UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ DIEGO BERNARDES DE OLIVEIRA SOCIEDADE EMPRESÁRIA: A FALÊNCIA COMO FORMA DE DISSOLUÇÃO FORÇADA Biguaçu 2008 2 DIEGO BERNARDES DE OLIVEIRA SOCIEDADE EMPRESÁRIA: A FALÊNCIA COMO FORMA DE DISSOLUÇÃO FORÇADA Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI , como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito. Orientador: Prof. MSc. Moacir José Serpa Biguaçu 2008 3 DIEGO BERNARDES DE OLIVEIRA SOCIEDADE EMPRESÁRIA: A FALÊNCIA COMO FORMA DE DISSOLUÇÃO FORÇADA Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas. Área de Concentração: Direito Comercial Biguaçu, 10 de novembro de 2008. Prof. MSc. Moacir José Serpa UNIVALI – Campus de Biguaçu Orientador Prof. MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica UNIVALI – Campus de Biguaçu Membro Prof. Esp. Gabriel Paschoal Pítsica UNIVALI – Campus de Biguaçu Membro 4 Dedico este trabalho aos meus pais, Alan e Maria José, pelo amor e atenção e por terem oportunizado mais um sonho. Aos meus irmãos, Tom e Ellen, pela alegria e companhia em todos esses anos. À Fernanda, pessoa iluminada, pela dedicação, amor e paciência, em nossos momentos juntos. 5 AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus, por conceder-me a vida e tudo que tem me proporcionado. Aos meus pais, pela dedicação na minha educação e formação, e por estarem sempre ao meu lado dedicando amor e carinho. Aos meus irmãos, por estarem presentes e sempre me apoiarem. Ao professor Serpa, por dedicar atenção, tempo e principalmente paciência nos momentos difíceis, e por sempre proporcionar informações seguras e pertinentes ao tema. À Fernanda, pessoa estimada e importante em minha vida, agradeço ao amor e atenção destinados a minha pessoa. 6 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Biguaçu, 10 de novembro de 2008. Diego Bernardes de Oliveira 7 RESUMO O presente trabalho tem como objetivo apresentar a falência como uma forma de dissolução forçada das sociedades empresárias. Na primeira parte do trabalho aborda-se sobre a evolução das sociedades empresárias, seu conceito, características e personalização, bem como os sócios e suas responsabilidades. O segundo capítulo tratará das formas de dissolução previstas no ordenamento jurídico. No terceiro capítulo cuidará da definição de falência, expondo suas principais características e sendo uma forma de dissolução forçada das sociedades empresárias. Palavra-chave: Sociedade empresária. Dissolução. Falência. 8 ABSTRACTI The present study has as objective report the insolvent as a type to forced dissolution in the society company. In the first chapter of this work, it is approached the evolution of society company’s, the concept, the attribute and personification, as yet the partner and your responsibilities. The second chapter will deal with the forms of dissolutions previously in the juridical order. The third chapter will treat about the insolvent definition, expose your essential attribute and is a type to coerce dissolution in the society company’s. Keywords: Society Company; Dissolution; Insolvent. 9 ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS CF – Constituição Federal CC – Código Civil CDC – Código de Defesa do Consumidor LSA – Lei da Sociedade Anônima LRE – Lei de Recuperação de Empresas LF – Lei Falimentar 10 ROL DE CATEGORIAS Teoria dos Atos de Comércio É a teoria adotada pelo Código Francês, sob os ideais da Revolução Francesa, que institui a tese de que a legislação comercial não se destinava a reger somente as relações de classe de comerciantes, passando, desse modo, a regular qualquer indivíduo que viesse a praticar determinados atos de comércio.1 Teoria da Empresa É a teoria consagrada com a promulgação do Codice Civile Italiano de 1942, que estabelecia que o amparo do direito comercial recai sobre a atividade empresarial, considerada aquela desenvolvida profissionalmente e com habitualidade, seja por um empresário individual, seja por uma sociedade empresária, de forma economicamente organizada, voltada à produção ou circulação de mercadorias ou serviços.2 Empresário É quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços.3 Sociedade Empresária É aquela que tem por objeto a exploração habitual de atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços, sempre com o escopo de lucro.4 Personalidade Jurídica É a autonomia patrimonial da sociedade empresária que nasce com o registro de seus atos constitutivos junto ao órgão competente, que no caso das sociedades empresárias é a Junta 1 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 28. 2 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 30. 3 NOGUEIRA, Ricardo José Negrão. Manual de Direito Comercial. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001. p.73. 4 CAMPINHO, Sérgio. O Direito de Empresa à luz do Novo Código Civil. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 35. 11 Comercial, e se tratando de sociedades simples, se realizará junto ao Ofício do Registro Civil de Pessoa Jurídica.5 Ato Constitutivo É o ato expresso de constituição da sociedade empresária onde deve constar o tipo societário, o objeto social, o capital social, responsabilidades dos sócios, qualificação dos sócios, qualificação de representantes, procuradores e administradores, nome empresarial, sede e foro, bem como o prazo de duração do mesmo.6 Dissolução É o procedimento de terminação da personalidade jurídica da sociedade empresária, ou seja, a dissolução se refere ao ato, judicial ou extrajudicial, que desencadeia o procedimento de extinção da pessoa jurídica.7 Falência É o fato jurídico que atinge a sociedade empresária, submetendo-a a um processo judicial, para arrecadar meios de pagamentos devidos aos credores, e que não foram pagos pela impossibilidade material de fazê-lo, já que o patrimônio disponível era menor do que o devido.8 5 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 68. 6 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 90. 7 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 450. 8 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 121. 12 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................. 14 1 A SOCIEDADE EMPRESÁRIA SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO16 1.1 A EVOLUÇÃO DAS SOCIEDADES EMPRESÁRIAS ........................................ 16 1.1.1 Breve Histórico ........................................................................................ 16 1.1.2 Das sociedades empresárias ............................................................... 17 1.2 AS ESPÉCIES DE SOCIEDADES EMPRESÁRIAS, SUAS CARACTERÍSTICAS E SUA PERSONALIZAÇÃO.................................................................................................... 22 1.3 OS SÓCIOS DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E SUAS RESPONSABILIDADES 27 2 A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.................................................................................................... 35 2.1 A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO................................................................................................................. 35 2.1.1 O processo de liquidação da sociedade empresária .................... 39 2.1.2 Da partilha .............................................................................................. 40 2.1.3 Distinção entre dissolução total e dissolução parcial ...................... 41 2.1.4 Da apuração de haveres..................................................................... 44 2.2 AS CONSEQÜÊNCIAS DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA .................................................................................. 45 2.3 DA DESPERSONIFICAÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA ......................... 47 3 A FALÊNCIA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA SEGUNDO A LEI Nº 11.101/05 49 3.1 A SOCIEDADE EMPRESÁRIA E A LEI FALIMENTAR ....................................... 49 3.2 O PROCESSO FALIMENTAR DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E SUAS CONSEQÜÊNCIAS ..................................................................................................... 53 3.2.1 Legitimidade passiva para o pedido da falência............................ 54 3.2.2 Legitimidade ativa para o pedido de falência ................................ 55 3.2.3 Pressupostos da falência ...................................................................... 56 3.2.4 Sentença declaratória da falência .................................................... 56 3.2.5 Conseqüências quanto à pessoa do falido ...................................... 57 3.2.6 Arrecadação dos bens do falido........................................................ 58 3.2.7 Da administração da falência............................................................. 60 3.2.8 Da verificação dos créditos ................................................................. 61 13 3.3 A FALÊNCIA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E O PROCESSO DE DISSOLUÇÃO FORÇADA .................................................................................................................. 62 3.3.1 Da liquidação......................................................................................... 62 3.3.2 Do encerramento e da extinção das obrigações do falido .......... 64 CONCLUSÃO................................................................................................... 68 REFERÊNCIAS................................................................................................ 70 14 INTRODUÇÃO Para compreensão da teoria da empresa e seu respectivo amparo legal, releva-se, inicialmente, a noção do que é a empresa e de quem é o empresário, uma vez que o Código Civil estabelece que “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços” (art. 966), sem que defina o que é a empresa. Contudo, extraindo do próprio art. 966 do CC, tem-se que a empresa é a atividade econômica organizada para a produção e circulação de bens, onde a profissionalidade no desenvolvimento da empresa diz respeito à habitualidade com que é exercida a atividade. Desse modo, extrai-se desse conceito que a realização de investimentos comuns para a exploração de atividade econômica pode revestir várias formas jurídicas, dentre as quais a sociedade empresária. A presente Monografia tem como objeto principal o estudo das sociedades empresárias, tendo a falência como uma forma de dissolução da empresa. Ainda como objeto, apresenta uma noção histórica da evolução das sociedades empresárias, suas espécies, características e as formas de dissolução, além de uma análise da legislação atual no que concerne ao processo falimentar. Na presente pesquisa utilizar-se-á o método dedutivo, pelo qual se partiu do geral, para chegar ao assunto específico. Para tanto, no capítulo primeiro, com o título de “A Sociedade Empresária segundo o Código Civil Brasileiro”, far-se-á uma abordagem geral, sob a ótica do Código Civil, sobre sociedade empresária e suas particularidades, ou seja, como é classificada, como ocorre sua constituição, e principalmente sua personificação, levando-se em consideração os direitos e deveres dos sócios. Após, de forma a entender a demanda em que existe a possibilidade de dissolução da sociedade empresária, passar-se-á a estudar o processo de 15 dissolução e suas peculiaridades, necessitando adentrar na esfera da despersonalização, liquidação e partilha dos bens, vez que, tema principal do segundo capítulo que recebeu, por conseguinte, o titulo de “A dissolução da sociedade empresária no Código Civil Brasileiro”. Por fim, o capítulo terceiro, cujo título é “A falência da sociedade empresária segundo a lei nº. 11.101/05” em que se buscará seu conceito, histórico, e principalmente sua previsão legal e aplicação no processo brasileiro, ressaltando, principalmente, quais os motivos que guarnecem o Magistrado em sua decisão de proferir a sentença declaratória de falência, a arrecadação dos bens para a constituição da massa falida, a realização do ativo e satisfação do passivo, bem como o encerramento e extinção das obrigações do devedor. Portanto, os três capítulos terão por objetivo chegar a uma conclusão de quando, como e porque ocorre a dissolução “forçada” de uma sociedade empresária, por meio do processo falimentar. Importante ressaltar que esta monografia baseou-se em doutrinas, artigos, decretos e esparsas leis, com intuito de trazer em pauta um tema que alcança diversas sociedades empresárias, que por motivos peculiares, são obrigadas, por meio do processo falimentar, a dissolverem o ente personalizado, para o pagamento das dívidas contraídas no exercício da atividade econômica. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com a conclusão, na qual são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o processo falimentar a que submentem-se as sociedades empresárias. 16 1 A SOCIEDADE EMPRESÁRIA SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO 1.1 A EVOLUÇÃO DAS SOCIEDADES EMPRESÁRIAS 1.1.1 Breve Histórico O comércio surgiu na antiguidade, caracterizado pela troca de bens, como forma de dirimir os conflitos de interesses entre os povos, intensificando-se na Idade Média, através dos feudos. Com o crescimento e desenvolvimento dos Estados, e com o desapontar das expedições marítimas, houve a necessidade do intercâmbio de mercadorias entre os povos, procedimento este, que acarretou na regulamentação dessas atividades.9 Desse modo, pode-se dizer que o direito comercial eclodiu no período de crescimento das cidades e da mercancia comercial, onde os mercadores associaram-se em corporações e estabeleceram regras para a regência do comércio.10 Destarte aos acontecimentos da época, em 1808 os juristas de Napoleão Bonaparte elaboraram o Code de Commerce, legislação que objetivou os atos legais de comércio, ou seja, as relações jurídicas mercantis antes definidas pela natureza do sujeito que a integrava, agora seria substituída pelos atos por eles praticados, baseando-se na “Teoria dos Atos de Comercio11”.12 9 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 15 e 16. 10 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 123. 11 Teoria dos Atos de Comércio - teoria adotada pelo Código Francês, sob os ideais da Revolução Francesa, que institui a tese de que a legislação comercial não se destinava a reger somente as relações de classe de comerciantes, passando, desse modo, a regular qualquer indivíduo que viesse a praticar determinados atos de comércio. 12 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 5. 17 No Brasil, em 1850, foi editado o Código Comercial, que inspirado na “Teoria dos Atos de Comércio”, classificava o comerciante como aquele que praticava mercancia, porém sem defini-la. E, progressivamente, com a evolução do direito comercial e a abrangência de novas atividades mercantis, a legislação comercial brasileira teve de atualizar-se. Contudo, somente com o advento do Código Civil de 2002, inspirado na “Teoria da Empresa”13, teve sua inserção no ordenamento nacional.14 Observa-se, portanto, que o Direito Comercial disciplina as relações e conflitos que norteiam a atividade empresarial, sendo a empresa o mecanismo responsável pela disposição de produtos e serviços no mercado, movimentando o consumo e a economia, e que será o principal objeto do presente estudo. 1.1.2 Das Sociedades Empresárias A produção de bens e serviços para o mercado não é mera conseqüência de atividades acidentais, mas sim de atividades especializadas e profissionais suportadas por organismos econômicos. Estes organismos que têm por finalidade a organização dos fatores de produção, bem como a satisfação das necessidades alheias e do mercado em geral, recebem a terminologia econômica de empresa.15 O conceito de empresa decorre da visão atual de empresário, onde se estabelecem regras próprias, não mais àquele que pratica com habitualidade e profissionalidade atos de comércio, mas algumas atividades definidas em lei como empresariais.16 Acerca do Direito de Empresa, o art. 966 do Código Civil Brasileiro, dispõe que: 13 Teoria da Empresa – teoria consagrada com a promulgação do Codice Civile Italiano de 1942, estabelecia que o amparo do direito comercial recai sobre a atividade empresarial, considerada aquela desenvolvida profissionalmente e com habitualidade, seja por um empresário individual, seja por uma sociedade empresária, de forma economicamente organizada, voltada à produção ou circulação de mercadorias ou serviços. 