos itens
físicos; o exame, ou obtenção, de comprovantes autênticos; a revisão profunda dos
critérios de avaliação e exame de sua conformidade como as normas e princípios
73
contábeis; o exame de registros auxiliares e fiscais e sua repercussão nos registros
contábeis; correlação das informações obtidas.
A técnica confirmação externa (circularização) é um dos procedimentos mais
eficientes no trabalho de auditoria. Confrontar e confirmar um registro de uma entidade
com o de outra dá uma enorme segurança de que todas de que a integridade de
lançamento está sendo operacionalizada. Esse processo pode ser muito bem
aproveitado nas confirmações de registros das operações com clientes e fornecedores.
A inspeção física e a contagem de itens físicos são procedimentos básicos
que servem para confirmar a fidedignidade dos totais de itens do ativo, como por
exemplo, o estoque, com os saldos apresentados nos balancetes e balanços.
No exame dos documentos originais ou obtenção de comprovantes
autênticos são analisados os documentos originais que validam o lançamento contábil,
o estoque, a aquisição de bens, a venda de mercadorias, dentre outros itens. Ao
examinar os documentos originais, o auditor deve verificar a autenticidade, a
veracidade, a idoneidade e a legitimidade do documento. Averiguar se o documento
está, corretamente, preenchido e se faz referência à operação escriturada. São
exemplos de documentos originais que corroboram os registros contábeis e fiscais:
notas fiscais, recibos, escrituras, duplicatas, dentre outros.
A revisão profunda dos critérios de avaliação e exame de sua conformidade
com as normas e princípios visa, sobretudo, a conciliação dos saldos das contas
existentes na data do balanço. Através de testes são realizadas confirmações analíticas
nas contas de fornecedores, nas contas de clientes e, necessariamente, por meio de
conciliação, os saldos bancários. Efetuam-se também exames quanto ao cumprimento
das normas e princípios contábeis.
Os exames dos registros auxiliares e fiscais são para confirmar a correção
de alguns registros contábeis que são efetuados de forma sintética, necessitando sua
confirmação através de registros auxiliares. Essa técnica é utilizada, por exemplo,
quando alguns lançamentos consolidam todas as operações de um mês em único
registro. Também, os registros fiscais precisam oferecer validade aos impostos
registrados, apurados e recolhidos na Contabilidade.
74
Por fim, a técnica correlação das informações obtidas, faz referência às
análises da correlação de uma conta com outra que a afete. Por exemplo, os
pagamentos a fornecedores, que afetam as contas a pagar e também o disponível.
Verifica-se a exatidão e consistência das informações, analisando as contas
correlacionadas. Qualquer entidade pode adotar a auditoria como instrumento de
controle de seus registros contábeis, assim como de todas as suas operações. Ela
subdivide-se em Auditoria Interna e Externa.
Segundo Attie (1998), a auditoria interna, feita por funcionários da instituição,
preocupa-se com as atividades detalhadas da entidade, buscando abarcar todas as
suas áreas e operações. A auditoria interna, por orientação gerencial da alta
administração da entidade, tem de examinar todas as ramificações e todos os
segmentos, em períodos regulares de tempo, para observar a correção às políticas, à
legislação, à eficiência operacional e aos aspectos tradicionais de controle e proteção
da entidade.
Além disso, a Auditoria Interna é feita de forma permanente, com mais
acuracidade, buscando identificar as incorreções a um menor nível de detalhes. Há,
com isso, também a preocupação com a intercepção e prevenção de fraude.
Já a Auditoria Externa, que é feita por um profissional sem vínculo empregatício
com entidade, um auditor independente, é realizada, periodicamente, geralmente, anual
e, consiste no exame das demonstrações financeiras feitas com o propósito de
expressar uma opinião sobre a propriedade com que as mesmas apresentam a
situação patrimonial e financeira da empresa e o resultado das operações no período
sob exame (ATTIE,1998).
Embora não sendo obrigadas, as entidades do terceiro setor devem se utilizar
tanto da auditoria interna, quando da auditoria externa. Isso para que ela possa
assegurar-se de que está adequada às obrigações estabelecidas nas normas e
princípios contábeis e coibindo o desvio de finalidade quando da aplicação de seus
recursos por seus coloboradores, mantendo-se, enfim, fiel aos requisitos estabelecidos
no artigo 14 do CTN.
75
2 METODOLOGIA
A questão que se pretende responder com o estudo está relacionada com um
fenômeno relativamente atual na sociedade brasileira. Há raríssimas referências
bibliográficas acerca da Contabilidade das instituições de educação sem fins lucrativos
com o fito de atender a imunidade tributária. Ademais, o entendimento deste aspecto é
uma questão complexa, exigindo uma investigação dentro do contexto real.
Segundo Beuren et al (2006, p. 76) “[...] no rol dos procedimentos metodológicos
estão os delineamentos, que possuem um importante papel nas pesquisas científicas
[...]”. Assim, após a revisão da literatura relativa ao assunto, decidiu-se efetuar uma
pesquisa de campo com a intenção de verificar a utilização dos conceitos apresentados
a Contabilidade aplicável às Associações de Educação sem Fins Lucrativos. Dessa
forma, várias foram as técnicas de pesquisas utilizadas no desenvolvimento desse
trabalho.
Na seqüência, apresentam-se as questões norteadoras, e o processo para a
definição da tipologia adotada, a escolha das unidades de análise, os procedimentos de
análise e coleta de dados e, por fim, as limitações do estudo.
2.1 Questões norteadoras
As questões que norteiam esse trabalho são:
a) quais são os procedimentos e normas legais e contábeis a que estão sujeitas
as entidades educacionais sem fins lucrativos para o alcance da imunidade tributária?
b) a Contabilidade praticada pela entidade analisada está em consonância com
os procedimentos e normas legais e contábeis mencionados acima?
c) qual a operacionalidade dos registros contábeis e a consistência das
informações oriundas desses registros elaborados pelas instituições objeto de análise,
no que tange ao alcance do benefício mencionado?
d) a Contabilidade das entidades pesquisadas serve para comprovar o caráter
“instituições sem fins lucrativos” para fins de imunidade tributária?
76
2.2 Tipo de Pesquisa
Beuren at al (2006, p. 76) enfatiza uma tipologia particular para a Contabilidade,
a qual pode ser agrupada em três categorias: a primeira, trata- se da pesquisa quanto
aos objetivos, que pode ser do tipo exploratória, descritiva e explicativa; a segunda,
refere-se aos procedimentos, abordando o estudo de caso, o levantamento a pesquisa
bibliográfica, documental, participante e experimental; e a terceira, refere-se à
abordagem do problema compreendendo a pesquisa qualitativa e a quantitativa.
Segundo a definição desses autores, a pesquisa será exploratória quando o
assunto ainda não foi muito explorado, há pouco material bibliográfico sobre o tema;
será pesquisa descritiva quando o principal objetivo é descrever as características de
determinada população para possibilitar conclusões sobre a sua relação com o
fenômeno pesquisado; será pesquisa explicativa quando se quer buscar aprofundar o
conhecimento, por isso é a que mais traz contribuições cientificas, pois explica com
mais propriedade a razão e o porquê das coisas; será um estudo de caso quando o
objeto de estudo é único caso ou multicasos, quando se quer aprofundar conhecimento
a respeito de um ou mais de um casos específicos; será pesquisa bibliográfica,
quando se busca utilizar o conhecimento já disponível em toda a literatura; será
documental quando a pesquisa utiliza-se de documentos em geral; será participante
quando houver a interação entre as pessoas ou objeto pesquisado com o pesquisador;
será experimental quando a pesquisa produzir um experimento para avaliar o resultado
e utilizar isso no seu estudo; será pesquisa qualitativa quando se buscar conhecer a
natureza de um fenômeno social; será quantitativa quando a coleta e análise de dados
utilizam dados estatísticos.
Dos tipos enumerados por esses autores, o presente estudo encaixa-se: quanto
aos objetivos propostos, pesquisa exploratória e pesquisa descritiva; quanto aos
procedimentos, estudo de caso, pesquisa bibliográfica e pesquisa documental;
quanto à abordagem do problema, pesquisa qualitativa.
77
É exploratória porque há pouca literatura disponível sobre o assunto em estudo.
Segundo Beuren at al (2006, p. 84) “[...] esse estudo é preferido pelos pesquisadores
que desejam aprofundar seus conhecimentos a respeito de determinado caso
específico”. A pesquisa tem caráter exploratório, pois se pretendeu fazer um estudo e a
posterior análise da Contabilidade das instituições pesquisadas, o que pode ser
confirmado com Lakatos & Marconi (1991, p. 188):
Exploratória: são investigações empírica cujo objetivo é a formulação de
questões ou de um problema, com tripla finalidade: desenvolver hipótese,
aumentar a familiaridade do pesquisador com um ambiente, fato ou fenômeno,
para a realização de uma pesquisa futura mais precisa ou modificar e clarificar
conceitos.
