Cabo Verde: Nação Crioula Caldeada num Bilinguismo em Construção Manuel Veiga, Ph.D. Coordenador do Mestrado de Crioulística e Língua Caboverdiana Director da Cátedra Amílcar Cabral na Uni-CV 1 Tópicos A Hora Zero da Crioulidade(Séc. XV e XVI); Os primeiros Contornos de uma singularidade em Construção (séc. XVII e XVIII); O discurso de negação da crioulidade (desde o séc. XIX); O Discurso de afirmação da crioulidade (contributo das gerações nativista, claridosa e pós- independência) Amor à nossa Singularidade, Respeito pelas Conquistas da Humanidade; Projecção da Língua Caboverdiana para o Futuro. 2 1. A HORA ZERO Antes de 1460, as dez ilhas que compõem o Arquipélago caboverdiano dormiam num sono profundo, sem sociedadade organizada, sem história edificada, sem cultura plasmada. Retratando a hora inicial das ilhas, o poeta Jorge Barbosa, no poema Panorama, diz: « Destroços de que continente,/ de que cataclismos,/ de que sismos,/ de que mistérios?// Ilhas perdidas no meio do mar,/ esquecidas/ num canto do mundo/ que as ondas embalam,/ maltratam/ abraçam (...) Praias / onde naufragaram/ navios/ aonde aportaram/ caravelas,/ marinheiros queimados,/ corsários, escravos, aventureiros,/ condenados,/ fidalgos, negreiros,/ donatários das ilhas,/ Capitães-Mores...» 3 A cosmogonia das ilhas surgiu de uma erupção volcânica que cuspiu das suas entranhas dez ilhas, sendo nove habitadas. E a cosmologia dessas ilhas começa, presumivelmente, com alguns fugitivos ou náufragos da Costa ocidental africana e, depois, com a aventura dos descobrimentos portugueses, a partir da segunda metade do século XV. Com efeito, as naus dos Navegadores Vasco da Gama e António da Noli chegaram em 1460 e encontraram as ilhas desertas, segundo a versão oficial da nossa história. 4 É ainda o poeta Jorge Barbosa que, no seu poema Prelúdio, afirma: « Quando o descobridor chegou à primeira ilha/ nem homens nus/ nem mulheres nuas/ espreitando/ inocentes e medrosos/ detrás da vegetação... Quando o descobridor chegou/ e saltou da proa do escaler varado na praia/ enterrando/ o pé direito na areia molhada/ e se perseguinou/ receoso ainda e surpreso/ pensando n’El-Rei/ nessa hora então/ nessa hora inicial/ começou a cumprir-se/ este destino ainda de todos nós». E se as ilhas estavam desertas ou quase desertas, era preciso povoá-las. A operação começa dois anos depois, isto é em 1462.Vieram alguns reinóis do sul de Portugal, dos Açores e da Madeira. Estes eram em número insignificante, segundo o historiador António Carreira. 5 O Infante Fernando que comandava a operação, a partir de Sagres, em Portugal, ordenou que as ilhas fossem habitadas com escravos trazidos do Continente africano. Foi assim que começou uma das maiores tragédias humanas que a história regista. É ainda J. Barbosa que em Relato na Nau, escreve: «Era antigamente/ a primeira nau de escravos/ no rumo do Arquipélago/rápida navegando/ sob o impulso dos alísios./ (...) E abateu sobre a nau/ a maior tempestade do equinócio. Desmantelada/ o convés varado pela força da procela/ o navio flutuou três dias/ e três noites à deriva/ enquanto o capitão veterano/ dos mares e oceanos/ amarrado ao leme seguia/ insone e atento e defendia/ a nau das avalanches/ e dos abismos súbitos das ondas.// (...) De olhos rígidos/ metálicos/ abertos/ foram com urgência/ lançados ao mar/ os corpus nus putrefactos/ com lastros dos pés/ para o mergulho em vertical.// Não houve orações/ nem foram lidos/ versículos tristemente/ na Bíblia de bordo.// Talvez nem houvesse nenhum temente/ e breve sinal da Cruz.» 6 Nem todos os escravos morreram na longa e penosa travessia. Alguns chegaram não tanto para o povoamento, mas sobretudo para um projecto que visava escolher os melhores para alimentar o tráfico negreiro. Assim, dos que chegavam com vida, uma pequena parte era destinada ao serviço doméstico, em casa dos patrões, e a outra parte, bem maior, era submetida ao regime de ladinização (aprendizagem dos rudimentos da língua e da religião), uma espécie de qualificação do contingente para os mercados da escravatura, nas Américas e na Europa. 7 Para aumentar o interesse dos colonos portugueses por Cabo Verde e pelo tráfico negreiro, o Infante D. Fernando, a quem o rei Afonso V, seu irmão, tinha doado as Ilhas, conseguiu que o mesmo outorgasse, através de uma carta regia, vários privilégios aos moradores e armadores, em termos de direitos sobre os escravos, de mercadorias de troca, de isenção fiscal, de atribuição de vastos domínios para a exploração no Continente (Carreira, 1972,p. 22 e segs.). 