PROGRAMA DINHEIRO DIRETO NA ESCOLA PROGRAMA DINHEIRO DIRETO NA ESCOLA Uma proposta de redefinição do papel do Estado na educação? Profª Drª Vera Maria Vidal Peroni | Coordenadora Geral Profª Drª Theresa Adrião | Coordenadora Brasília-DF 2007 Coordenadora-Geral de Linha Editorial e Publicações (CGLP) Lia Scholze Coordenadora de Produção Editorial Rosa dos Anjos Oliveira Coordenadora de Programação Visual Márcia Terezinha dos Reis Editor Executivo Jair Santana Moraes Revisão Zippy Comunicação Ltda. Projeto gráfico, diagramação e arte final Marcos Hartwich Capa Raphael Caron Freitas Tiragem 1.000 exemplares Editoria Inep/MEC – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Anexo I, 4º Andar, Sala 418, CEP: 70047-900 – Brasília-DF – Brasil Fones: (61)2104-8438, (61)2104-8042 – Fax: (61)2104-9812 – [email protected] Distribuição Inep/MEC – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Anexo II, 4º Andar, Sala 414, CEP: 70047-900 – Brasília-DF – Brasil Fone: (61)2104-9509 – [email protected] – www.inep.gov.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Programa Dinheiro Direto na Escola : uma proposta de redefinição do papel do Estado na educação? / Vera Maria Vidal Peroni, coordenadora geral. – Brasília : Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007. 204 p. ISBN 85-86260-42-8 1. Programa Dinheiro Direto na Escola. 2. Recursos federais. 3. Escola pública. 4. Sistema municipal de ensino. I. Peroni, Vera Maria Vidal. CDU 37.014.543 Sumário Equipes de Pesquisa ............................................................................................. 7 Relação de Siglas e Abreviaturas ......................................................................... 11 Lista de Quadros e Tabelas ................................................................................. 17 Introdução .............................................................................................................. 21 1 O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) .................................................. 29 2 Marco referencial para análise .......................................................................... 39 2.1 Mudanças na configuração do Estado brasileiro ................................ 39 2.2 Público não-estatal: implicações para a escola pública brasileira ............................................................................................ 40 2.3 O Estado na berlinda: o diagnóstico da crise e estratégias hegemônicas para sua superação ..................................................... 42 2.4 O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e a reforma do Estado ...................................................................... 49 2.5 Participação, autonomia e descentralização: a gestão democrática da escola e as orientações políticas nos anos 90 ............................. 52 2.6 Implicações do PDDE para a gestão escolar ...................................... 56 Programa Dinheiro Direto na Escola 5 3 Estudos de caso ................................................................................................ 65 3.1 Estado do Pará ................................................................................... 65 3.2 Estado do Piauí .................................................................................. 81 3.3 Estado do Mato Grosso do Sul .......................................................... 96 3.4 Estado de São Paulo ......................................................................... 111 3.5 Estado do Rio Grande do Sul ........................................................... 129 4 Análise dos casos .............................................................................................. 151 4.1 Caracterização das unidades executoras ............................................ 151 4.2 Relação entre os entre Federados e Estado/sociedade .................... 157 4.3 O impacto financeiro do PDDE nas escolas da amostra ................... 159 4.4 Democratização da gestão .................................................................. 164 4.5 Execução do Programa ....................................................................... 167 4.6 Principais problemas, vantagens e sugestões de acordo com os sujeitos da pesquisa .................................................................... 173 5 Considerações finais .......................................................................................... 179 6 Referências bibliográficas .................................................................................. 189 6 Programa Dinheiro Direto na Escola Equipes de Pesquisa 1 - Região Norte/Estado: Pará Coordenadora Estadual Profª. Drª Terezinha Fátima Andrade Monteiro dos Santos (Universidade Federal do Pará – UFPA) Professores(as) Pesquisadores(as) Profª. Msc. Dalva Valente Guimarães Gutierres (Professora da UFPA) Msc. Luizete Cordovil Ferreira da Silva (Aluna do Mestrado) Pedagoga Cristiane Silva de Almeida (Aluna da Especialização em Gestão da UFPA) Fabíola Bouth Grello (Aluna da Especialização em Gestão UFPA) Lana Emília Almeida Rosas (Aluna da Especialização em Gestão da UFPA) Alunos(as) envolvidos(as) Bárbara Márcia da Piedade da Silva (Universidade Federal do Pará – UFPA) Denise de Souza Nascimento (Universidade Federal do Pará – UFPA) Programa Dinheiro Direto na Escola 7 Heloisa Helena Meirelles Bahia (Universidade Federal do Pará – UFPA) 2 - Região Nordeste/Estado: Piauí Coordenadora Estadual Rosana Evangelista da Cruz (Universidade Federal do Piauí – UFPI) Professores(as) Pesquisadores(as) Prof. Ms. Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves (Universidade Federal do Piauí – UFPI) Profª Ms. Liliene Xavier Luz (Universidade Estadual do Piauí – Uespi) Aluna envolvida Samara de Oliveira Silva (Bolsista UFPI/Fapepi) 3- Região Centro-Oeste/Estado: Mato Grosso do Sul Coordenadora Estadual Profª Drª Regina Tereza Cestari de Oliveira (Universidade Católica Dom Bosco) Professora Pesquisadora Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini (Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul) Aluna envolvida Paula Priscila Bentos Ribeiro (Bolsista IC-CNPq Universidade Católica Dom Bosco) 4 - Região Sudeste/Estado: São Paulo Coordenadora Estadual Profª Drª Theresa Adrião (Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho – Unesp) Professoras Pesquisadoras Profª Drª Teise de Oliveira Guaranha Garcia (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – USP/RP) Profa. Dra. Áurea de Carvalho Costa (Universidade Júlio de Mesquista Filho – Rio Claro) Alunas envolvidas Rochelle Cristina Pegoraro (Universidade Júlio de Mesquista Filho – Rio Claro) 8 Programa Dinheiro Direto na Escola Egle Bezerra (Universidade Júlio de Mesquista Filho – Rio Claro) 5 - Região Sul/Estado: Rio Grande do Sul Coordenadora Estadual Profª Drª Vera Maria Vidal Peroni (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Mestrandas Maria Otilia Kroeff Susin (Mestre em Educação Ppgedu/UFRGS) Josiane Carolina Soares Ramos (aluna do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS) Alunos(as) envolvidos(as) Juliana Selau Lumertz (Bolsista CNPq/UFRGS) Fabiana Soares Mathias (Bolsista BIC/UFRGS) César Martinez (Bolsista BIC/UFRGS) José Rodrigo Pereira Saldanha (Bolsista BIC/UFRGS) Apoio: Edital Universal CNPq Programa Dinheiro Direto na Escola 9 Relação de Siglas e Abreviaturas A ABE – Associação Beneficente Educacional ACPM/Federação – Associação de Círculo de Pais e Mestres Apae – Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais Assepla – Assessoria de Planejamento, Finanças, Manutenção e Engenharia B Bird – Banco Interamericano de Reconstrução e Desenvolvimento BM – Banco Mundial C Cade – Centro de Atendimento e Desenvolvimento do Excepcional CCJ – Comissão de Constituição e Justiça CD – Conselho Deliberativo CE – Conselho Escolar CECDCT – Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia CEE – Conselho Estadual de Educação Ceee/RS – Companhia Estadual de Energia Elétrica do Rio Grande do Sul Cefam – Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério Programa Dinheiro Direto na Escola 11 Cefet – Centro Federal de Educação Tecnológica Ceinf – Centro de Educação Infantil CEM – Conselho Municipal de Educação Cenp – Coordenadoria de Estudos e Normas Cepal – Comissão Econômica para a América Latina e Caribe Cepro – Fundação Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Piauí Cesupa – Centro de Estudos Superiores do Pará CF – Constituição Federal CGC – Cadastro Geral de Contribuintes CIE – Centro de Informações Educacionais CLT – Consolidação das Leis do Trabalho CME/POA – Conselho Municipal de Educação de Porto Alegre CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Coafin – Coordenação Financeira Coredes – Conselhos Regionais de Desenvolvimento CPERS/Sindicato – Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul CPF – Cadastro de Pessoas Físicas CPM – Círculo de Pais e Mestres CPMF – Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira CRE – Coordenadorias Regionais de Educação CTG – Centro de Tradições Gaúchas D DE – Diretoria de Ensino Demec – Delegacia do Ministério da Educação Deplan – Departamento de Planejamento E EE – Escola Estadual EEx – Entidade Executora EF – Ensino Fundamental EI – Educação Infantil EJA – Educação de Jovens e Adultos EM – Escola Municipal Emeif – Escola Municipal de Educação Infantil EPA – Escola Municipal de 1º Grau Porto Alegre F Famurs – Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul Fapepi – Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Piauí Fasc – Fundação de Assistência Social e Comunitária 12 Programa Dinheiro Direto na Escola Fbesp – Fundação do Bem Estar Social do Pará FDE – Fundação para o Desenvolvimento da Educação FEE – Fundação de Economia e Estatística FEP – Ver nota 21 Fiana – Faculdades de Educação e Engenharia de Pirassununga – Faculdades Integradas Anhanguera FIC/Apae – Filantropia com Investimento Comunitário – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais Fiepa – Federação das Indústrias do Estado do Pará FMI – Fundo Monetário Internacional FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Fundef – Fundo de Desenvolvimento do Ensino fundamental e Valorização do Magistério Fundescola – Fundo de Desenvolvimento da Escola Fundesp – Fundação Esperança Funpapa – Fundação Papa João XXIII G GREs – Gerências Regionais de Educação Greppe – Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais I IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IC – Iniciação Científica Idec – Instituto de Desenvolvimento de Educação e Cultura Idese – Índice de Desenvolvimento Sócio-econômico Idesp – Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social do Planalto IDH – Índice de Desenvolvimento Humano Inep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social Iteai – Instituto de Tecnologia Aplicada à Informação J Jomeex – Jogos Municipais de Estudantes Excepcionais L LC – Lei Complementar LDB – Lei de Diretrizes e Bases LOM – Lei Orgânica do Município LSE – Levantamento de Situação Escolar Programa Dinheiro Direto na Escola 13 M Mare – Ministério de Administração e Reforma do Estado MEC – Ministério da Educação e do Desporto N Nais – Núcleos de Ação Interdisciplinar O ONGs – Organizações Não-Governamentais OP – Orçamento Participativo Oscip – Organização da Sociedade Civil Pública P Paed – Programação de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência Pape – Programa de Adequação do Prédio Escolar PAR – Plano de Aplicação de Recursos PCB – Partido Comunista Brasileiro PC do B – Partido Comunista do Brasil PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais PDDE – Programa Dinheiro Direto na Escola PDDEnet – Software para coleta e envio de dados cadastrais ao FNDE PDE – Plano de Desenvolvimento da Escola Pdrae – Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado PDT – Partido Democrático Trabalhista PES – Plano Estratégico Situacional PGM – Procuradoria Geral do Município PIB – Produto Interno Bruto PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro PMDE – Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental PME – Projeto de Melhoria da Escola PMT – Prefeitura Municipal de Teresina Pnae – Programa Nacional de Alimentação Escolar PNE – Plano Nacional de Educação PPB – Partido Progressista Brasileiro Ppgedu/UFRGS – Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul PSB – Partido Socialista Brasileiro PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira PT – Partido dos Trabalhadores 14 Programa Dinheiro Direto na Escola R RA – Regime de Adiantamento RE – Rede Estadual Reme – Rede Municipal de Ensino REX – Relação de Unidades Executoras e de Escolas Beneficiadas RM – Rede Municipal S Saresp – Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo SAS – Secretaria do Estado de Assistência Social SE – Secretaria de Educação SE/MS – Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul Seade – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados SEC/RS – Secretaria de Educação e Cultura do Rio Grande do Sul Seduc/PA – Secretaria Executiva de Educação do Estado do Pará Seduc – Secretaria do Estado da Educação SEE – Secretaria de Estado da Educação SEJA – Serviço de Educação de Jovens e Adultos Semec – Secretaria Municipal de Educação de Belém Semec – Secretaria Municipal de Educação e Cultura Senai – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial Serse – Serviço Social do Estado Sesi – Serviço Social da Indústria Setass – Secretaria de Estado de Trabalho, Assistência Social e Economia Solidária do Mato Grosso do Sul SIE – Sistemas de Informações Escolares Sintep – Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Pará SIR – Sala de Integração e Recursos SME – Sistema Municipal de Ensino Smed – Secretaria Municipal de Educação Smed – Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande SMT/POA – Sistema Municipal de Transportes de Porto Alegre Suaop/MS – Superintendência de Apoio Administrativo e Operacional de Mato Grosso do Sul SUS – Sistema Único de Saúde T TCU – Tribunal de Contas da União U UCDB – Universidade Católica Dom Bosco Uepa – Universidade do Estado do Pará Programa Dinheiro Direto na Escola 15 Uespi – Universidade Estadual do Piauí UEx – Unidade Executora UFPA – Universidade Federal do Pará UFPI – Universidade Federal do Piauí UFRA – Universidade Federal Rural da Amazônia Uges – União Gaúcha dos Estudantes Secundaristas Unama – Universidade da Amazônia Undime – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação Unesco – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura USP – Universidade de São Paulo 16 Programa Dinheiro Direto na Escola Lista de Quadros e Tabelas Quadro 1 Valor anual por escola para o ensino fundamental ............................................. 30 Quadro 2 Valor anual por escola para a educação especial ................................................ 31 Tabela 1 Comparativo dos recursos administrados pelas escolas estaduais e municipais da amostra nacional no ano de 2004 ................................................................ 160 Tabela 2 Valor aluno-ano recurso descentralizado para as escolas da amostra ............... 162 LISTA DE TABELAS POR ESTADO 1. Estado do Pará Tabela 1 Pará – Matrículas no ensino fundamental por dependência administrativa – 1996 a 2004 ....................................................................................................... 66 Tabela 2 Pará – Repasses do PDDE para a rede estadual segundo número de escolas, alunos e rubricas custeio e capital de 1996 a 2004 ............................................. 67 Tabela 3 Belém – Repasses do PDDE para a rede estadual segundo número de escolas, alunos e rubricas custeio e capital de 1999 a 2004 ............................................. 69 Programa Dinheiro Direto na Escola 17 Tabela 4 Belém – Evolução do número de unidades executoras na rede estadual – 1999 a 2004 ........................................................................................................................ 69 Tabela 5 Programa Dinheiro Direto na escola "A" recebido desde 1998 até 2004 ............ 71 Tabela 6 Recursos recebidos pela escola "A" em 2004 ..................................................... 71 Tabela 7 Atendimento do ensino básico e modalidades especiais no município de Belém por dependência administrativa – 2004 .............................................................. 74 Tabela 8 Belém – Repasses do PDDE para a rede municipal, segundo número de escolas, alunos e rubricas custeio e capital – 1997 a 2004 ............................................... 76 Tabela 9 Recursos do PDDE transferidos para a escola "B" 1999 a 2004 .......................... 78 2. Estado do Piauí Tabela 1 Processo de implantação do PDDE na rede estadual de educação do Piauí – 1997-2004 ........................................................................................................... 82 Tabela 2 Número de matrículas e recursos do PDDE recebidos pela escola "A" ............... 85 Tabela 3 Recursos descentralizados administrados pela unidade executora da escola estadual "A" .......................................................................................................... 87 Tabela 4 Processo de implantação do PDDE na rede municipal de educação de Teresina – 1999-2004 ........................................................................................................... 89 Tabela 5 Matrículas e recursos do PDDE recebidos pela escola ......................................... 91 Tabela 6 Recursos descentralizados para a escola municipal "A"...................................... 94 Tabela 7 Sistematização dos dados financeiros da Apae – Teresina-PI ............................. 95 Tabela 8 Outros recursos recebidos pela Apae .................................................................. 95 3. Estado do Mato Grosso do Sul Tabela 1 Recursos recebidos e gerados pela escola estadual .......................................... 101 18 Programa Dinheiro Direto na Escola Tabela 2 Recursos recebidos e gerados pela escola municipal ........................................ 104 Tabela 3 Recursos recebidos e gerados pela escola municipal de educação especial ...... 109 4. Estado de São Paulo Tabela 1 Dados de matrícula na educação básica por dependência administrativa no Estado de São Paulo em 2004 ...................................................................... 112 Tabela 2 Participação do Sistema Estadual de Ensino no total de matrículas no ensino fundamental – Estado de São Paulo ................................................................... 113 Tabela 3 Secretaria da Educação – Receitas Correntes ...................................................... 113 Tabela 4 Participação do PDDE (convênio FDE/ MEC – Secretaria de Educação) no total de recursos repassados às APMS .............................................................................. 118 Tabela 5 Recursos destinados à Associação de Pais e Mestres da escola ........................ 119 Tabela 6 Pirassununga – Matrículas iniciais na rede municipal ........................................ 121 Tabela 7 Pirassununga – Repasse dos recursos do PDDE entre 1999 e 2004 ................... 126 5. Estado do Rio Grande do Sul Tabela 1 Sistematização dos dados financeiros a escola "A" – 2003-2004 ..................... 133 Tabela 2 Sistematização dos dados do sistema sobre a implementação do PDDE a 1997 a 2004 ....................................................................................................... 139 Tabela 3 Sistematização dos dados financeiros da escola "A" – 2001-2003 .................... 141 Tabela 4 Quadro de alunos matriculados na Apae/POA – 2003 e 2004 ............................ 142 Tabela 5 Sistematização dos Dados da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Porto Alegre Apae/ POA – 2003-2004 ........................................................... 143 Programa Dinheiro Direto na Escola 19 Intodução Este relatório apresenta os resultados da pesquisa intitulada "Programa Dinheiro Direto na Escola: uma redefinição do papel do Estado na educação?", cujo objetivo central foi analisar o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), no contexto da reforma educacional brasileira, como uma das expressões da redefinição do papel do Estado, assim como suas conseqüências para a gestão da educação. Apoiada parcialmente pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a pesquisa foi realizada no período de março de 2004 a dezembro de 2005. Buscou compreender as peculiaridades e conseqüências do PDDE, tendo em vista distintas experiências da realidade educacional brasileira ao envolver um Estado de cada região do País: Pará (Norte), Piauí (Nordeste), São Paulo (Sudeste), Mato Grosso do Sul (Centro-Oeste) e Rio Grande do Sul (Sul). Em cada Estado, equipes de pesquisadores, vinculadas a instituições de ensino superior, desenvolveram a investigação com o propósito de analisar os processos de implantação e implementação do PDDE no âmbito da gestão dos sistemas e das escolas. O Programa foi analisado tendo em vista que as estratégias do capitalismo, na tentativa de superação de sua crise estrutural (globalização, reestruturação produtiva e neoliberalismo), têm redefinido o papel do Estado, principalmente em relação às políticas sociais. No caso brasileiro, essas redefinições foram contempladas no Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado, no qual as políticas sociais deixam de ser consideradas atividades exclusivas do Estado e passam para a esfera "pública não-estatal" (Bresser Pereira, 1997, p. 7), instituída por meio da criação das organizações sociais (OS), organizações de direito privado, públicas, não-estatais. Programa Dinheiro Direto na Escola 21 Nessa direção, o Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado (Pdrae) propõe mudanças na estrutura organizacional do aparelho estatal a partir da criação de mecanismos de descentralização, de redução da estrutura hierárquica e da introdução da avaliação de resultados. É uma nova concepção de administração pública centrada nos resultados, que o Pdrae denomina de "gerencial", nos moldes empresariais, por considerar que grande parte dos males sociais advém de problemas de mau gerenciamento das instituições do Estado. Portanto, a pesquisa analisou o Programa Dinheiro Direto na Escola como parte desse movimento. De certa forma, é a materialização de como estão ocorrendo, na política educacional brasileira, as redefinições do papel do Estado, mais especificamente, as redefinições ocorridas nas propostas de financiamento e gestão escolar, frisando que temos como pressuposto que a política educacional não é simplesmente determinada pelas mudanças que estão ocorrendo na redefinição do papel do Estado, mas parte constitutiva dessas mudanças. Partiu-se, ainda, do entendimento de política educacional como política social que não se separa da política econômica, por serem parte de uma mesma totalidade – daí a necessidade de estudar-se o desenvolvimento econômico. De igual modo, não se pode analisar a política econômica descolada da política social: "a totalidade é sempre relativa, embora possa figurar em certo momento como totalidade autônoma, destinada a servir de campo para uma investigação" (Vieira, 1992, p. 21). Entende-se, ainda, que as políticas públicas, especificamente as sociais, surgem a partir de demandas sociais, de interesses político-partidários, de movimentos de lutas, entre outros, em um cenário de tensões, lutas, conflitos e negociações, próprio de uma sociedade democrática. No caso particular da pesquisa que é objeto deste Relatório, buscou-se localizar o momento em que a gestão passou a ser central no conjunto das políticas públicas para a modernização do Estado brasileiro. Nosso objetivo geral, portanto, foi analisar o Programa do governo federal Dinheiro Direto na Escola (Medida Provisória nº 2.100-31) e as implicações para a organização e o funcionamento da escola pública decorrentes da constituição de unidades executoras como entidades de direito privado nos seguintes Estados: Rio Grande do Sul, São Paulo, Piauí, Pará e Mato Grosso do Sul. Nossos objetivos específicos foram: 1. Compreender a natureza do Programa do governo federal Dinheiro Direto na Escola (PDDE); 2. Analisar as conseqüências da implantação/implementação do Programa do governo federal Dinheiro Direto na Escola para a organização e a gestão dos "sistemas" educacionais de cada Estado envolvido no que se refere a: - alterações na natureza e dinâmica dos processos decisórios no interior de cada sistema; - produção de mecanismos de fiscalização para o repasse financeiro do Programa; 22 Programa Dinheiro Direto na Escola 3. Analisar as conseqüências da implantação/implementação do Programa Dinheiro Direto na Escola para a organização e a gestão democrática da escola pública no que se refere a: - alterações nas práticas decisórias e no locus onde tais práticas se desenvolvem; - envolvimento dos diferentes segmentos escolares nos processos decisórios e possíveis alterações na dinâmica da participação; - existência de diferentes configurações para as unidades executoras nos diferentes Estados e suas conseqüências para a gestão escolar; 4. Estudar as conseqüências financeiras do Programa, particularmente com relação a: - alteração do custo-aluno, a partir da análise das quantias e responsabilidades que passaram a ser administradas pela própria escola em relação ao custeio das rubricas transferidas quando ainda sob responsabilidade do órgão central; - prioridades de investimento com os recursos descentralizados; 5. Analisar as peculiaridades regionais do Programa Dinheiro Direto na Escola com base nos estudos de cada Estado. A concepção metodológica que norteou o desenvolvimento da pesquisa levou em consideração a importância das peculiaridades regionais, as relações de força manifestas e as especificidades presentes na materialização de uma política governamental. Dessa forma, considerou-se imprescindível para a realização do estudo a participação de pesquisadores de diferentes Estados. Atendendo a essa exigência metodológica, a pesquisa contou com um Estado de cada região brasileira, adotando os seguintes procedimentos: - Seleção e leitura de bibliografia relacionada ao objeto de estudo; - levantamento, organização e análise de documentos oficiais relativos à criação e regulamentação do Programa PDDE na esfera federal, estadual e nos municípios envolvidos; - entrevistas com representantes do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e Ministério da Educação (MEC) que participaram da elaboração do Programa ou de sua implementação; - entrevistas com componentes do corpo técnico de cada sistema de ensino em estudo, responsáveis por acompanhar a implantação do PDDE; - estudo, em cada um dos Estados, em duas escolas de ensino fundamental, uma vinculada à rede estadual e outra à rede municipal, e em uma unidade de educação especial no RS, no PI e no MS por meio de: • entrevistas a partir de roteiro elaborado a fim de que os pesquisadores mantivessem parâmetros mínimos para proceder à análise do conjunto Programa Dinheiro Direto na Escola 23 de casos. Todavia, buscou-se, nas entrevistas, preservar as condições para que as peculiaridades locais fossem registradas. Foram entrevistados representantes de todos os segmentos integrantes das unidades executoras e do Conselho de Escola ou Colegiado Escolar, quando foi o caso; • participação em reuniões das unidades executoras ou em outras instâncias coletivas de decisão; análise de atas e outros documentos relacionados à gestão da unidade escolar e ao PDDE; e • reuniões nacionais nas quais foram desenvolvidos os seguintes aspectos: discussão do referencial teórico; elaboração dos instrumentos de pesquisa; socialização dos dados de cada Estado; análise dos dados; produção do relatório técnico-científico. Desse modo, por meio do estudo dos cinco casos escolhidos intencionalmente, tendo em vista o propósito da pesquisa de apropriar-se das características do Programa nas diversas regiões do Brasil, buscamos, ao mesmo tempo em que analisávamos cada situação, ainda que sem intenções de generalizações (Stake, 1983), relacionar os casos estudados com o contexto em que se apresentaram. Isso porque, como em Rockwell (1986, p. 47), se entende, neste trabalho, que o fenômeno eleito para a investigação deva ser percebido a partir de suas relações com o contexto social mais amplo e não apenas em função de suas relações internas (Luckács, 1967). Metodologicamente, isto implica, por um lado, complementar a informação de campo com informações relativas a outras ordens sociais (por exemplo, a estrutura e política educacionais do país) e, por outro lado, buscar interpretações e explicações a partir de elementos externos à situação particular. Desse modo, não se realizam estudos de caso, mas estudos sobre casos (Rockwell, 1986, grifos meus). Observe-se que a ética na coleta das informações foi contemplada, entre outros procedimentos, pela realização de entrevistas somente mediante o consentimento prévio dos entrevistados e pelo respeito às opções de anonimato, quando foi o caso. A utilização de áudio somente ocorreu com a autorização específica dos participantes. A adesão à pesquisa foi voluntária. Por fim, vale ressaltar que os dados empíricos sobre a execução do PDDE utilizados para compor as comparações e sustentar as reflexões presentes neste Relatório sobre os diferentes sistemas/redes são relativos ao ano de 2004, ainda que se complementem com dados e informações anteriores na medida em que se quer relacionar aspectos da implantação e gestão do Programa. Diante do exposto, este Relatório está organizado em quatro capítulos, assim configurados: o primeiro capítulo descreve o Programa, desde a sua implantação até o ano de 2004. No segundo capítulo, é apresentado o marco teórico da pesquisa, enfatizando os eixos de análise Estado e Políticas Públicas e Gestão Democrática na Escola e no Sistema. O capítulo está constituído por parte dos textos elaborados pelas equipes e debatidos nas reuniões nacionais. O terceiro capítulo é composto pelos estudos de caso realizados nos Estados da amostra. 24 Programa Dinheiro Direto na Escola No quarto capítulo, faz-se a análise, com base nas experiências estaduais e municipais, enfocando os principais aspectos que sistematizam os resultados da pesquisa: caracterização das unidades executoras; relação entre os entes federados; impactos financeiros nas escolas da amostra; democratização da gestão; execução do Programa; e principais problemas, vantagens e sugestões, de acordo com os sujeitos da pesquisa. Nas considerações finais, apresentamos uma síntese a partir do marco referencial de análise e dos pontos que se destacaram no decorrer da pesquisa, como: a relação público/privado, a gestão democrática e a descentralização/centralização. Programa Dinheiro Direto na Escola 25 1 O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) O objetivo deste item é descrever o processo de criação, implantação e implementação do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), apontando as alterações expressas na legislação referente ao Programa ao longo do período de 1995 a 2005. O governo federal criou, em 1995, o Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (PMDE), com denominação alterada para Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), pela Medida Provisória nº 1.784, de 14 de dezembro de 1998, reafirmada pela Medida Provisória nº 2.100-32, de 24 de maio de 2001, que se justifica pela necessidade de adotar medidas racionalizadoras, menos burocráticas, de modo que os recursos cheguem com mais agilidade e diretamente às escolas, conforme Resolução do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) nº 12, de 10 de maio de 1995 (Brasil, 1995). O Programa tem como objetivo repassar, diretamente às escolas públicas do ensino fundamental e organizações não-governamentais sem fins lucrativos que atuem com educação especial, dinheiro para custeio e manutenção de suas atividades, com recursos oriundos do Salário-Educação1, distribuídos pelo FNDE segundo o número de alunos matriculados. Os recursos, inicialmente, deveriam ser repassados para a Secretaria Estadual ou Municipal de Educação ou para a unidade executora das escolas, sendo 1 O salário-educação foi instituído pela Lei nº 4.440, de 27 de outubro de 1964, sendo uma contribuição social correspondente a 2,5% da folha de pagamento das empresas vinculadas à Previdência Social. Programa Dinheiro Direto na Escola 29 destinados apenas ao custeio das despesas das escolas, e poderiam ser usados na manutenção e conservação do prédio escolar, aquisição de material necessário ao funcionamento da escola, capacitação e aperfeiçoamento de profissionais da educação, avaliação da aprendizagem, implementação do projeto pedagógico, aquisição de material didático/pedagógico e desenvolvimento de atividades educacionais diversas (Brasil, 1995). A partir de 1997, com base na idéia "de que a própria comunidade é quem sabe aplicar o dinheiro para resolver os seus problemas", para que esses recursos cheguem diretamente às escolas, passa-se a exigir que cada instituição escolar crie a sua unidade executora. Em outras palavras, as escolas com mais de 99 alunos, para receberem os recursos, precisam criar, obrigatoriamente, uma unidade executora, ou seja, uma "entidade de direito privado, sem fins lucrativos, representativos da comunidade escolar (caixa escolar, conselho escolar, associação de pais e mestres, etc.), responsável pelo recebimento e execução dos recursos financeiros recebidos pelo FNDE (...)" (Brasil, 1997a). A unidade executora, portanto, "tem como função administrar recursos transferidos por órgãos federais, estaduais, municipais, advindos da comunidade, de entidades privadas e provenientes da promoção de campanhas escolares, bem como fomentar atividades pedagógicas da escola" (Brasil, 1997a, p. 11). Entre as funções específicas, estão, por exemplo, prestar assistência ao aluno carente, realizar manutenção e conservação física da escola e dos equipamentos, bem como a limpeza de suas instalações, e promover a integração escola-famíliacomunidade (Brasil, 1997a, p. 11). Isso significa que a unidade executora, além dos recursos repassados pelo Programa, deve administrar recursos provenientes de uma outra fonte, ou seja, oriundos de campanhas organizadas pela comunidade escolar. A Resolução FNDE/CD nº 12/1995 apresentou os valores totais que deveriam ser recebidos, sendo que, com a Resolução FNDE/CD nº 3 de 1997 (art. 2º), esses valores passaram a ser divididos entre despesas de custeio e de capital. Quadro 1 - Valor anual por escola para o ensino fundamental Valor anual por escola (R$ 1,00) Número de alunos por escola De 21 a 50 De 51 a 100 De 101 a 250 De 251 a 500 De 501 a 750 De 751 a 1.000 De 1.001 a 1.500 De 1.501 a 2.000 Mais de 2.000 Regiões N, NE e CO* Custeio Capital Total Custeio Capital 600 1.300 2.300 3.200 5.300 7.500 8.600 12.000 16.000 400 700 1.000 1.400 1.700 2.400 3.000 600 1.300 2.700 3.900 6.300 8.900 10.300 14.400 19.000 500 1.100 1.500 2.200 3.700 5.200 7.000 8.000 12.000 300 500 800 1.000 1.200 2.000 2.500 Fonte: Resolução FNDE/CD nº 3, de 1997. (*) Exceto o Distrito Federal. 30 Regiões S, SE e DF Programa Dinheiro Direto na Escola Total 500 1.100 1.800 2.700 4.500 6.200 8.200 10.000 14.500 Com esse dinheiro, a escola pode adquirir material permanente, fazer sua manutenção e conservação, capacitar e aperfeiçoar os profissionais da educação, contratar setores para elaborar processos e indicadores de avaliação da aprendizagem, implementar seu projeto pedagógico e desenvolver atividades pedagógicas diversas (Brasil, 1997b). Como se pode verificar no Quadro 1, as Regiões Norte, Nordeste e CentroOeste recebem um valor maior do que as Regiões Sul, Sudeste e o Distrito Federal. No caso dessas últimas regiões, por exemplo, uma escola de 1.501 a 2 mil alunos recebe R$ 10 mil; se ela tiver 2 mil alunos, isso significará uma quantia de R$ 5,00 aluno/ano. Quadro 2 - Valor anual por escola para a educação especial Número de alunos por escola De 06 a 25 De 26 a 45 De 46 a 65 De 66 a 85 De 86 a 125 De 126 a 200 De 201 a 300 Mais de 300 Valor anual por escola (R$ 1,00) Custeio Capital Total 525 900 1.350 1.800 2.400 2.850 3.450 4.500 525 900 1.350 1.800 2.400 2.850 3.450 4.500 1.050 1.800 2.700 3.600 4.800 5.700 6.900 9.000 Fonte: Resolução FNDE/CD nº 3, de 1997. Apesar da exigüidade dos recursos, faz-se necessário que a unidade executora seja inscrita no Cadastro Geral de Contribuintes (CGC), do Ministério da Fazenda, para poder abrir conta bancária e participar de benefícios como subvenções e isenção do Imposto de Renda, além de assinatura de convênios com órgãos governamentais. A Resolução FNDE/CD nº 3, de 27 de fevereiro de 2003, reeditou as resoluções anteriores reafirmando que: O Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE consiste na transferência, pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, de recursos financeiros, consignados em seu orçamento, em favor das escolas públicas do ensino fundamental das redes estadual, do Distrito Federal e municipal, destinados à cobertura de despesas de custeio, manutenção e de pequenos investimentos, de forma a contribuir, supletivamente, para a melhoria física e pedagógica dos estabelecimentos de ensino beneficiários (art. 1º). Conforme a referida Resolução, os recursos financeiros devem ser repassados às escolas públicas do ensino fundamental das redes estadual, do Distrito Federal e municipal. Programa Dinheiro Direto na Escola 31 No entanto, em 27 de março de 2004, foi editada a Resolução FNDE/CD nº 10, incluindo, explicitamente, o repasse dos recursos também às instituições privadas de educação especial ao afirmar, em seu artigo 1º, que o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) consiste na transferência, pelo FNDE, de recursos financeiros consignados em seu orçamento em favor das escolas, assim especificadas: • públicas das redes estaduais, distrital e municipais no ensino fundamental, inclusive nas modalidades especial e indígena; • privadas de educação especial, mantidas por organizações não-governamentais (ONG), ou outras entidades similares, sem fins lucrativos e inscritos no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Ao definir que, por unidade executora, "entende-se a entidade ou instituição responsável pelo recebimento, execução e prestação de contas dos recursos transferidos, pelo FNDE", especificam-se essas unidades da seguinte forma: • Unidade Executora Própria (UEx) – entidade de direito privado, sem fins lucrativos, representativa da comunidade escolar dos estabelecimentos públicos de ensino públicos beneficiários do PDDE (caixa escolar, associação de pais e mestres, conselho escolar ou similar); • Entidade Executora (EEx) – prefeitura municipal e secretarias de educação estadual e do Distrito Federal, ao receberem e executarem os recursos do PDDE destinados às escolas públicas que não instituíram as UEx; • Entidade Mantenedora (EM) – organização não-governamental (ONG), ou outra entidade similar, sem fins lucrativos e inscrita no CNAS, responsável pela manutenção de escolas privadas de educação especial beneficiárias do PDDE (art. 3º, § 2º). Como se vê, modifica-se o conceito de unidade executora própria (UEx) para entidade sem fins lucrativos, representativa da comunidade escolar, assim como se modifica o conceito de entidade mantenedora (EM) para entidade sem fins lucrativos, inscritas no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), responsável pela manutenção de escolas privadas de educação especial beneficiárias do PDDE. Além disso, a Resolução FNDE/CD nº 16, de 19/4/2004, definiu que os recursos poderiam ser destinados, excepcionalmente, às escolas de ensino fundamental situadas em regiões afetadas pelo desastre natural provocado pelas fortes chuvas. Os recursos transferidos, à conta do PDDE a Título Emergencial, destinam-se à cobertura de despesas de custeio, de forma a contribuir, supletivamente, para a recuperação física e pedagógica dos estabelecimentos de ensino afetados por desastre natural provocado por inundações, com vistas à consecução dos objetivos de recondução e promoção da normalidade do ambiente escolar (art. 2º). No que se refere aos recursos destinados às escolas pelo PDDE, destaca-se que, de 1995 a 2004, não houve qualquer acréscimo na tabela de repasse dos 32 Programa Dinheiro Direto na Escola recursos às escolas. O dinheiro continuou a ser repassado uma vez por ano, tendo como base o número de alunos matriculados no ensino fundamental, extraído do Censo Escolar do ano anterior. Porém, a Resolução FNDE nº 10, de 22/3/2004, art. 5º, alterou a tabela de repasses, acrescentando um fator moderador/fator de correção ao número de alunos matriculados, visando contornar as disparidades verificadas nos repasses para escolas de mesma classe, com matrículas diferenciadas, consistindo em R$ 1,30 por matrícula excedente entre o maior e menor número da mesma classe. A nova fórmula de calcular assegura um valor base por escola, segundo sua classificação nos intervalos de classe de número de alunos, acrescendo-se o produto da constante K pelo número de alunos obtido da diferença entre a quantidade real de discentes e o limite inferior de cada classe, obedecendo a localização da escola, segundo as regiões brasileiras2. Por exemplo, uma escola no Estado do Acre, com 701 alunos matriculados, deve receber R$ 8.900,00 + (701 – 501) x K. Portanto, pela nova forma, o valor a ser repassado à escola aumentou o equivalente à parcela de (701 – 501) x K (Paz, 2005, p. 42). Paz (2005, p. 43) acentua outra grande novidade do Programa, definida em 2003 e implementada também em 2004, ou seja, a prerrogativa de a escola programar os valores que tem direito a receber, segundo as categorias econômicas de custeio e de capital. Esta medida veio ao encontro dos interesses dos estabelecimentos de ensino e tem a finalidade de aumentar a autonomia da gestão financeira da escola, propiciando-lhes melhores condições de planejamento do emprego do dinheiro e, desta forma, visa contribuir para o aumento da racionalidade do emprego dos recursos. Além destas inovações mais recentes, uma conquista singular foi a prerrogativa de reprogramação de saldos. A possibilidade de utilização dos saldos no exercício seguinte contribuiu para a racionalidade do emprego dos recursos, uma vez que possibilitou a aquisição de bens e a contratação de serviços tempestivamente. Com relação às fontes de recursos para o PDDE, verifica-se, em 2004, conforme dados sistematizados pela Diretoria Financeira do PDDE, a seguinte distribuição: contribuição do Salário-Educação (23%); produto da aplicação dos recursos à conta do Salário-Educação (15%); contribuição do Salário-Educação referente à contrapartida de empréstimos internacionais (37%); e produto da aplicação dos recursos à conta do Salário-Educação das contrapartidas (24%) (Gonçalves, Cruz, Luz, 2004, p. 134-135). Assim, dois aspectos são relevantes e merecem destaque: 1) o alto porcentual de recursos advindos das aplicações do Salário-Educação e 2) a utilização de parte dos recursos do Salário-Educação como contrapartida de empréstimos internacionais (Gonçalves, Cruz, Luz, 2004, p. 134). 2 A diferença de valores pagos às escolas, segundo a localização do estabelecimento de ensino nas regiões brasileiras, segue determinação legal de redistribuição dos recursos educacionais oriundos da Contribuição Social do Salário-Educação, com vistas à promoção da redução das desigualdades regionais. Programa Dinheiro Direto na Escola 33 A Resolução FNDE/CD nº 17, de 9 de maio de 2005, estabeleceu, em seu artigo 4º, que as escolas públicas receberão os recursos financeiros do PDDE em parcela única anual. As principais mudanças introduzidas no PDDE pela referida Resolução podem ser sintetizadas da seguinte forma: • as escolas públicas com até 50 alunos, que não possuírem unidade executora própria (UEx), receberão recursos por intermédio da entidade executora (EEx) – prefeitura municipal e secretarias estaduais de educação e do Distrito Federal (art. 4º, inciso I). • as escolas públicas acima de 50 alunos receberão os recursos por intermédio da unidade executora própria (UEx); e • as escolas públicas com até 99 alunos é facultada a formação de consórcio de modo a constituírem uma única UEx que as represente, desde que as unidades escolares sejam integrantes da mesma rede de ensino. No entanto, os consórcios constituídos até 2003, poderão continuar com até 20 escolas, porém, os consórcios constituídos em 2004 e os que vierem a ser constituídos, a partir da publicação dessa Resolução, somente poderão congregar, no máximo, cinco escolas, com o fim de constituir uma única UEx; (art. 4º, inciso III, alínea b). • as escolas públicas, com mais de 50 alunos, deverão, obrigatoriamente, destinar, do montante recebido, 20% à cobertura de despesas de capital e 80% à cobertura de despesas de custeio (art. 5º, § 2º), isso no caso de não terem informado, ao FNDE, na fase de adesão ao PDDE, os porcentuais de recursos que desejarão receber, no exercício seguinte ao da informação, em custeio ou capital, ou em ambas as categorias econômicas (art. 5º, § 4º); • as escolas públicas, com até 50 alunos, que não possuírem UEx somente receberão recursos destinados à cobertura de despesas de custeio (art. 5º, § 4º). Verifica-se, também, que a Resolução excluiu a possibilidade de as escolas poderem aplicar os recursos para capacitação e aperfeiçoamento de profissionais da educação. Um ponto ainda a ser considerado é o que estabelece o art. 18 da Resolução, ou seja, os repasses do PDDE, no caso de falta de apresentação da prestação de contas por culpa ou dolo dos gestores das unidades executoras sucedidas, somente serão restabelecidos se, além de os dirigentes sucessores apresentarem, ao FNDE, cópia autenticada de representação contra os antecessores no respectivo órgão do Ministério Público, a autarquia tiver instaurado as correspondentes Tomadas de Contas Especiais. Finalmente, os dados da execução do PDDE mostram que em 1995 havia 11.643 unidades executoras, sendo 7.017 em escolas estaduais, 4.626 em escolas municipais e nenhuma ONG, atendendo 28.350.299 alunos, correspondendo ao montante de R$ 229.348.000. Enquanto 132.663 escolas não tinham unidade executora. Em 2004, atinge o número de 75.056 unidades executoras, sendo 27.041 estaduais, 48.015 municipais e 1.587 ONG, enquanto 40.677 escolas não têm unidade executora, atendendo 29.543.278 alunos, correspondendo a 34 Programa Dinheiro Direto na Escola R$ 257.744.278. Isso significa um crescimento da adesão de escolas ao Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) (www.fnde.gov.br. Acesso em 20 nov. 2005). Programa Dinheiro Direto na Escola 35 2 Marco referencial para análise Neste capítulo, apresentamos, em forma de fragmentos de artigos, o material de análise produzido pelo grupo de pesquisadores para os seminários e reuniões nacionais realizados no desenvolvimento da pesquisa, com o objetivo de construir o necessário subsídio teórico para proceder à análise dos dados. Acreditamos que, dessa maneira, além de sistematizar o campo teórico a partir do qual analisamos o material empírico, ilustramos a dinâmica adotada pelo grupo de pesquisadores para a elaboração desse mesmo campo teórico, tendo em vista a construção de consensos, ainda que provisórios, a respeito dos seguintes temas: • Mudanças na configuração do Estado brasileiro; • Políticas para a gestão da educação: - no âmbito dos sistemas educacionais; - no âmbito das escolas públicas, tendo em vista o previsto pelo PDDE. O período priorizado para o enquadramento da análise dos temas acima corresponde, em linhas gerais, aos anos de 1995-2004, sem que se ignorem as prévias condições históricas que certamente influíram nas tendências ressaltadas em nossas produções. 2.1 Mudanças na configuração do Estado brasileiro Dada a centralidade dessa questão para a própria elaboração do projeto de pesquisa e, conseqüentemente, para a contextualização do PDDE no campo Programa Dinheiro Direto na Escola 39 das alterações político-institucionais percebidas no período entre meados dos anos 90 e início do século XXI, os primeiros trabalhos produzidos pelos pesquisadores envolvidos apresentaram esforços de sistematização dessa problemática. Por essa razão, apresentamos alinhavos das produções do grupo de pesquisa sobre a temática, cujo referencial teórico básico, mesmo mantendo-se constante desde a proposição da pesquisa, foi ampliado e refinado com as contribuições de todos os envolvidos. É por isso que iniciamos este tópico com a transcrição de parte da produção de Oliveira (2004), de forma a pautar o entendimento das mudanças nas relações entre Estado e sociedade civil induzidas pelas políticas governamentais adotadas no período. Estas, por sua vez, têm seus fundamentos retratados em fragmento de artigo de Peroni e Adrião (2005) que traz as matrizes teóricas que fundamentam a constituição da esfera pública não-estatal em que se insere o Programa aqui analisado. Em seguida, reproduzimos parte do material elaborado por Gonçalves, Luz e Cruz (2004), que relaciona o PDDE às reformas observadas no Estado brasileiro. Por fim, apresentamos, a partir das contribuições de Adrião, Costa e Garcia (2004) e de Santos, Gutierres e Dias (2004), reflexões sobre as características e tendências de alterações na gestão da educação deflagradas no período analisado e a maneira como tais alterações se expressam na proposta de gestão escolar que se encontra associada ao PDDE. 2.2 Público não-estatal: implicações para a escola pública brasileira3 O primeiro ponto a esclarecer refere-se à própria compreensão do que seja a "esfera do público". Recorre-se, inicialmente, ao Novo Dicionário Aurélio e verifica-se que o adjetivo público expressa: "do ou relativo, ou procedente, ou destinado ao povo, à coletividade; que serve para uso de todos; comum; relativo à governança de um país; manifesto; notório". Enquanto o adjetivo privado designa: "que não é público; particular; favorito; confidente". Diante desses significados, o termo público, que se origina do latim publicu, refere-se ao que é popular, aos interesses coletivos. O termo privado, por sua vez, do latim privatu, assume o sentido de negação em relação ao primeiro e, assim, opõe-se ao público. As categorias público e privado, de origem grega, alteram-se ao longo dos diferentes períodos históricos, que expressam concepções de mundo distintas. Com a constituição da sociedade moderna, a categoria histórica público assume um outro significado, ou seja, relacionado ao poder público, que é o Estado. Cabe esclarecer, também, qual o sentido em que se toma aqui o termo Estado. Trata-se do Estado enquanto instituição formada na modernidade para gerir o modo de produção capitalista, ou seja, inserido em um projeto determinado de sociedade que nasce da decadência do modo de produção feudal: 3 Este item constitui-se em parte do artigo de OLIVEIRA, R. T. C. Público não-estatal: implicações para a escola pública brasileira. In: JORNADA DO HISTEDBR: História e Historiografia da Educação: abordagens e práticas educativas, 4. [Anais...]. Ponta Grossa: UEPG, 2004. p.1-15. 1CD-ROM. ISBN 85-86941-39-5. 40 Programa Dinheiro Direto na Escola O Estado moderno, ou o Estado nacional constitui-se com as tarefas de definir, ampliar e consolidar sua base territorial, o país; de instituir e fixar no país a nação, sua base humana, considerando-lhe unidade; de estabelecer, como cimentos dessa unidade, a língua, a cultura e a educação, tornando-as orgânicas em relação ao todo nacional; e de fornecer a legitimidade institucional da sociedade, considerada em seus aspectos políticos, econômicos e propriamente sociais, mediante o ordenamento jurídico (Castanho, 2001, p. 22-23). No sentido moderno, o Estado constitui-se na organização da sociedade para a produção capitalista, abarcando, em uma dimensão ampla, o conjunto dos organismos públicos e privados de dominação burguesa. Esse entendimento corresponde à concepção ampliada de Estado desenvolvida por Gramsci (1984), segundo a qual "Estado = sociedade política + sociedade civil, isto é, hegemonia revestida de coerção". Assim, a noção geral de Estado abrange a sociedade política, correspondendo basicamente ao núcleo governamental que exerce o domínio legal por meio dos mecanismos de coerção sobre toda a sociedade, bem como a sociedade civil, compreendendo os aparelhos privados de hegemonia. Segundo o pensador italiano, permanecemos sempre no terreno da identificação de Estado e de governo, identificação que não passa de uma reapresentação da forma corporativo-econômica, isto é, da confusão entre sociedade civil e sociedade política, pois se deve notar que na noção entram elementos que também são comuns à sociedade civil4. Nesse sentido, deve-se entender Estado além do aparelho governamental, também o aparelho "privado" de "hegemonia" ou sociedade civil (Gramsci, 1984, p. 147-149). A sociedade política tem por função o exercício da coerção, da manutenção, pela força, da ordem estabelecida. Porém, ela não se restringe ao simples domínio militar, mas igualmente ao governo jurídico enquanto força "legal". A sociedade civil, por sua vez, é um conjunto complexo e constitui organizações que assumem a forma de "partidos"5, ou seja, "trata-se efetivamente de partes da sociedade que constituem agrupamentos com interesses comuns que se organizam para a defesa e ampliação de seus interesses" (Saviani, 1987, p. 17). 4 Gramsci (1984, p. 75) constata que: “No Oriente, o Estado era tudo, a sociedade civil era primitiva e gelatinosa; no Ocidente, havia entre o Estado e a sociedade civil uma justa relação e em qualquer abalo do Estado imediatamente descobria-se uma poderosa estrutura da sociedade civil. O Estado era apenas uma trincheira avançada, por trás da qual se situava uma robusta cadeia de fortalezas casamatas; em medida diversa de Estado para Estado, é claro, mas exatamente isto exigia um acurado reconhecimento do caráter nacional”. 5 É indispensável considerar, também, a concepção gramsciana de "partido" em sentido ampliado, estabelecendo a distinção entre "partidos políticos" e "partidos ideológicos". O partido político é entendido "como organização prática (ou tendência prática), isto é, como instrumento para a solução de um problema ou de um grupo de problemas da vida nacional e internacional". O partido ideológico, por sua vez, é o partido como "ideologia geral, superior aos vários agrupamentos mais imediatos" (Gramsci, 1987, p. 204-205). O partido político corresponde ao organismo da sociedade civil que se relaciona diretamente com a sociedade política, tendo em vista a posse, o controle ou a fiscalização do aparelho governamental. Já a própria base da sociedade civil é formada pelos partidos ideológicos, estando entre eles: a imprensa, as editoras, as igrejas, as associações culturais, profissionais ou comunitárias, as escolas públicas e privadas que se relacionam indiretamente com a sociedade política por meio dos partidos políticos. Programa Dinheiro Direto na Escola 41 "Na estrutura de massa das democracias modernas, tanto as organizações estatais como o complexo de associações na vida civil constituem para a arte política o mesmo que as 'trincheiras' e as fortificações permanentes da frente na guerra de posição" (Gramsci, 1984, p. 92). Dessa forma, fica evidente que a sociedade política é constituída pelo conjunto dos organismos públicos mantidos pelo Estado (sociedade política). Segundo essa concepção, o governo não se confunde com o Estado, na medida em que não constitui o Estado no todo. Já a sociedade civil abarca o conjunto dos aparelhos privados de hegemonia, tanto da classe dominante quanto da classe trabalhadora. Saviani (1985, p. 15) alerta-nos que, na sociedade contemporânea, delimitar os conceitos de "esfera pública" e de "esfera privada" requer certo cuidado, pois, na sociedade capitalista, fundada na propriedade privada dos meios de produção, o público é sempre, ainda que de modo contraditório, privado. "Tratase, com efeito, de apresentar os interesses privados (da classe dominante) como expressão 'genuína' do interesse público (do conjunto da sociedade). Em outras palavras, trata-se de organizar o poder privado (de uma classe) na forma de poder público (o Estado)". Mas o problema de fundo é, então: o que existe de novo em torno do papel do Estado, especificamente, do Estado brasileiro e, em decorrência, do conceito de público no atual contexto histórico? 2.3 O Estado na berlinda: o diagnóstico da crise e estratégias hegemônicas para sua superação6 Parte-se do pressuposto de que a origem das mudanças propostas para a educação na década de 90 tem como substrato um diagnóstico que identifica a crise do capitalismo como resultado da crise do Estado. Esse diagnóstico é comungado por duas orientações políticas: o neoliberalismo e a "terceira via". Em ambas, a crítica à ineficácia do Estado de bem-estar social é um dos aspectos passíveis de serem generalizados. Para a teoria neoliberal, não é o capitalismo que está em crise, mas o Estado. Portanto, a estratégia adotada para a superação da crise seria a reforma do Estado por meio da diminuição de sua atuação. Em linhas gerais, segundo essa perspectiva, duas causas levaram à crise do Estado: a primeira deve-se a um excessivo gasto governamental provocado pela permanente necessidade de se legitimar por meio do atendimento às demandas da população por políticas sociais, o que causou a crise fiscal. Além disso, para essa lógica, as políticas sociais, por constituírem-se em mecanismos de distribuição da riqueza, confrontavam-se 6 Parte constitutiva de trabalho apresentado por Peroni e Adrião em Reunião Nacional da Pesquisa realizada em Porto Alegre (RS), em julho de 2004, e posteriormente publicada em forma de artigo no livro ADRIÃO, T.; PERONI, V. (Org.). O Público e o privado na educação: interfaces entre Estado e Sociedade. São Paulo: Xamã, 2005. 