Também
é
pesquisa
descritiva,
por
preocupar-se
em
descrever
as
características das instituições sem fins lucrativos, mais especificamente das
associações de educação que gozam da imunidade tributária, assim como os princípios
e normas da Contabilidade obrigatórias a essas entidades
Dado o caráter exploratório da pesquisa, o procedimento mais adequado é o
estudo de caso.
O estudo de caso é apropriado para eventos atuais em que as
dimensões relevantes não podem ser manipuladas e é possível serem feitas
observações diretas. Dada a restrição do objeto pesquisado, permite obter evidencia
para as questões levantadas, o que torna mais rico e proveitoso o resultado do estudo.
(YIN, 2005).
Para Yin (2005, p. 32), estudo de caso “[...] é uma investigação empírica que
investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real,
especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente
definidos”. Dessa forma, a adoção do estudo de caso é coerente com a questão
proposta, qual seja, estudar um tema palpitante: a utilidade da informação contábil em
uma associação, com vista a avaliar a importância da Contabilidade na realidade social,
no contexto real.
Ainda segundo Yin (2005), há no mínimo cinco aplicações diferentes para o estudo
de caso:
78
 Explicar os supostos vínculos causais em intervenções da vida real que são
complexos demais para estratégias experimentais ou aquelas utilizadas em
levantamentos;
 descrever uma intervenção e o contexto na vida real em que ela ocorre;
 ilustrar certos tópicos dentro de uma avaliação, de modo descritivo;
 explorar situações nas quais a intervenção que está sendo avaliada não
apresenta um conjunto simples e claro de resultados;
 meta avaliação – estudo de avaliação.
Considerando-se que a pesquisa envolve duas organizações, conclui-se que
este trabalho trata-se de estudos multicasos, hipótese em que as evidências são mais
convincentes (YIN, 2005).
Outros procedimentos de pesquisa utilizados foram: a pesquisa bibliográfica e a
pesquisa documental. A bibliográfica serviu para a sistematização de conceitos e
normas da Contabilidade e das entidades de sem fins lucrativos. Isso tudo foi coletado
junto às mais diversas fontes de conhecimento e órgãos expedidores de normas. Essa
revisão bibliográfica serviu para fundamentar a coleta e análise dos dados empíricos e
delimitar o problema estudado. Já a pesquisa documental envolveu o exame dos
estatutos, dos livros contábeis, das demonstrações (relatórios) e dos documentos
comprobatórios da escrituração contábil. A abordagem é qualitativa porque foram
procedidas às análises das informações e documentos contábeis das instituições
pesquisadas. Foi avaliada a qualidade e a correção desses dados, à luz das normas,
dos princípios e da doutrina contábil, enfatizando os reflexos produzidos no mundo
objetivo quando utilizados como controles da imunidade tributária das associações
pesquisadas.
2.3 População ou Universo
O estudo de caso realizado na presente pesquisa tem como população as
Associações de Educação sem Fins Lucrativos que exploram o ensino nos níveis
Fundamental e Médio, estabelecidas no município de Manaus, que totalizam cerca de
79
15 (quinze) entidades. Do referido universo, extraiu-se uma amostra não probabilística
do tipo conveniência, selecionando-se 2 (duas) instituições.
Gil (1999) ensina que na amostragem por conveniência o pesquisador utiliza os
dados que tem maior facilidade de acessar, admitindo que eles representem
satisfatoriamente a população. Segundo Colauto e Beuren (2006, p. 126), esse tipo de
amostra “[...] é utilizado em pesquisa de caráter exploratório ou qualitativo, em que há
uma cobrança menor no nível de precisão de dados”.
Assim, em acordo com o delineamento estabelecido, a escolhas da 2 (duas)
instituições obedeceu aos seguintes critérios:
a) Estão localizadas em Manaus;
b) estão constituídas como Associação de Educação sem Fins Lucrativos;
c) exploraram a educação nos níveis Ensino Fundamental e Ensino Médio;
d) são mantidas exclusivamente com as receitas provenientes das mensalidades
cobradas de seus alunos;
e) não estão recolhendo impostos, por estarem usufruindo da Imunidade
Tributária.
2.4 Procedimentos de coleta e análise de dados
Os dados coletados durante a realização desta pesquisa foram os do tipo
secundários, assim, entendidos como aqueles já disponíveis em livros e relatórios
contábeis, relatórios gerenciais, relatórios de auditoria e os documentos comprobatórios
da escrituração contábil disponibilizada, dentre outros documentos de controle
administrativo-financeiro das duas associações.
Quanto ao procedimento de análise dos dados, adotou-se a análise documental
e a análise de conteúdo. A análise documental corresponde a uma série de operações
que visam estudar documentos para descobrir as circunstâncias sociais e econômicas
com as quais podem estar relacionadas. Essa técnica caracteriza-se por trabalhar sobre
os documentos e, essencialmente, sobre a temática (RICHARDSON, 1999).
Já análise de conteúdo, conforme define Bardin (apud TRIVIÑOS, 1992, p. 160)
é um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando, por procedimentos
80
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, obter indicadores
quantitativos ou não, que permitam a inferência de conhecimentos relativos às
condições de produção/recepção das variáveis inferidas das mensagens.
Assim, o método análise de conteúdo visa a estudar as comunicações entre os
homens, com maior ênfase no conteúdo das mensagens. No presente trabalho, o que
está estudado refere-se à avaliação da comunicação das associações com os seus
usuários, com a utilização da Contabilidade, com os seus instrumentos próprios,
analisando se estão sendo respeitados as Normas e Princípios Contábeis e os
requisitos legais da imunidade tributária.
Foi utilizada como técnica de análise conteúdo, a análise por categoria. No caso
em estudo, a análise de dados foi distribuída entre três categorias. Essa distribuição foi
procedida de acordo com o tema proposto, conforme orienta Richardson (1999). Assim,
optou-se por adotar as seguintes categorias, em conformidade com as disposições
acordo com o artigo 14 do CTN: a) consistência e integridade das informações
contábeis; b) distribuição de patrimônio, resultado ou de rendas; c) aplicação de
recursos na manutenção dos objetivos institucionais.
O estudo de caso exige múltiplas fontes de evidência. Segundo Yin (2005), as
evidências podem vir de seis fontes distintas: documentos, registros em arquivo,
entrevistas, observação direta, observação participante e artefatos físicos. No presente
estudo foram utilizadas as seguintes fontes:
 Pesquisa Documental: consulta aos estatutos, livros e relatórios contábeis,
relatórios gerenciais, relatórios de auditorias, documentos comprobatórios dos
lançamentos contábeis;
 observação Direta: o autor deste estudo desempenha atividades funcionais
em atividades de fiscalização de imunidade tributária de associações há mais
15 anos, tendo a oportunidade de estudar a imunidade tributária dessas
instituições.
A análise e interpretação dos dados, segundo Martins (2007, p. 55), representa a
fase em que “[...] o investigador irá classificar os dados, dando-lhes ordem ou
colocando-os nas diversas categorias, segundo critérios que facilitem a análise e
81
interpretação em face dos objetivos da pesquisa”. Para tanto, podem ser utilizadas
aquelas que descrevam o comportamento das variáveis em estudo.
2.5 Limitações do estudo
Segundo Beuren at al (2006, p. 84), o fato de um estudo de caso “[...] relacionarse a único objeto ou fenômeno constitui-se em uma limitação, uma vez que os
resultados não podem ser generalizáveis a outros objetos ou fenômeno.” A
preocupação é evitar que o resultado sirva a considerações genéricas.
Por isso,
convém admitir-se que a escolha dessa metodologia implicará em algumas limitações.
De fato, os estudos de casos são generalizáveis à proposições teóricas, e não a
populações ou universos, não tendo caráter probabilísticos. Assim, considerando, os
resultados obtidos nesta pesquisa, não podem levar a conclusão de que eles também
ocorrem em outras associações.
Ademais, salienta-se também como limitativo: o fato da pesquisa ter realizada
em Manaus, estado do Amazonas; a restrita literatura sobre o assunto; e por fim, o
estudo restringiu-se à legislação pátria.
Todavia, tais limitações, não invalidam os resultados alcançados, os quais
podem servir de parâmetro de comparação para outros estudos de problemáticas
semelhantes.
82
3 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
Esta seção contém a descrição e a análise dos dados coletados durante a
realização da pesquisa nas instituições objeto de estudo. Em um primeiro momento,
descreve-se o perfil das entidades pesquisadas de modo a proporcionar uma visão
geral das mesmas, no tocante à sua forma de constituição, objeto social e forma de
atuação no mercado. Em seguida, é feita a análise geral e individual das categorias
definidas no estudo, segregando-as de acordo com as entidades estudadas.
