VISTOS, etc. RODRIGO ALCANTARA DE LEONARDO, FERREIRA vulgo DE “Tumba”, CARVALHO, GUILHERME vulgo “Chuck”, WITIUK JORGE GABRIEL GONZALEZ, THIAGO BATISTA MIRANDA, vulgo “Crânio”, VIVIAN CRISTINY MOURA DA SILVA, vulgo “Vivi”, ALINE LACERDA FOCH, vulgo “Lika” e ANA PAULA RAMOS GUIMARÃES DA SILVA, vulgo “Mel”, qualificados nos autos, foram denunciados e processados pela incursão nos artigos 288, p.ú., 251, e 129, caput (por 12 vezes), na forma do artigo 69, todos do Código Penal. RODRIGO ALCANTARA DE LEONARDO, vulgo “Tumba”, também foi denunciado por incursão no artigo 180, caput, do Código Penal. Segundo a denúncia e respectivo aditamento: a) no primeiro semestre de 2008, todos os réus acima nomeados, juntamente com os adolescentes FERNANDO “Macaco”, CARIOLA e DIEGO DOS SANTOS NASCIMENTO LAGUNA, vulgo ALVES, vulgo “Seqüestrado”, associaram-se em quadrilha ou bando armado, por intermédio do grupo IMPACTO HOOLIGAN, visando a pratica de crimes violentos contra homossexuais e “punks”; b) em 14 de junho de 2009, por volta das 21:40h, na Av. Vieira de Carvalho, esquina com a Rua Vitória, na Av. Paulista (proximidades do Banco Bradesco) e na Rua Frei Caneca, nesta Capital, todos os réus acima nomeados, juntamente com os adolescentes FERNANDO CARIOLA DOS SANTOS LAGUNA, vulgo “Macaco”, e DIEGO NASCIMENTO ALVES, vulgo “Seqüestrado”, expuseram a perigo a vida e a integridade física das vítimas Kalahn Iço Bou Assi, Marcio Lima Santos, Paulo Luiz Freitas da Costa Santos, Felipe Pereira de Freitas, Renan Eduardo Santana da Costa, Herbert Vieira dos Santos, Camila de Cássia dos Santos Teixeira, Ana Paula de Oliveira, Jéssica Emanuelle da Silva e Willis Manoel da Silva, mediante explosão e arremesso de engenho de dinamite ou substância de efeitos análogos, causando nas vítimas as lesões corporais descritas nos laudos de corpo de delito encartados; c) em 14 de junho de 2009, por volta das 21:40h, na Av. Vieira de Carvalho, esquina com a Rua Vitória, na Av. Paulista (proximidades do Banco Bradesco) e na Rua Frei Caneca, nesta Capital, todos os réus acima nomeados, juntamente com os adolescentes FERNANDO CARIOLA DOS SANTOS LAGUNA, vulgo “Macaco”, e DIEGO NASCIMENTO ALVES, vulgo “Seqüestrado”, pela explosão acima descrita, ofenderam a integridade física das vítimas Kalahn Iço Bou Assi, Marcio Lima Santos, Paulo Luiz Freitas da Costa Santos, Felipe Pereira de Freitas, Renan Eduardo Santana da Costa, Herbert Vieira dos Santos, Camila de Cássia dos Santos Teixeira, Ana Paula de Oliveira, Jéssica Emanuelle da Silva, Willis Manoel da Silva, Mackson Custodio da Silva e Mauricio Ramos, causando-lhes lesões corporais descritas nos laudos periciais de fls. 496/501, 503/504 e 722; e d) no primeiro semestre de 2009, RODRIGO ALCANTARA DE LEONARDO, vulgo “Tumba”, recebeu em proveito próprio cartões de crédito e documentos pessoais de Bianca Correa dos Santos e Vinicius Henríquez, sabendo que eram produto de crime. A denúncia e o respectivo aditamento foram recebidos a fls. 810 e os réus tiveram a prisão preventiva decretada. Citados, os réus ofereceram as pertinentes respostas escritas. Durante a instrução foram ouvidas as testemunhas e vítimas arroladas e os réus foram interrogados (fls. 1146/1145, 1176/1225, 1286/1298, 1309/1366 e 1422/1475). As partes ofereceram alegações finais escritas. O Ministério Público pleiteou a condenação de todos os réus nos termos da imputação (fls. 1547). Os réus, por seus Defensores, deduziram pleitos absolutórios a fls. 1559 (THIAGO), 1596 (JORGE), 1621 (RODRIGO), 1636 (GILHERME), 1650 (ALINE),e 1668 (ANA PAULA e VIVIAN). Este é o relatório. FUNDAMENTO e DECIDO. O pedido acusatório procede em parte. A materialidade dos crimes imputados é comprovada pelos fartos elementos do inquérito policial, em especial os autos de exibição e apreensão, os laudos periciais resultado dos exames médicos nas vítimas e os depoimentos colhidos de testemunhas e investigados. Entretanto, o