42 Programa Dinheiro Direto na Escola com o direito à propriedade privada, razão pela qual provocariam distorções indesejáveis nas sociedades de mercado e deveriam ser suprimidas. A segunda causa encontrava-se no papel regulador desempenhado pelo Estado na esfera econômica, prática que atrapalhava o livre andamento do mercado. Como condição para a superação de tais causas, o neoliberalismo atribuía ao mercado a capacidade de superar as falhas do Estado, inclusive tomando de empréstimo a lógica mercantil e adotando-a na gestão de instâncias estatais como forma de torná-las mais eficientes e produtivas. Uma vez que a pré-condição para a superação da crise passava pela reforma do Estado, duas eram as prescrições, tendo em vista o seu redimensionamento: a racionalização de recursos, entendida como a diminuição na extensão das políticas sociais existentes, e o esvaziamento do poder das instituições governamentais, já que as instituições democráticas, além de mais permeáveis às pressões e demandas da população, perdiam em eficiência se comparadas às de mercado. Em vista disso, o papel do Estado relativo às políticas sociais seria completamente alterado. Consoante com tais prescrições, a perspectiva neoliberal sugeria, basicamente, duas estratégias: a primeira buscava transferir a responsabilidade pela execução e pelo financiamento das políticas sociais diretamente para o mercado, por meio da privatização de setores da estrutura estatal; a segunda, no caso do que fosse mantido no âmbito do Estado, propunha a introdução da lógica mercantil em seu funcionamento. Nesse último caso, vale lembrar o incentivo a processos concorrenciais entre setores da atividade pública ou entre estes e setores privados, tanto para angariar subsídios públicos para a oferta de seus serviços, quanto para legitimar as mudanças organizacionais no interior da esfera estatal resultantes da introdução da lógica mercantil. Porém, para o êxito de tais estratégias, além do apelo ideológico que o cenário conservador do neoliberalismo tece, faz-se necessário construir um substrato teórico que legitime tais reformas. Esse substrato tem na economia neoclássica e, mais recentemente, na public choice7 seus principais propositores, cuja idéiachave seria adequar a racionalidade econômica aos processos coletivos de tomada de decisão, nos quais se inscreve a gestão da esfera pública, para diminuir as externalidades da política, uma vez que elas, forçosamente, prejudicariam a maximização de resultados. No entanto, essa adequação encontra uma limitação a priori, qual seja, a natureza dos serviços sociais, que não permitiria, sob efeito de comprometer ou mesmo inviabilizar a oferta desses serviços, a implementação irrestrita da chamada regulação pelo mercado. Isso porque a relação entre os demandatários dos serviços sociais (entendidos como agentes econômicos) e a oferta desses mesmos serviços, entre os quais se encontra a educação, não resultariam de uma concorrência perfeita. Nisso parece residir uma das diferenças entre as prescrições neoliberais do início do século XX, representadas pelo "caminho da servidão", de 7 Corrente teórica que busca a aplicação dos instrumentos de análise da teoria econômica neoclássica ao estudo dos fenômenos políticos, entendidos em um sentido amplo (Buchanan, McCormick, Tollison, 1984). Programa Dinheiro Direto na Escola 43 Friedrich Hayek (1983), e a atual releitura dessas proposições, que têm nos teóricos da escola de Chicago seus principais expoentes. Tentando responder a essa peculiaridade sem deixar de recorrer à premissa da racionalidade econômica liberal, os neoliberais propõem, para aquelas situações em que privatizar um dado setor público não levaria ao estabelecimento das almejadas relações concorrenciais (pois se manteria o monopólio da oferta sobre as mãos privadas), um "choque de mercado no interior do Estado": eis aqui a origem do quase-mercado. A alternativa encontrada foi a de introduzir concepções de gestão privada nas instituições públicas sem alterar a propriedade das mesmas [...]. Surge, assim, a noção de "quase-mercado" que, tanto do ponto de vista operativo quanto conceitual, diferencia-se da alternativa de mercado propriamente dita, podendo, portanto, ser implantada no setor público sob a suposição de induzir melhorias (Oliveira, Souza, 2003). Nesses termos, o quase-mercado poderia ser compreendido como uma proposição adequada àquelas organizações, que, embora não pudessem integrar o mercado, nele disputariam, segundo suas características, vantagens adicionais como condição para o aumento de sua eficiência (Adrião, 2001). Essa proposição aplica-se à educação pública. No mesmo período, por volta do início dos anos 90, surgiu outra tentativa de responder à crise do capitalismo no marco do próprio capitalismo. Comungando do mesmo diagnóstico neoliberal para a crise, o formato do Estado de bemestar social, o novo trabalhismo inglês (new labor) de Tony Blair adotou o que aqui se convencionou chamar de "terceira via". Batizada por Antony Giddens, um dos teóricos dessas reformas, a terceira via se refere a uma estrutura de pensamento e de prática política que visa adaptar a social-democracia a um mundo que se transformou fundamentalmente ao longo das últimas duas ou três décadas. É uma terceira via no sentido de que é uma tentativa de transcender tanto a social-democracia do velho estilo quanto o neoliberalismo (Giddens, 2001, p. 36). Para Giddens, o resultado dessa tentativa seria a constituição de um novo Estado democrático que teria como base: a descentralização do poder, agora entendida como a relação entre Estados-Nações no contexto de economias globalizadas; o aumento da eficiência na ação governamental como forma de afirmar a competência do Estado na sociedade de mercado; a dupla democratização, representada, de um lado, pela ampliação de mecanismos de democracia direta e da descentralização do poder para esferas locais e, de outro, pela possibilidade de tais mecanismos interferirem de fato nas decisões, agora globais; a renovação da esfera pública por meio do aumento da transparência; e o Estado disposto a atuar como administrador de riscos, o que significa expor suas opções de políticas ao debate público e submeter-se a ele (Giddens, 2001, p. 82-87). Para tanto, teriam que se impor reformas no padrão de organização e gestão do Estado, delineando-se para os governos mudanças em seus desempenhos: 44 Programa Dinheiro Direto na Escola a reforma do Estado e do governo deveria ser um princípio orientador básico da política da terceira via - um processo de aprofundamento e ampliação da democracia. O governo pode agir em parceria com instituições da sociedade civil para fomentar a renovação e o desenvolvimento da comunidade (Giddens, 2001, p. 79). Sem romper com os preceitos básicos do neoliberalismo, o novo trabalhismo inglês de Blair, ao apostar na terceira via como estratégia para se descolar da social-democracia, "associa a preservação da social-democracia e elementos básicos do neoliberalismo" (Antunes, 1999, p. 95). Para os propositores da terceira via, o desejado redesenho no padrão de intervenção do Estado britânico, tendo em vista os efeitos das reformas neoliberais de Thatcher, pressupunha a consolidação de novos interlocutores8, ou melhor, de novos parceiros na oferta e manutenção das políticas sociais. Tais parceiros, identificados em segmentos da sociedade civil, comporiam o que aqui entendemos por terceiro setor. Terceiro setor: uma definição aproximada A primeira observação a fazer refere-se à imprecisão com que a literatura da área trata o termo "terceiro setor", ora aproximando-o de uma genérica definição de sociedade civil, ora referindo-se a um formato específico juridicamente definido de instituição privada, ora, ainda, identificando-o com as tradicionais entidades de caráter assistencial ou filantrópico. Segue-se que o cerco a sua definição se dá, então, por exclusão: o terceiro setor refere-se a esferas da sociedade que não se encontram no mercado e tampouco no Estado. Montaño (2002, p. 182) alerta para o reducionismo do conceito de terceiro setor: "como se o 'político' pertencesse à esfera estatal, o 'econômico' ao âmbito do mercado e o social remetesse apenas à sociedade civil". Para Fernandes (1994), o terceiro setor seria caracterizado como o público não-estatal e pressuporia a existência do Estado e do mercado. O conceito designaria "um conjunto de iniciativas particulares com um sentido público" (Fernandes, 1994, p. 127). Já para Montaño (2002), o terceiro setor estaria em contraposição a um primeiro setor, identificado com o Estado, e a um segundo, que seria o mercado. Szazi (2003) define-o como o "conjunto de agentes privados com fins públicos, cujos programas visavam atender direitos sociais básicos e combater a exclusão social e, mais recentemente, proteger o patrimônio ecológico brasileiro" (Szazi, 2003, p. 22). Montaño (2002) destaca também que, entre os diversos autores que trabalham com o tema, alguns se referem a ele como atividades públicas desenvolvidas por particulares, outros como função social em resposta às necessidades sociais, e há ainda os que o apresentam como valores de solidariedade local, auto-ajuda e ajuda mútua. 8 Ressalte-se a alteração na constituição partidária, mediante a substituição da defesa da propriedade coletiva pela defesa do empreendimento do mercado e da competição. Programa Dinheiro Direto na Escola 45 Apesar das definições pouco claras, há consenso em relação à tendência de transferência da responsabilidade sobre a oferta de políticas sociais da esfera estatal para instâncias de natureza privada dos mais diversos formatos: empresas, sociedades sem fins lucrativos, fundações, etc. Em meados da década de 90, o chamado terceiro setor havia gastado no Brasil o correspondente a 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) daquele ano (Szazi, 2003, p. 21). A responsabilidade pelo atendimento das demandas sociais passa a ser delegada aos próprios indivíduos, que buscam atendê-las por meio de atividades de ajuda mútua, voluntária, benemérita, etc. Ao mesmo tempo, as políticas sociais mantidas no âmbito do Estado têm seu tratamento alterado: são descentralizadas para os níveis locais das esferas governamentais e passam a ter uma natureza menos universalista (Montaño, 2002). Nesses termos, o crescimento do terceiro setor parece indicar que "o que na realidade está em jogo não é o âmbito das organizações, mas a modalidade, fundamentos e responsabilidades inerentes à intervenção e respostas para a questão social" (Montaño, 2002, p. 185). O novo formato para o trato da questão social e também da educação impõe a transferência de fundos públicos para o setor privado, já que o terceiro setor, em geral, não tem condições de autofinanciamento. "Esta transferência é chamada, ideologicamente, de 'parceria' entre o Estado e a sociedade civil, com o Estado supostamente contribuindo, financeira e legalmente, para propiciar a participação da sociedade civil" (Montaño, 2002, p. 19). Se atentarmos para a normalização dessas parcerias, temos que a parceria entre o poder público e a entidade qualificada será feita mediante um contrato de gestão9 pelo qual a organização social (OS) apresenta um programa de trabalho a ser avaliado por indicadores de qualidade e produtividade. Essa qualificação é restrita a organizações que direta ou indiretamente atuem na esfera da promoção dos chamados direitos sociais. Em síntese, as [...] organizações sociais são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, voltadas para atividades de relevante valor social, que independem de concessão ou permissão do Poder Público, criadas por iniciativa de particulares segundo modelo previsto na lei, reconhecidas, fiscalizadas e fomentadas pelo Estado (Modesto, 2001, p. 17). As organizações sociais no marco da reforma do Estado brasileiro Ao abordarem-se, ainda que esquematicamente, as estratégias de reforma do Estado expressas pela introdução do quase-mercado na gestão pública e pelas 9 Contrato de gestão é "o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes [...]" (Lei nº 9.637 de 15/5/98 , art. 5º). "O contrato de gestão elaborado em comum acordo entre o órgão ou entidade supervisora e a organização social discriminará as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da organização social" (Lei nº 9.637 de 15/5/98, art. 6º). 46 Programa Dinheiro Direto na Escola sugestões que compõem a pauta de mudanças propostas pela terceira via, especialmente aquela relativa ao incremento do terceiro setor como co-responsável pelo atendimento das demandas sociais, buscou-se sublinhar a constante referência de seus proponentes a um mesmo diagnóstico para a crise do capitalismo: o modelo de intervenção estatal originário do pacto keynesiano. Ressaltamos, portanto, que a terceira via não rompe com o diagnóstico neoliberal de que o "culpado" pela crise é o Estado. A identificação da crise fiscal do setor público como o principal agente da estagnação econômica redundou na defesa da diminuição dos gastos e dos investimentos públicos na oferta de políticas sociais. No olho do furacão, encontra-se um padrão de investimento governamental em políticas de bem-estar social cuja expansão deveria ser freada. No Brasil, a forma mais orgânica que as intenções de reforma no padrão de investimento e funcionamento estatal adquiriram encontra-se no Plano diretor da reforma do aparelho de Estado (Brasil, 1995), desenvolvido durante a primeira gestão de Fernando Henrique Cardoso, sob a coordenação do então ministro Luiz Carlos Bresser Pereira. Na proposta de reforma do Estado, o cidadão é adjetivado: é o cidadãocliente, o que, portanto, de acordo com as leis de mercado, não inclui todos os cidadãos, pois os clientes dos serviços do Estado seriam apenas os contemplados pelo núcleo estratégico e por atividades exclusivas. As políticas sociais assumiriam uma nova conotação, pois seriam consideradas, pelo plano diretor da reforma, serviços não-exclusivos do Estado e, assim sendo, de propriedade pública nãoestatal ou privada. Nesse plano, encontram-se explicitadas as estratégias que deveriam ser adotadas pelo governo federal para que a reforma no Estado fosse viabilizada: a privatização, a terceirização e/ou a publicização de serviços ou atividades prestados pelo Estado. Por privatização, o documento entende transferência, para a iniciativa privada, da propriedade de dado setor com vistas a transformá-lo em uma instituição de e para o mercado. A terceirização corresponderia ao processo de transferência, para o setor privado, de serviços caracterizados como auxiliares ou de apoio às atividades desenvolvidas pelo Estado. A publicização, por sua vez, consistiria "na transferência para o setor público não-estatal dos serviços sociais e científicos que hoje o Estado presta" (Pereira, 1997, p. 7). Essa é a definição que mais diretamente nos interessa, uma vez que o processo de publicização significa a transformação de "uma organização estatal em uma organização de direito privado, pública, nãoestatal" (Pereira, 1997, p. 8), consubstanciando uma forma "intermediária" de propriedade entre as tradicionais propriedades privada e estatal. De acordo com Bresser Pereira, tais atividades, por contarem com razoável assistência financeira por parte do Estado e referirem-se a serviços e instituições em que a privatização pura e simples não se aplicaria – casos como os da educação escolar, das universidades, dos hospitais, da pesquisa científica, etc. –, poderiam adquirir um caráter competitivo por meio da implantação da administração gerencial, do aumento do controle social sobre seus resultados e da constituição de quase-mercados. Por isso, a reforma do Estado nessa área implicaria sua publicização, ou seja, a transferência de sua gestão e controle para um setor denominado público não-estatal (Pereira, 1998). Programa Dinheiro Direto na Escola 47 Para essa concepção, que guarda semelhança com as proposições teóricas tanto da public choice10 quanto da terceira via, parece ser necessário fundar um aparentemente novo modo de o Estado organizar-se e funcionar, sintetizado na denominação de "Estado social-liberal". Pereira (1996, p.14) chama de Estado social-liberal um arranjo político-administrativo em que o Estado continua responsável pelos direitos básicos de saúde e educação da população, mas "de forma crescente os executa por intermédio de organizações públicas não-estatais competitivas". Portanto, esse Estado "é uma espécie de síntese ou de compromisso entre os direitos individuais, assegurados pelo Estado, mas viabilizados pelo mercado". O Estado social-liberal, que é social porque mantém suas responsabilidades pela área social, mas é liberal porque acredita no mercado e contrata a realização dos serviços sociais de educação, saúde, cultura e pesquisa científica de organizações públicas não-estatais, é que financia a fundo perdido com orçamento público (Pereira, 1996, p. 14). Tais organizações seriam mais eficientes, por serem mais flexíveis e competitivas, e atenderiam melhor aos direitos sociais. Porém, é importante atentar para o fato de que o Estado continuaria a financiar os serviços prestados por elas, apesar de seu controle político e ideológico passar para as próprias organizações públicas não-estatais. Ao determo-nos sobre as prováveis conseqüências surgidas da operacionalização das organizações públicas não-estatais, vemos emergirem ao menos duas contradições: a primeira refere-se ao papel efetivamente desempenhado pelo Estado, pois, conforme anunciado no plano de reforma, o Estado teria fortalecidas as suas funções de regulação e coordenação, particularmente em nível federal, mas essa condição vê-se minimizada à medida que o Estado transfere o controle político-ideológico das ações para as próprias organizações públicas não-estatais, reservando-se apenas potencialmente a função de financiá-las. A segunda contradição decorre do formato de financiamento proposto. Na realidade, o financiamento das OS ainda é um ponto obscuro, uma vez que a Lei nº 9.637, de 1998, que dispõe sobre as organizações sociais, e o art. 12 do Programa Nacional de Publicização indicam que poderão ser destinados às organizações sociais recursos orçamentários e bens públicos necessários ao contrato de gestão. Portanto, se as OS terão a obrigatoriedade de investir seus excedentes financeiros no desenvolvimento de suas próprias atividades, conforme Peroni (2003), e se os recursos orçamentários e bens públicos poderão ser destinados a essas organizações – o que não significa que necessariamente o serão –, está criada uma imprecisão que certamente acarretará prejuízo para a oferta dos serviços 10 Para a public choice, o paradigma da ação humana, em todas as dimensões, passa pela relação de troca, pelo jogo de interesses. Isso é tanto um pressuposto quanto uma prescrição, pois os defensores da teoria têm as instituições de mercado e as relações de troca como modelo. Após a Segunda Guerra Mundial, houve uma expansão da política como processo decisório, momento em que foram apontadas falhas do mercado e o Estado apresentou-se como o meio para se sanarem essas falhas. Em contraposição, a public choice desenvolveu uma teoria das falhas do Estado, que seus teóricos denominaram de rent seeking society. 48 Programa Dinheiro Direto na Escola destinados às OS. Isso torna a contradição apontada ainda mais complexa, pois, além de não ficar claro quem financiará, também não é esclarecido a quem caberá a coordenação e regulação (Peroni, 2003). Assinala-se que a ausência de financiamento público, aliada à transferência da função executora dos serviços, em uma atmosfera competitiva, tenderá a conduzir, mesmo que implicitamente, a coordenação e a regulação dessas organizações para o mercado. Assim sendo, quem as regularia efetivamente não seria o Estado, mas o mercado ou, como vimos anteriormente, um quase-mercado. Se tomarmos o conteúdo proposto para as OS presente no plano e o compararmos ao indicado para a consolidação das organizações da sociedade civil públicas (Oscips), tem-se que a novidade consiste na configuração do setor público não-estatal por meio da transformação de instâncias constitutivas da estrutura estatal em entidades juridicamente privadas. 2.4 O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e a reforma do Estado11 O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) guarda profundas relações com o processo de reforma do Estado iniciado nos anos 90, uma vez que a definição das políticas públicas para a educação no Brasil, desde então, ocorre em meio ao processo de contenção de recursos financeiros na área social, sendo o PDDE parte de um conjunto de reformas no campo da educação para os países latino-americanos, articuladas com os interesses econômicos externos. Implantado em 1995, ainda sob a designação de Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (PMDE) e sob a responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o PDDE constitui-se em um dos mais importantes programas de financiamento do ensino fundamental com características de descentralização. Sua abrangência compreende escolas públicas do ensino fundamental, das redes estadual e municipal e as escolas de educação especial mantidas por organizações não-governamentais sem fins lucrativos. A descentralização – um dos mais importantes eixos das reivindicações populares dos anos 70 e 80 contra a hierarquização do poder no regime militar, que ocorre no bojo das reformas dos anos 90 – transcende o universo da política hegemônica, ganhando outra significação. A nova retórica da descentralização, que pretende estimular a participação da sociedade na esfera pública, tem como finalidade a aproximação entre financiamento e administração, tanto nas relações do poder público com o mercado, quanto na transferência de responsabilidades para os municípios e para a escola no caso da educação. Assim, pode-se justificar a restrição do financiamento público para a educação, alegando-se que os problemas educacionais não decorrem da falta de recursos, mas da falta de uma melhor administração desses recursos. Para Krawczyk (2002), a descentralização, nas suas 11 Fragmento do artigo de GONÇALVES, F. W.; LUZ, L. X.; CRUZ, R. E. O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) como política educacional do estado contemporâneo. Série Estudos – Periódico do Mestrado em Educação, Campo Grande (MS), n. 18, p. 127-142, 2004. ISSN 1414-5138. Programa Dinheiro Direto na Escola 49 diferentes dimensões (para o mercado, a municipalização e a escola), consolida um dos principais eixos da reforma educacional em curso da América Latina, caracterizando uma nova organização e gestão do sistema educativo e da escola. O PDDE é pertinente, ainda, aos propósitos da reforma do Estado em curso por focalizar determinadas ações no âmbito da escola e por ser um Programa de caráter suplementar, uma vez que o governo federal não pretende assumir o custeio total das atividades de manutenção e desenvolvimento das escolas beneficiadas pelo Programa. Atitude similar pode ser observada no argumento utilizado para justificar o baixo per capita dos recursos destinados pelo FNDE para a manutenção do Programa Nacional de Alimentação Escolar. O Programa estimula a autonomia gerencial da própria dotação de recursos federais para a manutenção das escolas, tal como expressam seus objetivos, quais sejam: ... concorrer para a elevação da qualidade do ensino fundamental, reforçando a autonomia gerencial e a participação social das unidades escolares, bem como contribuir para a melhoria da infra-estrutura física e pedagógica das escolas por meio do repasse de recursos financeiros, em caráter suplementar (Brasil, 1995, p. 3). Esses objetivos exigem a transformação dos Conselhos Escolares, Associações de Pais e Mestres e Caixa Escolar em entidades de direito privado denominadas Unidades Executoras (UEx), exigência legal para recepção e gestão dos recursos do PDDE pela escola. Do mesmo modo, o PDDE tem motivado Secretarias de Educação a instituírem programas próprios, com características e critérios similares e com a utilização da mesma estrutura administrativa: as UEx, como é o caso dos programas da rede estadual do Piauí e da rede municipal de Teresina (Gonçalves, Luz, Cruz, 2003). Segundo documento do FNDE, que orienta acerca do Programa Dinheiro Direto na Escola: As unidades executoras, comumente chamadas de Caixa Escolar, Associação de Pais e Mestres ou Conselho Escolar constituem-se em associações civis, sem fins lucrativos, que assumem a função tradicionalmente exercida pelos estados e municípios. Elas passam a responsabilizar-se pelo recebimento e execução dos recursos financeiros transferidos pelo FNDE, caracterizando, desse modo, a desconcentração decisória e funcional (Brasil, 2001, p. 2) (grifos nossos). Além do aparato jurídico e institucional, o governo federal, como ator principal de um novo modelo de gestão, complementa sua ação no processo de implementação do PDDE por meio de aparato técnico, elaborando documentos que orientam as escolas-alvo a iniciar seu processo de organização e inserção no Programa. São documentos que explicitam as responsabilidades das esferas de governo, o quadro de exigências e orientações relacionadas à utilização e distribuição dos recursos e a constituição e funções das UEx (Resolução FNDE nº 10/ 2004). Mais especificamente, a organização do Programa ocorre via FNDE, o qual disponibiliza os recursos diretamente para as escolas por meio de suas UEx, que devem possuir CNPJ, conta bancária e se constituir como órgãos deliberativos com poder de compra, após a tomada de preços em estabelecimentos comerciários ou prestadores de serviços, conforme a situação. 50 Programa Dinheiro Direto na Escola No que concerne ao processo de avaliação, este se restringe, normalmente, à prestação de contas, que, em um primeiro momento, deve ser feita no departamento financeiro da Secretaria de Educação, de acordo com a dependência administrativa da escola (estadual ou municipal). Essas instâncias a posteriori prestam contas ao FNDE, até o dia 28 de fevereiro do ano seguinte ao ano de recebimento dos recursos, sendo que o repasse subseqüente está condicionado à prestação de contas referente ao ano anterior. Essa conotação da avaliação corrobora a natureza contábil do programa e a concepção quantitativista que tem predominado nas avaliações do sistema educacional, sem preocupação com os aspectos qualitativos de natureza pedagógica que fomentam a dinamicidade do processo educativo. Em relação aos recursos destinados às escolas pelo PDDE, destaca-se que, de 1995 a 2004, não houve qualquer acréscimo na tabela de repasse dos recursos para as escolas. Além disso, o Programa determina critérios para sua aplicação, impedindo a autonomia da escola em definir suas prioridades. Mesmo com essas limitações, observa-se um crescente processo de adesão das escolas ao Programa, pois, de 1995 para 2002, ocorreu um aumento de 36% nos recursos destinados ao PDDE. Além disso, verifica-se um processo intenso de criação de UEx, tendo havido um efetivo aumento, superior a 650%, no número de escolas que contam com esse tipo de organização no período analisado. A diferença no porcentual de aumento de recursos e de UEx justifica-se pelo fato de as escolas, mesmo não tendo UEx, receberem os recursos pelas suas Secretarias de Educação. Quanto às fontes de recursos para o PDDE, em 2004, verificamos que o Salário-Educação é a principal, sendo distribuído em forma de contribuição do Salário-Educação (23%); produto da aplicação dos recursos à conta do SalárioEducação (15%); contribuição do Salário-Educação referente à contrapartida de empréstimos internacionais (37%) e produto da aplicação dos recursos à conta do Salário-Educação das contrapartidas (24%). Além dessas fontes ordinárias do PDDE destinadas às escolas de ensino fundamental, no ano de 2004, o Programa passou a ser encaminhado, também, para escolas de ensino médio localizadas em municípios em situação de emergência que tenham sido prejudicados pelas fortes chuvas causadoras de enchentes em vários Estados do País. Para custear essa modalidade, o FNDE destinou recursos ordinários do Tesouro Nacional e recursos da Manutenção e Desenvolvimento do Ensino, ou seja, parte dos 18% obrigatórios da União para a educação, conforme determina o artigo 212 da Constituição Federal, o que significa que o ensino médio está à mercê dos parcos recursos destinados ao ensino fundamental e pouco evidenciado nas reformas do governo federal. Dois aspectos fazem-se relevantes e merecem destaque quanto às fontes de recursos do PDDE: 1) o alto porcentual de recursos advindos das aplicações do Salário-Educação e 2) a utilização de parte dos recursos do Salário-Educação como contrapartida de empréstimos internacionais. O primeiro, sobre o porcentual considerável de recursos advindos dos resultados de aplicações (39%), motiva a seguinte ilação: possivelmente, essa realidade justifique-se pelo fato de os recursos do PDDE serem encaminhados Programa Dinheiro Direto na Escola 51 para as escolas, normalmente, no segundo semestre de cada ano, portanto, permanecendo aplicados até o período de liberação. O segundo, extremamente relevante para a compreensão da forma de organização do PDDE e dos elementos que evidenciam a linha política adotada no processo de sua implantação e implementação, refere-se aos recursos provenientes do Salário-Educação, que assumem o papel de contrapartida de empréstimos internacionais (37%), conforme evidenciado acima. 2.5 Participação, autonomia e descentralização: a gestão democrática da escola e as orientações políticas nos anos 9012 As lutas pela democratização da educação inserem-se no conjunto das lutas sociais pela redemocratização do País no final dos anos 70 e 80. As produções acadêmicas na área revelam não apenas as características dos movimentos sociais e das políticas públicas, como também o esforço em sistematizar o entendimento sobre democracia no âmbito dos sistemas educativos e da unidade escolar. A produção acadêmica, cuja temática é a democratização da gestão escolar nos anos 80 e início dos anos 90, registra em levantamento bibliográfico mais de cem pesquisas e artigos sobre o tema (Ghanem Junior, 1995). Em 1999, a Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae) publica O Estado da Arte em política e gestão da educação no Brasil de 1991 a 199713. O relatório insere-se em uma ampla pesquisa que implicou a análise de 922 documentos, entre teses de doutorado, dissertações de mestrado e pesquisas docentes. As pesquisas foram agrupadas em 11 categorias: Direito à educação e legislação; Escola, instituições educativas e sociedade; Financiamento da educação; Gestão da escola; gestão da universidade; Gestão de sistemas educacionais; Municipalização e gestão municipal; Planejamento e avaliação educacionais; Políticas da educação; Profissionais da educação; Público e privado na educação14. A categoria Gestão da escola representou 14,4% do total, com 134 documentos. As pesquisas foram agrupadas em quatro conjuntos, segundo a incidência de abordagem: democratização e autonomia, organização do trabalho escolar, função e papel do gestor e gestão pedagógica (Anpae, 1999, p. 25). Registra-se que, dentre os 134 trabalhos que abordaram a gestão da escola, 45,5% tiveram como foco central a democratização e a autonomia, conjunto em que se agrupam investigações que dizem respeito 12 Item elaborado a partir do texto de Adrião, Garcia e Costa (2004) intitulado O Programa Dinheiro Direto na Escola e a gestão escolar, produzido para a Reunião Nacional da Pesquisa, ocorrida em Porto Alegre, em julho de 2004. 13 O estudo realizado para a produção do relatório deu prosseguimento a um levantamento iniciado em 1997 que resultou em relatório de pesquisa intitulado "Situação e Perspectiva da Administração da Educação no Brasil" (Anpae, 1998). 14 A categorização refere-se, segundo os organizadores, ao foco principal da análise desenvolvida (Anpae, 1998, p. 16). 52 Programa Dinheiro Direto na Escola à democratização da educação, democratização da gestão da escola, participação, gestão participativa, eleição de diretores, papel do gestor, conselho de gestão escolar, conselho deliberativo e conselho de classe, direção colegiada, envolvimento da comunidade, provimento do cargo e identidade e autogoverno da escola (Anpae, 1999, p. 208). O tema democratização da gestão escolar concentrou 61 pesquisas, com maior incidência em estudos de mecanismos institucionais de gestão democrática da escola. Essa breve apresentação de estudos sobre a produção na área da gestão escolar indica-nos a relevância do tema em um momento em que o País buscava a democratização de suas instituições políticas. A democratização da gestão da escola implicava, naquele contexto, a combinação de três fatores: ampliação das possibilidades de participação nos processos de tomada de decisão na gestão da educação e na gestão escolar; busca de autonomia para as unidades escolares; e descentralização de gestão e financiamento. Ao contrário dos estudos clássicos no campo da administração, segundo os quais a função administrativa na escola restringe-se ao cumprimento de determinações externas produzidas nas instâncias responsáveis pelo planejamento, o pressuposto da gestão democrática da escola é a explicitação dos conteúdos políticos da administração, para que a população usuária exerça democraticamente o controle sobre o Estado em relação à qualidade dos serviços prestados. Tal condição exige ruptura com estruturas burocratizadas e verticalizadas, requerendo autonomia para as unidades escolares e descentralização nos processos de tomada de decisão e utilização de recursos. Portanto, a democratização da gestão escolar implica necessariamente a desburocratização dos sistemas de ensino e a autonomia da escola. Como afirma Mendonça (2000), a gestão democrática deve ser vista como: ...um conjunto de procedimentos que inclui todas as fases do processo de administração, desde a concepção de diretrizes de política educacional, passando pelo planejamento e definição de programas, projetos e metas educacionais, até suas respectivas implementações e procedimentos avaliativos (Mendonça, 2000, p. 96). No plano das políticas públicas para a educação, a democratização da gestão escolar integrou os discursos governamentais no início da década de 80. Os governadores eleitos pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) apresentavam em seus programas os temas participação e descentralização em resposta às expectativas depositadas pelos votos nas urnas (Adrião, 2001). A autora mencionada sintetiza as propostas de mudança na gestão que estiveram no centro do debate materializando-se em diversas políticas públicas durante essa década: Em síntese, as mudanças na gestão escolar, com vistas a sua democratização, pressupunham a articulação de três mecanismos básicos: medidas voltadas para descentralização político-administrativa das estruturas governamentais, para o aumento de participação dos usuários e funcionários nos processos decisórios escolares e o aumento da autonomia pedagógica e de gasto para as unidades escolares (Adrião, 2001, p. 49). Programa Dinheiro Direto na Escola 53 A mesma autora observa, entretanto, que o tratamento dado a esses mecanismos na rede pública estadual de ensino de São Paulo combinou processos de centralização administrativa e relativa autonomia pedagógica, além da baixa permeabilidade dos órgãos superiores do sistema (Adrião, 2001). Em 1988, com a aprovação da Constituição Federal, pela primeira vez na história constitucional brasileira a educação é integrada aos direitos sociais. As características desse direito são também explicitadas com maior clareza do que nas constituições anteriores (Oliveira, 2001). Os princípios constitucionais que regem a educação nacional, expressos no artigo 206 da Constituição Federal (CF) de 1998, incluem, em seu inciso VI, a gestão democrática da escola pública15. A importância dos princípios, pelo menos do ponto de vista formal, consiste no fato de que "não podem ser desrespeitados por qualquer medida governamental ou pela ação dos componentes da sociedade civil, tornando-se uma espécie de referência para validar legalmente as normas que dele derivam" (Adrião, Camargo, 2001, p. 70). No contexto das lutas sociais dos anos 1980, os conteúdos atribuídos aos termos "participação", "autonomia" e "descentralização" diferem significativamente daqueles apresentados pelas políticas reformistas dos anos 90. Apesar de a Constituição Federal refletir (ainda que limitadamente) demandas dos setores progressistas por ampliação da participação, na década seguinte, as reformas políticas, dentre elas as implementadas na educação, irão refletir novos conteúdos, mais adequados ao projeto neoliberal, especialmente nos anos 90. Os anos 90 caracterizam-se por uma alteração na correlação de forças entre setores progressistas e conservadores, produzindo o que Oliveira (2001) denomina de "inflexão neoliberal" no plano das políticas públicas, em geral, e nas políticas educacionais, em particular. A educação escolar brasileira passa por ampla reforma que habilmente incorpora pontos defendidos pelos setores progressistas da sociedade, como a descentralização e a autonomia, mas em um processo de recontextualização que caracterizaria medidas de natureza pontual. O mesmo autor avalia que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1996, ao definir com maior clareza do que a CF/88 a distribuição de responsabilidades pela educação entre os entes federados, explicita o sentido de descentralização agora assumido: trata-se da transferência de responsabilidade sobre a gestão de sistemas de ensino para municípios, Estados e Distrito Federal, ao mesmo tempo em que a União controla o "produto", por meio das avaliações nacionais. A autonomia da escola é, dessa maneira, "monitorada" pela União, que estabelece os resultados desejáveis para os processos de ensino. No tocante à administração de recursos financeiros, a autonomia da escola dá-se, principalmente, por meio de transferências de recursos, como no caso do próprio Programa Dinheiro Direto na Escola, programa federal que transfere recursos em caráter suplementar para o ensino fundamental, exigindo para tanto que as escolas instituam entidades de direito privado, as unidades executoras (UExs). A administração de recursos financeiros por meio das UExs pode ser entendida 15 Limitados, exclusivamente, à escola pública (BRASIL. Constituição Federal de 1988. DOU 5/10/1988). 54 Programa Dinheiro Direto na Escola como uma particularidade importante no processo de instauração de um novo padrão de gestão nas escolas, pois se trata de responsabilizar uma entidade paralela à estrutura estatal por decisões políticas significativas para o funcionamento da escola, uma vez que lida com a definição do uso de recursos disponíveis para a implementação de projetos, alterações nos espaços físicos, formação de pessoal e outras ações. Cabe lembrar, ainda, que as UExs podem captar recursos. O debate político sobre a ampliação da autonomia esteve, nos anos 80, centrado na produção de mecanismos de participação na gestão da educação e na gestão escolar, enfatizando a criação de órgãos colegiados em que todos os segmentos envolvidos nos processos educativos estivessem representados e a partir dos quais o controle democrático sobre o Estado pudesse ser exercido. No âmbito da unidade escolar, os órgãos colegiados, como os Conselhos de Escola, são, sob essa perspectiva, depositários das expectativas em torno da democratização da gestão, pois os processos eletivos para sua composição e a possibilidade de se instituírem como órgãos gestores efetivamente responsáveis pelas decisões mais relevantes para a escola potencialmente fazem de tais órgãos instrumentos de ampliação da participação e de exercício de autonomia. A inovação dos órgãos colegiados de gestão foi timidamente apresentada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), que, em seu art. 14, estabelece os seguintes princípios a serem observados na implantação da gestão democrática nos sistemas de ensino: - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; - participação da comunidade escolar e local em conselhos escolares ou equivalente. Além de a LDB não estabelecer uma regulamentação para a organização da gestão democrática, entregando aos sistemas a responsabilidade de formular suas diretrizes, sequer deixa claro se os "conselhos escolares ou equivalentes" terão caráter deliberativo ou não (Paro, 2001). Não se trata, evidentemente, de uma preocupação relevante na legislação a criação de normas e preceitos que efetivamente contribuam para a implementação da participação da comunidade na gestão escolar. Essa ausência de preocupação com a democratização da gestão escolar integra-se ao contexto político dos anos 90, em que as vias democráticas não são necessariamente tidas como importantes para o aumento da eficiência e eficácia da gestão estatal. Para as unidades escolares, o esvaziamento do significado político da participação na gestão escolar parece ficar configurado na combinação entre criação de unidades executoras de direito privado e pouco estímulo à produção de mecanismos coletivos de gestão. Cabe lembrar que, na reforma educacional promovida durante o regime militar pela Lei nº 5.692/71, as escolas foram obrigadas a criar entidades que congregassem "professores e pais de alunos com objetivo de colaborar para o eficiente funcionamento dos estabelecimentos de ensino (art. 62). Por essa medida, as Associações de Pais e Mestres, as APMs, tornaram-se obrigatórias Programa Dinheiro Direto na Escola 55 (Bueno, 1987). Esvaziadas de possibilidades políticas democráticas e visando à colaboração financeira com o funcionamento das escolas, as APMs trouxeram para dentro das unidades escolares os pais de alunos, porém sob tutela e por meio de "regras burocráticas, ou seja, estabelecendo uma condição de cidadania sob controle" (Sposito, 1990, p. 53). As APMs funcionam atualmente como unidades executoras. Por isso, temse a transferência de decisões cabíveis ao Conselho de Escola para essas entidades auxiliares, que excluem em sua composição alunos e funcionários, o que ocorre, por exemplo, na rede estadual de ensino paulista. A forte tradição autoritária da APM faz com que nos perguntemos se não estaríamos presenciando, no esvaziamento do órgão político da escola, uma nova forma de participação sob tutela, sob controle, enfim, um retrocesso político em relação às lutas pela democratização da gestão escolar empreendidas a partir dos anos 80. 2.6 Implicações do PDDE para a gestão escolar16 Com a emergência das OS, estabelece-se uma nova relação entre Estado e sociedade no que tange à oferta dos serviços sociais, especialmente. Nessa relação, institui-se uma nova parceria "[...] baseada em resultados, que conjuga autonomia, flexibilidade e responsabilidade na gestão" (Sposito, 1990, p. 121). Nessa parceria, o Estado assume o compromisso de financiar, total ou parcialmente, os serviços, e as OS assumem a prestação desses, sendo as responsáveis pelos resultados definidos no contrato de gestão assumido na parceria. Esse processo de saída e ao mesmo tempo de fortalecimento do Estado pode ser evidenciado na lógica de funcionamento do projeto das OS, já que a Medida Provisória n° 1.591 prescreve as condições para que as entidades possam se habilitar como organização social, limitando a autonomia em seu sentido de obediência às regras da administração pública. No caso específico dos serviços de educação ofertados pela escola, essa também passa a ser a lógica que orienta a oferta dos serviços educacionais (delegação de funções, do MEC às UEx, com recursos públicos) por meio de uma parceria estabelecida entre Estado e sociedade. Nessa direção, A operacionalização do programa [PDDE] tem por base o princípio da parceria, envolvendo as três esferas de governo (federal, municipal e estadual) e, sobretudo, a participação ativa da comunidade escolar, por meio de organizações representativas, chamadas Unidades Executoras (UEx) (Brasil, 2004e, p. 1, grifo nosso). Na parceria, ao FNDE cabe, entre outras atribuições, "[...] prover os recursos para execução do PDDE"; e às UEx, 16 Item elaborado a partir do artigo de SANTOS, T. F.; GUTIERRES, D. V.; SILVA, L. A relação gestão e autonomia financeira como política na escola (2004), apresentado em Reunião Nacional ocorrida em Campinas/SP no período de 4 a 7 de julho de 2005. 56 Programa Dinheiro Direto na Escola a) empregar os recursos em favor das escolas que representam, de conformidade com os critérios e as normas estabelecidas [e elaboradas pelo FNDE, como vimos] para execução do PDDE; b) prestar contas à Secretaria de Educação do Estado ou do Distrito Federal ou do município a que a escola pertença, da utilização dos recursos recebidos (Brasil, 2003a, p. 2, grifo nosso). Da transferência da responsabilidade pela execução dos serviços ofertados pela escola, ocorrida com essa parceria, decorrem duas grandes atribuições às UEx: aplicar os recursos, transferidos e captados, em ações que incidam, efetivamente, na melhoria da oferta dos serviços e prestar contas dessa aplicação. Às UExs compete, portanto, não apenas exercer direitos sobre os recursos da escola (recebê-los e administrá-los), como também cumprir com compromissos assumidos na parceria com o MEC. Nesse sentido, a autonomia proposta no PDDE não está somente em garantir direitos às UExs sobre os recursos da escola, mas também fazer com que essa assuma novas obrigações. A Unidade Executora é uma entidade jurídica de direito privado sendo um órgão de representação de pais, professores, funcionários da escola e da comunidade em geral. Como pessoa jurídica, ela possui autonomia para exercer direitos e contrair obrigações com os recursos recebidos de órgãos governamentais, de entidades públicas e privadas, doações e outros (Brasil, 1995 ou 1996a, p. 9, grifo nosso). No PDDE, um possível descumprimento do compromisso do Estado com a UEx, estabelecido na parceria (transferir recursos financeiros), é evidenciado na possibilidade de o MEC não dispor de recursos financeiros suficientes para a execução do Programa, ainda que sua fonte principal (quota federal do SalárioEducação) continue existindo e seja destinada, "exclusivamente"17, para os programas federais voltados para o ensino fundamental. Analisando essa questão na Resolução nº 10 de 2004, o que fica evidente é que o Estado não garante incondicionalmente a transferência de recursos federais para as UEx, como podemos constatar no trecho abaixo: Concluídos os procedimentos de adesão e de habilitação, ao PDDE, das secretarias de educação dos Estados e do Distrito Federal, das prefeituras municipais, das UEXs e das EM e ultimados os preparativos de abertura de contas correntes, o FNDE providenciará os correspondentes repasses, desde que haja disponibilidades orçamentária e financeira e as entidades adeptas e habilitadas estejam com as prestações de contas de exercícios anteriores ao do repasse aprovadas ou estejam enquadradas na situação prevista no art. 18 desta Resolução (Brasil, 2004a, p. 8, grifo nosso). Isso significa que às UExs é imposto um compromisso de parceria com o MEC (executar os serviços antes sob a incumbência desse) sem que as condições financeiras sejam efetivamente asseguradas pela outra parte (Estado), o que põe 17 Como vimos no Capítulo 2, trata-se de uma fonte de recursos voltada para o atendimento de programas educacionais que tem sido bastante "solidária" com outras áreas de investimento do governo federal (Ramos, 2003). Programa Dinheiro Direto na Escola 57 em jogo a oferta pública dos serviços da escola. Isso porque a unidade executora da escola é regida, de acordo com o Programa de Publicização, pelo modelo de organizações sociais, no qual "não existe nenhum instrumento jurídico ou institucional que garanta a manutenção do aporte dos recursos necessários à sua sobrevivência, mesmo quando atingidos todos os resultados determinados no contrato de gestão" (Barreto, 1999, p. 129). A execução das atividades a serem realizadas pela escola por meio do Programa, como, por exemplo, a contratação de serviços que garantam a manutenção da escola, já foi descentralizada e assumida pelas UExs na medida em que elas aderiram ao Programa18. Se essa possibilidade de falta de recursos ocorrer ou se eles se tornarem insuficientes a cada ano (dadas as demandas da escola pública), as unidades de ensino ver-se-ão obrigadas a captar recursos privados, a partir de diferentes formas que lhe são asseguradas no PDDE, pois essas demandas da comunidade persistem e exigem soluções, muitas imediatas. Essa possibilidade de captação de recursos privados é legalmente assegurada às UExs, já que "[...] Os meios e recursos para atender os objetivos da UEx serão obtidos mediante: a) contribuição voluntária dos sócios; b) convênios; c) subvenções diversas; d) doações; e) promoções escolares; f) outras fontes" (Brasil, 1995 ou 1996a, p. 27, grifo nosso). À medida que o Estado concede autonomia às escolas (transferindo não apenas recursos, mas também funções e atribuições) e não garante recursos financeiros suficientes para que as unidades de ensino realizem os serviços de educação, essas são obrigadas a resolver, por si mesmas, os problemas decorrentes da escassez. Ao que parece, o governo brasileiro optou por acatar a recomendação da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal) e do Banco Mundial (BM) diversificando as fontes de financiamento da educação pública e incentivando o co-financiamento, já que, além de receberem recursos públicos, as escolas podem, por meio do PDDE, captar recursos de outras fontes para sua sobrevivência ou para disputar lugar no ranking entre as escolas. Para isso, no caso específico das escolas beneficiárias do PDDE, criam-se UExs que dão às escolas condições legais de captar recursos de formas variadas. Para isso, elas também dispõem de autonomia financeira, enquanto técnica de gestão, bastando que sejam criativas na forma de buscar soluções para o problema da falta e/ou insuficiência dos recursos e assim atender rapidamente às demandas da comunidade beneficiada. Nesse processo, a participação e a contribuição de todo e qualquer cidadão é fundamental, já que, para o MEC, todos são co-responsáveis pela oferta da educação. A participação e a contribuição dos cidadãos na escola de seus filhos justificamse, segundo da Paz (2002), por duas razões fundamentais: 1- a CF (art. 205), que torna todo cidadão co-responsável pela promoção da educação; e 2- a estreita 18 Na verdade, não se trata de uma adesão das escolas, mas do ministério responsável pela oferta do serviço de educação que aquelas realizam, nesse caso, o MEC. Assim sendo, as escolas públicas tomam a conformação de uma organização social de direito privado responsável pela oferta dos serviços de educação porque o MEC optou pelo Programa de Publicização proposto pelo governo brasileiro para o setor de serviços sociais e científicos. 58 Programa Dinheiro Direto na Escola relação entre a participação dos pais no Conselho Escolar e os resultados dos alunos. [quanto maior o envolvimento dos pais, maior o desempenho dos alunos]. Assim é que Xavier e Amaral Sobrinho (1999) afirmam que "[...] uma comunidade bem informada pode encontrar caminhos mais eficientes para reivindicar a melhoria da qualidade da escola" (Brasil, 2002c, p. 9-10, grifos nossos). A sociedade é "convocada" a participar na manutenção da escola pública, e esse processo de "participação" é compreendido pelo governo brasileiro como um exercício de cidadania, uma vez que "mobiliza a comunidade e promove o seu envolvimento nas atividades escolares" (Brasil, 2004e, p. 1, grifo nosso). Ser cidadão, nesse desenho, não pressupõe os direitos de ter educação pública assegurados, mantidos e regulamentados pelo Estado a partir dos interesses e reivindicações da população, mas o compromisso de contribuir para que esse serviço seja ofertado, ou seja, responsabilizar-se por parte de sua manutenção. É o cidadão "mais participativo" e "menos espectador" de que nos fala Pereira (1998a). Ora, se, de um lado, o Estado descentraliza recursos públicos para as escolas executarem ações voltadas para a manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE) e assim criarem espaços de decisão, ainda que limitados, acerca do emprego dos recursos públicos, de outro, ele coloca à disposição das UExs um conjunto de estratégias de substituição da manutenção pública da escola pela manutenção privada no momento em que diversifica as fontes de recursos da escola via PDDE. É importante ressaltar que o PDDE não traz, como novidade, a prática de captação de recursos privados pela escola pública. Essa prática tem-se dado muito comumente nas escolas por meio de festas (como a junina e a de misses escolares) e feiras escolares (como a da pechincha), por exemplo, com o objetivo de angariar fundos, ao lado de aquisição de papel para avaliações, de apostilas vendidas por alguns professores para a realização de pequenas ações na escola. Isso, por si só, não compromete a manutenção pública da escola. O que compromete essa manutenção é, a nosso ver, a tendência à substituição do aporte público pelo privado na medida em que as fontes para a manutenção das unidades de ensino se tornam, concorrentemente, públicas e privadas e também porque tais iniciativas acabam se transformando em cobranças indiretas permanentes dos pais e alunos. Ainda que o Programa tenha sido criado a partir de uma política de descentralização de recursos financeiros federais (o que, em tese, significa que a autonomia proposta pelo Programa impunha apenas uma autonomia de gestão financeira, e não autonomia financeira), cabendo às UExs a administração dos recursos públicos transferidos, o governo brasileiro, ao diversificar as fontes de recursos da educação no PDDE, institui a lógica da participação financeira privada na escola pública. Por isso, para além de uma autonomia de gestão financeira, a autonomia proposta no PDDE é uma autonomia financeira. A partir da Resolução n° 17 de 9/5/05, os colegiados das escolas não são mais denominados de unidades executoras, passando a chamarem-se entidades sem fins lucrativos. Referindo-se ao papel do Conselho Escolar na implementação dessa autonomia, o MEC afirma que: Programa Dinheiro Direto na Escola 59 O Conselho Escolar, instrumento de participação da comunidade, deve ser o maior aliado do gestor na construção da autonomia financeira da escola. O repasse de recursos financeiros para a escola, se for bem trabalhado, pode se transformar em ponto de partida para a própria formação e o fortalecimento dos conselhos (Brasil, 2001d, p. 283). Santos (2004, p. 7), ao analisar a configuração dos Conselhos no PDDE (enquanto uma organização social, no padrão de ONGs), afirma que eles "poderão servir de mantenedores da unidade escolar" na medida em que, ao fomentar as ações em parceria na escola, o MEC institui a lógica da captação de recursos privados na escola pública. Para a autora, isso pode estimular a competição na escola "por meio de diferentes estratégias, como a criação de ranking, prêmios de gestão, etc., obrigando as escolas a funcionarem como organizações sociais e buscarem qualquer tipo de parceria [...] em nome da melhoria das suas condições materiais". Com essa medida, afirma Santos (2004, p. 7), [...] o Estado poderá ter espaços objetivos para se desobrigar de sua responsabilidade com a educação. O Programa Dinheiro Direto na Escola é um exemplo emblemático dessa ideologia de abertura e fomento às ações em parceria, na busca pela captação de novos recursos capazes de viabilizar a autonomia das unidades escolares para se autofinanciarem. Nesse contexto, o papel do Estado de mantenedor dos serviços oferecidos pela escola cede espaço para outros atores (em especial, os membros das UExs) que, se desejosos de uma educação de qualidade, devem também "fazer a sua parte" na educação, contribuindo e cooperando de toda forma, para o que a conjugação de esforços coletivos é uma condição básica: Art. 3º – Constituem finalidades específicas das UEx a conjugação de esforços, a articulação de objetivos e a harmonia de procedimentos, o que a caracteriza por: [...] b) promover a aproximação e a cooperação dos membros da comunidade pelas atividades escolares; [...] d) cooperar na conservação dos equipamentos e prédios da unidade escolar [...] (Brasil, 1995, 1996a, p. 20, grifo nosso). Este repasse de responsabilidades pelo financiamento das ações da escola fica mais explícito na medida em que o MEC, exatamente como propunha a Cepal, recomenda que cada escola constitua um fundo financeiro para que as unidades de ensino dêem conta de realizar ações não previstas com recursos repassados pelo Programa. Art. 44 – A UEx constituirá um fundo de reserva para situações emergenciais, cujo percentual deverá ser decidido pela Diretoria, em assembléia (Brasil, 1995, 1996a, p. 28) (grifo nosso). A colaboração financeira da comunidade na manutenção da escola pública foi prevista na reforma do Estado por Bresser Pereira (2001), que já definia que a sociedade assumiria parte dos compromissos financeiros dos serviços sociais executados pelas organizações sociais. 