3.1 Descrição do perfil das entidades pesquisadas
Apresenta-se, a seguir, uma descrição sintetizada das 2 (duas) Associações
pesquisadas, com a finalidade de fornecer uma visão acerca dos seus objetivos
institucionais, das estimativas de quantidade de alunos, do pessoal empregado e da
infra-estrutura utilizada.
3.1.1 Associação Delta
Visando assegurar o sigilo das informações e a identidade desta instituição,
adotou-se o critério de designá-la pelo nome fictício de Associação Delta. Consoante o
que reza o seu estatuto trata-se de “uma associação sem fins lucrativos” que tem como
objetivo “[...] criar e manter, em todos os graus, unidades de ensino, estudos e difusão
científica, técnica e cultural, em todos os ramos do conhecimento humano e colaborar
com entidades públicas e privadas”. Atua em dois estabelecimentos, localizados em
Manaus e cerca 90 docentes, 20 técnicos em educação mantendo matriculados cerca
de 1.500 alunos.
A prestação do serviço não é gratuita, sendo cobrada uma mensalidade de todos
os alunos, a preços equivalentes ao de outras instituições de ensino particulares em
atividade em Manaus auferindo também receita com venda de material escolar.
83
3.1.2 Associação Instituto Batista Ida Nelson - IBIN
É uma Associação de Educação sem Fins Lucrativos, estabelecida em Manaus
há 66 anos, que tem como objetivo, conforme dispõe o seu estatuto: “[...] ministrar
Educação Básica e Educação Superior, observados, em cada caso, as diretrizes e
bases da educação nacional e normas aplicáveis, buscando sempre a formação integral
do estudante de qualquer nível”.
A instituição não recolhe imposto devido a sua caracterização com entidade
imune. Ela aufere receitas na prestação de serviços do ensino fundamental ao ensino
médio, atuando no turno matutino e vespertino. Conta com cerca 118 professores, 48
técnicos em de educação, 10 estagiários, e tem em torno de 1.600 alunos matriculados.
A Associação é mantida com os recursos provenientes de suas receitas com
mensalidades. Os valores cobrados dos seus alunos estão aos mesmos patamares dos
estabelecimentos escolares similares em Manaus.
3.2 Apresentação das categorias do estudo
A análise de conteúdo dos dados coletados propiciou a identificação de três
categorias, as quais foram definidas em função das obrigações que Associações de
Educação, sem fins lucrativos, devem cumprir para se manterem com o status de
imunes aos impostos, consoante determinação do art. 14 do CTN. Desse modo, definiuse para cada instituição as seguintes categorias: a) consistência e integridade das
informações contábeis; b) distribuição de patrimônio, resultado ou de rendas; c)
aplicação de recursos na manutenção dos objetivos institucionais.
a) Categoria Consistência e integridade das informações contábeis
Essa categoria trata do cumprimento dos preceitos contábeis e legais por parte
das instituições pesquisadas para o alcance da imunidade tributária. Para tanto, centrase na forma como está apresentada a Contabilidade das entidades pesquisadas,
confrontando a prática adotada com os preceitos contidos na doutrina contábil aplicável
às associações de educação que gozam de imunidade tributária. Ela foi delineada em
84
função da obrigação dessas entidades “[...] manterem escrituração de suas receitas e
despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão”,
requisito estabelecido no inciso III, do artigo 14 do CTN.
Nesse sentido, a regularidade da Contabilidade dessas instituições está atrelada
ao correto cumprimento das práticas contábeis, das NBC’s e dos Princípios
Fundamentais de Contabilidade.
Para bem compreender e para com isso melhor analisar como decorre o
processo contábil de uma organização, a análise dessa categoria pautou-se nos
ensinamentos de Lopes e Martins (2005), concernente às três fases do processo
contábil que são: a fase do reconhecimento, quando são classificados os fatos
econômicos, respeitando a natureza do evento; a fase da mensuração, na qual se
definem como avaliar os fatos, quais os critérios de avaliação; e a fase de evidenciação,
em que a informação é revelada aos usuários através dos relatórios contábeis,
retratando tudo aquilo que ocorre em uma instituição.
Também na análise dessa categoria, tomou-se em conta o regramento
estabelecido pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), consubstanciado nas
Normas Profissionais (NBCPs), nas Normas Técnicas (NBCTs) e nos Princípios
Fundamentais de Contabilidade, acrescido do que assenta a doutrina contábil, os quais
orientam de maneira explicita como deve ser elaborada a Contabilidade. Tudo isso,
para produzir relatórios contábeis fidedignos, para torná-los instrumentos de
comunicação eficazes nas suas finalidades.
Assim, a consistência e integridade da informação que se busca na análise
dessa categoria diz respeito à adequação das rotinas e procedimentos das entidades
pesquisadas ao que prescrevem o referido arcabouço contábil. Desse modo, optou-se
por adotar a análise e interpretação seguindo os seguintes tópicos:
 Adoção de Plano de Contas e manual com a função e o funcionamento de
cada conta;
 obediência às Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs);
 obediência aos Princípios Fundamentais de Contabilidade (PFCs);
 demonstrações Contábeis;
 auditoria contábil.
85
Conforme se mencionou no Referencial Teórico desse estudo, não há
determinação legal, estabelecendo a obrigatoriedade de escrituração contábil por parte
das Associações. Conseqüentemente, essas instituições não estão obrigadas a manter
o Plano de Contas e o seu respectivo manual. Também não estão obrigadas a elaborar
as Demonstrações Contábeis e nem utilizar a Auditoria Contábil.
Entretanto, a comprovação da atividade sem fins lucrativos requer entre outros
requisitos a manutenção de escrituração das receitas e despesas em livros revestidos
de formalidades que assegurem a sua exatidão (art. 14 do CTN). Diante dessa
determinação, deduz-se que a escrituração deve ser feita em livros contábeis e
divulgada por meio dos relatórios contábeis os quais ficarão à disposição para o exame
de sua veracidade por meio de Auditoria.
Nesse sentido, destaca-se que as regras trazidas pelas Normas Brasileiras de
Contabilidade, especialmente, as relativas às formalidades da escrituração contábil, e
os
Princípios
Fundamentais
de
Contabilidade,
devem
ser,
obrigatoriamente,
respeitados, sob pena de tornar a Contabilidade irregular, sem valor probante.
b) Categoria Distribuição de Patrimônio, Resultado ou de Rendas
Essa categoria interpreta e analisa a distribuição de valores decorrentes da
apuração dos resultados das operações das Associações pesquisadas. Refere-se,
especificamente, ao que determina o requisito estabelecido no inciso I, do artigo 14 do
CTN: “I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a
qualquer título”.
Conforme já mencionado, esse dispositivo visa proibir qualquer distribuição aos
sócios de valores pertencentes às Associações de Educação sem fins Lucrativos.
Ocorrendo a distribuição, a Associação também perde o caráter sem fins lucrativos, não
fazendo mais jus à imunidade tributária.
c) Categoria aplicação de recursos na manutenção dos objetivos
institucionais
Com a terceira e última categoria interpreta-se e analisa-se como se operou a
aplicação dos recursos das Associações pesquisadas, consoante o que orienta os seus
objetivos institucionais. Trata-se do requisito legal que impõe que os recursos das
86
Associações de Educação sem fins Lucrativos devem ser todos aplicados no Brasil e
nas suas finalidades institucionais, conforme prescreve o inciso II, do artigo 14 do CTN
“II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus
objetivos institucionais“.
Assim como os outros dois requisitos supramencionados, o atendimento dessa
imposição legal é obrigatória, por isso é condicionante para que as Associações gozem
da imunidade. Desrespeitada a regra, a Associação perde o caráter “Sem fins
Lucrativos” e, conseqüentemente, o benefício.
3.2.1 Análise geral das categorias da Associação Delta
Apresenta-se, a seguir, a análise e interpretação das categorias desta
associação, salientando-se que na primeira categoria a busca de adequação das
rotinas e procedimentos contábeis da entidade centra-se na observância dos aspectos
relativos a: adoção de Plano de Contas e manual com a função e funcionamento de
cada conta; obediências às normas e princípios contábeis; demonstrações contábeis e
auditoria contábil.
a) Consistência e integridade das informações contábeis
À luz da doutrina contábil e das normas do CFC aplicável às Associações,
passa-se a analisar e interpretar a Contabilidade elaborada pela Associação Delta.
