GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS PARA O SEC. XXI
Mário Ceitil
Director Associado da CEGOC
Professor Auxiliar Convidado da Universidade Lusófona
Professor Convidado da Faculdade de Ciências Económicas e Empresariais da Universidade Católica
Vice-Presidente do IPCG (Instituto Português de Consultores de Gestão)
DA CERTIFICAÇÃO DAS QUALIFICAÇÕES Á QUALIFICAÇÃO DAS
COMPETÊNCIAS
ntervenção Forum AIP 2004
Volto, neste painel, ao tema das competências que, na minha perspectiva, vai continuar a
dominar os grandes debates sobre a Função de Recursos Humanos no próximo futuro.
E, face às polémicas que têm existido em relação a este conceito, gostaria de acentuar
que, na minha perspectiva, e para além dos aspectos eventualmente cabalísticos e
académicos das discussões, a ideia das competências aparece com tanta força,
actualmente, porque através dela perpassa a grande preocupação de encontrar
instrumentos de gestão centrados sobre as dinâmicas das performances efectivas das
pessoas, e não apenas sobre o estaticismo das funções desempenhadas ou os equívocos
prognósticos dos potenciais subentendidos.
A competência, vale a pena insistir, entendida como substantivo e não como adjectivo, é
a acção concreta que cada pessoa realiza e que adiciona valor a qualquer resultado
requerido, num contexto determinado.
Neste sentido, a competência é revelada, e não subentendida.
Sendo, portanto, a competência, ela própria um resultado, evidentemente que a ela estão
subjacentes um conjunto de factores que ora facilitam esse resultado, ora o dificultam.
Este conjunto constitui aquilo que poderemos designar por “cadeia de valor das
competências”, que é constituída pelos factores pessoais e factores de suporte que têm
expressão operatória nas acções que consubstanciam o exercício de cada competência.
Consideram-se factores pessoais, todas as características específicas das pessoas, os seus
traços, os seus valores, as suas motivações, os seus códigos de significação cognitivos e
emocionais, que, em princípio, capacitam a pessoa para exercer uma determinada
competência numa situação concreta.
Quanto aos factores de suporte, são constituídos pelas variáveis externas à pessoa que,
num dado momento, condicionam, favorável ou desfavoravelmente, o exercício dessa
mesma competência.
Podemos, então, dizer que cada acção, através da qual se consubstancia a actualização de
uma determinada competência, resulta do cruzamento dinâmico dos factores pessoais e
dos factores de suporte, vivenciados por cada pessoa através das sínteses cognitivas e
emocionais que realiza no exercício da sua actividade profissional.
A complexidade deste cruzamento leva a que exista alguma relatividade, e mesmo
alguma falibilidade, nas previsões relativas à probabilidade de uma pessoa apresentar, de
modo consistente e continuado, as competências requeridas, num dado contexto, pelo que
é natural que os diferentes sistemas de gestão de competências se preocupem em arranjar
instrumentos que permitam a operacionalização de factores que apresentem uma maior
validade prediditiva.
A experiência profissional anterior é, neste contexto, um desses factores sendo, por isso,
um dos mais frequentemente valorizados nos processos de selecção.
Na verdade, se uma pessoa já revelou ter, em experiências profissionais anteriores, um
certo número de competências actualizadas, documentadas através do seu currículo e
evidenciadas em entrevista de selecção, esse facto pode constituir um factor com elevada
validade preditiva relativamente à probabilidade de essa mesma pessoa vir a actualizar as
mesmas competências, noutros contextos.
As qualificações apresentadas constituem outro desses factores.
Convém sublinhar que emprego aqui o conceito de qualificações como sendo um
conjunto de saberes, ou de domínios de execução técnica, que as pessoas podem adquirir
seja por via do sistema formal de ensino, seja pela formação profissional, seja ainda por
outras modalidades de aprendizagem ao longo da vida.
O que verdadeiramente distingue a qualificação é o facto desses conjuntos de unidades
de aprendizagem serem formalizados por um qualquer sistema de reconhecimento
institucional.
Podemos dizer, assim, que a qualificação é um qualquer conjunto de conhecimentos
reconhecido e certificado por uma instituição devidamente habilitada para tal efeito.
E embora a obtenção de uma qualificação seja uma resultante do empenhamento e do
processo de aprendizagem realizado por uma determinada pessoa e, como tal, a habilite
para vir a desenvolver competências (acções) futuras relacionadas com essa qualificação,
é fundamental, todavia, assinalar que a qualificação não é a competência.
Por isso, e porque a qualificação é extemporânea em relação à competência, a sua
importância e o seu valor, enquanto factor preditivo para a actualização de competências
futuras, depende também, e às vezes em larga medida, da credibilidade e do “valor de
mercado” da instituição onde ela é obtida.
Nesta linha, veja-se o que se passa em Portugal, por exemplo, onde certos cursos
universitários, em certas Universidades, são preferidos em relação a outros, nos processos
de selecção de jovens recém-licenciados.
No entanto, é bem certo que estas práticas continuam a ter alguma falibilidade, no que diz
respeito ao seu real valor predititivo em relação à actualização de competências futuras.
Há, assim, pessoas que apresentam elevadas qualificações, obtidas em instituições de
grande credibilidade que, todavia, não conseguem desenvolver, na sua prática
profissional, os tais comportamentos operatórios que consubstanciam as competências de
sucesso.
Inversamente, há pessoas que não apresentam qualificações significativas, do ponto de
vista formal, mas que, todavia, nos contextos concretos, sabem mobilizar os seus recursos
para atingir elevados padrões de performance.
Numa altura em que tanto se fala de Certificação de Competências, vale a pena, na
minha perspectiva, pensar em qual é o objecto real dessa certificação: se as competências,
se as qualificações.
As qualificações são certificadas a anteriori da performance; as competências são
certificadas pela evidência da performance.
Entre as duas não existem, propriamente, linhas de ruptura.
Mas existem diferenças que vale a pena ter em atenção.
Porque, em Portugal, existem várias realidades diferentes:
•
•
•
Existem pessoas que não têm qualificações nem têm competências;
Existem pessoas que têm qualificações e não têm competências;
E também existem, finalmente, pessoas, que, não tendo qualificações, têm as
competências necessárias, num determinado contexto.
Fica aberta a discussão sobre o que é que queremos valorizar nos sistemas de
certificação: se a sobredeterminação do formal em relação à substância ou se vamos
valorizar a própria substância, secundarizando, ou não, o formal.
Isto é como a velha ideia das “boas pessoas”: em princípio somo todos “boas pessoas”;
mas, na prática, nem todos se comportam como tal.
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Mário Ceitil