60 Programa Dinheiro Direto na Escola A desresponsabilização do Estado com a oferta pública dos serviços executados pela escola via UEx não está apenas na questão do financiamento, mas também na prestação dos serviços a serem realizados nas unidades de ensino. Aqui, o que o MEC propõe é a substituição da prestação estatal dos serviços pelo serviço voluntário, que pode ser realizado por todo e qualquer membro da UEx, desde que interessado em "colaborar" com a escola. A colaboração voluntária na realização de ações e/ou serviços na escola pode se dar a partir das especificidades de cada unidade de ensino e será determinada tendo em vista a conjugação de diversos fatores. A Unidade Executora será constituída com número ilimitado de sócios pertencentes às categorias: efetivos – serão sócios efetivos os pais de alunos, o diretor e o vice-diretor do estabelecimento de ensino, os professores e os alunos; colaboradores – serão sócios colaboradores o pessoal técnico-administrativo, os pais de ex-alunos, os ex-diretores do estabelecimento de ensino, os exprofessores, os ex-alunos e os demais membros da comunidade, desde que interessados em prestar serviços ao estabelecimento de ensino e aceitos pela Diretoria (Brasil, 1995, 1996a, p. 16-17, grifo nosso). Ao introduzir a lógica do voluntariado na prestação dos serviços na escola, o Estado não apenas se exime da responsabilidade de arcar com as despesas financeiras desses serviços (transformando, por exemplo, os pais de alunos nos responsáveis pela realização voluntária dos serviços de marcenaria, hidráulicos e elétricos da escola), como também dispensa serviços especializados na realização de ações a serem executadas nas unidades de ensino, já que qualquer um pode fazê-lo, desde que tenha disposição, boa vontade e tempo para isso. Programa Dinheiro Direto na Escola 61 3 Estudos de caso 3.1 Estado do Pará O Sistema Estadual de Educação do Pará foi oficialmente criado em 1998 pela Lei nº 6.170, de 15 de dezembro daquele ano, embora a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) já existisse desde 195119. Do ponto de vista da gestão e normatização, compreende as instituições de educação básica e superior mantidas pelo poder público estadual, a Secretaria de Estado de Educação e do Desporto (Seduc), como órgão executivo, e o Conselho Estadual de Educação (CEE)20, como órgão normativo, consultivo e deliberativo. Mais de 90% dos municípios são subordinados às normatizações do Conselho Estadual por não possuírem sistema constituído. A política educacional tem no Plano Decenal de Educação para Todos do Estado do Pará – 1993/200321 uma importante referência para a década subseqüente à sua definição. Ao avaliar a situação educacional no Estado, o Plano 19 De acordo com o site da Seduc, essa Secretaria foi criada em agosto de 1951, por meio da Lei nº 400. O Conselho Estadual de Educação foi criado em 1963, pela Lei nº 2.840, de 18/7/63, e teve suas competências redefinidas pela Lei nº 6.170/98, que criou o Sistema Estadual de Educação. 21 Esse Plano foi discutido durante os primeiros anos da década de 90, sob a coordenação de uma comissão executiva composta pelas seguintes entidades: Demec, Seduc, UFPA, Unama, FEP, Semec, Idesp, Fiepa, Fbesp, Funpapa. Consta, em sua apresentação, que foi amplamente debatido com vários segmentos sociais, como pais de alunos, igrejas, trabalhadores, estudantes, Undime, congregando, dessa forma, órgãos governamentais e não-governamentais. 20 Programa Dinheiro Direto na Escola 65 enumera diversos obstáculos a serem superados para que se consiga universalizar a educação com qualidade, destacando como um dos principais a: "Dispersão e ineficiência na alocação de recursos destinados a investimentos para desenvolver o sistema e para operar e manter as unidades escolares" (Plano Decenal de Educação para Todos – Pará, 1999, p. 27). A política de gestão proposta pelo Plano Decenal de Educação do Pará elege a gestão democrática como fim, mediante a implantação e aperfeiçoamento de Conselhos Escolares, a autonomia e, ao mesmo tempo, a integração da escola com a comunidade. Barros (1991), ao relatar o processo de luta pela implantação dos Conselhos Escolares em Belém, destaca a atuação da organização dos professores nesse sentido e sinaliza os Congressos Estaduais de Professores, ocorridos em 1983 e 1984, como marcos nesse processo – mas que só alcançaram uma resposta em 1987, quando a Seduc, por meio da Portaria nº 201/87, institucionalizou a criação de Conselhos Escolares na rede estadual22. A partir do governo de Almir Gabriel (PSDB) a política de gestão democrática proposta pelo Plano Decenal é colocada um pouco à margem da discussão quando é proposto o Plano Estadual de Educação para o período de 1995 a 1999. O governo retoma os princípios de descentralização e municipalização da gestão do ensino fundamental previstos na Constituição Estadual de 1989, lançando publicamente a Proposta de Municipalização do Ensino Fundamental em 1996. Com a possibilidade de antecipação da vigência da Lei nº 9.424/96, a Assembléia Legislativa do Pará aprova a Lei nº 6.044/97 em 16 de abril de 1997 que possibilitou ao Pará implantar, de forma pioneira no País, o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), a partir de julho de 1997, o que possibilitou a adesão de 67,1% dos municípios à proposta de municipalização do ensino fundamental no Estado, redefinindo esse atendimento a partir de 1997 como demonstram os seguintes números: Tabela 1 – Pará – Matrículas no ensino fundamental por dependência administrativa - 1996 a 2004 Dependência administrativa Estadual Federal Municipal Particular Total Anos 1996 1997 1999 2000 2001 2003 2004 788.288 816.692 561.310 451.382 421.938 388.698 365.884 3.771 3.825 4.534 4.579 3.848 3.326 1.907 505.127 577.333 986.275 1.089.490 1.116.199 1.170.294 1.184.001 67.825 61.840 71.481 77.252 63.310 61.986 63.150 1.369.430 1.614.743 1.614.743 1.606.537 1.609.733 1.624.301 1.614.942 Fonte: MEC/Inep – Censo Escolar – 1996 a 2004, exceto os anos de 1998 e 2002. O ensino fundamental regular no Estado do Pará, em 2004, compreendia um total de 1.614.942 alunos, o que representa apenas 4,74% do total nacional, embora 22 O Conselho Escolar, no Estado do Pará, embora estivesse previsto no art. 278 da Constituição Estadual, só viria a ser regulamentado no ano de 1991, por meio da Lei Complementar nº 6/91, por iniciativa do então deputado Edmilson Rodrigues. 66 Programa Dinheiro Direto na Escola represente 48,2% de toda a Região Norte. Observa-se a expressiva municipalização ocorrida no período. Em 1996 a participação porcentual das redes municipais no conjunto das matrículas do ensino fundamental na rede pública era de 36,88%, passando a 73,35%, em 2004, aumentando, portanto, em 134,4% o número de matrículas no período. Em compensação, a matrícula na rede estadual, que em 1996 era de 57,56%, passa para 22,65% em 2004, diminuindo o seu atendimento em 53,6%. A quantidade global de alunos não sofre aumento significativo ficando em apenas 17,92%. O que aconteceu foi uma redefinição das competências de atendimento ou "uma municipalização na marra" conforme Neves (1999, p. 138). Muito mais do que democratização da gestão ancorada na participação, o que vamos ver no limiar da década de 90 no Pará é a descentralização da gestão associada ao discurso da eficiência administrativa em função da economia de recursos proporcionada pela descentralização dos mesmos, via Fundef ou via PDDE (Gemaque, 2003; Gutierres, 2005). A implantação e a gestão do PDDE na rede estadual de ensino do Pará Na rede estadual de ensino do Pará, como nos demais estados do País, o PDDE foi implantado por meio da legislação federal, que criou a sistemática de repasse de recursos financeiros federais para as escolas públicas de nível fundamental (Resolução FNDE/CD nº 12, de 10 de maio de 1995). A implementação do Programa ocorreu no mesmo ano de sua implantação em nível nacional (1995) e de acordo com as orientações centrais do MEC/FNDE. Nos dois primeiros anos de exercício do Programa (1995 e 1996), o repasse dos recursos ocorreu do FNDE para a entidade mantenedora (EEx) das escolas da rede de ensino (a Seduc), que distribuía os recursos entre suas escolas de acordo com o número de matrículas registradas no Censo Escolar. A partir de 1997, as escolas foram orientadas a constituírem as unidades executoras. Vejamos os números desses repasses: Tabela 2 – Pará – Repasses do PDDE para a rede estadual segundo número de escolas, alunos e rubricas custeio e capital de 1996 a 2004 Ano Número de escolas Número de alunos Valores para custeio Valores para capital Total 1996* 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total 3.186 2.546 2.669 1.656 1.583 1.165 1.037 972 949 15.763 951.995 781.851 788.439 548.839 542.692 443.535 406.930 385.480 364.912 5.124.673 8.022.600,00 7.986.700,00 7.710.170,00 4.973.600,00 4.949.400,00 3.998.000,00 3.637.300,00 3.461.100,00 3.215.901,46 47.954.771,46 1.154.000,00 1.243.420,00 837.100,00 851.100,00 707.600,00 649.100,00 621.000,00 732.754,94 6.796.074,94 8.022.600,00 9.140.700,00 8.953.590,00 5.810.700,00 5.800.500,00 4.705.600,00 4.286.400,00 4.082.100,00 3.948.656,40 54.750.846,40 Fonte: Seduc/Departamento Financeiro. * Em 1996, a utilização dos recursos foi definida somente para gastos com custeio da escola, excluindo-se os gastos com capital. Programa Dinheiro Direto na Escola 67 Verifica-se que houve um significativo índice de diminuição de recursos do PDDE de 1996 em relação a 2004 na base de 50,7%. O número de escolas beneficiadas pelo Programa no período também sofreu uma redução de 70,2%, bem como o número de alunos, que foi reduzido em 61,6% nos 9 anos de existência do PDDE. Certamente esse resultado se deve aos efeitos da política de municipalização ocorrida no Estado a partir de 1997. Inicialmente, a Seduc realizou treinamentos que envolveram apenas os diretores das escolas da rede para orientá-los na execução e prestação de contas dos recursos. A partir de 1997 – ano em que o MEC/FNDE descentralizou os recursos diretamente para as escolas com mais de 200 alunos matriculados –, os treinamentos passam a ser diretos para os Conselhos Escolares23 (CE), pois, a partir das novas determinações do MEC (exigência de constituição de unidades executoras próprias (UEx) para o recebimento direto dos recursos, sem a necessidade de convênios), essas entidades (os CE) é que passam a ser os responsáveis primeiros pelo recebimento e administração dos recursos do Programa. Entre as dificuldades enfrentadas nesse início, estava a falta de entendimento da linguagem técnica dos materiais vindos do MEC por parte de algumas escolas da rede, o que levou algumas unidades de ensino da rede a sofrerem sanções do MEC/ FNDE quanto à utilização (inadequada, não permitida pelas normas do Programa) dos recursos. De acordo com as normas do Programa, essas escolas foram obrigadas a devolver os recursos aplicados de forma inadequada. Hoje, essas dificuldades foram superadas, pois além dos treinamentos, a Seduc produziu e distribuiu cartilhas que orientam os CE sobre como gastar os recursos e fazer a prestação de contas. As despesas correspondentes à transformação dos CE em UEx, em entidades jurídicas de direito privado (registro das UEx em cartório, pagamento de taxas à Receita Federal) foram custeadas pela Seduc, já que são despesas que não podem ser pagas com recursos do Programa. Na rede estadual de ensino do Pará, a gestão do PDDE tem-se dado de duas formas, ambas previstas nas normas de funcionamento do Programa: 1) por meio do repasse dos recursos do FNDE para a Seduc, que, na condição de entidade mantenedora e executora (EEx), recebe e administra os recursos do Programa; e 2) do FNDE para as unidades executoras (UEx) das escolas da rede, no caso os Conselhos Escolares. No segundo caso, a Seduc acredita ter assumido, até então, papel importante no processo de acompanhamento da aplicação dos recursos pelas escolas, orientando-as a investi-los apenas nas áreas permitidas pelo FNDE. Assim, afirma que "[...] a atuação da Seduc é só para orientar que eles não gastem de forma diferente da que o Conselho Deliberativo [do FNDE] determina. Tem algumas determinações: quanto vai ser gasto em capital, quanto vai ser gasto em custeio e o nosso controle é em cima disso, entendeu?" (Seduc/PA, p. 2). A orientação do MEC/FNDE, seguida à risca pela Seduc, não compromete a autonomia da escola, pois, segundo o ponto de vista dos componentes dos Conselhos Escolares das escolas pesquisadas o PDDE tem apresentado avanços na democratização das 23 Na rede de ensino do Estado do Pará, as entidades representativas das escolas são os Conselhos Escolares, que, com o PDDE, se tornam os responsáveis diretos pela gestão dos recursos do programa no âmbito da escola. 68 Programa Dinheiro Direto na Escola decisões, haja vista que, antes da implantação do Programa, quem decidia onde aplicar os recursos era a Seduc. Atualmente essa é uma decisão que cabe ao coletivo da escola, por meio do Conselho Escolar. Por outro lado, a gestão do PDDE por meio das UExs na rede estadual, tem apresentado alguns problemas em função do não-funcionamento dos Conselhos Escolares. Esse não-funcionamento, segundo as informações coletadas, decorre da falta de interesse da comunidade escolar em participar das reuniões. Esse é, para o representante da Seduc, o único fator que compromete a gestão do Programa, pois, para ele, o PDDE é, por si só, uma política de descentralização bastante positiva para as escolas, já que, por meio do Programa, o governo federal tem viabilizado não só a participação da comunidade escolar no emprego dos recursos das escolas, como também um aumento nos investimentos na escola, que antes do Programa, contava apenas com recursos estaduais (Fundo Rotativo). Tabela 3 – Belém – Repasses do PDDE para a rede estadual segundo número de escolas, alunos e rubricas custeio e capital de 1999 a 2004 Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total Número de escolas 868 737 238 223 214 209 2.489 Número de alunos Valores para custeio Valores para capital 192.051 188.925 161.261 149.433 140.750 133.991 966.411 1.822.600,00 1.741.400,00 1.301.800,00 1.194.500,00 1.155.700,00 1.066.801,42 8.282.801,42 246.600,00 258.000,00 252.000,00 231.900,00 224.900,00 264.422,38 1.477.822,38 Total 2.069.200,00 1.999.400,00 1.553.800,00 1.426.400,00 1.380.600,00 1.331.223,80 9.760.623,80 Fonte: Seduc/Departamento Financeiro. O repasse dos valores do PDDE para Belém nos anos de 1996 e 1997 deuse por meio de convênios. Como as escolas ainda não contavam com unidades executoras, a própria Seduc coordenou a execução do PDDE a partir do plano de aplicação das escolas. As UExs vão sendo criadas gradativamente e em 2004, 97% das escolas estaduais de ensino fundamental de Belém já haviam constituído suas UExs, como se pode constatar abaixo: Tabela 4 – Belém – Evolução do número de unidades executoras na rede estadual – 1999 a 2004 Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total Número Número de escolas de alunos 868 737 238 223 214 209 2.489 192.051 188.925 161.261 149.433 140.750 133.991 966.411 Número de escolas com unidade executora 204 229 226 214 208 202 1.283 Número de escolas sem unidade executora* 664 508 12 9 6 7 1.206 Fonte: Seduc/Departamento Financeiro. * Os números de escolas sem unidade executora correspondem àquelas cuja administração dos recursos ficava sob a coordenação direta da Seduc. Programa Dinheiro Direto na Escola 69 A Escola estadual de ensino fundamental e médio "A" A escola "A" fica situada em um bairro periférico de Belém, o Guamá24 e dispõe de boas instalações em termos de prédio. Atende ao ensino fundamental, ao ensino médio e à educação de jovens e adultos. Foi fundada em 1985, funcionando em três turnos, com 2.151 alunos matriculados (2004) e distribuídos nos cursos de ensino fundamental (416), médio (l.465) e supletivo médio (270). O corpo docente é composto por 65 professores sendo que 95,23% possuem nível superior e 15,38% pós-graduação. O corpo técnico-administrativo da escola é composto por uma diretora, três vice-diretoras, duas orientadoras educacionais (todas habilitadas em área específica de gestão e orientação, a maioria com pós-graduação) e uma secretária habilitada. Cabe evidenciar que a escola "A" tem como órgão consultivo e deliberativo o Conselho Escolar, fundado no início dos anos 90, com registro de pessoa jurídica a partir de 11/6/97, que funciona regularmente, segundo a direção da escola, mas que há uns meses só faz reuniões em casos de necessidade. Em relação ao espaço físico da escola, este se encontra bem conservado, tendo passado recentemente por uma reforma para adequação de salas de recursos audiovisuais. A implantação e a gestão do PDDE na escola "A" A escola estadual "A" foi uma das primeiras escolas da rede a implantarem o PDDE em 1996, ainda com a denominação de Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (PMDE). Os recursos foram repassados via Seduc, no valor de R$ 10 mil, sendo a diretora a responsável pelo seu destino e aplicação na unidade escolar, com direcionamento de aplicar somente na aquisição de material de consumo. Em seguida, a Seduc forneceu à escola um Manual com normas para a gestão e organização do Conselho Escolar, detalhando todos os passos para a sua constituição a fim de possibilitar à escola receber diretamente os recursos do PDDE. Foram realizados também treinamentos por técnicos da Seduc, mas que, segundo o presidente do CE, não foram suficientes para esclarecer bem o papel desse órgão. Um dado a ressaltar é que o Regimento do Conselho Escolar é único para toda a rede estadual do Pará, o que resultou em um embate judicial do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Pará (Sintep) contra a imposição, por parte da Seduc, de um padrão unificado de Colegiado Escolar. A partir da habilitação da UEx, a escola passou a receber recursos do PDDE, Fundo Rotativo, além de outros que eventualmente entram na escola, como doações ou resultados de pequenas promoções festivas que a escola realiza, como festa junina, festival do sorvete, 24 O bairro do Guamá é caracterizado como um dos mais populosos, pobres e violentos do município de Belém, sobretudo pelo surgimento de uma grande quantidade de áreas de ocupação que acabaram dificultando ainda mais a infra-estrutura do bairro, tanto no que se refere ao saneamento básico, quanto aos serviços de saúde, educação e lazer, entre outros. 70 Programa Dinheiro Direto na Escola etc., que já existiam antes. A aplicação dos recursos passou a ser discutida pelo coletivo escolar. O registro do CE só se efetivou em 11/6/97, a partir do que foi aberta uma conta no Banco do Estado do Pará, sendo ordenadores da despesa a diretora (presidente do CE) e o tesoureiro do Conselho (vice-diretora). Somente a partir de 1998 ela passa a receber os recursos diretamente, como demonstra a tabela abaixo: Tabela 5 – Programa Dinheiro Direto na escola "A" recebido desde 1998 até 2004 Ano Número de alunos Vl. custeio (C) 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total geral 1.001 1.030 1.039 1.064 972 731 416 8.600,00 8.600,00 8.600,00 8.600,00 7.500,00 5.300,00 3.291,60 50.491,60 Vl. capital (K) 1.700,00 1.700,00 1.700,00 1.700,00 1.400,00 1.000,00 822,90 10.022,90 Total 10.300,00 10.300,00 10.300,00 10.300,00 8.900,00 6.300,00 4.114,50 60.514,50 Fonte: Seduc/2005. Conforme podemos visualizar na tabela acima, a escola recebeu diretamente R$ 10.300,00 em 1998 passando a receber apenas R$ 4.114,50 em 2004, uma redução de 60%, o que veio a ter impacto nas dificuldades de uma boa manutenção já que a Seduc não compensou essas perdas decorrentes da diminuição dos alunos no período, que foi da ordem de 58,44% em relação a 199825, situação que reflete a política de municipalização adotada pelo governo estadual desde 1996, antes referida. Há que se ressaltar que essa diminuição de recursos tem forçado a escola a desenvolver outros mecanismos de compensação das perdas, tais como a cobrança de taxas para a confecção de carteirinhas. A tabela a seguir pode nos dar uma idéia sobre a situação financeira da escola, demonstrando o total de recursos recebidos e geridos em 2004: Tabela 6 - Recursos recebidos pela escola "A" em 2004 Número de alunos PDDE Fundo rotativo Arrecadação promoções Recebido aluno (R$1,00 cada) Carteirinhas Total 2.151 4.114,50 4.691,50 500,00 2.151,00 11.457,00 Fonte: Arquivos da escola “A” – 2004. 25 Embora Belém ainda não tenha oficialmente municipalizado o ensino, está se dando, na verdade, uma municipalização compulsória porque, de 2002 para 2004, foi diminuindo o número de vagas para o ensino fundamental nessa escola. Em 2005, só há uma turma de 46 alunos dessa etapa do ensino básico. Programa Dinheiro Direto na Escola 71 A Tabela 6 demonstra toda a arrecadação da escola "A" durante um ano, em um total de R$11.457,00. O PDDE representa 34,29% do total recebido; o próprio fundo rotativo é um pouco maior porque o número de alunos do ensino fundamental está muito reduzido em função do processo crescente de municipalização; o Fundo Rotativo, além do número de alunos, considera os espaços físicos existentes na escola como critério de alocação de recursos. Apesar de os sujeitos entrevistados considerarem os recursos do programa irrisórios diante das necessidades de despesas apresentadas pela escola, esses representam parcela significativa na arrecadação. O fato é que os recursos públicos transferidos às escolas pelo sistema estadual têm sido insuficientes, o que pode forçosamente conduzir as unidades de ensino à necessidade de ampliá-los, captando outros de fontes privadas por meio de parcerias ou diretamente com a realização de eventos de toda natureza, obrigando até muitas vezes os pais a arcarem com aquisição de rifas, bingos ou outras promoções similares, para assim dar conta das suas demandas. Não encontramos nenhuma norma nos documentos do PDDE analisados que limite os valores dos recursos a serem captados pela escola, o que significa que as unidades de ensino podem buscar o quanto "necessitar" de recursos para dar conta das ações planejadas no seu projeto pedagógico. É importante ressaltar que o PDDE não traz, como novidade, a prática de captação de recursos privados pela escola pública. Essa prática se tem dado muito comumente nas escolas por meio de festas (como a junina, a de misses escolares) e de feiras escolares (como a da pechincha, de festival do sorvete) com o objetivo de angariar fundos, ao lado de aquisição de papel para avaliações, de apostilas vendidas por alguns professores para a realização de pequenas ações na escola, cobrança de carteirinhas de identificação, tal como vem fazendo a escola "A". Isso, por si só, pode até não comprometer a manutenção pública da escola. O que compromete esta manutenção é, a nosso ver, a tendência à substituição do aporte público pelo privado na medida em que as fontes para a manutenção das unidades de ensino tornam-se, concorrentemente, públicas e privadas e também porque tais iniciativas acabam se transformando em cobranças indiretas permanentes dos pais e alunos, o que, contraditoriamente, é legalmente proibido nas escolas públicas de Belém, ao mesmo tempo em que o próprio MEC as incentiva. Ao lado disso, consideramos que as UExs têm um poder do qual elas próprias ainda não se deram conta, porque podem captar qualquer recurso e, se não houver um colegiado funcionando efetivamente, com a comunidade escolar e local participando ativamente, com compromisso político e consciência sobre seus papéis na condução da escola, tais captações poderão descambar para outras finalidades. É unânime a importância atribuída ao PDDE para a comunidade escolar, que manifesta sua aprovação, ainda que alguns o critiquem pelo excesso de exigências, na maioria das vezes circunscritas à pesquisa de preços e prestação de contas. Enfatiza-se a melhoria das condições infra-estruturais e até das salas de aula, por meio da utilização de equipamentos e materiais pedagógicos. Um outro destaque nas falas foi o estímulo à participação do coletivo escolar nas decisões sobre a vida da escola, porque, mesmo existindo o Conselho anteriormente, não havia uma participação nas decisões de recursos financeiros. 72 Programa Dinheiro Direto na Escola Ao lado disso, nem todas as categorias estavam representadas naquele colegiado, sendo hoje diferente. Entretanto, as reuniões não vêm acontecendo periodicamente, como prescreve o Regimento, mas só nas emergências, o que entendemos como um óbice à participação tão defendida. Na verdade, as reuniões acontecem para definir as prioridades e na prestação de contas do PDDE. Por outro lado, todos reconhecem a fundamentalidade do Programa, criticam as exigências para sua operacionalização, especialmente o atraso no repasse dos recursos, que vem aumentando, segundo suas avaliações. Apontam ainda o trabalho dos conselheiros para 14operacionalizar tudo em tempo mínimo, até apresentando sugestões, como ampliação da verba para o ensino médio, liberação em tempo adequado para dar condições de exeqüibilidade e otimização desses recursos. Das manifestações dos entrevistados, podemos destacar que, em vários momentos, os sujeitos demonstraram preocupações com o final do recebimento dos recursos do PDDE em função da municipalização compulsória do ensino fundamental, tal seu significado na escola. Como a pesquisa envolveu também a rede municipal de ensino, é dela que começaremos a tratar em seguida. O Sistema Municipal e a política educacional no município de Belém O Sistema Municipal de Educação de Belém foi criado em julho de 1994, mediante a Lei nº 7.722, de 7 de julho daquele ano. De acordo com o art. 1º da Resolução nº 17/99 do CME. O Sistema Municipal de Educação de Belém é constituído, entre outros, pelas instituições de educação mantidas pelo poder público municipal; pelas instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada e pelos órgãos municipais de educação, como a Secretaria Municipal de Educação (Semec) e o Conselho Municipal de Educação (CME)26. Com a eleição do prefeito Edmilson Rodrigues (PT), que exerceu mandato de 1997 a 2000, reeleito de 2001 a 2004, a política educacional ancorou-se em um programa de gestão definido como "Governo do Povo", que, entre outras ações, implementou, o Projeto Pedagógico denominado "Escola Cabana"27, fruto das discussões implementadas durante os fóruns temáticos e os Congressos Municipais de Educação28. De acordo com o Caderno de Educação nº 1, de 1999 (Semec), são diretrizes básicas do Projeto: O CME foi criado pela Lei nº 7.509, de 20 de janeiro de 1991, e reestruturado pela Lei nº 7.772/94. Essa nova lei define a composição do CME em oito membros paritários entre os representantes do poder público e da sociedade civil e reduz a duração do mandato dos conselheiros de quatro para dois anos. 27 Essa proposta é inspirada nos ideais do Movimento Cabano, que, nos anos de 1800, unificou diferentes segmentos da sociedade (índios, negros e caboclos que viviam em cabanas miseráveis às margens dos rios) pela liberdade diante da opressão do governo central ao Estado paraense. 28 Os principais fóruns realizados foram os seguintes: I Fórum de Educação da Rede Municipal de Ensino: Projeto Político Pedagógico: um olhar que ressignifique a educação municipal (1997); I Conferência Municipal de Educação – Escola Cabana: dando um futuro às crianças (1998); II Fórum Municipal de Educação – Reconstruindo o Currículo de Jovens e Adultos na Escola Cabana (1999); I Seminário de Gestão Democrática no Projeto Político-Pedagógico da Escola Cabana (2000); II Seminário de Gestão Democrática (2001); I Congresso Municipal de Educação de Belém (2003) e II Congresso Municipal de Educação de Belém, realizado em 2004. 26 Programa Dinheiro Direto na Escola 73 • • • • Democratização do acesso e permanência com sucesso; Gestão democrática; Qualidade social da educação; e Valorização do profissional da educação. A criação de Conselhos Escolares na rede municipal de Belém está prevista na Lei Orgânica do Município, em seu art. 214, cuja regulamentação se deu em 1994, pela Lei Municipal nº 7.722/94. Com o projeto Escola Cabana e por meio da Resolução CME n° 6/2001, o Conselho Escolar assume um caráter deliberativo, mas é somente a partir do ano de 1997 que passa a constituir-se como unidade executora, com personalidade jurídica. É composto por no mínimo 7 e no máximo 19 membros eleitos por seus pares, sendo 50% de representantes da Semec (coordenadores pedagógicos, professores, agentes operacionais e administrativos) e 50% de usuários (alunos com idade a partir de 12 anos, pais e/ou responsáveis por alunos da escola e comunidade organizada). O diretor da escola é membro nato, mas não pode assumir cargo executivo, embora lhe seja preservado o direito de voto. Esses representantes têm poder de decisão sobre a parte pedagógica, administrativa, financeira e política da escola. A configuração democrática do Conselho Escolar adotada pela rede é fruto das lutas dos educadores desde a década de 80, quando, por meio de suas organizações, fizeram aprovar na Assembléia Legislativa a Lei nº 6/91, que regulamentava a criação de Conselhos Escolares em todo o Estado. Quanto ao atendimento educacional, o município de Belém apresenta a seguinte situação por dependência administrativa em 2004: Tabela 7 – Atendimento do ensino básico e modalidades especiais no município de Belém por dependência administrativa – 2004* Ensino Dependência Educação Ensino administrativa infantil fundamental médio Estadual Federal Municipal Privada Total 1.412 287 11.700 11.085 24.484 139.896 1.907 48.548 26.534 216.885 79.749 535 171 16.526 96.981 EJA 51.202 0 13.917 132 65.251 Educação Educação profissional especial 596 0 164 822 1.582 1.270 0 0 1.194 2.464 Total 274.125 2.729 74.500 56.293 407.647 Fonte: MEC/Inep – Censo Escolar de 2004. São 407.647 alunos atendidos nas várias modalidades do ensino básico em Belém. O ensino fundamental é o que mais recebe atendimento e significa 53% do total geral. A rede estadual ainda é a que mais atende a essa etapa, sendo responsável por 64,5% das matrículas, em razão de a Prefeitura Municipal de Belém ter optado por não municipalizar o ensino fundamental, como já o fizeram 96 municípios paraenses desde 1996, quando a proposta foi lançada pelo governo do Estado. Mas, de modo geral, a Semec vem ampliando o seu atendimento. 74 Programa Dinheiro Direto na Escola Implantação e gestão do PDDE na rede municipal de Belém O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) foi implantado na rede municipal de ensino em Belém dois anos após sua criação pelo governo federal, ou seja, só em 1997. Denominou-se inicialmente Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (PMDE), conforme Resolução nº 12/95. Consta nos arquivos da Semec que, naquele ano, foi assinado o Convênio nº 557/97, que beneficiou 48 escolas e 42.484 alunos, no valor de R$ 510.900,00, com vigência até 28/2/98. Embora a cláusula 4ª do referido convênio facultasse a execução financeira às unidades executoras (UExs), nesse ano ainda não houve a possibilidade de o recurso ser repassado diretamente para as escolas, uma vez que as UExs ainda se encontravam em fase de criação. Esse convênio ainda foi executado via Semec, que se baseou em um plano de aplicação advindo da escola. Os mecanismos e critérios de repasse foram os mesmos definidos nacionalmente pela Resolução nº 3/97 do FNDE, que contemplava as escolas com mais de 20 alunos no ensino fundamental e se baseava no número de alunos do Censo Escolar/Inep do ano anterior. Para a criação dessas UExs, a Semec recebeu orientação de uma equipe do FNDE/MEC, que esteve em Belém exclusivamente para orientar os municípios nessa tarefa. O ordenamento jurídico federal advindo do FNDE passou por adaptações na Semec, que, por meio de uma linguagem mais clara, elaborou materiais informativos, como folders e cartilhas, que foram utilizados nos cursos e oficinas29 de capacitação dos gestores e conselheiros escolares. Toda essa preocupação com os treinamentos e com o conhecimento das normas para execução e prestação de contas pela escola têm um caráter preventivo, pois, segundo o técnico da Semec, em última instância, esta se sente responsável caso alguma escola torne-se inadimplente e deixe de receber os recursos. Daí o estabelecimento de parcerias nessas orientações com o CME e o setor jurídico e contábil da Semec. Esse talvez seja o motivo por que não haja tantos problemas com relação à execução e prestação de contas dos recursos pelas escolas. A partir de 1998, os recursos do PDDE foram descentralizados para as escolas por meio de seus respectivos Conselhos Escolares, então transformados em unidades executoras. Nesse processo de implantação, foram definidos os mesmos critérios de funcionamento e gestão das demais escolas do País, adotando-se a regulamentação definida pelo MEC/FNDE, já que o município não dispõe de uma legislação própria para o PDDE, embora adote o procedimento de pagamento de despesas em regime de adiantamento ou suprimento de fundos30 para as escolas de forma legal desde 1993 (Lei nº 7.627 de 20 de maio de 1993, Decreto nº 39.114 – PMB, de 24 de julho de 2001), que guarda alguma semelhança 29 Segundo o técnico da Semec, foram várias as oficinas e minicursos ministrados que, além de capacitar os conselheiros quanto aos programas e projetos que envolviam financiamento da educação, especialmente o PDDE, visavam orientar o trabalho coletivo a ser desenvolvido pelo Conselho Escolar. 30 O adiantamento refere-se ao fornecimento de recursos financeiros para pagamento de despesas que, por sua natureza e urgência, são facultadas de seguir os trâmites mais demorados. São consideradas despesas de pronto pagamento: selos postais, gás, impressos e papelaria, transporte urbano, água, consertos, entre outros. Programa Dinheiro Direto na Escola 75 com o PDDE. Embora este seja repassado mensalmente para a escola (em torno de R$ 800,00 mensais), não o é para o Conselho Escolar, mas para o diretor, que se encarrega de executá-lo e fazer a prestação de contas à Semec. A gestão do PDDE no município de Belém concentra-se basicamente em dois espaços. O primeiro compreende a Secretaria Municipal de Educação, que é responsável pelo recebimento e execução dos recursos do PDDE das escolas que não instituíram UEx, pelo cadastramento de novas UExs, pela orientação sobre a dinâmica de funcionamento dos conselhos, pelo acompanhamento e recebimento da prestação de contas das UExs de sua rede. O segundo refere-se às próprias UExs, que executam e prestam contas dos recursos à Semec. Mesmo com os avanços expressivos alcançados, ainda persistem alguns problemas nesses colegiados, como: 1) nem sempre há uma participação desejável de todos os seus membros nas reuniões; 2) irregularidade de reuniões, em contraposição ao que preconiza seu Regimento; 3) o pouco reconhecimento do CE como instância representativa da comunidade escolar; 4) dificuldades de alguns diretores lidarem com divergências surgidas em relação às suas decisões, entre outros. Os dados fornecidos pela Semec dispostos na Tabela 8 dão conta que é somente a partir do ano de 1998 que o PDDE começa a ser operacionalizado diretamente pelas escolas, quando inicia com 52 unidades executoras. Atualmente, estão habilitadas 59 escolas, o que significa um aumento de 14% na quantidade de escolas com unidades executoras. Tabela 8 – Belém – Repasses do PDDE para a rede municipal segundo número de escolas, alunos e rubricas custeio e capital – 1997 a 2004 Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total Número de escolas 48 52 52 54 56 59 59 59 439 Número de alunos Valores para custeio Valores para capital 42.484 41.786 42.202 44.553 44.368 45.684 47.771 47.105 365.953 447.700,00 329.900,00 334.900,00 353.700,00 353.300,00 369.200,00 381.800,00 362.567,20 2.933.067,20 63.200,00 63.500,00 64.400,00 67.700,00 68.000,00 71.000,00 73.700,00 90.487,90 561.987,90 Total 510.900,00 393.400,00 399.300,00 421.400,00 421.300,00 440.200,00 455.500,00 453.055,10 3.495.055,10 Fonte: Coordenadoria de Planejamento (Coplan)/Semec. Nos oito anos de implantação do programa, o quantitativo de recursos apresenta um decréscimo de 11,32%, que, de R$ 510.900,00, em 1997, passam para R$ 453.055,10, em 2004, inversamente ao número de alunos, que aumentou 12,29%, indo de 42.484, em 1997, para 47.105, em 2004. Certamente, tais oscilações devem-se às modificações dos cálculos dos coeficientes que determinam os valores ano a ano. O Sistema Municipal de Educação de Belém foi contemplado 76 Programa Dinheiro Direto na Escola com o total de R$ 3.435.055,10, a título de repasses do PDDE de 1997 a 2004. Vale ressaltar que o PDDE contempla as 152 escolas da rede porque inclui os anexos, incorporando as matrículas desses espaços que funcionam em pequenos prédios próprios, centros comunitários ou imóveis alugados. A escola municipal de educação infantil e fundamental "B" A escola "B" está localizada no bairro da Cidade Velha31, tendo um anexo no bairro do Jurunas32, no município de Belém. Atende à educação infantil (4 a 5 anos de idade), ensino fundamental e educação de jovens e adultos, funcionando em quatro períodos: manhã, intermediário, tarde e noite. Possui as seguintes dependências: seis salas de aula, uma sala de leitura, um depósito para alimentos, uma secretaria, uma cozinha e cinco banheiros. Essas dependências são pequenas. No entanto, não apresentam depredações nem pichações. A escola conta com 59 funcionários, entre eles: um diretor, três supervisores, três orientadores, dois administradores e uma secretária. Uma questão muito comentada pela comunidade escolar é o problema do tamanho da escola, o que é visto como um fator que dificulta o melhor desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem. Em conseqüência do espaço restrito, não há quadra de esportes para a realização de atividades físicas dos alunos, o que invalida qualquer atividade de lazer dentro da escola, além de, com as intensas chuvas que caem cotidianamente em Belém, a escola do bairro da Cidade Velha ficar inundada. Pelo fato de a escola dispor de um pequeno espaço para atender à comunidade, foi criado um prédio anexo, que está localizado no Bairro do Jurunas. No entanto, existe uma disparidade entre as duas realidades, evidentemente distintas, ainda que constituam uma só escola. Ambos os espaços escolares são administrados pela mesma diretora, que, segundo relatos, conta com o apoio das técnicas para a realização das atividades no prédio anexo. Todas as programações desenvolvidas tentam contemplar as duas realidades. A implantação e a gestão do PDDE na escola municipal "B" O PDDE foi implantado na escola em 1999, sendo muito bem recebido. No princípio, houve muitas dificuldades, mas a Semec orientou as escolas e sempre havia técnicos disponíveis para explicar seu funcionamento, segundo a presidente do Conselho, diretora da escola. Geralmente, quem participa mais na prestação de contas são professores que entendem das contas e ajudam a escola. A escola define o seu plano de aplicação por meio do Conselho Escolar, cuja dinâmica de 31 O bairro da Cidade Velha é um dos bairros pioneiros da cidade de Belém, onde se localiza a maioria dos prédios e monumentos históricos que guardam a memória de sua fundação. 32 O bairro do Jurunas é um bairro populoso, que apresenta carências infra-estruturais diversas. Programa Dinheiro Direto na Escola 77 funcionamento é baseada em reuniões ordinárias mensais – convocadas pelo coordenador do Conselho –, extraordinárias e eventuais, convocadas pelo coordenador ou por pelo menos um terço dos membros. Somente a partir de 2000 a escola passou a receber diretamente os recursos, em virtude de problemas na habilitação da UEx nos anos anteriores. A tabela abaixo dá uma visão dos recursos que chegaram à escola desde 1999: Tabela 9 – Recursos do PDDE transferidos para a escola "B" 1999 a 2004 Ano Alunos Custeio 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Totais 653 653 661 593 784 729 4.185 5.300,00 5.300,00 5.300,00 5.300,00 7.500,00 5.277,12 33.977,12 Capital 1.000,00 1.000,00 1.000,00 1.000,00 1.400,00 1.319,28 6.719,28 Total 6.300,00 6.300,00 6.300,00 6.300,00 6.596,40 6.596,40 40.696,40 Fonte: Escola “B”. O total de recursos transferidos do PDDE para a escola desde o ano de sua implantação até 2004 varia de R$ 6.300,00 a R$ 6.596,40. Outro ponto que podemos observar na referida tabela é o aumento de recursos transferidos para escola em 2003, que recebia um valor de R$ 6.300,000 e, no ano seguinte, passou a receber R$ 8.900,00. Esse aumento significou um acréscimo no número de matrículas no ensino fundamental, mas em 2004 diminuiu o número de alunos e baixaram os recursos. As entrevistas e observações revelam que, na escola, há uma primeira reunião para decidir onde aplicar a verba do PDDE, que em geral ocorre no período que antecede a chegada do recurso. Recomenda-se que cada representante do CE verifique as prioridades com as categorias que representam para que, em um período posterior, com a chegada da verba, essas necessidades já tenham sido pelo menos pensadas e discutidas com as categorias, uma vez que se dispõe de um determinado tempo para gastá-la e os conselheiros, em geral, não possuem tempo disponível para se dedicar à execução de tais tarefas devido ao excesso de atividades desenvolvidas e ao tempo exíguo de operacionalização do Programa e sua prestação de contas. É válido ressaltarmos que os recursos do PDDE direcionados para cada escola ficam sob a responsabilidade dos CEs, mas são o presidente e o tesoureiro que mais trabalham, porque são eles que devem movimentar a conta bancária da unidade executora e fazer as licitações. Quando a verba chega na conta, os representantes do CE são convocados novamente para uma reunião, em que apresentam suas prioridades; entre elas, são escolhidas aquelas mais viáveis de acordo com o valor estabelecido para custeio e capital. É a partir da definição das metas 78 Programa Dinheiro Direto na Escola que o tesoureiro e o presidente vão fazer pesquisa de preços nas lojas acerca do que se vai comprar com a verba, necessitando avaliar no mínimo três orçamentos distintos para então decidir onde vão adquirir os bens. E isso vem sendo cumprido rigorosamente pela escola. Na concepção da diretora, há autonomia, mas, ao mesmo tempo, percebese que é muito pouca, apesar de isso ficar apenas subentendido. Nesse sentido, podemos considerar a idéia de Silva (1995, p. 58), que, ao examinar a questão da autonomia da escola pública, destacou três pontos fundamentais: "a noção de liberdade que é sempre relativa (capacidade de escolha); idéia de poder (capacidade de influenciar coisas e pessoas); e a responsabilidade para exercer essa autonomia". Ainda ancorados nessa concepção de autonomia, sabemos ser ela sempre relativa, mas, ao que parece, a escola tem a gestão da autonomia financeira para decidir entre o que é permitido pelo FNDE e suas prioridades para execução na Escola, embora saibamos que existam normas do Direito Financeiro Público para serem seguidas pelas instituições públicas brasileiras. Os depoimentos revelam uma infinidade de questões relativas à participação, entre elas, destacaremos: 1) o pouco entendimento sobre o papel do CE e, sobretudo, dos conselheiros, como no caso da representante dos pais e dos alunos, que parece ter uma participação passiva, só presencial, e que nem sempre comparece; 2) quando não se compreendem as coisas, a tendência natural é não ligar, é achar "enjoado", como alega a mãe; 3) a tesoureira quase restringe o CE a questões do PDDE; 4) o reconhecimento, por parte da direção, da falta de regularidade nas reuniões do CE ao mesmo tempo em que tenta justificá-la. Tais questões também foram por nós observadas na escola, o que nos leva a afirmar que, embora haja indícios de democratização da gestão escolar, ainda é muito incipiente a participação da comunidade escolar nas instâncias coletivas, como o Conselho Escolar, por inúmeras razões já por nós conhecidas e relatadas anteriormente. A escola precisa criar estratégias adequadas para trazer os pais para as reuniões do CE, bem como tentar fazer um trabalho com os alunos para que realmente compreendam o sentido do espaço colegiado de decisão para a construção de relações mais democráticas e participativas. A maioria dos conselheiros considera que a escola melhorou a partir do PDDE, mas quando tentam explicar, só se referem aos meios, como aquisição de bens. Só a direção tratou das relações de poder e da necessidade da maior integração entre as duas unidades, escola e seu anexo. A tesoureira tocou na questão da demora da liberação dos recursos do PDDE, que é uma questão recorrente nos depoimentos até da unidade estadual e dos próprios agentes do sistema. -Ao que nos parece, o CE funciona muito mais para gerir o PDDE e quem mais participa são a direção, tesoureiro e professora. Alunos e pais têm participação incipiente e tímida e demonstraram desconhecimento da importância de participar no processo de tomada de decisão, o que se justifica, no caso da mãe, que precisava ser mais bem orientada antes de ingressar no CE, bem como dos alunos, já que a direção alega estar o tempo todo com eles, conversando. A despeito desses problemas, a avaliação do PDDE na escola "B" foi positiva e representa a possibilidade de obter melhorias dos equipamentos e do trabalho pedagógico. Programa Dinheiro Direto na Escola 79 Considerações finais As observações e análises dos dados da pesquisa oferecem condições para fazermos algumas considerações importantes sobre o processo de implantação e implementação do PDDE, tanto por parte do Sistema quanto pelas escolas da amostra selecionada em Belém. Se, de um lado, o Estado descentraliza recursos públicos para as escolas executarem ações voltadas para a Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE) e assim criarem espaços de decisão, ainda que limitados, de outro, ele coloca à disposição das UExs um conjunto de estratégias de substituição da manutenção pública da escola pela manutenção privada no momento em que possibilita a captação de recursos pela escola via UEx. A autonomia financeira da escola, no programa, é garantida na medida em que o MEC viabiliza condições legais para que a escola seja "criativa" na captação de recursos, já que, além das subvenções, a comunidade escolar pode se organizar para angariar fundos de diversas formas: seja por meio de doações, seja com promoções escolares, seja via convênios ou parcerias, o que pode abrir espaço para o descomprometimento do poder público com a manutenção da escola pública. Na escola municipal, o PDDE é muito bem avaliado, ainda que sejam ressaltadas as excessivas exigências burocráticas da execução e da prestação de contas dos recursos. Para os entrevistados, os resultados do Programa têm sido altamente positivos, que de um modo geral, o consideram como uma conquista importante a ser fortalecida pelos profissionais da educação. Um dado a ser enfatizado é que, em ambas as escolas da amostra, o CE representa uma instância importante de participação da comunidade escolar na tomada de decisões sobre as políticas internas, sendo que o PDDE representou a possibilidade concreta de melhorias nas condições infra-estruturais das escolas, embora os recursos sejam considerados reduzidos diante da necessidade das escolas. Ficou evidenciado um receio de que esses recursos não tenham continuidade, sobretudo na escola estadual que está sendo municipalizada compulsoriamente. Apresentamos a seguir, as principais sugestões, em duas dimensões: primeiro, por parte das escolas e, segundo, pela equipe de pesquisa. No primeiro caso, sugere-se: 1) que os recursos sejam corrigidos conforme a inflação; 2) que os recursos cheguem antes do final do ano; 3) que os recursos sejam definidos a partir das sugestões das próprias unidades executoras, que encaminharão suas prioridades, com o FNDE orçamentando nas rubricas custeio e capital, seguindo tais prioridades; 4) que o PDDE seja estendido ao ensino médio; e 5) que haja mais treinamentos para o Sistema e para os conselheiros. Do lado da equipe, sugerimos: 1) que sejam revistas as unidades executoras para que não sejam organizações sociais, com caráter empresarial dentro da escola pública, podendo continuar nos Conselhos Escolares como instituições gestoras da escola, com os recursos sendo repassados como faz o CNPq, de forma desburocratizada, liberando os fundos para as contas do diretor e tesoureiro do CE, com um CNPJ único, com os dígitos referentes à escola ou outra forma; 2) que os recursos sejam liberados com antecedência de pelo 80 Programa Dinheiro Direto na Escola menos três meses para se fazer a prestação de contas; 3) que haja correção dos valores; 4) que os recursos sejam definidos a partir das prioridades encaminhadas pelos CEs; 5) que os CEs não sejam estimulados e/ou obrigados a angariar recursos de outras fontes para sua manutenção, com cobranças aos pais de alunos e realização de promoções pagas ou mesmo que precisem fazer parcerias com empresas privadas ou ONGs; e 6) que o Estado garanta o caráter público das escolas brasileiras, afinado com as propostas de mudanças há muito requeridas pelo movimento dos trabalhadores da educação, que apontam para uma escola pública, gratuita e de qualidade, aberta a todos que a procurarem. 3.2 Estado do Piauí Sistema Estadual de Ensino do Piauí Na rede estadual de educação do Piauí, o processo de implantação do PDDE iniciou-se em 1995, tendo como primeiro documento orientador o Decreto nº 9.425/95, de criação dos Conselhos Escolares nas escolas estaduais, com o objetivo de sua formação enquanto unidades executoras. Após esse decreto, a Seduc deu prosseguimento ao processo por meio da produção de um conjunto de documentos do setor responsável pela implantação dos conselhos escolares no Piauí a fim de que as escolas se habilitassem a receber recursos do PDDE e de outros programas. A maior parte dos problemas vivenciados no processo de implantação decorreu da falta de formação para as equipes executoras das escolas e da Seduc, segundo técnicos entrevistados. Em geral, eles afirmam que não houve treinamento inicial, sendo relatados encontros regionais promovidos pelo FNDE, em 2000 e 2001, porém sem a participação dos técnicos responsáveis pela prestação de contas do recurso no Estado. Além disso, não há relatos de orientação local pelo FNDE por meio de visitas. Entretanto, em pesquisas nas escolas, obtiveram-se informações da participação de técnicos do MEC no treinamento dos diretores no período de implantação do PDDE. Essa realidade resultou, no início do processo, em desencontros de informações e ausência de um sistema de controle, ocasionando, por exemplo, o não-recebimento dos recursos por todas as escolas ou mesmo situações em que os recursos não foram encaminhados, ficando na Secretaria e, posteriormente, sendo devolvidos ao FNDE, meses depois. Ao que tudo indica, segundo os relatos dos entrevistados, os problemas começaram a ser resolvidos com a implantação das unidades executoras nas escolas, pois, inicialmente, os cheques eram entregues pela tesouraria da Secretaria para quase todas as unidades. A tabela a seguir apresenta a seqüência histórica da implantação do PDDE na rede estadual, incluindo o número de escolas, o número de alunos e os valores repassados pelo PDDE para escolas com e sem unidades executoras, no período de 1997 a 2004. Programa Dinheiro Direto na Escola 81 Tabela 1 – Processo de implantação do PDDE na rede estadual de educação do Piauí – 1997-200433 Número de escolas que recebem diretamente o PDDE Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Número de escolas 753 879 701 663 762 692 702 684 Número de alunos Custeio Capital Total 293.462 238.729 226.261 254.269 255.512 241.171 222.944 177.618 3.010.440,00 2.584.950,00 2.202.100,00 2.499.500,00 2.467.100,00 2.336.400,00 2.210.600,00 1.849.718,18 451.000,00 471.510,00 424.900,00 461.400,00 455.100,00 429.600,00 408.600,00 428.900,32 3.491.440,00 3.056.460,00 2.627.000,00 2.960.900,00 2.922.200,00 2.760.000,00 2.618.600,00 2.278.689,90 Número de escolas que recebem pela Secretaria Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Número de escolas 229 204 123 114 91 46 23 35 Total de escolas 782 1.083 824 777 853 738 725 719 Número de alunos Custeio Capital Total 26.366 16.938 6.234 5.281 4.225 2.183 955 1.076 237.335,80 224.940,24 115.100,00 99.200,00 77.700,00 41.600,00 18.707,00 31.531,90 20.370,00 23.750,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 257.705,80 248.690,24 115.100,00 99.200,00 77.700,00 41.600,00 18.700,00 31.531,90 Total de alunos 319.828 255.667 232.495 259.550 259.737 243.354 223.899 178.694 Total de recursos 3.794.145,80 3.305.140,24 2.743.000,00 3.066.100,00 2.999.980,00 2.801.600,00 2.627.300,00 2.310.221,80 Fonte: Secretaria de Educação do Piauí. Relação de unidades executoras de 1997 a 2004. A Tabela 1 mostra certa instabilidade no número de unidades executoras na rede estadual de educação, com momentos de acréscimos ou quedas consideráveis. Em geral, de 1997 a 2004, houve um decréscimo de 9,2% no número de escolas com UEx, em contraposição à queda no número de escolas sem UEx, 84%, no mesmo período. 33 Em 2004, devido a situações de emergência social, por meio do que se chamou PDDE emergencial, o FNDE liberou recursos destinados a reparos em escolas que foram utilizadas como abrigo nessas situações. Esse recurso foi repassado sob a forma de custeio, que, em termos de Piauí, representou o montante de R$ 2.636.665,60, que beneficiou 1.718 alunos de 35 escolas. Por outro lado, a Seduc repassou a cinco escolas para benefício de 254 alunos. Esses dados não constam na tabela. 