Adoção de Plano de Contas e manual com a função e o funcionamento de cada conta
Na Associação Delta utiliza-se plano de contas elaborado pelo setor contábil, sob
o qual orienta seu processo de classificação contábil. Ressalte-se que as
denominações das contas do Patrimônio estão utilizando descrições de Lucros em vez
se Superávit nomenclatura apropriada para identificar seu resultado positivo. Além
disso, contatou-se que não há a adoção de manual com a função e o funcionamento
das contas do plano de contas.
87
Obediência às Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs)
O quadro 11 demonstra os achados da pesquisa inerente ao cumprimento da
NBC T 2.1 pela Contabilidade elaborada pela Associação Delta, de acordo com cada
item da norma. Essa NBC, conforme se comentou no referencial teórico, define as
obrigações quanto às formalidades da escrituração contábil:
Obrigação (o que deve ser)
Manter um sistema de escrituração uniforme dos seus atos e fatos
administrativos, através de processo manual, mecanizado ou eletrônico.
A escrituração será executada:
a) em idioma e moeda corrente nacionais;
b)em forma contábil;
c)em ordem cronológica de dia, mês e ano;
d)com ausência de espaços em branco, entrelinhas, borrões, rasuras,
emendas ou transportes para as margens;
e)com base em documentos de origem externa ou interna ou, na sua
falta, em elementos que comprovem ou evidenciem fatos e a prática de
atos administrativos.
A terminologia utilizada deve expressar o verdadeiro significado das
transações.
A escrituração contábil e a emissão de relatórios, peças, análises e
mapas demonstrativos e demonstrações contábeis são de atribuição e
responsabilidade exclusivas do Contabilista legalmente habilitado.
O Balanço e demais Demonstrações Contábeis, de encerramento de
exercício serão transcritos no “Diário”, completando-se com as
assinaturas do Contabilista e do titular ou de representante legal da
Entidade. Igual procedimento será adotado quanto às Demonstrações
Contábeis, elaboradas por força de disposições legais, contratuais ou
estatutárias.
O “Diário” e o “Razão” constituem os registros permanentes da
Entidade.
Os registros auxiliares, quando adotados, devem obedecer aos
preceitos gerais da escrituração contábil, observadas as peculiaridades
da sua função. No “Diário” serão lançadas, em ordem cronológica, com
individuação, clareza e referência ao documento probante, todas as
operações ocorridas, incluídas as de natureza aleatória, e quaisquer
outros fatos que provoquem variações patrimoniais.
No caso de a Entidade adotar para sua escrituração contábil o processo
eletrônico, os formulários contínuos, numerados mecânica ou
tipograficamente, serão destacados e encadernados em forma de livro.
O livro Diário será registrado no Registro Público competente, de acordo
com a legislação vigente.
Realidade encontrada (o que é)
Regular
Irregular em relação ao
relacionado a documentos.
item
e,
Irregular
Regular
Regular
Irregular quanto à inexistência de
documentos
comprobatórios.
Há
lançamentos sem o amparo do
documento.
Regular
Regular
Quadro 11 - Cumprimento das Formalidades da Escrituração Contábil pela Associação Delta
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da pesquisa
Os itens identificados como irregulares são aqueles que estão em desacordo
com o que orienta a norma contábil. Já os assinalados como regulares, correspondem
aos que estão sendo corretamente cumpridos.
88
Pelo que se verificou, o processo contábil da Associação é executado por único
profissional contábil. Não há entre as rotinas contábeis execução de trabalhos de
conferência, de cálculos de conciliações por outro profissional da Contabilidade. Assim,
constatou-se que as fases do reconhecimento, mensuração e evidenciação não são
criticadas durante a elaboração da Contabilidade na instituição.
Consultando-se o relatório de auditoria da referida instituição, observa-se que na
escrituração contábil foram detectados inúmeros lançamentos contábeis desprovidos
dos documentos comprobatórios. Também há menção a ausência de cópias dos
cheques emitidos, das folhas de pagamentos e das notas fiscais de compra de valerefeição, entre documentos relevantes que estão transcritos nos lançamentos
contábeis, mas que fisicamente não estão presentes nos dos documentos contábeis da
instituição.
Resgatando o que preceitua a NBC T 2.2, item 2.2.1.1 “Documento contábil,
estrito-senso, é aquele que comprova os atos e fatos que originam lançamento (s) na
escrituração contábil da Entidade”. Não obstante a referida norma, na análise de
documentos, durante o confronto entre os lançamentos contábeis registrados no livro
diário versus os documentos comprobatórios, detectaram-se essas faltas.
A despeito da orientação da doutrina contábil e das NBCs, detectou-se também
que vários lançamentos contábeis não expressam os fatos conforme estão retratados
nos documentos comprobatórios, prejudicando totalmente a fase do reconhecimento do
processo contábil. Contudo, os casos mais substanciais, ou seja, aqueles que trazem
mais distorções a informação contida nos relatórios contábeis são os retratados a
seguir:
a) Lançamento que retrata a transferência do saldo da conta Receita de
Mensalidades Antecipadas, componente do Passivo, subgrupo Resultado de Exercícios
Futuros, relativo a mensalidades escolares recebidas antecipadamente, para a conta
Contas Correntes Diversas, pertencente ao Ativo Circulante. Segundo as normas e
princípios contábeis, o procedimento correto seria o reconhecimento da referida receita
no ano em curso de XB, já que trata-se de uma receita incorrida naquele ano de XB,
recebida antecipadamente no ano anterior, em XA.
89
b) Retiradas em espécie das contas correntes dos bancos, através da utilização
de cheques, que deveriam estar retratados como Débito de Caixa (entrada dos
recursos) e Crédito de Bancos Conta Movimento (baixa do saldo). Em vez disso, o
lançamento operado foi débito de Conta Correntes Diversas e Crédito de Bancos Conta
Movimento.
Princípios Fundamentais de Contabilidade (PFCs)
Apesar do que preceitua o Princípio da Entidade, o relatório de auditoria da
entidade pesquisada acusa que no Livro Diário foram computadas despesas, que por
suas naturezas, não pertencem à entidade, pois são vinculadas a interesses de outras
pessoas. Tais impropriedades foram detectadas quando da análise dos documentos
comprobatórios dos respectivos lançamentos contábeis no Livro Diário. Dentre as
referidas despesas mencionam-se:
a) despesas com veículos registrados e de uso particular dos dirigentes, tais
como taxas de licenciamento, IPVA;
b) despesas de materiais de construções destinados a utilização em imóveis
particulares de seus dirigentes.
Ainda segundo o mesmo relatório de auditoria, durante a análise documental foi
constatada a omissão nos registros no Livro Diário de documentos que retratam
pagamentos, tornando incompletos os relatórios contábeis. Tais desembolsos
beneficiaram os dirigentes da associação, retratada na análise a seguir:
a) Os saldos das contas do disponível da Associação Delta, conforme está
descrito no livro razão e balancetes mensais, desdobra-se em Caixa e Bancos Conta
Movimento, relativos ao último semestre do ano em curso, totalizando os valores
constantes do quadro 12:
SALDOS FINAIS NO LIVRO RAZÂO AO FINAL DE CADA MÊS
31/7/XB
31/8/XB
30/9/XB
31/10/XB
30/11/XB
31/12/XB
Caixa
152.955
182.651
192.939
203.304
232.345
498.967
Bancos C. Movimento
-224.776
-187.922
-163.255
-203.122
-52.825
-93.241
SALDO CONSOLIDADO
-71.821
-5.271
29.684
182
179.520
405.726
Quadro 12 – Transcrição dos saldos das contas contábeis do disponível no último semestre de XB
Fonte: Livro razão da Associação Delta
CONTA
Observando-se os números do quadro acima, percebe-se que a conta Caixa está
com saldo devedor (saldo favorável). Ao contrário, a conta Bancos Conta Movimento
90
está com saldo credor (saldo desfavorável). Como a conta de bancos está credora
significa que a instituição está devendo os referidos valores para os bancos. O saldo
devedor da conta caixa representa que há esses numerários no caixa da organização
nos montantes referidos.
Diante desse cenário, questiona-se o fato da entidade não depositar os valores
que aparecem como disponíveis na conta caixa, nas contas dos bancos e, com isso,
quita esse débito. Todavia, observou-se que no período referenciado a associação
arcou com os pagamentos de juros bancários, conforme está escriturado no livro diário,
na Conta Comissões e Taxas Bancárias, por conta dessa obrigação financeira o que
nos leva a concordar com a afirmativa do relatório de auditoria de que os referidos
valores tiveram como beneficiários os dirigentes da entidade pesquisada.