8 Com esses privilégios, acrescidos da grande corrupção dos beneficiados, estes, rapidamente, começaram a adquirir enormes riquezas, em detrimento dos interesses da coroa. Por isso, seis anos depois, isto é em 1472, o Rei outorga uma nova Carta Régia limitando os privilégios anteriormente atribuídos. De acordo com esta nova Carta, os armadores só podiam iniciar a operação a partir de Cabo Verde e com mercadorias produzidas localmente (novidades da terra). 9 A Carta régia de 1472 pode ser considerada como documento impulsionador das condições que viriam desembocar no nascimento da Nação Caboverdiana. Trata-se de uma medida económica que sem que o legislador tivesse tomado consciência viria a transformar-se numa condição fundamental para o surgimento do Povo e da Nação Caboverdiana. 10 Com efeito, se a compra de escravos tinha que ser feita com produtos da terra ( e não com os que provinham de Portugal – fazenda, trigo, vinho, azeite...), a filosofia de comércio negreiro tinha que mudar. Os escravos não podiam ser destinados apenas à exportação, mas tinham que ser utilizados para cultivar a terra, em Cabo Verde, para a criação de gado e para a criação do artesanato de onde provinham «as novidades da terra» para alimentar o comércio na Costa africana. 11 Ora, se uma parte dos escravos tinha que produzir «as novidades da terra», esses mesmos escravos só o podiam fazer ocupando a terra e trabalhando juntos. E estando juntos, eles se organizam, se comunicam, rezam, criam hábitos e costumes, cantam, dançam, se divertem, reproduzem, enfim, se estruturam em sociedade com alguma organização e criam cultura. É essa organização, é essa cultura que começaram a configurar o povo das ilhas e a nação caboverdiana desde a segunda metade do século XV. 12 2. Os Primeiros contornos da singularidade caboverdiana Nós somos mestiços. Assumidamente. De sangue, de cultura, de visão prospectiva. Segundo o ensaísta Gabriel Mariano (199, p.54), «não deixa de ser significativo que uma civilização de brancos, criada por brancos, tenha sido apropriada por negros, vindo a desabrochar em nossos dias numa cultura mestiça, onde brancos, negros e mulatos se realizam pelas mesmas vias; participando com igual sinceridade nas efemérides locais; sentindo-se igualmente responsáveis pelos destinos da sua comunidade». Continuando, o mesmo autor afirma que « o processo de formação social do caboverdiano operou-se mais por uma africanização do europeu do que por uma europeização do africano» (p. cit. p. 69). 13 Se em 1462 o negro e o branco se encontraram no laboratório da ilha de Santiago, primeiro, e das outras ilhas, depois, os primeiros sinais de uma singularidade visível aconteceriam sobretudo a partir do século XVI. E a língua é o primeiro testemunho mais eloquente dessa singularidade em construção. Esta mesma singularidade é patente em todas as manifestações da identidade caboverdiana como: o imaginário islenho, as tradições orais, os hábitos e costumes, a música, 14 a dança, a relação com o transcendente e a respectiva religiosidade, o ciclo e os rituais da morte, a culinária, o artesanato, a arte de construir abrigo e de cultivar a terra, o associativismo de diversa índole (reconhecido como djuntamô), etc., etc. Por eu ser antes linguista do que antropólogo, a minha análise sobre os primeiros contornos da singularidade caboverdiana vai incidir sobre o crioulo caboverdiano. 15 A mestiçagem caboverdiana (em construção) não foi, não é e nem será uma dádiva. Ela foi e é fruto de uma transculturação, de uma síntese que perdura e vai perdurar. Nessa transculturação, de início, perfilaram o mundo lusitano e o mundo africano, mas hoje, a transculturação é entre a crioulidade caboverdiana e a diversidade mundial, particularmente através da emigração. E o resultado é uma sístese e não um amontoado. A nossa crioulidade é também resultado da aculturação, mas a transculturação é muito mais significativa. A língua portuguesa, em Cabo Verde, é um produduto aculturado, mas o crioulo é resultado da transculturação. 16 Retomando a questão linguística, os contornos da singularidade islenha começaram a desenhar-se desde meados do século XVI. Diz o historiador António Carreira que a cem anos do achamento das ilhas havia já em Cabo Verde (entenda-se ilhas de Santiago e Fogo, as primeiras habitadas) um proto-crioulo, isto é um instrumento de comunicação com uma estrutura fonética, morfológica e sintáctica ainda pouco diversificada e pouco autónoma, mas que já servia como instrumento de comunicação. 17 Como se explica que do confronto de mundos tão diferentes - como era o mundo branco e o mundo negro - tivesse sido possível a emergência, em tão pouco tempo, de um instrumento de comunicação que não era nem a do branco, nem a do negro, mas um produto mestiço em construção, fruto da cumplicidade dos dois mundos em presença? 