14 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual de Direito Comercial. 2. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2003. p. 53-55. 15 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 49. 16 NOGUEIRA, Ricardo José Negrão. Manual de Direito Comercial. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001. p.73. 18 Art. 966 – Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços. Destarte, o conceito jurídico de empresa se fundamentar em um organismo econômico, uma empresa, de acordo com o dicionario Aurélio, é “organização econômica destinada à produção ou venda de mercadorias ou serviços, tendo em geral como objetivo o lucro; organização jurídica, firma, sociedade”.17 Para o autor Fábio Ulhoa, a sociedade empresária: É um conjunto organizado de meios com vista a exercer uma atividade particular, pública, ou de economia mista, que produz e oferece bens e/ou serviços, com o objetivo de atender a alguma necessidade humana. O lucro, na visão moderna das empresas privadas, é consequencia do processo produtivo e o retorno esperado pelos investidores. As empresas de titularidade do Poder Público têm a finalidade de obter rentabilidade social. As empresas podem ser individuais ou coletivas, dependendo do número de sócios que as compõem.18 A empresa é definida por Waldírio Bulgarelli em sua obra como a “atividade econômica organizada, exercida profissionalmente pelo empresário, através do estabelecimento”. Sendo assim, para que a atividade intelectual represente um elemento de empresa, deve ela estar englobada em uma das características da empresa. Dentre estas características, só é possível que a atividade intelectual se refira a atividade econômica. Deste modo, a sociedade não será simples, e, por conseguinte será empresária, se, apesar de desenvolver uma atividade intelectual, esta for um dos meios para a sociedade explorar a atividade econômica.19 Observa-se que, por exemplo, quando dois ou mais médicos formam uma sociedade para explorar a medicina, sendo este o único objeto social, ela será classificada como sociedade simples, tendo em vista que a atividade médica é uma atividade intelectual de caráter científico. E mesmo que ela contrate diversos empregados, tais como secretária, boys, assistentes, e tenha mais de uma clínica ou estabelecimento, ainda assim, será uma sociedade simples.20 Em contrapartida, se os mesmos médicos em conjunto com pessoas não médicas formem uma sociedade para oferecer, além de serviços médicos 17 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: dicionário da língua portuguesa. 3. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 742. 18 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 1. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 17. 19 BULGARELLI, Waldirio. Sociedades Comerciais. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 21 e 22. 20 ANDRADE JR., Attila de Souza Leão. Comentários ao Novo Código Civil, Volume IV: Direito de Sociedades. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 47 e 48. 19 dermatológicos, tratamento estético e de emagrecimento, corte de cabelo e outros serviços correlatos, tem-se que, esta sociedade será classificada como sociedade empresária, pois os serviços médicos constituem parte da atividade econômica por ela explorada.21 Ressalta-se, portanto, que no plano do direito estão positivadas algumas alternativas para a composição de interesses entre dois ou mais agentes, dentre as quais, a forma jurídica da sociedade. Acerca do tema sociedades empresárias, discorre Campinho que “a sociedade empresária é aquela que tem por objeto a exploração habitual de atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços, sempre com o escopo de lucro”.22 Acrescenta, ainda que: Explora, pois, de forma profissional a empresa, resultado da ordenação do trabalho e capital, e, porque não, tecnologia. A sociedade simples, ao revés do que no afoitamento se possa pensar, também executa atividade econômica e seus integrantes partilham, entre si, os resultados que venham a ser auferidos. Se assim não fosse, não seria sociedade. A exploração de atividade econômica e a partilha dos lucros são próprias do conceito de sociedade. A sociedade simples, segundo o perfil legislativo que lhe foi destinado, empreende atividades econômicas específicas. O ordenamento jurídico positivo é quem lhe reserva o objeto.23 O estudo das sociedades empresariais revela que as atividades de pequeno porte podem ser exploradas por uma pessoa natural. Entretanto, na medida em que se tornam mais complexas exigindo maiores investimentos ou diferentes capacitações, pressupõe-se, então, uma aglutinação de esforços entre duas ou mais pessoas interessadas nos lucros da atividade econômica em questão.24 O direito das empresas mercantis e civis no Brasil, até 11 de janeiro de 2003, eram reguladas pelo Código Comercial de 1850, e o Código Civil de 1916, que adotavam como critério de divisão das empresas, as atividades exercidas por elas, isto é, normatizavam que a sociedade constituída com o objetivo social de prestação de serviços (sociedade civil), tinha o seu contrato social registrado no Cartório de 21 ANDRADE JR., Attila de Souza Leão. Comentários ao Novo Código Civil, Volume IV: Direito de Sociedades. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 47 e 48. 22 CAMPINHO, Sérgio. O Direito de Empresa à luz do Novo Código Civil. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 35. 23 CAMPINHO, Sérgio. O Direito de Empresa à luz do Novo Código Civil. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 35. 24 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007 p. 3. 20 Registro Civil das Pessoas Jurídicas, enquanto que uma sociedade mercantil, constituída com o objetivo de exercer atividades de indústria e/ou comércio, tinha o seu contrato social registrado nas Juntas Comerciais dos Estados.25 Paralelamente, existiam as firmas individuais e aos autônomos, na qual o empreendedor poderia atuar por conta própria, sem a participação de um ou mais sócios em qualquer ramo de atividade mercantil, constituindo uma Firma Individual na Junta Comercial, ou se atuasse na prestação de serviços em caráter pessoal e com independência, registrando-se como autônomo na Prefeitura local.26 Ocorre, porém, que o ordenamento jurídico pátrio passou a adotar uma nova divisão que não se embasa mais na atividade desenvolvida pela empresa, isto é, comércio ou serviços, mas no aspecto econômico de sua atividade, fundamentandose na “Teoria da Empresa”. Pode-se dizer que dependendo da existência ou não do aspecto "econômico da atividade", se uma pessoa desejar atuar individualmente em algum segmento profissional, enquadrar-se-á como empresário individual ou autônomo, ou ainda, reunindo-se com uma ou mais pessoas para, juntos, explorar alguma atividade, deverão constituir uma sociedade que poderá ser uma sociedade empresária ou sociedade simples, conforme veremos as diferenças entre uma e outra, mais adiante.27 O Código Civil de 2002 substituiu as denominações das sociedades, ou seja, as sociedades civis passaram a ser denominadas sociedades simples, e as sociedades comerciais denominadas de sociedades empresarias. Ainda, regulamentou como principal diferenciação entre ambas, o tipo de atividade desenvolvida ao invés de considerar o objeto social desenvolvido.28 Em seu Dicionário Jurídico-Comercial, Borges, que muito contribuiu para implantar as bases clássicas do direito comercial brasileiro, conceituou a sociedade: “[...] definida em geral, é um contrato pelo qual duas ou mais pessoas convêm 25 MELCHOR, Paulo. Direito de empresa no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 66, jun. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4132>. Acesso em: 30 mar. 2008. 26 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 369. 27 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual de Direito Comercial. 2. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2003. p. 88. 28 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 66. 21 voluntariamente em pôr alguma coisa em comum para melhor negócio lícito e maior ganho com responsabilidade nas perdas”.29 Como disposto no art. 981 do Código Civil Brasileiro: Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.30 As sociedades são formadas de pessoas, as quais são os sócios ou acionistas que subscrevem determinada quantidade de capital social e integralizam esse montante, tornando-se, dessa maneira, integrantes da pessoa jurídica, auxiliando no exercício das atividades, como também participando dos lucros.31 A sociedade empresária é, portanto, a pessoa jurídica que explora uma empresa. Entende-se que a denominação empresaria corresponde à própria sociedade, titular da atividade econômica, pois empresário, para todos os efeitos de direito, é a sociedade e não os seus sócios. Desse modo, é incorreto considerar os integrantes da sociedade empresária como os titulares da empresa, por ser essa qualidade característica da pessoa jurídica.32 Sobre o entendimento discorre Fuhrer: A sociedade constitui-se através de um contrato entre duas ou mais pessoas, que se obrigam a combinar esforços ou recursos para atingir fins comuns. O que mais diferencia as sociedades comerciais umas das outras é a forma de responsabilidade de seus sócios, pois, conforme o tipo de sociedade, respondem eles ou não com os seus bens particulares pelas obrigações sociais.33 O Direito Comercial nacional não permite a existência de sociedades unipessoais, tendo em vista que, para a constituição de uma sociedade é necessária a presença de pelo menos dois sócios, sejam estes pessoas físicas ou jurídicas, pois se somente uma pessoa desenvolver a atividade de empresa, esta o fará como empresário individual.34 29 BORGES, José Ferreira. Dicionário Jurídico-Comercial. Porto, 1856. ANGHER, Anna Joyce. Vade mecum acadêmico de direito. Código Civil. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2008. 31 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 83. 32 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 5. 33 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 36. 34 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 85. 30 22 Observa-se, que durante muito tempo, a sociedade unipessoal não se concebia no ordenamento jurídico, na medida em que a sociedade sempre significou a existência de um grupo de pessoas que reuniam seus esforços para um objetivo comum. No Brasil, convive-se com a possibilidade da existência da sociedade unipessoal em casos bastante específicos. Em relação as exceções da existência da sociedade unipessoal, discorre Bertoldi que: Na verdade, somente em duas situações nosso direito permite a unipessoalidade. São elas: a) Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76), em seu art. 206, prevê a continuidade da sociedade que, por qualquer motivo, remanesça com apenas um sócio, se o mínimo de dois for reconstituído no prazo de um ano. Durante esse prazo estaremos diante de uma sociedade unipessoal com responsabilidade limitada – essa regra se aplica também às demais sociedades do Código Civil, por força do seu art. 1.033, IV, reduzindo, no entanto, o prazo para a recomposição da pluralidade dos sócios para 180 dias; b) a chamada subsidiária integral, que, nos termos do art. 251 da Lei 6.404/76, conta com um sócio e deverá ter como instituidora uma sociedade brasileira. A sociedade instituidora não precisa necessariamente ser uma sociedade anônima, mas subsidiária integral deverá ser considerada como tal.35 Na constituição das sociedades empresárias, o registro do ato constitutivo (contrato ou estatuto social) faz nascer a pessoa jurídica de direito privado, entretanto, para a formação dessas sociedades é necessária, ainda, a composição de seu capital social, ou seja, precisa-se determinar o montante do capital e em quantas cotas ou ações será ele dividido. Com a formação do capital social, a sociedade poderá iniciar as negociações de suas cotas ou ações.36 Desse modo, observar-se-á no presente estudo que as sociedades empresárias se classificam em espécies com características específicas, que abrangem desde a sua constituição e personalização, à sua dissolução total ou parcial, dependendo das circunstâncias ensejadoras de sua despersonalização. 1.2 AS ESPÉCIES DE SOCIEDADES EMPRESÁRIAS, SUAS CARACTERÍSTICAS E SUA PERSONALIZAÇÃO 35 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 171. 36 NOGUEIRA, Ricardo José Negrão. Manual de Direito Comercial. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001. p.83. 23 A legislação brasileira considera nacional, a sociedade que cumpre os requisitos de sua constituição e esteja sediada em território nacional, e somente será admitida a constituição de sociedade empresária que estiver de acordo com uma das cinco espécies dispostas na lei. Destaca-se que, as partes interessadas em formar um tipo de sociedade empresária, não poderão adotar outra espécie de figura societária.37 De acordo com o direito brasileiro, os empreendedores só podem associarse sob a forma de sociedade empresária prevista no Código Civil, as quais podem ser classificadas em cinco tipos: nome coletivo, comandita simples, comandita por ações, anônima e limitada.38 O Código Civil apresenta, ainda, os dois tipos de sociedades sem personalidade jurídica: as sociedades em comum e as sociedades em conta de participação. Por outro lado, são consideradas sociedades personificadas as sociedades simples e as sociedades empresárias39 As sociedades em comum são aquelas que não têm personalidade jurídica, porque não registradas no órgão competente, portanto, é a designação de uma situação irregular em que se encontra a sociedade, e não do tipo societário. O Código Civil normatiza sobre as sociedades em comum nos arts. 986 a 990, e supletivamente, aplicam-se as regras das sociedades simples. Como disposto no art. 990 do Código Civil, todos os sócios da sociedade em comum respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, contraídas em nome da sociedade.40 Outro tipo societário desprovido de personalidade jurídica é a sociedade em conta de participação, sociedade esta, dotada de natureza secreta. O fato de serem secretas não significa que sejam ilícitas, nem irregulares. Integram essa sociedade o sócio ostensivo, quem exerce o objeto social e reponde direta e ilimitadamente pelas obrigações sociais; e o sócio participativo, quem resta oculto perante terceiros, apenas participando dos resultados obtidos com o objeto da sociedade, e somente 37 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 67. 38 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 147. 39 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 23. 40 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 69. 24 se obrigam perante o sócio ostensivo. Esta sociedade não possui nome empresarial, pode ser formada independentemente de qualquer formalidade e pode provar-se por todos os meios de direito.41 As sociedades empresárias podem, ainda, apresentar-se de forma personificada, ou seja, pessoas jurídicas de direito privado registradas no órgão competente. E, de acordo com o Código Civil de 2002 podem ser dispostas de cinco tipos, como apresentado a seguir. A sociedade em nome coletivo é um tipo societário pouco utilizado, tendo em vista a exigência dos sócios serem pessoas físicas, com responsabilidade solidária e ilimitada por todas as dívidas da empresa, podendo o credor executar os bens particulares dos sócios, mesmo sem ordem judicial. Essas sociedades têm o nome da empresa como firma ou razão social, não podendo utilizar-se de nome fantasia ou denominação, apesar de poderem ser compostas pelo nome dos sócios, acrescentando a expressão "& Cia" ao final.42 Tão pouco utilizada, aparece a sociedade em comandita simples, formada por sócios comanditados, que participam com capital e trabalho, tendo responsabilidade solidária e ilimitada; e comanditários, que aplicam apenas o capital, possuindo responsabilidade limitada ao capital empregado e não participando da gestão dos negócios da empresa. Destaca-se por ser uma empresa de capital fechado (não negociável em Bolsa), no qual o nome empresarial ou razão social devem apresentar apenas os sócios comanditados, sob pena de responsabilidade solidária e ilimitada do sócio que constar na razão social.43 A sociedade anônima é uma espécie de sociedade bastante utilizada, principalmente nos casos de grandes empresas, onde o capital encontra-se dividido em ações e cada acionista é responsável apenas pelo preço de emissão de suas próprias ações – responsabilidade limitada e não solidária. Os acionistas controladores respondem por abusos. Possui várias espécies de títulos tais como ações, partes beneficiárias, debêntures e bônus de subscrição, sendo regulamentada por diversos órgãos, devendo publicar seus atos no Diário Oficial e 41 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 429. 