Corroborando a assertiva mencionada no parágrafo anterior, salienta-se que na
análise dos documentos da movimentação financeira da entidade, constataram-se
durante a auditoria que o seu setor financeiro emitia cheques para sacar dinheiro das
suas contas bancárias. Em seguida, esses valores eram depositados em contas
bancárias pessoais dos dirigentes da associação. Essa operação está registrada na
contabilidade por meio de lançamentos contábeis retratando as entradas desses
recursos na conta Caixa, com as respectivas saídas das contas Bancos Conta
Movimento. Todavia, não há os registros dos eventos subseqüentes, ou seja, dos
repasses para as contas bancárias dos dirigentes. Por isso há o saldo alto de caixa,
com as contas bancárias negativas.
As transações mencionadas, anteriormente, caracterizam a inobservância dos
princípios contábeis. Foi violado o Princípio da Entidade, uma vez que foi desrespeitada
a independência do patrimônio da instituição, confundindo-o com o patrimônio dos seus
dirigentes, e o Princípio da Oportunidade, pois os registros não foram procedidos na
tempestividade devida e nem identificaram, integralmente, todos os fatos em toda a sua
extensão. Isso porque se deixou de registrar os fatos relacionados ao repasse para as
contas bancárias dos dirigentes quando eles ocorreram.
O fato relacionado acima, que trata de Receita Antecipada de Mensalidades, que
foi transferida para a conta Conta Correntes Diversas, retrata uma infringência ao
Principio de Competência. Isso porque ela é uma receita que foi recebida
91
antecipadamente no exercício anterior (XA), daí a sua classificação, relativa a
mensalidades do ano em curso (XB). Portanto, obrigatoriamente, por imposição do
Princípio de Competência, deveria haver o seu reconhecimento, a sua transferência
para a conta de Receita com Mensalidades em XB, fato que não ocorreu, conforme já
explicado.
Dessa forma, ficou entendido que os valores constantes da conta caixa não
estão disponíveis no financeiro da instituição, porque foram distribuídos aos seus
dirigentes, contrariando as afirmações de (LAURINDO, 2006) bem como o inciso I do
art. 14 do CTN que proíbe a distribuição de “qualquer parcela de seu patrimônio ou de
suas rendas, a qualquer título”.
Ademais, constam no relatório de auditoria que houve vendas de veículos de
propriedade da associação, sendo que o registro desse fato não foi efetuado na
contabilidade. Tal procedimento viola o Principio da Oportunidade e o Princípio da
Competência. Pois há vendas de veículos registradas, sem os correspondentes
reconhecimentos das operações na escrituração contábil.
Verifica-se que a omissão desses registros de receitas de vendas de veículos
assim como as respectivas baixas no ativo imobilizado, na conta veículos contrariam o
Princípio da Oportunidade, por não terem sido registrados ao tempo em que ocorreram.
Da mesma forma, o não reconhecimento da referida receita conflita com o Princípio da
Competência, pois não houve a contabilização de um fato da Associação na data da
sua ocorrência.
Demonstrações Contábeis
O Estatuto da Associação Delta dispõe que suas contas serão prestadas aos
seus usuários através seguintes relatórios “1 – Balanço Patrimonial; 2 – Balanço
Financeiro; 3 – Atestado de Exame assinado por contador habilitado”. Não obstante a
orientação estatutária, verificou-se que são elaborados e transcritos no livro diário da
entidade o Balanço Patrimonial e Demonstração do Resultado do Exercício. Essa
prática contraria as orientações contidas NBC T 3 da Resolução n.º 686 a qual prevê
que os relatórios contábeis a serem elaborados por essas instituição são: o Balanço
Patrimonial, a Demonstração do Resultado do Exercício, a Demonstração de Lucros ou
92
Prejuízos Acumulados, a Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido e, por fim,
a Demonstração das Origens e aplicações de Recursos.
Continuando-se
a
análise
desta
categoria,
apresentam-se
abaixo
as
demonstrações contábeis produzidas pela Associação Delta, relativas ao exercício XB.
Cabe mencionar que os números originais foram alterados, para manter o sigilo acerca
da identificação da Associação Delta. Entretanto, as alterações promovidas não
invalidam os resultados da pesquisa, uma vez que as características básicas
(proporções) estão preservadas:
ATIVO
CIRCULANTE
DISPONÍVEL
Caixa
Banco Conta Movimento
OUTROS CRÉDITOS
Almoxarifado
Contas a Receber
REAL. A LONGO PRAZO
Consórcio de Veículos
IMOBILIZADO
Máquinas e Equipamentos
Móveis e Utensílios
Veículos
Benfeitorias
Biblioteca
(-) Depreciações
TOTAIS
634.443
405.726
498.967
-93.241
228.717
208
228.509
34.366
34.366
310.399
176.585
39.536
21.998
77.756
10.317
-15.793
979.207
PASSIVO
CIRCULANTE
Contas a Pagar
RES. DE EXERC. FUTUROS
Receitas Diferidas
PATRIMÔNIO LÍQUIDO
Lucros Acumulados
Lucros do Exercício
256.323
256.323
201.625
201.625
521.259
387.141
134.119
979.207
Quadro 13 – Balanço patrimonial da Associação Delta encerrado em 31 de dezembro de XB
Fonte: Contabilidade da Associação Delta
O formato do Balanço Patrimonial está de acordo com a estrutura prescrita na
NBC T 3. Entretanto, visualiza-se que as denominações das contas do Patrimônio
Líquido estão desconformes com aquilo que prescreve a referida norma. Assim, o termo
Lucros deveria estar substituído pela denominação Superávit.
Devido às omissões de registros contábeis e a ocorrência de registros no Livro
diário da instituição de pagamentos de despesas de terceiros, conforme mencionado,
conclui-se que o Balanço da Associação Delta, encerrado ao final de XB, é um relatório
contábil que não retrata os saldos corretos de todas as contas. Especialmente, as
contas Caixa e as contas de Superávit (Lucros).
93
O quadro 14 apresenta a Demonstração de Resultado do Exercício relativa a XB
da Associação Delta.
DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO DO ANO XB
Receita de Venda de Serviços
Receita com Mensalidades
Material Escolar
DESPESAS/RECEITAS
Receitas Financeiras
Receitas Eventuais
Despesas com Manutenção de Ensino
Pessoal Docente
Pessoal Tec. Administrativo
Encargos Sociais
Despesas Gerais
Material de Manutenção/ Conservação
Materiais de Consumo
Outros Materiais
Serviços
Impostos. Taxas e Contribuições
Outras Despesas
-1.994.469
-1.930.077
-64.392
1.860.350
-44.218
-89.826
2.029.748
314.877
274.603
155.324
122.316
160.879
87.051
79.102
807.259
25.754
2.583
Convênio e Doações
LUCRO DO EXERCÍCIO
Quadro 14 – DRE do exercício do ano XB da Associação Delta
Fonte: Contabilidade da Associação Delta
35.354
-134.119
Os números reportados na DRE acima apresentam as receitas auferidas e
despesas incorridas no exercício XB. Como se observa, a receita principal é a relativa à
prestação de serviços de educação. Os dispêndios (despesas) estão relacionados com
a atividade de Educação, ressalvadas as omissões e os pagamentos indevidos já
mencionados. Neste sentido, salienta-se a lição de Carraza (2001) ao afirmar que
exigência da ausência de fins lucrativos, não implica a prestação gratuita de serviços,
sendo esse também o entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF.
Todavia, observa-se uma impropriedade no relatório, qual seja a denominação
Lucro do Exercício para identificar o resultado positivo da entidade, quando deveria
utilizar Superávit do Exercício, pois conforme se mencionou anteriormente, superávit
não é lucro, visto que segundo AMARO (2003) a entidade não foi criada para dar lucro
aos seus fundadores, mas sim para atingir a finalidade filantrópica.
94
Relativamente, ao exposto acima, recorda-se, ainda, o entendimento de
Machado (2007) ao afirmar que não ter fins lucrativos não significa ter receitas limitadas
aos custos operacionais. Porquanto, tais entidades podem e devem ter sobras
financeiras, até para que possam progredir, modernizando e ampliando suas
instalações. O que não pode ocorrer é a distribuição, devendo todo o excesso de suas
disponibilidades ser aplicado na manutenção dos seus objetivos institucionais.
Auditoria Contábil
O estatuto da Associação ao estabelecer que para prestar contas far-se-ia uso
de “3 – Atestado de Exame assinado por contador habilitado” parece orientar a
utilização de auditoria interna, ou até mesmo a auditoria externa. Não obstante, a
orientação estatuária, a instituição não utiliza a técnica contábil Auditoria, seja a Interna
ou a Externa.
b) Categoria Distribuição de Patrimônio, Resultado ou de Rendas
O livro diário de XB e os relatórios contábeis da Associação Delta não registram,
explicitamente, fatos relativos à distribuição de seus resultados, de suas rendas ou de
qualquer item patrimonial. Entretanto, há os documentos registrados como despesas da
Associação, mas que, diretamente, beneficiaram os seus dirigentes, caso das despesas
de veículos e despesas com material de construção, conforme retratado. A fase do
reconhecimento do processo contábil do fato não procedido corretamente, senão
registraria um pagamento para o sócio e não o registro de uma despesa para a
organização.