18 De acordo com a lógica e os constrangimentos do tráfico negreiro, a língua portuguesa deveria pura e simplesmente sobrepor-se como único instrumento de comunicação, como aconteceu em alguns espaços de regime escravocrático, o Brasil, por exemplo. Em Cabo Verde, foi diferente. Sem que o português desaparecesse, surgiu uma língua mestiça com uma estrutura autónoma e com uma vivacidade, em termos de informalidade comunicativa, que ultrapassa a do português 19 Como explicar este fenómeno? É que, como diz o escritor Gabriel Mariano, em Cabo Verde, culturalmente, o negro africanizou o europeu e ambos tiveram que fazer grandes cedências para que a transculturação linguística, mas também a aculturação, a síntese genética e antropológica, acontecessem. As razões são várias: o número de brancos era extremamente limitado quando comparado com o dos negros (Carreira, 1972); um número considerável de brancos era analfabeto e o seu interesse era mais económico do que cultural; 20 Os poucos brancos existentes, com a pirataria implantada e com a mudança da rota de escravos, ficam cada vez mais pobres e eram obrigados a conceder alforrias aos cativos para não morrerem de fome. E isto porque a partir da primeira década do século XVII os armadores partiam directamente do continente para os mercados de escravos na Europa e nas Américas, secundarizando a Cidade Velha como placa giratória do comércio negreiro. 21 Uma outra fragilidade do branco consistia no facto dele viajar sem a companhia da família, por razões de ordem climática e, naturalmente, sentia a necessidade de aproximar-se da escrava negra e, sem dar-se conta, esta ia limando não só as arestas da prepotência do patrão, mas também ia fazendo a ponte entre os dois universos culturais. 22 O negro nem sempre foi um elemento submisso e dócil. Muitas vezes organizava rebelião, fugia para os lugares mais inacessíveis e, na calada da noite, vinha roubar nas propriedades do branco. A expressão «badiu», como o habitante da ilha de Santiago é reconhecido, deriva da palavra «vadio» e esta era a designação dada aos escravos fujões que, recusando a autoridade e a opressão do branco, fugiam para os montes e, pela calada da noite, vinham roubar o seu próprio patrão. Esta situação enfraquecia a autoridade do branco e o tornava mais dialogante. 23 Se o branco, pelos condicionalismos atrás descritos era forçado a ser tolerante, o negro, pela sua própria condição de escravo, na maior parte das vezes tinha que ser não só tolerante, mas também submisso. Com efeito, o patrão, pela Carta régia de 1466, tinha todos os direitos sobre o escravo. E para enfraquecer a capacidade de reivindição dos cativos, o patrão nunca juntava os escravos da mesma etnia no mesmo local. Com esta separação a comunicação linguística era praticamente nula 24 Os escravos não percebiam nem a língua do branco, nem a língua do companheiro de destino. Ora, de acordo com o linguista Noam Chomsky, em situações limites de comunicação como aquelas em que viveu o escravo em Cabo Verde, a faculdade inata de comunicação se desenvolve consideravelmente. E esta é uma das razões por que em tão pouco tempo se formou o crioulo de Cabo Verde. Nessa formação, há a cumplicidade tanto do branco como a do negro e daí a síntese, daí a transculturação. 25 Linguisticamente falando, a sintaxe e a morfologia do crioulo são negras, enquanto o léxico é, na sua maioria, português. De acordo com o linguista alemão Jürgen Lang - docente no mestrado de Crioulística e Língua Caboverdiana em Cabo Verde – a maior parte do material linguístico caboverdiano é português, porém a esse material os caboverdianos insuflaram uma alma nova de tal forma que um português que nunca viveu em Cabo Verde não fala e nem compreende o crioulo caboverdiano. 26 Hoje fala-se tanto de globalização. A mestiçagem caboverdiana é um exemplo acabado de globalização e de diálogo intercultural, um diálogo que começou por ser uma confrontação e que acabou realizando uma rica síntese. Esta síntese é um processo inacabável. Ontem, ela se processava entre o branco e o negro, nas condições atrás referidas. Hoje, ela ramifica e se diversifica entre Cabo Verde e o mundo, pela ponte da emigração, das tecnologias de comunicação, do conhecimento académico, do diálogo entre as culturas, da leveza da arte e das diversas outras formas de mobilidade social. A nossa crioulidade é o que restou, pois, de positivo da escravatura e do colonialismo. 