mesmo não se pode dizer da autoria delitiva, ao menos quanto a todos os réus e delitos. Após a longa instrução, o que se tem provado nos autos é a associação de parte dos réus e de outros indivíduos em quadrilha para o fim de cometer crimes violentos e de intolerância. A existência da quadrilha autodenominada IMPACTO HOOLIGAN, assim como sua finalidade ilícita, é fato incontroverso e mais do que provado nos autos. Pensar o contrário é ofender o bom senso. A formação da quadrilha está demonstrada, de um lado, por farta prova material. Os principais documentos a esse respeito foram formalmente apreendidos por policiais civis do DECRADI na residência do réu RODRIGO. Todo o material foi periciado e os laudos respectivos foram juntados, merecendo maior interesse os laudos referentes ao caderno de 241 folhas (fls. 527/563) e à agenda pessoal referente ao ano de 2008 (fls. 564/613). No caderno examinado, as anotações referentes ao grupo IMPACTO HOOLIGAN são fartas e inegáveis. A fls. 547, consta o nome do bando e as palavras (com ele incompatíveis) Honra, Coragem e Respeito. A fls. 555 e 558, novas anotações referentes ao grupo e frases vazias, como “vida longa aos verdadeiros skinheads”. Por fim, a fls. 552/553 constam regras escritas, em forma de estatuto, a serem seguidas pelos membros da quadrilha. Deixo de transcrever a integralidade das regras, mas a leitura do manuscrito fala por si. Basta mencionar, por exemplo: respeitar a hierarquia, comparecer às reuniões, honrar o nome da Impacto Hooligan, ajudar e respeitar os membros da IH, lutar contra o inimigo, ser leal a ideologia, cobrar tretas suas e de membros do IH, não trair o movimento, não ter dó de inimigos, não ficar bêbado em dias de role agressivo, levar o nome da IMPACTO HOOLIGAN adiante, nunca baixar a cabeça para os inimigos, conhecer símbolos e siglas, em hipótese alguma trair membros da IH, mesmo em minoria, ir aos combates. Na agenda pessoal de RODRIGO, as menções a quadrilha são igualmente robustas e demonstram não só sua existência como a periodicidade de reuniões e dos chamados “rolês”, quando o grupo saía com o propósito deliberado de praticar crimes contra a honra e a integridade física de homossexuais e “punks”, alguns de bandos rivais. Basta a leitura da agenda para constatar que RODRIGO ingressou no bando no dia 25 de maio de 2008 (fls. 590), e durante os meses seguintes participou de várias reuniões, “roles” e batizados de novos membros, todos devidamente identificados nas datas em que ocorreram. Alem desses dois documentos principais, diversos outros objetos foram apreendidos nas residências de RODRIGO e de GUILHERME, conforme autos de fls. 180/181 e 174/178. A par de roupas adereços típicos de grupos “skinheads”, alguns objetos robustecem ainda mais a prova material da existência da quadrilha. Na residência de GUILHERME, por exemplo, foram apreendidas 07 cartas manuscritas a ele endereçadas (fls. 201 e ss) e 01 carta escrita por GUILHERME e endereçada ao réu RODRIGO (fls. 203 e envelope de fls. 210). A leitura das cartas reforça algumas conclusões importantes. Primeiramente, a maioria das cartas chama GUILHERME pelo apelido “CHUCK”, nome pelo qual é referido pelos membros da quadrilha. Em segundo lugar, fica nítido especialmente pela carta redigida por GUILHERME o forte vínculo associativo do bando e a óbvia liderança de GUILHERME. Ele escreveu a carta em fevereiro de 2009, endereçada a RODRIGO, de dentro do estabelecimento prisional em que estava preso por mais um crime violento, e alguns trechos falam por si. No segundo parágrafo, GUILHERME escreve: “O os rolês muleque? Ta fiel ao IMPACTO né? Porque aqui é 98 até a morte, não é porque eu fui preso que tudo ou eu irei parar ou largar a banca. Eu to montando a banca até aqui na cadeia, juro pra você, HAHAHA!. No parágrafo seguinte, acrescenta “seja leal a banca e ao nosso ideal 88”. Por fim, termina assinando: CHUCK 98, IMPACTO H88LIGAN e