O livro diário e os relatórios contábeis também não retratam a destinação dos
recursos correspondentes aos saques nas contas de bancos, conforme exposto e
analisado, produzindo um saldo fictício da conta caixa, decorrente da omissão dos
lançamentos contábeis das saídas da conta Caixa para os verdadeiros beneficiários
dos valores, os dirigentes da Associação Delta.
Como resultado da análise documental e da análise de conteúdo, conclui-se,
com base no que, efetivamente, retrata os documentos comprobatórios, que a
Contabilidade registra a distribuição de recursos da Associação Delta, não obstante a
vedação do CTN.
95
c) Categoria aplicação de recursos na manutenção dos objetivos
institucionais
Consoante ao divulgado nas Demonstrações Contábeis desta instituição,
especialmente, a DRE, os gastos com despesas estão relacionados com a Educação.
Essa constatação nos leva a inferir que não houve aplicação de recursos em finalidades
distintas daquelas constantes dos objetivos institucionais da Associação Delta.
Entretanto, considerando o resultado do relatório de auditoria da citada
instituição, as análises documentais, comprovam a destinação aos dirigentes da
Associação dos valores sacados nos bancos e que estão registrados na conta Caixa,
conforme mencionado.
A razão da Auditoria, assim, em consideração, vincula-se ao fato de esses
valores estarem apresentados, ficticiamente, na conta Caixa, já que essa quantia não
está disponível na Associação Delta, levando ao entendimento de que foi entregue aos
dirigentes. Diante dessa comprovação, infere-se que a Contabilidade registra que
houve a aplicação de recursos da associação em outras finalidades, em detrimento dos
objetivos institucionais da entidade. Corrobora com isso o que foi retratado acima
relativo a pagamento de despesas pessoais dos dirigentes detectadas durante a
pesquisa documental.
3.2.2 Análise geral das categorias da Associação Instituto Batista Ida Nelson
Da mesma forma que na Associação Delta, apresenta-se a seguir a análise e
interpretação das categorias da Associação IBIN, destacando-se que, na primeira
categoria a adequação das rotinas e procedimentos contábeis da entidade é rastreada
por meio da observância dos aspectos inerentes à: adoção de Plano de Contas e
manual com a função e funcionamento de cada conta; obediências às normas e
princípios contábeis; demonstrações contábeis e auditoria contábil.
a) Consistência e integridade das informações contábeis
Passa-se a analisar e interpretar a Contabilidade da Associação IBIN,
confrontando a prática contábil com doutrina contábil e normas do CFC aplicável às
Associações, conforme consta no Referencial Teórico.
96
Adoção de Plano de Contas e manual com a função e o funcionamento de cada conta
A Associação IBIN adota Plano de Contas em suas práticas contábeis adequado
à sua atividade. As denominações das contas componentes do Patrimônio estão com
as descrições conforme orienta a NBC T 2.1, ou seja, Patrimônio Social e
Superávit/Déficit. Há também a utilização de Manual com Função e o Funcionamento
das Contas do Plano de Conta de conformidade com os ensinamentos de Araújo
(2006).
Obediência às Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs)
O quadro 14 demonstra a regularidade contábil da Associação IBIN, quanto a
NBC T 2.1, norma do CFC que define as regras da escrituração contábil:
Obrigação (o que deve ser)
Manter um sistema de escrituração uniforme dos seus atos e fatos
administrativos, através de processo manual, mecanizado ou eletrônico.
A escrituração será executada:
a) em idioma e moeda corrente nacionais;
b)em forma contábil;
c)em ordem cronológica de dia, mês e ano;
d)com ausência de espaços em branco, entrelinhas, borrões, rasuras,
emendas ou transportes para as margens;
e)com base em documentos de origem externa ou interna ou, na sua falta,
em elementos que comprovem ou evidenciem fatos e a prática de atos
administrativos.
A terminologia utilizada deve expressar o verdadeiro significado das
transações.
A escrituração contábil e a emissão de relatórios, peças, análises e mapas
demonstrativos e demonstrações contábeis são de atribuição e
responsabilidade exclusivas do Contabilista legalmente habilitado.
O Balanço e demais Demonstrações Contábeis, de encerramento de
exercício serão transcritos no “Diário”, completando-se com as assinaturas
do Contabilista e do titular ou de representante legal da Entidade. Igual
procedimento será adotado quanto às Demonstrações Contábeis,
elaboradas por força de disposições legais, contratuais ou estatutárias.
O “Diário” e o “Razão” constituem os registros permanentes da Entidade.
Os registros auxiliares, quando adotados, devem obedecer aos preceitos
gerais da escrituração contábil, observadas as peculiaridades da sua
função. No “Diário” serão lançadas, em ordem cronológica, com
individuação, clareza e referência ao documento probante, todas as
operações ocorridas, incluídas as de natureza aleatória, e quaisquer
outros fatos que provoquem variações patrimoniais.
No caso de a Entidade adotar para sua escrituração contábil o processo
eletrônico, os formulários contínuos, numerados mecânica ou
tipograficamente, serão destacados e encadernados em forma de livro.
O livro Diário será registrado no Registro Público competente, de acordo
com a legislação vigente.
Realidade encontrada (o que é)
Regular
Regular
Regular
Regular
Regular
Regular
Regular
Regular
Quadro 15 - Cumprimento das Formalidades da Escrituração Contábil pela Associação IBIN
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da pesquisa
97
Como é possível notar, a Contabilidade da Associação IBIN está apresentada
consoante ao que preceitua as regras estabelecidas nas NBCs relativas a Escrituração
Contábil. Confrontando as prescrições da referida norma versus os procedimentos de
escrituração utilizados pelo setor contábil da organização, não se detectou nenhuma
inconformidade.
A escrita está elaborada em meio eletrônico, os livros diários e razões estão
impressos e encadernados, assinados pelo profissional contábil regular perante o CFC.
Quanto ao processo contábil (reconhecimento, mensuração e evidenciação),
verificou-se a sua adequação ao que prescreve a doutrina contábil, não se encontrando
nenhuma impropriedade nas rotinas de classificação, mensuração e elaboração da
informação contábil.
O setor contábil está estruturado com três profissionais, sendo um contador e
duas técnicas contábeis. As técnicas elaboram a Contabilidade e o contador confere os
trabalhos desenvolvidos pelas técnicas, para atestar e assinar os relatórios contábeis.
Assim, todos os seus lançamentos contábeis retratam fidedignamente os fatos
ocorridos e estão baseados em documentos comprobatórios. Os documentos probantes
expressam fielmente as ocorrências, de acordo com a natureza dos fatos.
Princípios Fundamentais de Contabilidade (PFCs)
Durante a pesquisa da análise de dados da Associação IBIN, não se detectou a
infrigência a qualquer Principio Fundamental da Contabilidade. Todas as ocorrências
identificam fatos relacionados exclusivamente da Associação, assim não há violação ao
Princípio de Competência. Os fatos estão registrados ao tempo certo e com a
integridade devida, não prejudicando o Princípio da Oportunidade. Da mesma forma, as
receitas e as despesas estão incluídas no período a que se refere, atendendo ao
Princípio da Competência.
Demonstrações Contábeis
A Associação IBIN disponibiliza aos seus usuários como relatórios contábeis: o
Balanço Patrimonial – BP, a Demonstração do Resultado do Exercício e as Notas
Explicativas. Por outro lado, ela não elabora a Demonstração das Mutações do
98
Patrimônio Social e as Demonstrações das Origens e Aplicação de Recursos, conforme
estabelecem as orientações da NBC T 3 da Resolução n.º 686.
A seguir são transcritas as demonstrações contábeis elaboradas pela
Associação IBIN, relativas ao exercício de XB, para se possa fazer as análises e
interpretações:
ATIVO
CIRCULANTE
Caixa e Bancos
Aplicações Financeiras
Mensalidades a Receber
Créditos de Liquid. Duvidosa
Estoques
Outros contas a receber
1.518.030
6.096
2.102
899.986
-153.711
209.554
554.003
REAL. A LONGO PRAZO
Mensalidades a Receber
Créditos de Liquid. Duvidosa
229.760
383.471
-153.711
IMOBILIZADO/INVESTIMENTOS
Edifícios
Instalações e Equipamentos
Biblioteca/Móveis/Utensílios/Informática
Veículos
Terrenos
Direito de Uso de Telefones
Obras de Arte
(-) Depreciações
TOTAIS
5.152.103
3.298.467
1.332.261
1.119.159
118.391
1.720.560
3.674
1.349
2.441.758
PASSIVO
CIRCULANTE
Empréstimos Bancários
Fornececedores
Impostos e Contribuições
Salários e Férias a Pagar
Antecip. para Exercícios Fut.