42 ASHIKAGA, Carlos Eduardo Garcia. As sociedades no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 80, 21 set. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4255>. Acesso em: 29 mar. 2008. 43 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 433. 25 em jornal de grande circulação editado no local da sede da companhia. O nome pode ser disposto em forma de denominação ou nome fantasia (não utiliza firma ou razão social), acrescidos da expressão "S/A" ou antecedido da expressão "Companhia" ou "Cia".44 A sociedade em comandita por ações, que se encontra em processo de extinção, é regida pelas normas relativas às sociedades anônimas, salvo a restrição de que somente os acionistas podem ser diretores ou gerentes, respondendo ilimitadamente pelas obrigações da empresa, enquanto os sócios comanditários possuem responsabilidade limitada ao capital social. Assim como as sociedades anônimas, pode ser empresa de capital aberto (ações em Bolsa de Valores). O nome apresenta-se como denominação ou nome fantasia, firma ou razão social, acrescidas da expressão "Comandita por Ações" ou "C/A".45 Por fim, a sociedade limitada, que é tipo mais utilizado no Brasil, alcançando mais de 90% das sociedades empresariais, pelo fato de cada sócio ter a responsabilidade restrita ao valor de suas cotas, mas responder solidariamente pela integralização do capital social, referente à parte não integralizada pelos demais sócios. Com o advento do Código Civil de 2002 foi muito afetada, pois era regulamentada por apenas 18 artigos do Decreto 3.708/19, o que dava ampla liberdade e flexibilidade ao seu contrato social. Seu nome pode apresentar-se como denominação ou nome fantasia, firma ou razão social, acrescidas da expressão "Ltda".46 Verifica-se, ainda, a existência das sociedades cooperativas, que de acordo com o Código Civil e com a Lei nº. 5.764/71 são consideradas sociedades simples, independentes de seu objeto e porte, que devem ter seus estatutos sociais e atos societários registrados no Cartório ou na Junta Comercial, cabendo aos sócios a responsabilidade de escolha.47 44 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 47. 45 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 169. 46 ASHIKAGA, Carlos Eduardo Garcia. As sociedades no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 80, 21 set. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4255>. Acesso em: 29 mar. 2008. 47 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 72. 26 Cabe ressaltar que, as sociedades podem ser classificadas de acordo com alguns critérios, dentro os quais sua forma de capital, sua estrutura econômica, sua personificação e a responsabilidade dos sócios. Em relação à sua forma de capital a sociedade pode ser de capital fixo, cujo capital é determinado e estável, só podendo ser modificado por alteração contratual; ou de capital variável, que é caso das sociedades cooperativas. No que tange à sua estrutura econômica, podem ser sociedade de pessoas, constituídas em função da qualidade pessoal dos sócios; ou sociedade de capitais, constituídas levando em consideração o capital social.48 As sociedades empresariais podem apresentar-se de forma não- personificada ou que não tenha personalidade jurídica, e de forma personificada ou que adquirem personalidade jurídica própria. Deste modo, diz-se da sociedade empresarial, toda aquela que exercer atividade econômica organizada, para a produção ou a circulação de bens ou serviços, incluindo a indústria, o comércio, o setor de prestação de serviços, podendo abranger também a atividade rural.49 A personalização das sociedades nem sempre está relacionada à limitação da responsabilidade de seus integrantes, pois como observado, há no Brasil, sociedades personalizadas onde os sócios respondem ilimitadamente pelas obrigações, bem como há sociedades despersonalizadas onde os sócios podem responder limitadamente.50 Ressalta-se, portanto, que além de dar publicidade aos atos jurídicos, o registro faz com que a sociedade nasça no mundo jurídico, como pessoa jurídica, onde o efeito só ocorre com o registro do contrato social de uma sociedade. Entretanto, o empresário individual não possui, e jamais possuirá personalidade jurídica, pois desde o nascimento já possui a sua personalidade definida.51 As sociedades adquirem personalidade jurídica com o registro de seus atos constitutivos junto ao órgão competente, que no caso das sociedades empresárias é a Junta Comercial, e se tratando de sociedades simples, se realizará junto ao Ofício do Registro Civil de Pessoa Jurídica. Em razão de sua falta de personalidade jurídica, a sociedade que não registra seus atos constitutivos é uma sociedade 48 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 374. 49 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 38. 50 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 7. 51 NOGUEIRA, Ricardo José Negrão. Manual de Direito Comercial. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001. p.82. 27 irregular, que arcará com diversas conseqüências jurídicas, ou seja, estará à mercê de sanções àqueles que desenvolvem atividade econômica desrespeitando a legislação.52 Sobre a personalidade jurídica das sociedades empresárias, discorre Rubens Requião que: Formada a sociedade comercial pelo concurso de vontades individuais, que lhe propiciam os bens ou serviços, a conseqüência mais importante é o desabrochar de sua personalidade jurídica. A sociedade transforma-se em novo ser, estranho à individualidade das pessoas que participam de sua constituição, dominando um patrimônio próprio, possuidor de órgãos de deliberação e execução que ditam e fazem cumprir a sua vontade. Seu patrimônio, no terreno obrigacional, assegura sua responsabilidade direta em relação a terceiros. Os bens sociais, como objetos de sua propriedade, constituem a garantia dos credores, como ocorre com os de qualquer pessoa natural.53 Não obstante, as sociedades podem ser classificadas quanto ao regime de constituição e dissolução, quanto às condições para a alienação da participação societária e quanto à responsabilidade dos sócios. Neste diapasão, abordar-se-á no item subseqüente, a classificação das sociedades empresárias em relação à responsabilidade dos sócios. 1.3 OS SÓCIOS DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E SUAS RESPONSABILIDADES A responsabilização da sociedade ou dos sócios, que historicamente utilizou-se de elementos e termos como ilicitude de determinados atos, prejuízo a 52 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. 52 p. 68. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 7. 52 NOGUEIRA, Ricardo José Negrão. Manual de Direito Comercial. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001. p.82. 52 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 68. 53 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 384. 28 outrem, negligência, imprudência, imperícia, perdas e danos, e obrigação de reparar, vem sofrendo alterações que atingem diretamente as sociedades brasileiras.54 Todavia, antes de se falar em responsabilidade, é necessário apresentar o significado de sócio, que de acordo com o Dicionário Aurélio, “é o membro de uma sociedade; societário; aquele que se associa com outro numa empresa, da qual espera auferir lucros”.55 Os sócios são as pessoas físicas ou jurídicas que contribuem para a formação da sociedade ou que nela ingressam após a sua constituição. Em se tratando de pessoa física, deverá contar com capacidade, nos termos da lei civil, para que possa validamente comprometer-se com a sociedade, e, no que se refere a sócio pessoa jurídica, deverá ela estar representada por pessoa eleita nos termos do seu contrato social ou estatuto.56 Isto posto, o sócio ou acionista das sociedades empresárias submete-se a um regime próprio, de modo que a lei tutela uma parte desses direitos e deveres, e a outra parte é disciplinada pelos contratos e estatutos sociais das sociedades, e, dependendo do tipo de sociedade, esses direitos e deveres dos sócios adéquam-se às necessidades da pessoa jurídica em questão.57 Ressalta-se que, mesmo que os direitos dos sócios não estejam explicitados no contrato social, decorrem de lei alguns direitos básicos insuscetíveis de supressão: direito de participar dos lucros sociais, direito de fiscalizar a escrituração social, direito de recesso, direito à prestação de contas dos administradores, e direito de votar nas deliberações sociais nas sociedades contratuais.58 Os sócios, considerados membros da sociedade empresária, podem ingressar na sociedade tanto na sua fundação, assinando o contrato ou ato 54 ASHIKAGA, Carlos Eduardo Garcia. As sociedades no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 80, 21 set. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4255>. Acesso em: 29 mar. 2008. 55 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: dicionário da língua portuguesa. 3. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 1874. 56 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 166. 57 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 68. 58 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 130. 29 constitutivo, como subscrevendo aumento de capital ou substituindo um sócio que se retira, através da cessão e transferência de sua parte capital.59 Desse modo, têm como principal obrigação ao assinar o contrato social, a função de investir na sociedade, determinados recursos, isto é, eles têm que cumprir o compromisso contraído ao assinar o contrato, de entregar para a sociedade, dinheiro, bem ou crédito no montante contratado com os demais sócios. Na linguagem utilizada pelo direito societário, cada sócio tem o dever de integralizar a quota do capital social que subscreveu.60 Ao contrário do ocorre com os contratos bilaterais, não há contraprestações das partes que se cruzam, pois as prestações saem do patrimônio social comum. Nesse ato também não existem partes com interesses contrapostos, mas só parte, integrada por todos os sócios e caracterizada pela busca de um mesmo interesse, com obrigações convergentes.61 O Código Civil Brasileiro dispõe em seu art. 1001 e seguintes sobre os direitos e obrigações dos sócios dentro de uma sociedade empresária personificada, legislando que: Art. 1001 – As obrigações dos sócios começam imediatamente com o contrato, se este não fixar outra data, e terminam quando, liquidada a sociedade, se extinguirem as responsabilidades sociais.62 Observa-se que a sociedade aparece como o meio facilitador de celebração de um negócio jurídico, interpondo-se entre os sócios para representar o conjunto por eles formado e figurar em relações jurídicas que vier a manter com cada qual ou com terceiros.63 Em virtude dos sócios possuírem uma parcela representativa do capital social (quotas ou ações), eles são titulares de direitos e obrigações diante da sociedade empresária. Deste modo, destacam-se alguns direitos e deveres comuns a todos os sócios. Os sócios têm o dever fundamental de contribuir para a 59 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 441. 60 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 398. 61 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual de Direito Comercial. 2. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2003. p. 113. 62 ANGHER, Anna Joyce. Vade mecum acadêmico de direito. Código Civil. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2008. 63 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual de Direito Comercial. 2. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2003. p. 113. 30 integralização do capital social, bem como o dever de lealdade e cooperação recíproca.64 Em relação à integralização do capital social, Bertoldi acrescenta que: Quando da constituição da sociedade, deve obrigatoriamente ficar estabelecido o montante da contribuição de cada sócio. [...] Após a subscrição do capital social, ou seja, após os sócios se comprometerem perante a sociedade a cumprir com determinada quantia em dinheiro ou com a entrega de determinado bem para a integralização do capital social, se qualquer deles deixar de fazê-lo no modo e tempo combinado, terá a sociedade duas alternativas ao seu dispor: executar o sócio inadimplente ou excluí-lo da sociedade.65 O art. 1004 do CC estabelece que “os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora”. O parágrafo único do mesmo artigo completa disponde que, “verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.03166”.67 Quanto ao dever de lealdade e cooperação recíproca, Bertoldi discorre em sua obra que: [...] Muito embora não exista disposição legal expressa a esse respeito, a constituição e manutenção da sociedade pressupõe o envolvimento positivo de todos os sócios, que se comprometem a unir suas forças para a consecução dos objetivos sociais em busca do lucro. Por esse motivo, não é possível que o sócio venha a assumir posição conflitante com os interesses da sociedade. É o que ocorre quando um dos sócios, por si próprio ou pela participação em outra sociedade, assume posição de concorrência com relação à primeira sociedade. Essa concorrência contraria frontalmente os objetivos sociais, razão pela qual a doutrina e a jurisprudência têm 64 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 166. 65 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 167. 66 o Art. 1.031, § 1 , do CC - Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. 67 ANGHER, Anna Joyce. Vade mecum acadêmico de direito. Código Civil. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2008. 31 entendido que situações como essa possibilitam a exclusão dos quadros sociais do sócio que falta com o dever de lealdade.68 Em contrapartida, os sócios são detentores de direitos perante a sociedade que podem ser relacionados como: participação dos lucros da empresa, fiscalizar a administração bem como a escrituração da sociedade empresária, retirar-se da sociedade em determinadas condições estipuladas no contrato, exigir a prestação de conta por parte dos administradores, votarem nas assembléias sobre as atividades e destinos da sociedade, e direito de preferência na subscrição de quotas ou ações.69 Os sócios têm o direito de participar dos lucros sociais, considerando-se nula qualquer cláusula que venha a excluir tal direito. Contudo, a doutrina e a jurisprudência trataram de limitar a nulidade somente para a cláusula que determinava a exclusão do direito, sem que isso afetasse todo o contrato.70 Nesse sentido, adveio o art. 1008 do CC, estabelecendo que “é nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas”. Portanto, o contrato não pode conter cláusulas que atribua os lucros a apenas alguns, em detrimento de outros sócios, e, mesmo na hipótese de dissolução da sociedade, após a liquidação, o capital remanescente será partilhado entre os sócios na proporção de suas cotas.71 Quanto ao direito de fiscalização, cabe ressaltar que estes se subdividem em dois níveis: o primeiro refere-se ao acompanhamento dos atos de gestão da sociedade, ao passo que o segundo, se fundamenta na possibilidade de cada sócio de examinar a escrituração contábil, a qualquer tempo. Observa-se, ainda, que nas sociedades empresárias não se pode recusar aos sócios o exame de todos os livros, documentos, escrituração, etc., bem como, na mesma direção os administradores são obrigados a prestar contas de sua gestão aos demais sócios.72 68 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 167. 69 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 93 e 94. 70 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 168. 71 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 68. 72 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 130. 