uma suástica nazista. Fica clara a liderança de GUILHERME sobre a quadrilha e sobre RODRIGO, que é cobrado na carta a manter-se fiel ao grupo. Também fica clara a simbologia utilizada pelos integrantes do bando, especialmente os numerais 88 e 98. Conforme demonstrado nos autos de inquérito e confirmado pelos adolescentes membros da quadrilha, os números se referem a localização da primeira letra das palavras no alfabeto. Especificamente, 88 refere-se a HH, que por sua vez indica a saudação nazista “Heil Hitler”, enquanto 98 se refere a IH, que tem o significado óbvio de IMPACTO HOOLIGAN. Vale ressaltar que GUILHERME, como confirmado em audiência, ostenta o numeral 98 tatuado em seu corpo. Por sua vez, o adolescente Fernando Cariola dos Santos, membro confesso do grupo liderado por CHUCK, ostenta as letras IH tatuadas no peito (fls. 399/405). Os fartos elementos colhidos, especialmente no inquérito policial, demonstram não apenas a existência do grupo, mas sua estabilidade, organização e finalidade criminosa. Todas as testemunhas e investigados ouvidos na fase policial confirmaram a estabilidade do grupo, que já existia já apelo menos alguns anos, e sua finalidade violenta. Analisando-se todos os documentos e depoimentos chega-se a conclusão fatal de que o grupo IMPACTO HOOLIGAN não se limitava a exercer o direito constitucional de reunião e de expressão do pensamento, ainda que absurdo, preconceituoso, intolerante e desarrazoado, mas extrapolava para a execução de atos de violência contra os alvos escolhidos, preferencialmente grupos “punks” rivais igualmente criminosos e indivíduos com orientação homossexual. São inúmeros os boletins de ocorrência acostados aos autos sobre crimes contra a integridade física, a vida e o patrimônio, em sua maioria envolvendo vítimas homossexuais, sempre com o envolvimento de membros da quadrilha desde a adolescência. Basta mencionar os diversos boletins de ocorrência acostados a fls. 126/155 (todos envolvendo GUILHERME e alguns com envolvimento de RODRIGO), por fatos semelhantes, sempre praticados em bando e ligados, direta ou indiretamente, à ideologia do grupo. Mais recente é o boletim de ocorrência de fls. 412/417, que versa sobre crimes de formação de quadrilha, roubo mediante violência e injúria real contra vítimas com orientação homossexual. Na ocasião, foram presos em flagrante delito quatro imputáveis, entre eles os réus GUILHERME e JORGE, e dois adolescentes infratores, entre os quais a ré VIVIAN e a testemunha Fernando Cariola Laguna, membro confesso da quadrilha ouvido na fase policial. Por este fato, os réus GUILHERME e JORGE foram processados e condenados por injuria real pelo juízo desta 29ª Vara Criminal (fls. 1110 e 1111). Por fim, vale ressaltar que GUILHERME e THIAGO respondem juntos a processo criminal por homicídio doloso contra vítima homossexual. De outra banda, não se pode concluir, com base idônea nos autos, de que a quadrilha em questão fosse armada. Nenhuma arma foi apreendida com qualquer dos membros e o modus operandi dos chamados “roles”, segundo consta, incluía predominantemente agressões físicas com mãos e pés. Estabelecido nos autos o crime de quadrilha, tipificado no artigo 288, do Código Penal, cabe analisar concretamente a efetiva participação de cada réu em sua formação e funcionamento. Constata-se, de início, que importantes depoimentos tomados na fase policial não foram repetidos em juízo, por ter o Ministério Público optado em não arrolar como testemunhas os adolescentes Fernando Cariola dos Santos Laguna, vulgo “Macaco”, e Diego do Nascimento Alves, vulgo “Sequestrado”. Tais adolescentes ofereceram importantes esclarecimentos em Delegacia de Polícia, por meio de depoimentos detalhados em que admitem serem membros do grupo IMPACTO HOOLIGAN, chefiado por GUILHERME, e fornecem importantes elementos de convicção. Entretanto, o Ministério Público não os arrolou como testemunhas na denúncia ou em