Outras Contas a Pagar
EXIGÍVEL A LONGO PRAZO
Prov. P/ Contrib. p/ Exerc. Fut.
PATRIMÔNIO LÍQUIDO
Patrimônio Social
Reserva de Reavaliação
Superávit do Exercício
6.899.893
Quadro 16 – Balanço patrimonial da Associação IBIN encerrado em 31 de dezembro de XB
Fonte: Contabilidade da Associação IBIN
1.165.931
96.852
70.581
396.445
300.296
288.563
13.194
748.573
748.573
4.985.389
1.581.658
3.246.029
157.702
6.899.893
O formato do Balanço Patrimonial da Associação IBIN segue a estrutura indicada
pela NBC T 3. Além disso, utiliza as denominações tipificas para as Associações sem
Fins Lucrativos, quando da identificação das contas componentes do Patrimônio
Líquido, conforme orienta a referida norma. Assim, ela está utilizando a denominação
Superávit em vez de lucros, Patrimônio Social em vez de Capital Social.
Conclui-se que os saldos das contas do Balanço Patrimonial da Associação IBIN
estão corretamente representados, uma vez que eles são resultantes do seu processo
contábil, que está conforme orienta a Doutrina, as Normas e os Princípios Contábeis.
No Patrimônio Líquido está demonstrado o saldo remanescente da Reserva de
Reavaliação que foi constituída em 2001, que serviu para atualizar a valores de
99
mercado os seus prédios e dos seus terrenos. A referida reserva foi operacionalizada
para melhor traduzir os principais bens da instituição, refletindo com mais fidedignidade
o patrimônio da entidade.
Referindo-se à Demonstração do Resultado do Exercício da Associação IBIN,
verifica-se que está sendo utilizada a denominação correta quando identifica o seu
resultado positivo como Superávit, ou seja, da forma como orienta a NBC T 10.18.
O quadro 17 apresenta a Demonstração de Superávit ou Déficit - DSD relativa a
XB da Associação IBIN:
RECEITAS OPERACIONAIS:
Anuidades (matrículas/mensalidades)
Taxas Médicas e Outras
Demais Receitas
RECEITAS NÃO OPERACIONAIS:
Receitas não Operacionais
Despesas não Operacionais
DESPESAS OPERACIONAIS:
Remunerações (sal./13º/Férias/Rescisões)
Engargos Sociais (INSS/FGTS/PIS/VT)
Paecelamento débito do INSS
Crédito de Liquidação Duvidosa
Depreciação e Amortização
Material Escolar
Alimentação
Cons. Mat. Escritório/Limpeza/Outros
Energia Elétrica/Água/Telefone/Serv. Utililit.
Manutenção e Conservação
Aluguéis/Condomínios
Formação Profissional/Congresso/Seminário
Propaganda e Publicidade
Viagens e Representações
Serviços Prestados por Terceiros
Convênios
Contribuições Sociais, Impostos e Taxas
Outras Despesas
RESULTADO OPERACIONAL
SUPERÁVIT DO EXERCÍCIO
Quadro 17 – DRE do exercício do ano XB da Associação IBIN
Fonte: Contabilidade da Associação IBIN
-6.903.143
-234.102
-898.619
-8.035.864
-377.598
376.734
3.244.962
1.536.942
322.720
307.422
247.125
512.471
240.150
381.947
249.198
264.287
119.352
11.847
54.444
23.210
180.393
112.506
37.568
32.484
7.879.026
-157.702
-157.702
Os números referidos na Demonstração do Resultado do Exercício da
Associação Delta apresentam as receitas auferidas e as despesas incorridas no
100
exercício de XB. O relatório demonstra que a receita principal é a relativa a prestação
de serviços de educação e os gastos com despesas estão relacionados com a atividade
fim da instituição.
Notas Explicativas
As Notas Explicativas da Associação IBIN relativas ao ano de XB estão
detalhando vários fatos retratados nas demonstrações contábeis, em consonância com
o que orienta a NBC T 10.18. Os esclarecimentos estão divididos nos seguintes tópicos:
Operações, Elaboração das Demonstrações Financeiras, Descrição das Principais
Práticas Contábeis, Mutações do Patrimônio Líquido e Seguros.
Cabe destacar o tópico Práticas Contábeis, em que houve o desdobramento nos
seguintes subitens:
a)
Direitos, Bens e Obrigações: informa que houve a correção de alguns direitos
e obrigações segundo o regime de competência, para refletir os valores
atualizados na data no encerramento do Balanço;
b)
Créditos de Liquidação Duvidosa: informa detalhes da provisão para
devedores duvidosos e a estima de recuperação desses créditos;
c)
Realizável a Longo Prazo: informa que o Realizável a Longo Prazo refere-se a
exercícios passados e que haverá possíveis perdas com esses direitos;
d)
Impostos e Contribuições a Pagar: detalha a configuração das obrigações
fiscais que constam no balanço;
e)
Exigível a Longo Prazo: informa que o exigível está demonstrando os valores
originais de uma obrigação;
f)
Antecipações para Exercícios Futuros: Informa que o valor refere-se a receita
antecipada relativa a matrículas do ano letivo de XC, recebida em XB.
Auditoria Contábil
A Associação IBIN submete anualmente as suas Demonstrações Contábeis a
Auditoria Externa. Após a realização de auditoria externa relativa ao ano de XB, o
auditor independente, após auditoria nos documentos, nos registros dos atos e fatos
econômico-financeiros, nas demonstrações contábeis, opinou que a escrita e os
relatórios contábeis estão corretamente elaborados. Com relação a Auditoria Interna,
observou-se que não há a utilização da técnica.
101
b) Categoria Distribuição de Patrimônio, Resultado ou de Rendas
A Contabilidade da Associação IBIN não registra em seus relatórios, em sua
escrituração qualquer distribuição de seus lucros. Procedendo-se à análise dos
documentos, também não se detectou qualquer utilização indevida dos recursos da
Associação, concluindo-se que a Contabilidade por ela praticada não registra a
distribuição de recursos da Associação IBIN.
c) Categoria aplicação de recursos na manutenção dos objetivos
institucionais
Conforme demonstra a DRE da Associação IBIN, os seus recursos foram todos
aplicados em gastos com despesas relacionada a atividade de educação. Além disso,
o relatório de auditoria da citada instituição afirma que os documentos probantes da
escrituração contábil comprovam que todos os valores utilizados foram empregados
dentro do Brasil, concluindo-se que a Contabilidade da Associação IBIN não registra a
aplicação de recursos da entidade em outras finalidades que não as institucionais.
3.2.3 Análise comparativa entre as unidades pesquisadas
O quadro 18 apresenta, sinteticamente, os resultados obtidos relativos às práticas
contábeis das duas Associações selecionadas, relativo à categoria Consistência e
Integridade das Informações Contábeis:
CATEGORIA
a) Consistência
e integridade
das
informações
contábeis
UTILIZA OU RESPEITA ?
INSTRUMENTOS/NORMAS/
CONDIÇÃO
Assoc. Delta Assoc. IBIN
PRINC. CONTÁBEIS
Plano de Contas
Facultativo
Manual com unção e o
Facultativo
funcionamento de cada conta
Obediência às Normas
Obrigatório
Brasileiras de Contabilidade
Obediência aos Princípios
Obrigatório
Fundamentais de
Sim
Sim
Não
Sim
Não
Sim
Não
Sim
ATENDE AO REQUISITO?
Assoc. Delta Assoc. IBIN
Não
Demonstrações Contábeis
Facultativo
Sim
Sim
Auditoria Contábil
Facultativo
Não
Sim
Quadro 18 – Quadro comparativo do cumprimento das práticas contábeis
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da pesquisa
Sim
102
Pelos resultados na pesquisa junto a Contabilidade da Associação Delta, concluise que ela não cumpre as NBCs e os Princípios Fundamentais de Contabilidade, além
de outras práticas orientadas pela doutrina contábil.
Com relação à Associação IBIN, comprovou-se que a sua Contabilidade está
regular, retratando corretamente os fatos, segundo as suas ocorrências, não havendo
infrigência a nenhuma NBC e nenhum Princípio Contábil.
A despeito das constatações acima, relembra-se o que diz Gonçalves (2000), ao
afirmar que as transações efetuadas pela empresa alimentam o sistema contábil, o qual
codifica e retorna com o resultado das operações, por meio da emissão de relatórios.