27 3. O Discurso da negação do crioulo caboverdiano Até ao século XIX, a formação do crioulo caboverdiano se processou sem grandes sobressaltos, para além dos que eram congénitos ao regime escravocrata. Mesmo nessa situação, não houve, ao que sabemos, nenhuma tentativa organizada e deliberada para sufocar o crioulo nascente. Os próprios brancos se compraziam em aprender e falar crioulo, o que levou um escritor anónimo a alertar o rei de Portugal, em 1784 dizendo que «Até mesmo os brancos são pouco civilizados, de sorte que são bem raros os que sabem a língua portuguesa com perfeição, e só vão seguindo o estilo da terra, que é uma corruptela tão rústica que se não pode escrever» (Carreira, 1985:27). 28 Estamos no último quartel do século XVIII. A tentativa deliberada de sufocar o crioulo caboverdiano começa sobretudo no século XIX, estranhamente após a criação do primeiro liceu em 1860 e o surgimento do Seminário Liceu de S.Nicolau em 1866. Nessa altura, «os zelosos compatriotas», no dizer de Pedro Cardoso, começaram a ver no crioulo um atentado contra a unidade do Império português e que urgia impedir o desenvolvimento e alastramento. 29 Várias vozes surgiram condenando o crioulo: «a língua que usam é um ridículo crioulo» (Pusich, princípio do séc. XIX); «… idioma o mais perverso, corrupto e imperfeito, sem gramática e que não se pode escrever …» ( Chelmich e Varnhagen, 1841); «… gíria ridícula, composto monstruoso de antigo português e das línguas da Guiné que aquele povo (o caboverdiano) tanto preza e mesmo os branco se comprazem a imitar» (Lopes de Lima, 1841); Eles «animam este uso aprendendo o crioulo logo que chegam da Europa, usando-o no trato doméstico e educando os seus filhos a falarem-no, quase com exclusão do português» Continuando « … o crioulo não favorece a ideia unitária do Império» ( Ferreira, 1973:130-131). 30 « O dialecto que fala os habitantes de S.Nicolau e que se chama crioulo, é uma miscelânea de português antigo, de castelhano e francês, sem regras algumas de gramática, nem se podem aplicar, o que torna a sua aprendizagem mais difícil aos europeus, os quais não conseguindo bem falá-lo, ainda assim, em breve e com facilidade o compreendem facilmente» ( Adolfo Coelho, 1886) « A língua deste gentio toda pela costa é uma: carece de três letras – scilicet , não se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de espanto, porque assim não têm Fé, nem Lei, nem rei, e desta maneira vivem sem justiça e desordenadamente» ( Gandalvo, s/d). Este discurso de negação ainda hoje existe. Já não se diz que o crioulo quebra a unidade do império português, mas sim a unidade da Nação. É curioso que o estatuto social do crioulo tem sido sempre superior ao político, razão por que em Cabo Verde «a vida decorre sempre em crioulo» e mesmo os brancos se acostumam facilmente ao «estilo da terra». 31 Temos ainda que convir que a negação da crioulidade, estranhamente, tem contribuído para a sua própria promoção. Com efeito, numa altura em que se dizia que ele devia ser proibido porque contribuía para quebrar a unidade do império, tanto os negros, os mestiços como os próprios brancos o privilegiavam na sua comunicação; o mesmo deixou ainda de ser considerado como «estilo da terra» para passar a ter o estatuto de dialecto. Até os anos 70 do século XX era este o estatuto de que gozava. Com a Independência de Cabo Verde, em 1975, as críticas não acabaram, mas o estatuto evolui para língua nacional e materna. 32 Hoje, 37 anos depois da Independência, o português é língua do poder, mas a língua que efectivamente reina é o crioulo. É essa força do crioulo a razão por que em 1999 e em 2010 o Parlamento caboverdiano analisou a proposta da sua oficialização em paridade com o português. Tanto na primeira como na segunda tentativa a proposta foi chumbada, mas os defensores desta causa estão cada vez mais confiantes e tudo leva a crer que a terceira tentativa vai ser a vez da oficialização. Até porque o crioulo já ocupa espaços da oficialidade no ensino, na arte, administração, na comunicação social... O que falta é o reconhecimento jurídico-constitucional. 33 4. Discurso de afirmação do Crioulo Se é no século XIX que começou o discurso da negação do crioulo caboverdiano, como atrás ficou demonstrado, é também a partir desse século que o discurso de afirmação começou a ser mais visível. A primeira tomada de posição mais consistente foi a de António de Paula Brito que, em 1888, publicou «Apontamento para a Gramática do Crioulo que se Fala em Santiago de Cabo Verde». 