nenhum dos aditamentos posteriores, limitando-se a pleitear em audiência, a fls. 1149, a vinda aos autos de cópia de eventuais depoimentos prestados pelos menores em procedimentos na Vara Especial da Infância e Juventude. Tal providência ficou prejudicada diante da notícia a fls. 1233/1234 de que nada constava a esse respeito nos registros das Varas Especializadas. Dessa forma, impossível aceitar como absolutos os depoimentos prestados pelos adolescentes exclusivamente na fase policial, pois não foram repetidos ou ao menos confirmados em juízo. A prova oral deve ser produzida em juízo, sob o crivo do contraditório, não se podendo contentar com o mero aproveitamento isolado dos depoimentos colhidos em Delegacia de Polícia. Feita essa ressalva, conclui-se que a prova destes autos é inequívoca apenas no sentido de que GUILHERME e RODRIGO eram membros atuantes da quadrilha denominada IMPACTO HOOLIGAN. Os depoimentos colhidos na fase policial, especialmente dos menores Diego e Fernando, assim como os relatos dos então investigados, confirmam a participação de GUILHERME e RODRIGO. Tanto os adolescentes quando todos os demais réus (VIVIAN, ALINE, JORGE, ANA PAULA e THIAGO), confirmaram na fase policial que o grupo era liderado por GUILHERME e integrado, entre outras pessoas, por RODRIGO. A esses elementos somam-se nos autos a prova documental já esmiuçada quando da análise da quadrilha em si e seu funcionamento. A farta documentação e os objetos apreendidos nas residências de RODRIGO e GUILHERME, especialmente a indumentária característica, as obras de temática nazista e neonazista, o caderno com anotações já referidas, as cartas de GUILHERME e a agenda pessoal de RODRIGO, trazem plena segurança sobre a imputação do crime de quadrilha a tais indivíduos. Não resta dúvida de que GUILHERME liderava o grupo estável e hierarquizado, contando até mesmo com estatuto a ser cumprido, com a finalidade precípua de praticar crimes contra a vida, integridade física, honra e patrimônio de vítimas homossexuais ou integrantes de outras minorias. Também está demonstrado á saciedade, pela farta documentação apreendida e já analisada, que RODRIGO era membro atuante de tal quadrilha, que contava com rituais de batismo, reuniões periódicas e códigos de comunicação e conduta. Contudo, a mesma certeza não se tem acerca da participação dos demais réus, por maiores os indícios nesse sentido decorrentes dos depoimentos colhidos em Delegacia. Nenhum dos réus confessou a participação na quadrilha ou nos demais crimes em juízo, o que enfraquece os relatos prestados na fase policial. As vítimas arroladas e ouvidas nada acrescentaram nesse sentido, pois se referiram apenas às lesões corporais sofridas na explosão ocorrida em 14 de junho de 2009. Por sua vez, as únicas testemunhas ouvidas na fase policial e que poderiam colaborar com a apuração dos fatos em juízo, os adolescentes Diego e Fernando, não foram arrolados por qualquer das partes. Importante ressaltar que os réus, na fase policial, em sua maioria negam a participação no grupo, mas implicam os demais ou parte dos demais, e viceversa. Outros se dizem apenas simpatizantes eventuais, namoradas ou amigos de membros do IMPACTO HOOLIGAN. Sem maiores elementos documentais ou de outra natureza, e sem depoimentos judiciais que esclarecessem as contradições, impossível presumir que os réus JORGE, THIAGO, VIVIAN, ALINE e ANA PAULA eram membros ativos da quadrilha, e não apenas amigos de membros, simpatizantes eventuais ou namoradas. Não se olvidam os enormes indícios nesse sentido, ao menos quanto aos réus JORGE e THIAGO, ambos corréus em outros processos juntamente com o réu GUILHERME. Entretanto, não se pode tomar a coautoria em outro feito como prova cabal e isolada de formação de quadrilha. O fato é que nestes autos não existem provas orais, documentais ou periciais suficientes para responsabilização criminal de tais indivíduos pelo crime do artigo 