32 Outro direito dos sócios é o de retirar-se da sociedade, como esclarece Perrotta Gonçalves: Haverá em decorrência desse direito de retirada, uma dissolução parcial da sociedade, com conseqüente redução do capital social. O sócio que sai terá direito ao valor equivalente às suas cotas. Em se tratando de sociedade contratual por prazo indeterminado, qualquer sócio poderá retirar-se da sociedade mediante notificação aos demais sócios com, no mínimo, 60 dias de antecedência. Se a sociedade tiver prazo determinado, o sócio somente poderá retirar-se se houver justa causa, comprovada judicialmente (art. 1.02973, CC). Nos 30 dias seguintes à notificação, os demais sócios poderão optar pela dissolução de toda a sociedade (art. 1.02974, parágrafo único)75. O direito à prestação de contas justificada e à analise dos balanços anuais (art. 1.02076 do CC), é um direito de singular magnitude no cotidiano societário, haja vista os sócios poderem exigir, a qualquer tempo, a prestação de contas por parte dos administradores.77 Os sócios detêm, ainda, o direito de votar nas assembléias sobre as atividades e destinos da sociedade, direito este de natureza pessoal, que é exercido pelo sócio na proporção de sua participação no capital social, observado que podem influenciar diretamente nos rumos da sociedade, o sócio ou grupo de sócios que detiver a maior parte do capital social.78 Fidedignamente, os sócios possuem, também, preferência na subscrição de cotas ou ações, objetivando a manutenção da participação societária e, permitindo o aumento do capital social somente após todo o capital social estiver integralizado.79 No que tange a responsabilidade dos sócios, deve-se considerar a espécie de sócio, pois cada uma dessas espécies determina as características de sua 73 Art. 1.029, do CC - Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa. 74 Art. 1.029, parágrafo único, do CC - Nos trinta dias subseqüentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade. 75 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 94. 76 Art. 1.020, do CC - Os administradores são obrigados a prestar aos sócios contas justificadas de sua administração, e apresentar-lhes o inventário anualmente, bem como o balanço patrimonial e o de resultado econômico. 77 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 131. 78 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 168. 79 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 95. 33 responsabilidade. Sendo assim, o sócio será de responsabilidade limitada (sociedade limitada e anônima), de responsabilidade ilimitada (sociedade em nome coletivo), ou de responsabilidade mista (sociedades em comandita simples e comandita por ações).80 Em relação à responsabilidade dos sócios, Maria Gabriela Perrotta apresenta que, na prevalência do princípio da autonomia patrimonial e de que a responsabilidade dos sócios é sempre subsidiária, a repercussão dessa responsabilidade pode ser: De forma ilimitada, onde o patrimônio dos sócios responderá subsidiariamente, porém de forma ilimitada, pelas obrigações sociais; De forma limitada, na qual os sócios respondem com seu patrimônio pessoal pelas obrigações sociais de forma subsidiária e limitada, onde o montante da limitação dependerá do tipo societário e da subscrição de capital feita pelo sócio; E de forma mista, onde parte dos sócios responde de forma limitada e parte de forma ilimitada pelas obrigações sociais.81 Nas sociedades em geral observa-se que, em razão da natureza subsidiária da responsabilidade dos sócios e da decorrente exaustão do patrimônio social como pressuposto de responsabilização, somente após o processo de falência que será possível executar os bens do patrimônio particular dos sócios para a garantia de obrigação social.82 Tendo em vista que o sócio tem, perante a sociedade, o dever de integralizar a quota subscrita, ou seja, de transferir do seu patrimônio para o social dinheiro, bens ou crédito, nos termos do compromisso contratual assumido junto aos demais sócios, destaca-se a figura do sócio remisso, que na concepção de Bertoldi, “é aquele que não cumpre, no prazo, a obrigação de integralizar a quota subscrita”.83 Desse modo, deverá ele arcar com os prejuízos decorrentes da mora causados à empresa, e, permanecendo inadimplente, a sociedade pode cobrar-lhe o devido, em juízo, expulsá-lo, restituindo ao remisso as entradas feitas, deduzidas às 80 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 448. 81 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 68. 82 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 398. 83 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 167. 34 quantias correspondentes aos juros de mora, ou ter suas cotas reduzidas ao montante por ele efetivamente pago.84 A sociedade empresária tem como um de seus elementos o affecio societatis, que para Bertoldi “é a vontade de constituir e manter a sociedade por parte dos sócios, que guardam relação de identidade com os demais sócios e com os objetivos perseguidos pela sociedade”. Por isso, quando ferido o dever de lealdade e cooperação recíproca, o affecio societatis deixa de existir, ocasionando a dissolução da sociedade ou então a exclusão do sócio que faltou com o dever fundamental de lealdade, em virtude da desarmonia gerada entre os sócios.85 No que tange as características das sociedades empresárias, pode se observar, que esta é um sujeito capaz de direitos e obrigações, podendo ou não adquirir sua personalidade jurídica, uma vez que “a sociedade empresária é a pessoa jurídica que explora uma empresa”86. Desse modo, o próximo capítulo, esclarecerá as noções de como uma sociedade se desconstitui, ou seja, como esta pode se dissolver de modo natural ou forçado. 84 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 68. 85 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 167. 86 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 5. 35 2 A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO 2.1 A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO A sociedade empresária surge quando duas ou mais pessoas se reúnem e a constituem com o objetivo de exploração de algum tipo de atividade econômica, extinguindo-se no momento que ocorra algum fato impeditivo de sua continuidade, ou seja, através do processo de dissolução.87 No direito societário dissolução é um conceito ambíguo, na medida em que, em sentido amplo significa o procedimento de terminação da personalidade jurídica da sociedade empresária, ao passo que em sento estrito, a dissolução se refere ao ato, judicial ou extrajudicial, que desencadeia o procedimento de extinção da pessoa jurídica.88 Neste diapasão acrescenta Ulhoa Coelho: A partir da dissolução, compreendida em sentido amplo, a sociedade empresária não mais titulariza direitos, nem é devedora de prestação. (...) Os atos de encerramento da personalidade jurídica da sociedade empresária (a dissolução, em sentido amplo) distribuemse nas fases da dissolução (sentido estrito), liquidação e partilha.89 Cabe ressaltar, entretanto, que o Código Comercial regulava a dissolução das sociedades comerciais tendo por precípua finalidade proporcionar a libertação do sócio de seus compromissos sociais. E, ainda, apresentava a dissolução de duas formas, quais sejam a dissolução de pleno direito e a dissolução judicial.90 Sobre as formas de dissolução, discorre Requião: Naquele sistema predominante, duas formas de dissolução existiam: a dissolução de pleno direito e a dissolução judicial. Catalogou o art. 335 a primeira forma, ao declarar que se reputam dissolvidas as sociedades: 1) expirasse o prazo ajustado de sua duração; 2) por 87 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 153. 88 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 450. 89 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 450. 90 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 24. ed. 2. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 325. 36 quebra da sociedade ou qualquer dos sócios; 3) por mútuo consenso de todos os sócios; 4) pela morte de um dos sócios, salvo convenção em contrário a respeito dos que sobreviverem; 5) por vontade de um dos sócios, sendo a sociedade celebrada por tempo indeterminado.91 As sociedades poderiam, ainda, ser dissolvidas judicialmente de acordo com o revogado art. 336 do Código Comercial, pela impossibilidade da consecução do objeto social; pela inabilidade ou incapacidade moral ou civil de alguns sócios; ou pelo abuso, prevaricação, violação ou falta de cumprimento das obrigações sociais, ou fuga de algum dos sócios.92 Observa-se, que nem sempre determinada causa dissolve a sociedade, independentemente de provimento judicial, se os sócios não se põem de acordo quanto à sua verificação. Portanto, quando os sócios estão de acordo que o negócio se mostra inviável, dissolvem extrajudicialmente a sociedade; mas se apenas a minoria está convencida da inviabilidade da empresa, a dissolução só poderá ser judicial.93 No que tange a distinção entre dissolução de pleno direito, amigável e judicial, discorre Ulhoa Coelho: De acordo com essa classificação, certas causas, como a falta de pluralidade de sócios além de 180 dias, dissolvem a sociedade, mesmo contra a vontade dos seus membros: é a dissolução de pleno direito; outras causas, como o distrato, importam no desfazimento da sociedade, por vontade dos sócios: é a amigável; e, finalmente, causas como a falência ou a impossibilidade de realização do objeto social redundam o fim da pessoa jurídica, em razão de controvérsia decidida pelo juiz: esta é a solução judicial.94 Baseada na constante evolução da sociedade, a doutrina e a jurisprudência passaram a prestigiar cada vez mais o princípio da preservação da empresa, pelo qual a sociedade empresária não poderia se extinguir em havendo qualquer dos sócios que não concordasse com a dissolução.95 Hodiernamente, o direito societário brasileiro abrange dois diferentes regimes dissolutórios, onde de um lado é regulado pela Lei das Sociedades por 91 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 24. ed. 2. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 326. 92 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 154. 93 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 452. 94 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 451. 95 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 154. 37 Ações (artigo 206 e seguintes) referentes às institucionais, e de outro pelo Código Civil (artigo 1.033 a 1.038) relacionado às contratuais. As concepções básicas são as mesmas, existindo diferença apenas em razão da natureza dos vínculos jurídicos que se desfazem (contratual ou institucional). Desse modo, a dissolução, caracterizada como procedimento de terminação da personalidade jurídica da sociedade empresária, compreende três fases: a dissolução, a liquidação e a partilha.96 Deste modo, a primeira fase é justamente a dissolução em sentido estrito ou propriamente dita, precedida pela fase de liquidação. Nesta última, procede-se à realização do ativo da sociedade e pagamento do passivo. Encerrada a liquidação, ou seja, pago o passivo, e se ainda restar algum patrimônio, este será dividido entre os sócios, cada um percebendo na proporção de suas cotas. Essa fase é denominada partilha e encerra-se quando os sócios recebem o que restou do patrimônio da sociedade.97 Segundo o Código Civil Brasileiro e com fundamento no princípio da preservação da empresa, a dissolução e a liquidação das sociedades se darão nas seguintes hipóteses: por vontade dos sócios (art. 1.033, II e III); em decurso do prazo de duração (art. 1.033, I); por falência da sociedade (art. 1.044); unipessoalidade (art. 1.033, IV, e art. 206, I, d, da Lei das SA); irrealização do objeto social (art. 1.034, II); extinção da autorização para funcionar (art. 1.033, V); e outras causas definidas no contrato social (art. 1.035).98 No que tange a dissolução por vontade dos sócios na sociedade anônima (art. 206, I, c, da LSA99, e art. 1.033, II100 e III101, do CC), esta terá lugar numa assembléia geral extraordinária, onde a lei exige para a deliberação, pelo menos metade do quorum qualificado de acionistas das ações com direito a voto. Já na sociedade limitada, a dissolução depende da aprovação de ¾ do capital social (art. 96 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 450. GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 128 e 129. 98 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 154. 99 Art. 206, I, c, da LSA - Dissolve-se a companhia de pleno direito por deliberação da assembléiageral (art. 136, X). 100 Art. 1.033, II, do CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer o consenso unânime dos sócios; 101 Art. 1.033, III, do CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado. 97 38 1.076, I102, do CC), necessariamente manifestada em assembléia ou reunião para votar o ato dissolutório.103 Em relação à dissolução por decurso do prazo de duração, Bertoldi apresenta que: O inciso I do artigo 1.033 do CC104 estabelece que para que ocorra a dissolução da sociedade pelo decurso de seu prazo de duração, é necessária que a sociedade efetivamente venha a ser liquidada, sob o risco de tornar-se, automaticamente, por prazo indeterminado. Ressalta-se, ainda, que os sócios deverão providenciar a alteração contratual dentro de um prazo razoável, sob pena de o contrato não mais refletir a verdade.105 A falência (art. 206, II106, c, da LSA e art. 1.044107 do CC) é uma modalidade de processo judicial de execução que importa na dissolução da sociedade, utilizada para em determinadas situações de insolvabilidade da empresa, para garantir o tratamento paritário dos credores.108 E, portanto, será abordada com maior ênfase no terceiro Capítulo do presente estudo. Como apresentado no capítulo anterior, na edição do atual Código Civil, o legislador não se preocupou em criar dispositivos de lei sobre a sociedade unipessoal, razão pela qual determina a dissolução da sociedade com somente um sócio, desde que a pluralidade não seja regularizada no prazo de 180 dias, correspondente ao de um ano ou até a realização da próxima reunião ou assembléia de sócios, previstos no art. 18 do Dec. 3.708/19, cumulado com art. 206, I, d da LSA.109 A sociedade poderá ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando for anulada a sua constituição, houver exaurido o fim social ou 102 o Art. 1.076, I, do CC - Ressalvado o disposto no art. 1.061 e no § 1 do art. 1.063, as deliberações dos sócios serão tomadas pelos votos correspondentes, no mínimo, a três quartos do capital social, nos casos previstos nos incisos V e VI do art. 1.071. 103 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 452. 104 Art. 1.033, I, do CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado 105 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 155. 106 Art. 206, II, c, do CC - Dissolve-se a companhia por decisão judicial em caso de falência, na forma prevista na respectiva lei. 107 Art. 1.044 do CC - A sociedade se dissolve de pleno direito por qualquer das causas enumeradas no art. 1.033 e, se empresária, também pela declaração da falência. 108 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 454. 109 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 156. 39 for constatada a irrealização do objeto social (art. 1.034110 do CC).111 Por outro lado, exaure-se o objeto social naquelas sociedades de propósito específico, constituídas com um objetivo claro e delimitado, como exemplo da construção de uma determinada obra.112 A dissolução da sociedade também pode ocorrer pela extinção da autorização de funcionamento (art. 206 I, da LSA e art. 1.033, V113 do CC), como demonstrado por Ulhoa Coelho em sua obra: Para as sociedades de funcionamento sujeito a autorização estatal, a extinção da autorização pode causar a dissolução. Contudo, dependendo do regime de direito público aplicável, ou a sociedade deixa de explorar aquela atividade específica, ou extingue-se mediante a dissolução.114 Observa-se, ainda, que o contrato social poderá estabelecer outras regras de dissolução da sociedade, que ocorrerá extrajudicialmente, quando averbada no registro da empresa na Junta Comercial, se deliberado entre os sócios, ou judicial, quando forem contestadas.115 Desse modo, passa-se a analisar o processo de liquidação e partilha das sociedades empresárias, procedimentos estes com a finalidade de extinguir a empresa e despersonalizá-la, arrecadando os bens necessários para o pagamento dos credores. 