34 O filólogo Francisco Adolfo Coelho, no prefácio desta obra, categoricamente, diz: «O trabalho do sr. A. de Paula Brito … [sendo] o primeiro sobre o assunto, merece publicidade, porque contém muitos dados novos, sobretudo porque tem por objecto o estudo especial do dialecto de Santiago, que o autor fala desde a infância» (Coelho, 1888, p. 333). Outra tomada de posição significativa é a do Cónego António Manuel da Costa Teixeira que em 1903 publicou uma cartilha bilingue português-crioulo. 35 Por entre os defensores da afirmação do crioulo caboverdiano temos também o professor e escritor Pedro Monteiro Cardoso. O mesmo publicou em 1932 o seu livro Folclore Caboverdiano. E defendeu por várias vezes a causa do crioulo no jornal O Manduco. É o mesmo ainda que em 1933, numa conferência pronunciada no teatro Virgínia Vitorino da Praia, declarou. « … Todos aprendemos a língua estrangeira tendo por instrumento a língua materna; saibam os professores de instrução primária servir-se do crioulo como veículo para mais rápido e profícuo ensino das matérias do programa a cumprir, principalmente do português». 36 Continuando, o professor da ilha do Fogo afirma: « … Em toda a parte estudam-se e cultivam-se os dialectos regionais; só em CaboVerde é que aparecem uns ilustres pedagogos a denunciar o crioulo como trambolho, e se a mais não se atrevem é porque se podem levantar as pedras das calçadas». Outro paladino do crioulo é o poeta Eugénio Tavares. Em 1932 publicou Morna – Cantigas Crioulas. Insurgindo-se contra os que na época diziam que o crioulo não tinha regras nem gramática, o poeta da ilha da Brava escreveu em 1924, no jornal O Manduco: «Desde que não seja possível negar que o Caboverdiano pensa; e que dispõe de palavras para dizer o seu pensamento; e que usa de regras para a arrumação dessas palavras; e que, finalmente, tais palavras 37 e regras constituem o resultado de uma colaboração de elementos associados na colonização – fica admitida a utilidade do estudo dessas palavras e regras, como elementos para o estudo da colonização. E se não me ilude a minha incompetência, esse estudo é que constitui a gramática». Napoleão Fernandes é outra voz que advogou a causa do crioulo através de uma obra iniciada em 1920, tendo levado mais de vinte anos a escrever, a qual só veio a ser publicada postumamente, em 1991, com o título de Léxico do Dialecto Crioulo do Arquipélago de CaboVerde. 38 Em 1923, Elsie Parsons, de nacionalidade americana, publica Folklore from the CapeVerde Island. A afirmação do crioulo prossegue na revista Claridade, fundada em 1936, com a publicação de poemas e letras do folclore caboverdiano. Em 1957, Baltasar Lopes publica O Dialecto Crioulo de CaboVerde e mais tarde, em 1961, Dulce Almada dá à estampa Contribuição do Dialecto Falado no seu Arquipélago, ambas as obras de cunho gramatical. 39 A partir de 1960, uma plêiade de escritores e compositores, como Kaberdiano Dambará, Ovídio Martins, Luís Romano, Sérgio Fruzoni ... começou a escrever poemas e livros de poemas em crioulo, inscrevendo-se claramente na linha da defesa da nossa língua materna. Porém, é depois da Independência, ocorrida em 1975, que a defesa da língua materna ganha maior fôlego. Em todos os programas do Governo são inscritas acções de afirmação e valorização do crioulo. 40 O primeiro Colóquio Internacional sobre a Problemática da Língua e do Ensino do Crioulo acontece em 1979. É desse fórum que surgiu a 2ª proposta de alfabeto para a escrita do crioulo, tendo em conta que a primeira proposta surgiu com A. de Paula Brito, em 1888. Escritores como Donaldo Macedo, Manuel Veiga, Tomé Varela da Silva, Kaká Barboza, Henrique Lopes Mateus, Eutrópio Lima da Cruz, Eduardo Cardoso, Horácio Santos, Francico Fragoso…, na década de 80 e 90 do século XX, divulgaram obras nos domínios da ficção, do ensaio, do teatro e da poesia. 41 Ainda na década de 90 do século XX começaram a surgir várias teses académicas de mestrado e doutoramento sobre o crioulo de Cabo Verde de Marlyse Baptista, Nicolas Quint, Manuel Veiga, Fernanda Pratas... Foram defendidas ainda algumas dissertações de licenciatura no Instituto superior de Educação. Foi ainda em 1998 que o Governo aprovou, a título experimentar, o ALUPEC (Alfabeto Unificado para a Escrita do Caboverdiano). 42 A partir de 2000 várias dissertações de mestrado e teses de doutoramento sobre a problemática do crioulo caboverdiano, foram defendidas em Universidades estrangeiras. É nessa década que foram dadas à estampa vários trabalhos de autores caboverdianos, como o José Luís Tavares, o Armindo Martins, entre tantos outros. É nessa década ainda que o linguista alemão Jürgen Lang publicou o Dicionário do Crioulo de Santiago (2002), com 8.000 entradas,e Manuel Veiga, em 2011/2012, publicou também o Dicionário Bilingue Caboverdiano–Português, com 16.000 entradas. 