288, do Código Penal. O que está provado, para além de qualquer dúvida, é que GUILHERME e RODRIGO, desde pelo menos o início de 2008, associaram-se entre si e com os adolescentes Fernando Cariola dos Santos Laguna, vulgo “Macaco”, e Diego do Nascimento Alves, vulgo “Seqüestrado, além de outros indivíduos não identificados, de forma estável e organizada, para a prática de crimes violentos e contra a honra de homossexuais e integrantes de outros grupos rivais. Apesar disso, não existe prova judicial suficiente nos autos de que o grupo IMPACTO HOOLIGAN, e por conseguinte os réus RODRIGO e GUILHERME, foi o responsável pela explosão ocorrida em 14 de junho de 2009, durante a Parada do Orgulho Gay, causadora das lesões corporais nas várias vítimas. Nenhuma testemunha judicial ou acusado confirmou os elementos amealhados na fase policial, que ficaram enfraquecidos em juízo. Tampouco as vítimas contribuíram para o esclarecimento da autoria da explosão, pois se limitaram a confirmar as lesões e as circunstâncias da explosão, nenhuma delas reconhecendo qualquer dos réus. Mais uma vez, por maiores os indícios decorrentes dos depoimentos colhidos pela Policia, não existe nenhum elemento concreto produzido em juízo que ligue os réus ou o grupo IMPACTO HOOLIGAN à explosão em questão. Os elementos que levaram o Ministério Público a pleitear a condenação dos réus nesse particular resumem-se a relatos colhidos em fase policial que, ou não foram reproduzidos em juízo, no caso das testemunhas adolescentes, ou foram aqui expressamente desmentidos, no caso dos réus. A única prova técnica que poderia alterar esse panorama também não foi suficiente para tanto. A Polícia Civil conseguiu imagens do local da explosão na hora do fato e tais imagens foram periciadas, impressas e gravadas em mídia acostada aos autos. Na Delegacia, alguns réus teriam se identificado em tais imagens, como consta do inquérito. Contudo, mais uma vez tal identificação não se confirmou em juízo e foi negada pelos réus a quem eram atribuídas. Os próprios policiais ouvidos confirmaram que as pessoas que aparecem nas gravações não foram identificadas propriamente, mas teriam se auto-identificado, o que perde força diante da negativa dos réus a esse respeito. Ressalto, por oportuno, que examinei não só os laudos e imagens impressas acostados aos autos, como assisti ao inteiro teor das imagens gravadas no dia da explosão, e não consegui identificar a fisionomia de nenhum dos indivíduos que teriam sido os responsáveis pelo fato. Em verdade, as imagens, em plano distante e em péssima resolução, mostram dezenas de pessoas paradas na esquina e logo depois correndo da explosão. Impossível a identificação correta e segura de qualquer pessoa em tais imagens. Por conseqüência lógica, a falta de provas sobre a autoria do crime de explosão alcança os delitos de lesão corporal dolosa contra as vítimas. Por fim, resta analisar a imputação referente ao crime de receptação (artigo 180, do Código Penal) feita contra o réu RODRIGO. A solução, nesse particular, é igualmente a improcedência do pleito. A uma, porque a instrução criminal passou ao largo da questão, cingindo-se aos crimes de quadrilha, explosão e lesão corporal. A duas, porque a única vítima da receptação ouvida, Bianca Correa dos Santos (fls. 1201), relatou em audiência ter apenas perdido os documentos em via pública. Negou ter sido vítima de furto ou roubo de tais documentos, que posteriormente foram localizados na residência de RODRIGO. Dessa forma, não há prova segura de que o objeto encontrado era produto de crime anterior, elementar objetiva do tipo penal. Passo a dosar as penas. Na primeira fase da dosimetria, considero especialmente graves a finalidade e a motivação da quadrilha formada. Os réus RODRIGO e GUILHERME e seus comparsas adolescentes e não identificados foram além da finalidade criminosa. O grupo IMPACTO HOOLIGAN, além de praticar crimes violentos e contra