82 Programa Dinheiro Direto na Escola No mesmo período houve uma queda de 44,1% no número de alunos atendidos pelo Programa e de 39,5% no total de recursos movimentados, embora tenha ocorrido apenas um decréscimo de 8% no total de escolas contempladas pelos recursos. O per capita aluno-ano do PDDE, em 2004, foi de R$ 12,93. No âmbito da gestão do PDDE, a sistemática de funcionamento envolve as escolas, as Secretarias de Educação e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, pois, apesar de o FNDE repassar os recursos para as escolas, as Secretarias funcionam como intervenientes, principalmente no que diz respeito às orientações para a execução do Programa e ao processo de prestação de contas. A Seduc acompanha a execução do PDDE por meio dos setores de Conselhos Escolares e de Prestação de Contas. Mesmo assim, em geral, os técnicos do sistema reconhecem a ausência de treinamento direto para os executores do Programa, já que encontros rápidos de formação, principalmente para supervisores das Gerências Regionais de Educação, não suprem as necessidades de informação dos diretores das escolas sobre a gestão financeira do Programa, em especial para as escolas do interior do Estado. As principais dificuldades apontadas para a gestão do PDDE estão relacionadas à gestão financeira do Programa: insuficiência dos recursos para suprir as necessidades das escolas; repasse apenas no último trimestre do ano; pouco tempo para execução e despreparo do pessoal executor, principalmente no interior do Estado, onde o contato com a Seduc se torna mais difícil. Em relação à última questão, as cidades do interior, particularmente as menores, têm outros problemas adicionais: por vezes, não existem os três estabelecimentos devidamente legalizados para a realização da pesquisa ou mesmo ocorrem dificuldades em conseguir a prestação de serviços especializados, fazendo com que o diretor tenha que se deslocar de uma cidade a outra em busca da planilha exigida pelo PDDE; dificuldade de acesso; resistência dos comerciantes em preencher e assinar as planilhas de pesquisas de preços; dificuldade de movimentação bancária, dada a distância do banco, fazendo com que os estabelecimentos recusem a aceitação dos cheques, diante da dificuldade para trocá-los. Além disso, outro problema adicional que afeta a execução do PDDE por parte das escolas da capital e do interior é a falta de previsão de recursos para a execução das pesquisas de preços e efetivação das compras. Ao abordarmos os técnicos do sistema de educação sobre as vantagens do PDDE para as escolas, a ênfase recai nos aspectos ligados a uma maior autonomia da escola; o melhor uso dos recursos descentralizados; a melhoria da qualidade do ensino e da estrutura da escola; o estímulo à participação da comunidade; a maior transparência e economia no uso dos recursos; a adequação das despesas às necessidades das escolas; a maior agilidade para a resolução de problemas mais simples e a economia para a Secretaria de Educação, pois anteriormente havia despesas muito altas para a entrega de poucos materiais em municípios muito distantes. O problema mais destacado pela maior parte dos entrevistados, como uma das desvantagens do Programa, diz respeito à insuficiência do valor repassado às escolas para assegurar as atividades do ano letivo. Programa Dinheiro Direto na Escola 83 A partir da avaliação sobre as vantagens e desvantagens do PDDE, os entrevistados do Sistema apresentam sugestões para a melhoria do Programa: aumentar o valor dos repasses e o número de parcelas (de duas a quatro vezes ao ano); encaminhar o recurso no início do ano; melhorar a escala de distribuição dos recursos, ou seja, revendo a tabela de valores pelo tamanho das escolas; treinamento para os executores (no mínimo, para três pessoas do Conselho); cálculo do recurso de acordo com as matrículas do ano do repasse; inserção, como uma das despesas do PDDE, daquelas realizadas com a legalização do Conselho; intervenção do FNDE no Banco do Brasil para garantir a isenção do CPMF e da taxa de manutenção das contas, bem como maior fiscalização e conscientização sobre os objetivos do programa. Além dos recursos do PDDE, as unidades executoras recebem outros montantes para a administração direta. Do FNDE, recebem os recursos do Programa Nacional da Alimentação Escolar (Pnae); o Projeto Alvorada e do Programa de Desenvolvimento da Escola (Fundescola) compõem três entradas: Programa de Adequação do Prédio Escolar (Pape), Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE) e Programa de Manutenção da Escola (PME); além de recursos do Tesouro Estadual, desde 2004, por meio da Conta Manutenção ou Pactue. As unidades executoras administram também recursos advindos de parcerias com várias organizações sociais, conforme sua própria capacidade de buscar patrocínios no comércio e em organizações locais. Tais parcerias visam suprir a falta de recursos públicos e a alcançar a melhoria na manutenção das escolas ou o custeio de atividades, como formaturas, passeios, entre outros. Além dessas fontes de recursos, as escolas angariam mais verbas por meio da cobrança para colocação de outdoor em suas dependências, da administração da cantina, da venda de uniformes escolares, da cobrança de fotocópias (xerox), entre outros, conforme iniciativa local. O incentivo para arrecadação de recursos não-governamentais passa pela própria Secretaria, pois o Pactue define que, a cada R$ 1,00 que a escola arrecadar, a Secretaria, a título de estímulo, cede mais R$ 0,30 no limite de R$ 2 mil, incentivando as parcerias com a sociedade civil para a manutenção das escolas públicas (Piauí, Seduc, 2004). Isso reforça nossa tese sobre a redefinição do papel do Estado para a educação. Embora cada vez mais haja a propagação das ações que visam à autonomia financeira da UEx, mediante a descentralização de recursos, mesmo que insuficientes, para a manutenção da escola, não há uma avaliação mais crítica que perceba como norte o processo de desresponsabilização do Estado, mas sim a necessidade de responsabilização solidária da comunidade educacional. No processo de pesquisa de campo, procurou-se verificar se existe algum meio de encaminhar recursos para a escola sem ser pela unidade executora, resposta que pudemos pesquisar, especificamente, no setor de prestação de contas, com os funcionários mais antigos. Nesse sentido, foi possível saber que, antes do PDDE, existiu na rede estadual, entre 1986-1994, a experiência de repasse diretamente para a escola, sem unidade executora, conta corrente ou CNPJ, sendo os recursos administrados pelo diretor. Nesse período, houve, também, a possibilidade de algumas escolas maiores abrirem contas correntes com o CNPJ da Seduc, 84 Programa Dinheiro Direto na Escola sem que isso acarretasse problemas para o Sistema. Entretanto, para os técnicos entrevistados, essa modalidade de repasse é um risco, já que, se houver um problema com a prestação de contas de uma escola, a Seduc pode ficar com todas as contas bloqueadas. Atualmente, o próprio PDDE contempla uma modalidade de repasse sem a exigência de UEx, situação em que a diretora saca no banco (com a apresentação da portaria de nomeação para o cargo) e executa diretamente, dentro dos mesmos critérios do Programa. Entretanto, os técnicos consideram esse sistema muito vulnerável, uma vez que não permite um acompanhamento mais sistemático, com extratos bancários, movimentação somente por cheque, etc. Eles observam que se perde um pouco do controle sobre a prestação de contas; portanto, não indicam a ampliação dessa experiência, reforçando, assim, uma avaliação positiva sobre o papel financeiro das unidades executoras para o Sistema de Educação. A escola estadual "A" A tabela a seguir expõe o processo de transferência dos recursos do PDDE para a escola estadual "A": Tabela 2 – Número de matrículas e recursos do PDDE recebidos pela escola "A" Número de matrículas Recursos recebidos pelo PDDE Ano Fundamental Médio Total Custeio Capital Total 1.135 1.782 1.116 1.188 1.171 1.086 123 504 961 1.184 1.035 1.905 1.620 2.149 2.355 2.121 8.600,00 12.000,00 8.600,00 8.600,00 8.600,00 8.510,40 1.700,00 2.400,00 1.700,00 1.700,00 1.700,00 2.127,60 10.300,00 14.400,00 10.300,00 10.300,00 10.300,00 10.638,00 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Fonte: Seduc. É necessário atentar para o fato de que, embora a escola estadual "A" seja de ensino fundamental e médio, o repasse dos recursos do PDDE tomam como referência apenas o número de alunos matriculados no ensino fundamental, isto é, as matrículas contabilizadas são as desse nível de ensino. Por isso, é possível compreender por que, no ano de 2000, ela recebe mais recursos do PDDE do que em anos posteriores, quando o total de alunos é superior ao do referido ano. Isso ocorre porque, desde a sua implantação, conforme a tabela, é no ano de 2000 que a escola "A" ultrapassa a faixa de 1.001-1.500 (precisamente 1.782) alunos de Ensino fundamental, o que modifica o montante recebido pela escola, em consonância com a Resolução nº 3/97, do FNDE. É possível depreender, também, a partir da tabela acima, que, se por um lado, houve uma redução do número de alunos do ensino fundamental, por outro, Programa Dinheiro Direto na Escola 85 no que concerne ao ensino médio, o número de alunos que se beneficiam indireta ou extensivamente do Programa teve um aumento considerável, passando de 123, em 2000, para 1.035 (841%) em 2004, tendo alcançado, no ano de 2003, 1.184 (962%). Outro aspecto que pode ser levantado é o fato de que se leva em conta somente os alunos de ensino fundamental – o número de matrículas tem sido praticamente o mesmo, com exceção do ano de 2000 –, tendo havido um significativo aumento do número de matriculados no ensino médio. É razoável considerar, na prática, que o valor destinado a cada aluno está dividido por dois, o que significa dizer que o benefício está cobrindo meio aluno. Esse é o caso das matrículas de ensino fundamental e médio, no ano de 2004, que, respectivamente, foram: 1.086 e 1.035. Como se pode observar, não houve aumento dos recursos repassados pelo PDDE por não ter ocorrido aumento no número de matrículas do ensino fundamental. No âmbito da gestão do Programa, não obstante o fato de os recursos serem destinados à escola, a gestão desses recursos é de responsabilidade da unidade executora, nesse caso, o Conselho Escolar, também responsável pela gestão dos demais recursos descentralizados. Os entrevistados afirmam que o Programa Dinheiro Direto na Escola modificou a gestão da escola em diferentes aspectos: quanto à disponibilização de material escolar, aos recursos para o trabalho, à qualidade do ensino e à manutenção do aluno na escola. Afirmam que a prestação de contas, antes de ser encaminhada para a Secretaria de Educação, é apreciada pelo Conselho Escolar. Desse modo, todos avaliam a gestão do PDDE pelo Conselho de modo positivo. Apesar de sua avaliação positiva, quando se referem à organização do Programa, os membros do Conselho reclamam da insuficiência dos recursos e da burocracia na gestão do PDDE, basicamente em dois momentos: na tomada de preços e na prestação de contas. No primeiro caso, criticam a necessidade de três planilhas de preços para valores monetários muito baixos, seja para compra de material ou de prestação de serviços. Critica-se, em menor grau, a distinção entre recursos de custeio e capital. No segundo caso, revelam sua dificuldade de compreender as operações matemáticas e contábeis, além da quantidade de notas e recibos que devem ser apresentados nesse processo. Como sugestões, eles são uma voz ao reivindicar mais recursos financeiros do PDDE para a escola estadual "A", além de apontarem para a redução das exigências burocráticas ("que seja somente uma planilha") e para a necessidade de treinamentos para membros do Conselho. É importante destacar alguns elementos: a) o processo de gestão do PDDE na escola estadual "A" ensaia uma experiência coletiva, em que os membros do Conselho têm clareza sobre os trâmites exigidos pelo Programa, mas ainda pouco participativa34; e b) pôde-se constatar que, em nenhum momento, eles se referem a quem confere as mercadorias recebidas. Esse dado é de extrema relevância, tendo-se em vista que a gestão do PDDE é uma gestão supostamente coletiva. 34 Entrevistamos conselheiros que desconhecem o montante dos recursos, os nomes ou siglas dos programas que repassam recursos diretamente para a gestão pelo Conselho Escolar. 86 Programa Dinheiro Direto na Escola A escola recebe recursos diretamente na sua conta bancária, provenientes de três programas, sendo dois do governo federal e um do estadual. Os programas do governo federal são: o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) ou Merenda Escolar e o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), ora investigado. O Programa do governo estadual é o conhecido Fundo de Manutenção, ou Pactue. Os recursos do PDDE administrados pelo Conselho Escolar têm-se mantido praticamente os mesmos. No entanto, em 2004, devido ao PDDE emergencial, houve considerável aumento no montante de recursos recebidos pela escola estadual "A", como demonstra a tabela a seguir: Tabela 3 – Recursos descentralizados administrados pela unidade executora da escola estadual "A"35 Período 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total geral PDDE 10.300,00 14.400,00 10.300,00 10.300,00 10.300,00 10.638,00 66.238,00 Fundo de Merenda manutenção Pnae Pactue 30.990,00 26.810,00 700,00 35.000,00 29.163,00 34.675,00 600,00 37.830,00 6.138,17 194.468,00 7.438,17 PDE Total de recursos Outros: PDDE administraProjeto Emergencial dos pela Alvorada – 2004 escola (1999-2004) 1.600,01 6.000,00 13.250,00 5.093,60 62.000,00 6.000,00 19.943,31 62.000,00 41.290,00 41.910,00 46.900,01 58.713,00 50.068,30 116.606,17 364.487,48 Fonte: Seduc e escola estadual “A”. Conforme a tabela acima, é possível identificar a importância que os recursos provenientes do PDDE têm para a escola estadual "A", embora quase não tenha havido alteração no montante desses recursos no período de 1999 (R$ 10.300,00, isto é, 24,94% do total recebido pela escola) a 2003 (R$ 10.300,00, ou seja, o mesmo valor de 1999), com exceção do ano de 2000 (R$ 14.400,00, que correspondem a 34,35% do total de recursos recebidos pela escola estadual "A" nesse ano), devido ao aumento no número de alunos matriculados. Quanto ao ano de 2004, vale ressaltar que o PDDE repassou para a escola estadual "A" recursos sob duas modalidades: 1) o repasse anual, que regularmente acontece (em 2004, foi de R$ 10.638,00), segundo a tabela acima, desde 1999; e 2) o repasse para compensar possíveis danos causados às escolas que abrigaram populações carentes em situações de emergência provocadas por fenômenos naturais, como chuvas, enchentes, etc. Em 2004, a escola estadual "A" recebeu, conforme tabela acima, a quantia de R$ 62 mil, o que permitiu a reconstrução de 35 Acredita-se ser importante manter o período 1995-1998, embora não haja dados, para demonstrar que se tem clareza de que as UExs passaram a receber recursos desde sua criação em 1995. Programa Dinheiro Direto na Escola 87 sua quadra de esportes. Em síntese, do mesmo Programa, a escola recebeu o montante de R$ 72.638,00, o que representou 62,29% do total dos recursos recebidos. Pode-se, então, constatar que, com o PDDE emergencial, o impacto dos recursos repassados pelo Programa altera consideravelmente a importância que ele passa a ter para a escola. Um último aspecto que não se deve ocultar é o fato de que o Programa Dinheiro Direto nas Escolas tem aspectos positivos e negativos. Entre os primeiros, é possível afirmar que o PDDE é uma experiência exitosa de descentralização de recursos na medida em que consegue organizar formalmente as escolas, por meio das unidades executoras, em torno da gestão dos recursos recebidos. Entre os aspectos negativos, citam-se a insuficiência do montante dos recursos recebidos do PDDE e a conseqüente preocupação que se pode gerar entre os membros das UExs quanto a ter que gerenciar a escassez de recursos. Desse modo, o PDDE pode contribuir fortemente para que se prepare um importante campo para a redefinição do papel do Estado em matéria de financiamento educacional, negando-lhe tal responsabilidade ou diminuindo o raio de sua atuação nesse campo. O Sistema Municipal de Ensino de Teresina O PDDE foi implantado na rede municipal de ensino em Teresina no ano de sua criação pelo governo federal, em 1995, denominado inicialmente de Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (PMDE), conforme Resolução Federal nº 12/95. Os procedimentos tomados no início da implantação do PDDE em Teresina tiveram como órgão de mediação a antiga Delegacia do Ministério da Educação (Demec), que, até 1998, tinha uma unidade no Piauí. Por intermédio dos diretores da Demec, foram realizadas as primeiras capacitações dirigidas aos técnicos dos setores da Secretaria Municipal de Educação e Cultura (Semec) responsáveis mais diretamente pelo acompanhamento do PDDE, no caso, o setor de Prestação de Contas, o Núcleo Financeiro e o Departamento de Assistência ao Educando. Conforme informação dos entrevistados, posteriormente, os técnicos dos referidos setores realizaram treinamentos nas escolas, tendo como suporte o material utilizado pela Demec, assim como passaram a realizar reuniões no início de cada ano com os diretores e vice-diretores das escolas sobre o PDDE. Já nas escolas recéminauguradas, eram feitas capacitações em torno tanto do PDDE quanto dos demais programas administrados pela Semec. Outro procedimento no processo de implantação do PDDE nas escolas da rede municipal de Teresina foi a criação dos Conselhos Escolares e sua transformação em unidades executoras (UExs) à medida que as escolas iam sendo incorporadas ao Programa. No caso de Teresina, a personalidade jurídica, de direito privado, institucionalizada como responsável pela gestão do PDDE, bem como dos demais programas que repassam dinheiro para as escolas é o Conselho Escolar. Pela fonte fornecida pela Secretaria de Educação do ano de 2004, do total de 153 escolas do sistema municipal de ensino que receberam recursos do PDDE, 153 administraram diretamente, conforme tabela a seguir: 88 Programa Dinheiro Direto na Escola Tabela 4 – Processo de implantação do PDDE na rede municipal de educação de Teresina 1999 – 2004 Número de escolas que recebem diretamente o PDDE Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Número de escolas 130 136 141 139 133 138 Número de alunos Custeio 50.243 54.404 57.727 59.679 56.421 55.546 456.100,00 502.000,00 525.600,00 535.200,00 504.200,00 506.329,06 Capital 78.600,00 89.200,00 94.600,00 97.400,00 92.400,00 118.915,84 Total 534.700,00 591.200,00 620.200,00 632.600,00 596.600,00 625.244,90 Número de escolas que recebem o recurso pela Secretaria Ano Número de escolas Número de alunos 1999 2000 2001 2002 2003 2004 43 31 22 19 14 15 2.534 1.861 1.028 909 613 600 Ano Total de escolas Total de alunos Total de recursos 52.777 56.265 58.755 60.588 57.034 56.146 579.400,00 623.100,00 639.000,00 648.900,00 607.800,00 637.258,90 1999 2000 2001 2002 2003 2004 173 167 163 158 147 153 Custeio total 44.700,00 31.900,00 18.800,00 16.300,00 11.200,00 12.014,00 Fonte: Semec, 2004. * As escolas que recebem pela Semec não são comtempladas com recursos para compra de bens de capital, pois têm menos de 101 alunos. Analisando-se a tabela acima, pode-se verificar que o processo de descentralização dos recursos do PDDE na rede municipal de educação foi bastante acentuado, uma vez que, em 2004, após 10 anos da implantação do programa, 90% das escolas recebem os recursos diretamente. Entre os anos de 1999 e 2004, observa-se que existiu um aumento de 10% no total dos recursos do PDDE na rede municipal de educação, enquanto o número de alunos aumentou 6,4%. A pesquisa procurou saber a opinião dos técnicos do sistema em relação às vantagens do PDDE para a escola. Nesse ponto, prevaleceram os principais eixos constitutivos das reformas educacionais dos anos 90 que foram focos de debates nos anos 80, como descentralização, autonomia e participação, bem como a utilização dos recursos para aquisição de materiais pedagógicos e permanentes, conforme as necessidades das escolas, embora a maioria dos entrevistados os considerem insuficientes. Quanto às possíveis desvantagens do PDDE, alguns dos entrevistados não chegam a visualizar nenhuma, sendo poucas as críticas associadas ao período de Programa Dinheiro Direto na Escola 89 chegada dos recursos nas escolas e ao intervalo entre a chegada e a data prevista para prestação de contas, considerados exíguos para o bom planejamento e execução do Programa. Em média, uma escola recebe R$ 11,35 por aluno/ano do PDDE36, o que, conforme os técnicos do Sistema, está aquém das necessidades da escola, embora alguns entrevistados ressaltem a melhoria na aquisição de material. Com base nessas considerações, algumas sugestões foram dadas pelos entrevistados para a melhoria do PDDE, mais direcionadas à revisão do período de chegada dos recursos nas escolas: "o repasse deveria chegar no início do ano ou se estendesse até o início das aulas, porque no primeiro bimestre a escola terá um melhor tempo para aplicação" (técnica 3 – municipal); e ao aumento no montante dos recursos: "acho que deveria haver uma revisão dessa quantia" (técnica 2 – municipal), "a sugestão é aumentar os recursos" (técnico 1 – municipal). Pelo exposto, ao lado dos problemas relativos à quantidade dos recursos financeiros e outros mencionados pelos entrevistados, as mudanças ocorreram na forma de obtenção do material didático pela escola, na medida em que diminuiu a distância entre a escola e a burocracia estatal, mudando a lógica de destinação dos recursos. Assim, a burocracia estatal foi ressignificada, redistribuindo as funções e atribuindo atividades que antes a escola não tinha, o que faz com que, ao ampliar suas funções, integrando a gestão financeira, passe a vivenciar os problemas característicos do exercício dessa função. As unidades executoras (UExs), personalidades jurídicas, de direito privado, responsáveis pela gestão do PDDE nas escolas da rede municipal de Teresina, são os Conselhos Escolares. A criação dos Conselhos data de 1995 (Decreto nº 2.801/95), mesmo ano de implantação do PDDE em nível nacional e local. Sua origem está ligada a uma história de debates nos vários níveis e instâncias educacionais governamentais e não-governamentais sobre a descentralização, autonomia e participação, embora com desfechos diferentes após a reforma dos anos 90, com uma descentralização com escassez de recursos e uma frágil participação da comunidade nas decisões da escola, o que nem sempre condiz com os documentos oficiais. Enquanto UExs, os Conselhos cumprem uma das exigências do FNDE para o repasse dos recursos do PDDE para as escolas. São vários os problemas remetidos aos Conselhos Escolares, sobretudo quando se referem à representação e à atuação cotidiana nas ações da escola. Porém, as perspectivas em relação à atuação dos Conselhos estão mais voltadas para o aspecto financeiro. A administração dos recursos fixa-se, na maioria dos casos, nos aspectos formais, em que prevalece a assinatura obrigatória dos membros exigidos nos documentos de prestação de contas à Secretaria. Aliado a esse aspecto, outro diz respeito aos órgãos ligados ao PDDE exigirem a criação de uma entidade de direito privado no âmbito de uma instituição pública, reconfigurando as Associações de Pais e Mestres, a Caixa Escolar e os Conselhos Escolares que, em princípio, fizeram parte de um universo de propostas vinculadas à democratização da gestão pública. 36 O cálculo foi realizado com base na relação entre o total de recursos enviados e o número total de alunos das escolas que recebem, direta ou indiretamente, recursos do PDDE na rede municipal de ensino, tendo como referência o ano de 2004. 90 Programa Dinheiro Direto na Escola Essas questões são pertinentes porque dizem respeito às relações entre o público e o privado na educação brasileira, que vêm sendo ampliadas sob diferentes formatos no âmbito da administração das instituições públicas de ensino, dentro do parâmetro denominado público não-estatal. De outro modo, enquanto aos Conselhos foram atribuídas funções mais amplas, às UExs foram atribuídas funções primordialmente financeiras e, secundariamente, pedagógicas, acrescentando-se a função de administrar recursos arrecadados fora dos transferidos pelos órgãos públicos. Cabe registrar que a inserção do PDDE na rede pública municipal de ensino de Teresina contribuiu para influenciar a criação de outras propostas de descentralização financeira para as escolas em nível local, a exemplo do Programa Fundo Rotativo, mantido com recursos da prefeitura, mas com gestão similar ao PDDE, ou seja, administrados pelas unidades executoras. Além do PDDE e do Fundo Rotativo, outro Programa de descentralização de recursos para as escolas que vem sendo executado em nível municipal é o Programa de Alimentação Escolar (Pnae) do governo federal. Esse Programa também guarda similaridades com o PDDE no aspecto da gestão, na medida em que as escolas aptas a receberem os recursos diretos devem ter constituído uma unidade executora37. A escola da amostra municipal de Teresina O PDDE foi implantado na escola no ano de sua criação e também de formação do Conselho, sendo pauta de reunião logo no segundo encontro, em 31/ 8/95. A tabela de sistematização dos dados financeiros também é uma referência da implantação do PDDE na escola, embora ele permita retomar o processo apenas após 1999, dada a dificuldade de acesso aos dados dos anos anteriores. Assim, inicialmente, apresenta-se a Tabela 9 com informações sobre os recursos financeiros administrados pela escola. Tabela 5 – Matrículas e recursos do PDDE recebidos pela escola Número de matrículas Recursos recebidos pelo PDDE Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Infantil Fundamental Total Custeio Capital Total 50 50 52 50 53 77 1.009 926 1.013 1.017 1.019 1.010 1.059 976 1.065 1.067 1.072 1.087 8.600,00 7.500,00 8.600,00 8.600,00 8.600,00 7.189,60 1.700,00 1.400,00 1.700,00 1.700,00 1.700,00 1.799,40 10.300,00 8.900,00 10.300,00 10.300,00 10.300,00 8.987,00 Fonte: Semec/Setor de Prestação de Contas. 37 Em 2004, segundo dados da Semec, o total de recursos do Fundo Rotativo transferido para as escolas municipais foi de R$ 777 mil representando um valor superior em 18% aos recursos transferidos pelo PDDE (R$ 637.258,90) no mesmo ano. Programa Dinheiro Direto na Escola 91 A Tabela 5 evidencia que não houve aumento significativo no número de alunos contemplados com os recursos do PDDE entre o período de 1999 e 2004, qual seja, 1%, embora tenha ocorrido uma queda de 12,8% nos recursos entre os mesmos anos, sem que seja registrada a justificativa para tal queda, uma vez que não decorreu da diminuição no número de matrículas em 2004. A escola "A" administrou, em 2004, do PDDE, um per capita por aluno-ano do ensino fundamental de R$ 8,90, ou de R$ 8,27, se consideradas as matrículas da pré-escola, que, embora não sejam computadas para o recebimento dos recursos, são beneficiárias indiretas. Em 2003, ano que não se observa queda no repasse, foram R$ 9,61 por aluno-ano do ensino fundamental. O processo de decisão sobre as prioridades na utilização dos recursos da rubrica capital passa pela unidade executora, no caso, o Conselho Escolar, mas conta com uma instância introduzida pela Secretaria de Educação em 2003: o "Orçamento Popular nas Escolas", do qual participam, segundo a diretora da escola, professores, funcionários, líderes de turmas, líderes comunitários (Associação dos Moradores) e Conselho Escolar. Não obstante algumas dificuldades na administração dos recursos, as opiniões dos entrevistados sobre o PDDE, em geral, enfatizam suas vantagens, sendo a principal a chegada dos recursos para o gerenciamento direto pela escola. A diretora, por exemplo, enfatiza a possibilidade de a escola escolher os produtos adequados às suas necessidades, considerando a qualidade e a quantidade, o que, em sua opinião, não ocorreria com a compra centralizada pela Semec. Outra vantagem do PDDE em relação a outros recursos é a existência da possibilidade de compra de materiais permanentes e o custeio de pequenas reformas ou reparos na escola, o que os outros recursos descentralizados não permitem. O fato de o PDDE ser compreendido como um recurso adicional ao repasse do próprio município, o Fundo Rotativo (professora da escola – municipal), é destacado como uma vantagem, assim como a transparência exigida para a administração dos recursos, pois "...sem ele, nem sei como seria, porque é mais organizado, as pessoas sempre vêm acompanhando o jeito de distribuir esses recursos que vêm para a escola" (sic) (representante dos alunos – municipal). As desvantagens são menos citadas, embora haja uma percepção de que a transferência de recursos diretamente para a escola tenha levado a Secretaria da Educação a compreender que a escola está amplamente apoiada em suas necessidades, o que não é uma realidade, principalmente pelo pequeno montante dos recursos transferidos. A Semec custeia diretamente somente alguns produtos ou serviços maiores, como ventiladores, armários e reforma do piso da escola, embora, segundo a diretora, isso ocorra com dificuldade. Outras importantes desvantagens do PDDE, apontadas por quase todos os entrevistados, são o pequeno montante de recurso transferido, que não supre as necessidades da escola, e a demora no seu envio. Além disso, ainda outra desvantagem destacada é a ausência da diretora no cotidiano da escola devido ao tempo gasto em serviços externos na execução do PDDE. A orientação com o respeito à divisão dos recursos entre despesas de custeio e de capital é vista também como desvantagem, uma vez que a escola é obrigada a respeitar os porcentuais, independentemente das suas necessidades. 92 Programa Dinheiro Direto na Escola Além disso, o fato de o PDDE exigir sempre a compra dos produtos mais baratos é criticado no sentido de que "nem sempre o produto mais barato é o melhor, às vezes a qualidade deixa a desejar quando se faz a pesquisa e se escolhe o produto mais em conta" (representante dos professores – municipal). Em relação à autonomia para gerir os recursos do PDDE, observa-se ser "suficiente até certo ponto, desde que a autonomia esteja dentro da burocracia que é imposta para a gente. Tem, mas só até aí", como observa a diretora. A autonomia é apontada, também, como uma maior limitação no que diz respeito à prestação de serviços porque exige que a empresa prestadora esteja devidamente legalizada (CNPJ, nota fiscal, etc.), impedindo uma maior economia que seria possível com o uso da mão-de-obra presente na própria comunidade. Na realidade, na opinião da diretora, uma autonomia ideal seria aquela que oferecesse uma maior flexibilidade para administração dos recursos destinados aos pequenos reparos da escola. Ainda em relação à autonomia, investigou-se a existência de mudança no padrão de gestão após a implantação do PDDE. A direção da escola verifica que mudou a questão da qualidade do material utilizado no seu cotidiano; que houve uma efetiva priorização dos materiais realmente necessários para a escola; que tais materiais estão mais adaptados às suas necessidades (a merenda é citada como um exemplo de adaptação dos produtos ao perfil e gosto dos alunos) e que os recursos são mais bem administrados. Quanto às sugestões para a melhoria do Programa, são indicados pelos entrevistados: diminuição da burocracia para as compras; procedimentos que impeçam os atrasos dos repasses que prejudicam sua execução e protelam as necessidades da escola e, principalmente, o aumento dos recursos. A unidade executora da escola administra, além dos recursos do PDDE, outros recursos, os quais apresentam procedimentos burocráticos próprios, similares ou não ao PDDE, o que, por vezes, segundo a diretora da escola, terminam por dificultar sua execução. Entre os recursos administrados, destacam-se: as parcelas regulares dos recursos do Programa Nacional da Alimentação Escolar (dez parcelas anuais) e o Fundo Rotativo repassado pela Secretaria Municipal de Educação, em duas parcelas anuais, no primeiro semestre (cuja aplicação deve se restringir às despesas de custeio). Além dessas duas fontes regulares, a escola recebe recursos para a preparação da participação na Feira do Conhecimento (evento anual que envolve todas as escolas municipais), tendo participado de duas fases do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE), nos anos de 2001 e 2004. No sentido de ter uma noção dos recursos administrados pela escola em relação ao papel desempenhado pelo PDDE como pioneiro no processo de descentralização de verbas para as unidades executoras/Conselhos das Escolas, a Tabela 6, mostrada na página seguinte, explicita esse processo. No primeiro ano exposto na tabela, 1999, o PDDE representava 46,2% dos recursos administrados diretamente pela escola, sendo os demais referentes à merenda escolar. Em 2000, ano em que a escola recebeu os recursos do Programa de Adaptação dos Prédios Escolares (Pape), financiados pelo Fundescola, essa verba representou 82,4% de todos os recursos recebidos, exigindo procedimentos bem específicos por parte do Conselho Escolar, como licitação e fiscalização de obras, entre outros procedimentos complexos para a gestão escolar. Programa Dinheiro Direto na Escola 93 Tabela 6 – Recursos descentralizados para a escola municipal "A" Recursos recebidos da administração pública e geridos pela unidade executora Ano PDDE 1999 2000 2001 2002 2003 2004 10.300,00 8.900,00 10.300,00 10.300,00 10.300,00 8.987,00 Merenda Fundo Rotativo 19.593,60 27.706,00 28.480,00 12.000,00 5.500,00 5.500,00 8.250,00 8.250,00 8.250,00 PDE Total de recursos administrados pela escola Outros *Pape 67.200,00 12.000,00 12.000,00 - 22.300,00 81.600,00 27.800,00 38.143,60 46.256,00 57.717,00 Fonte: Semec/Setor de Prestação de Contas. * Foi excluída a coluna referente aos recursos próprios gerados pela escola, devido à não-obtenção de dados. ** Pape – Programa de Adequação de Prédios Escolares. Em 2004, o PDDE representou apenas 18,1% dos recursos, enquanto os recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar representaram 41,2%, o Fundo Rotativo, 16,6%, e o PDE, 24,1%. Esses dados revelam o acelerado processo de descentralização de recursos, pois, em geral, houve um aumento de cerca de 150% nos recursos repassados diretamente para a administração escolar, pela unidade executora, de 1999 a 2004, denotando o crescente processo de descentralização. Além desses recursos, eventualmente a escola promove alguma atividade (bingo, festinha) para a arrecadação de recursos para fins determinados, a exemplo da formatura dos alunos da 8ª série, embora, segundo os relatos, esses recursos não sejam significativos, principalmente porque a "comunidade é muito pobre" (representante dos pais – municipal). Além disso, tais recursos não são administrados pela UEx. A escola da amostra de educação especial A amostra de educação especial é composta por uma escola vinculada à Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), o Centro de Recuperação e Profissionalização Integrado, por ser aquela entidade a mais expressiva em termos de atendimento a portadores de necessidades especiais no Estado. O PDDE foi implantado na Apae em 2001, ano em que os gestores da instituição tomaram conhecimento do Programa. As providências tomadas no processo de sua implantação deram-se por meio do MEC/FNDE, com informações diretamente para a Apae sobre como fazer uso dos recursos e repasse de documentação necessária à liberação. O MEC fez a abertura da conta bancária em nome da Apae, ficando a presidência, por meio do Setor de Contabilidade, responsável pelo recebimento anual dos recursos e pelo repasse às escolas, transformados em material de consumo e permanente, tendo como base as solicitações das diretoras. 94 Programa Dinheiro Direto na Escola A Apae recebe anualmente R$ 11.700,00 do PDDE para serem distribuídos entre as duas escolas de sua responsabilidade, ficando R$ 6.900,00 para o Centro de Recuperação e Profissionalização Integrado e R$ 4.800,00 para a Escola de Educação Especial Professora Consuêlo Pinheiro, divididos, respectivamente, em metade para custeio e metade para capital, como mostra a tabela abaixo: Tabela 7 – Sistematização dos dados financeiros da Apae – Teresina-PI Ano Custeio Capital Total 2001 2002 2003 2004 5.850,00 5.850,00 5.850,00 5.850,00 5.850,00 5.850,00 5.850,00 5.850,00 11.700,00 11.700,00 11.700,00 11.700,00 Fonte: Apae. A tabela mostra o recebimento dos recursos do PDDE desde o período de sua implantação, permanecendo o mesmo valor após quatro anos de existência na instituição, sem apresentar nenhuma evolução. Como a Apae faz a distribuição dos recursos para as escolas em forma de material permanente e de consumo, conforme solicitações das diretoras, não é possível precisar os valores definidos em custeio e capital para as escolas. Além do PDDE, a Apae recebe recursos da Secretaria de Estado de Assistência Social (SAS), da Prefeitura Municipal de Teresina (PMT), do Sistema Único de Saúde (SUS), do Ministério da Educação (MEC), dos Sócios, do Exame do Pezinho, do Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência (Paed), de doações e de atividades como feiras, bingos, feijoadas, etc., perfazendo um montante de R$ 138.277,90, conforme a tabela abaixo: Tabela 8 – Outros recursos recebidos pela Apae Ano Paed Exame Pezinho SAS SUS PMT MEC Serse Sócios Doações 10.755,00 9.082,70 9.571,05 51.833,95 149.348,07 97.267,06 20.000,00 2001 28.809,14 126.227,64 116.830,86 28.000,00 62.669,34 7.592,40 9.362,50 22.204,97 2002 7.845,00 14.688,95 2003 2004 11.825,50 114.752,40 Fonte: Apae. A Apae não possui uma unidade executora com a finalidade de gestão do PDDE. A decisão sobre a utilização tanto dos recursos do PDDE quanto dos outros recursos recebidos pela instituição é de responsabilidade da sua diretoria, com apoio dos associados, pais e pessoal docente e não-docente, levando em conta o Programa Dinheiro Direto na Escola 95 conjunto dos recursos arrecadados pela entidade. Por outro lado, a escola não administra nenhum recurso diretamente, apenas executa as funções tradicionais do ensino e auxilia na tomada de preços. Quanto à prestação de contas, como a Apae recebe os recursos diretamente do MEC/FNDE, não tendo responsabilidade com os sistemas de ensino locais, envia os dados referentes às contas para o FNDE, ao tempo que deixa à disposição dos órgãos de controle interno e externo os mesmos documentos para possíveis fiscalizações, conforme Resolução nº 4, de 27 de março de 2003, que dispõe sobre os critérios de atendimento e sobre as formas de transferência e de prestação de contas dos recursos do PDDE destinados às escolas de educação especial. De acordo com a responsável direta pela contabilidade dos recursos financeiros, não há nenhuma dificuldade na gestão dos recursos do PDDE, seja na tomada de preços, seja na compra dos produtos, seja na prestação de contas, por dispor de experiência suficiente nessa função. O PDDE é considerado um programa de grande importância para a escola pelos membros da Apae. Suas principais vantagens estão, segundo uma das entrevistadas, na aquisição de material didático para o aluno e para o professor, contribuindo na melhoria da qualidade do ensino-aprendizado e na melhoria dos equipamentos para as escolas. Quanto às desvantagens do PDDE, a diretora da escola afirma não haver nenhuma, embora a falta de recursos para o andamento das atividades da escola seja um dos problemas mencionados, alegando-se que os recursos não são suficientes para suprir as necessidades por não contemplarem os pedidos das listas por ela elaboradas, o que constantemente requer a elaboração de projetos para realização de parcerias com a iniciativa privada e com a comunidade local. O que podemos considerar a partir dos documentos analisados, das entrevistas realizadas, dos estudos e das discussões, além de levar em conta as alterações que têm ocorrido com o Programa no âmbito de suas instâncias federais, é que a pesquisa apontou a direção certa do propósito do PDDE: este pretendia criar um certo espírito racionalizador que, paulatinamente, prescindisse da ação estatal como responsável pela manutenção da escola ao tempo em que transferia aos cidadãos organizados em unidade executora a responsabilidade pela escola. Evidentemente, o PDDE é uma das políticas e não a política de redefinição do papel do Estado na educação. 3.3 Estado do Mato Grosso do Sul Sistema Estadual de Ensino de Mato Grosso do Sul A Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul, promulgada em 5 de outubro de 1989, fundamentada na Constituição Federal, estabeleceu, em seu artigo 189, parágrafo único que o ensino será ministrado com base, entre outros princípios, na: "A gestão democrática do ensino público na forma da lei" (inciso VI). 96 Programa Dinheiro Direto na Escola Após a aprovação da Constituição Estadual, uma primeira tentativa de regulamentação da gestão das escolas estaduais ocorreu por meio do Decreto Estadual nº 5.868, de 16 de abril de 1991, ao estabelecer que "cada unidade escolar contará com um Colegiado escolar, órgão de natureza deliberativa, responsável pelas ações de coordenação e avaliação das atividades administrativas e pedagógicas da unidade escolar (art. 9º)", integrado pelo diretor da unidade escolar (membro nato e secretário executivo), até três representantes da coordenação pedagógica, dos pais, dos alunos, dos professores e dos funcionários administrativos (art. 10), sendo que seus membros deverão ser eleitos pelas respectivas categorias para um mandato de dois anos, sendo permitida a reeleição (art. 10, parágrafo único) (Mato Grosso do Sul, 1991). A partir daí, as escolas estaduais passaram a eleger o seu colegiado, sendo que a primeira eleição para diretor aconteceu em 22/6/91, com voto secreto; em 3/7/1991, foram eleitos os membros do Colegiado Escolar cujo voto poderia ser secreto ou por aclamação em assembléia (Fernandes, 1997, p. 70). O Estado de Mato Grosso do Sul aderiu ao Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) em 1995, ano de sua implantação, sendo definida a Associação de Pais e Mestres (APM), entidade existente nas escolas do Estado desde a década de 80, como unidade executora, apesar de as escolas estaduais contarem, desde 1991, com o Colegiado Escolar. Atualmente, todas as escolas da rede estadual de ensino, dos 78 municípios de Mato Grosso do Sul, têm a sua unidade executora. A APM de cada escola tem o seu Estatuto, elaborado segundo modelo fornecido pela Secretaria de Estado de Educação. Conforme o art. 2º desse Estatuto, A Associação de Pais e Mestres, pessoa Jurídica de Direito privado, com a designação simplificada de APM, instituição auxiliar da Unidade Escolar, terá por finalidade colaborar no aprimoramento do processo educacional, na assistência ao educando na integração família-escola-comunidade (Mato Grosso do Sul, 1999). Ressalta-se que uma discussão mais aprofundada a respeito da gestão democrática, incluindo o papel do Colegiado Escolar, foi desencadeada no governo de José Orcírio Miranda (1999-2002) do Partido dos Trabalhadores (PT). Nesse governo, na gestão do secretário Pedro Cesar Kemp Gonçalves, a Secretaria de Estado de Educação elaborou a proposta de educação para a rede estadual de ensino, formulada sob o título "Escola Guaicuru: vivendo uma nova lição", assentada em três grandes eixos: "a qualidade social da educação", "a democratização do acesso" e a "democratização da gestão" (Mato Grosso do Sul, 2001, p. 3). Com o objetivo de concretizar a proposta, a Secretaria abriu várias frentes de trabalho, estando, entre elas, o Movimento Constituinte Escolar, entendido como um instrumento estratégico de mobilização de todos os trabalhadores da educação e da sociedade em geral para a construção coletiva de um projeto educacional comprometido com a transformação social e com a formação do cidadão na sua acepção mais plena, tendo em vista a construção do Plano de Educação para a Rede Estadual de Ensino de Mato Grosso do Sul (Mato Grosso do Sul, 2001, p. 3). Programa Dinheiro Direto na Escola 97 As sugestões emanadas dos seminários escolares e das propostas das Políticas Educacionais da Secretaria de Estado de Educação constituíram-se em objeto de análise, debate e aprovação no Congresso Estadual da Constituinte Escolar, com a participação de delegados nos fóruns de debates e decisões, realizados de 26 a 28 de junho de 2001 em Campo Grande (MS). No elenco de temas, destaca-se a "Gestão Democrática", apontando, principalmente, "para a necessidade de uma gestão genuinamente colegiada, na qual os pares compreendam essa função social da escola e atuem de forma a representar cada segmento partícipe da comunidade escolar". Com base no entendimento de que o Colegiado Escolar deveria ser o principal instrumento da gestão escolar, exercendo seu papel como órgão consultivo, deliberativo e avaliativo, tanto nas questões administrativas, quanto nas pedagógicas ou financeiras, a Secretaria entende que: O destinatário dos repasses financeiros das verbas públicas federais ou estaduais, nessa lógica, seria o Colegiado Escolar, a quem cabe geri-los democraticamente, ouvindo a comunidade escolar, tendo como parâmetro a legislação vigente. O Colegiado Escolar passaria a ser a Unidade Executora, com caráter jurídico, para que este possa, junto à comunidade escolar, planejar, aplicar e acompanhar o gerenciamento de todos os recursos públicos destinados à Educação (sic) (Mato Grosso do Sul, 2001, p. 51-52). Assim foi encaminhada para votação, no Congresso Constituinte, a proposta do Colegiado Escolar como unidade executora, nos seguintes termos: 1a. O Colegiado Escolar, unidade executora da unidade escolar, passará a gerenciar os recursos públicos federais e estaduais, com o objetivo de fortalecer a gestão colegiada; 1b. Os Colegiados Escolares passarão a gerenciar os recursos públicos federais e estaduais, juntamente com a APM; 1c. Manter o gerenciamento dos recursos públicos pela APM e as funções avaliativas, deliberativas e consultivas pelo Colegiado Escolar (Mato Grosso do Sul, 2001, p. 51-52). No processo de votação, os congressistas decidiram pelo segundo item entre os demais apresentados, ou seja, "os Colegiados Escolares passarão a gerenciar os recursos públicos federais e estaduais, juntamente com a APM". Pode-se dizer que essa decisão dos congressistas expressa uma forma de conciliação. Assim, a APM, entidade da sociedade civil com personalidade jurídica de direito privado, continua sendo a unidade executora da escola, enquanto o colegiado, apesar de formado por representantes dos diferentes segmentos da escola, não tem caráter jurídico (Fachini, Oliveira, 2004). As informações referentes à implantação e implementação do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) foram apresentadas, nesta pesquisa, por três pessoas vinculadas ao Sistema Estadual de Ensino, relacionadas diretamente ao acompanhamento do PDDE na Secretaria Estadual de Educação. 98 Programa Dinheiro Direto na Escola A Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul, órgão executivo do Sistema, além de mantenedora e gestora da rede estadual de ensino está organizada em três Superintendências. Em cada uma delas, estão inseridas coordenadorias específicas: Superintendência de Planejamento e Apoio à Educação (Supae); Superintendência de Planejamento e Apoio à Educação (Suped); e Superintendência de Apoio Administrativo e Operacional (Suaop). De acordo com os entrevistados, os programas que repassam recursos diretamente para a escola, atualmente, pelo Fundescola, por meio do FNDE são os seguintes: Programa de melhoria da Escola (PME) – elaboração do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE); Programa Dinheiro Direto na escola (PDDE) – segundo o número de alunos registrados no Censo Escolar do ano anterior; Programa Adequação de Prédios Escolares (Pape) – por meio do Levantamento de Situação Escolar (LSE), em que são priorizados os prédios em situação de maior necessidade. Por ocasião da implantação do Programa, a Secretaria de Estado de Educação (SED) realizou palestras, distribuiu cartilhas e prestou orientação à direção das escolas e ao presidente das unidades executoras, as APMs. Observou-se que a SED não interfere no desempenho dessas unidades, limitando-se a encaminhar à escola o documento a ser preenchido pelo dirigente da APM, com a finalidade de cadastrá-lo no Sistema PDDEnet para o FNDE. A Gerência de Recursos Financeiros, parte integrante da Superintendência de Gestão Operacional da Secretaria de Educação, conta com uma pessoa responsável no cargo de gerente administrativo e financeiro, responsável pelo cadastro, pelo acompanhamento e pela prestação de contas. No entanto, o controle das contas é feito pela Coordenação Financeira (Cofin) localizada na Superintendência de Apoio Operacional, que faz o acompanhamento de toda a parte que se refere aos recursos financeiros das escolas estaduais e emite o parecer final. Quanto ao acompanhamento da Secretaria às escolas, um entrevistado afirma que a "orientação e acompanhamento do PDDE são feitos em conjunto entre Fundescola e Cofin". Afirma, ainda, que a orientação para a organização das unidades executoras nas escolas é feita "pelo Fundescola e Coordenadoria de Gestão. Mas não existe um trabalho conjunto dentro da SED". Outro entrevistado confirma a afirmação de que o "[...] O Fundescola não tem contato com o financeiro – desconhece". Desse modo, fica evidente que não há uma articulação entre esses dois setores. Ao ser indagado sobre a relação das escolas com o sistema, o Técnico1 afirma que o PDDE não mudou essa relação, uma vez que: O PDDE é gestão da escola e não há interferência de Secretaria no processo. Quem assina o convênio é o Secretário de Educação e é ele quem responde pelos programas quando algo sai errado. O controle sobre a prestação de contas é da SED, que encaminha a relação de escolas que estão consolidadas, sem nenhum problema com as contas (Técnico 1). O técnico enfatiza, ainda: "a Secretaria, assim, quanto à relação das escolas com o Sistema de Ensino, não interfere na administração dos recursos: é administrado pela APM da escola em parceria com a direção escolar, porém quem Programa Dinheiro Direto na Escola 99 decide tudo é o diretor, inclusive o envolvimento do Colegiado". "Quem gasta é o diretor. A APM só assina, não atua efetivamente. Quem executa é um, quem responde é outro. Geralmente é a Secretaria que presta contas. A SED também ajuda na prestação de contas, muitos diretores não sabem fazer." (Técnico 1). O depoimento da pessoa entrevistada revela que, além de uma fragmentação das ações, as decisões estão concentradas nas mãos do diretor da escola. A obrigatoriedade da criação de unidade executora nas escolas para gerenciamento de recursos públicos é entendida como uma "política vinculada aos acordos com o Banco Mundial. Mas para a escola é melhor, pela agilidade e autonomia com os recursos" (Técnico 1), sendo que a principal vantagem da criação das unidades executoras para a organização e funcionamento das escolas públicas consiste na: "Maior agilidade nas compras da escola. Agora a escola deve ter a responsabilidade em prestar contas senão não recebe outro repasse e o Estado fica inadimplente. Não sei como seria outra forma de repasse de dinheiro para a escola." (Técnico 2). A respeito do papel das unidades executoras, o Técnico 1 considera que a Unidade Executora tem o papel "de gerenciar os recursos. Geralmente, não são feitas reuniões para decidir o que e como comprar, não segue a proposta pedagógica da escola e não passam informações à comunidade, só quando compram algo que todo mundo cobrava." O seu depoimento evidencia que os membros da APM não participam das decisões coletivas relacionadas aos aspectos pedagógicos das escolas, enquanto o Técnico 2 assinala que a unidade executora tem a "a função de administrar de maneira eficiente e transparente os recursos repassados para a escola". Como as unidades executoras são entidades de direito privado, elas arrecadam recursos às escolas, por meio de festas, bingos e eventos diversos. Isso ocorre, segundo o Técnico 1, pois "o recurso repassado não é suficiente para a manutenção da escola, e, segundo o Técnico 3, "porque precisam de mais recursos. E também gostam de fazer promoções para a comunidade". Além disso, acrescentam que o governo dispensa as unidades executoras do pagamento de tributos porque "os recursos são escassos e muito necessários para a melhoria da educação" (Técnico 1), além de ser "a única maneira de receberem os recursos" (Técnico 2). A respeito do impacto pedagógico do PDDE, vale a pena atentar para o entendimento expresso pelos entrevistados: Não houve impacto na aprendizagem, melhoria no atendimento da escola. Quem controla todo o movimento dos programas na escola é o diretor, que faz reuniões quando julga importante. A escola não tem a cultura da participação, então o diretor acaba fazendo como quer. Por exemplo, o presidente da APM não entende sua responsabilidade (Técnico 1). O objetivo do fundo é a melhoria da aprendizagem. Em MS, isto não foi trabalhado pelos diretores. Tem recurso sobrando, mas não atingem a aprendizagem dos alunos. Exemplo: na compra de uma TV, não justificam no Plano o uso didático. Impacto pedagógico não acontece. A escola tem aparelhagem, está bem equipada, mas o aluno não tem acesso. A questão pedagógica não está sendo atendida. A escola não faz nada em benefício do aluno (Técnico 3). 100 Programa Dinheiro Direto na Escola Os Técnicos 1 e 2 apontam que a maior dificuldade do Programa "está na tomada de preços, principalmente nas escolas do interior, inclusive pela demora no depósito do recurso nas contas". O Técnico 3 assinala que, além da tomada de preço, "não respeitam prazos. Não têm idéia do que é custeio e capital, desconhecem a sistemática. Deixam as coisas por conta da SED". Em síntese, os gestores demonstram uma visão positiva do PDDE, apontando, por um lado, como vantagem do Programa, o fato de ser "uma verba muito útil para a escola" (Técnico 1) ou de o recurso ser "[...] muito bem aproveitado na compra de materiais de consumo, nos pequenos reparos, aperfeiçoamento pedagógico e aquisição de material permanente. As compras não passam pela Central de Compras" (Técnico 2). Por outro, apontam que a principal desvantagem consiste no fato de que "o recurso chega à escola somente no final do ano". Escola da amostra estadual – escola "A" A escola estadual da amostra, aqui denominada de escola "A", iniciou suas atividades no ano de 1981. Em setembro de 1990, foi efetuada a transferência da Escola com a instalação e funcionamento em estrutura organizacional e padrão em prédio próprio, onde moram professores universitários, médicos, advogados e outros profissionais liberais; no entanto, a escola quase não atende a essa população Os alunos são oriundos de classe social de baixo poder aquisitivo e apresentam muitos problemas familiares. Na escola da rede estadual de ensino, as entrevistas foram realizadas com a diretora, que atua na escola há 15 anos, sendo 10 anos na direção, e com os representantes dos segmentos da APM: a presidente da APM, cuja profissão é do lar, e a representante dos professores. O PDDE foi implantado na escola em 1998 e recebe, também, recursos do PDE, Merenda Escolar, Repasse Financeiro do Estado, segundo os entrevistados. Tabela 1 – Recursos recebidos e gerados pela escola estadual Nº alunos PDDE Ano 2002 2003 2004 Repasse Estado Merenda PDE*** EF EM Custeio Capital 829 623 726 344 379 333 7.500,00 1.400,00 23.374,00 7.500,00 5.171,04 EF* EM** Recursos da escola - 4.275,00 1.016,00 1.600,00 1.400,00 16.198,00 10.000,00 4.145,00 1.376,00 2.822,56 1.292,76 17.194,00 10.000,00 4.190,00 1.516,00 1.530,50 Fonte: Estatística/Supae/SED e Registros da EE. * Fonte 08 – repasse duas vezes ao ano. ** Fonte 00 – repasse duas vezes ao ano. *** 2003 = 7.000,00 Federal; 3.000,00 Estado/2004 = 5.000,00 Estado; 5.000,00 Federal. Em relação aos recursos do PDDE, de 2002 para 2004, houve decréscimo dos valores recebidos, que passaram de R$ 8.900,00 para R$ 6.463,80, ou seja, menos 27,37%, tendo em vista a diminuição do número de alunos e a manutenção dos valores. Programa Dinheiro Direto na Escola 101 A escola recebeu, em 2002, o valor de R$ 8.900,00, representando 62,71% em relação ao repasse efetuado pelo Estado, que foi de R$ 5.291,00 (37,28%). Em 2003, recebeu também o valor de R$ 8.900,00, correspondendo a 61,71% em relação ao repasse do Estado, de R$ 5.521,00, o que representa 38,22%. Já em 2004, recebeu o valor de 6.463,80, correspondendo a 53,11% em relação ao repasse do Estado, de R$ 5.706,00 (46,89%). Conforme a diretora da escola, a decisão sobre a aplicação dos recursos cabe tanto ao colegiado, que acompanha o trabalho da APM, quanto à própria APM; porém, acentua que "em alguns momentos, não dá para reunir todo mundo para resolver algum gasto emergente". A decisão quanto à aplicação dos recursos, conforme as palavras da presidente da APM, confirmadas pela representante dos professores da APM, é a seguinte: "o dinheiro vem pela conta da APM, a decisão é tomada pela direção, que escuta as sugestões". Já o membro do Colegiado Escolar entrevistado assinala que "a decisão é pela maioria, apresentada pela direção o que é prioridade da escola". Isso significa que a decisão, em última instância, fica a cargo da direção da escola. Quanto à tomada de preços, a diretora afirma: Fazemos uma tomada de preços, geralmente é a Secretaria que faz, eu também faço. Recolho panfletos de propaganda de supermercado, entro em acordo com alguns locais para fazer menor preço. A presidente da APM também ajuda. Depois, frente às necessidades (sic), resolvemos onde e como comprar. A prestação de contas é feita por mim, pela Secretaria, e a presidente da APM e Colegiado acompanham. As compras pelo PDDE são basicamente para materiais para o aluno, por exemplo, papelaria. O recurso entra pela conta corrente da APM - Banco do Brasil. Cada recurso tem uma conta, por convênio. Toda prestação de contas tem que seguir as planilhas que compõem o processo. Para os recursos gerados pela escola, existe o livro caixa. A escola não paga imposto de renda, apenas declara que é isenta. Os entrevistados não têm encontrado dificuldades na execução do Programa. No relato da diretora: "Depois que a gente acostuma a trabalhar, é fácil. Primeiro, aplico o dinheiro, depois é feita a pesquisa de preços por panfleto, fax, e-mail, telefone. O repasse do Estado também é aplicado, mas não pode ser usado o rendimento." Quanto às vantagens do Programa, a presidente da APM afirma que o PDDE "é bom, necessita aumentar a verba". A professora concorda, porém destaca que "o gasto é muito amarrado". Em suma, os entrevistados, em seus depoimentos, foram unânimes com relação aos valores recebidos, afirmando que é preciso "aumentar os recursos. Rever o valor por aluno". Sistema Municipal de Ensino de Campo Grande O Sistema Municipal de Ensino do município de Campo Grande foi criado pela Lei nº 3.404, de primeiro de dezembro de 1997, com o objetivo de 102 Programa Dinheiro Direto na Escola promover melhor qualidade educacional, orientar, coordenar e controlar a execução das atividades relacionadas ao ensino no Município, em conformidade com as diretrizes da legislação vigente e políticas de ação de Governo, embasando o pleno desenvolvimento do educando e o seu preparo para o exercício da cidadania (art. 2º). A Secretaria Municipal de Educação é um dos órgãos que integram esse Sistema (art. 3º). Um ponto a ser destacado é que a Lei Orgânica Municipal (LOM) em seu artigo 168, inciso V, determina a criação de um fundo de manutenção às escolas da rede municipal de ensino, também segundo tipologia. O processo de descentralização financeira de recursos às escolas municipais de Campo Grande efetivou-se a partir do ano 2000, com a Resolução Semed nº 27, de 24 de março de 2000, que estabeleceu critérios para a transferência de recursos financeiros às unidades escolares da rede municipal de ensino. O art. 2º define que o Regime de Adiantamento consiste na transferência de recursos às unidades escolares para despesas como: manutenção, conservação e pequenos reparos da unidade escolar; aquisição de material de consumo necessário ao funcionamento da escola; implementação de projeto pedagógico. Esse adiantamento será concedido mediante a apresentação trimestral de seu plano de aplicação (parágrafo único). Embora já estivesse previsto na LOM, o mecanismo de transferência de recursos às escolas ocorreu, somente, após a implantação do PDDE, podendo ter sido induzido pelo Programa. No município de Campo Grande, conforme o Decreto nº 8.508, de 7 de agosto de 2002, a direção escolar é cargo em comissão, de livre nomeação e exoneração do Poder Executivo entre os servidores do quadro permanente de pessoal do magistério, mediante processo seletivo, observados os seguintes requisitos: ser servidor estável detentor de cargo de provimento efetivo integrante do Quadro Permanente de Pessoal do Magistério; possuir habilitação mínima de curso de graduação, licenciatura plena; possuir experiência mínima de três anos de efetivo exercício em função de magistério na rede municipal de ensino; participar do curso de capacitação de gerenciamento escolar. Na Secretaria Municipal de Educação, há um setor denominado Grupo Orçamentário e Financeiro. Esse setor conta com um técnico responsável pelo acompanhamento, execução, emissão do parecer e encaminhamento da prestação de contas ao FNDE desde que o Programa foi implantado na rede municipal. Assim, a técnica responsável pelo setor, foi a entrevistada da Secretaria Municipal de Educação (Técnica). Possui formação em Pedagogia e especialização em Metodologia de Ensino, estando na função e acompanhando o PDDE há oito anos. O PDDE foi implantado na rede municipal em 1995, quando ainda havia em Campo Grande a Delegacia do MEC (Demec). As orientações foram feitas por técnicos treinados pelo FNDE, e o cadastro das escolas foi efetuado pela Demec. "Nem todas as escolas tinham Associação de Pais e Mestres, a maior parte foi executada pela prefeitura. Quem tinha APM, a Semed fez uma cartilha orientando como gastar os recursos" (Técnica). Conforme registros da escola, as matrículas no ensino fundamental corresponderam a 604 alunos em 2002, 621 em 2003 e 646 em 2004. Programa Dinheiro Direto na Escola 103 104 Programa Dinheiro Direto na Escola Custeio Capital Total 7.951,61 8.886,72 9.087,74 Merenda Fundo Rotativo* (RA/PMC) 10.225,17 10.195,23 PDE 10.000,00 Outros** (Cantinho da leitura) Outros recursos recebidos da administração pública Fonte: Registros da escola “B”. * Recursos recebidos bimestralmente da prefeitura municipal e depositados na conta da direção da escola. ** Recursos recebidos do governo federal em parceria com a prefeitura para a aquisição de livros didáticos. *** Recursos angariados por meio de festas e eventos promovidos pela Associação de Pais e Mestres. 