43 É ainda em 2005 que o Governo aprovou as Linhas Estratégicas para a Afirmação da Língua Caboverdiana. E cinco anos mais tarde, em 2010, o Governo institui o ALUPEC como alfabeto caboverdiano. Seguidamente, em Novembro de 2010, a Universidade de Cabo Verde cria o Mestrado em Crioulística e Língua Caboverdiana. Se em Cabo Verde o ensino do crioulo, de forma não sistemática, começou desde os anos 80 do século XX, há experiências de ensino do crioulo nos EUA desde os anos de 1970. 44 Essa experiência não se restringe apenas a Cabo Verde e aos EUA. Também na Holanda e em Portugal há ou houve experiências do ensino junto da nossa emigração. Apesar de todo esse caminho andado, ainda não se atingiu a paridade desejada entre o português e o crioulo caboverdiano. Com efeito, o primeiro continua sendo língua das situações formais de comunicação e o segundo das situações informais. Entretanto, hoje, o crioulo marca presença cada vez mais significativa no ensino, na administração pública, na comunicação social, no Parlamento ... 45 Aliás é essa dinâmica que levou o Parlamento, desde 1999, a consagrar na Constituição da República (artº9. 2 e 3) que «O Estado promove as condições para a oficialização da língua materna cabo-verdiana, em paridade com a língua portuguesa» (2); que «Todos os cidadão têm o dever de conhecer as línguas oficiais e o direito de usá-las» (3). Não há dúvidas que o bilinguismo caboverdiano é um projecto em construção. Ainda temos muito caminho para andar, mas o rumo é irreversível e cada dia os passos são mais significativos. Apesar de tudo, o crioulo precisa de conquistar mais espaços de formalidade e o português mais espaços da informalidade. 46 5: Amor à nossa singularidade Respeito pelas Riquezas da Humanidade A Nação caboverdiana pela história, pela vivência e pelo projecto de vida foi, é e será sempre crioula. Uma crioulidade que é ontológica, antropológica, linguística... No começo, essa crioulidade nasceu do confronto/reencontro entre o mundo lusitano e o mundo africano. Hoje e sempre essa mesma crioulidade é e será fruto de uma síntese crítica entre Cabo Verde e o mundo, através dos caminhos da mobilidade social, da intercomunicação, da emigração, do turismo, da ciência e da cultura. 47 Assim como a humanidade não deve ter fronteiras, o mesmo se pode dizer em relação à nossa crioulidade. Cabo Verde nasceu da mestiçagem étnica e transcultural. Cabo Verde quer continuar a afirmar-se na mestiçagem transétnica e transcultural. A mestiçagem é o nosso destino, mas também o nosso projecto de vida, sem racismo, sem etnocentrismo, sem diglossia, sem glotofagia. A nossa crioulidade forja-se num diálogo crítico, aberto, respeitador, tolerante. Nesse diálogo, amamos a nossa singularidade e respeitamos, com espírito crítico, as riquezas do mundo global. 48 6. Projecção da Língua Cabverdiana para o Futuro O trajecto realizado até agora exige que se dê um novo salto. Fundamentalmente, este salto deve estar ligado à massificação do ensino da língua caboverdiana e da investigação a ela ligada, à padronização de algumas variáveis, ao alargamento do espaço da informalidade e, ainda, à oficialização da língua caboverdiana, em paridade com o português, nos termos do artigo 9º.2 da Constituição. Toda essa trajectória tem na massificação do ensino e da investigação a chave de todo o segredo. Isto significa que o futuro da língua caboverdiana, em grande medida, depende da estratégia traçada para o seu ensino e para a investigação. 49 Porém, como ensinar a língua caboverdiana no contexto das variantes e variedades existentes? O que eu penso, neste momento, sobre este assunto, está plasmado na resposta que dei a um jornalista, sobre as seguintes questões: 1.“Qual ou quais [...] deve (m) ser a (s) variante (s) que deve (m) ser eleita (s) como padrão? 2. [Quais] os principais argumentos científicos, históricos, culturais e políticos para essa escolha. 3. Qual será o futuro possível das outras variantes menos expressivas em termos de número de falantes? 4. Quais poderão ser as implicações da padronização de uma, ou de um número limitado de variantes para a diversidade cultural existente nas diferentes ilhas?” 50 Respondendo, digo: 1. Em vez de se falar da escolha da variante padrão, penso ser melhor falar-se de que estratégia para o enriquecimento linguístico orientado e sistematizado do crioulo caboverdiano. Há que ter uma política linguística que dê oportunidade de desenvolvimento e de afirmação a todas as variantes, e isto dentro do espírito da valorização da diversidade cultural. Para que isto seja possível, é necessário a definição de uma estratégia que tenha em conta não só a diversidade linguística, mas também os aspectos práticos, metodológicos e económicos. 