2.1.1 O processo de liquidação da sociedade empresária 110 Art. 1.034 do CC - A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando: I - anulada a sua constituição; II - exaurido o fim social, ou verificada a sua inexeqüibilidade. 111 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 132. 112 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 157. 113 Art. 1.033, V do CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. 114 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 456. 115 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 132. 40 Consolidada a dissolução da sociedade, seja de pleno direito, judicialmente ou extrajudicialmente, cabe a liquidação do patrimônio social, realizando-se o ativo e satisfazendo o passivo, de modo que todos os bens e direitos inerentes à sociedade sejam convertidos em dinheiro para pagamento dos credores, e divisão do saldo restante entre os sócios, na proporção de seus quinhões.116 Nesta fase, os sócios deverão providenciar a investidura do liquidante e restringir a gestão da sociedade aos negócios inadiáveis (art. 1.036117 do CC). O liquidante, quando não designado no contrato social, será eleito por deliberação dos sócios, e poderá ser um terceiro estranho à sociedade (art. 1.038118 do CC). E, durante a liquidação (judicial ou extrajudicial), a personalidade jurídica da sociedade restringe-se à prática dos atos necessários à sua dissolução.119 Nesse sentido Ulhoa Coelho apresenta em sua obra: Após a dissolução, a sociedade empresária conserva sua personalidade jurídica apenas para cumprir as finalidades da liquidação (realização do ativo e satisfação do passivo). Para proteger os interesses de terceiros de boa-fé, nessa fase, além do registro do ato dissolutório na Junta, prevê a lei que a sociedade acresça ao seu nome a expressão “em liquidação”, e o órgão de representação legal não seja mais a diretoria ou gerência, mas sim o liquidante.120 Cabe, desse modo, a liquidação do patrimônio social, mediante o qual será realizado o ativo e satisfeito o passivo, ou seja, todos os bens e direitos pertencentes à sociedade serão transformados em dinheiro para pagamento de seus credores, e o saldo que porventura sobrar dessa operação será distribuído aos sócios na proporção de seus quinhões.121 2.1.2 Da partilha 116 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 157. 117 Art. 1.036 do CC - Ocorrida a dissolução, cumpre aos administradores providenciar imediatamente a investidura do liquidante, e restringir a gestão própria aos negócios inadiáveis, vedadas novas operações, pelas quais responderão solidária e ilimitadamente. 118 Art. 1.038 do CC - Se não estiver designado no contrato social, o liquidante será eleito por deliberação dos sócios, podendo a escolha recair em pessoa estranha à sociedade. 119 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 132. 120 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 450. 121 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 157. 41 A partilha dos bens da sociedade entre os sócios se dará, no momento em que todo o passivo social for pago e restar algum patrimônio, na proporção das cotas de cada um, salvo disposição em contrário.122 Considera-se extinta a sociedade, quando finalizada a liquidação e realizada a partilha do saldo líquido entre os sócios, momento em que o liquidante convocará assembléia de sócios para a prestação final de contas (art. 1.108123 do CC). Aprovadas as contas, a sociedade extinguir-se-á quando o ato de dissolução for arquivado na Junta Comercial.124 2.1.3 Distinção entre dissolução total e dissolução parcial A doutrina entende existir uma diferença entre a dissolução total e a dissolução parcial da sociedade, de modo que, a total ocorre quando efetivamente a sociedade se extingue ao passo que a parcial, ocorre quando um ou alguns dos sócios é excluído da sociedade, remanescendo os demais.125 O Código Civil de 2002 denominou a dissolução parcial de resolução da sociedade em relação a um sócio, na qual ocorre o desvinculamento de algum sócio do quadro social, o que não implica a dissolução total da sociedade, que procede com suas atividades empresariais, desde que ainda composta por uma pluralidade de sócios.126 Neste diapasão, Ulhoa Coelho disserta sobre o princípio da preservação da empresa: O princípio da preservação da empresa, esculpido na doutrina e na jurisprudência principalmente a partir dos anos 1960, recomenda a dissolução parcial da sociedade limitada, como forma de resolver conflitos entre os sócios, sem comprometer o desenvolvimento da 122 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 133. 123 Art. 1.108 do CC - Pago o passivo e partilhado o remanescente, convocará o liquidante assembléia dos sócios para a prestação final de contas 124 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 157. 125 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 158. 126 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 133. 42 atividade econômica nem sacrificar empregos, reduzir o abastecimento do mercado de consumo ou prejudicar pessoas direta ou indiretamente beneficiadas com a empresa.127 Destarte as sociedades empresárias detenham a capacidade de se dissolverem, a dissolução parcial somente está presente nas sociedades contratuais, onde existe o vínculo entre os sócios e que pode ser rompido com a dissolução. Desta feita, são hipóteses de dissolução parcial a morte, a retirada ou a exclusão de um sócio.128 Com o falecimento de um sócio, a participação societária, bem como os demais elementos do patrimônio do falecido, será atribuída, por sucessão causa mortis, a um herdeiro ou legatário, de modo que esse sucessor pode querer ou não fazer parte da sociedade. Neste caso, a dissolução parcial caracteriza-se pela divergência ou convergência de vontades entre os sócios sobreviventes e os sucessores.129 No que tange a dissolução parcial pela morte de um sócio, Bertoldi acrescenta: Na hipótese de falecimento de qualquer dos sócios (CC, art. 1.028, caput130), na falta de disposição especial no próprio contrato social, as quotas que pertenciam ao de cujus deverão ser liquidadas e o resultado econômico da liquidação deverá compor o espólio. Estabelece o Código Civil que poderão os sócios sobreviventes optar pela solução da sociedade (CC, art. 1.028, II131), disposição essa que se torna redundante, pois o próprio Código estabelece a possibilidade de liquidação da sociedade por deliberação unânime entre sócios (CC, art. 1.033,II132). Prevê, ainda, o Código Civil a possibilidade de os herdeiros do sócio falecido virem a compor os quadros sociais em sua substituição, desde que assim seja deliberado pela maioria dos votos dos sócios presentes, se o contrato social não estabelecer maioria mais elevada (CC, art. 1.076, III133).134 127 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 461. GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 134. 129 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 467. 130 Art. 1.028 do CC - No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota. 131 Art. 1.028, II do CC - No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade. 132 Art. 1.033, II do CC - Dissolve-se a sociedade quando ocorrer o consenso unânime dos sócios. 133 o Art. 1.076, III do CC - Ressalvado o disposto no art. 1.061 e no § 1 do art. 1.063, as deliberações dos sócios serão tomadas pela maioria de votos dos presentes, nos demais casos previstos na lei ou no contrato, se este não exigir maioria mais elevada. 134 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 160. 128 43 Portanto, falecendo um sócio, liquidar-se-á sua cota, exceto se o contrato dispuser contrariamente, se os sócios remanescentes preferirem a dissolução total da sociedade ou concordarem com o ingresso do sucessor do sócio falecido no quadro social.135 Outra hipótese de dissolução parcial é o direito de retirada, que é um ato unilateral de um sócio desinteressado de permanecer na sociedade, onde nos termos do art. 1.029136 do CC, além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade, operando-se a dissolução parcial por retirada imotivada, mediante simples notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias, e se por retirada motivada, opera-se mediante justa causa provada em juízo.137 O sócio pode, ainda, de acordo com o art. 1.030 do CC, ser excluído judicialmente de uma sociedade por falta grave no cumprimento de suas obrigações ou incapacidade superveniente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios. O parágrafo único do mesmo artigo dispõe que, o sócio declarado falido ou aquele cuja cota tenha sido liquidada por credor será excluído da sociedade de pleno direito.138 Sobre as hipóteses de dissolução parcial acrescenta Ulhoa Coelho: Quando o sócio descumpre seus deveres com a sociedade (integralizar a quota subscrita e contribuir para o desenvolvimento da empresa), pode ser expulso. A expulsão importa a dissolução parcial da sociedade limitada. Se o expulso for minoritário, e o contrato social contemplar cláusula permissiva ou sendo a motivação do ato a mora na integralização das quotas subscritas, a dissolução será extrajudicial. Já se o expulso for majoritário, ou o contrato social não permitir expressamente a expulsão do minoritário por justa causa, os sócios interessados deverão pleitear a exclusão em juízo. Nesse caso, a dissolução é judicial.139 135 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 134. 136 Art. 1.029 do CC - Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa. 137 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 464 e 465. 138 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 135. 139 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 465. 44 E, por fim, admite-se a exclusão do sócio remisso que não integraliza as cotas por ele subscritas (art. 1.004140, parágrafo único do CC). Desse modo, observa-se que, a dissolução parcial, diferentemente da total, não é precedida pelas fases da liquidação e partilha, pois após a saída do sócio da sociedade, segue-se a chamada apuração de haveres.141 2.1.4 Da apuração de haveres Para garantir o equilíbrio na composição dos interesses, o sócio, na dissolução parcial, deve receber exatamente o que receberia se fosse esta total. A apuração de haveres simula a liquidação da sociedade, para definir o valor do reembolso. A liquidação da quota só será feita por outro critério, se expressamente determinado em contrato social.142 No entendimento de Perrota Gonçalves: Nesta, há a liquidação apenas das cotas do sócio desvinculado, entregando-se a ele a mesma quantia que receberia na partilha da dissolução total. O valor de sua cota, considerado pelo montante efetivamente realizado, será definido de acordo com a situação patrimonial da sociedade, verificada em balanço especialmente levantado (art. 1.031 do CC). Assim, o sócio recebe o valor patrimonial de suas cotas, que corresponde à proporção delas em relação ao patrimônio atual da sociedade. Esse valor difere do valor nominal, que é aquele previsto no contrato social.143 A apuração dos haveres deve ser efetuada sobre o último balanço aprovado, realizado pela sociedade, onde a cota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias a partir da liquidação, salvo determinação contrária.144 140 Art. 1.004 do CC - Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o o disposto no § 1 do art. 1.031. 141 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 135. 142 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 468. 143 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 135. 144 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 24. ed. 2. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 335. 45 2.2 AS CONSEQUÊNCIAS DA DESCONSIDERAÇÃO PERSONALIDADE JURÍDICA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA Como apresentado no primeiro capítulo, as sociedades empresárias adquirem sua personalidade jurídica no momento em que registram seus atos constitutivos no órgão competente, e, desse modo, passam a deter autonomia patrimonial, isto é, seu patrimônio é distinto do patrimônio particular de seus sócios, e servirá para adimplir as obrigações sociais.145 Entretanto, em razão do princípio da autonomia patrimonial, as sociedades empresárias podem ser utilizadas como instrumento para a realização de fraudes contra credores ou mesmo abuso de direito, na medida em que a consideração da pessoa jurídica importa a inviabilidade de correção da fraude ou do abuso, por ser a sociedade o sujeito titular dos direitos e devedor das obrigações, e não os seus sócios.146 A sociedade, simples ou empresarial, tem individualidade própria, não se confundindo com as pessoas dos sócios. Contudo, essa regra é derrogada por um fenômeno denominado desconsideração da personalidade jurídica.147 Com a edição do Código Civil de 2002, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica passou a ser recepcionada em todas as relações jurídicas, e não somente em situações específicas, como é o caso do abuso de utilização da pessoa jurídica nas relações de consumo, tutela do livre comércio ou do meio ambiente (art. 28148, CDC).149 Não obstante, o art. 50 do CC estabelece que, “em caso de abuso de personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público 145 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 96. 146 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 31. 147 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 74. 148 Art. 28 do CDC - O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. 149 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 152. 46 quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.150 Geralmente a desconsideração é aplicada para corrigir um ato, mas também pode ser aplicada pela lei ou por outras considerações, não suprimindo a sociedade, nem a considerando nula. Na verdade, a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, em casos específicos, declara-se ineficaz determinado ato, enfatizando mais à pessoa do sócio do que à sociedade.151 Sobre o tema, Perrota Gonçalves disserta em sua obra que: Para que a teoria seja aplicada, dever ser demonstrada, cabalmente, a ocorrência de fraude, ou seja, exigi-se a comprovação em juízo de o(s) sócio(s) estava(m) utilizando-se da personalidade distinta da pessoa jurídica e da autonomia patrimonial desta, bem como da limitação de sua(s) responsabilidade(s) como escudo para a prática de atos lesivos a terceiros. Como diz o conhecido brocardo jurídico, “fraude não se presume, se prova”.152 Ressalta-se, contudo, que a solução para evitar a manipulação da autonomia das pessoas jurídicas é abolir esta autonomia, tendo em vista que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica tem a finalidade de possibilitar a coibição da fraude, sem comprometer o próprio instituto da pessoa jurídica. Em outras palavras, a teoria tem o intuito de preservar a pessoa jurídica e sua autonomia, sem que terceiros, vítimas de fraudes fiquem desamparados.153 Observa-se, que quando provada a fraude no caso concreto, o judiciário afasta autonomia patrimonial da sociedade, a ignora, e determina que seja atingido diretamente o patrimônio do pessoal dos sócios envolvidos, de forma ilimitada até que sejam adimplidas as obrigações assumidas com terceiros.154 Coelho apresenta duas formulações para a desconsideração da personalidade jurídica: 150 ANGHER, Anna Joyce. Vade mecum acadêmico de direito. Código Civil. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2008. 151 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 74. 152 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 97. 153 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 31. 154 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 97. 