2002 5.301,00 999,00 6.300,00 2003 5.125,96 1.174,04 6.300,00 2004 5.165,80 1.291,20 6.457,00 Ano Recursos recebidos pelo PDE 18.176,78 8.886,72 29.282,97 Total 1.353,04 1.018,91 1.354,00 Recursos gerados pela própria escola*** (APM) Tabela 2 – Recursos recebidos e gerados pela escola municipal 25.829,92 16.205,63 37.093,97 Total de recursos administrados pela escola A escola recebeu do PDDE, em 2002, o valor de R$ 6.300,00, representando 44,20% em relação ao Fundo Rotativo repassado pela prefeitura municipal, que foi de R$ 7.951,61 (55,80%). Em 2003, recebeu também o valor de R$ 6.300,00, correspondendo a 41,49% em relação ao repasse do Fundo Rotativo, de R$ 8.886,72 (58,51%). Já em 2004, o valor foi de R$ 6.457,00, correspondendo a 41,53% em relação ao regime de adiantamento (RA) repassado pela prefeitura municipal, de R$ 9.087,74 (58,47%). Assim, nesse período, os recursos repassados pelo PDDE corresponderam a valores menores em relação aos recursos oriundos da Prefeitura Municipal de Campo Grande e repassados, trimestralmente, à escola. Desde a implantação do PDDE, a APM constitui a unidade executora das escolas, sendo regida por um Estatuto padrão para as entidades das escolas do município. De acordo como art. 2º desse Estatuto, "a Associação de Pais e Mestres (APM), instituição cooperativa da escola, tem por finalidade colaborar no aprimoramento do processo educacional, na formação do educando e na integração família-escola-comunidade". Atualmente, as orientações da Secretaria são feitas por meio de reuniões com os diretores e secretários das escolas, no sentido de orientá-los sobre como proceder assim que o recurso é liberado. "Entregamos um manual, elaborado pela técnica responsável, de como executar e como prestar contas". Ao ser indagada a respeito da criação das unidades executoras como "entidades de direito privado" para administrar os recursos da escola, a entrevistada afirma: Foi criada para receber e executar os recursos repassados pelo FNDE. Deve ser formada por pessoas interessadas em promover o bom funcionamento da escola pública e em melhoria da qualidade do ensino por ela ministrado, tendo participação ativa e sistemática na sua gestão administrativa, financeira e pedagógica. A entrevistada acredita que "foi a melhor forma que o governo federal encontrou para que esse recurso fosse direto para as escolas sem ingerência política e desvios de verbas". Quanto às implicações da criação das unidades executoras para a organização e funcionamento das escolas públicas, a entrevistada considera que: Como existe um setor na Semed responsável pelas APMs, não houve resistência por parte das escolas, porque foi exigência do governo federal que se criasse uma unidade executora para que o recurso fosse direto para a escola. Foi feito um trabalho de conscientização, trazendo bons resultados, porque hoje temos 85 escolas, todas com unidade executora própria. Além de gerenciar recursos públicos, as unidades executoras arrecadam recursos por meio de promoções feitas pela escola, envolvendo a comunidade escolar: festa junina, festa da primavera, festa do folclore, entre outros. "O que foi arrecadado é revertido para melhoria do funcionamento da escola e as aquisições são feitas conforme o que ficou determinado em reunião". Para a entrevistada, a gestão do Programa não vem encontrando dificuldades, uma vez que "o diretor e o secretário da escola são treinados pela técnica responsável pelo Programa, e a mesma teve todas as orientações necessárias por Programa Dinheiro Direto na Escola 105 parte dos técnicos que vieram do FNDE". Ressalta, porém, que a maior dificuldade de funcionamento das unidades executoras está na própria atuação da APM, na medida em que: "a comunidade que compõe a Associação de Pais e Mestres precisa ser mais conscientizada da importância do seu papel no contexto escolar". Em resumo, a técnica entrevistada tem uma visão do Programa considerando que: O PDDE é um Programa para prover diretamente a escola com recursos financeiros, visando contribuir para a melhoria da sua infra-estrutura física e pedagógica, assegurando as condições indispensáveis ao seu bom funcionamento e reforçando a participação social e autogestão escolar. Com isso, ocorre a elevação da qualidade do ensino. Escola municipal da amostra – Escola "B" A escola municipal selecionada para a pesquisa, aqui denominada de escola "B", foi inaugurada em 12 de fevereiro de 1999, está localizada em área urbana, porém afastada da cidade e atende a uma população de baixo poder aquisitivo. Atualmente, abriga 712 alunos entre os turnos matutino e vespertino, possui 14 salas de aula com duas turmas de educação infantil, com um total de 58 alunos, 14 turmas de 1ª a 4ª série e 7 turmas de 5ª a 8ª série do ensino fundamental. As informações referentes à implantação e implementação do PDDE na escola foram levantadas por meio de entrevistas, com base em um roteiro de questões abertas, com a diretora da escola. A diretora tem formação em Pedagogia, atua na função há oito anos e acompanha o PDDE há sete anos. Foram também entrevistadas as representantes dos diferentes segmentos da APM/unidade executora: a presidente da APM, que acompanha o PDDE há três anos, é mãe de dois alunos que estudam na escola, cursa, no momento, a 8ª série na educação de jovens e adultos (EJA) no período noturno e, durante o dia, trabalha como autônoma na confecção de bolos; e a professora da escola e vicepresidente da APM, formada em Letras, cursa especialização em Psicopedagogia, trabalha na função há 15 anos e acompanha o PDDE há três anos. A escola, conforme as entrevistadas, conta com três programas de repasse de recursos: o PDE, o PDDE, implantado em 2000, e o RA. Conforme relato da diretora: O RA, ele é um dinheiro que vem direto para a direção da escola. Esse dinheiro é para a manutenção da escola. Então, eu faço o quê? O que eu mantenho? Compro material de limpeza e material pedagógico. O PDDE é uma verba que vem uma vez por ano para a manutenção, para tudo na escola, nosso trabalho na rede municipal, nós usamos a verba do PDDE para manutenção, pedagógico, também da escola. Só não uso para reformas, mas é mais o pedagógico e o trabalho diário da Secretaria. Agora, o PDE é só pedagógico, é só para o pedagógico, tudo, para comprar material permanente, material de custeio, mas só para atender ao pedagógico da escola, porque já diz PDE, Programa de Desenvolvimento da Escola (sic). 106 Programa Dinheiro Direto na Escola No que se refere às decisões sobre a aplicação de recursos provenientes do PDDE, a diretora afirma: A APM não chega aqui nessa escola e diz o que quer. Lógico, primeiramente, eu reúno os professores e ouço as necessidades, a comunidade interna; depois, eu abro para a comunidade externa. Quando a gente reúne a APM, nós já sabemos o que queremos, aí nós passamos para a APM, se a APM concorda ou não, o que a APM deseja. Aí, quando é pedagógico e os pais gostam, a gente faz. A APM desta escola aqui, ela participa assim. Não é de conviver todo dia na escola, mas tudo o que eu preciso quando eu vou fazer uma reunião, por exemplo, eu preciso comprar alguma coisa para a escola, ela pergunta em que pode ajudar, aí todo mundo ajuda. Os relatos acima evidenciam que a APM não participa, diretamente, do processo de decisão sobre a aplicação dos recursos, estando essa centralizada nas mãos da direção da escola. A esse respeito, são elucidativos os depoimentos, primeiro, da presidente da APM e, em seguida, da professora, vice-presidente da Associação: Então, isso é mais assim, convém à diretora, eles que trabalham juntamente com o secretário, eles que organizam isso daí. [...] Então, a diretora faz uma reunião com os professores e vê a necessidade da escola, o que a escola está necessitando naquele momento, desde que seja do pedagógico (sic). Olha, é sempre repassado o que é feito não é? Claro que a direção tem o poder maior, claro que a direção é democrática na medida do possível, até porque cada um tem sua função e é habilitado para aquela determinada função, mas sempre é repassado, ela está opinando também, não que o que a APM determina é lei, há uma troca de idéias. A professora acrescenta que a maior dificuldade encontrada pela APM para o seu funcionamento é "a questão do horário mesmo das reuniões, às vezes, falta um, não dá para atender todos os membros daquele horário; às vezes, alguns podem no período matutino, vespertino ou no noturno, sempre vai faltar um ou outro membro, mas as reuniões sempre aconteceram" (sic). Afirma, ainda: Às vezes, assim, não tem um limite de vezes, de acordo... sentindo a necessidade, nós nos reunimos. Tem Ata, tem o livro Ata, em que é registrado tudo o que acontece; em nível de financeiro também é o mesmo, administrativo também. Às vezes, é passada alguma coisa para a APM para ela estar se informando do que está acontecendo na escola (sic). A respeito da decisão sobre a aplicação dos recursos, a diretora relata: O PDDE, nós fazemos uma planilha de gasto do que vamos fazer e mandamos para a Secretaria para ser analisado tudo o que a gente faz. Por exemplo, eu não posso comprar dez caixas de papel sulfite, eu posso comprar cinco, mas se a APM decidiu dez, eu mando dez e reponho, assim, cem caixas de lápis, trezentos cadernos, quinhentos cadernos, tudo o que for para ser comprado com a verba é enviado para o setor financeiro da Secretaria de Educação para Programa Dinheiro Direto na Escola 107 eles verificarem e financiarem, mas podem falar 'dá para você comprar essas dez caixas, dá para você comprar cinco, não é permitido'. Aí, eu reúno a APM e falo: 'olha, não vai ser possível dez, apenas cinco, mas dá pra comprar esses 750. Aí, eles concordam. Nunca tivemos problemas. Aí, depois que é autorizado, a gente vai ao banco e abre uma conta (...) (sic). E a presidente da APM acentua: Então, a gente vai no banco, a gente é chamado para ir num determinado banco. Chega lá, o gerente apresenta para a gente a quantidade que tem lá, a escola faz uma documentação do valor que tem lá, eles fazem assim é... Eles fazem um projeto, eles reúnem os professores, os pedagogos e vêem qual é a necessidade da escola, porque a verba é gasta só com o pedagógico da escola, então, cada um fala o que tem que fazer, e aí eles fazem um projeto e vai gastando conforme está no projeto (sic). Os depoimentos acima evidenciam que a escola elabora planilhas referentes à aplicação de recursos, encaminhando-as à Secretaria de Educação para aprovação. Isso significa que as decisões estão concentradas, de fato, na Secretaria de Educação, o que pode comprometer o exercício da autonomia da escola. Esse procedimento pode ser entendido como uma forma de controle, não assumida pela Secretaria e não questionada pela direção da escola, talvez pelo fato de que os cargos de direção das escolas municipais são de "confiança" do prefeito municipal em comum acordo com a secretária municipal, embora sejam definidos alguns critérios para essa indicação. Percebe-se uma contradição entre o procedimento assinalado e a afirmação da gestora do sistema de que o PDDE "[...] reforça a participação social e autogestão escolar. Com isso, ocorre a elevação da qualidade do ensino." Ainda, segundo a diretora, os recursos do PDDE (custeio e capital) são utilizados, principalmente, para a compra de material com o objetivo de atender às necessidades pedagógicas. Com relação às vantagens do Programa, a diretora expressa o seguinte: O PDDE, para mim, é uma vantagem, assim, que eu nem posso imaginar... onde eu sei que eu vou manter a escola o ano inteiro. Eu compro desde papel sulfite, papel higiênico, tudo, material de limpeza, material pedagógico, eu compro material permanente, compro tudo para a escola. Dentro daquele dinheiro que eu tenho, eu falo que a comunidade, ela quer saber, assim, o que você precisa para a escola: "Arlene, a escola precisa de quê?" Aí, eu digo, e eles aceitam (sic). Já a principal dificuldade do PDDE para a escola refere-se à prestação de contas: Olha, o que eu acho mais difícil no PDDE é a prestação de contas. A prestação de contas é a coisa mais chata que tem, não pode sobrar um centavo, porque a gente tem que controlar toda semana, porque eles cobram CPMF. Eu tive vantagem porque, nesta escola aqui, eu não paguei CPMF. Mandei uma cartinha para o banco, e o banco liberou. Então, foi fácil. Eu controlava o dia e ia, aí sobra 108 Programa Dinheiro Direto na Escola verba quando a gente faz a licitação, tem que fazer uma nova, então, eles dão prazo de uns três meses para a gente gastar e gastamos quase tudo, assim... eu atendo o pedagógico da escola, eu atendo o administrativo da escola. Aí é que eu vejo a desvantagem, porque não gosto disso (sic). A escola de educação especial da amostra integra a rede estadual de ensino, atende alunos deficientes da audiocomunicação, oferecendo à pessoa surda, a partir de 14 anos, vários programas. As informações na escola de educação especial foram levantadas por meio de entrevista concedida pela diretora, que trabalha há 10 anos na escola e desempenha a função há cinco anos. A diretora possui formação em Letras e Pedagogia e especialização em Educação Especial. Segundo a diretora, a escola recebe recursos dos seguintes programas: PDE, Merenda Escolar e Repasse Financeiro do Estado. Recebe, ainda, recursos do PDDE, desde 1998, por meio da APM. Conforme registro da escola, as matrículas no ensino fundamental correspondem a 198 alunos, em 2003, e 171 alunos, em 2004. Tabela 3 – Recursos recebidos e gerados pela escola municipal de educação especial Ano 2003 2004 PDDE Custeio Capital 2.300,00 2.271,40 400,00 517,00 Repasse Merenda de Setass Repasse Estado EF* 3.016,00 20.000,00 1.000,00 5.148,00 20.000,00 1.000,00 EM Recursos da escola - 1.570,00 3.176,00 Fonte: Coordenadoria de Planejamento/Estatística/Supae/SED e registros da escola especial. * Fonte 08 – repasse duas vezes ao ano. Conforme Tabela 3, a escola recebeu, em 2003, o valor de R$ 2.700,00 do PDDE, correspondendo a 10,68% em relação aos recursos recebidos da Secretaria de Estado de Trabalho, Assistência Social e Economia Solidária (Setass), ou seja, R$ 22.570,00 (89,32%), e a 27,02% em relação ao repasse de R$ 1 mil feito pelo Estado. Em 2004, os recursos do PDDE, no valor de R$ 2.788,40, representaram 10,35% em relação aos recursos da Setass, no valor de R$ 24.176,00 (89,65%); e em relação ao repasse do Estado, no valor também de R$ 1 mil, correspondendo a 26,40% do total dos recursos recebidos. A diretora acentua que, enquanto o colegiado é escolhido "por eleição, os membros da APM são escolhidos por convite, consenso, por aclamação. Não tem movimento político". Fica claro, na fala da entrevistada, que a APM recebe somente os recursos, ficando a decisão sobre a sua aplicação ao Colegiado. "A APM recebe o recurso. Fazemos reunião com o Colegiado e deliberamos os gastos. Fazemos pesquisa junto aos segmentos para ver o que julgam ser mais urgente comprar, por exemplo, o portão automático - a solicitação foi de todos (2005)" (sic). A diretora acrescenta que as reuniões "são feitas mais com o Colegiado. A APM quase não se reúne. Só para prestar contas. Quem faz a documentação é a Secretaria". As reuniões são realizadas durante o período de aulas. A APM está Programa Dinheiro Direto na Escola 109 mais voltada aos "problemas internos e sobre as contas, promoções". Porém há uma "boa convivência" entre eles, na medida em que "cada um tem uma tarefa", tanto que: "No dia-a-dia que passam as informações às mães, pois a maioria fica aqui na frente. Elas não voltam para casa porque é longe e caro. Aqui as mães são presentes direto, tem até uniforme para identificá-las. Temos algumas aulas de trabalhos manuais e outros cursos para quem quer fazer" (sic). A diretora considera que o PDDE é bom, porém destaca que os recursos são poucos, já que "nós temos muitas necessidades e especificidades diferentes das outras escolas. Nossos materiais são muito caros". Aponta como principal vantagem do Programa para a escola o fato de o "dinheiro vir direto". Entretanto, destaca como desvantagem o fato de se "receber igual à escola regular. Nós temos menos alunos, então, acabamos recebendo menos, mas o gasto é maior devido ao atendimento diferenciado". Quanto à gestão do Programa, enfatiza que "a prestação de contas não é difícil. O problema é receber como as outras escolas. A escola especial tinha que ter outro critério", apresentando como sugestão para melhorar o PDDE: "Verificar um recurso maior para a per capita da escola especial. A composição das nossas salas de aulas seguem a Deliberação Estadual, por exemplo, oito alunos/sala por deficiência; quatro alunos/sala para deficiência múltipla. Temos poucos alunos" (sic). As informações levantadas na rede estadual e na rede municipal de ensino revelaram que tanto o Estado de Mato Grosso do Sul quanto o município de Campo Grande aderiram ao PDDE no mesmo ano em que foi implantado pelo FNDE em nível nacional. Em ambas as redes, a opção política foi pela APM, entidade que já atuava nas escolas das redes como unidade executora de direito privado, apesar da existência do Colegiado Escolar, no caso da rede estadual, instituído por decreto governamental no ano de 1991, formado pelos diferentes segmentos da comunidade (diretor, coordenador pedagógico, professor, pai, aluno e técnico-administrativo). Com isso, a APM é revitalizada nas escolas dessas redes. As entrevistas realizadas com os sujeitos do sistema estadual e municipal, assim como com a direção e membros da APM das escolas, mostraram que, no momento da implantação do Programa e no decorrer da sua implementação, não houve preocupação no sentido de se construir um debate relacionado à gestão, estrutura ou obrigatoriedade da unidade executora, uma vez que se trata de uma unidade de direito privado. Esse debate foi levantado somente no interior do movimento da Constituinte Escolar, na gestão do PT, tendo em vista a proposta de educação para a rede estadual e de gestão democrática defendida pela Secretaria de Educação. Esse movimento mostrou que um debate não surge espontaneamente, mas é construído por sujeitos históricos conscientes das contradições que se manifestam em uma determinada conjuntura política e econômica. As entrevistas na escola da rede estadual e na escola da rede municipal revelaram que a APM/unidade executora pouco interfere nas decisões referentes à aplicação dos recursos do PDDE. O seu trabalho limita-se, praticamente, a acompanhar essas decisões e a assinar documentos. As entrevistas mostraram, ainda, 110 Programa Dinheiro Direto na Escola que as decisões estão basicamente concentradas nas mãos do diretor, reforçando uma prática centralizadora. O trabalho que a APM vem desempenhando é mais no sentido de arrecadar recursos para a escola e aprovar as contas, na medida em que não define, por exemplo, o regimento, não aprova e acompanha a proposta pedagógica e não avalia - em suma, somente executa. Da mesma forma, a APM, como unidade executora da escola especial, integrada ao Sistema Estadual, segundo a entrevistada, não decide sobre a aplicação dos recursos e não acompanha efetivamente a sua aplicação, ficando essa tarefa a cargo da direção, juntamente com o Colegiado Escolar. A escola especial, mesmo sendo uma escola do Estado, reivindica para si recursos diferenciados dos recebidos pelas escolas de ensino regular. Observou-se que a relação das escolas com os sistemas ocorre de forma diferenciada. A Secretaria de Estado de Educação não interfere na execução do PDDE, enquanto a Secretaria Municipal de Educação relaciona-se mais diretamente com a escola, chegando a aprovar planilhas de aplicação de recursos. Nesse sentido, pode-se dizer que o Programa induz mais à burocratização e menos à gestão democrática. Assim, diante das informações levantadas, pode-se afirmar que o PDDE não tem contribuído para a gestão democrática como um instrumento de transformação das práticas escolares, sendo fundamental, para isso, democratizar o debate de modo que todos na escola possam ser sujeitos dele. As entrevistas revelaram que o Programa não trouxe impacto pedagógico no sentido de provocar mudanças significativas na aprendizagem dos alunos, apesar de os recursos de custeio serem aplicados, de modo geral, na compra de material didático. Tais aplicações são definidas, porém, sem a devida articulação com a proposta pedagógica da escola. Esse aspecto foi manifestado, principalmente, pelos gestores do sistema estadual. Em síntese, de modo geral, os entrevistados, tanto do Sistema Estadual quanto do Sistema Municipal, têm uma visão positiva do Programa, uma vez que o recurso repassado pelo PDDE ajuda a manter a escola funcionando. 3.4 Estado de São Paulo O PDDE no Estado de São Paulo As informações apresentadas resultam de pesquisa de campo na rede estadual de ensino de São Paulo e na rede municipal de Pirassununga. Foram realizadas observações e entrevistas com gestores, no âmbito do Sistema, e nas escolas, com pais e com técnicos das Secretarias de Educação. Procedeu-se ainda à análise documental privilegiando atas de Colegiados Escolares, balancetes das unidades executoras, e planilhas orçamentárias em diferentes instâncias, além de consulta a dados estatísticos oficiais, tais como matrículas, funções docentes, rendimento escolar, entre outros. Programa Dinheiro Direto na Escola 111 Na rede estadual de ensino foram entrevistadas duas responsáveis por convênios, vinculadas diretamente à Secretaria de Estado da Educação (a gerente de projetos e sua assistente), e um dos técnicos responsáveis por convênios entre as Associações de Pais e Mestres (APM) e escolas que atua em uma autarquia vinculada à Secretaria de Educação, a Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE). Na escola foram entrevistados aqueles mais envolvidos com o funcionamento da APM e com o Programa: diretora e vice-diretora e uma professora (que também é mãe de aluno), membro da diretoria executiva. No âmbito da prefeitura do município de Pirassununga, entrevistaram-se três funcionários/técnicos governamentais (o chefe da Seção de Contabilidade e duas encarregadas do setor de Educação), além dos três últimos Secretários de Educação (gestões de 1997 a 2005). No âmbito das escolas municipais, entrevistaram-se três pessoas escolhidas conforme o critério de envolvimento direto com o PDDE: a assistente de direção da escola-sede, uma professora que atuou nessa escola quando da constituição da APM, e um pai de aluno, membro da APM. A escolha pela realização da pesquisa em Pirassununga deveu-se à existência de um tipo específico de organização para recebimento dos recursos do Programa (Consórcio), uma vez que as escolas municipais (grande parte rurais) individualmente não atingiam o número mínimo de alunos exigido pelo PDDE para recebimento dos recursos. Situação que, dado o perfil dos municípios brasileiros, deve se repetir com muita freqüência em todos os Estados da Federação. Caracterização do Sistema Estadual de Ensino Os dados referentes às matrículas na educação básica no Estado refletem as grandes dimensões populacionais, conforme podemos verificar na Tabela 1: Tabela 1 – Dados de matrícula na educação básica por dependência administrativa no Estado de São Paulo em 2004 Dependência Educação Ensino administrativa infantil fundamental Estadual Federal Municipal Privada Total 1.071 3.001.513 354 187 1.339.650 2.075.869 445.020 785.386 1.786.095 5.862.955 Ensino médio 1.763.024 2.100 17.142 263.585 2.045.851 Educação Educação de especial jovens e adultos 8.726 0 17.022 44.700 70.448 499.820 0 334.227 42.552 876.599 Total 5.274.154 2.641 3.783.910 1.581.243 10.641.948 Fonte: Inep, 2004. A iniciativa privada tem participação reduzida na educação básica quando comparada à esfera pública, exceção feita à educação especial, modalidade de atendimento na qual 63,41% das matrículas ocorrem em escolas privadas. A maior concentração de matrículas no Estado, quase 50%, encontra-se na dependência administrativa estadual, que agrega os maiores porcentuais de atendimento no ensino fundamental, ensino médio e na educação de jovens e adultos: 86,17% no ensino médio e 51,19% no ensino fundamental. Neste nível de ensino 112 Programa Dinheiro Direto na Escola 35,4% das matrículas estão localizadas na esfera municipal, que têm também a responsabilidade pela oferta da educação infantil. Tabela 2 – Participação do Sistema Estadual de Ensino no total de matrículas no ensino fundamental – Estado de São Paulo Matrículas no ensino fundamental Total 2003 5.896.461 Estado de São Paulo Rede 3.106.812 estadualSP 1ª a 4ª séries 2004 2003 5ª a 8ª séries 2004 2003 2004 5.862.955 3.034.014 2.999.216 2.862.447 2.825.863 3.001.513 1.166.431 1.104.762 1.940.381 1.896.751 Fonte: Tabela organizada a partir dos dados finais do Censos Escolares de 2003 e 2004. Inep/2004. Os números acima mostram que, nos dois anos observados pela pesquisa, mais de 50% do total de matrículas no ensino fundamental localizavam-se na rede estadual. No caso das matrículas entre 5a e 8a séries, os porcentuais aproximamse de 70%, enquanto nas quatro primeiras séries compõem porcentuais menores, no entanto relevantes, pois correspondem a quase 40% do total do Estado. Para atender a essa demanda, a rede estadual contava, em 2003, com 5.559 escolas, entre as quais, a maioria, 4.286, com mais de 300 alunos. Há que se considerar que, no mesmo ano, o total de estabelecimentos públicos com ensino fundamental no Estado era de 13.358 (Inep, 2004). As funções docentes informadas para ensino fundamental no Estado correspondiam, em 2003, a 271.175. Desse total, 135.633 estavam na rede estadual de ensino. Receita da Secretaria de Estado da Educação A composição das receitas correntes da Secretaria do Estado da Educação nos anos de 2003 e 2004 é apresentada a seguir em tabela composta a partir de consulta aos Relatórios de Execução Orçamentária dos referidos anos: Tabela 3 – Secretaria da Educação- Receitas correntes Fonte Receita Patrimonial Receita de Serviços Transferências Correntes Outras Transferências Total 2004 2003 126.109.723,42 18.186,00 1.276.516.403,29 109.987.802,59 1.512.632.115,30 91.030.025,82 13.270,00 981.600.275,30 121.519.242,64 1.194.162.813,76 Fonte: Relatório de Execução Orçamentária do Estado de São Paulo – 2003 e 2004. Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo. Programa Dinheiro Direto na Escola 113 Os recursos repassados às UExs pelo PDDE encontram-se sob a rubrica Transferências Correntes Intergovernamentais, composta pelos recursos da Participação na Receita da União e as transferências do FNDE à Secretaria da Educação e à Fundação Esperança (Fundesp). Os repasses decorrentes do PDDE, nos dois anos pesquisados, representam pouco mais de 2% do total das receitas correntes. Entre os programas financiados pelo FNDE, o PDDE é o que conta com menor recurso, menos de 20% do total. Em 2004, os recursos foram ligeiramente reduzidos, embora o total de recursos advindos do FNDE tenha aumentado para o Pnae e o Fundesp. A rede estadual de ensino A Secretaria de Estado da Educação conta com órgãos centrais e órgãos vinculados. Os órgãos centrais podem ser entendidos como aqueles responsáveis pela criação das condições técnicas e financeiras de funcionamento do sistema estadual e aqueles responsáveis pela orientação pedagógica, produção de projetos e organização de informações. No primeiro caso, estão o Departamento de Recursos Humanos (DRHU), responsável pela administração de pessoal no âmbito da Secretaria de Educação, a Coordenadoria de Ensino do Interior (CEI) e a Coordenadoria de Ensino da Região Metropolitana da Grande São Paulo (COGSP), ambas responsáveis, em suas áreas de abrangência geográfica, pela implementação do plano de educação da Secretaria, para o que são organizadas nos setores de Assistência Técnica, Divisão Administrativa e Divisão de Finanças. No segundo caso, órgãos responsáveis pelas orientações pedagógicas, estão a Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (Cenp), que organiza e desenvolve estudos e projetos, oferecendo assessoria às Diretorias de Ensino, e o Centro de Referência Mario Covas (CRE Mario Covas), organizador de eventos, documentação e pesquisa. A SEE conta ainda com dois órgãos vinculados: a Fundação para Desenvolvimento da Educação (FDE) e o Conselho Estadual de Educação de São Paulo (Cees). A FDE é uma autarquia que funciona como órgão executor da política da Secretaria de Estado da Educação, organizando processos de licitação e desenvolvendo projetos. Responsabiliza-se também pelo encaminhamento de recursos às Associações de Pais e Mestres (APMs) das escolas. O Conselho Estadual de Educação é um órgão normativo, consultivo e deliberativo, vinculado tecnicamente à Secretaria de Educação. É composto por 24 membros, escolhidos pelo governador do Estado, para um mandato de três anos. (www.educacao.sp.gov.br. Acesso em 28/11/2004). No plano regional, os órgãos responsáveis pela supervisão das escolas do sistema estadual e pela implementação da política da SEE são Diretorias de Ensino (DE), às quais as unidades escolares estão subordinadas diretamente. As Diretorias de Ensino (criadas pelo Decreto nº 43.948 de 1999) assumiram a responsabilidade por um maior contingente de unidades escolares e uma maior área geográfica do que as antigas Delegacias de Ensino. Sua criação foi uma das medidas adotadas com o objetivo de promover a "racionalização administrativa" e a "descentralização" na administração pública. 114 Programa Dinheiro Direto na Escola A equipe técnica administrativa das escolas é composta pelo diretor escolar, licenciado em pedagogia e concursado; pelo vice-diretor, esse professor da rede designado para a função pelo diretor escolar e aprovado pelo Conselho de Escola, e pelo secretário de escola. Os professores da rede estadual podem também assumir a função de professor coordenador, posto de trabalho que existe nas escolas com, no mínimo, 12 classes em dois ou mais turnos, cujas funções relacionam-se à organização, implementação e avaliação do projeto pedagógico, além de subsidiar professores no desenvolvimento das atividades docentes e organizar as reuniões regulares que compõem as jornadas dos docentes. A administração das escolas é formalmente responsabilidade da equipe técnica e do Conselho de Escola (CE), no qual estão representados todos os segmentos envolvidos com a atividade escolar (usuários e profissionais). Os Conselhos Escolares de natureza consultiva surgem no final da década de 70. A partir de 1985, com o Estatuto do Magistério (Lei nº 444/85), o Conselho de Escola passa a ter caráter deliberativo. Além disso, a eleição dos componentes do CE institui caráter proporcional à composição do colegiado: 50% de representantes dos profissionais escolares e 50% de representantes da comunidade usuária. Presidido pelo diretor escolar, o CE deve ter um mínimo de 20 e um máximo de 40 componentes, entre os quais, 40% devem ser docentes, 5% devem ser especialistas de educação (exceto o diretor), 5% são os demais funcionários, 25% são pais de alunos e 25% são alunos. Desde a implantação dos Conselhos de Escola deliberativos na rede estadual paulista, inúmeros estudos têm se dedicado à análise da participação da comunidade na gestão escolar, discutindo os obstáculos à implementação do órgão colegiado. Devido a diversas formas de resistência no âmbito das unidades escolares e à ausência de políticas capazes de potencializar a ação dos Conselhos, observa-se que condicionantes de ordem material, político-social, institucional e ideológica (Paro, 1995) têm limitado a capacidade de a gestão colegiada na rede constituir-se como uma realidade, prevalecendo formas hierárquicas de administração (Cf. Avancine, 1990; Campos, 1983; Russo, 1995; Garcia, 1995 e 2003). As Associações de Pais e Mestres (APMs), órgãos auxiliares da administração criados ao final dos anos 70, têm relevância crescente no sistema e no cotidiano das escolas estaduais, uma vez que, progressivamente, vêm assumindo um volume maior de responsabilidades em termos de administração de recursos essenciais para o funcionamento das unidades. Tais recursos são destinados à contratação de pessoal e serviços, além de desenvolvimento de projetos os mais diversos. O diretor escolar, segundo o Estatuto Padrão da APM, é presidente nato do Conselho Deliberativo (art. 16), responsável pela aprovação do plano anual e contas da Associação, além de eleger a secretaria executiva. Cabe ainda ao dirigente, convocar a assembléia geral (instância máxima da APM) que elege os membros dos Conselhos Deliberativo e Fiscal e da Diretoria Executiva. Destaca-se, portanto, o papel relevante reservado ao diretor escolar nas atividades da entidade. O Conselho Deliberativo, presidido pelo diretor da escola é composto por, no mínimo, 11 membros: 30% de professores; 40% de pais de alunos; 20% de Programa Dinheiro Direto na Escola 115 alunos maiores de 18 anos; 10% de sócios admitidos. Um dos pais, membros do conselho, deve obrigatoriamente participar do Conselho de Escola. A Diretoria Executiva da APM subdivide-se em cinco diretorias: Executiva, Financeira, Cultural e Esportes, Social e de Patrimônio. Para cada setor, são eleitos um diretor e vice-diretor, excluindo-se os alunos. O diretor financeiro deverá sempre ser um pai de aluno. O diretor da escola pode participar das reuniões, com direito à voz, mas sem direito a voto. As APMs podem estabelecer convênios, e captar recursos por meio de: contribuições dos sócios; subvenções diversas; doações; promoções diversas e outras fontes. O Estatuto Padrão de 1978 já atribuía às APMs funções na colaboração para a melhoria da qualidade de ensino, por meio de mobilização de recursos humanos e financeiros. Tais funções assemelham-se aos objetivos do PDDE (Adrião, Garcia, 2003). Em 2004, visando adequar o Estatuto Padrão das APMs ao novo Código Civil, um novo decreto o atualiza. A principal mudança é a explicitação da entidade como pessoa jurídica, de direito privado (art. 1º). A participação do diretor e a composição de conselhos e diretoria não se alteram. Em relação aos meios de arrecadação dos recursos, o novo Estatuto mantém todos os já previstos, exceto a arrecadação de "outras fontes". É importante destacar que a realização de convênios entre FDE e APMs já era uma prática no sistema, assim como o recebimento de recursos federais por meio de programas. O Estatuto Padrão de 1978 já atribuía às APMs funções na colaboração para a melhoria da qualidade de ensino, por meio da mobilização de recursos humanos e financeiros. Tais funções assemelham-se aos objetivos do PDDE (Adrião, Garcia, 2003). A implementação do PDDE O Programa Dinheiro Direto na Escola foi assumido pela Secretaria de Estado da Educação de São Paulo em 1995, ano de seu lançamento. Segundo o responsável pelo Programa na FDE, o processo de implantação foi "quase automático", facilitado pelo fato de as escolas já terem unidades executoras em funcionamento. A SEE disciplinou a implantação do Programa na rede estadual em julho de 1995, com o comunicado nº 5. De acordo com o documento, todas as escolas que ofereciam o ensino fundamental, regular ou supletivo, fariam jus aos repasses, conforme o número de alunos matriculados e de acordo com as faixas de distribuição estabelecidas para as escolas da Região Sudeste do País. Coube à FDE estabelecer os convênios com as unidades executoras das escolas para o repasse dos recursos. Nesses termos, frise-se que o trâmite adotado para o repasse de tais recursos às escolas se deu entre fundações, ou seja, paralelamente ao aparato da administração pública direta. Às Delegacias de Ensino, coube a função de intermediar as remessas de recursos para as escolas, checando os documentos de caracterização da unidade executora e a prestação de contas enviada pelas escolas (Adrião, Garcia, 2003).Conforme o técnico da FDE: "(...) na realidade, é um convênio, e convênio pressupõe partes iguais. 116 Programa Dinheiro Direto na Escola Então, o órgão FNDE e o órgão FDE são entidades jurídicas também e formalizam o convênio" (C. 17/6/2005). A respeito de possíveis dificuldades no processo de implantação do PDDE, o representante da FDE menciona problemas de ordem técnica, afirmando que, nos primeiros anos, o registro de dados, quanto à adesão das APMs e prestação de contas, ocorreu com alguns entraves. De posse dos dados coletados nas UExs, os técnicos deveriam digitá-los em computadores com acesso ao banco de dados do FNDE, só disponíveis em órgãos federais. Atualmente o acesso ao banco de dados federal é possível na própria FDE que contrata temporariamente digitadores para executar a tarefa de transferir os dados provenientes das escolas para o FNDE. Após a chegada dos recursos nas escolas, ainda segundo o técnico entrevistado, o trabalho é maior em termos de orientações às unidades executoras em relação às compras. Segundo o técnico, foram poucas as dificuldades nas escolas, uma vez que as Associações de Pais e Mestres já tinham estrutura para administrar recursos. Ainda assim, observa que [...] mudavam algumas coisas. Tinha umas exigências maiores. Naquela época, a gente não tinha uma verba que encerrava no próprio ano. Aí, veio uma verba para fechar em dois meses. E não era verba pequena. Sete, oito mil. Então, no início, foi meio problemático isso. Mas, aos poucos, se acostumaram (C. 17/6/ 2005). A gerente de projetos da SEE observa que a adesão das escolas ao Programa foi de 100%: "quando nós tínhamos quase 6mil escolas (atualmente são 5.500), só três não recebiam o recurso". A respeito de um caso recente de não adesão ao Programa, a entrevistada avalia: "o diretor simplesmente se recusou a preencher [o formulário de adesão]. Deveria até ter um trabalho de diligência em cima dessa escola, porque a direção da escola não pode se decidir a não preencher, a escola é que está perdendo. E ela [a direção] não é a escola" (B. 12/5/2004). A orientação aos administradores escolares é realizada anualmente desde a implantação do programa e segue algumas etapas: 1) a SEE divulga, por meio de um Comunicado, as orientações gerais sobre a aplicação dos recursos do Programa, segundo a Resolução anual do FNDE; 2) a seguir são realizadas videoconferências em que a gerente de projetos fala aos dirigentes de ensino; 3) as Diretorias de Ensino, por sua vez, organizam as atividades em suas regiões para orientar os diretores escolares; 4) a FDE encarrega-se da produção e distribuição de informativo impresso e mantém contatos com UExs e Diretorias que manifestam dúvidas sobre a aplicação de recursos ou a prestação de contas. As UExs devem prestar contas dos recursos até o início do mês de dezembro. As contas são examinadas e homologadas na Diretoria de Ensino e depois encaminhadas à FDE, que as confere e lança os dados no sistema do FNDE. Há um conjunto de recursos encaminhados às APMs, via FDE, que nos indica ser a Associação de Pais e Mestres uma "peça" importante na política educacional da SEE, especialmente no que diz respeito à concepção de descentralização e construção de autonomia nas escolas. A forma como são realizados os convênios é também um indicador do papel relevante que tem a FDE na Programa Dinheiro Direto na Escola 117 gestão do sistema, refletindo uma opção política da atual administração por um modelo de gestão que privilegia as parcerias entre escolas e instituições. Embora a Secretaria de Estado da Educação produza as orientações, as entrevistas mostram que a FDE ocupa lugar de destaque na relação com as escolas. O órgão, segundo informações disponíveis em seu site, mantém atualmente convênios com 5.540 Associações de Pais e Mestres. (www.fde.sp.gov.br). Apesar do elevado número de convênios, os recursos sofreram alterações nos últimos anos, segundo declaração de um dos técnicos da FDE devido ao PDDE: Inclusive, nós, do Estado, a gente passava quatro parcelas para a escola de manutenção. Aí, nós acabamos passando três, porque a última parcela é a do MEC. Então, ano passado, por exemplo (período no qual houve atraso no repasse do FNDE), foram as três e nada mais, e ficou muito chato. Então, acabou caindo no dia 24 de dezembro para usar em janeiro, que já era recesso. (C. 17/ 6/2005) A participação do PDDE no conjunto de recursos disponibilizados pela Secretaria de Educação e transferidos às Associações de Pais e Mestres por meio de convênio com a FDE é relevante, como podemos observar na Tabela 4: Tabela 4 – Participação do PDDE (convênio FDE/MEC – Secretaria de Educação) no total de recursos repassados às APMs Ano Convênio – FDE/MEC 1999 2000 2001 2002 2003 2004 31.115.700,00 28.528.700,00 27.428.700,00 25.313.400,00 23.606.000,00 23.309.561,00 Total de recursos (incluindo PDDE) 83.985.812,41 125.459.759,03 180.004.034,40 174.614.420,62 169.936.131,88 129.140.499,57 Porcentual representado pelo PDDE no total de recursos repassados às APMs (%) 37,04 22,73 15,23 14,49 13,89 18,04 Fonte: ???. Observe-se que os recursos advindos do PDDE são denominados "VerbaMEC", procedimento comum nas escolas e no âmbito da gestão do sistema. Verificamos nesses dados a materialização de dois fatores que caracterizam o ensino fundamental na rede estadual paulista: 1) a ampliação significativa de recursos descentralizados para as APMs nos últimos cinco anos, pois, embora os repasses em 2004 sejam menores que nos três anos anteriores, o volume é expressivamente maior do que em 1999; e 2) a redução do volume de recursos provindos do PDDE pode refletir a diminuição de matrículas no ensino fundamental (discreta) em função da normalização do fluxo escolar e, principalmente, devido à municipalização. A abrangência do Programa fica visível quando verificamos que, em todos os anos, o número de escolas alcançadas é muito próximo do total de unidades do sistema. Em 1999, quase 40% do total de recursos repassados às APMs correspondiam a verbas repassadas pelo Programa. 118 Programa Dinheiro Direto na Escola O entrevistado na FDE mostra entusiasmo com a descentralização e com a autonomia estimulada pelo PDDE. Segundo ele, uma das grandes qualidades do Programa é ter promovido o crescimento das unidades executoras, substituindo a centralidade do diretor escolar pela UEx, representativa, a seu ver, da comunidade. A transferência direta de recursos para a escola é outra qualidade ressaltada pelos entrevistados na FDE e na SEE. O representante da FDE aponta os ganhos que as escolas obtêm em receber verbas que não precisam tramitar pelas Secretarias de Educação locais, evitando perdas e desvios: "(...) agora, com esse sistema, saem R$ 100 do ministério e chegam R$ 100 na escola. Isso foi fundamental. O dinheiro se perdia, porque todo mundo usava" (C. 17/6/2005). O entrevistado interpreta o projeto como um prenúncio, ainda modesto, da "autonomia total" da escola. Reconhece, todavia, que um dos entraves para a melhor aplicação dos recursos do PDDE é a rotatividade do diretor escolar, uma vez que isto diminui o grau de conhecimento do dirigente sobre o Programa. A escola estadual A unidade, quando realizada a pesquisa, concentrava-se no atendimento aos quatros anos iniciais do ensino fundamental. Funcionando em dois períodos, a escola atendia 891 alunos em 2004. Nos dois anos aos quais se refere a coleta de dados foram repassados à APM recursos trimestrais provenientes do convênio com a FDE destinados a pequenos serviços de manutenção e contratação de funcionários, além dos repasses do PDDE, como mostra a Tabela 5: Tabela 5 – Recursos destinados à Associação de Pais e Mestres da escola Recursos PDDE Verba trimestral FDE - 1ª parcela Verba trimestral FDE - 2ª parcela Verba trimestral FDE - 3ª parcela Totais de recursos destinados à APM Destino 2003 APM APM APM APM 6.200,00 1.371,50 2.800,00 2.324,30 14.698,8 2004 6.401,50 3.726,00 4.980,00 5.275,00 22.386,5 Fonte: Informações cedidas pela vice-diretora da escola. Em 2003, os repasses do PDDE representaram 42,18% do total de recursos recebidos e executados pela APM. No ano seguinte, com a ampliação de outros recursos, a participação dos repasses do Programa nos recursos recebidos declinou para 28% do total. A APM, além de administrar capta os recursos por meio do arrendamento da cantina escolar da escola. Os depoimentos indicam que diretora e vice-diretora assumem a responsabilidade pelo PDDE, atuando no processo referente à tomada de preços que antecede as compras e na prestação de contas referente aos gastos com o Programa. Em contrapartida, a participação dos pais é reduzida. Segundo a Programa Dinheiro Direto na Escola 119 vice-diretora, isso ocorre porque os pais "têm medo de não saber fazer": Ainda de acordo com a vice-diretora, se os pais são convocados para trabalhar em algum evento, sua participação é mais tranqüila, mas, em se tratando de recursos, têm medo e evitam participar. A professora entrevistada demonstrou não conhecer o PDDE, embora fosse membro de diretoria da APM. Questionada sobre sua pouca informação, observou: "Eu sei que não devia, mas confio totalmente na diretora" (C. 16/5/2005). A fala da professora e o envolvimento da equipe técnica demonstram que, no caso da escola pesquisada, embora o repasse seja destinado a APM, a centralidade da atuação do diretor para a consecução do Programa ainda é um fato. O exame das atas do CE demonstrou que a discussão sobre os recursos no âmbito desse colegiado não ultrapassa os limites da formalidade, uma vez que cabe ao órgão apenas homologar as propostas da APM, restando-lhe o papel único de referendar decisões já tomadas. Embora membros do Conselho componham também a APM, verificou-se em todas as atas analisadas a ausência de discussões e uma extrema regularidade no formato. Localizamos, nos anos pesquisados, quatro atas com referências ao PDDE, duas versando sobre a chegada dos recursos e duas formalizando a prestação de contas. Cabe registrar que as atas da APM são peças vitais na prestação de contas da entidade, o que é altamente considerado na escola. Os registros são documentos organizados com fins de apresentação aos órgãos superiores, suprimindo qualquer anotação relevante sobre eventuais discussões ocorridas nas reuniões. Caracterização do município de Pirassununga Pirassununga oferecia atendimento na educação infantil (EI), ensino fundamental (EF) e educação de jovens e adultos (EJA). Disponibilizava, na zona urbana, oito creches, 19 estabelecimentos municipais de educação infantil (Emei), uma escola municipal de educação infantil e ensino fundamental (Emeief), uma escola municipal de ensino fundamental (EMEF) e um centro integrado de educação infantil (Ciei). As crianças residentes na zona rural do município contavam com três Emeifs. Além disso, a prefeitura cedia professores de educação infantil e ensino fundamental para três instituições filantrópicas e uma Apae. Existiam, ainda, seis salas de ensino supletivo (Suplência I, Termos I e II) mantidas pela prefeitura. Em relação ao ensino superior, funcionavam: a Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo (USP), a Faculdade de Engenharia de Agrimensura de Pirassununga; a Academia da Força Aérea (AFA) e as Faculdades de Educação e Engenharia de Pirassununga – Faculdades Integradas Anhanguera (Fian). Os estabelecimentos públicos de ensino destinados ao atendimento da educação básica totalizavam, em 2004, 51 unidades das quais 28 sob dependência administrativa municipal e 51 sob dependência administrativa estadual. Apenas seis estabelecimentos municipais ofereciam atendimento ao ensino fundamental. Outras 23 unidades atendiam a mesma etapa da educação básica na rede 120 Programa Dinheiro Direto na Escola estadual, representando 73,9% do total de estabelecimentos. Sob a responsabilidade estadual também se encontrava o ensino médio e a educação de jovens e adultos. A oferta de pré-escola pública, por sua vez, está sob a responsabilidade total do município (IBGE, 2004). As matrículas na rede municipal encontravam-se distribuídas conforme o quadro abaixo: Tabela 6 – Pirassununga – Matrículas iniciais na rede municipal Matrículas 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Pré-escola EF 1ª A 4ª séries Educação de jovens e adultos 2.073 414 298 1.966 523 260 1.965 521 230 2.041 832 202 1.896 888 205 1.872 927 185 Fonte: Inep. Constatou-se oscilação na oferta de vagas da pré-escola. De 1999 a 2001, houve um decréscimo de 5,20%. Em 2002, houve um aumento de 103,86%. Em 2003 e 2004, ocorreu uma nova diminuição, agora de 1,26%. No ensino fundamental, as matrículas apresentaram um crescimento constante, de 123,91%, ao longo do período acompanhado por crescimento proporcional nas funções docentes. A respeito da composição das receitas municipais para a educação em 2004, verificou-se que os recursos do Fundef representavam 9,35% do total, enquanto os provenientes do PDDE, 0,02%. Caracterização de rede municipal de ensino O município de Pirassununga não contava com Sistema de Ensino. A estrutura e atribuições da Secretaria Municipal de Educação (SME) em vigor estavam definidas na Lei Complementar nº 9/93, que dispõe sobre a reorganização administrativa da Prefeitura Municipal de Pirassununga. Afora essa lei, apenas um organograma da Secretaria de Educação existente na sede da SME, previa o setores que compunham a Secretaria da Educação, evidenciado o grau de informalidade encontrado na gestão municipal. Estrutura das escolas De acordo com o Regimento Comum das Escolas Municipais em vigor, a estrutura funcional das escolas compreende os seguintes núcleos de atividades: Direção, com diretor e assistente de direção; Apoio Técnico Pedagógico, com multimeios e coordenação pedagógica; Núcleo de Apoio Administrativo, compreendendo as funções de Secretaria e atividades complementares; Assistência Escolar e corpo docente. Programa Dinheiro Direto na Escola 121 Ressalte-se que, apesar de o Regimento datar do ano de 2002, ainda não se encontrava oficializado. Por essa razão, a estrutura prevista não ocorria conforme o prescrito, restringindo-se à presença do assistente de diretor, ao Núcleo de Apoio Administrativo (Secretaria e atividades complementares) e ao Corpo Docente. As escolas não contavam com diretor. As atribuições desse cargo ficavam sob responsabilidade do assistente de direção, cargo criado em 1991 pela Lei Municipal nº 2.152. O assistente de direção atuava em duas ou três escolas, definidas de acordo com designação do secretário. Suas funções eram auxiliadas pelo encarregado do Setor de Educação, que percorria todas as escolas municipais suprindo a ausência do assistente quando era o caso. O cargo de assistente de direção era provido por meio de concurso público, e o de encarregado de setor era um cargo de confiança do prefeito, respondendo pela assistência na administração das escolas e na gestão dos recursos financeiros da educação, como as verbas do PDDE, Fundef, merenda, transporte, etc. Em 1999, ano da implantação do Programa Dinheiro Direto na Escola, apenas as escolas rurais contavam com assistente de direção. No ano de 2000, realizou-se concurso para a contratação de novos assistentes, ocasião em que a escola sede do PDDE, objeto da pesquisa, passou a ter assistente de direção. Também até 1999, as escolas municipais não contavam com nenhum tipo de mecanismo de ação coletiva intra-escolar, como a APM ou os Colegiados Escolares. Naquele ano, em decorrência das exigências colocadas pelo Programa Dinheiro Direto na Escola, criou-se uma APM em uma das escolas, definida como escola-sede de um consórcio interescolar, de maneira a viabilizar o recebimento dos recursos do Programa. Implementação do PDDE Sobre a implantação, de acordo com a Técnica B, o primeiro contato do município com o Programa Dinheiro Direto na Escola ocorreu em 1997, por meio de documentos e materiais enviados pelo MEC à Secretaria Municipal de Educação, os quais tinham por finalidade apresentar o Programa e orientar os procedimentos operacionais para a sua implantação. Em 1998, o MEC promoveu duas reuniões, em cidades vizinhas a Pirassununga, a fim de oferecer para técnicos das Secretarias Municipais de Educação da região esclarecimentos sobre as diretrizes gerais do Programa, elucidar as dúvidas sobre seu funcionamento e apresentar as orientações para o processo de adesão e execução da prestação de contas. Ainda de acordo com a Técnica B e com informações obtidas nos documentos da Secretaria Municipal de Educação, a efetivação do Programa no município ocorreu em 1999, por meio de um consórcio entre cinco escolas municipais, situação que será detalhada no próximo item. Entre as primeiras medidas para a implantação do Programa, destaca-se a constituição da unidade executora. A Secretaria Municipal de Educação definiu a APM para figurar como UEx na unidade escolar. O secretário Municipal de Educação "A" do período em foco (1999) destacou que a opção pela APM se deu em função das orientações fornecidas pelo Programa e por se configurar como uma 122 Programa Dinheiro Direto na Escola associação jurídica, característica necessária para a realização das ações propostas nos moldes do Programa. Como decorrência, em 29/5/1999, a SME instituiu o Estatuto Padrão das APMs. Definido o estatuto da UEx, procedeu-se a sua constituição na única escola municipal de ensino fundamental (Emef) da zona urbana, criada no ano anterior (1998), que apresentava o número de alunos suficiente para receber os repasses do PDDE, constituindo-se a UEx. Com relação à gestão do PDDE no município, o recurso foi recebido pela primeira vez em 1999. A UEx definida para o recebimento e administração dessa verba foi a APM da Emef, com a qual havia sido firmado o convênio na modalidade de consórcio. Na época, a escola contava com 214 alunos. O consórcio foi constituído pela escola-sede38, uma Emeief e mais três escolas da zona rural, também Emeiefs. Segundo uma das técnicas entrevistadas, o processo de constituição da APM da escola sede contou com a orientação do então secretário Municipal de Educação "A", do encarregado do Setor de Educação do período e com técnicos da SME. Por não dispor de diretor e tampouco de assistente de direção, as funções desse cargo eram desempenhadas pela encarregada do Setor da Educação. É importante esclarecer que o Estatuto Padrão da APM adotado pelas escolas municipais de Pirassununga (1999) define o diretor como membro nato da Associação. Nesse caso, a secretária administrativa do Setor de Educação, orientada pelo secretário Municipal de Educação em exercício, assumiu formalmente o cargo de assistente de direção, tendo em vista a necessidade de efetivar a composição dos membros natos exigidos pelo estatuto, com a finalidade de completar o quadro necessário para a oficialização da Associação na escola. Segundo o Estatuto Padrão das APMs, a participação dos segmentos da comunidade escolar em seu Conselho Deliberativo deveria respeitar a seguinte proporção: 30% dos membros deveriam ser professores; 40%, pais de alunos; 20%, alunos (maiores de 18 anos, mesmo a escola não os possuindo); e 10%, sócios admitidos. Assumiu a presidência do Conselho Deliberativo uma das escriturárias da Secretaria Municipal de Educação, conforme verificado na ata de constituição da APM. Observou-se, dada a composição real da APM, o distanciamento entre o previsto no Estatuto Padrão e o materializado na escola. O primeiro repasse dos recursos (1999) foi depositado em uma conta da prefeitura municipal e, posteriormente, repassado à UEx da escola-sede do consórcio. Segundo o Setor de Contabilidade da Prefeitura, o valor foi de R$ 3.200,00. Conforme uma das técnicas, responsável pelas finanças da Secretaria Municipal de Educação, essa verba foi destinada à pintura das unidades escolares. De acordo com o secretário Municipal de Educação que atuava em 1999, tal decorreu de orientações da SME às assistentes de direção das escolas consorciadas, no sentido de priorizar as "questões de maior necessidade". 