51 Se não é aconselhável a imposição de uma única variante, nem tomar todas as variantes e colocá-las num mesmo saco, julgo ser possível proceder-se da seguinte maneira: Ver os eixos linguísticos existentes, em termos de proximidade gramatical (no sentido estrutural, fonético-fonológico e morfosintáctico; ver esses mesmos eixos em termos de intercompreensão e aceitabilidade linguísticas. Seria desejável a escolha de dois Eixos: O Eixo Norte, a partir de S. Vicente; e o Eixo Sul, a partir de Santiago. A valorização do Eixo Norte seria em confluência com as outras variantes do Norte do Arquipélago. A oportunidade de enriquecimento linguístico em confluência dá-se em dois sentidos: no da variante de S. Vicente (a grande confluência, com vocação supra-regional); e no de cada uma das variantes do Norte, com imputs de S. Vicente (a pequena confluência, com vocação local). 52 Na prática, em S. Vicente estuda-se a variante de S. Vicente e faz-se a ponte possível com as riquezas e as particularidades específicas das outras variantes do Norte. Em cada uma das outras ilhas do Norte, estuda-se a respectiva variante e faz-se a ponte possível com as riquezas e especificidades da variedade de S. Vicente, lá onde é possível. Ao estudante, em S. Vicente, dá-se-lhe a competência na respectiva variante e os conhecimentos básicos do funcionamento das outras variantes do Norte. Se se entender que este procedimento é muito complexo ou muito dispendioso, pode-se optar pela variante que para os sanvicentinos tem mais potencialidades enriquecedoras, melhores possibilidades de intercompreensão e maior dimensão em termos de mercado linguístico (a de Santo Antão, por exemplo). 53 A sociabilização das diferenças, a partir da competência adquirida, pode ou não dar-se espontaneamente. No caso afirmativo, paulatinamente consolidará uma expressão em S. Vicente muito rica, e com vocação supra-regional, e em cada uma das outras ilhas do Norte, expressões cada vez mais ricas, mas com vocação apenas local. E isto não pontualmente, mas num processo que pode durar vários anos. No Eixo Sul, a partir de Santiago, a estratégia se repete, nos mesmos moldes, possuindo a expressão de Santiago vocação supra–regional e, mesmo, nacional ( já que esteve na origem de todas as outras). As restantes variantes, ao Sul, terão uma vocação local. 54 Com essa estratégia, cria-se oportunidade para se ter, a nível do Norte e do Sul, duas expressões linguísticas muito fortes (à volta de S. Vicente e de Santiago), e expressões mais ricas que as que hoje existem em cada uma das ilhas do Arquipélago. O futuro poderá, eventualmente, dar conta da confluência Norte/Sul. E isto devido à mobilidade social, através das ligações aéreas e marítimas, da comunicação social, do ensino, da investigação e da arte, do matrimónio entre pessoas de ilhas diferentes e da globalização do mercado nacional. Esta mobilidade, dizia, poderá ser responsável por essa confluência Norte/Sul. Se ela se der, será bom e teremos uma expressão linguística muito rica. Se não se der, não haverá nenhum drama, e teremos duas expressões linguísticas fortes e expressões mais ricas em cada ilha. 55 2. Porquê a escolha dos dois Eixos?: a) A variedade de S. Vicente é o resultado de uma unificação 56 linguística a partir de Fogo, S. Antão, S. Nicolau e Boavista. b) Em todo o Norte há uma larga intercompreensão desta variedade e a sua aceitação é pacífica, depois da respectiva variante local. A variante de S. Vicente nasceu à volta do Porto Grande, mas ela é, seguramente, um património das ilhas que estiveram na base do seu surgimento. A unificação linguística que emergiu em S. Vicente e a intercompreensão e aceitação da variedade emergente, em todo o Norte do País, são três forças sociolinguísticas muito fortes e que aconselham que o Eixo Norte, em confluência, tenha S. Vicente por palco privilegiado. A escolha do Eixo Sul, à volta de Santiago, em confluência 57 com as outras variantes do Sul, tem por fundamentos: A expressão de Santiago constitui a matriz de todas as variantes. Do ponto de vista estrutural é a mais autónoma. Mais de metade dos locutores caboverdianos fala ou convive diariamente com esta variedade. Há uma larga intercompreensão a nível do Eixo Sul. Possui um manancial de tradições culturais. A sua autonomia redunda-se numa autenticidade e originalidade muito grandes. Por ser uma variedade que não come vogais, em todos os contextos (no início, no meio e no fim das palavras) faz com que os compositores, mesmo os do Norte, tenham a necessidade de a ela recorrerem muito frequentemente, creio eu que para vincar a acentuação sonora, no final de sílabas, de um trecho musical. É a variante que, até este momento, tem merecido maior atenção de académicos estrangeiros e, mesmo a nível nacional, está melhor estudada. 