a honra de terceiros, o fazia por motivação odiosa e preconceituosa, elegendo as vítimas entre minorias e homossexuais, apenas e tão somente pelo fato de pertencerem a tais minorias ou exercerem referida orientação sexual. Os membros do bando, jovens de classe média, oriundos de famílias constituídas e que cursavam boas escolas e faculdades, seguiam orientação neonazista e xenófoba que disseminava o preconceito, o ódio, a intolerância e a violência. Reputo que tais circunstâncias, frontalmente contrárias ao Estado democrático de Direito que se pretende ver estabelecido em nosso país, demonstram reprovabilidade à conduta. Por isso, com apoio nos artigos 59, e 288, caput, do Código Penal, fixo a pena-base de cada réu em 02 ANOS DE RECLUSÃO. Na segunda etapa, reconheço a agravante da reincidência em desfavor de GUILHERME, em virtude de sua condenação definitiva certificada a fls. 1110. Observo, nesse ponto, que apesar de a quadrilha ter se formado antes do trânsito em julgado da condenação mencionada, tratase de crime permanente, que continuava em plena consumação no período já posterior ao trânsito em julgado para as partes. Por esse motivo, agravo a pena de GUILHERME em 1/5, levando-a para 02 ANOS, 04 MESES E 24 DIAS DE RECLUSÃO. Não há outras agravantes ou atenuantes a se aplicar, nem causas de aumento ou diminuição, razão pela qual torno as penas definitivas. Diante das circunstâncias judiciais desfavoráveis já analisadas na primeira fase da dosimetria, referentes a ambos os réus, especialmente a motivação e a finalidade da quadrilha em comento, inviável o cumprimento das penas em regimes brandos, incompatíveis com a gravidade concreta do crime praticado e seus efeitos deletérios à sociedade. A tais circunstâncias soma-se, quanto ao réu GUILHERME, a reincidência em crime doloso. Por esses motivos, com apoio no artigo 33, do Código Penal, fixo para ambos os réus o regime inicial FECHADO para o desconto das penas. Pelos mesmos motivos, os réus não fazem jus a substituição da pena por medidas restritivas de direito ou ao sursis, com apoio nos artigos 44 e 77, do Código Penal. Ante todo o exposto, e pelo mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial e: a) CONDENO, como incursos no artigo 288, caput, Código Penal, o réu RODRIGO ALCANTARA DE LEONARDO, vulgo “Tumba”, qualificado nos autos, a pena de 02 ANOS DE RECLUSÃO em regime FECHADO, e o réu GUILHERME WITIUK FERREIRA DE CARVALHO, vulgo “Chuck”, também qualificado nos autos, à pena de 02 ANOS, 04 MESES E 24 DIAS DE RECLUSÃO em regime FECHADO; b) ABSOLVO os réus JORGE GABRIEL GONZALEZ, THIAGO BATISTA MIRANDA, vulgo “Crânio”, VIVIAN CRISTINY MOURA DA SILVA, vulgo “Vivi”, ALINE LACERDA FOCH, vulgo “Lika” e ANA PAULA RAMOS GUIMARÃES DA SILVA, vulgo “Mel”, qualificados nos autos, de todas as imputações, por falta de provas suficientes para a condenação, com apoio no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal; c) ABSOLVO o réu RODRIGO ALCANTARA DE LEONARDO, vulgo “Tumba”, qualificado nos autos, da imputação referente ao artigo 180, caput, do Código Penal, por falta de provas suficientes para a condenação, com apoio no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal. d) ABSOLVO LEONARDO, os vulgo réus RODRIGO “Tumba”, e ALCANTARA GUILHERME DE WITIUK FERREIRA DE CARVALHO, vulgo “Chuck”, das imputações referentes aos artigos 251 e 129, caput, por 12 vezes, ambos do Código Penal, por falta de provas suficientes para a condenação, com apoio no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal. Taxa judiciária pelos réus condenados, nos termos da legislação estadual vigente, ressalvada eventual gratuidade. Transitada em julgado, lancemse os nomes no rol dos culpados. Ate o presente momento, não existe razão concreta para restabelecimento da prisão processual revogada. Faculto o recurso em liberdade. P.R.I.C. São Paulo, 17 de setembro de 2010. LUIZ RAPHAEL NARDY LENCIONI VALDEZ Juiz de Direito