Contudo, para que a emissão desses relatórios possa ocorrer de maneira correta, é
necessário que a entrada de dados seja feita de forma adequada, embasada em
documentos hábeis, retratando todas as operações realizadas pela organização, de
modo que as informações possam ser úteis aos seus usuários.
Passando-se a interpretar e analisar o quadro comparativo que consolida os
resultados obtidos entre as outras duas categorias, quadro 19, depara-se com um
resultado semelhante. Pelo que já foi mencionado, conclui-se que a Associação Delta
não cumpre o que o CTN exige tanto quanto a não distribuição de seus resultados,
patrimônio ou de rendas, assim como em relação à aplicação dos seus recursos
exclusiva em seus objetivos institucionais, conforme evidencia a Contabilidade. Já com
relação a Associação IBIN, comprovou-se, que os dois requisitos referidos foram
devidamente cumpridos.
CATEGORIAS
b) Distribuição de patrimônio, resultado ou de
rendas
c) Aplicação de recursos na manutenção dos
objetivos institucionais
ATENDE AO REQUISITO?
Assoc. Delta
Assoc. IBIN
Não
Sim
Não
Sim
Quadro 19 – Quadro comparativo relativos a distribuição de lucros e aplicação de recursos
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da pesquisa
Do exposto, infere-se que à luz da Contabilidade financeira apenas uma das
instituições atende aos requisitos para o alcance da imunidade tributária. Essa mesma
103
instituição também se enquadra, embora que parcialmente, na postura gerencial
defendida por Olak (2000, apud BRITO; DE LUCA BRITO, 2006, p.3), pois dos três
elementos apresentados como requisitos, a entidade apresenta característica explicitas
de dois que são: transparência (accountability) e instrumentos de comunicação
(relatórios contábeis), porque mesmo não divulgando os seus relatórios em um veículo
de comunicação de fácil acesso ao público elabora os dois principais relatórios
contábeis consoante as determinações contábeis e legais além de complementá-las
com notas explicativas. Quanto ao terceiro elemento, relatórios de avaliação
(desempenho), não foi constatada a sua elaboração.
104
CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃO
O interesse para a realização deste trabalho decorreu dos constantes
questionamentos presentes na mídia acerca da regularidade das Entidades do Terceiro
Setor, principalmente, quanto à correta utilização da Imunidade Tributária. Conforme foi
mencionado no desenrolar desse trabalho, esse setor auxilia o Estado na consecução
de suas funções estatais. Entretanto, a correta aplicação dos recursos dessas
entidades não transparece à sociedade. Isso gera incertezas, questionamentos sobre
se a finalidade pretendida com a instituição da Imunidade está sendo alcançada.
Dentre os serviços sociais, tipicamente, estatais, que vem sendo subsidiado
através da concessão da Imunidade Tributária no Terceiro Setor está a educação.
Compreendendo-se a estrutura que envolve a Imunidade Tributária das instituições de
educação sem fins lucrativos, nota-se a finalidade pública quando da concessão de tal
benefício a essas entidades.
Os impostos são instituídos para que o poder público possa custear os serviços
de necessidade comum, daí eles serem cobrados de todos, indistintamente. Mas, nesse
caso, se há uma entidade de interesse social suplementando o aparato estatal com as
suas atividades, ela deve ser dispensada dos impostos, já que suas operações servem
tão somente para complementar naquilo em que o Estado não está, suficientemente,
oferecendo os serviços públicos.
Ao conceder o benefício da imunidade, o Estado brasileiro impôs uma condição:
a instituição deve comprovar que é sem fins lucrativos. E através do art. 14 do CTN,
foram estabelecidos requisitos pelos quais foram disciplinados como identificar tais
caracteres. Ademais, pelo que também consta no referido dispositivo legal, a
Contabilidade é o instrumento para comprovar tal condição.
Desse modo, a Contabilidade nas instituições sem fins lucrativos que gozam da
imunidade tem essa missão de retratar se ela atende aos requisitos, que são
condicionantes para usufruto do benefício fiscal.
O controle que a Contabilidade exerce sob o patrimônio das instituições interessa
aos seus usuários internos para auxiliá-los na gestão, visando acompanhar o seu
desempenho, buscando torná-la sempre mais eficiente. Mas, ela ganha ainda mais
105
relevância, quando está se falando da Contabilidade de uma instituição sem fins
lucrativos que goza da Imunidade Tributária. Neste caso, os recursos que ela recebe
são considerados bens públicos, por isso deve haver a transparência de como se dá as
suas aplicações.
Além disso, a Contabilidade com seus instrumentos pode ser um importante
meio de fortalecer a cidadania. Isso porque, atualmente, ela é o elo de comunicação
entre as entidades e os seus usuários. O acompanhamento, a fiscalização das
entidades do Terceiro Setor pela sociedade é possibilitada pelas informações
produzidas pela Contabilidade. De fato, a Contabilidade é um importante instrumento de
comunicação, atuando em retratar aos usuários através dos seus relatórios como está
decorrendo a gestão das organizações.
Por outro lado, a questão do respeito aos requisitos sem fins lucrativos,
interessa, fundamentalmente, ao Governo para verificar se as condições estabelecidas
estão sendo cumpridas. Se não estão conforme orienta o art. 14 do CTN, seus agentes
fiscais, utilizam-se da Contabilidade para fundamentar a cobrança dos impostos não
recolhidos.
Conforme foi apresentado no trabalho, para atingir as suas finalidades, a
Contabilidade deve ser feita sob critérios uniformes, de acordo com padrões préestabelecidos. No Brasil, é o CFC que estabelece todo o regramento que deve ser
seguido por todas as organizações, sejam elas públicas ou privadas, não descartando a
orientação da doutrina contábil,
Para examinar como a Contabilidade vem sendo praticada pelas entidades
educacionais pesquisadas, com vista a identificar se elas atendem às determinações
legais e contábeis, inerentes ao alcance dos benefícios da imunidade tributária, adotouse uma abordagem qualitativa com a condução de Estudo de Caso nas Associações
Delta e IBIN, Instituições de Educação sem Fins Lucrativos.
O referencial teórico utilizado foi constituído com base em pesquisa bibliográfica
sobre a contextualização do Terceiro Setor no Brasil, assim como as suas
características, das Associações e os benefícios de ordem tributária e a Contabilidade a
elas aplicáveis.
106
Pelos resultados apurados na pesquisa, verificou-se que uma das entidades
pesquisadas, a Associação Delta, a despeito de elaborar a sua Contabilidade, não o faz
de forma correta. Seus relatórios não retratam os fatos corretamente. Há omissões de
registros, o que a tornam imprópria para a utilização de qualquer usuário. Confrontando
com os modelos estabelecidos através da NBCs do CFC, e os preceitos inerentes aos
Princípios
Fundamentais
de
Contabilidade,
detectam-se
irregularidades
nos
procedimentos contábeis, além da distribuição implícita de resultados ficou claro pela
análise que a entidade aplicou recursos em finalidades, distintas dos objetivos
institucionais não atendendo, com isso, aos requisitos do art. 14 do CTN.
Já com relação à Associação IBIN, verificou-se que a sua Contabilidade está
regular, seus relatórios estão refletindo a realidade da entidade, servindo plenamente
aos objetivos para os quais foram elaborados, não apresentando qualquer divergência
em relação às NBCs e aos Princípios Contábeis. Além disso, ficou comprovado através
da Contabilidade que os recursos dessa entidade estão sendo geridos corretamente,
concluindo-se que ela está cumprindo plenamente aos requisitos do art. 14 CTN.
Confirmou-se, com isso, que a Contabilidade tem os instrumentos suficientes
para comprovar a regularidade ou a irregularidade ante ao que está estabelecido no art.
14 do CTN.
Pelo que restou comprovado como resultado da pesquisa, a Contabilidade é um
instrumento eficaz no controle das entidades, pois dispõe de ferramentas necessárias
para controlar o patrimônio das instituições do Terceiro Setor, podendo-se através dela,
confirmar se a instituição é “Associação de Educação Sem fins Lucrativos”, para fins de
usufruto da Imunidade Tributária.
Recomendação
Conforme mencionado anteriormente, este trabalho reconhece suas limitações,
sugerindo uma investigação mais ampla, trabalhando-se, por exemplo, com outras
Associações, incluindo até as Fundações existentes em Manaus. Dado ao fato das
entidades pesquisadas terem sido selecionadas através de amostragem por
conveniência, isso não representa, corretamente, toda a população de Associações de
107
Educação em Manaus. Dessa forma, recomenda-se o aprofundamento do estudo do
tema, assim poder-se-ia traçar um diagnóstico mais amplo e consistente acerca da
importância da Contabilidade no controle da Imunidade Tributária no Terceiro Setor.
108
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1 INTRODUÇÃO