47 Há duas formulações para a teoria da desconsideração: a maior, pela qual o juiz é autorizado a ignorar a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, como forma de coibir fraudes e abusos praticados através dela, e a menor, em que o simples prejuízo do credor já possibilita afastar a autonomia patrimonial.155 Essa teoria proporciona grande vantagem de aplicação pontual, na medida em que demonstrada a fraude, a desconsideração da personalidade da sociedade ocorrerá apenas sobre os atos ilícitos praticados, sem que ocorra a dissolução ou extinção da empresa.156 Em suma, a aplicação da teoria da desconsideração não importa a dissolução da sociedade, sendo aplicada apenas em determinados casos, nos quais se a autonomia patrimonial foi fraudulentamente utilizada, ela é desconsiderada, sem que ocorra o desfazimento da sociedade. Antes da aplicação dessa teoria, existia repressão às irregularidades e abusos de forma significativa, ocasionando, assim, a dissolução da sociedade.157 Ressalta-se, que a partir do momento que a teoria da desconsideração passou a vigorar, puderam-se reprimir as fraudes e os atos abusivos sem prejudicar os interesses de trabalhadores, consumidores, fisco e outros que gravitam em torno da continuidade da empresa.158 2.3 DA DESPERSONIFICAÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA As sociedades empresárias adquirem personalidade jurídica no instante em que registra seu contrato social no Registro Público de Empresas Mercantis, ao passo que perde essa personalidade jurídica, através de um processo extintivo desse registro. Observa-se que, para a despersonalização sociedade algumas etapas devem ser respeitadas: primeiro a dissolução, que é a resolução ou desfazimento do ato constitutivo; em seqüência, a liquidação, que é a realização do 155 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 35. GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 97. 157 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 42. 158 GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 98. 156 48 ativo e pagamento do passivo da sociedade; e, por fim, a partilha do acervo remanescente da sociedade.159 No que tange o término da personalidade jurídica da sociedade, Ulhoa Coelho discorre que: A personalização da sociedade empresária termina após um procedimento dissolutório, que pode ser judicial ou extrajudicial. É necessário acentuar que a simples inatividade da sociedade não significa o seu fim, como pessoa jurídica. A exemplo do que se verifica com as pessoas naturais que deixam de exercer qualquer atividade profissional (quando, por exemplo, se aposentam), mas não perdem, por óbvio, a capacidade para a prática de atos jurídicos, a pessoa da sociedade permanece, mesmo que o seu estabelecimento tenha sido fechado e alienado, mesmo que seus empregados tenham sido dispensados, mesmo que não esteja praticando nenhuma atividade econômica. A paralisação da atividade empresarial não importa necessariamente a dissolução da sociedade.160 Portanto, consolidada a dissolução da sociedade, cabe a liquidação do patrimônio social, mediante o qual será realizado o ativo e satisfeito o passivo, de modo que todos os bens e direitos pertencentes à sociedade serão transformados em dinheiro para o pagamento dos credores, e o saldo que por ventura sobrar dessa operação será destinado aos sócios na proporção de seus quinhões. E, como apresentado finalizada a liquidação e realizada a partilha do saldo líquido entre os sócios, considera-se extinta a sociedade, com o termino de sua personalidade jurídica, desde o ato de dissolução seja arquivado na Junta Comercial.161 Ressalta-se, entretanto, que destarte as formas de dissolução da sociedade empresária apresentadas neste capítulo, abordar-se-á no terceiro e último sobre o processo falimentar, uma forma especial de dissolução, regulada pela Lei nº. 11.101/05 e objeto principal do presente trabalho de conclusão de curso. 159 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 117. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 18. 161 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 157. 160 49 3 A FALÊNCIA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA SEGUNDO A LEI Nº. 11.101, DE 09/02/2005 3.1 A SOCIEDADE EMPRESÁRIA E A LEI FALIMENTAR O estado falimentar é um estado de direito só existindo quando declarado no devido processo regulado por lei especial. Neste óbice, o Decreto-lei nº. 7.661/45 estabelecia, assim como a atual Lei 11.101, de 09.02.2005, estabelece o caráter interventivo do instituto.162 O estudo do instituto jurídico da falência de uma empresa deve levar em consideração a relação credor/devedor, uma vez que nas relações obrigacionais, o patrimônio do devedor é a garantia dos credores, pois em caso de não-cumprimento da obrigação, o credor insatisfeito deve buscar a tutela individual promovendo o adimplemento forçado da obrigação.163 A falência é, portanto, um processo de execução coletiva, em que todos os bens do falido são arrecadados para uma venda judicial forçada, com a distribuição proporcional do resultado entre todos os credores, de acordo com uma classificação legal de créditos.164 Como apresentado na obra de Campos Filho: A falência é a expressão técnico-jurídica correspondente à noção de insolvência de empresário individual ou de sociedade empresária. Sua decretação judicial não exprime, necessariamente, o conceito econômico de insolvência embora traduza uma situação de desequilíbrio econômico-financeiro do devedor. (...) Consiste o processo falimentar no conjunto de atos provenientes da sentença que reconheça sua incidência em relação a determinado devedor, com a nomeação de um administrador judicial, a quem compete promover a arrecadação dos bens integrantes do acervo patrimonial titularizado pelo devedor falido, provendo sua conservação com 162 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 530. 163 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 1. 164 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 120. 50 vistas a alienação e conseqüente pagamento dos créditos aos credores conforme relação hierarquizada constante da lei.165 No entendimento de Fazzio Júnior, “a falência é o reconhecimento jurídico da inviabilidade da empresa. Representa o estágio final de sua existência”.166 Bertoldi discorre em sua obra que: A idéia de falência costuma estar associada ao encerramento ou desaparecimento da empresa. É a cessação da atividade em razão da imposição de uma sistemática normativa provocada pelo próprio empresário ou terceiro (credor), que, ao mesmo tempo em que permite a formação do concurso de credores, pode impedir o prosseguimento do exercício do objeto da empresa, caso o Judiciário opte por determinar que o estabelecimento seja lacrado. Expressões como a quebra, ruína e banrracota freqüentemente são utilizadas para representar a falência e em muito ajudaram a estigmatizar o estado falimentar.167 E, ainda, a falência caracteriza-se por: Falir, significa faltar, enganar, ou ainda falhar, defeito, engano ou omissão. Deriva do latim fallere. Em seu sentido jurídico comercial, veio em substituição ao sentido de falimento, indicativo do ato de falir, da insolvência comercial ou da bancarrota.168 Desta feita, pode-se conceituar a falência como o fato jurídico que atinge a sociedade empresária, submetendo-a a um processo judicial, para arrecadar meios de pagamentos devidos ao(s) credor(es), e que não foram pagos pela impossibilidade material de fazê-lo, já que o patrimônio disponível era menor do que o devido.169 Neste diapasão, observa-se que o instituto da falência compreende a atividade empresarial disposta no art. 966170 do CC, considerando-se empresários individuais ou sociedades empresárias os que exercem profissionalmente atividade econômica organizada para a produção de bens ou serviços.171 165 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 149. 166 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 179. 167 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 530. 168 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 10. ed. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 1987. 169 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 121. 170 Art. 966 do CC - Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. 171 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 120. 51 Contudo, para que se possa aplicar o processo de execução concursal da falência, exige-se a observância de três requisitos, quais sejam o devedor empresário, a insolvência e a sentença judicial.172 Sobre os requisitos necessários ao estabelecimento do processo falimentar, Castellani apresenta que: A falência não se aplica a todos os devedores, abrangendo, nos termos do art. 1º da LF, o empresário, pessoa física, empresário individual, seja pessoa jurídica, sociedade empresária. Isto posto, todos aqueles que não são considerados empresários pelo ordenamento jurídico não poderão gozar do benefício especial da falência.173 Destaque-se que a lei falimentar, no seu art. 2º, excluiu como sujeitos passivos da falência, a empresa pública, a sociedade de economia mista, a instituição financeira pública ou privada, as cooperativas de crédito, os consórcios, as entidades de previdência complementar, as sociedades operadoras de plano de assistência à saúde, as sociedades seguradoras, as sociedades de capitalização, além de outras entidades legalmente equiparadas às anteriormente mencionadas.174 O segundo requisito é a configuração do estado de insolvência, que por se tratar de um elemento objetivo, somente o devedor empresário insolvente se sujeitará ao procedimento falimentar. Nesse sentido discorre Fazzio Júnior que: No direito concursal, a lei presume insolvência. (...) Sob a perspectiva econômica, existe insolvência sem descumprimento. Lá, a insolvência não está ligada ao ato de cumprir ou descumprir. Por outro lado, para o direito, importante é o descumprimento do dever de pagar. Pode existir descumprimento sem insolvência. Assim, quando ocorre descumprimento, interessa perguntar “por que descumpre?”. Se a resposta é “porque não pode”, tem-se a capacidade de cumprir. Para o direito, a insolvência está para a incapacidade e para o descumprimento.175 172 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 4. 173 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 4. 174 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 152. 175 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 180. 52 E, ainda, como disposto no art. 47176, pode-se dizer que a lei falimentar tem o objetivo de oferecer oportunidade para evitar a decretação da falência e viabilizar a superação da crise econômica da empresa devedora. Assim, esta última detém a opção de ingressar diretamente em juízo, requerendo a recuperação judicial, com o compromisso de apresentar em 60 dias, um plano de recuperação; ou negociar primeiro com os credores, requerendo posteriormente em juízo a homologação do acordo extrajudicial; ou tendo um credor requerido a falência, pedir a recuperação judicial no prazo de defesa.177 Por se tratar de um processo judicial complexo que compreende a arrecadação dos bens, sua administração e conservação, bem como a verificação e acertamento dos créditos, para posterior liquidação dos bens e rateio entre os credores, a Lei de Falências tem por objetivo a proteção da pessoa jurídica, e não propriamente a proteção ao empresário, na medida em que a lei busca a continuação do empreendimento, decorrente do reconhecimento da função social da empresa.178 As empresas podem ser conduzidas ao estado de falência em virtude de alguns fatores, encontrados tanto na imperícia do condutor do negócio, como a interferência das políticas macroeconômicas.179 O terceiro e último requisito, fundamenta-se na falência se originando por uma decisão judiciária, e, portanto, a falência é o estado de insolvência definido a partir do provimento pretoriano, tendo em vista que antes da decretação judicial, pode-se falar em crise econômica ou em insolvência, porém nunca em falência, porque essa é um procedimento especial, ao passo que aquela é mera conjuntura fática.180 Desse modo, observa-se que a sentença que declara a falência não é meramente declaratória, tão pouco condenatória, sendo considerada constitutiva, 176 Art. 47, da Lei 11.101/05 - A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. 177 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Comercial – Empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 117. 178 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 2 e 3. 179 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 531. 180 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 180. 53 pois além de declarar o direito, ela pode criar, modificar ou extinguir as relações jurídicas entre credores e devedores.181 Destarte a compreensão da Lei nº. 11.101/05 frente ao ordenamento jurídico passa-se a analisar o procedimento, bem como as conseqüências do processo falimentar a que se submetem as sociedades empresárias. 3.2 O PROCESSO FALIMENTAR DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS A Lei 11.101/05 prevê a possibilidade de decretação da falência do devedor que não paga, no vencimento e sem relevante razão de direito, obrigação líquida constante de título ou títulos executivos protestados, cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários mínimos na data do pedido (art. 94, I182). Citado, o devedor poderá contestar o pedido em 10 (dez) dias (art. 98183), podendo reunir provas, juntar documentos, preparando-se para enfrentar o pedido de declaração de sua falência.184 Nesse momento surge o instituto do deposito elisivo, no qual de acordo com o art. 98 da Lei Falimentar, nos casos de pedido de falência, em que o devedor não pague no vencimento obrigação líquida, sem relevante razão de direito para não fazê-lo ou que, executado por qualquer quantia líquida, não pague, não deposite ou não nomeie bens à penhora, poderá o mesmo depositar o valor correspondente ao total do crédito, aí incluídos juros e honorários advocatícios, mais correção monetária impedindo, dessa forma, a decretação da falência.185 181 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 548. 182 Art. 94, I da Lei 11.101/05 - Será decretada a falência do devedor que, sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência; 183 Art. 98, da Lei 11.101/05 - Citado, o devedor poderá apresentar contestação no prazo de 10 (dez) dias. 184 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 164. 185 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 164. 54 O estado falimentar gera conseqüências que vão da cessação da atividade da empresa até a possibilidade de responsabilização criminal do empresário por atos praticados no âmbito negocial, que possam ter sido a causa ou contribuído para o agravamento da situação de insolvência.186 Bertoldi discorre que: O processo pré-falimentar é um processo de investigação judicial para a identificação dos pressupostos à decretação da falência, ou seja, a existência de um devedor empresário e seu estado de insolvência. O processo de investigação se conclui pela sentença que rejeita ou decreta a falência. Quando o juiz rejeita a decretação é porque os pressupostos não estavam configurados, estando ausentes as condições da ação (...). A primeira fase é um processo tipicamente de conhecimento: busca-se a identificação do empresário e de seu estado de insolvência.187 Observa-se que o processo falimentar como execução concursal do devedor empresário, pode ser dividido em três fases distintas: a fase pré-falimentar, compreendida desde a apresentação do pedido judicial até a sentença declaratória; a fase falimentar propriamente dita, da sentença declaratória até a sentença de encerramento da falência; e a fase pós-falimentar ou da reabilitação, da sentença de encerramento até a sentença de extinção das obrigações do falido.188 Destaca-se, ainda, que a falência é causa de dissolução da sociedade empresária, de modo que no processo falimentar, no qual se realiza a liquidação do ativo e passivo é uma forma específica de dissolução, constituindo o principal efeito da falência em relação à pessoa jurídica da sociedade falida.189 Desse modo, analisar-se-ão os sujeitos legítimos do processo falimentar, bem como os efeitos da sentença que declara a falência da sociedade empresária. 3.2.1 Legitimidade passiva para o pedido de falência 186 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 530. 187 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 548. 188 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 318. 189 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 282. 