38 Apesar de essa escola ser a única Emef, ou seja, a única a atender exclusivamente alunos do ensino fundamental, havia outra escola, também na zona urbana, que atendia a essa modalidade. Entretanto, tratava-se de uma Emei que, já naquele período, vinha gradativamente incorporando salas de ensino fundamental, configurando-se como uma Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental (Emeief), mas ainda com número de alunos insuficiente para compor uma APM própria. Programa Dinheiro Direto na Escola 123 A implementação do PDDE não transcorreu sem percalços no que tange à aplicação de verbas e à prestação de contas. Depois do recebimento dos recursos pela primeira vez, em 1999, nos anos seguintes, houve uma série de dificuldades enfrentadas para manutenção do Programa. Em 2001, primeiro ano de uma nova gestão no município, por decisão do novo Secretário Municipal de Educação, não houve solicitação dos recursos ao FNDE, uma vez que, segundo uma das técnicas entrevistadas, o novo governo considerou os procedimentos exigidos pelo Programa por demais trabalhosos se comparados ao montante a ser recebido. No ano de 2002, a situação foi diferente. De acordo com a técnica do Setor de Contabilidade, somente a partir desse ano, as escolas municipais consorciadas passaram a receber os recursos diretamente na conta da APM da escola-sede. Com isso, passaram também a ficar responsáveis pela prestação de contas do PDDE, encaminhando-a diretamente ao FNDE. A partir de então, os documentos relativos à composição dos gastos do PDDE efetuados pelas escolas passaram a ser inteiramente de responsabilidade da APM da escola sede. Em 2002, o montante foi de R$ 6.500,00. Houve, no entanto, dificuldades no recebimento dos recursos referentes a 2002. As contas prestadas em 1999 continham irregularidades, e, até que essas fossem resolvidas, os recursos foram suspensos. Por diversas vezes, as escolas refizeram as contas e enviaram-nas ao FNDE, contando com o auxílio de profissionais do Setor de Contabilidade da prefeitura, que contribuíram na organização da prestação de contas. O problema, segundo a assistente de direção da escolasede, referia-se à reserva de CPMF que deveria ter sido feita. Somente após a regularização referente a 1999, os recursos do ano de 2002 foram liberados, e as escolas puderam efetuar a compra de diversos materiais. Em 2003, novamente não houve a solicitação de recursos. Segundo o depoimento do Secretário de Educação em exercício, o repasse não ocorreu em decorrência de problemas com a prestação de contas do ano anterior. Tal afirmação, entretanto, não se confirma, uma vez que a prestação de contas de 2002 havia sido aprovada, conforme a informação que nos foi relatada pelo próprio Setor de Contabilidade. Havia a hipótese de que os recursos não tinham vindo em decorrência da perda do prazo de solicitação. Vale relembrar que, em 2003, o município atravessava uma crise política em que o prefeito era processado por improbidade administrativa com relação à má utilização dos recursos públicos da educação, conforme já apontado. Em 2004, os procedimentos para requisição e gastos transcorreram sem que houvesse problemas. O processo de implementação do PDDE no município foi marcado por uma série de dificuldades, especialmente, como foi registrado, no que diz respeito à prestação de contas. Tal situação levou o chefe de Contabilidade da prefeitura municipal a deduzir que, se o setor pelo qual era responsável tivesse maior capacidade de ingerência nas decisões tomadas na escola, seriam menores os problemas. Como responsável por organizar a prestação de contas e encaminhá-las ao FNDE entre 1999 e 2000, em seu depoimento reivindicava, primeiramente, informações mais detalhadas sobre o funcionamento do Programa. Em segundo lugar, reivindicava a participação também no planejamento para o gasto dessa verba, de maneira a facilitar a assessoria técnica necessária e atender aos trâmites burocráticos exigidos na prestação de contas. 124 Programa Dinheiro Direto na Escola Caracterização da escola municipal – Consórcio O Programa exigia, para o repasse de recursos direto às escolas que possuíssem entre 21 e 99 alunos, a organização de um consórcio. Este seria composto por um conjunto de escolas de uma mesma rede, que receberiam os recursos por meio da UEx de uma delas, a escola-sede (Resolução/CD/FNDE nº 3 de 27 de fevereiro de 2003). A escola-sede para o PDDE foi criada pelo Decreto nº 2.087, de 13 de março de 1998 (Pirassununga, 1998). No município de Pirassununga, o convênio foi firmado por meio de consórcio entre a escola municipal de ensino fundamental e as escolas municipais de educação infantil e ensino fundamental urbanas e rurais da rede municipal de ensino, contabilizando um total de cinco unidades representadas por uma única UEx a fim de receberem os recursos do PDDE. Essa UEx, conforme indicado anteriormente, foi sediada na Emef, sob a forma de uma Associação de Pais e Mestres. Até o ano de 2003, apenas as escolas consorciadas recebiam os recursos do convênio, ou seja, uma Emef, uma Emeief, ambas da zona urbana e três Emeiefs da zona rural. A partir de 2004, a Emeief-urbana, até então no consórcio, atingiu o número de alunos suficientes para compor a sua própria APM e continuar a receber os recursos do PDDE autonomamente. Também em 2004, outra Emeief, uma escola que havia sido municipalizada em 2001, constituiu APM e aderiu ao Programa após ter atingido o número de alunos indicado para tal. Até 2003, eram cinco as escolas conveniadas. Em 2004, duas escolas municipalizadas passaram a ter unidades executoras próprias e quatro mantiveram-se no consórcio. O processo de criação da APM foi relatado pela professora entrevistada que a integrou como diretora Financeira: [...] veio uma verba, a escola era nova, aí precisou abrir a APM para que a gente pudesse receber a verba. Então, aí, nós fizemos uma reunião e abrimos a APM. [...] Nós fomos convidadas. Fizemos uma reunião com o secretário da Educação, a encarregada de setor e com a secretária administrativa. A secretária administrativa ficou como presidente, e eu junto com ela. Então, ficamos eu e ela nos dois primeiros anos. Nós penamos bastante, porque nós só conhecíamos, assim, mas nunca tínhamos feito nada na APM. (Entrevistada B – entrevista realizada por Rochelle Pegoraro) (sic). A entrevistada acrescentou que a maior dificuldade para constituição da APM foi totalizar a sua composição, em virtude da relutância dos pais em integrála. Finalmente, em 29/5/99, a APM da escola sede foi constituída. Na tentativa de solucionar os problemas de falta de informação sobre os procedimentos do Programa, as assistentes de direção das escolas consorciadas e algumas professoras buscaram material em escolas estaduais, chegando muitas vezes a entrar em contato com a assessoria do Programa em Brasília. De acordo com a professora a orientação da SME foi que tinha que gastar a verba, e nós não sabíamos o que podia comprar, o que não podia. Aí, como eu trabalho [no cargo de professora] no Estado, eu fui atrás pedir para o diretor [da escola estadual onde leciona] que me desse um caderninho [informativo]. Aí, eu xeroquei, porque nós não recebemos nada. Com o caderninho, Programa Dinheiro Direto na Escola 125 eu e a presidente da APM estudamos o que nós podíamos gastar. Ela ligou para Brasília também muitas vezes. Ela ligava bastante. Ela era muito interessada nessa parte, e, aí, a gente, quer dizer, foi aprendendo assim (...). (Entrevistada B – entrevista concedida à Rochelle Pegoraro) (sic). Na época da prestação de contas, as assistentes das escolas consorciadas reuniram-se a fim de preencher os formulários em conjunto e esclarecer eventuais dúvidas. As Emeifs explicitam uma peculiaridade do Programa. Uma vez que atendem, além do ensino fundamental, à educação infantil, verifica-se que estudantes matriculados em outro nível da educação básica (educação infantil) usufruem dos resultados advindos dos recursos repassados pelo PDDE. Em 2004, o total de estudantes da educação infantil que se encontravam nessa situação era de 131. Durante os anos de 1999 a 2004, houve um aumento progressivo nas matrículas do EF municipal, saltando de 414 para 927 alunos, condição que resultou em ampliação no montante de recursos tornados disponíveis pelo Programa. A tabela a seguir demonstra o movimento do PDDE no município ao indicar informações sobre o repasse de recursos no período, os valores, as opções de gasto, bem como a situação com relação à prestação de contas. Tabela 7 – Pirassununga – Repasse dos recursos do PDDE entre 1999 e 2004 Ano Condições Valores Valores por do convênio totais (R$) alunos (R$) 1999 Sim 3.200,00 7,72 2000 Não 2.600,00 6,19 2002 Sim 6.500,00 12,47 2003 2004 Sim 10.111,90 10,90 2001 Aquisições Prestação de contas Pintura das escolas Aprovada associadas. Serviços, acessórios de Aprovada informática, material pedagógico (papel, cola, etc.) Não houve solicitação do Programa. Computador, Cds, chuveiros, Em diligência tomadas, relógios de parede, e posteriormente câmera fotográfica, cadeira, aprovada escrivaninha, caixa de som, microfone, amplificador, bebedouro e ventiladores. Uniformes Aprovada Fonte: Setor de Contabilidade e Secretaria Municipal de Educação. Os recursos repassados pelo PDDE aumentaram substancialmente entre 1999 e 2004 devido ao aumento de matrículas. Também se tornaram mais diversificadas as aquisições efetuadas. Observe-se que, no primeiro ano (1999), todas as escolas consorciadas utilizaram os recursos em uma única atividade, a pintura dos prédios. Naquele momento, a ingerência do secretário de Educação 126 Programa Dinheiro Direto na Escola sobre a utilização dos recursos foi acentuada. Nos anos seguintes, as compras foram mais centradas em recursos para o desenvolvimento do trabalho pedagógico e equipamentos que visavam à ampliação do bem-estar de estudantes e profissionais (ventiladores, bebedouros, chuveiros). Os gastos efetuados foram arrolados sem discriminação por escola, uma vez que a prestação de contas não forneceu informações desmembradas, referindo-se ao total de gastos registrados pela UEx. Cada escola conveniada recebeu parte dos materiais, conforme decisão prévia tomada entre a direção da escola, professores, membros da APM e pais de alunos. O depoimento de uma professora fornece indícios sobre o processo vivenciado: [...] a gente se reunia, os professores passavam um papel com o que queriam gastar, [a gente] fazia uma reunião com os pais, via o que era mais viável e, inclusive, vamos supor, se a gente faz uma festa junina, a gente já sabe onde vai gastar. Gastamos em bebedouro, bastantes coisinhas para a escola, as crianças não tinham bebedouro, compramos outras coisas aí, que precisávamos, menores, tesoura de picotar, umas coisinhas que a escola estava precisando... Da verba, nós compramos um computador, que nós não tínhamos na escola, uma impressora, uma máquina digital, que a gente gasta muito com revelação de filme quando a gente queria fazer os projetos, então, nós compramos uma máquina digital, um amplificador e uma impressora, tudo com a verba. (...) Todos os professores decidem, não só os da APM (...), apesar de que eles são poucos, todos quase têm que entrar, todo mundo dá opinião vê o que é mais viável que a escola precisa e compra. (Entrevista de professora da rede municipal da escola sede, realizada por Rochelle Pegoraro em 2004) (sic). O depoimento revela uma avaliação positiva por parte da professora em função do impacto positivo dos recursos sobre as necessidades da escola e da possibilidade de os professores decidirem em que gastá-los. Ainda segundo o depoimento, há uma ampliação na participação dos docentes em relação às decisões referentes ao uso de recursos, no entanto, são poucas as referências à participação dos usuários no processo (Pegoraro, 2004). A exclusão do segmento dos pais nos processos decisórios relativos ao uso dos recursos é confirmada por todos os depoimentos. A APM analisada não foge à regra encontrada nas escolas do Estado em que, na melhor das hipóteses, os pais são informados sobre as decisões tomadas pelos educadores. Para os agentes do Sistema, o nível de informação era um pouco maior, talvez pelo fato de estarem envolvidos diretamente com o processo que antecedeu a implantação do Programa e também por terem participado de encontros que esclareciam os procedimentos para recebimento dos recursos e prestação de contas. Ainda assim, registramos a presença de muitas dúvidas. Considerações finais As informações obtidas na rede municipal de Pirassununga e na rede estadual levam-nos a considerar alguns aspectos a respeito da implementação do PDDE em redes distintas. Enquanto na rede municipal o Programa foi responsável pela criação das Associações de Pais e Mestres como UEx, na rede estadual, sua Programa Dinheiro Direto na Escola 127 implantação ocorreu em um contexto diverso, uma vez que as APMs já recebiam recursos e os executavam com regularidade. É necessário observar que, na rede estadual de ensino, a política da Secretaria de Estado da Educação privilegiava desde a primeira gestão do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) a descentralização de recursos para as UEx. Observou-se que, na rede municipal pesquisada, o PDDE foi implantado em um quadro de escassez de informações e precárias condições operacionais. Tal situação criou diversos problemas na utilização dos recursos. Os níveis de informação entre todos os entrevistados podem ser considerados inferiores ao necessário, pois afirmavam que se tratava de uma "verba que viria para a escola" e poderia ser utilizada mediante instruções legais, mas não conseguiam explicar a natureza do Programa. O PDDE, entretanto, no município de Pirassununga, em face da precariedade para sua consecução, acabou por auxiliar na configuração e formalização das APMs como UEx, indicando o potencial indutor do Programa na institucionalização da rede no que diz respeito à sua organização e à produção de instrumentos para normalização de seu funcionamento. Tal observação sugere a potencialidade do Programa em municípios de pequeno porte como o estudado, mas também oferece indícios sobre as possíveis dificuldades de administrações municipais na criação e normalização de suas redes de ensino. As diferenças nas duas redes, no entanto, não ocultam que Programa contribui para o estabelecimento de um padrão de relacionamento entre gestores do sistema, profissionais da escola e comunidade usuária, pautado pela dimensão técnico-operacional, em detrimento da dimensão política da gestão escolar. Não há, no conjunto de informações produzidas pelo FNDE e reelaboradas, por exemplo, na esfera estadual, algo que retrate a preocupação com a democratização da gestão e com a participação da comunidade usuária nos processos decisórios para a execução de recursos. Todas as orientações, escritas ou verbais, restringem-se à correta utilização de recursos e prestação de contas. Finalmente, os dados, sobretudo os coletados em Pirassununga, permitem contrapor a suposta autonomia que o PDDE tenderia a proporcionar às escolas, por meio da atividade das UExs, à dependência das decisões tomadas no âmbito das Secretarias da Educação, uma vez que, por dois anos seguidos, a decisão do secretário de Educação de não firmar o convênio impediu as escolas de receberem os recursos As resoluções sobre recursos, quando tomadas pela APM, produzem, no mínimo, uma separação entre esta e o Conselho de Escola. "Tal situação acaba por criar, na melhor das hipóteses, uma sobreposição de decisões, quando não, um esvaziamento dos Conselhos de Escola, uma vez que a instância responsável pela gestão dos recursos financeiros possui uma posição de destaque em qualquer processo decisório" (Adrião, Garcia, 2003, p. 6). Registre-se ainda que a contribuição para o enfraquecimento do Conselho de Escola se encontra na própria origem da APM. Trata-se de um órgão auxiliar da direção escolar que tem no diretor um membro importante, uma vez que é presidente nato de seu Conselho Deliberativo (São Paulo, Estatuto Padrão, art. 16, 1978, 2004), 128 Programa Dinheiro Direto na Escola Contrapondo o que dizem os gestores quanto ao que é verificado na escola, podemos afirmar que, não apenas pela orientação da SEE em relação ao destino dos recursos ou pelo fato de os recursos da SEE estarem sendo substituídos pela verba suplementar, mas também pelo papel central da direção escolar no encaminhamento do processo, as noções de autonomia e participação mencionadas merecem ser analisadas mais detidamente. O fato de a escola contar com uma UEx e receber dela doações (todos os bens adquiridos pela APM são doados e patrimoniados pelo poder público) não parece representar ampliação da participação ou tratamento coletivo no processo de tomada de decisões relativas aos recursos e ao projeto pedagógico. Vale ressaltar que o modo pelo qual o PDDE foi implantado no caso paulista parece reforçar a estrutura pouco permeável à participação de pais e alunos que tem caracterizado nossas escolas. Explica, ainda, por que a implantação do PDDE, segundo os entrevistados no âmbito do Sistema, causou poucos transtornos ao funcionamento das escolas, uma vez que a trajetória das APMs as fazia se configurarem como unidades executoras sob a tutela do diretor escolar. 3.5 Estado do Rio Grande do Sul Implementação do PDDE No entendimento da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul de 1989 a gestão democrática da educação é constituída por três fatores: a instituição do Conselho Escolar, a realização da eleição direta e uninominal para diretor e a autonomia escolar (administrativa, pedagógica e financeira). A Lei nº 10.576 de 199539 regulamenta a gestão democrática do ensino público na rede estadual de educação, juntamente com as alterações da Lei nº 11.304 de 1999 e da Lei nº 11.695 de 2001 e teve como princípios: a autonomia dos estabelecimentos de ensino na gestão administrativa, financeira e pedagógica; a livre organização e a participação dos segmentos da comunidade escolar nos processos decisórios e em órgãos colegiados; a transparência dos mecanismos administrativos, financeiros e pedagógicos; a garantia da descentralização do processo educacional e a valorização dos profissionais da educação. Em 1999 foi promulgada a primeira alteração da Lei de Gestão Democrática (10.576/95), no governo Olívio Dutra40. A Lei nº 11.304, de 14 de janeiro de 1999, somente alterava a eleição para diretor. Neste mesmo ano foi desencadeado o processo denominado "Constituinte Escolar"41, que foi o instrumento para a 39 Essa Lei foi promulgada no governo Antônio Britto, eleito em 1994 pelo PMDB. Eleito pela Frente Popular em 1998, integrando partidos como o PT, PCdoB, PCB, PSB e PDT. 41 A Constituinte Escolar chamou a comunidade escolar para repensar a escola, esse processo foi organizado em cinco momentos: elaboração da proposta, sensibilização e lançamento da Constituinte; estudo da realidade regional contextualizada; aprofundamento dos temas e temáticas levantados em um segundo momento; definição dos princípios e diretrizes da Escola Democrática e Popular; e materialização dos mesmos, na perspectiva de reconstrução dos Projetos Político-Pedagógicos, Regimentos Escolares e Planos de Estudos (Ibidem). 40 Programa Dinheiro Direto na Escola 129 construção da democracia participativa do governo do Estado do Rio Grande do Sul para a área de educação (Camini, 2002). Nas discussões em relação à gestão democrática da educação, mais especificamente sobre a gestão financeira da escola, realizadas durante o processo Constituinte, ficou acordado entre os participantes que a unidade executora seria o Conselho Escolar. Em paralelo a este processo foi instituído um grupo, mais conhecido como "Comissão Paritária", para a reformulação do texto legal da Lei de Gestão Democrática, composto pela União Gaúcha dos Estudantes Secundaristas (Uges), pela Associação de Círculo de Pais e Mestres (ACPM/Federação), pelo Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS/Sindicato) e pela Secretaria de Educação (Camini, 2002). O resultado dessas discussões foi mandado à Assembléia Legislativa em agosto de 1999. O Projeto de Lei propunha, no que diz respeito à parte financeira das escolas, que o Conselho Escolar fosse o co-responsável pela gestão dos recursos financeiros. No entanto, o governo acabou retirando esse Projeto da pauta da Assembléia Legislativa por meio da apresentação de inúmeras propostas de emendas, as quais descaracterizavam o projeto proposto. Em 2000-2001 o grupo de trabalho retornou as discussões sobre a Lei nº 10.576/95 e, nesse período, foi encaminhada a proposta da Constituinte Escolar, incorporada pela Secretaria de Educação, de tornar o Conselho Escolar uma unidade executora, ou seja, uma entidade de direito privado sem fins lucrativos, a fim de receber os recursos financeiros advindos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE). O Conselho Escolar, assumiria o papel até então do Círculo de Pais e Mestres (CPM) de ordenador de despesas, dividindo a responsabilidade da gestão dos recursos financeiros com o diretor da escola. No entanto, a ACPM e o CPERS depois de consultar os demais membros das suas entidades, se opuseram a essa proposta. A posição da ACPM/Federação era fortalecer o CPM como unidade executora da escola. Na opinião de seus representantes o PDDE está conseguindo aproximar a sociedade da discussão dos recursos fazendo com que essa seja chamada para opinar nas decisões tomadas pela escola. O sindicato dos servidores da rede estadual de ensino, o CPERS, viveu um grande dilema para a escolha da unidade executora. O CPERS/Sindicato, preocupado com a consolidação da eleição dos diretores, não tinha o PDDE como prioridade em sua pauta até a convocação para a Comissão Paritária. A possibilidade de o Conselho Escolar tornar-se uma unidade executora foi vista sobre duas perspectivas pelo CPERS. A primeira seria o fortalecimento da gestão democrática dentro da escola, dando muito mais autonomia ao Conselho. A segunda perspectiva, gerou um dilema, onde o mesmo organismo que garantiria a gestão democrática na escola estaria se tornando uma entidade de direito privado, podendo futuramente dar espaço a um processo de privatização das escolas públicas (Lazarotto, 2003). Dessa forma, o CPERS manifestou-se contra o Conselho Escolar como unidade executora, pois acreditava que esta constituía uma ameaça ao caráter público da escola apoiando, assim, o CPM como a unidade executora das escolas da rede estadual. A Uges e a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) ausentaram-se das reuniões sem expor suas opiniões a respeito. 130 Programa Dinheiro Direto na Escola A Secretaria de Educação manteve a sua opção de tornar o Conselho Escolar a unidade executora, legitimando a diretriz decidida na Constituinte. Para isso, argumentou que o Conselho, sendo um organismo da escola, estaria sob a esfera do controle público. Além disso, o objetivo da Secretaria era fortalecer a gestão democrática, apoiando o Conselho Escolar como ordenador de despesas, ou seja, a unidade executora. Em 10 de dezembro de 2001, é promulgada a Lei nº 11.695, que altera a Lei nº 10.576/1995, dispondo sobre a Gestão Democrática do Ensino Público. Segundo essa lei a unidade executora da rede estadual passa a ser o Círculo de Pais e Mestres, responsável pelo recebimento e a administração dos recursos financeiros advindos do PDDE (Rio Grande do Sul, 2001). Segundo Marlene Schuck (2003), técnica do Departamento de Planejamento (Deplan), responsável pela administração do PDDE na rede estadual de ensino "[...] o Conselho Escolar como unidade executora obteria uma maior funcionalidade política na gestão escolar, além de ser um órgão representativo de todos os segmentos escolares". E, também, segundo Inajara Ferreira (2002), coordenadora da Assessoria Jurídica da Secretaria de Educação: [...] a proposta da personalidade jurídica para o Conselho Escolar era com o intuito de garantir uma qualidade maior pra escola através da autonomia financeira que era centralizado nesse processo de mudança, porque permitiria que o recurso fosse gasto de acordo com as necessidades efetivas das escolas [...] (sic). Segundo Raul Gomes de Oliveira Filho, ex-presidente do ACPM/Federação, o PDDE começou a ser discutido no Rio Grande do Sul em 1994, quando os representantes dos Círculos de Pais e Mestres propuseram ao então ministro da Educação, que houvesse repasses que fossem geridos pela comunidade, afinal, o CPM tinha consciência das reais necessidades de cada escola. (Oliveira Filho, 2003). Em 1997, com a obrigatoriedade das unidades executoras, o CPM obtinha grandes chances de assumir esse papel, pois era uma entidade civil de direito privado, porém, nessa época, muitos Círculos de Pais e Mestres estavam desestruturados politicamente e inadimplentes em relação a impostos e situação fiscal, fato que impediu o cadastramento imediato desses como unidades executoras (Oliveira Filho, 2003; Souza, 2003). Nós entramos em contato com o Ministério da Educação, levamos o quadro geral do Rio Grande do Sul, onde os CPMs tinham como maior entrave a questão de não estar em dia com o Imposto de Renda [...]. Viajamos para Brasília e tivemos contato com o Ministério da Educação que emitiu uma outra resolução tomando para si o encargo de 96, 97 e 98, os CPMs simplesmente enviariam um ofício ao Ministério da Educação dizendo que estavam em plena atividade e o Ministério da Educação, juntamente com o Ministério da Fazenda regularizariam essa situação [...]. (Oliveira Filho, 2003) Visto a necessidade que alguns CPMs tinham de se adaptar à nova estrutura, foi elaborado um Manual, em conjunto com a Secretaria de Educação, para Programa Dinheiro Direto na Escola 131 orientar como e onde a verba deveria e poderia ser utilizada, e de que forma se dá a gestão e a fiscalização dessa utilização. Para Oliveira Filho (2003) "[...] os Conselhos Escolares têm representação até o portão da escola saindo fora do portão da escola o Conselho Escolar não representa qualquer segmento [...]" (sic), sendo assim quem representaria melhor a escola "fora dos portões" seria o CPM. Esse posicionamento demonstra certo receio da ACPM em relação à perda de poder no interior da escola. Amostra estadual: escola "A" Fica localizada na região norte em uma das áreas divisas e fronteiras da ocupação urbana de Porto Alegre e apresenta um baixo poder aquisitivo da população moradora, grande contingente de pessoas recém-chegadas de localidades do interior do Estado, ausência de equipamentos urbanos, como praças, sistema de transporte coletivo no interior das vilas e iluminação pública, etc. A Escola "A" atende às modalidades educação infantil (pré-escola), ensino fundamental, ensino médio e Curso Técnico em Contabilidade (pós-médio). Segundo o diretor, atualmente, a escola possui um total de 71 professores e 11 funcionários trabalhando. O número de matriculas no ano de 2004 foi: 40 na educação infantil, 428 no ensino fundamental, 566 no ensino médio e 41 no ensino técnico (pós-médio) dando um total 1.023 alunos regularmente matriculados. A gestão financeira dos recursos obtidos por meio do Círculo de Pais e Mestres (CPM) e do montante repassado pelo programa PDDE/FNDE resulta das decisões da tesouraria do CPM em conjunto com a Direção e o Conselho Escolar. Durante o ano de 2004, o CPM, enquanto instituição, não vinha promovendo reuniões periódicas, ficando, assim, a destinação da verba do Programa Dinheiro Direto na Escola ao encargo da decisão da direção, do Conselho Escolar e de alguns membros do Círculo de Pais e Mestres atuantes. Os segmentos escolares entrevistados, com exceção de direção e professores, pouco ou nada sabiam sobre o PDDE. A mãe de aluno, tesoureira do CPM, a aluna presidente do CE e o funcionário da escola, membro do CE ficaram sabendo da necessidade do recebimento de "um dinheiro do FNDE" – como se referem o PDDE/FNDE – via Circulo de Pais e Mestres. Ainda assim, ao serem indagados sobre o conhecimento de expressões como Programa Dinheiro Direto na Escola e Gestão Democrática do Ensino Público, os entrevistados dos segmentos de alunos, pais e funcionários não lembravam de terem ouvido falar sobre esses elementos em reuniões ou no cotidiano da escola. Por sua vez, os segmentos entrevistados que tinham conhecimento do PDDE/FNDE –- professores e direção –, nada tinham a reclamar ou acrescentar, ressaltando que o Programa é bem visto, assim como toda e qualquer verba que a escola recebe. A sugestão feita por parte da professora atuante na tesouraria do Círculo de Pais e Mestres indicava que não havia necessidade de o dinheiro passar pelo CPM, podendo ser transferido diretamente à escola, como o restante dos repasses. 132 Programa Dinheiro Direto na Escola Pela pesquisa, percebemos a aceitação da estrutura organizada e definida pelo Estado para manejar os recursos como PDDE/FNDE na escola da parte do diretor, uma vez que esse realiza ações no sentido de promover a constituição dos órgãos de "representação comunitária", no caso, o Conselho Escolar e o Círculo de Pais e Mestres. Este, por sua vez, vem passando atualmente por problemas de articulação entre os segmentos da comunidade escolar, sendo que não houve, em 2005, até o presente momento, reuniões oficiais do Círculo de Pais e Mestres da escola. Na conjuntura atual, essas pessoas obrigam-se a discutir mecanismos de manutenção da escola por meio de seu próprio trabalho de reflexão, invenção e criação de estratégias de captação de recursos. Assim, grande parte do momento de encontro entre as pessoas do segmento escolar tornou-se destinado à discussão de maneiras de se captarem recursos. Tabela 1 – Sistematização dos dados financeiros da escola "A" – 2003-2004 Recursos recebidos pelo PDDE Ano FNDE via COM Outros recursos recebidos da administração pública e geridos pela unidade executora Recursos gerados Repasse pela própria escola Merenda Autonomia (bingos, festas, Financeira doações, etc.) 2003 4.500,00 15.507,20 29.812,94 2004 2.884,60 6.079,32 44.029,08 2.221,30 2.800,00 Total Total de recursos administrados pela escola 51.372,14 55.793,00 52.041,44 55.793,00 Fonte: Escola “A”. A tabela não está completa, pois nem todos os valores foram informados pela escola. Não havia registros organizados do período anterior a 2003 para todos os dados. O PDDE, em 2003, representou 9% do total de recursos administrados pela escola e 15% do repasse financeiro da Secretaria de Educação. Em 2004, esses porcentuais diminuem devido à redução dos recursos do PDDE. A Escola recebeu42 um montante de R$ 2.884,60 no mês de outubro de 2004, relativo ao repasse do PDDE/FNDE, sendo que, nos anos anteriores, recebia R$ 4.500,00. O motivo da diferença de recursos não foi explicado pela escola nas entrevistas, já que permaneceu na mesma faixa em todo o período. Em 2004, os porcentuais citados acima diminuem indo para 5% e 17%, respectivamente. Segundo a professora responsável pelo Departamento Financeiro43, o montante do PDDE foi dividido em gastos permanentes (capital) e gastos com manutenção (custeio), sendo R$ 576,92 para os gastos permanentes e R$ 2.307,68 para os gastos de manutenção – compra dos ventiladores e manutenção da rede elétrica, anteriormente citados. 42 Segundo dados fornecidos pela primeira tesoureira do COM, em 2004, e pela professora responsável pelo Departamento Financeiro da escola. 43 A professora desempenha funções no Departamento Financeiro da escola desde o início do ano letivo de 2004. É professora de Biologia e trabalha na escola há seis anos. Programa Dinheiro Direto na Escola 133 A escola, juntamente com o CPM, faz campanhas de arrecadação de dinheiro em diferentes atividades, tais como: bingos, festas, rifas, lanches vendidos na escola, etc. Os valores arrecadados nessas atividades (Tabela 1), conforme as entrevistadas, foram utilizados para a construção de um "Galpão Crioulo" no estilo Centro de Tradições Gaúchas (CTG), utilizado para atividades culturais e demais atividades na escola, como as próprias reuniões do Conselho Escolar. Segundo a tesoureira e a presidente do Conselho, indagadas nas entrevistas sobre obtenção de recursos e sua utilização, a escola recebeu doações de materiais de construção (madeiramento e outros) da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE/RS). No final do primeiro semestre de 2005, foi realizada nova eleição para o Conselho Escolar na escola investigada. Nesse processo eleitoral, envolveram-se professores, pais, alunos e a diretoria da escola. A eleição foi nomeada na última reunião do Conselho como "eleição tapa buraco". Ela tem como função garantir a ocupação por indivíduos eleitos dos cargos – secretário, vice-presidente e outros – que haviam ficado vagos no Conselho devido ao "descompromisso" (palavra utilizada pelos presentes nas reuniões do Conselho Escolar) das pessoas anteriormente eleitas. Esses indivíduos eleitos, apresentados em reunião (início do mês de agosto), ocuparão os cargos até o final do ano de 2005, quando deve ser realizada nova eleição para o ano escolar seguinte. Implementação do PDDE Anteriormente ao processo de implementação do PDDE, o município de Porto Alegre vinha promovendo a descentralização financeira como parte de seu projeto de gestão democrática da educação, o qual, desde 1989, tem avançado na concepção de um planejamento e orçamento participativos, tanto da cidade quanto da instituição escolar. Em 1996 a Secretaria Municipal de Educação (Smed) viabiliza o aperfeiçoamento na descentralização financeira, com a implantação do Sistema de Crédito Escolar Trimestral, que repassava recursos diferenciados de acordo com a característica de cada escola. Esse processo foi construído juntamente com os Conselhos Escolares44. A comunidade escolar, representada pelos segmentos do Conselho Escolar (pais, professores, alunos e funcionários), torna-se habilitada para gerir seus recursos financeiros, passando a ter conta própria, com o CNPJ da prefeitura, para gerir o Repasse Trimestral de Recursos. Durante esse processo de descentralização programática e físico-financeira dos recursos, o governo municipal foi surpreendido, pela Resolução nº 3, de março de 1997, MEC/FNDE, que passava a transferir recursos da União diretamente às unidades executoras, mas com a exigência de Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) próprio e não mais da prefeitura municipal, o que transforma a unidade executora em entidade de direito privado. Inicia-se então uma batalha jurídica travada no governo municipal para a transformação dos Conselhos Escolares em unidades executoras, conforme exigência do MEC. 44 O Conselho Escolar foi criado pela Lei Complementar nº 292/93. 134 Programa Dinheiro Direto na Escola Em fevereiro de 1996, a Secretaria Municipal de Educação fez uma consulta à Procuradoria Geral do Município45 sobre a viabilidade do "repasse de verbas públicas aos Conselhos Escolares disciplinados na LC nº 292/9346, como forma de aplicabilidade do disposto no § 2º, art. 183, LOM47, que assegura autonomia de gestão financeira às escolas públicas municipais". O que conforme a Secretaria é inviável, já que o "repasse pressupõe personalidade e capacidade jurídica do recebedor, características inexistentes nos Conselhos Escolares, órgãos de cooperação governamental e de auxílio à administração" (Porto Alegre, PGE, 1996). O parecer da procuradora do município, Ana Cristina Tópor, em resposta à consulta da Smed é de "não ser possível, juridicamente, os Conselhos Escolares receberem e gerenciarem verbas públicas, sejam elas repassadas pelo Município, sejam elas repassadas pelo MEC" (Tópor, 1996) tendo em vista que: a Lei nº 4.320/64 aboliu a transferência de "verbas públicas" e adotou a expressão dotação e créditos orçamentários, o que faz com que o recebedor tenha que ter personalidade jurídica, que é a "aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, e assumir o compromisso da prestação de contas. A pessoa jurídica, neste sentido poderia receber e gerenciar verbas públicas" (Tópor, 1996). Mas, conforme o Parecer, a questão é se os Conselhos Escolares podem ser considerados pessoas jurídicas. Após citação do que caracterizaria a pessoa jurídica, a procuradora conclui que os Conselhos Escolares: [...] não se coadunam, s.m.j., com a natureza de pessoa jurídica, eis faltar-lhes, no modo de constituição, a manifestação de vontade exclusiva dos membros, nos atos praticados para esse fim, uma vez que todo o processo de criação desses órgãos já se encontra minudentemente disciplinado por lei municipal, bem como suas atribuições e finalidades, restando aos eleitos somente a submissão às normas da LC nº 292/93. Os membros ou sócios, se fosse realmente uma associação, só atingem esse status através de processo eletivo, também esse orientado pela norma municipal, o que força à conclusão que só a manifestação de vontade dos mesmos não basta para a constituição do colegiado. Assim sendo, tais conselhos não preenchem o terceiro elemento caracterizador da pessoa jurídica, enumerada pela doutrina citada, qual seja, a capacidade jurídica reconhecida pela norma [...] Os conselhos, portanto, são órgãos de cooperação governamental, de auxílio à administração na interpretação, orientação, planejamento e julgamento da matéria que lhe compete [...] (Tópor, 1996). O impasse jurídico continuou, já que a Secretaria de Educação precisava organizar o repasse trimestral e também, o governo federal já anunciava que repassaria o dinheiro do PMDE diretamente às unidades executoras. A coordenadora de Assuntos Jurídicos da Procuradoria Geral do Município, Vanesca Prestes, que participou de várias reuniões na Smed para encontrar solução para o impasse, elabora uma minuta de projeto de Lei e emite o seguinte parecer: 45 46 47 Parecer nº 939/96, de 26 de fevereiro de 1996, em resposta ao ofício nº 2/96 – G. S. Smed. Lei Complementar nº 292/93, rege o Conselho Escolar (Porto Alegre, 1993). Lei Orgânica Municipal (LOM) (Porto Alegre,1990). Programa Dinheiro Direto na Escola 135 Em síntese, será aberta uma conta em nome de cada escola municipal (em nome do Município porque não possuem personalidade jurídica própria), para que as verbas sejam recebidas e geridas. A competência para definir a aplicação dos recursos é exclusivamente de cada Conselho Escolar (grifo da autora). Porém as responsabilidades quanto a todo o controle registrário, quanto a ordenação da despesa e a movimentação da conta corrente são da Junta Administrativa composta por funcionários municipais, ficando expressa a impossibilidade da Junta liberar recursos sem a autorização do Conselho Escolar (sic). Destarte, desta forma entendemos que mais uma vez o Município de Porto Alegre estará inovando ao demonstrar a viabilidade de compatibilizar o ordenamento jurídico vigente com a efetiva participação popular, vez que garante à comunidade escolar a deliberação, fiscalização, enfim o controle sobre as verbas da escola, ao mesmo tempo atribui a responsabilidade burocrática e executiva a funcionários municipais que pela própria situação funcional devem respeito às normas legais vigentes (Prestes, 1996) (sic). Desta discussão jurídica é que surge o Decreto nº 11.600 de 22 de novembro de 1996 (Porto Alegre, 1996c) que dispõe sobre o repasse de recursos para a rede municipal, cujos considerandos estão pautados na proposta de democratização da escola – Escola Cidadã – e de suas relações, na transferência de recursos financeiros para as escolas como processo de descentralização da tomada de decisões e da gestão, incluindo o Programa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental do MEC/FNDE, que visa à transferência de recursos para as escolas públicas de ensino fundamental. Os recursos destinados às unidades de ensino do município serão geridos pela comunidade escolar por meio do Conselho Escolar, e o diretor48 e o vice-diretor serão os ordenadores de despesa. As unidades deverão apresentar um plano de aplicação dos recursos financeiros. A procuradora esclareceu na entrevista qual foi o teor do Decreto nº 11.600/96: Nós propúnhamos que fosse como são os demais Conselhos de toda a gestão, que toda a liberação de recursos fosse feita pelo Conselho, mas que a execução fosse de um funcionário público. Porque uma de nossas preocupações é que toda essa tarefa burocrática consome muito e a gente viu vários Conselhos subsumidos na burocracia, esquecendo-se de discutir a política. Era um alerta que se fazia muito seriamente, primeiro porque tem toda uma questão da verba pública e é uma burocracia necessária porque é recurso do contribuinte [...]. [...] é bem como funciona o Conselho da Criança e o de Assistência Social, eles discutem no pleno do Conselho, o presidente se preocupa com as deliberações e quem vai aplicar é a junta administrativa. Quer dizer, eles têm a responsabilidade para dizer que a verba é para isso ou para aquilo e depois verificam se foi executado (Prestes, 2002). Portanto, com o Decreto nº 11.600/96, o Conselho Escolar deliberava sobre os recursos e a direção da unidade de ensino executava as decisões. Mas, no caso 48 De acordo com o art. 5º, da Lei Complementar nº 292/93, que cria o Conselho Escolar, a direção da escola integra o Conselho Escolar, representado pelo diretor, como membro nato, e, em seu impedimento, por um de seus vice-diretores indicados. 136 Programa Dinheiro Direto na Escola do PMDE, a verba não era passada direto para as unidades escolares, o município era intermediário do repasse. Conforme a procuradora Vanesca Prestes (1998), [...] esta fórmula apesar de respeitar a autonomia política dos conselhos escolares, na medida em que tornou cogente o cumprimento das deliberações do conselho, combinando os preceitos de direito público com a descentralização das ações e decisões, não foi considerada suficiente pela União. A Resolução nº 3, de 3 de março de 1997 (Brasil, 1997c), institui que o repasse da verba da União direto para as escolas será por meio das unidades executoras e impossibilita que ocorra pela Secretaria Municipal. A procuradora assim comenta o fato dos municípios serem retirados do processo: A República Federativa do Brasil tem três entes. Mas, há uma dicotomia da administração federal, alguns vêm os municípios como meramente unidades executoras e daí é bem complicado porque não somos mais unidades executoras, somos formuladores de políticas e projetos distintos (Prestes, 2002). A Smed insistiu, com o MEC, para que o dinheiro fosse repassado utilizando-se a organização funcional e administrativa já existente no município, o que lhe foi negado, obrigando a Secretaria a adaptar-se às normas determinadas pelo MEC, para que as escolas não deixassem de receber os recursos a que tinham direito. Para adaptar-se à nova sistemática do PMDE/FNDE, o poder público municipal institui o Decreto nº 11.952, de 15 de abril de 1998 (Porto Alegre, 1998), que dispõe sobre o repasse de recursos financeiros aos Conselhos Escolares das escolas municipais. Conforme a procuradora Vanesca Prestes (1998): [...] os Conselhos Escolares foram constituídos como Associações Civis, na forma da Lei dos Registros Públicos, fazendo surgir uma pessoa jurídica distinta do Município. Em que pese essa não ser a solução juridicamente mais adequada [...], atendeu a exigência federal para repasse dos recursos. Como essa solução é exigida pelo governo federal e a verba oriunda da União é imprescindível para as escolas municipais cabe a nós, dentro do âmbito de competência, estabelecendo regras gerais, dispor sobre as normas de utilização destes e outros recursos pelos Conselhos escolares. É isto o que faz o Decreto nº 11.952, combinado com o Decreto nº 11.600. Da leitura de ambos verifica-se que o Município, gestor e responsável pela execução da política pública, não deixa de fiscalizar a utilização direta do recurso, pois o pleno de aplicação é previamente submetido à Smed, assim como tem por obrigação orientar e assessorar a unidade executora quanto a execução e o controle da política pública (sic). Esse controle do poder público por intermédio, entre outros, do Plano de Aplicação de Recursos, proposto no Decreto nº 11.600/96 (Porto Alegre, 1996a), e no Decreto nº 11.952/98 (Porto Alegre, 1998), que dispõe sobre a aplicação de recursos e prestação de contas dos convênios da Administração Direta e Indireta do Município com entidades não-governamentais. Com este Decreto, é possível perceber que o debate sobre o repasse de dinheiro público para entidades nãogovernamentais já estava ocorrendo na administração democrático-popular de Porto Alegre. Programa Dinheiro Direto na Escola 137 O Decreto apresenta a necessidade de unificar os procedimentos relativos aos convênios com entidades não-governamentais de caráter comunitário, educativo ou assistencial, não-lucrativo (o que se convencionou chamar de "público nãoestatal"), e as normas para elaboração do Plano de Trabalho, Plano de Aplicação de recursos e as normas e procedimentos de aplicação de recursos e de prestação de contas. Conforme Vanesca Prestes, que participou de todo este debate e emitiu os pareceres à Smed: Nós temos toda uma regulamentação para prestar contas dos recursos, porque é muito séria esta questão da participação da população, cria um compromisso. [...] Nesses últimos tempos, nós fomos passando por vários processos de participação da população na execução direta das tarefas públicas, [...] era projeto político a execução de forma partilhada. E nós não tínhamos e não temos no arcabouço jurídico a forma de participação popular efetiva da população nas tarefas públicas na perspectiva de colaborador e não desonerador. [...] foi uma demarcação da prefeitura de Porto Alegre, inclusive contrapondo a Reforma Administrativa que veio subseqüentemente (sic) (Prestes, 2002). A Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre, além de resolver os impasses jurídicos mencionados foi obrigada a reorganizar, em parte, a operacionalização da gestão para adequar as escolas às exigências do governo federal e poder receber os recursos. Para dar ciência às escolas das mudanças administrativas em relação à autonomia financeira das instituições e construir com estas as alternativas viáveis, a Secretaria de Educação, por meio da Assessoria de Planejamento, convocou-as e fez a discussão, explicando as mudanças que estavam se operando no âmbito dos Conselhos, quais eram as responsabilidades de cada segmento na administração da verba pública, bem como a importância da participação de todos. As escolas foram chamadas a discutir uma proposta de estatuto para os Conselhos Escolares. Participaram todos os segmentos em reuniões organizadas por região da cidade. Além do estatuto, foi elaborada uma ata de fundação da unidade executora, rebatizando o Conselho Escolar com um novo nome e com uma outra característica, uma vez que agora cada Conselho teria o seu próprio CNPJ passando assim, a assumir um caráter privado. A Smed registrou, em cartório, os CNPJs dos Conselhos, e coube à própria Secretaria de Educação fazer também uma assessoria contábil às novas UExs. A verba do PDDE passou a ser incluída no planejamento anual das escolas, juntamente com o Repasse Trimestral. Atualmente, 50 escolas do município recebem a verba do PDDE. O MEC, geralmente durante o mês de abril (o que varia conforme o ano), manda para a Secretaria uma relação das escolas aptas a receberem os recursos financeiros. Essa relação é feita a partir da Prestação de Contas e do Censo Escolar do ano anterior ao recebimento. Se o número de alunos matriculados mudar durante o ano letivo, a faixa de recebimento de valores só mudará no ano seguinte. Todas as escolas da rede municipal de Porto Alegre têm unidade executora; nenhuma recebe o dinheiro por meio da Secretaria Municipal de Educação. 138 Programa Dinheiro Direto na Escola Tabela 2 – Sistematização dos dados do Sistema sobre a implementação do PDDE – 1997 a 2004 Ano Nº de escolas ensino fundamental Nº de escolas que recebem e administram diretamente o PDDE Total 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 53 47 48 50 50 50 51 51 41 47 46 46 47 50 50 50 291.720,00 247.900,00 265.800,00 290.400,00 319.300,00 327.000,00 327.000,00 323.500,00 Fonte: Smed/POA. O PDDE representa 0,17% da receita total do município, que é R$ 1.912.710.778,53, e 2,44% da receita de convênios, que é R$ 13.252.806,40. Embora a Secretaria faça um trabalho de orientação nas escolas, ela não é notificada sobre quando será feito o depósito da verba pelo MEC. Para manter-se informada, precisa consultar a Internet, sabendo, dessa forma, quando o dinheiro estará disponível para as escolas. Os diretores geralmente ligam notificando o recebimento e pedindo alguma orientação, quando julgam necessário. Quando a verba chega, a Smed envia para as escolas uma planilha de aplicação de recursos do PDDE para que o Conselho se reúna e decida o que vai ser adquirido pela escola naquele ano com a verba, o que passa por discussão prévia em cada segmento, por meio de assembléias ou reuniões. Segundo a Smed, os Conselhos atrapalharam-se um pouco com a parte burocrática do Programa, como foi o caso dos vencimentos dos CNPJs, pois não estavam acostumados a lidar com questões empresariais, o que causou uma pequena correria. Os Conselhos têm até o dia 31 de dezembro para fazer seus orçamentos (no mínimo três) e gastar o recurso, ou então podem reprogramar o uso do recurso para o ano seguinte. Verificado, pelo MEC, algum problema na prestação de contas, a Secretaria é responsável, e, se necessário, é feita uma auditoria nas escolas. Amostra municipal – Centro Municipal de Educação dos Trabalhadores (CMET Paulo Freire)49 O CMET Paulo Freire é uma escola de jovens e adultos que fica localizada na região central de Porto Alegre. A escola começou seu funcionamento em 1989 nos altos do Mercado Público da cidade dentro de um Programa da Secretaria Municipal de Educação, que percebeu a necessidade de um atendimento diferenciado aos 49 A escola autorizou o uso do nome no Relatório de pesquisa. Programa Dinheiro Direto na Escola 139 funcionários municipais e ao significativo número de analfabetos espalhados pela capital, dentro do "Projeto de Experiência Pedagógica em Educação Básica de Jovens e Adultos". O Projeto foi autorizado pelo Parecer nº 945/91, tendo como base normativa o Parecer CEE nº 315/91, que instituiu "no Sistema Estadual de Ensino, a modalidade de ensino supletivo Projetos de Alfabetização Massiva", que tinha como uma de suas diretrizes, a seguinte exigência: "todas as classes deverão estar vinculadas a uma escola regularmente constituída e sob sua responsabilidade". A partir daí, ela foi vinculada à Escola Municipal de 1º Grau Porto Alegre (EPA), situada também na região central do município. Mas a comunidade escolar do CMET queria que a escola fosse desvinculada da EPA e começasse a funcionar como uma escola regular de ensino com as características próprias de EJA. A intenção dos professores e da direção da escola, quando fizeram o pedido para desvincular-se da EPA, era que ela fosse reconhecida como uma escola de jovens e adultos com seus direitos. Então foi encaminhada ao Conselho Municipal de Educação uma proposta de regimento em que a escola demonstrava tal intenção. Foi aberto um Processo, do qual resultou o Parecer nº 6/2000 do Conselho Municipal de Educação, que autorizou o funcionamento da escola "pertencente à Rede Municipal de Ensino, desvinculando-a da Escola Municipal de 1º Grau Porto Alegre – EPA". Mas, mesmo contra o debate acumulado pela comunidade escolar, a escola teve que passar por uma reformulação para ser reconhecida como escola de ensino fundamental regular, inclusive para receber os recursos do PDDE. No ano de 2000 com o Parecer nº 3/2000 do Conselho Municipal de Educação, o CMET foi incluído, pela Smed, na relação de escolas que recebem o recurso do governo federal. Segundo a ata de reunião do Conselho Escolar, "a escola recebeu pela primeira vez a verba do PDDE cerca de oito mil reais" (ATA, /2001). O recurso, conforme descrito em ata, foi investido em compras que ainda não haviam sido feitas e estavam previstas para aquele ano, de acordo com o Planejamento Global para 2000. No ano de 2003, a verba recebida pela escola do PDDE foi de R$ 8.200,00, sendo que, desse dinheiro, R$ 7 mil deveriam ser investidos em material de consumo e o restante (R$ 1.200,00) em material permanente. Conforme a diretora da escola, o dinheiro do PDDE tem sido utilizado para fazer um estoque na escola de materiais de limpeza e também para comprar material pedagógico. A ex-diretora disse também que por a verba vir no final do ano letivo ela torna-se um complemento do Repasse Municipal, porém, ressalta que a verba do Programa é insuficiente para as demandas apresentadas pela escola. (Andrejew, 2004). Além do repasse do governo federal, a escola recebe da Secretaria Municipal de Educação o Repasse Bimestral; verbas extras, quando necessárias, para reparos no prédio, já que esse é alugado e enfrenta diversos problemas de infraestrutura e para a Sala de Integração e Recursos na qual profissionais especializados acompanham alunos com necessidades educativas especiais. Além disso, também concorre com projetos no Orçamento Participativo da Smed. 140 Programa Dinheiro Direto na Escola Tabela 3 – Sistematização dos dados financeiros da escola "A" – 2001-2003 Recursos recebidos pelo PDDE Ano Outros recursos recebidos da administração pública e geridos pela unidade executora FNDE pelo Repasse Orçamento Conselho Bimestral Participativo Verba extra Escolar 2001 8.200,00 28.711,66 2002 8.200,00 27.307,30 2003 8.200,00 34.221,31 6.070,00 18.300,00 4.471,87 Sala de Integração e Recursos 1.600,00 1.600,00 1.600,00 Total de recursos administrados pela escola 44.581,66 47.207,30 42.421,00 Fonte: CMET Paulo Freire. A verba do PDDE representou, nos anos de 2001 a 2003, 18,5% em relação aos recursos recebidos pela escola. O Conselho Escolar já havia avançado bastante na gestão democrática na escola pela efetiva participação de todos os segmentos em assembléias envolvendo o restante da comunidade estudantil. A unidade executora que recebe os recursos do PDDE no CMET é o próprio Conselho Escolar que se mostrou bastante participativo e preocupado com as questões escolares, tanto pedagógicas quanto administrativas. As reuniões são realizadas a cada 15 dias no intervalo das aulas para que possa participar o maior número de representantes. A participação dos pais é um pouco diferenciada, pois os alunos, em sua maioria, são maiores de idade e eles mesmos acabam sanando essa demanda. Mas foi instituída a participação dos pais de alunos menores de idade para que esse segmento também pudesse ser representado. Os alunos demonstraram-se bastante participativos e interessados nas reuniões do Conselho. Conforme o representante deste segmento são convocadas assembléias chamando os alunos para discutirem suas demandas ou então cada líder de turma traz as principais questões levantadas em sala de aula e estas são levadas às reuniões do Conselho Escolar. (Silva, 2004). Quanto aos professores, estes se mostraram bastante preocupados com a escola e muito críticos nas reuniões do Conselho Escolar. Segundo um dos professores representantes do segmento, ele procura levar ao conhecimento do grande grupo o que está sendo discutido nas reuniões para que todos possam analisar e dar sugestões (Silva, 2004). No ano de 2003, foi realizada uma auditoria na escola50. No documento em que consta registrada a auditoria, a escola foi classificada somente como educação de jovens e adultos, não se constituindo como ensino fundamental, embora houvesse o Parecer do Conselho Municipal de Educação nº 3/2000, como já explicado anteriormente, e a própria diretora, na época, tivesse explicado a forma de condução da escola. Assim, o PDDE acabou sendo cancelado em 2004. Eles tentaram reverter a situação entrando com processo, mas este foi negado. A escola também não recebeu o recurso em 2005. 