58 3. A estratégia proposta dá oportunidade a todas a variantes. Porém, uma coisa é certa: as variantes que mais vão contribuir para o enriquecimento dos dois eixos e que, também, vão ter mais possibilidade de enriquecimento próprio, serão aquelas que forem: objecto de mais estudo científico e de mais investigação, que tiverem mais investigadores e mais professores formados; que for suporte de mais produção cultural e literária; veículo mais usado na comunicação social; objecto de mais tradução, de mais ensino no básico e secundário, na respectiva ilha, mas também de ensino superior no país. 59 4. A pergunta 4, sobre quais as implicações da padronização de uma variante, pela estratégia que apresentamos, deixa de ter razão de ser. A proposta é de dar oportunidade de desenvolvimento orientado a todas as variantes, num contexto em que sobressaem duas variedades supra-regionais. Por isso, a diversidade cultural e linguística ficam salvaguardadas. Nenhuma variante fica de fora, mas a importância da mesma e consequente contributo na padronização das variantes supra-regionais vai depender do investimento local de que ela for objecto. 60 Devo dizer que a estratégia proposta não é para ser materializada a curto prazo. É uma estratégia que começa com o primeiro passo (fazer o que de facto podemos fazer em cada momento) e que, progressivamente dará os outros passos a médio e longo prazos. A sabedoria popular diz que “é caminhando que se aprende a caminhar”. O que certamente não é uma boa estratégia é ficar parado à espera que todas as condições se reúnam. Eis, em poucas palavras [a trajectória histórica da língua caboverdiana, os altos e baixos no seu processo de afirmação e] a visão estratégica para um desenvolvimento futuro harmonioso, científico e inclusivo da Língua Caboverdiana. 61 bibliografia António CARREIRA, 1972 – CaboVerde – Formação e Extinção de uma Sociedade Escravocrata, Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, p. 22 e segs; p. 287. Idem, 1985 – Notícias Corográficas e Chronológicas do Bispado de Cabo Verde, Lisboa, ICL, p. 27. António de PAULA BRITO, 1888 - «Apontamentos para a Gramática do Crioulo que se Fala na Ilha de Santiago de Cabo Verde», in Crioulos, 1967, ed. Jorge Morais Barbosa, Lisboa, Academia Internacional da Cultura Portuguesa. António PUSICH, «Memória in as Ilhas de Cabo Verde no princípio do séc. XIX», citação de Manuel Ferreira em Aventura Crioula, Plátano Editora, 1973, 2ª ed. P.29. Baltasar Lopes, 1957, O Dialecto Crioulo de Cabo Verde, reeditado em 1984, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Donaldo MACEDO, 1979 – A Linguistic Approach to the Capeverdean Language, Universidade de Massachusts, dissertação de mestrado. 62 Dulce ALMADA, 1961 – Contribuição para o Dialecto Falado no seu Arquipélago, Lisboa, Junta de Investigação do Ultramar. Elsie PARSONS, 1923 – Folk-Lore from the Cape Verde Islands, New York, American Fol-Lore Society. Eugénio TAVARES, 1932 – Mornas – Cantigas Crioulas, Lisboa, ed. J. Rodrigues& Cª. Francisco Adolfo COELHO, 1886, in Boletim da Sociedade de Georafia de Lisbo, nº12, 6ª série, publicado depois em Crioulos, 1967, por Jorge Morais BABOSA, Academia Internacional da Cultura Portuguesa. Gabriel MARIANO, 1991, Cutura Caboverdiana, Lisboa, Vega, p. 54 e 69. Jorge BARBOSA, poemas «Panorama»,«Prelúdio» e «Relato da Nau», Obra Poetica, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2002. 63 José Conrado de CHELMICH e Francisco Adolfo de VARNHAGEN, 1841 64 – Geografia Caboverdiana ou Descrição Geográfica-Histórica de CaboVerde e Guiné, citação de Manuel Ferreira, op. cit. P.129. José Lopes de LIMA, 1841 _ «Ensaios sobre a estatística das possessões portuguesas do Ultramar», Imprensa Nacional, cit. Manuel Ferreira, op. cit. p 29. Manuel VEIGA, 2002 – O Caboverdiano em 45 Lições, Praia, Virar de Página. Napoleão FERNANDES, Léxico do Dialecto Crioulo do Arquipélago de Cabo Verde, edição póstuma da filha Ivone Fernandes Ramos, 1991, S.Vicente. Pedro CARDOSO, 1932 – Folclore Caboverdeano, reeditado em 1983, Lisboa, Edição da Solidariedade Caboverdiana de Paris. Pero Magalhães GANDALVO, Tratado da Terra do Brasil, p. 49, citação de Manuel Ferreira, op. cit. p. (?) Lisboa, 21 de Fevereiro de 2013