55 No processo falimentar a legitimidade passiva cabe ao devedor empresário, pessoa física ou jurídica, quais sejam os devedores exercentes de atividade econômica de forma empresarial. Disso resulta que não se submete à execução concursal quem não explore atividade econômica nenhuma, nem quem o faz sem empresarialidade.190 Ulhoa Coelho acrescenta, ainda, que “nem todo exercente de atividade econômica empresarial encontra-se sujeito à falência, pois embora produzam ou circulem bens ou serviços por serem empresas organizadas, estão excluídas do direito falimentar”.191 Portanto, de acordo com o art. 1º da Lei 11.101/05192, o devedor empresário, seja o empresário individual ou a sociedade empresária que “exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” (art. 966, CC), terá legitimidade passiva para requerer a falência. 3.2.2 Legitimidade ativa para o pedido de falência Em contrapartida, o processo falimentar deve ser iniciado por algumas pessoas habilitadas pela legislação, e, de acordo com o art. 97193 da Lei 11.101/05, são legitimados a apresentar o pedido de falência: o próprio devedor (autofalência); o cônjuge sobrevivente, o herdeiro ou o inventariante do devedor empresário individual; algum dos sócios da sociedade empresária; e qualquer dos credores.194 190 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 247. 191 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 248. 192 o Art. 1 da Lei 11.101/05 - Esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor. 193 Art. 97 da Lei 11.101/05 - Podem requerer a falência do devedor: o próprio devedor, na forma do disposto nos arts. 105 a 107 desta Lei; o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou o inventariante; o cotista ou o acionista do devedor na forma da lei ou do ato constitutivo da sociedade; qualquer credor. O credor empresário apresentará certidão do Registro Público de Empresas que comprove a regularidade de suas atividades. O credor que não tiver domicílio no Brasil deverá prestar caução relativa às custas e ao pagamento da indenização de que trata o art. 101 desta Lei. 194 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 13. 56 No que concerne a legitimidade ativa para pleitear a falência da sociedade empresária, Ulhoa Coelho acrescenta que: O credor está legitimado para o pedido de falência ainda que seu crédito não esteja vencido, cabendo-lhe provar a impontualidade injustificada da sociedade devedora ou a execução frustrada em relação a título de terceiros ou ainda a prática de ato de falência. Estão legitimados para o pedido de falência, além dos credores, a própria sociedade devedora e seus sócios.195 Indica o art. 97, IV da Lei falimentar que, qualquer credor pode requerer a falência do devedor, desde que seja titular de uma obrigação líquida, não paga no vencimento sem que haja relevante razão de direito para não fazê-lo (art. 94, I, da LRE). Pode-se dizer, então, que o legislador conferiu ampla legitimidade ativa, de modo que todos os credores estarão aptos a requerer a decretação da falência do devedor, desde que observados os pressupostos para o pleito de falência da sociedade.196 3.2.3 Pressupostos da falência Como abordado no início deste capítulo, a caracterização do estado de falência é legal, fundamentando-se em três pressupostos de sua identificação: o devedor empresário (pressuposto material subjetivo); a presunção não elidida de insolvência (pressuposto material objetivo); e a sentença constitutiva de falência (pressuposto formal), de modo que o empresário devedor é o réu na ação constitutiva de falência, cuja premissa da causa seja a presunção legal de insolvência, autorizando o judiciário a emitir um pronunciamento favorável.197 3.2.4 Sentença declaratória da falência 195 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 259. 196 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 164. 197 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 608. 57 Desde que observado o requerimento da falência pelos credores habilitados, apresentada defesa, e realizada, quando necessária a instrução, o magistrado, convencido do estado falimentar, decretará a falência do devedor. Bem verdade que essa sentença tem caráter predominantemente constitutivo, haja vista instituir ao devedor empresário uma situação jurídica especial, onde prosseguirá a dissolução da sociedade empresária falida, bem como a instauração de um regime especial para os bens, atos jurídicos, contratos e pessoa do devedor.198 Ulhoa Coelho ressalta que, “a sentença declaratória da falência não é declaratória, mas constitutiva, porque altera as relações entre os credores em concurso e a sociedade devedora falida, ao fazer incidir sobre elas as normas específicas do direito falimentar”.199 A sentença de que trata o art. 99 da Lei 11.101/05, é aquela onde o juiz, ao acolher o pedido de falência apresentado pelo credor ou pelo próprio devedor, extingue a fase pré-falencial caracterizada pela apresentação do pedido e pela possibilidade de oposição do devedor, e inaugura o processo falimentar propriamente dito.200 3.2.5 Conseqüências quanto à pessoa do falido A sentença que declara a falência produz extensas e profundas modificações quanto à capacidade de exercício de direitos do empresário. No que tange à pessoa do falido, observa-se uma supressão de direitos e faculdades chegando à conclusão de que o empresário falido adquire uma condição de relativamente incapaz para a prática de atos civis e empresariais.201 Neste óbice, destaca-se um trecho da obra de Bertoldi: Em contrapartida à perda de direito imposta ao empresário, tem ele assegurado pela lei o direito de fiscalizar a administração da massa 198 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 21 e 22. 199 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 267. 200 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 186. 201 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 612. 58 falida, de requerer providencias conservatórias do patrimônio da empresa e de intervir nos processos de interesse da massa, assim como de apresentar os recursos que julgar cabível.202 Considerando que a sentença de falência implica a impossibilidade de o devedor prosseguir na exploração de sua atividade empresária, mais do isso, ela representa o ato inicial do processo dissolutório da sociedade empresária. Em regra, a falência da sociedade não implica a falência dos sócios, uma vez que seu patrimônio não pode ser atingido pelos efeitos da falência.203 Sobre as conseqüências quanto à pessoa do devedor, Bertoldi discorre em sua obra que: A decretação da falência altera substancialmente as relações jurídicas obrigacionais do falido, eis que este perde a administração de seus bens e a liberdade de iniciativa antes existente, do empresário ou da sociedade empresária. Instaura-se um novo quadro de situações que envolve interesses de credores e da massa falida. Os negócios jurídicos do falido, antes regulados, de regra, pelo direito comum, passam agora a se submeter a um novo regime jurídico, qual seja, o do direito falimentar.204 De certa forma, os sócios são afetados pela falência da sociedade empresária de forma diversa, segundo tenham ou não administrado a empresa, importando, ainda, identificar o tipo societário da falida e a natureza de responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais, para que possam surtir os efeitos da sentença declaratória da falência.205 3.2.6 Arrecadação dos bens do falido Conforme estudado, com a decretação da falência o devedor perde a posse e administração dos bens, mas não perde de plano, a sua propriedade, momento 202 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 612. 203 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 28. 204 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 628. 205 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 267. 59 este que o Estado toma a posse dos bens do falido, ou seja, a posse indireta é transferida automaticamente como efeito da decretação da falência.206 Cabe ressaltar que, não se trata de expropriação, mas de perda da administração e da disponibilidade, uma vez que com o desapossamento, o falido não possa assumir novas obrigações, nem modificar o patrimônio existente no momento da decretação da falência.207 No que tange a arrecadação dos bens e a constituição da massa falida, Fazzio Júnior apresenta que: Com a arrecadação do patrimônio do devedor, nasce a massa falida objetiva. Constitui-se, então, um patrimônio afetado por sua destinação no regime legal de falência. A massa falida objetiva é próprio ativo do devedor sob a gestão do administrador judicial. Entenda-se por bens todo o ativo do devedor, ou seja, tudo o eu consistir valor econômico. Não são arrecadados os bens absolutamente impenhoráveis, os alienáveis, o seguro de vida, etc. Também o imóvel residencial próprio do casal ou entidade familiar, conforme o que dispõem o art. 70, do CC, e o art. 1º, da Lei nº. 8.009/90. Assim, não se compreende na arrecadação falencial o direito de autor, cujo conteúdo, a produção intelectual, constitui emanação de uma particular capacidade da pessoa, portanto, a ela ligada visceralmente.208 Procedida a arrecadação dos bens, estes ficarão sob a guarda do administrador judicial que pode figurar, nos termos do art. 108209, §1º, da Lei Falimentar, como depositário do falido. Ressalta-se que lei faculta ao administrador, no caput do art. 114210, alugar ou celebrar contrato referente aos bens da massa com o objetivo de produzir renda, mediante autorização do comitê.211 Os bens arrecadados pelo administrador judicial, bem como os demais bens agregados à massa falida, comporão o montante destinado à alienação, que através 206 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 671. 207 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 654. 208 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 293. 209 o Art. 108, § 1 da Lei 11.101/05 - Ato contínuo à assinatura do termo de compromisso, o administrador judicial efetuará a arrecadação dos bens e documentos e a avaliação dos bens, separadamente ou em bloco, no local em que se encontrem, requerendo ao juiz, para esses fins, as medidas necessárias. Os bens arrecadados ficarão sob a guarda do administrador judicial ou de pessoa por ele escolhida, sob responsabilidade daquele, podendo o falido ou qualquer de seus representantes ser nomeado depositário dos bens. 210 Art. 114 da Lei 11.101/05 - O administrador judicial poderá alugar ou celebrar outro contrato referente aos bens da massa falida, com o objetivo de produzir renda para a massa falida, mediante autorização do Comitê. 211 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 612. 60 do processo falimentar, constituirão a fonte de recursos para iniciar o pagamento de todos os credores devidamente habilitados.212 3.2.7 Administração da falência A fase de administração dos bens do processo falimentar envolve uma estrutura orgânica que possui órgãos obrigatórios (juiz, administrador judicial, e representante do Ministério Público) e órgãos facultativos (Comitê e assembléia geral de credores), de modo que o administrador judicial executa as medidas judiciais imprescindíveis à realização do ativo e solução do passivo da massa falida, sob a supervisão do juiz e fiscalização ministerial.213 A administração da falência inicia uma série de procedimentos simultâneos, que sob o prisma de Bertoldi apresenta-se da seguinte forma: São atos processuais de arrecadação dos bens do falido, possibilitando que os bens que compõem o ativo da empresa sejam trazidos ao processo, inclusive aqueles que haviam sido objeto de negócios jurídicos revogados. Os credores são chamados ao processo para justificar sua condição, por meio de atos destinados à declaração dos créditos e à verificação de legitimidade, a fim de lhes possibilitar participação no quadro geral que será elaborado e que norteará o rateio dos pagamentos que serão efetuados. A administração da falência envolve atos de informação, arrecadação de bens do falido, declaração e verificação dos créditos, além da investigação das causas da falência, o que permitirá uma reconstituição do passado da empresa para que sejam apuradas as causas da falência, na busca de elementos que podem conduzir a eventual punição penal.214 Realizada a arrecadação dos bens será efetuado pelo oficial de justiça que acompanhará o administrador judicial o auto de arrecadação, documento este que conterá, além do inventário da sociedade, também, o termo de avaliação de todos os bens. E, quando arrecadados os bens e composta a massa falida, proceder-se-á a 212 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 83. 213 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 328. 214 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 658. 61 alienação, que no processo falimentar, constituirá a meio pelo o qual o passivo será satisfeito, observada a verificação dos créditos.215 3.2.8 Da verificação dos créditos A sentença que decreta a falência concede o prazo para que os credores habilitem seus créditos para concorrerem ao que for apurado na liquidação do ativo, que serão verificados pelo administrador judicial (art. 7º da LRE216) mediante dados extraídos dos livros contábeis e documentos do devedor, bem como nos documentos apresentados pelos credores. Bertoldi, acrescenta também que: O §1º atribui aos credores prazo para apresentação de suas habilitações ou divergências quanto aos créditos relacionados. Acrescenta-se a informação de que cabe ao falido apresentar a primeira relação de credores no prazo de cinco dias, conforme disposto no art. 99, III, da LRE. No caso do pedido de autofalência (art. 105, II, da LRE), a lei obriga a apresentação da lista de credores junto com os documentos que formam tal pedido próprio formulado pelo credor ou de ter sido ele relacionado pelo devedor, ou, ainda, dos levantamentos realizados pelo administrador judicial. O dispositivo agora comentado leva à conclusão de que o pedido formal de habilitação não é essencial, desde que o crédito tenha sido relacionado e não tenha encontrado oposição. Também nessa hipótese o credor será tido como habilitado.217 Reitera a doutrina, que o procedimento de verificação dos créditos possui três diferentes publicações no seu curso: uma primeira que decorre da lista de credores conhecida pelo magistrado no momento da sentença; a segunda, elaborada e publicada pelo administrador judicial, após os credores apresentarem as habilitações e divergências; e, por fim, permite-se a apresentação de impugnações às habilitações, que após o julgamento de cada impugnação, o juiz homologa e 215 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 82. 216 o Art. 7 da Lei 11.101/05 - A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas. 217 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 691. 62 determina a publicação de uma terceira relação, o quadro geral de credores da falência.218 Verifica-se, portanto, que no processo falimentar os credores declaram e demonstram a veracidade e extensão de seus créditos, submetendo-os à verificação do administrador judicial e do juiz, almejando torná-los integrantes do quadro-geral de credores, pois uma vez reconhecida a procedência do crédito, seu titular estará habilitado a recebê-lo do montante da massa falida.219 3.3 A FALÊNCIA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E O PROCESSO DE DISSOLUÇÃO FORÇADA Destarte a falência ser uma causa de dissolução forçada da sociedade empresária, o efeito de sua decretação é a extinção da empresa, tendo em vista que, trata-se de ato judicial que instaura uma forma específica de liquidação do patrimônio social, onde através da sentença declaratória da falência, se desfaz todos os vínculos existentes entre sócios ou acionistas, dando início ao processo judicial de terminação da personalidade jurídica da sociedade.220 Assim, através do processo falimentar e da sentença que declara a falência da sociedade, procede à liquidação da sociedade empresária, nos termos do art. 154 e seguintes, da Lei Falimentar.221 3.3.1 Da liquidação A razão do instituto da falência é realizar o ativo e solver o passivo, na medida em que proferida a sentença declaratória de falência, prosseguir-se-á 218 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 85. 219 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 206. 220 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 282. 221 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 343. 