50 O número de matrículas estava apresentando alguns problemas, pois, como durante o ano letivo os alunos podem ir e vir sem que isso cause a perda de sua vaga ou prejudique sua matrícula, acabou acontecendo uma grande diferença entre os alunos que estavam matriculados e aqueles que estavam freqüentando a escola. Programa Dinheiro Direto na Escola 141 A escola da amostra de educação especial – O caso da Apae/POA51 A Apae, Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae)/Porto Alegre tem por objetivo atuar nas áreas de prevenção e educação para pessoas com deficiência mental e/ ou condutas psíquicas associadas, proporcionando o desenvolvimento das potencialidades e autonomia, melhorando a qualidade de vida como pessoa e cidadão, por meio da atualização e diversificação de oportunidades e serviços (Folder de divulgação Apae/POA). Foi fundada em 1962, sendo uma das sócias fundadoras da Federação das Apaes, que conta com 1.300 entidades no Brasil, atendendo mais de 110.000 portadores de necessidades especiais. O PDDE/FNDE é repassado via CNPJ para a Apae, como acontece nas escolas da rede pública, mas administrado diretamente pela gerência administrativa da mantenedora. Os conselhos de pais e comunidade da escola possuem, em princípio, a função de acompanhamento da administração, tanto em termos de estrutura e ensino, quanto de administração de recursos. O setor de projetos e o setor financeiro administram os recursos repassados à entidade e as pessoas que atuam na diretoria são eleitas por chapa para um período de dois anos. Atualmente, a Apae Porto Alegre passou por um período de dificuldades financeiras, tendo que diminuir o número de funcionários e enxugar os gastos, passando, inclusive, por um período de intervenção da Federação das Apaes em função de problemas financeiros. Funcionando como entidade filantrópica de caráter social, a Apae Porto Alegre possui três escolas: Instituto Educacional Nazareth, Centro de Atendimento e Desenvolvimento do Excepcional (Cade) e Escola de Educação Especial Dr. João Alfredo de Azevedo. Tabela 4 – Quadro de alunos matriculados na Apae/POA – 2003 e 2004 Número de matrículas Ano 0 a 6 anos 7 a 12 anos 13 a 18 anos Mais de 18 anos 2003 2004 49 51 51 34 47 52 249 246 Total 396 383 Total de alunos conforme Censo Escolar* 188 203 Fonte: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Porto Alegre – (Apae/POA) (informante). * O total de alunos do Censo Escolar determina o valor do PDDE, sendo que o número de alunos ultrapassa esse dado, uma vez que atendem igualmente alunos maiores de 14 anos. O recurso do PDDE/FNDE chega à escola como nas escolas públicas, ou seja, seu valor é sempre referente ao número total de alunos atendidos pela escola. O detalhe em particular no caso da administração da verba na Apae/POA é 51 No caso específico da Apae/POA, a utilização de nomes de pessoas ou de entidades vinculadas às informações aqui relatadas foi formalizada por meio de termo de consentimento informado de pesquisa. 142 Programa Dinheiro Direto na Escola que o número de alunos para o cálculo do financiamento enviado pelo FNDE corresponde ao Censo Escolar de cada ano, ou seja, os alunos em idade escolar que têm direito à educação assegurada (até 14 anos, segundo a LDB). A questão, nesse ponto, é que a Apae/POA não atende apenas pessoas nessa idade escolar, a entidade possui um número de alunos maior que o do Censo Escolar, sendo que parte desses alunos está com idade maior que a idade de obrigatoriedade do direito ao ensino assegurado e garantido pelo Estado brasileiro. A Apae/POA administra um montante de recursos totais e os distribui para suas três escolas e programas. Ou seja, há uma sede administrativa única para repasses e setor financeiro na entidade, que distribui os valores necessários à manutenção dos estabelecimentos educacionais e programas. Segundo o gerente administrativo, toda a despesa feita pela instituição é de sua responsabilidade e a verba que ela "recebe dos órgãos públicos, não chega a 15% do orçamento de que ela necessita", pois a despesa mensal gira "em torno de R$ 200 mil por mês" (Bertoletti, 2005). Além do PDDE, a escola recebe também: Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae); Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência (Paed); Recursos do INSS, uma vez que atende pessoas com deficiência mental e/ou condutas psíquicas associadas e os recursos via Prefeitura Municipal de Porto Alegre – por meio de formalizações de parcerias e contratos, renovados anualmente. Já os recursos arrecadados pela própria Apae/POA, segundo Bertoletti são oriundos de fontes como: Campanha da Nota Fiscal; boleto bancário de pagamento via sócio/Apae; telemarketing (de onde vem o recurso mais expressivo, os valores variam em torno de R$ 5,00 a R$ 100,00); doação de empresas privadas; Programa "Adote um aluno da Apae", em que empresas ou pessoas físicas podem pagar bolsas a alunos carentes; e contribuições espontâneas de pais com filhos que estudam na Apae/POA (a contribuição espontânea de pais gira em torno de 10% do orçamento da instituição. Há pais, por exemplo, que contribuem com até R$ 490,00/mês. Tabela 5 – Sistematização dos dados da escola – Nome da Escola: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Porto Alegre (Apae/POA) – 2003 e 2004 Recursos recebidos pela Apae Ano PDDE Merenda Pnae* 2003 2004 8.400,00 9.300,00 2.831,2 2.831,20 Paed 6.800,00 INSS** Prefeitura Total 109.729,32 109.729,32 90.000,00 120.960,52 218.660,52 Fonte: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Porto Alegre (Apae/POA) (informante). * Valor relativo a 100 alunos. ** O valor recebido pelo INSS é fixo mensal, sendo atualmente R$ 9.144,11/mês, assim, realiza-se a média anual. O informante deu os valores iguais para os anos de 2003 e 2004. A Tabela 5 nos fornece os dados relativos aos recursos obtidos pela escola nos anos de 2003 e 2004. Segundo Bertoletti, no ano de 2004, a Apae/POA apresentou um quadro de despesas anuais médio de R$ 2.400.000,00. Esse cálculo foi realizado pelo professor Bertoletti durante visita à Apae/POA, com base em Programa Dinheiro Direto na Escola 143 uma média de gastos estimados em R$ 240.000,00/mês para o funcionamento da instituição. É possível observar que a Apae recebe recursos de várias fontes públicas diferentes. Em 2003, o PDDE representava 4% do total de recursos públicos recebidos pela instituição e, em 2004, representou 7% do total. Considerações gerais Como principais questões levantadas pela pesquisa, após quatro anos de trabalho, passamos a destacar alguns aspectos. Em Porto Alegre, há o embate jurídico acerca de os Conselhos Escolares poderem ser ou não unidades executoras de direito privado. Lembramos, ainda, o debate acerca da autonomia dos entes federados, já que a centralização da União não respeitou a proposta feita por Porto Alegre e a sua trajetória de gestão democrática. Na rede estadual, a principal questão foi o dilema vivido entre avançar na gestão democrática e escolher como unidade executora o Conselho e não correr o risco de ter uma instituição de direito privado no interior da escola ou, por outro lado, fortalecer o CPM. Na Apae, ressaltamos a quantidade de verbas públicas que recebe das mais variadas fontes e a sua forma de gestão centralizada, apesar de ser não-estatal. Porto Alegre viveu 16 anos de administração de uma frente de esquerda, que tinha na democratização da gestão uma de suas maiores bandeiras. Mesmo com todos os impasses vividos no cotidiano das instituições, o objetivo estava bem definido, e as principais estratégias eram o fortalecimento do Conselho Escolar, a autonomia financeira e a eleição para diretores, além de toda a discussão da democratização do acesso e do conhecimento. Sem esquecer que as questões estão intimamente interligadas, para fins deste trabalho, vamos nos deter mais no Conselho Escolar e na autonomia financeira. O ente federado município, em um processo de correlação de forças, tinha construído suas políticas, inclusive, muitas vezes, em contraposição às políticas do governo federal, que tinha outros objetivos políticos, entre eles, a diminuição do papel do Estado para as políticas sociais, e o que ficava sob a propriedade do Estado deveria ter a lógica do mercado para ser mais eficiente e produtivo. O Programa Dinheiro Direto na Escola foi concebido dentro dessa lógica – de repassar para o privado a administração do dinheiro público e ainda enfraquecer as instituições públicas, tanto os sistemas estaduais quanto municipais, quanto a própria escola, entendida como instituição estatal. Nesse sentido, a União não respeitou a autonomia dos entes federados, impondo-se, em um período democrático, não mais por meio da força física, mas econômica, já que os municípios que não se ajustassem à sua lógica não receberiam o recurso. No caso da rede estadual do Rio Grande do Sul, apesar de, no início do Programa (1995), ter sido aprovada a Lei de Gestão Democrática – muito por pressão dos profissionais da educação –, o fato é que o governo estadual na época era alinhado politicamente com o governo federal e, sem nenhum tipo de resistência, aderiu ao Programa. É interessante observar, ainda, que a Associação de Pais no RS é muito influente desde o período da ditadura. Com o debate acerca da gestão democrática e o fortalecimento dos Conselhos, essa instituição estava sem forças e praticamente acabada. Com o recebimento do dinheiro do 144 Programa Dinheiro Direto na Escola governo federal, por meio do PDDE, ela sobrevive, ganha força – onde não existia foi organizada, passando a disputar novamente os espaços de gestão na escola. Outro aspecto a ressaltar na rede estadual foi o embate vivido durante o governo Olívio Dutra, entre duas formas de participação na democratização do Sistema. A mais direta, por meio da Constituinte Escolar, e a representativa, por meio da Comissão Paritária, que tinha os representantes da forças (sindicato, CPM, Uges e governo). Enquanto a comunidade escolar, por meio da Constituinte Escolar, escolheu o Conselho Escolar para ser a unidade executora, o sindicato e a Associação dos CPMs escolheram o CPM. O governo representou os interesses da Constituinte escolhendo o Conselho. É um interessante debate – quem tem mais legitimidade e quem fala em nome de quem –, já que duas instâncias que tinham por objetivo democratizar a elaboração das políticas estaduais no período decidiram sobre um mesmo ponto de forma diferente. Ainda na rede estadual, há o grande debate apresentado pelo sindicato, entre fortalecer a gestão e o receio de transformar o Conselho Escolar, como instância do interior da escola pública, em entidade de direito privado. Tal dilema é provocado pela obrigatoriedade de as UExs terem CNPJ próprio. Quanto à arrecadação de recursos por parte da Unidade Executora, é uma das questões mais controversas do Programa, já que estimula a busca de recursos na comunidade, desobrigando, assim, o Estado de financiar totalmente a escola pública. Essa prática já existia nas escolas anteriormente – ela não nasceu com o Programa –, mas a luta dos profissionais da educação por autonomia financeira da escola era justamente para acabar com essa prática, pois a escola receberia dinheiro para seus gastos cotidianos e não precisaria mais buscar por meio de rifas, festas juninas, rainha da primavera... O Programa vai na contramão dessa luta e estimula a arrecadação de recursos pela escola, montando, inclusive, a estrutura da organização social (proposta pelo Ministério de Administração e Reforma do Estado – Mare) por meio da unidade executora. Na pesquisa do RS, esse tema teve impactos diferentes na rede estadual e na rede municipal de Porto Alegre. Na capital gaúcha, a UEx não está autorizada a arrecadar recursos na comunidade por se acreditar que a escola pública deveria ser financiada pelo poder público; já na rede estadual, verificamos que essa é uma prática que tem tomado muito tempo, tanto do CPM quanto do Conselho, e que essas duas instituições podem ou não conviver bem na escola. De qualquer maneira, foi fortalecida a prática da arrecadação e já praticamente naturalizada. É interessante observar também que o PDDE representou, em 2003, apenas 15% do que a escola recebia da Secretaria da Educação como repasse financeiro e, em 2004, apenas 7%. Outro fator interessante na escola municipal pesquisada foi que, em função do financiamento da educação, principalmente Fundef e PDDE, a escola, que atende jovens e adultos, teve que se adaptar para receber o recurso. A flexibilidade inicial que era parte da filosofia da escola, que procurava atender às especificidades do aluno trabalhador, tanto na metodologia quanto na organização escolar, teve que ser repensada para a escola tornar-se de ensino fundamental regular e, assim, receber os recursos. Foi um embate enorme na escola, com muitos questionamentos dos professores acerca da submissão do pedagógico ao financeiro. Programa Dinheiro Direto na Escola 145 Enfim, a escola passou pelos ajustes, e o Conselho Municipal de Educação acabou "legalizando a escola" como de ensino fundamental por meio do Parecer nº 3/2000. Para nossa surpresa, houve uma "auditoria" na escola, que foi considerada pelo poder público federal como de jovens e adultos no Censo Escolar, o que quer dizer que perdeu os recursos do PDDE. Isso foi considerado pelas pesquisadoras como uma intervenção da União em relação ao que o município havia definido no seu Conselho Municipal de Educação – e mais uma vez questionamos a autonomia relativa dos entes federados. Por fim, vale destacar o "fluxo" do dinheiro, que é público, mas que passa por uma instituição privada para ser gasto pelo poder público. E ainda que os pais, no caso de a UEx ser o CPM, têm que ressarcir o poder público se houver qualquer problema na prestação de contas. Levando em consideração que as escolas públicas são para filhos de trabalhadores, muitas vezes com pouca escolaridade e familiaridade com a burocracia, repassar mais essa responsabilidade para os pais, que já são expropriados pela sociedade e pagam seus impostos, parece um abuso de poder, porque, se nenhum pai se responsabilizar, o dinheiro simplesmente não vai para a escola. Quanto à Apae, chamou a atenção principalmente a diversidade de fontes de recursos públicos, sendo que o PDDE, mesmo repassando mais recursos para essas escolas do que para as públicas, ainda assim foi responsável por apenas 4% do total de recursos públicos recebidos em 2003. Outro aspecto a ressaltar é que, apesar de ser uma instituição proveniente da organização da sociedade, a gestão é totalmente centralizada, assim como a destinação dos recursos. Não encontramos na pesquisa nenhum vestígio de gestão democrática na instituição, além de pouca transparência na destinação dos recursos, já que a prestação de contas pública, inclusive publicada em um jornal local, é muito geral e em linguagem contábil. Percebemos, assim, um controle social, tanto no que se refere à escolha de onde seria gasto o recurso, quanto no que diz respeito à prestação de contas para a comunidade educativa, que é menor na Apae do que nas escolas das redes públicas estudadas. A Resolução nº 17 definiu que a Entidade Mantenedora (no caso das Apaes) deve: Fazer gestões permanentes no sentido de garantir que a comunidade escolar tenha participação sistemática e efetiva, desde a seleção das necessidades educacionais prioritárias a serem satisfeitas até o acompanhamento do resultado do emprego dos recursos do programa (Resolução nº 17/05, art. 7º, inciso IV, alínea c). No entanto, essa não foi a realidade encontrada na pesquisa. No que se refere à gestão democrática, não só a Apae apresentou centralização nas decisões. Entre as escolas pesquisadas, mesmo de um mesmo sistema, como o Sistema Municipal de Porto Alegre, que tem uma longa caminhada de construção da gestão democrática nas escolas, encontramos diferentes estágios de participação dos segmentos. Em uma das escolas, a verba do Programa, assim como os demais recursos recebidos eram definidos com ampla participação. O Plano de Aplicação de recursos era definido em assembléias por segmentos, para definir prioridades dos gastos, e depois em uma assembléia geral dos segmentos, em que eram 146 Programa Dinheiro Direto na Escola debatidas as propostas e as decisões eram tomadas de acordo com a proposta pedagógica da escola no Conselho Escolar. Na outra escola pesquisada, a reunião do Conselho para definir a destinação dos recursos foi "monopolizada" pela diretora, que definiu a utilização na aquisição de um videokê com karaokê. Alguns representantes questionaram se não seria mais interessante investir em equipamento de som para o auditório, mas foi em vão, e a diretora acabou convencendoos. Na escola da rede estadual, o fato de haver duas instâncias que recebem recursos e definem sua destinação deixa o quadro ainda mais complexo. O diretor acaba centralizando as decisões e administrando, às vezes, junto, outras vezes, individualmente, tanto o CPM quanto o Conselho. Analisaremos, no próximo item, a relação entre o diagnóstico neoliberal de que o "responsável" pela crise é o Estado, a conseqüente estratégia proposta pelo Plano de Reforma do Estado no Brasil (Brasil, Mare, 1995) de passagem das políticas sociais para o setor público-não estatal e a obrigatoriedade de construção de unidades executoras (entidades públicas de direito privado) em todas as escolas públicas brasileiras para recebimento do dinheiro do Programa. Programa Dinheiro Direto na Escola 147 4 Programa Dinheiro Direto na Escola 149 Análise dos casos 4.1 Caracterização das unidades executoras O Programa Dinheiro Direto na Escola, ao condicionar o repasse de recursos à existência de unidades executoras de natureza privada, vinculadas às escolas, produziu diferentes impactos nos sistemas e nas unidades escolares. Tais impactos decorrem das características das próprias redes de ensino e das políticas locais em relação à descentralização de recursos e à democratização da gestão escolar, especialmente no que diz respeito às concepções sobre a participação da comunidade na tomada de decisões. Observamos em alguns sistemas a capacidade indutora do Programa em relação à normalização nas redes, especialmente naqueles municípios que, não contando com nenhum mecanismo de descentralização de recursos, receberam por meio do PDDE um forte estímulo à criação ou revitalização de entidades como as Associações de Pais e Mestres ou os Conselhos de Escola. Em redes com maior nível de organicidade, caso das redes estaduais de ensino, o PDDE produziu desde a simples incorporação dos procedimentos a políticas já em curso, o que foi verificado na rede estadual de São Paulo, até intensos debates em relação às conseqüências da implantação de uma entidade de direito privado para a democratização da gestão escolar, conforme verificado nos Estados do Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul. Nos dois Estados (MS e RS), a existência das unidades executoras interferiu nos processos em curso de tal maneira que, ao contrário do Estado de São Paulo e Programa Dinheiro Direto na Escola 151 de outras redes estaduais, não se tratou apenas de sua incorporação a políticas ou do estímulo à criação de entidades com personalidade jurídica, mas de um debate no campo político (e também jurídico) que dizia respeito aos rumos do projeto local de gestão democrática. Nas redes municipais pesquisadas, três optaram por instituir as UExs como Conselhos de Escola, enquanto duas criaram ou instalaram a unidade executora na Associação de Pais e Mestres. Nas redes estaduais, ocorre o inverso: três incorporaram o PDDE às Associações de Pais e Mestres ou similares (MS, SP e RS/Círculos de Pais e Mestres), e duas operaram a transformação jurídica dos Conselhos de Escola a fim de ajustar seu funcionamento às exigências do Programa (PA e PI). O fato de as unidades executoras terem o formato de Conselho de Escola ou APM/CPM as diferencia em relação aos segmentos que participam da gestão dos recursos: APMs e CPMs privilegiam em sua composição a participação de pais e profissionais, podendo até possibilitar a participação dos estudantes, mas não na condição de representantes eleitos por seus pares, enquanto do Conselho de Escola participam oficialmente estudantes, profissionais e pais. A exigência de criação das unidades executoras em redes de ensino já organizadas, como as redes estaduais pesquisadas, produziu uma "revitalização" de órgãos auxiliares (APMs) ou de gestão da escola (Conselhos de Escola). Há significativa diferenciação entre as duas entidades. As APMs são organizadas como associações de apoio ao trabalho da direção escolar. Suas funções (mesmo considerando as variações dos Estatutos em diferentes Estados e municípios) relacionam-se à realização de atividades de apoio à gestão escolar e a ela estão submetidas. Os Conselhos de Escola deliberativos, por seu turno, refletem os esforços empreendidos, especialmente a partir dos anos 80, em direção à democratização da gestão na escola. São órgãos de natureza deliberativa que, em tese, funcionam em colaboração com a direção da escola, mas de maneira autônoma, contando com a participação dos diferentes segmentos da comunidade escolar. Os Conselhos de Escola ou Associações de Pais e Mestres, em alguns Estados, ganharam nova formatação e foram objeto de atenção específica dos gestores locais, o que, antes do PDDE, nem sempre ocorria. No Estado do Pará, os Conselhos de Escola, com caráter deliberativo, já existiam na rede, mas não em todas as unidades, pois não era obrigatório instituílos. O PDDE induziu a criação das UExs, e o Sistema reagiu transformando os Conselhos de Escola nas unidades executoras, tornando-os obrigatórios. A partir de então, verifica-se um duplo movimento: 1) transformação dos Conselhos já existentes em UExs e 2) criação do Conselho nas escolas que não o tinham implementado. No Estado do Piauí, também observamos um movimento que, ao alterar a configuração dos Conselhos de Escola, coloca-os em funcionamento em todas as unidades da rede como UEx. Oriundos dos debates e lutas sociais pela democratização da gestão escolar, os Conselhos existentes foram criados no início dos anos 90, mas, tal como no Pará, não tinham existência e funcionamento generalizados. Somente com sua transformação em UExs passaram a existir em todas as escolas, tendo como principal atividade a execução dos recursos advindos do PDDE. Observe-se que, no Piauí, o diretor escolar é também coordenador 152 Programa Dinheiro Direto na Escola (presidente) do Conselho, sugerindo-nos que, nesse caso, o diretor escolar tem papel central na tomada de decisões. No Estado do Rio Grande do Sul, houve intenso debate sobre as possibilidades de a Política de Gestão Democrática em curso na rede ser comprometida pela criação da entidade de direito privado nas escolas. Em face dessa preocupação, a Secretaria de Educação optou por transformar os Conselhos de Escola em unidades executoras, preservando a participação de todos os segmentos nas decisões referentes à execução dos recursos. Todavia, representantes do Centro do Professorado do Estado do Rio Grande do Sul/Sindicato (CPERs) e da Associação dos Círculos de Pais e Mestres (ACPM), por razões diversas, opuseram-se tenazmente: o sindicato docente questionou a transformação do órgão colegiado de gestão em entidade de direito privado, afirmando que não se trataria mais da escola se organizando coletivamente, mas de uma entidade com poderes deliberativos nos campos administrativo e pedagógico, assumindo o lugar do poder público. Pais integrantes da ACPM, por sua vez, reivindicavam o direito de a entidade assumir a execução dos recursos descentralizados. A resolução do embate deu-se pela aprovação do Círculo de Pais e Mestres (CPM) como unidade executora, preservando-se o Conselho de Escola como órgão de gestão. Os CPMs, que, no âmbito da política educacional do Estado, não eram priorizados, receberam nova ênfase e um novo papel na organização do trabalho escolar. Nas duas outras redes nas quais a UEx foi implementada como Associação de Pais e Mestres (São Paulo e Mato Grosso do Sul), os dados mostram que o Programa foi absorvido por uma organização antecedente, na qual as APMs já executavam recursos descentralizados para a escola, não havendo maiores impactos em termos de gestão escolar. As APMs, nesses dois Estados, configuravam-se como peças importantes da política local de descentralização52. As UExs, nas redes estaduais, além de gerirem recursos públicos, também podem captá-los, o que se verificou em todos os Estados. Embora não nos tenhamos deparado com unidades que captassem recursos para além das já conhecidas formas de arrecadação presentes nas escolas (contribuições, festas, arrendamento de cantinas, reprografia e uso dos muros para propagandas), é importante observar que todas as UExs mantinham algum tipo de atividade para angariar fundos. No Estado do Piauí, a atividade de captação é explicitamente estimulada pela Secretaria de Estado da Educação por meio do Programa Pactue, que estabelece uma contrapartida financeira por parte do governo estadual, proporcional à arrecadação realizada. Os relatos, sobretudo aqueles produzidos no âmbito das unidades escolares, indicam que o PDDE não se apresenta como programa indutor de discussões de natureza político-pedagógica profunda. A dimensão operacional na execução dos repasses leva a que a centralidade do diretor, em qualquer formato adotado para a UEx, se evidencie. Excetuem-se os casos do Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul, onde houve debate mais aprofundado em relação às concepções políticas do Programa e suas conseqüências para os projetos locais. 52 No Estado de Mato Grosso do Sul, no ano de 2000, houve certo debate em torno da alocação da UEx. Prevaleceu, todavia, a manutenção da APM como UEx. Programa Dinheiro Direto na Escola 153 Argumentos relativos à dificuldade de os pais entenderem o funcionamento do Programa e participarem ativamente das atividades necessárias à correta execução de recursos incorporaram depoimentos em vários Estados, justificando, assim, que os profissionais assumissem as maiores responsabilidades sobre as decisões em relação ao uso da verba. As redes municipais pesquisadas apresentam grande diversidade, quer em número de matrículas, quer em formas de gestão, que se expressam não apenas em termos numéricos, mas em sua própria organização. Em São Paulo, por exemplo, o município pesquisado, Pirassununga, nem sequer conta com sistema de ensino. A diversidade na história nas redes municipais faz com que a implementação do PDDE produza impactos diferenciados, sobretudo no que diz respeito à gestão no âmbito do Sistema e na própria escola. Todavia, apesar das diferenças, é nítida a capacidade indutora do Programa nos processos organizativos e de normalização da rede, uma vez que as exigências de criação de UEx para recebimento dos recursos foram capazes de promover a criação de entidades ou levar à transformação na natureza de Conselhos de Escola, que passaram a ser pessoas jurídicas. Dois municípios, Campo Grande (MS) e Pirassununga (SP), fizeram a opção por instituir a APM como UEx. É importante observar que em nenhum dos dois existem órgãos colegiados de gestão instalados nas escolas. Em ambos, o PDDE foi fundamental para que as APMs fossem regulamentadas, e estas passaram a ser os primeiros órgãos das unidades escolares que contavam com a participação de pais. No município de Pirassununga, a APM foi regulamentada pela Secretaria de Educação especialmente para fins de recebimento dos repasses provindos do Programa, por meio de consórcio. O Estatuto padrão, criado em 1999 exclusivamente para atender às necessidades do PDDE, determina que o diretor escolar e o assistente de direção sejam sócios natos. Entretanto, a escola com número de alunos suficiente para ter sua UEx funcionando como sede do consórcio não contava com as funções de direção e assistente de direção. A fim de que a APM pudesse ser criada, a encarregada do Setor de Educação da Secretaria de Educação assumiu formalmente a função de assistente de direção, passando a ser sócia da APM da escola-sede. A presidente do Conselho Deliberativo também era funcionária da Secretaria de Educação. Tal situação mostra que o precário nível de institucionalização na rede municipal produziu a necessidade de arranjos emergenciais para que houvesse o recebimento dos recursos. O PDDE expôs essa precariedade e exigiu um grande esforço dos gestores para que fossem criadas condições de inserção da rede no campo de atuação do Programa. Acredita-se que essas dificuldades em termos de organização e normalização dos sistemas integrem a realidade de outros municípios brasileiros, especialmente aqueles de pequeno porte, como o município estudado nesta pesquisa. As Associações de Pais e Mestres não foram a única opção política para a criação das UExs. Em três municípios, os Conselhos Escolares foram transformados em unidades executoras: Belém (PA), Porto Alegre (RS) e Teresina (PI). Em dois deles, Belém (PA) e Porto Alegre (RS), o processo implicou debates, tal qual o observado na rede estadual do Rio Grande do Sul e de Mato Grosso do Sul. 154 Programa Dinheiro Direto na Escola No município de Belém, os recursos do PDDE passaram a ser descentralizados para as escolas em 1998, um ano após o município ter implantado o Programa. A Secretaria Municipal de Educação orientava sua política para a implementação da gestão democrática nas escolas, para a qual os Conselhos de Escola tinham grande importância, o que se revelava no esforço de formação política de conselheiros. O preparo para a transformação dos Conselhos em UEx deu-se nesse contexto, de tal maneira que houve formação de profissionais e demais conselheiros para a administração dos recursos: foram realizadas desde oficinas em parcerias com órgãos federais, com o objetivo de discutir a responsabilidade do Conselho com os recursos públicos advindos de diferentes projetos (entre eles o PDDE), até capacitações específicas para utilização dos recursos do Programa. No município de Porto Alegre, o debate centralizou-se em torno da alocação da UEx. O processo político de implementação da Gestão Democrática, como na rede estadual, foi surpreendido pela necessidade de criação de uma entidade de direito privado. Após intensas discussões, a opção, diferente da realizada na rede estadual gaúcha, resultou na alocação da UEx no Conselho de Escola. A administração municipal de Porto Alegre, assim como a de Belém, declarava o compromisso político com a gestão democrática. À semelhança da rede estadual de ensino, a implementação do PDDE e a criação de unidades executoras foi fator de tensão na Secretaria de Educação, gerando disputa jurídica em relação à criação da UEx, o que expressa muito bem o caráter impositivo do programa, uma vez que o município precisou criar as entidades. A administração municipal vinha implementando gradativamente a descentralização de recursos para as escolas, cabendo a execução dos recursos aos órgãos de gestão da escola, os Conselhos de Escolas. Como já se consolidara um campo de posições em favor de uma concepção de gestão democrática, houve reações por parte da Secretaria de Educação e do sindicato docente. Contudo, apesar das resistências e tentativas jurídicas, os conselhos acabaram por se transformar em UExs. As unidades executoras da rede municipal de Porto Alegre são as únicas, entre as pesquisadas em todo o País, que legalmente se encontram proibidas de captar recursos. A proibição, segundo depoimentos, foi uma forma encontrada pela administração pública para preservar os princípios da gestão democrática no Conselho de Escola. É necessário registrar que, tal como ocorre nas redes estaduais de ensino onde houve debate sobre as relações entre o Programa e a Gestão Democrática da Escola, Belém e Porto Alegre eram administrados pelo Partido dos Trabalhadores na ocasião da implementação do PDDE. Municípios que não implementavam ações específicas relacionadas à democratização da gestão escolar lidaram com a implantação das UExs de maneira menos tensa, mesmo quando se tratou de criar Conselhos Escolares, como ocorreu em Teresina, onde, pode-se concluir, a criação das UEx ofereceu parâmetros para o estímulo à descentralização de recursos. As experiências das UExs nas redes municipais indicam que o PDDE contribui para que os sistemas se organizem, normalizando órgãos como APM e Conselho de Escola. Contudo, tal como o observado em duas redes estaduais e duas Programa Dinheiro Direto na Escola 155 municipais, o Programa tensiona políticas que visam à democratização da gestão nas escolas públicas. As escolas públicas não são as únicas que têm direitos a beneficiarem-se do PDDE. Escolas de natureza pública não-estatal que atendem à modalidade educação especial podem também ser beneficiárias do Programa. A pesquisa buscou analisar o processo de implementação do Programa em tais instituições em dois Estados (RS e PI), por meio de coleta de dados em instituições educativas vinculadas à Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae). Em um Estado, a pesquisa transcorreu em uma escola de educação especial regular (MS). Para efeito de análise das características da UEx, detemo-nos no caso das Apaes, uma vez que a escola oficial de educação especial pesquisada mostrou ter as mesmas características das escolas regulares de ensino fundamental. Nos Estados do Rio Grande do Sul e Piauí, o PDDE foi implementado segundo a estrutura administrativa vigente nas instituições. Sendo a Apae uma pessoa jurídica, é ela própria uma unidade executora. Os recursos foram executados pelo escritório administrativo da mantenedora, não havendo descentralização para as unidades educativas da entidade. Essas recebiam os materiais comprados pelo escritório, após consulta aos dirigentes locais. Verificou-se, assim, que na Apae a gestão de recursos é centralizada, estando a instituição acima das exigências feitas às escolas oficiais para administrar os recursos. Os repasses promovidos pelo PDDE não produzem, portanto, qualquer efeito de estímulo à participação da comunidade. Após apresentar os dados referentes às características das unidades executoras nas redes e escolas pesquisadas, podem-se apresentar algumas considerações de ordem mais geral a respeito da natureza das UExs. A centralidade do diretor escolar ou secretários de Educação no gerenciamento dos recursos provindos do PDDE é registrada em diversos casos, especialmente em redes municipais. O formato da UEx, a esse respeito, não é fator determinante. As orientações sobre o funcionamento das UExs, segundo as informações coletadas nos diferentes Sistemas, dirigem-se preferencialmente aos profissionais envolvidos, não atingindo os pais e alunos, exceto na rede estadual do Pará, em que houve formação de todos os integrantes do Conselho Escolar. Verifica-se, no caso dos municípios de Porto Alegre e Belém e na rede estadual do Rio Grande do Sul, onde se encontravam em curso políticas de implementação da Gestão Democrática, que o FNDE fere a autonomia dos Sistemas ao impor a criação das unidades executoras como entidades de direito privado. Nesses casos, a implementação de duas políticas com prioridades diferenciadas produz tensionamento e interrupção no curso de discussões e práticas já estabelecidas. Somente nesses casos a criação da entidade de direito privado na escola é problematizada. Os depoimentos revelam uma tendência ao esvaziamento político dos Conselhos de Escola quando estes, na condição de UEx, centralizam suas ações na execução de recursos. São também os depoimentos recolhidos nas escolas que indicam haver limites à autonomia da UEx, pois observamos casos diversos em que fica claro que a gestão dos recursos não está exclusivamente nas mãos da entidade, mas centralizada pelo diretor escolar ou pela própria Secretaria de Educação. 156 Programa Dinheiro Direto na Escola Faz-se necessário observar que o Programa tem forte capacidade indutora na organização dos sistemas. Esse potencial ganha materialidade na indução à criação das UExs, o que chega a se constituir como parte dos movimentos iniciais de organização da rede e, em vários casos, como único espaço potencial de participação, ainda que precária, da comunidade na escola. 4.2 Relação entre os entes federados e Estado/sociedade A relação entre os entes federados que envolvem a implementação do PDDE nos diferentes Estados e municípios tem mais semelhanças do que diferenças. Isso ocorre em razão de a maioria dos secretários de Educação ter assumido na íntegra a proposta do Programa logo após o seu lançamento pelo governo federal. Particularmente, a política da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo privilegia, desde a primeira gestão do PSDB, a descentralização de recursos para as unidades executoras. No caso das escolas da rede estadual de São Paulo, a adesão ao PDDE foi de 100%; só mais recentemente houve um caso de nãoadesão de um diretor de uma escola da grande São Paulo, fato que vem sendo alvo de crítica por parte dos técnicos da Secretaria. No caso do Estado do Pará, houve resistência por parte do Sindicato dos Trabalhadores em Educação, que chegou a entrar com ação judicial no Tribunal de Justiça do Estado. A intenção foi barrar a Portaria nº 225/96, em que a Secretaria de Estado de Educação decretava os Conselhos Escolares como unidades executoras de direito privado, habilitando-os a receberem os recursos do governo federal. Contudo, em última instância, prevaleceu a decisão da Secretaria. No caso do Rio Grande do Sul, a resistência veio da Associação dos Círculos de Pais e Mestres/Federação e do CPERS/Sindicato, que também rejeitavam a proposta da Secretaria da Educação do Estado em tornar os Conselhos Escolares em unidades executoras, utilizando jurisdicialmente a Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia Legislativa. Porém, os motivos diferem dos do Pará, uma vez que a opção da Secretaria da Educação em converter os CEs em UEx estava ligada à idéia de fortalecimento da gestão democrática por meio dos Conselhos. Por outro lado, o dilema vivido pelo CPERS estava entre o fortalecimento da gestão democrática da escola por meio da autonomia dos Conselhos e a possibilidade de torná-los entidades de direito privado, o que fez com que se manifestasse contrário à decisão da Secretaria, optando pelos Círculos de Pais e Mestres como UExs. Tal situação favoreceu os CPMs, e, com a obrigatoriedade das instituições das UExs em 1997, a ACPM fez interlocução direta com o Ministério da Educação no sentido de garantir a transformação dos CPMs em UExs, situação legalizada em 2001, pela Lei nº 11.695/2001, que torna os CPMs em UExs responsáveis pelo recebimento e administração dos recursos do PDDE. Tal situação também não modificou a posição das escolas da rede estadual, que, no processo de implantação do PDDE, aderiram amplamente ao Programa, sendo que a maioria recebe os recursos diretamente do FNDE. Programa Dinheiro Direto na Escola 157 Quanto à responsabilidade por possíveis irregularidades na prestação de contas do Programa, em alguns Estados, quem é auditado é o presidente da UEx, que, na maioria dos casos, é o diretor da escola, realidade constatada no Piauí, em que a Secretaria se responsabiliza por acompanhar o caso e, quando necessário, instala auditoria para investigar o diretor da escola. Já em Mato Grosso do Sul, a situação difere, pois quem responde por alguma irregularidade na administração do PDDE no FNDE e no Tribunal de Contas é a Secretaria de Estado de Educação. No caso dos municípios, houve mais adesões ao Programa do governo federal do que resistências, situação diferente apenas em Porto Alegre. No caso de Teresina (PI), a Secretaria Municipal de Educação aderiu ao PDDE desde sua implementação em nível nacional, quando buscou a interlocução com o MEC, mediada pela Demec-Piauí, no sentido de viabilizar a operacionalização do Programa. Em Pirassununga (SP), o município estabeleceu contato com o PDDE em 1997, por meio de materiais enviados pelo MEC à Secretaria Municipal de Educação. Em Belém (PA), ao longo da existência do Programa, a Secretaria Municipal de Educação preocupou-se apenas em repassar as informações e orientações aos dirigentes das escolas, adotando a regulamentação definida pelo MECFNDE. No caso de Campo Grande (MS), a relação com o governo federal também não é diferente, sendo encarados de forma positiva pelos técnicos tanto o Programa quanto a criação das UExs. Portanto, Porto Alegre (RS) é o único caso no universo da amostra da pesquisa em que o município se pronunciou contrário à forma como o governo federal estabeleceu a implementação do PDDE. Inicialmente, com a exigência da criação das unidades executoras para a transferência de recursos da União, a Secretaria Municipal de Educação iniciou um processo de negociação no MEC, buscando garantir o repasse com a organização funcional e administrativa existente na rede, o que lhe foi negado. O embate continuou por meio de uma batalha jurídica, tendo como mediação a Procuradoria do município com vistas a assegurar que os Conselhos Escolares administrassem os recursos sem que fossem transformados em UExs, uma vez que a descentralização financeira já fazia parte do projeto de gestão democrática da educação de Porto Alegre e foi um processo construído juntamente com os CEs. Os recursos seriam administrados com intermediação da Smed e com controle social da comunidade por meio dos Conselhos. Porém, o embate jurídico esbarrava na Resolução nº 3 do MEC-FNDE, que impossibilitava a ação da Secretaria e que obrigou sua adaptação às normas do Programa. Passado o impasse jurídico, a Smed teve que se reorganizar, visando à adaptação das escolas às exigências do governo federal, pois, nesse processo, a Smed sofreu pressão também por parte dos diretores das escolas, em decorrência do prazo estabelecido pelo MEC para recebimento dos recursos. A Smed passou a ter um papel de orientação do Programa, e, em caso de verificar algum problema na prestação de contas, mesmo sendo responsável, quando necessário, a auditoria é feita nas escolas. 158 Programa Dinheiro Direto na Escola 4.3 O impacto financeiro do PDDE nas escolas da amostra O Programa Dinheiro Direto na Escola assumiu um importante papel ao estimular outras políticas de descentralização de recursos, seja na esfera federal, seja nas esferas locais. Assim, como evidenciam os dados da pesquisa, o PDDE terminou por induzir a instituição de mecanismos próprios de repasses de recursos para as escolas públicas, por intermédio das unidades executoras ou por Regime de Adiantamento. A única rede que tem somente o PDDE como recurso descentralizado é a rede municipal de Pirassununga. As escolas pesquisadas, em geral, relataram a instituição de mecanismos próprios de arrecadação de recursos, normalmente pela promoção de atividades ou eventos, a exemplo de bingos, rifas ou festas, além do recebimento de recursos doados pela própria comunidade. Tais atividades objetivam complementar os recursos públicos repassados, suprindo, assim, outras necessidades das escolas. A única exceção em relação a essas estratégias foi o Município de Porto Alegre, onde é explicitamente proibida, por parte do Sistema de Ensino, a instituição de tais mecanismos. Embora de extrema importância, nem sempre as informações sobre os recursos criados pelas próprias escolas estiveram disponíveis para a equipe, seja por dificuldade de cálculo, seja pelo argumento de que esses recursos são tão pequenos que "não valem a pena ser destacados" (escolas estaduais do Piauí e de São Paulo e escolas municipais de Belém, Teresina e Pirassununga). No sentido de realizarmos a análise do impacto financeiro do PDDE nas escolas da amostra, na página seguinte, apresenta-se a tabela de comparativo dos recursos administrados pelas escolas, com exceção dos dados do Programa Nacional de Alimentação Escolar, o qual é escolarizado em parte dos Estados da amostra (MS, PI, RS), pois se considerou que, além de tais recursos terem destinação específica, não são comuns para todas as escolas pesquisadas. O procedimento para análise da tabela será a correlação dos dados, considerando os seguintes aspectos: 1) a importância do PDDE em relação ao total de recursos administrados pela escola; 2) importância do PDDE em relação aos recursos estaduais ou municipais descentralizados; 3) mecanismos de descentralização de recursos estaduais ou municipais e 4) a importância dos recursos gerados pela própria escola em relação ao total de recursos administrados em âmbito local. A importância do PDDE em relação ao total de recursos administrados pelas escolas a) No âmbito das escolas estaduais, existem diferenças regionais importantes na amostra da pesquisa: a escola do Piauí é a única em que o PDDE é altamente significativo, pois representou 63% do total de recursos administrados em 2004. Em ordem decrescente de importância, o PDDE representou 36% dos recursos administrados na escola do Pará; 27% no Mato Grosso do Sul; 24% em São Paulo e 6% no Rio Grande do Sul. Programa Dinheiro Direto na Escola 159 EF 6.596,40 8.987,00 8.200,00 729 1.087 1.292 506 77 65 12.000,00 10.195,23 10.000,00 PDE 56 57 6.071,87 10.000,00 Outros 8.250,00 34.221,31 13.981,00 6.138,17 Repasse do Tesouro Estadual 53 5.706,00 9.000,00 9.807,84 44.029,08 6.277,50 4.691,50 Regime de adiantamento Recursos administrados pela direção 5.494,90 15.596,40 29.237,00 48.493,18 35.739,97 22.169,80 8.806,00 16.776,17 46.913,68 26.600,00 Total 1.354,00 2.800,00 2.651,00 54 1.530,50 Recursos criados pela escola 5.494,90 15.596,40 29.237,00 48.493,18 37.093,97 23.700,30 11.457,00 16.776,17 49.713,68 26.660,00 Total de recursos administrados pela escola 54 Inclui recursos do Tesouro Estadual de MS para o atendimento do ensino fundamental e médio. Inclui R$ 2.151,00 de comercialização de carteirinhas e R$ 500,00 de arrecadação própria. 55 A escola estadual do Piauí recebeu, em 2004, R$ 62 mil referentes ao PDDE Emergencial. Entretanto esse valor foi retirado da tabela por apresentar um desvio muito grande para um recurso que, na realidade, é uma exceção. 56 Recursos recebidos do governo federal em parceria com a prefeitura para aquisição de livros didáticos (Cantinho da leitura). 57 Inclui R$ 4.471,87 do Orçamento Participativo e R$ 1.600,00 destinados a salas de acompanhamento de crianças com necessidades especiais. 53 5.494,90 6.457,00 704 58 Outras Total de etapas matrículas PPDE da EB 6.463,80 333 1.059 4.114,50 1.735 2.151 55 1.035 2.121 10.638,00 606 1.034 2.884,60 891 6.401,50 Fonte: Estudos de Casos dos Estados. 726 MS 416 PA 1.086 PI 428 RS 891 SP Escolas municipais 646 Campo Grande 729 Belém 1.010 Teresina 1.292 Porto Alegre 441 Pirassununga Escolas estaduais Recursos administrados pela Uex Recursos estatais repassados para a escola Programa Dinheiro Direto na Escola Matrículas Tabela 1 – Comparativo dos recursos administrados pelas escolas estaduais e municipais da amostra nacional no ano de 2004 160 b) No caso das escolas municipais, os dados evidenciam que a maior representatividade do PDDE é na escola municipal da Pirassununga, pois esse é o único recurso descentralizado, representando, portanto, 100%. Nas demais escolas municipais, o peso do PDDE varia entre 42% (Belém) e 17% (Campo Grande e Porto Alegre), sendo um valor intermediário o apresentado pela escola municipal de Teresina, 31%. A importância do PDDE em relação aos recursos descentralizados, via UEx ou Regime de Adiantamento (excluindo a arrecadação própria) a) O programa é mais significativo na escola estadual do Piauí, onde representa 63% dessa modalidade. No caso da estadual do Pará, o recurso é bastante relevante, embora seja apenas 47% dos recursos descentralizados. b) Na escola estadual do Mato Grosso do Sul, em 2004, o PDDE representou 53% desses recursos. c) Os dados das escolas estaduais do Rio Grande do Sul e de São Paulo revelam que esses Estados, no contexto da diversidade regional brasileira, têm maior autonomia em relação aos recursos descentralizados pelo governo federal, uma vez que, considerando apenas os recursos do PDDE e dos governos estaduais, o primeiro representa 6% e 24%, respectivamente. d) Em geral, os recursos municipais repassados são superiores ao valor do PDDE, com exceção da escola municipal de Teresina, onde o PDDE representou 52%. e) Nas escolas municipais de Campo Grande e Belém, o PDDE representou 42% dos recursos regulares, enquanto que, em Porto Alegre, representou somente 19%. Mecanismos de descentralização de recursos do governo local (os cálculos desse tópico excluem os recursos da arrecadação própria, PDE e outros repasses eventuais) a) Duas redes estaduais (MS e PI) optaram por descentralizar recursos para as escolas exclusivamente por intermédio das unidades executoras, assim como as redes municipais de Teresina e de Porto Alegre. b) São Paulo adotou as duas modalidades, transferindo recursos para as UExs concomitantemente aos repasses por Regime de Adiantamento, embora a maior parte dos recursos públicos estaduais seja administrada pela UEx (76%), reforçando o mesmo mecanismo do PDDE, a Unidade Executora, nesse caso, a Associação de Pais e Mestres. c) O Estado do Pará descentraliza seus recursos pelo regime de adiantamento para o diretor da escola, representando, assim, 53% dos recursos por essa via de administração. Programa Dinheiro Direto na Escola 161 d) O Rio Grande do Sul descentraliza os recursos para a conta bancária do diretor da escola, cuja administração ocorre sob gestão do Conselho Escolar, representando 94% dos recursos descentralizados; e) As prefeituras de Campo Grande e de Belém também optaram pela sistemática de Regime de Adiantamento para a descentralização, representando 25% e 58%, respectivamente, do total de recursos administrados. Em Porto Alegre, além dos repasses regulares municipais, a prefeitura provê a escola de recursos do Orçamento Participativo e do Apoio para as salas de educação especial. Recursos criados nas próprias escolas Relacionando os valores criados na própria escola e o total de recursos administrados em âmbito local, pode-se verificar que tais recursos são mais relevantes na escola estadual do Pará (23%), valor bem superior à arrecadação própria das escolas do Mato Grosso do Sul e do Rio Grande do Sul (6%) e da escola municipal de Campo Grande (menos de 4%). No sentido de compreender as diferenças regionais no que se refere à descentralização de recursos para as escolas e ao compromisso do poder público com uma maior qualificação do ensino nas escolas da amostra, a seguir, apresenta-se uma tabela com o valor-aluno-ano recurso descentralizado. É importante destacar que o cálculo tem por base o total de recursos administrados pela escola e o total de matrículas, independentemente da etapa da educação básica atendida. Tal procedimento é motivado pela compreensão de que os recursos, embora muitas vezes destinados a etapas específicas de atendimento, como é o caso do PDDE e do PDE, atingem todos os alunos da escola, pois, diante da falta de políticas que descentralizem recursos para a educação infantil e o ensino médio, as escolas de atendimento misto necessitam utilizar os poucos recursos descentralizados em benefício de toda a população atendida. Tabela 2 – Valor-aluno-ano recurso descentralizado para as escolas da amostra Estado Escolas municipais Escolas estaduais MS PA PI RS SP 52,69 21,39 26,90 37,53 10,86 22,38 5,33 7,91 48,08 29,92 Fonte: ???? Os dados de valor-aluno-ano recurso descentralizado revelam disparidades entre as regiões e redes de ensino pesquisadas, conforme descrito a seguir: 162 Programa Dinheiro Direto na Escola a) O maior valor apurado é o da escola municipal de Campo Grande (R$ 52,69), embora, nesse mesmo Estado, a escola estadual apresente o terceiro lugar em valor-aluno-ano recurso descentralizado: Mato Grosso do Sul, R$ 22,38. No Rio Grande do Sul, a escola da rede estadual tem o maior valor-alunoano recurso descentralizado da amostra estadual, qual seja, R$ 48,08, e o segundo maior valor municipal (Porto Alegre – R$ 37,53). Os menores valores-aluno-ano recursos descentralizados nas escolas estaduais estão no Pará (R$ 5,33) e no Piauí (R$ 7,91), ou seja, elas administram um valor aluno-ano que representa somente 11% e 16%, respectivamente, do maior valor verificado (Campo Grande). Apesar da situação bastante desvantajosa da escola estadual do Piauí, Teresina tem o terceiro maior valor pesquisado entre as escolas municipais (R$ 26,90), seguido por Belém (R$ 21,39); enquanto o menor valor é Pirassununga (R$ 10,86), pois, nesse caso, não existe qualquer outro recurso na escola além do PDDE. A diferença entre o menor e o maior valor-aluno-ano recurso descentralizado é de cerca de cinco vezes na rede municipal e de nove vezes na rede estadual. Em geral, os dados revelam que a maior parte das escolas da amostra municipal tem um valor-aluno-ano recurso descentralizado bastante superior ao das escolas das redes estaduais dos seus próprios Estados, como é o caso de Campo Grande (MS), Belém (Pará) e Teresina (PI). As exceções ficam por conta de Porto Alegre (RS), cuja diferença não é tão acentuada (22%), e de Pirassununga, onde o valor-aluno estadual é quase o triplo do valor no município. Em relação às escolas de educação especial, a amostra da pesquisa contemplou três instituições, duas Apaes (RS e PI) e uma pública estadual (MS). Tendo em vista a diversidade de organização, as diferenças no montante de recursos administrados e os dados por anos disponibilizados, não foi possível empreender uma análise comparativa das mesmas, mas considerações sobre os aspectos financeiros no interior de cada escola. No caso da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais do Rio Grande do Sul, com exceção das transferências referentes à merenda escolar (R$ 2.831,20) e os recursos criados pela própria escola (aos quais não tivemos acesso), em 2003, verifica-se a administração de recursos estatais em um montante de R$ 208.129,32, distribuídos nos seguintes porcentuais: 4% PDDE; 53% INSS e 43% prefeitura municipal. Assim, é possível verificar a pequena participação do PDDE no total dos recursos públicos recebidos pela Apae/RS. O per capita aluno-ano de recursos públicos administrados é de R$ 1.107,07, se consideradas apenas as matrículas admitidas no Censo Escolar (188), e de R$ 525,58, se considerado o total de matrículas (396). No âmbito da escola de educação especial pesquisada em Teresina – Apae, do total de R$ 413.396,85 administrados pela entidade, em 2002, 92% referem-se a recursos públicos, denotando a grande dependência dessa instituição em relação ao Estado. A arrecadação própria, apenas 8% dos recursos administrados, é constituída por contribuição de sócios (30%) e doações (70%). A arrecadação pública é distribuída da seguinte forma: 3,1% PDDE; 7,5% Exame do Pezinho; 33,1% Secretaria de Assistência Social do Município; 30,6% Sistema Único de Programa Dinheiro Direto na Escola 163 Saúde; 7,3% Prefeitura Municipal de Teresina; 16,4% do Ministério da Educação e 2% Serviço Social do Estado. O PDDE tem uma representatividade mínima em relação aos recursos administrados pela Apae, de apenas 3,1%. A escola de educação especial pesquisada em Mato Grosso do Sul é da rede estadual; portanto, tem características bem diferenciadas das Associações de Pais de Amigos dos Excepcionais no que diz respeito ao montante de recursos recebidos e administrados. Em 2004, a escola administrou diretamente, excluindo os recursos da merenda escolar (R$ 5.148,00), apenas R$ 23.788,40, conforme as seguintes entradas: PDDE (11,7%), Secretaria de Assistência Social (84,1%) e repasse do Tesouro Estadual (4,2%). O per capita de recursos públicos administrados diretamente pela escola foi de R$ 139,11, sem que esses valores incluam gastos, como, por exemplo, pagamento de salários. As escolas de educação especial filantrópicas, embora beneficiárias do PDDE, não se submetem aos mesmos critérios de administração descentralizada, principalmente no que se refere à exigência da unidade executora, já que os recursos são administrados centralizadamente pela entidade mantenedora. No caso das escolas públicas, além da maior relevância dos recursos do Programa, este tem um maior impacto, em especial, por estimular o processo de descentralização de outros recursos públicos. Por fim, é importante destacar que o valor-aluno-ano recursos descentralizados evidenciou as diferenças entre regiões e redes de ensino, dadas as grandes discrepâncias nos valores descentralizados, revelando disparidades na oferta educacional e no grau de autonomia financeira. Isso denuncia a necessidade de maiores esforços por parte do poder público para avançar no sentido de proporcionar melhores condições para a qualificação da educação pública nas regiões mais pobres do País, haja vista que o PDDE não colaborou para diminuir o fosso existente, principalmente entre Norte/Nordeste e Sul do Brasil. 4.4 Democratização da gestão Com base nos dados coletados, apresentaremos alguns pontos importantes, entre os estudos de casos realizados, para situar o processo de democratização da gestão escolar, um dos pilares centrais da criação do PDDE, a partir dos seguintes eixos fundamentais ao processo de tomada de decisão sobre a aplicação dos recursos do PDDE, aglutinando-se, portanto, um conjunto de informações que podem nos oferecer pistas sobre o papel do PDDE na configuração de um padrão de gestão, afinado com a redefinição do papel do Estado brasileiro: Participação e autonomia • De modo geral, prevaleceu o posicionamento por parte do Sistema Estadual de que há pouca participação dos sujeitos escolares, enquanto que, do ponto de vista dos sujeitos escolares entrevistados, se diz haver alguma participação nas UExs, sobretudo dos diretores e técnicos. 