Março | 2013
Mercado de trabalho e crescimento econômico no Brasil
O PIB brasileiro registrou crescimento de 0,9% em 2012 ante 2,7% no ano anterior. Nos últimos dez anos, este resultado superou apenas a queda de 0,3%
de 2009, ano em que a economia enfrentou os efeitos da crise financeira internacional de 2008. A desaceleração do crescimento se distribuiu entre os três setores
da economia. O setor agropecuário mostrou queda de 2,3% ante a expansão de 3,9% registrada no ano anterior, a indústria recuou 0,8% ante o crescimento de
1,6% e o setor de serviços, desaceleração do crescimento de 2,7% para 1,7%. Neste contexto, a força do mercado de trabalho se mostrou surpreendente. O menor
crescimento da economia ocorreu num contexto em que o nível de emprego cresceu 2,2%. Disto depreende-se que, desconsiderando-se alterações significativas
no processo produtivo, a produtividade do trabalho recuou 1,3% no ano.
A pesquisa domiciliar de emprego do IBGE mostra condições bastante apertadas no mercado de trabalho, com a taxa de desemprego em níveis
historicamente baixos. No trimestre encerrado em janeiro, a taxa de desemprego média, sazonalmente ajustada, atingiu 5,4% da força de trabalho contra 5,6% no
mesmo período do ano anterior. Nos últimos doze meses, a taxa tem oscilado entre 5,3%-5,7%, menores níveis da série iniciada em 2002. A ligeira queda da taxa
de desemprego no período foi resultante da combinação do forte ritmo de crescimento do nível de emprego, com expansão de 2,9% no trimestre encerrado em
janeiro, e da força de trabalho, com crescimento de 2,7%.
Neste período, o crescimento da força de trabalho foi bastante superior ao crescimento da população em idade ativa (1,0%), resultando na elevação da
taxa de participação, que representa o percentual das pessoas, dentre aquelas em idade ativa, que procuram emprego e/ou está empregada. Em termos
sazonalmente ajustados, esta taxa atingiu 57,9% no trimestre encerrado em janeiro ante 57,0% no mesmo período do ano anterior. Fosse mantida a média
histórica da taxa de participação, a taxa de desemprego teria recuado para cerca de 4,0%, o que reforça a noção de condições muito apertadas no mercado de
trabalho.
Como reflexo deste quadro de aperto no mercado de trabalho, os rendimentos nominais têm mostrado forte expansão. Os salários registraram alta de
9,9% no trimestre encerrado em janeiro deste ano ante o mesmo período do ano anterior. Este percentual não apenas é elevado como mostrou aceleração em
relação ao crescimento anual de 8,2% registrado em janeiro do ano anterior. Apesar de mostrarem desaceleração em relação à alta de 10,6%, observada no último
trimestre do ano passado, as variações salariais encontram-se em níveis incompatíveis com os ganhos de produtividade.
No setor industrial, o custo unitário do trabalho, ou seja, o custo da quantidade de trabalho necessária para produzir uma unidade de produto, cresceu
13,2% em 2012, resultante da expansão de 11,8% do custo da hora trabalhada e da queda de 1,2% da produtividade. Este quadro aponta para significativas
pressões inflacionárias provenientes do mercado de trabalho.
O forte desempenho do mercado de trabalho, no contexto de desaceleração da atividade, pode estar associado à defasagem com que o emprego se
ajusta às flutuações do ciclo econômico. A pesquisa Focus coletada pelo Banco Central mostra que as expectativas para o crescimento do PIB num horizonte de
quatro trimestres à frente têm sido frustradas desde a divulgação do resultado do terceiro trimestre de 2011. Na maior parte desse período, os resultados
observados se situaram em torno do limite inferior das expectativas.
Por outro lado, há alguns indícios de que as empresas estejam protelando suas decisões de demitir e optando por reter seus empregados. Este fator pode
explicar uma parcela do descolamento entre a evolução do crescimento do produto e do emprego. Ademais, a elevação da participação de trabalhadores
parcialmente ociosos parece condizente com o caráter pró-cíclico da produtividade da mão de obra. A decisão de reter trabalhadores reflete o elevado custo
associado à admissão, demissão e treinamento, num contexto em que a desaceleração da atividade seja percebida como transitória e tende a ser diretamente
proporcional à perspectiva de retomada da expansão da atividade econômica.
Os registros de empregos formais do Ministério do Trabalho (Caged) parecem reforçar esta hipótese, ao mostrar um quadro de menor dinamismo nas
demissões e fragilidade nas contratações. Enquanto o nível de demissões teve seu ritmo de expansão anual reduzido de 7,2% no trimestre encerrado em janeiro de
2012 para 3,8% em janeiro deste ano, o das admissões passou de crescimento de 4,7% para queda de 1,0%. Reforçando este quadro, a razão entre os salários das
novas contratações e das demissões tem se reduzido, refletindo o menor ritmo de expansão dos salários iniciais.
Março | 2013
Adicionalmente, a pesquisa domiciliar do IBGE mostra que as empresas têm utilizado seus trabalhadores de forma menos intensa, ao capturar redução na
jornada de trabalho. No trimestre encerrado em janeiro, a média das horas habitualmente trabalhadas por semana, sazonalmente ajustada, atingiu o menor nível
da série e cerca de 1,0% abaixo do mesmo período no ano anterior.
Um aspecto favorável da hipótese de retenção é que o grau de aperto no mercado de trabalho pode ser menor do que o apontado pela taxa de desemprego
e, portanto, se mostrar como um atenuante sobre as pressões inflacionárias ao reduzir o poder de barganha dos trabalhadores. Além disso, caso se confirme a
expectativa de aceleração do crescimento da demanda, as empresas poderiam elevar a jornada de trabalho e expandir seu nível de produção sem elevar o nível de
emprego.
Cabe destacar, entretanto, que no estágio do desenvolvimento demográfico em que nos encontramos, a contribuição da força de trabalho para o
crescimento da economia tem se reduzido, pois o diferencial entre o crescimento da população em idade ativa e da população total tem se estreitado e, com isso,
limitado a expansão do total de horas disponíveis adicionais na economia. Portanto, a contribuição do fator trabalho para o crescimento nos próximos anos tende a
ser menor do que o registrado na média dos últimos anos.
Por fim, a economia brasileira registrou crescimento médio de 1,8% da taxa de produtividade entre 2004 e 2011. Mesmo considerando-se o caráter prócíclico da produtividade e os indícios que esteja ocorrendo alguma retenção de empregados por parte das empresas, parece haver pouco espaço para que a
economia cresça acima de 3,0% sem que haja quedas adicionais da taxa de desemprego, o que acentuaria as condições já apertadas no mercado de trabalho, com
ganhos salariais acima da produtividade e manutenção da elevação do custo unitário do trabalho.
Em resumo, o descolamento entre a expansão da atividade e do emprego parece refletir a combinação entre a defasagem do mercado de trabalho ao ciclo
econômico e, mais recentemente, da resistência das empresas em demitir. Este último fator pode atenuar as pressões inflacionárias advindas do reduzido grau de
ociosidade da mão de obra. Entretanto, a redução da contribuição do emprego para o potencial de crescimento da economia implica que a expansão da atividade
dependerá crescentemente dos ganhos de produtividade.
Eduardo Marques
Economista do Opportunity e Mestre em Finanças e Economia Empresarial pela EPGE-FGV.
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