63 liquidação dos ativos do falido. Portanto, a liquidação da empresa insolvente passa pela arrecadação, depuração e destinação do seu ativo, com vistas ao pagamento de seu passivo exigível, podendo envolver a utilização de soluções diferentes dependentes do volume de bens do devedor e da vontade do corpo de credores.222 No processo falimentar, na medida em que os bens são vendidos, os valores arrecadados são depositados em uma conta de depósitos remunerados, movimentada pelo administrador judicial mediante autorização judicial, e, quando munido dos recursos necessários, o administrador deve iniciar o pagamento dos credores respeitando a ordem hierarquizada definida no quadro geral de credores.223 Neste óbice, o art. 139224 da Lei estabelece que, após arrecadação dos bens e juntada do respectivo auto de arrecadação ao processo de falência, será dado início à realização do ativo, ou seja, à sua alienação.225 O processo falimentar envolve duas etapas sucessivas, quais sejam a informativa e a executiva. No que tange essas duas etapas, Fazzio Júnior apresenta suas considerações: Na fase informativa, verifica-se o ativo e o passivo da massa falida. Quer dizer, arrecadam-se os bens e documentos do empresário falido e promove-se a verificação e a classificação dos créditos, culminando com a publicação o quadro geral de credores. Definemse, pois, a massa falida objetiva (patrimônio do concurso) e a massa falida subjetiva (pretensões). A segunda concorre na distribuição da primeira. A fase executiva compreende a realização do ativo do devedor e o conseqüente pagamento possível do seu passivo.226 Desde que possível, a Lei Falimentar objetiva a manutenção da empresa com a continuidade do exercício da atividade econômica por ela desenvolvida, e estando em falência, busca a melhor solução para a sociedade, distinguindo-a do empresário, bem como apresentando algumas modalidades de realização dos ativos que compõem a massa falida objetiva: O art. 140 da LRE estabelece que as modalidades ordinárias de alienação dos bens, determinando em seus incisos uma ordem de 222 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 343. 223 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 97. 224 Art. 139 da Lei 11.101/05 - Logo após a arrecadação dos bens, com a juntada do respectivo auto ao processo de falência, será iniciada a realização do ativo. 225 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 714. 226 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 344. 64 preferência: I – alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos em bloco; II – alienação da empresa, com a venda de suas filiais ou unidades produtivas isoladamente; III – alienação em bloco dos bens que integram cada um dos estabelecimentos do devedor; e por último, IV – alienação dos bens individualmente considerados.227 Todo o dinheiro resultante da realização do ativo deverá ser depositado pelo administrador judicial, em 24 horas, em instituição financeira, obedecidas as normas da Corregedoria-Geral da Justiça de cada Estado, e, enquanto não satisfeito o passivo, o dinheiro depositado deve ser aplicado em algum tipo de investimento. Desse modo, os pagamentos na falência serão realizados pelo administrador judicial com observância da ordem legal que distingue os credores em espécies e classes.228 A Lei 11.101/05 estabeleceu que a realização do ativo e pagamento do passivo deverá ocorrer simultaneamente, onde o requisito essencial para que isso ocorra está na arrecadação dos bens. Assim, concluído o pagamento de todos os créditos habilitados, o processo falimentar será encerrado extinguindo as obrigações do devedor. 229 3.3.2 Do encerramento e da extinção das obrigações do falido Depois de liquidados todos os bens arrecadados e de pagos os credores, na medida das possibilidades da massa e com base nos valores obtidos pela alienação judicial dos bens, processo de falência será encerrado por decisão judicial, podendo ser acompanhado da extinção das obrigações ou não, pois ao final do processo de falência algumas obrigações podem ter sido pagas, e serão declaradas extintas, ao passo que outras podem ter sido parcialmente satisfeitas ou não liquidadas.230 227 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 714. 228 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 282. 229 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 276. 230 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 723. 65 O encerramento do processo falimentar e a declaração de extinção das obrigações do falido é a fase posterior à liquidação do ativo e pagamento do passivo. Inicialmente, nesta fase, compete ao administrador judicial a prestação de contas, acompanhadas dos documentos comprobatórios, ao juiz, no prazo de 30 (trinta) dias após a liquidação, e serão prestadas em autos apartados e apensados aos autos da falência, permitindo maior organização e identificação das contas (art. 154, § 1º231, da Lei 11.101/05).232 Como disposto nos §§ 2º, 3º e 4º, do art. 154233 da Lei, a apresentação das contas pelo administrador judicial, será publicado o aviso de recebimento, de forma que os interessados possam impugná-los no prazo de 10 (dez) dias, seguido pela intimação do Ministério Público para manifestar-se também no prazo de 10 (dez) dias. Findo, será ouvido o administrador judicial, e o juiz julgará as contas por sentença.234 Entretanto, por se tratar de título executivo extrajudicial, se a sentença rejeitar as contas apresentadas pelo administrador judicial, já fixará suas responsabilidades, o que significa que poderá determinar a indisponibilidade ou, até mesmo, o seqüestro de bens para garantir a indenização da massa falida. Em contrapartida, julgadas boas as contas do administrador judicial, este deverá apresentar em 10 (dez) dias, o relatório previsto no art. 155235 da LRE, indicando o valor do ativo, o valor do produto da realização do ativo, o valor do passivo, o valor 231 o Art. 154, § 1 , da Lei 11.101/05 - Concluída a realização de todo o ativo, e distribuído o produto entre os credores, o administrador judicial apresentará suas contas ao juiz no prazo de 30 (trinta) dias. As contas, acompanhadas dos documentos comprobatórios, serão prestadas em autos apartados que, ao final, serão apensados aos autos da falência. 232 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 287. 233 o o o Art. 154, §§ 2 , 3 e 4 , da Lei 11.101/05 - O juiz ordenará a publicação de aviso de que as contas foram entregues e se encontram à disposição dos interessados, que poderão impugná-las no prazo de 10 (dez) dias. Decorrido o prazo do aviso e realizadas as diligências necessárias à apuração dos fatos, o juiz intimará o Ministério Público para manifestar-se no prazo de 5 (cinco) dias, findo o qual o administrador judicial será ouvido se houver impugnação ou parecer contrário do Ministério Público. o o Cumpridas as providências previstas nos §§ 2 e 3 deste artigo, o juiz julgará as contas por sentença. 234 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 98. 235 Art. 155 da Lei 11.101/05 - Julgadas as contas do administrador judicial, ele apresentará o relatório final da falência no prazo de 10 (dez) dias, indicando o valor do ativo e o do produto de sua realização, o valor do passivo e o dos pagamentos feitos aos credores, e especificará justificadamente as responsabilidades com que continuará o falido. 66 dos pagamentos efetuados, e a especificação justificada das responsabilidades remanescentes do falido.236 No entendimento de Ulhoa Coelho: Após fazer o último pagamento (em atenção ao valor integral do devido a todos os credores ou, como é mais comum, por exaurimento dos recursos da massa), o administrador judicial deve apresentar sua prestação e contas. O prazo é de 30 dias. Processadas e julgadas as contas, ele tem 10 dias para submeter ao juiz seu relatório final. Nele, informará o valor ativo e do produto de sua realização, bem como o do passivo e dos pagamentos feitos aos credores. Também do relatório final devem constar as responsabilidades que continuam imputáveis à sociedade falida, isto é, o saldo não pago dos créditos admitidos.237 E ainda, acrescenta que, “em seguida à apresentação do relatório final, se não houver mais nenhuma outra pendência, o juiz profere a sentença de encerramento da falência”.238 Neste diapasão, Campos Filho apresenta suas considerações sobre o tema: A sentença que encerra o processo decorre do exaurimento patrimonial da massa ou da verificação de sua inexistência. O processo falimentar existe, portanto, na medida em que houver bens que integrem o acervo patrimonial, de caráter objetivo, denominado massa falida. O relatório final da falência, a cargo do administrador judicial, corresponde ao marco final do processo. Nele, o administrador dá conta da realização do ativo, de forma completa, e do pagamento aos credores. Do ponto de vista da movimentação patrimonial, todos os bens já terão sido objetivo de alienação, pelo que, também, a sentença que encerra o processo colocará termo às pretensões dos credores. Proferida a sentença de encerramento da falência, não há mais que se falar em processo falimentar. Entretanto, apesar do término do processo podem ocorrer alguns efeitos da sentença declaratória da falência que atinjam o devedor empresário, caracterizando, desta maneira, a chamada fase pós-falencial do processo falimentar.239 Ressalta-se, portanto, que exaurido o patrimônio do devedor, o processo de falência deverá ser encerrado, ou seja, a extinção da falência só ocorre porque não 236 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 361. 237 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 378 e 379. 238 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 379. 239 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 98. 67 existem mais bens a serem liquidados para o pagamento dos credores. E, na hipótese de ainda restarem dívidas, se o falido adquirir novos bens, o processo será reaberto para a busca da satisfação das obrigações pendentes.240 Desse modo, observa-se que, após a entrega do relatório do administrador judicial, o magistrado proferirá sentença encerrando o processo de falência, passível de impugnação por apelação. E, no que tange aos prazos prescricionais relativos às obrigações do falido, estes recomeçarão após o transito em julgado dessa sentença, onde as obrigações que não foram saldadas na falência permanecerão ativas até que sejam pagas pelo devedor ou até que prescrevam.241 Por derradeiro, vale ressaltar que a falência é um processo provocado, na maioria das vezes, por credores, e que, apesar da sociedade perder sua personalidade jurídica, submete-se a arrecadação dos bens, realização do ativo e satisfação do passivo, sempre observando a possibilidade de restauração da atividade empresarial. Diante disso, a sociedade deve registrar o seu ato de dissolução nas Juntas Comerciais, para extinguir suas obrigações com o mundo jurídico.242 240 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 719. 241 CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 99. 242 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de Empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. p. 366. 68 CONCLUSÃO Como observado no primeiro capítulo do presente estudo, destarte as inovações da legislação que regula as atividades e os atos de comércio, o legislador brasileiro deixou de lado a Teoria dos Atos de Comércio, substituindo-a pela Teoria da Empresa. Desse modo, observa-se que a sociedade empresária surge quando duas ou mais pessoas se reúnem e a constituem com o objetivo de exploração de algum tipo de atividade econômica, extinguindo-se no momento que ocorra algum fato impeditivo de sua continuidade, ou seja, através do processo de dissolução. Essa dissolução pode ocorrer de diversas formas, desde observados alguns requisitos, tendo ao final deste processo dissolutório, a despersonalização da sociedade empresária. Neste diapasão, a Lei nº. 11.101/05 estabelece os parâmetros para a decretação da falência da sociedade empresária e do empresário, sendo esse o que exerce atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, em conformidade com o contido no art. 966 do Código Civil. Verifica-se que para sujeitar-se à falência é necessário explorar atividade econômica de forma empresarial, excluindo desse processo, de um lado, quem não explora atividade econômica nenhuma e, de outro, quem o faz sem empresarialidade, de modo que, quem não produz nem circula bens ou serviços, assim, nunca terá sua falência decretada, nem poderá beneficiar-se de qualquer tipo de recuperação judicial ou extrajudicial. É cediço que no Direito Falimentar, uma das maiores preocupações dos juristas sempre foi com relação aos meios para evitar a quebra, preservando a atividade empresarial, haja vista ser necessária a adoção de um procedimento de reorganização da empresa, para evitar a perda de sua personalidade jurídica. Portanto, destaca-se que a Lei de Falimentar incorporou essa idéia, em consonância com modelos experimentados em outros países, numa concepção generalizada do princípio da conservação da empresa. Diante o exposto, pode-se compreender que a partir da vigência da Lei nº. 11.101, a recuperação judicial e a extrajudicial do empresário e da sociedade 69 empresária tornaram o juiz vinculado ao procedimento e colocaram nas mãos do devedor e dos credores o poder de negociar e compor seus interesses, ampliando seus poderes. Por derradeiro, destaca-se que o presente trabalho teve por escopo abordar a falência como uma forma de dissolução forçada da sociedade empresária, uma vez que é um processo provocado, na maioria das vezes, por credores, e que, apesar de perder sua personalidade jurídica, submete-se a arrecadação dos bens, realização do ativo e satisfação do passivo, sempre observando a possibilidade de restauração da atividade empresarial. 70 REFERÊNCIAS ANDRADE JR., Attila de Souza Leão. Comentários ao novo Código Civil, volume IV: direito de sociedades. Rio de Janeiro: Forense, 2002. ANGHER, Anna Joyce. Vade mecum acadêmico de direito: Código Civil. 4. Ed. São Paulo: Rideel, 2008. ASHIKAGA, Carlos Eduardo Garcia. As sociedades no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 80, 21 set. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4255>. Acesso em: 29 mar. 2008. BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso avançado de direito comercial. 4. ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. BORGES, José Ferreira. Dicionário jurídico-comercial. Porto, 1856. BULGARELLI, Waldirio. Sociedades comerciais. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2001. CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo Código Civil. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. CASTELLANI, Fernando F. A empresa em crise: falência e recuperação judicial de empresas. São Paulo: Saraiva, 2008. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 2. V. São Paulo: Saraiva, 2007. 71 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 3. V. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário jurídico. 10. ed. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 1987. FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Lei de falência e recuperação de empresas. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2008. FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2007. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: dicionário da língua portuguesa. 3. Ed. Ver. E atual. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de direito comercial – empresarial. 37. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrota Rios; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 21. V. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual de direito comercial. 2. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2003. MELCHOR, Paulo. Direito de empresa no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 66, jun. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4132>. Acesso em: 30 mar. 2008. 72 NOGUEIRA, Ricardo José Negrão. Manual de direito comercial. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica – idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 10. ed. rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2007. REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 26. ed. 1. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 24. ed. 2. V. atual. por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2006.