164 Programa Dinheiro Direto na Escola • Os dados revelam que, quando há participação, prepondera o papel do diretor e, às vezes, do tesoureiro das UExs, excetuando-se a amostra da rede municipal de Porto Alegre, em que se verifica a existência de mecanismos coletivos de participação que foram sendo aperfeiçoados ao longo dos anos e da rede estadual do Rio Grande do Sul, em que as decisões são tomadas pela equipe diretiva da escola, dos membros do CE e daqueles atuantes na UEx (CPM). • Na rede municipal do Pará, as decisões são da UEx, com o apoio do Conselho Municipal de Educação, resguardada a autonomia do Colegiado Escolar; contraditoriamente, a implantação do PDDE ajudou a diminuir a participação mais regular dos conselheiros pelo excesso de atribuições a eles confiadas: enquanto que, no Piauí, são divididas entre a UEx e a Seduc (Orçamento Popular); no MS, parece haver pouca autonomia para decidir, o que é feito pela Seduc, ficando a participação de professores e membros da APM restrita à pesquisa de preço para aquisição dos materiais. • Em SP, em Pirassununga, a APM (sede do consórcio das escolas) vem assumindo um maior volume de responsabilidades, em que a centralidade do diretor escolar ainda é grande, diferente da rede municipal de Porto Alegre, onde os conselheiros do CE demonstraram ser mais atuantes. No Piauí, a Apae (UEx) recebe e administra os recursos e, segundo a funcionária responsável pela administração do Programa, tem autonomia para gestão financeira do Programa e de outros recursos captados, embora sugira haver limites por parte do MEC na definição das rubricas custeio e capital. Os entrevistados indicaram não haver participação de todos os segmentos na priorização dos recursos, ficando a cargo da direção escolar. No MS, a unidade executora (APM) é responsável pelos recursos do PDDE; os diversos segmentos escolares são consultados, mas as decisões finais são definidas, sobretudo, pela direção escolar. • No RS, no caso da amostra de educação especial, a situação é diferente das outras unidades Federadas porque a Apae é mantida e administrada pelos pais e outros envolvidos com a causa dos portadores de necessidades especiais, mas, contraditoriamente, não há participação dos pais nas decisões do PDDE, sendo do escritório administrativo da mantenedora tal definição. • Na rede estadual do Pará, o PDDE induziu a participação na gestão de recursos financeiros de outras fontes e melhorou as condições de equipamentos de uso coletivo, enquanto que, na rede municipal, boa parte dos entrevistados evidenciou a pouca autonomia dos sujeitos escolares para definição das prioridades de aplicação dos recursos. • Ainda que haja algumas críticas, a imagem do Programa para os Sistemas e para as Escolas e/ou UExs é positiva de modo geral. Grande parte dos sujeitos entrevistados demonstrou temer sua extinção, embora haja quem critique a necessidade imposta pelo Programa de criação de UEx como ente privado dentro das escolas públicas. Programa Dinheiro Direto na Escola 165 • De modo geral, prevaleceu a idéia, por parte dos Sistemas estaduais e municipais, de que há autonomia das UExs nas decisões de priorização do uso dos recursos do PDDE, ainda que alguns conselheiros das UExs julguem o contrário. No caso específico da rede estadual do RS, a autonomia circunscreve-se muito mais à captação de recursos de outras fontes. • Quanto à amostra de educação especial, verifica-se que a gestão do PDDE se dá por intermédio das Apaes, havendo particularidades em sua operacionalização, como no Piauí, onde a direção da escola participa da pesquisa de preços dos materiais a serem adquiridos. Os estudos revelam que, nesse caso, também prepondera a centralidade da direção escolar nas decisões e a Apae tem autonomia para a decisão final na aplicação dos recursos. Em Campo Grande, a escola especial possui um colegiado, mas é a APM que funciona como UEx, preocupada muito mais com os problemas internos e prestação de contas, não interferindo nas decisões. Apesar dos discursos participacionistas dos entrevistados, ainda há indícios de centralidade de decisões na direção. No RS, na amostra de educação especial de Porto Alegre, a administração dos recursos do PDDE é feita pelo escritório administrativo da mantenedora, conforme já assinalado anteriormente. Eleições diretas Quanto às eleições, pode-se dizer que, em grande parte dos casos estudados, há eleições diretas para dirigentes escolares, excetuando-se a rede estadual de MS, inclusive na unidade educação especial, cujo dirigente é escolhido por convite ou aclamação. Na rede estadual de São Paulo, o provimento efetiva-se por concurso público, com a especificidade de Pirassununga, onde não há a figura do diretor escolar, mas de assistente de direção, que é escolhido por meio de concurso público, embora o responsável pela gestão dos recursos financeiros seja o encarregado do Setor de Educação da prefeitura, que é seu cargo de confiança. Grau de informação De modo geral, pode-se afirmar que os depoimentos e estudos realizados revelam que o grau de informação dos segmentos envolvidos com o PDDE ainda é incipiente, especialmente nas amostras da rede estadual do Piauí e do Mato Grosso do Sul e da rede municipal de São Paulo. Nessa última, a exceção dá-se por parte da direção e dos professores, que detêm algum conhecimento sobre a operacionalização do Programa. Conselho Deliberativo antes do PDDE Na maioria das unidades da amostra, havia Conselho Deliberativo (CD) antes da implantação do PDDE, excetuando-se os casos de Mato Grosso do Sul 166 Programa Dinheiro Direto na Escola em suas amostras das duas redes e na da rede municipal de São Paulo, em que o PDDE funcionou como um indutor da criação desses colegiados. No Rio Grande do Sul, por exemplo, antes do PDDE, o Conselho Escolar possuía CD, tendo a CPM como sujeito co-participante na democratização da gestão escolar. Execução do Programa Rede estadual A execução do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) pode ser evidenciada por meio do levantamento dos dados nos Estados e municípios da amostra, destacando-se os seguintes elementos norteadores: relação das escolas com o gestor do Sistema, determinação dos gastos, prestação de contas e estrutura de gestão financeira. A adesão ao PDDE ocorreu em 1995, ano de sua implantação pelo FNDE, nos cinco Estados pesquisados (Pará, Piauí, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul). O processo de implantação tem início, no Estado do Pará, no ano de 1995 e continuidade no ano de 1996, com o repasse dos recursos sendo feitos para a Secretaria de Educação (Seduc), entidade executora (EEx) das escolas da rede de ensino, que distribuía os recursos entre as escolas, de acordo com o número de matrículas registrado no Censo Escolar. A Seduc confeccionou cartilhas para orientar as unidades executoras, ou seja, os Conselhos Escolares, sobre como gastar os recursos (capital e custeio), atendendo às normas de funcionamento do programa definidas pelo Conselho Deliberativo do FNDE. No Estado do Piauí, os Conselhos Escolares foram revitalizados tendo em vista as novas funções assumidas enquanto unidades executoras. A Secretaria de Educação (Seduc) produziu uma série de documentos a fim de que as escolas se habilitassem a receber os recursos do PDDE, assim como de outros programas. A partir de 2004, com base em Instrução Normativa, a Seduc incentiva o estabelecimento de parcerias por meio de premiação ou bônus. Já em Mato Grosso do Sul, por ocasião da implantação do Programa, a Secretaria de Estado de Educação (SED) realizou palestras, distribuiu cartilhas e prestou orientação à direção das escolas e ao presidente das unidades executoras, as APMs. Observou-se que a SED não interfere no desempenho dessas unidades, limitando-se a encaminhar à escola o documento a ser preenchido pelo dirigente da APM, com a finalidade de cadastrá-lo no Sistema PDDEnet para o FNDE. No caso do Rio Grande do Sul, a Secretaria Estadual de Educação estimulou a constituição de unidades executoras, entendendo que o PDDE faz parte do processo de descentralização e de autonomia financeira. O relacionamento do Departamento de Planejamento (Deplan) com as escolas é intermediado pelas coordenadorias regionais, que, entre outras tarefas, repassam as fichas às escolas com menos de 50 alunos, que, portanto, não possuem uma unidade executora. Essas escolas utilizam os recursos somente para manutenção (custeio), conforme determinação nacional. Programa Dinheiro Direto na Escola 167 Um aspecto a ser destacado que aponta diferença em relação aos demais Estados da amostra, foi encontrado em São Paulo. Nesse Estado, a implantação do PDDE diferencia-se na medida em que ocorreu sob a forma de gestão compartilhada entre a Fundação de Educação (FDE) e a Secretaria de Estado de Educação (SEE). A FDE estabeleceu convênios com as unidades executoras, ou seja, as Associações de Pais e Mestres, para o repasse dos recursos. A realização de convênios entre a FDE e a APM já era uma prática no sistema para o recebimento de recursos de programas federais. Coube às Delegacias de Ensino então existentes, inicialmente, a função de intermediar as remessas dos recursos para as escolas, e à Secretaria de Educação, de disciplinar a implantação do Programa. A gerente de convênios da SEE repassa orientações às diretorias de ensino, e estas, por seu lado, organizam as atividades em suas regiões para orientar os diretores escolares. No que se refere à decisão sobre a aplicação dos recursos nas escolas pesquisadas, pode-se verificar que essa decisão, no sentido de uma participação mais direta, está atrelada à natureza da unidade executora. Por exemplo, no Pará, a decisão cabe ao Conselho Escolar, constituído pelos diferentes segmentos da comunidade, com base no levantamento das prioridades da escola. Porém, constatou-se que as reuniões para a definição dos gastos não contam, geralmente, com a representação de todos os conselheiros. No Piauí, as decisões são tomadas nos Conselhos, o levantamento de preços é realizado por diversos conselheiros, e as planilhas são comparadas. Assim, alguns bens são adquiridos em comércios diferentes, conforme o menor preço. Apesar desses procedimentos, observa-se, no entanto, uma preponderância do diretor da escola na administração dos recursos descentralizados, o que se soma às demais responsabilidades de âmbito administrativo e pedagógico. Em São Paulo, a Secretaria de Educação estimula as escolas no sentido de que os gastos sejam maiores com manutenção (custeio), favorecendo o seu funcionamento. Porém, a decisão quanto à aplicação é da direção com a APM. A direção e a vice-direção fazem a tomada de preços que antecede as compras, assim como fazem a prestação de contas ao FDE. No Rio Grande do Sul, observou-se que a decisão ocorre de forma conjunta entre CPM, direção e Conselho Escolar, observando-se o mesmo procedimento em Mato Grosso do Sul, em que a APM participa da decisão juntamente com a direção e o Colegiado Escolar. Pode-se observar que, dos cinco Estados pesquisados, em quatro deles, as escolas relacionam-se diretamente com a Secretaria de Educação, que as orienta, por meio das diretorias regionais, como no Rio Grande do Sul, ou repassa orientações diretamente às escolas, como nos Estados do Pará, Piauí e Mato Grosso do Sul. Um ponto comum observado com relação à gestão financeira é que, na estrutura organizacional das Secretarias de Estado de Educação dos Estados do Pará, Piauí, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, há um setor responsável pela prestação de contas. No Pará, encontra-se o Setor de Supervisão de Prestação de Contas, com um técnico designado para essa finalidade. 168 Programa Dinheiro Direto na Escola No Piauí, dois setores relacionam-se com as escolas para orientações e encaminhamentos diversos, entre eles, os relacionados ao PDDE. Um é o Setor de Conselhos Escolares, e o outro é o Setor de Prestação de Contas, não sendo identificado, neste último, um técnico responsável. Um ponto a ser destacado é o fato de que, antes de ser encaminhada à Secretaria, a prestação de contas é apreciada pelo Conselho Escolar. No caso de irregularidade na prestação, o setor responsável determina um prazo para que o diretor apresente à Secretaria a regularização da prestação de contas. Caso isso não aconteça, determina a devolução dos recursos que não foram devidamente executados e informa à auditoria para que apure os fatos, investigando a gestão do diretor da escola, que responde pela UEx. Em Mato Grosso do Sul, a Gerência de Recursos Financeiros, parte integrante da Superintendência de Gestão Operacional da Secretaria de Educação, conta com uma pessoa responsável no cargo de gerente administrativo e financeiro, responsável pelo cadastro, pelo acompanhamento e pela prestação de contas. No entanto, o controle das contas é feito pela Coordenação Financeira (Cofin), localizada na Superintendência de Apoio Operacional, que faz o acompanhamento de toda a parte que se refere aos recursos financeiros das escolas estaduais e emite o parecer final. Verificou-se que, no Rio Grande do Sul, a prestação de contas é encaminhada às coordenadorias regionais, que a repassam ao Departamento de Planejamento, setor responsável pelo recebimento, contando com vários técnicos na Secretaria de Educação. A prestação de contas não é encaminhada para um setor da Secretaria de Educação, com exceção do Estado de São Paulo. Embora a Secretaria de Educação elabore as orientações referentes ao Programa, a prestação de contas é administrada pela FDE, por intermédio de três técnicos e mais os contratados (terceirizados), em função da demanda de trabalho. Isso significa que a FDE desempenha um papel relevante na gestão do sistema. Trata-se de opção política da atual administração por um modelo de gestão que privilegia as parcerias entre escolas e instituições. Rede municipal O PDDE foi implantado em 1995 em três municípios (Teresina, Campo Grande e Porto Alegre); em 1997, em Belém; e, em 1999, em Pirassununga, cuja especificidade é o consórcio realizado entre cinco escolas municipais (duas urbanas e três rurais). Em quatro municípios (Belém, Teresina, Campo Grande e Porto Alegre), a Secretaria de Educação dispõe de um setor encarregado pelo acompanhamento e pelo recebimento da prestação de contas do PDDE. No caso de Pirassununga, o setor está localizado na própria prefeitura. A partir de 1998, no município de Belém, quando os recursos foram descentralizados para as escolas aos Conselhos Escolares, a Secretaria de Educação do Município (Semec) repassou informações e orientou os dirigentes escolares, Programa Dinheiro Direto na Escola 169 utilizando cartilhas elaboradas pela própria Secretaria e orientando a consulta na Internet. Várias oficinas e cursos de capacitação foram realizados com o objetivo de prestar orientações aos gestores e conselheiros. Um aspecto que merece ser ressaltado é a orientação oferecida aos diretores pela Semec no sentido de que seja considerado o papel político do Conselho Escolar como órgão de decisão coletiva. Com isso, o PDDE reforçou a criação de novos Conselhos, ampliando o seu número na rede municipal. No ano da implantação do PDDE em Teresina, a mediação era feita pela antiga Delegacia do MEC (Demec), que, por intermédio dos seus diretores, fez as primeiras capacitações, dirigidas principalmente aos técnicos da Semec. Esses técnicos, por sua vez, passaram a realizar reuniões, no início de cada ano, com os diretores e vice-diretores das escolas. Outro procedimento observado diz respeito à criação dos Conselhos Escolares, responsáveis, enquanto unidades executoras, pelo PDDE e demais programas. A direção da escola é representativa na gestão do PDDE para o sistema. Na prática, é o diretor que se relaciona com a Secretaria do ponto de vista da gestão e prestação de contas do PDDE. No período de implantação do PDDE em Campo Grande, havia a Delegacia do MEC (Demec), que, por intermédio dos seus técnicos, treinados pelo FNDE, prestou as orientações iniciais. Atualmente, as orientações são feitas por meio de reuniões com os secretários das escolas. A Semed entrega um manual elaborado pela técnica responsável sobre como executar e prestar contas do PDDE. Como em Porto Alegre as unidades executoras (Conselhos Escolares) foram registradas em 1995, após intenso embate, a Semed solicitava inicialmente às escolas que incluíssem os valores no planejamento anual e, após a sua aplicação, apresentassem uma planilha com a especificação dos gastos. Uma situação diferenciada foi observada no município de Pirassununga, onde o dinheiro do PDDE era depositado, primeiramente, na conta da Secretaria de Educação. No ano de 2001, o secretário de Educação do município decidiu não solicitar o dinheiro do Programa, fato que se repetiu em 2003, apesar de a APM já ter sido instituída como unidade executora em 2002 na maior escola municipal de ensino fundamental. Esse fato chama a atenção, primeiro, pela intervenção do secretário de Educação no programa, impedindo as escolas de receberem os recursos e, certamente, trazendo prejuízos ao seu funcionamento; segundo, porque essa intervenção acontece em um programa cujos recursos são repassados diretamente à escola. Desse modo, o questionamento que cabe ser feito aqui é o seguinte: até que ponto o repasse do PDDE pode ser caracterizado como automático? Já nas escolas dos municípios da amostra, as prioridades de gastos são estabelecidas conforme descrição a seguir: Na escola de Belém, verificou-se que as prioridades são estabelecidas em reuniões sistemáticas do Conselho Escolar, a partir do levantamento feito com as categorias que o representam. O presidente e o tesoureiro do CE fazem a tomada de preços nas lojas e avaliam, no mínimo, três orçamentos. Em Teresina, a prefeitura, por meio da Secretaria de Educação (Semec), determina os gastos dos recursos do PDDE dirigidos às escolas municipais que não têm UEx. O repasse dos recursos é feito pela emissão de cheques, prevalecendo as 170 Programa Dinheiro Direto na Escola mesmas exigências das que possuem UEx com relação à prestação de contas. Na escola com UEx, as prioridades na definição de recursos são do Conselho Escolar. A partir de 2003, a Semec introduziu uma instância, ou seja, o Orçamento Popular nas Escolas (OP), com a participação de professores, funcionários, líderes de turma, líderes comunitários, associação de moradores e Conselho Escolar. Antes de serem aplicados os recursos, o plano passa por uma revisão técnica da Secretaria para os ajustes necessários. A direção apresenta os valores dos recursos recebidos e as possibilidades dos gastos, o que é seguido por um processo de levantamento de propostas. Após a definição das prioridades, estas são encaminhadas conforme o montante de recursos. Depois, voltam para o Conselho. Na escola de Campo Grande, a definição dos gastos está mais a cargo da direção, com o acompanhamento da APM. Porém, todas as planilhas e aplicação dos recursos, incluindo a do PDDE, são encaminhadas à Secretaria de Educação para aprovação, o que evidencia uma forma de controle da aplicação dos recursos. Em Pirassununga, até 2002, a decisão era da Secretaria de Educação. Quando a unidade executora foi constituída, cada escola, integrante de um consórcio, recebeu os materiais conforme decisão prévia tomada entre a direção e a escola, professores e APM. A decisão formal é da APM, mas o papel da direção (trata-se do assistente de diretor, encarregado do setor da Secretaria) é fundamental. Uma atuação significativa a ser destacada na determinação dos gastos foi observada na escola do município de Porto Alegre, em que o Conselho Escolar, com a presença de todos os segmentos na maioria das reuniões, se reúne a cada 15 dias ou até semanalmente, dependendo da quantidade dos assuntos a serem tratados. No município de Belém, a prestação de contas, contando com a ajuda dos professores, é encaminhada pela escola ao setor responsável pela prestação de contas da Semec. Um ponto a ser destacado é o papel do Conselho Municipal de Educação (CME), órgão que discute as políticas educacionais do município, quanto ao exame e aprovação da prestação de contas antes de ser encaminhada à Semec. Verificou-se, portanto, a partir de 1997 (governo do PT), o trabalho articulado entre a unidade executora e o CME. Em Teresina, enquanto o Departamento de Assistência ao Educando realiza um trabalho mais direto com os Conselhos, o Núcleo Financeiro repassa os recursos aos Conselhos e acompanha os registros das atas elaboradas. O acompanhamento dos gastos é feito com base no Plano de Aplicação, elaborado pelos Conselhos Escolares, responsáveis pelo planejamento, compra de material e organização de prestação de contas de recursos com a Secretaria Municipal de Educação. A prestação de contas é encaminhada pela escola de Campo Grande ao Setor da Secretaria de Educação denominado Grupo Orçamentário e Financeiro (GOF). Esse setor, com uma pessoa responsável, acompanha a aplicação dos recursos do PDDE, orienta as escolas e encaminha essa prestação ao FNDE. No município de Porto Alegre, a prestação de contas é feita pela escola à Secretaria de Educação, que a encaminha ao FNDE por meio de documentos, assinados pelo prefeito. Na Secretaria de Educação, há uma Assessoria de Planejamento, Finanças, Manutenção e Engenharia (Asseplan) responsável pela Programa Dinheiro Direto na Escola 171 operacionalização financeira do planejamento da Secretaria, onde são administrados todos os programas, entre eles, o PDDE. A operacionalização do setor é informatizada, e o planejamento é feito pelo sistema. O setor tem relação direta com o gabinete do secretário. A partir de 2002, no município de Pirassununga, quando as escolas consorciadas passaram a receber os recursos diretamente na conta da unidade executora, a prestação de contas passou a ser feita pela APM diretamente ao Setor de Contabilidade da prefeitura, com um técnico responsável que recebe essa prestação e a encaminha ao FNDE. No caso das escolas de educação especial pesquisadas, as APMs, em Teresina e Porto Alegre, não têm uma unidade executora, uma vez que os recursos são repassados à Entidade Mantenedora (EM), que faz a prestação de contas. Em Campo Grande, a escola pesquisada pertence à rede estadual de ensino, portanto, tem também a APM como unidade executora. A definição dos investimentos centrase nas mãos da direção, juntamente com o Colegiado Escolar, enquanto a APM reúne-se, praticamente, para aprovar as contas. Os dados levantados por meio das entrevistas, com base em um roteiro semi-estruturado de questões, nos Estados da amostra, indicaram, de modo, geral, que as unidades executoras (quando APM e CPM) estão efetivando um acompanhamento que pode ser caracterizado como formal, tanto no que se refere à definição da aplicação dos recursos quanto na prestação de contas do PDDE. Uma participação mais ativa na execução do programa pôde ser identificada quando os Conselhos Escolares constituem-se como unidades executoras. Dos cinco Estados pesquisados, as Secretarias de Estado de Educação, em quatro deles, por meio de um setor específico, desempenham a função de orientação e de acompanhamento da operacionalização do programa, assim como de análise da prestação de contas para encaminhamento ao FNDE. Excetua-se o Estado de São Paulo, onde a Secretaria desempenha somente a função de orientação do programa, cabendo ao FDE o papel de acompanhamento de sua execução, incluindo a administração da prestação de contas. Evidenciou-se que as Secretarias de Educação dos municípios desempenham papel semelhante ao das Secretarias Estaduais. No caso do município de Pirassununga, a prestação de contas é feita diretamente ao Setor de Contabilidade da prefeitura municipal. Os relatos dos sujeitos entrevistados nos municípios indicaram, também, maior participação na execução do Programa quando os Conselhos Escolares se constituem como unidades executoras. Verificou-se que a unidade executora (APM) acompanha o Programa, mas não se pode dizer que atua, diretamente, na sua execução, tendo em vista, em alguns casos, a dificuldade para a realização de reuniões, a centralidade das decisões na figura do diretor ou a interferência da própria Secretaria de Educação na definição da aplicação dos recursos. Com isso, pode-se dizer que o PDDE não favoreceu o mecanismo de controle social como forma de ação democrática, o que significa considerar o que expressa a sociedade, por intermédio dos seus segmentos representativos. 172 Programa Dinheiro Direto na Escola 4.6 Principais problemas, vantagens e sugestões de acordo com os sujeitos da pesquisa O presente item tem como finalidade a explicitação dos pontos de vista apresentados pelos sujeitos da pesquisa, sejam eles vinculados aos sistemas ou às escolas. Refere-se, pois, às concepções, às opiniões, às impressões e aos envolvimentos desses sujeitos no processo de implementação do Programa Dinheiro Direto na Escola, bem como, na maioria dos casos, na execução no período em que aconteceram as entrevistas nas escolas e nos sistemas. Trata-se, portanto, de uma espécie de avaliação que membros das Unidades Executoras e representantes dos sistemas educacionais que trabalham diretamente com o PDDE fazem acerca do processo de implantação e da execução do PDDE, de seus impactos sobre a gestão e acerca da relação escola-sistema, sobre a relação escola-comunidade, a organização da própria escola e a qualidade do ensino. Como nos demais aspectos expostos neste relatório, foram sistematizados dados referentes aos cinco Estados envolvidos na pesquisa, tomando-se sempre como referência uma escola estadual e uma escola municipal e, em alguns Estados, escolas/entidades que trabalham com educação especial. A primeira consideração a fazer em relação às respostas coletadas é que, embora o Programa seja nacional e o processo de implementação seja similar em todos os Estados, há singularidades que aparecem muito mais nas falas dos indivíduos do que em determinados documentos. Nesse sentido, a avaliação da eficácia do PDDE deve ser pensada em termos de como os indivíduos vivenciam sua execução, dimensionada pelo grau de ingerência ou não dos órgãos dos sistemas que orientam as UEx na condução do Programa. Sob essa ótica, entre as vantagens apresentadas, boa parte dos entrevistados afirma que o PDDE permitiu maior participação e democratização da gestão da escola. Fala-se de transparência, de autonomia, de compromisso, de maior poder de decisão. Outro aspecto destacado diz respeito ao gerenciamento dos recursos, isto é, ao fato de que o repasse do dinheiro é feito diretamente para a escola e à liberdade que esta tem para elencar suas prioridades e definir seu plano de aplicação de recursos a partir dessas prioridades, implicando também a solução dos problemas mais imediatos. Em menor grau, aparece a idéia de que o PDDE permite maior aproximação da comunidade escolar na discussão sobre a aplicação dos recursos, fazendo com que seja chamada a opinar nas tomadas de decisões. Outro aspecto compreendido como vantagem proporcionada pelo PDDE é a melhoria das condições de manutenção, dos equipamentos e de funcionamento das escolas. Desse modo, afirma-se que o ambiente de trabalho melhorou, pois a estrutura física melhorou bastante e a aquisição de material é muito mais funcional em relação às demandas das escolas. Ainda com relação às vantagens, afirma-se que houve orientação e repasse de informações pelo MEC e pelas Secretarias de Educação para a execução do Programa. Os sujeitos dos sistemas informam que a criação da unidade executora foi um aspecto importante trazido pelo PDDE. Programa Dinheiro Direto na Escola 173 Observação bastante singular aparece no relato do Pará ao apresentar como aspecto positivo ou vantagem a burocracia exigida pelo Programa Dinheiro Direto na Escola. No que concerne aos problemas, de modo geral, os sujeitos asseveram que, embora necessários, os recursos repassados pelo PDDE são insuficientes para os fins a que se propõem. Outrossim, a exigência de que os recursos sejam aplicados sob rubricas distintas - custeio e capital - aparece como uma dificuldade na efetivação de algumas ações das unidades executoras. Outro problema destacado fortemente pelos sujeitos da pesquisa diz respeito à prestação de contas. Nesse caso, fala-se da pouca familiaridade dos conselheiros com os cálculos e da falta de tempo. A pesquisa de preços, no entanto, constitui o principal problema, de acordo com os sujeitos. Tal problema surge devido ao fato de o PDDE não prever gastos de deslocamento para a realização da pesquisa de preços e para transporte do material adquirido. Tal situação é mais grave nas pequenas cidades, onde não há, muitas vezes, estabelecimentos comerciais legalizados que possam constituir as planilhas da pesquisa de preços, como também não podem vender com notas fiscais. Ainda nesse ponto, mas característicos dos maiores centros urbanos dos Estados, afirma-se que a tentativa de adquirir produtos por menor preço fragmenta a compra em diversos estabelecimentos, o que inviabiliza a entrega do material pelos comerciantes. A incerteza quanto à efetivação das compras pelos diretores faz com que alguns comerciantes se neguem a preencher a planilha de preços, no processo de tomadas de preços que antecede as compras, o que se torna um problema àqueles que tentam empreender tal tarefa. Outro aspecto considerado problemático refere-se ao período de recepção dos recursos do PDDE. Informam os entrevistados que o período entre a recepção dos recursos pela UEx, sua aplicação e a prestação de contas é bastante exíguo. Acrescentam que não há tempo, inclusive, para análise de documentos (notas fiscais, cópias de cheques, entre outros). Algumas experiências na implantação apresentaram dificuldades: resistência dos pais em participar, incompatibilidades quanto aos horários de reunião, desinformação, entre outros. Paradoxalmente, um aspecto que fora apresentado como vantagem ou aspecto positivo reaparece como aspecto negativo ou problema. Trata-se da autonomia. No Estado do Pará, esta aparece sob a denominação de autonomia relativa. Fala-se que "a autonomia que existe é só entre nós". Em Pirassununga (SP), revela-se a forte intervenção da Secretaria Municipal de Educação nas atividades da unidade executora. Outros problemas são colocados: ausência de treinamentos para os membros das UExs; rotatividade do diretor; centralidade das decisões nas mãos do diretor; dificuldades no repasse de informações dos representantes a sua base; as Secretarias pensam que as escolas estão fortemente apoiadas, negligenciando suas ações quanto ao financiamento, etc. O relato de São Paulo apresenta forte interferência da Secretaria Municipal da cidade pesquisada. Igualmente, na rede municipal de Campo Grande (MS), a Secretaria de Educação interfere nas decisões de aplicação de recursos da escola. 174 Programa Dinheiro Direto na Escola Os sujeitos da pesquisa fizeram uma série de sugestões para que o Programa Dinheiro Direto na Escola fosse mais adequado às aspirações das escolas, sendo a mais a freqüente a de que os recursos do PDDE devem ser ampliados, isto é, deve-se aumentar o valor por aluno. Sugere-se, também, o repasse em várias parcelas e de acordo com o número de matrículas no ano do repasse. Outrossim, sugere-se que o montante dos recursos tome como referência o tamanho da escola e que chegue à escola no início de cada ano. Aparece, em uma rede municipal, a sugestão de que haja um técnico ou administrador financeiro participando dos projetos das escolas. Reivindica-se, aí, alguém com formação dirigida para a área contábil ou de finanças que possa contribuir para o entendimento da UEx quanto a planilhas, tabelas e gráficos, muito comuns nos processos de compras e de prestação de contas. Não separar custeio de capital constitui uma das sugestões mais freqüentes nos relatos estaduais. Do mesmo modo, fala-se da correção dos valores do PDDE com base na inflação, bem como da criação de mecanismos formais que impeçam o atraso do repasse dos recursos. Sugere-se a redução das exigências burocráticas do PDDE. Faz-se referência, principalmente, ao processo de aquisição de produtos e à prestação de contas. Outrossim, reivindica-se treinamento aos membros das unidades executoras. Programa Dinheiro Direto na Escola 175 5 Considerações finais Este trabalho se propôs a investigar o Programa Dinheiro Direto na Escola como expressão das mudanças ocorridas no papel do Estado, especialmente naquelas relativas às conexões entre a constituição e gestão da esfera pública e da esfera privada. De certa forma, acreditamos que o PDDE materializa essas mudanças quando apontadas para o campo educacional e, mais especificamente, quando a localizamos nas redefinições ocorridas nas propostas de financiamento e gestão escolar. Tal pressuposto resulta do fato de entendermos que a política educacional, ainda que não seja "simplesmente, determinada pelas mudanças que estão ocorrendo na redefinição do papel do Estado, (...) é parte constitutiva dessas mudanças" (Peroni, 2003). Por essa razão, o que determinou a escolha do PDDE como objeto desta pesquisa foi menos suas características intrínsecas e mais sua qualidade como exemplo das redefinições ocorridas e/ou pautadas para âmbito do Estado em decorrência das reformas conservadoras introduzidas no cenário brasileiro pós anos 90. Nesse sentido, para demarcarmos e melhor contextualizarmos a análise decorrente da investigação de campo e com o objetivo de o leitor relacionar as conseqüências do Programa para o fortalecimento ou o refreamento das mudanças já citadas, é importante ao menos sublinharmos os principais aspectos das mudanças ocorridas na configuração do Estado brasileiro, já que se encontram mais profundamente apresentadas no item referencial teórico no corpo deste relatório. Programa Dinheiro Direto na Escola 179 Por sua relevância, iniciaremos relembrando que o diagnóstico neoliberal para a crise do capitalismo deflagrada nos anos 70 encontrava-se em uma hipotética relação entre o formato do Estado, mais precisamente o Estado de bem-estar social e a crise econômica. Para a teoria neoliberal, não é o capitalismo que está em crise, mas o Estado. O Estado entrou em crise porque gastou mais do que podia para legitimarse, já que tinha que atender às demandas da população por políticas sociais, o que provocou a crise fiscal. A crise ocorre também porque o Estado, ao regulamentar a economia, atrapalhou o livre andamento do mercado. A estratégia para superação dessa crise, portanto, é reformar o Estado ou diminuir sua atuação em áreas consideradas não-prioritárias e/ou geradoras de déficit público. O mercado é que deveria superar as falhas do Estado, razão pela qual a lógica do mercado deveria prevalecer, inclusive no âmbito da gestão estatal, para que o Estado pudesse ser mais eficiente e produtivo. No Brasil, com as devidas adequações e peculiaridades, a identificação do Estado como o "responsável" pela crise obteve resposta político-institucional nas estratégias propostas pelo Plano de Reforma do Estado no Brasil (Brasil, Mare, 1995), das quais destacamos a transferência de políticas sociais para o então denominado setor público não-estatal. Em vista disso, propõem-se alterações no papel e no funcionamento do Estado em relação à oferta e manutenção de políticas sociais. Tais alterações podem ser sintetizadas em duas prescrições, cujo objetivo, em última instância, seria combater uma certa improdutividade da e na ação estatal quando comparada à do mercado: racionalizar os recursos públicos e esvaziar o poder das instituições democráticas tendo em vista sua maior suscetibilidade diante das pressões e demandas da população. Assim, para os neoliberais, a responsabilidade pela execução das políticas sociais deveria ser repassada para a sociedade por meio da privatização (mercado) ou da constituição de uma esfera híbrida denominada de público não-estatal, propostas presentes no projeto de reforma do Estado brasileiro em que as políticas sociais são consideradas serviços não-exclusivos do Estado e, assim sendo, de propriedade pública não-estatal ou privada. A viabilidade dessas mudanças, por sua vez, exige uma forte atuação do mesmo Estado mediante políticas e medidas governamentais capazes de redefinirem a lógica de regulação estatal até então existente. No caso da educação pós década de 90, experimenta-se uma recentralização da ação estatal na esfera da União (Peroni, 2003), da qual é parte integrante a introdução de programas e medidas nacionais para a educação pública em todas as etapas de escolaridade, por vezes sem a participação dos demais entes federados que, na prática, implementaram as políticas propostas. Assim, quando no âmbito do PDDE, analisamos a obrigatoriedade de todas as escolas terem unidades executoras para receberem os recursos repassados pela União, verificamos uma centralização por parte da mesma União ao minimizar a autonomia dos Estados e municípios no que se refere à obrigatoriedade das UExs e, por conseqüência, nas políticas de gestão da escola. 180 Programa Dinheiro Direto na Escola Além disso, o PDDE apresentou-se como um forte instrumento para o avanço no processo de implantação das organizações sociais (OS) no âmbito da educação básica, exemplificando a opção governamental de, em nome da descentralização e da flexibilização, transferir parte das políticas públicas para a esfera pública não-estatal, conforme veremos a seguir. Da análise dos casos que compuseram este estudo, salientamos ainda os aspectos que seguem, para efeito de melhor entender as conseqüências do PDDE na democratização da gestão da educação e da escola pública. Ressaltamos, todavia, que o relativo foco na esfera da gestão adotado neste relatório não minimizou o enquadramento da análise no campo geral das políticas públicas, especialmente naquelas tendentes a reorientar o formato pelo qual o Estado brasileiro se organizou e que, como já salientado, tem se caracterizado na última década pela tentativa constituição de mecanismos híbridos, denominados de público não-estatal. Nesse sentido, a opção do Programa por exigir para o repasse de recursos às escolas a constituição de entidades de direito privado, as quais, não obstante gerirem recursos públicos e articularem-se a uma instituição pública (a escola), levam a que essas entidades acabem tendo autonomia jurídica diante dessa mesma instituição à qual se vinculam, o que pode gerar conseqüências ainda não previsíveis para o sistema público, como alertou a Procuradora Jurídica do município de Porto Alegre. Com a intenção de apresentar didaticamente as principais conclusões deste estudo, destacaremos a seguir a análise final do Programa a partir de três grandes eixos: a gestão democrática, a relação público-privado e a relação entre descentralização-centralização. Gestão democrática Observamos, nos casos estudados, que, independentemente do tamanho da rede ou do sistema de ensino, o PDDE interferiu na configuração e dinâmica dos mecanismos de gestão democrática então existentes. No entanto, essa interferência não apresentou um padrão único. Nos casos em que os Colegiados ou Conselhos Escolares já estavam instituídos e se tornaram UExs, presenciou-se um relativo retrocesso nas práticas participativas, uma vez que, como vimos, a lógica do Programa, ao enfatizar os procedimentos técnico-operacionais, secundariza a dimensão política própria dos processos coletivos de tomada de decisão que têm caracterizado os graus mais avançados de participação (Bordenave, 1994) . Nessa perspectiva, o Programa reforça o tom pragmático das políticas educacionais dos anos 90, uma vez que a ampliação da participação, historicamente assumida como possibilidade de a sociedade civil exercer o controle democrático sobre o Estado, é reduzida ao emprego das energias de usuários e profissionais na assunção de tarefas gerenciais. Comprova essa tendência a ausência de políticas indutoras ao fortalecimento dos Conselhos de Escola, órgãos de gestão colegiada das unidades escolares, Programa Dinheiro Direto na Escola 181 ou mesmo a ausência de ações que estimulem a solidariedade e ação coletiva no âmbito das escolas ou nas redes de ensino (Garcia, Adrião, 2005, p. 12, impresso). Em muitos casos, o PDDE, ao estimular a arrecadação de recursos por parte do Colegiado, agora UEx, com o objetivo de estimular o co-financiamento da escola pela comunidade escolar, reforçou a idéia que limita a participação dos usuários à arrecadação e gestão de recursos financeiros. Assim, atuando sobre dois fundamentos da democratização da gestão da escola pública - participação dos diferentes segmentos e autonomia de gestão financeira -, o PDDE tendeu a redesenhar a atuação dos Colegiados ao enfatizar a "participação financeira" da comunidade na manutenção da escola pública. Nesses termos, ainda que a captação de recursos privados pela escola não se constitua em novidade, o fato é que "o governo brasileiro (...) institui a lógica da participação financeira privada na escola pública. Por isso, para além de uma autonomia de gestão financeira, a autonomia proposta no PDDE é uma autonomia financeira" (Santos, Gutierres, Silva, 2004, p. 12, mimeo). Ressalva seja feita ao caso de Porto Alegre, em que a UEx, no período em estudo, não podia arrecadar recursos por determinação do poder público municipal. Nos casos em que a APM ou o CPM tornaram-se as UExs e o Conselho de Escola foi mantido como instância de gestão, também se observou a introdução de ao menos dois obstáculos à democratização da gestão escolar, dessa vez, associados à divisão de atribuições entre essas duas instâncias. O primeiro articula-se à fragmentação entre as decisões de ordem político-pedagógicas, mantidas a cargo dos Colegiados, e as decisões sobre questões de gestão financeira, agora atribuída à APM/CPM. A fragmentação do processo decisório, ao reforçar a dicotomia entre as decisões de natureza pedagógica e as financeiras, concentrou ainda mais as opções de política escolar nas mãos dos diretores, implicando restrições às práticas democráticas de gestão e contrariando um princípio elementar de democratização da gestão: atribuir ao órgão coletivo de gestão escolar a possibilidade de decidir sobre destinação e priorização de recursos. Verificamos esse processo acontecendo principalmente nos casos das redes estaduais paulista e gaúcha. O segundo obstáculo à democratização da gestão relaciona-se à descaracterização e ao enfraquecimento dos Colegiados/Conselhos58. No caso da rede estadual do Rio Grande do Sul, a APM/CPM, ao tornar-se UEx, apropriou-se de funções antes atribuídas a tais Conselhos, o que gerou certo esvaziamento desses, uma vez que retirou de sua alçada as decisões sobre parte dos recursos financeiros. Em outras situações, como a encontrada na rede estadual paulista em que coexistiam as duas instâncias, ampliou-se a importância das APMs e fortaleceu-se uma 58 Para efeito deste trabalho, consideram-se os Colegiados/Conselhos Escolares como instâncias mais democráticas se comparadas à APM/COM, seja por razões históricas, dado que surgiram como pauta de movimentos de democratização das relações entre Estado e sociedade pós-ditadura militar, seja por razões de organização, uma vez que em muitas redes adquirem um caráter deliberativo e são compostos por representantes de todos os segmentos escolares, o que não ocorre com grande parte das APMs. 182 Programa Dinheiro Direto na Escola política de estímulo às parcerias entre setor público e setor privado que vêm compondo as estratégias governamentais do Estado. Por outro lado, nos casos em que ou não havia quaisquer mecanismos democráticos de gestão, ou onde esses eram incipientes, o Programa parece ter contribuído para a sua institucionalização, inclusive induzindo à incorporação da presença de todos os segmentos escolares em seu funcionamento, como observado no Pará e no Piauí, tanto nas redes municipais quanto nas estaduais. Tal constatação não deixa de indicar um relativo avanço, que parece ser mais evidente em redes de ensino menos organizadas ou com tempo de criação relativamente recente, como é o caso de Pirassununga, onde, na ausência do PDDE, possivelmente a rede continuaria sem qualquer tipo de mecanismo coletivo de participação. No entanto, é bom que se diga que essa indução pode redundar em limites para a própria democratização da gestão, uma vez que os Conselhos recém-criados nascem já crivados pela lógica da UEx, erigida a partir da ambigüidade que a caracteriza (entidade de natureza privada articulada ao setor público) e da função que lhe é prioritária: captar recursos privados e gerir recursos públicos descentralizados, condição que tende a secundarizar o exercício das práticas democráticas nas decisões. Enfim, independentemente da trajetória da gestão democrática encontrada nos sistemas quando da implantação do Programa, nota-se que a divisão entre as decisões sobre os aspectos financeiros e os pedagógicos da gestão escolar enfatiza a burocratização da gestão escolar (Paro, 1995) na medida em que prioriza as atividades-meio em detrimento das atividades-fim, condição agravada pela sabida penúria financeira encontrada nas escolas públicas. Outro aspecto a revelar refere-se à presença ou à ampliação do controle social sobre os recursos descentralizados, já que se considera, no âmbito de políticas relacionadas à democratização da gestão da educação, como necessária a existência de medidas que facilitem o controle social do Estado por parte da sociedade civil. Nesse sentido, a análise do funcionamento das UEx na esfera das escolas indicou que seu modus operandi pouco contribuiu para a instalação de práticas de controle, seja sobre a definição de prioridades, seja sobre a execução dos recursos repassados, especialmente pelos pais/mães, ainda que formalmente esteja prevista sua incorporação. Há casos também em que, pelo formato adotado para as UEx, os funcionários das escolas estão alijados de qualquer participação. Se o foco dirigir-se para a esfera dos sistemas ou redes de ensino, também contribuíram para a insuficiência do controle social sobre o Programa a canalização das poucas informações sobre a execução do PDDE a funcionários e técnicos governamentais e a sua desvinculação dos Conselhos de acompanhamento e fiscalização de políticas ou programas educacionais, como o são os Conselhos Municipais/Estaduais de Educação e o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundef. Faz-se exceção ao município de Belém, onde, por ser a gestão democrática um princípio de governo, as contas do Programa eram analisadas pelo Conselho Municipal de Educação. Programa Dinheiro Direto na Escola 183 A relação entre o público e o privado Tendo em vista as alterações no campo da gestão escolar propostas explícita ou implicitamente pelo Programa, destaca-se a introdução e/ou o fortalecimento, a depender do caso pesquisado, de uma nova relação entre a administração pública e uma instituição de natureza privada, como é o caso do modelo de UEx proposto. No entanto, em todos os casos analisados, na visão dos segmentos escolares, isso não se constitui em questão relevante, uma vez que a preocupação de gestores e educadores escolares se centra na oportunidade de perceber diretamente os recursos. Tal posição reforça, de um lado, a relevância que políticas descentralizadoras têm para aqueles que vivenciam o cotidiano escolar, na medida em que se constituem como pré-condição para o exercício da reivindicada autonomia pedagógica, além de, no caso específico do PDDE, desempenhar função relevante no conjunto dos recursos escolares. De outro lado, também é certo afirmar que o pragmatismo a que estão sujeitos os educadores, pela urgência de respostas que o cotidiano da escola forja e exige, tende a minimizar a preocupação com conseqüências de natureza mais geral, como as políticas, ou com as que apresentam impactos em longo prazo. Em relação à dificuldade de percepção de conseqüências de maior amplitude, temos a destacar dois problemas relacionados à natureza privada da UEx. O primeiro aplica-se aos casos em que a UEx é a APM. Observamos que, em alguns casos, um representante dos pais, em conjunto com o responsável pela escola, assina os cheques e, portanto, se co-responsabiliza pela gestão dos recursos. Diante dessa situação, o que ocorre se as contas da UEx não são aprovadas? Como responsabilizar esse representante da "sociedade civil" pela eventual incorreção no gasto de recursos públicos? Afinal, no âmbito da escola, quem responde por tais recursos: o representante da administração pública, no caso, o responsável pela unidade escolar, ou o representante da sociedade civil, pai ou mãe do aluno? O segundo problema, também resultante da superposição entre as esferas pública e privada imposta pelo Programa, refere-se ao fato de que, ao tornaremse entidades de direito privado, as UExs, sejam elas APMs ou CEs, passam a ter autonomia total diante da administração pública, aqui representada pela escola, prescindindo de submissão às regras do sistema ou rede pública de ensino. Por conta disso, em que medida as UExs devem se submeter à política educacional dos sistemas ou da mantenedora, como no caso das Apaes? A questão torna-se mais complexa quando o Conselho Escolar é a UEx, uma vez que, em muitas redes públicas, esse colegiado compõe a estrutura administrativa da unidade escolar ao ser a instância de gestão da escola. Nesse caso, em que medida está preservada a natureza pública da escola? Como garantir a subordinação por parte das UExs às normas da administração pública definidas pelos sistemas de ensino? Descentralização x centralização A tensão centralização/descentralização tem sido uma das grandes características da redefinição do papel do Estado nesse período histórico. Verificamos 184 Programa Dinheiro Direto na Escola nas políticas sociais, de maneira geral, e nas políticas educacionais, em particular, que o Estado tem cada vez mais a tarefa de coordenação e avaliação das políticas, repassando cada vez mais a sua execução para a sociedade, como já aprofundamos no marco teórico deste relatório. Verificamos esse mesmo movimento no Programa analisado. Ao mesmo tempo em que o Programa descentraliza os recursos para as UEx, ele exige como formato para a instalação dessas a criação, necessariamente, de uma entidade de direito privado, para o que não consultou sequer os sistemas de ensino. Tal constatação exemplifica a faceta centralizadora do PDDE. Isso remete para outra discussão, a questão federativa, já que a União definiu e obrigou a implementação das UEx nas redes públicas municipais e estaduais, não respeitando as políticas de gestão propostas pelos sistemas/ mantenedoras. Questionamos se o pacto federativo não ficou comprometido com tal imposição. O Programa foi concebido tendo em vista a desburocratização e a descentralização do repasse e da gestão financeira dos recursos: • O PDDE objetivou enfrentar uma "suposta" rigidez própria da administração pública, como diagnosticado pelo Plano Diretor da Reforma do Estado. • Ainda no âmbito da esfera pública e na perspectiva de combater essa mesma rigidez, o Programa privilegiava a "ponta do sistema", sem passar pelas estruturas político-administrativas de Estados e municípios, como pré-condição para o aumento da autonomia das unidades escolares diante dos órgãos da administração pública. No entanto, observamos, em pelo menos um caso, que a decisão sobre a solicitação ou o cancelamento dos recursos do Programa era tomada pelo secretário de Educação do município. • Complementarmente, para efeito de combater a mesma suposta rigidez inerente à administração pública, princípio do Programa, institui-se o repasse de dinheiro público para uma entidade privada, no caso, as UExs, dado um pré-juízo de ser esta mais eficiente. Concluindo, é importante ressaltar que o PDDE tem aspectos muito positivos, entre eles, a transparência de critérios para a distribuição dos recursos do Salário-Educação, a importância que esse repasse financeiro teve para o conjunto das escolas, apesar de impactos diferentes, dependendo do total de recursos descentralizados em cada região, assim como a autonomia financeira da escola, que é uma bandeira histórica dos educadores. Enfim, a questão principal do grupo não foi provar que, por meio do Programa, se aprofundou ou não o processo de público não-estatal ou a privatização da escola, mas apenas situar o contexto em que ele nasce, já que partimos do fato de que as escolas formaram organizações sociais e que as unidades executoras tinham também o objetivo de captação de recursos. O objetivo da Pesquisa foi verificar como o Programa, dadas as diferentes realidades, teve diferentes repercussões, além de aproveitar para aprofundar questões teóricas referentes à questão do Estado e políticas sociais nesse período particular do capitalismo. Programa Dinheiro Direto na Escola 185 6 Referências bibliográficas ADRIÃO, T.; GARCIA, T.; COSTA, A. C. O Programa Dinheiro Direto na Escola e a Gestão Escolar. Rio Claro, São Paulo: Unesp, 2004. Não publicado. Texto produzido para Reunião Nacional de Pesquisa, Porto Alegre, 2004. 25 p. ADRIÃO, T.; PERONI, V. 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Entrevistas realizadas no Estado do Piauí DIRETOR. Escola Especial. Entrevistadoras: Liliene Xavier Luz e Samara de Oliveira Silva. Teresina, jan. 2005. Escola de Educação Especial. DIRETORA. Escola Municipal A. Entrevistadoras: Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 23 fev. 2005. Escola Municipal A. REPRESENTANTE DOS ALUNOS. Escola Municipal A. Entrevistadoras: Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 23 fev. 2005. Escola Municipal. 200 Programa Dinheiro Direto na Escola REPRESENTANTE DOS PAIS. Escola Municipal A. Entrevistadoras: Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 23 fev. 2005. Escola Municipal. REPRESENTANTE DOS PROFESSORES. Escola Municipal A. Entrevistadoras: Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 23 fev. 2005. Escola Municipal. TÉCNICO 1. Estadual. Entrevistadores: Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves, Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 29 ago. 2004. Secretaria Estadual de Educação. TÉCNICO 1. Municipal. Entrevistadores: Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves, Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 16 set. 2004. Secretaria Municipal de Educação. TÉCNICO 2. Municipal. Entrevistadoras: Rosana Evangelista da Cruz e Sâmara Oliveira da Silva. Teresina, 13 set. 2004. Secretaria Municipal de Educação. TÉCNICO 3. Municipal. Entrevistadores: Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves, Liliene Xavier Luz e Rosana Evangelista da Cruz. Teresina, 14 jan. 2004. Secretaria Municipal de Educação. Entrevistas realizadas em Mato Grosso do Sul DIRETORA. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande,21 set. 2005. Escola Estadual de Educação Especial. DIRETORA. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, 17 ago. e 21 set. 2005. Escola Estadual A. DIRETORA. Municipal. Entrevistadora: Paula Priscila Bentos Ribeiro. Campo Grande, 2 ago. 2005. Escola Municipal B. MEMBRO DA UNIDADE EXECUTORA. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, 21 set. 2005. Escola Estadual A. MEMBRO DA UNIDADE EXECUTORA. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, 21 set. 2005. Escola Estadual A. MEMBRO DA UNIDADE EXECUTORA. Municipal. Entrevistadora: Paula Priscila Bentos Ribeiro. Campo Grande, 22 set. 2005. Escola Municipal B. MEMBRO DA UNIDADE EXECUTORA. Municipal. Entrevistadora: Paula Priscila Bentos Ribeiro. Campo Grande, 22 set. 2005. Escola Municipal B. TÉCNICO 1. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, 28 jun. e 5 set. 2005. Secretaria de Estado de Educação. Programa Dinheiro Direto na Escola 201 TÉCNICO 1. Municipal. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, set. 2005. Secretaria de Municipal de Educação. TÉCNICO 2. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, 28 jun. 2005. Secretaria de Estado de Educação. TÉCNICO 3. Estadual. Entrevistadora: Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini. Campo Grande, 6 set. 2005. Secretaria de Estado de Educação. Entrevistas realizadas no Estado de São Paulo PROFESSOR. Estadual. Entrevistadora: Teise de Oliveira Guaranha Garcia. São Paulo, 16 jun. 2005. Nas dependências da unidade escola. PROFESSORA. Municipal. Entrevistadora: Rochele Cristina Pegoraro. Pirassununga, 7 out. 2004. Nas dependências da unidade escolar. SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO A. Municipal. Entrevistadora: Egle Bezerra. Pirassununga, 12 ago. 2005. Nas dependências da Secretaria Municipal de Educação. TÉCNICO B. Estadual. Entrevistadora: Teise de Oliveira Guaranha Garcia. São Paulo, 11 maio 2004. Secretaria de Estado da Educação. TÉCNICO B. Municipal. Entrevistadora: Rochelle Cristina Pegoraro. Pirassununga, 22 jul. 2004. Nas dependências da Secretaria Municipal de Educação. TÉCNICO B. Municipal. Entrevistadora: Egle Bezerra. Pirassununga, 12 set. 2004. Nas dependências da Secretaria Municipal de Educação. TÉCNICO C. Estadual. Entrevistadora: Teise de Oliveira Guaranha Garcia. São Paulo, 17 jun. 2005. Na Fundação para o Desenvolvimento da Educação. VICE-DIRETOR ESCOLAR. Estadual. Entrevistadora: Teise de Oliveira Guaranha Garcia. São Paulo, 17 jun. 2005. Nas dependências da unidade escolar. Entrevistas Realizadas no Estado do Rio Grande do Sul ANDREJEW, Marlize. Entrevistadora: Juliana Lumertz. Porto Alegre, 29 set. 2004. CMET Paulo Freire. FERREIRA, Inajara. Assessora Jurídica da Secretaria Estadual de Educação. Inajara Ferreira. Entrevistadora: Vera Maria Vidal Peroni. Porto Alegre, 11 dez. 2003. Na SEC, Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre. 202 Programa Dinheiro Direto na Escola LAZZAROTTO, Neiva. Dirigente do CPERS. Neiva Lazzarotto. Entrevistadoras: Vera Maria Vidal Peroni e Fabiana Mathias. Porto Alegre, 5 set. 2003. No CPERS, Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre. OLIVEIRA FILHO, Raul Gomes de. 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