Efeito da adição de solutos e ácidos em
poupa de goiaba1
Renata TORREZAN2,*, José Gilberto JARDINE3, Alfredo de
A. VITALI4
RESUMO
Neste trabalho foram comparados os efeitos da adição
dos solutos sacarose, glicose, glicerol e açúcar invertido
com relação à capacidade de reduzir a atividade de água
(Aa) da polpa de goiaba 15ºBrix e dos ácidos fosfórico,
cítrico e láctico (percentuais de 0 a 10% em relação à
polpa) com relação à capacidade de reduzir o pH e
aumentar a acidez desta polpa. Foram comparados os
valores de Aa experimentais, teóricos e calculados da
polpa de goiaba em função da adição dos solutos. Para o
cálculo da Aa teórica utilizou-se o modelo de Norrish e
para a determinação da Aa calculada utilizou-se a
equação de Ross, conhecendo-se experimentalmente a
Aa da polpa original. A acidez total foi determinada
pelo método acidimétrico e o pH pelo método
potenciométrico. Foram levantadas as curvas de acidez.
Observou-se que o glicerol é o maior depressor de Aa
do produto, seguido pela glicose, sacarose e açúcar
invertido. Para as concentrações de até 1%, os ácidos
testados apresentaram comportamento semelhante em
relação à redução de pH e aumento da acidez.
Palavras-chave: polpa de goiaba, atividade de água,
acidez total, pH.
SUMMARY
EFFECTS OF SOLUTES AND ACID ADDITION TO
GUAVA PULP. The capacities of added sucrose,
glucose, invert sugar and glycerol to decrease water
activity (aw) of guava pulp (15° Brix) were compared.
Added fosforic, citric and lactic acids were also
assessed for their effects in pH reduction as well as in
increasing titritable acidity in pulp. Theoretical,
experimental and calculated aw values were compared
as a function of solute addition. Norrish model was used
to determine theoretical aw values and Ross equation to
generate calculated aw values using experimental ones.
Acidity and pH curves were determined according to
titrimetric and potentiometric assays, respectively.
Glycerol exhibited the strongest capacity regarding aw
reduction, followed by glucose, sucrose and invert
sugar. In concentrations up to 1% w/w, all tested acids
showed similar effects in decreasing pH and increasing
titritable acidity of guava pulp.
Keywords: guava pulp; water activity; titritable acidity,
pH.
1 – INTRODUÇÃO
O Brasil situa-se entre os principais produtores mundiais de goiaba,
sendo que a maior parte da produção destina-se à industrialização,
geralmente na forma de polpa ou purê e doces [5]. No processo de
fabricação de polpas é permitida a adição de sacarose e ácido cítrico
[1].
Dos acidulantes os ácidos cítrico, fosfórico e láctico são os mais
utilizados em alimentos. O primeiro, devido à alta solubilidade e ao
efeito tamponante, favorece a estabilidade dos produtos finais, sendo
assim, bastante utilizado em geléias, doces em massa e frutas em calda.
O pH e a atividade de água (Aa) são fatores importantes que
determinam o crescimento e a sobrevivência dos microrganismos
durante o processamento, estocagem e distribuição de alimentos.
A Aa quantifica o grau de ligação da água contida no alimento e
conseqüentemente sua disponibilidade para agir como solvente e
participar das transformações químicas, bioquímicas e microbiológicas
[7].
O primeiro passo para predizer a Aa de um alimento fresco ou
processado consiste em conhecer quais são os seus principais
constituintes e suas proporções relativas com respeito à água contida
nestes alimentos [2].
Vários trabalhos têm sido desenvolvidos no sentido de estimar a Aa de
soluções simples ou mistura de multicomponentes por modelos
matemáticos teóricos ou semi-empíricos. Os modelos propostos por
NORRISH [8] e ROSS [9] descrevem as soluções binárias de nãoeletrólitos e a de multicomponentes.
A possibilidade de ajustar a Aa dentro das faixas desejadas muitas
vezes é limitada pela necessidade de se utilizar altas quantidades de
solutos que podem conferir sabores indesejáveis ao produto (amargor,
doçura, etc.) ou podem afetar adversamente suas propriedades físicas.
A utilização de depressores de Aa constitui o princípio básico dos
alimentos que utilizam a Aa como obstáculo principal ou como um dos
obstáculos para a sua preservação. Três classes gerais de compostos
químicos têm sido comumente utilizados como depressores de Aa na
produção de alimentos: polióis (propileno glicol, glicerol, sorbitol),
açúcares (sacarose, glicose e frutose) e os sais minerais (cloreto de
sódio, cloreto de potássio e lactato de sódio).
O objetivo deste trabalho foi comparar os efeitos da adição dos ácidos
mais utilizados e permitidos para a indústria de doces de goiaba e de
sacarose, glicose, glicerol e açúcar invertido, com relação,
respectivamente, a capacidade de reduzir o pH e aumentar a acidez e
de reduzir a Aa desta polpa.
2 – MATERIAL E MÉTODOS
2.1 – Material
Utilizou-se polpa de goiaba, variedade IAC-4 e 15° Brix, obtida pelo
processo de enchimento a quente. Os produtos utilizados foram os
solutos sacarose comercial, açúcar invertido comercial, glicose P.A. e
glicerol P.A. e os ácidos cítrico monohidratado, láctico (85%) e
ortofosfórico (85%), todos P.A. Os ácidos foram adicionados na
proporção de 0 a 10% em relação à polpa.
2.2 – Metodologia experimental
Os solutos foram adicionados em quantidade suficiente para reduzir a
Aa até cerca de 0,9.
Os ingredientes testados e as quantidades de polpa correspondentes
foram devidamente pesados em balança semi-analítica e
homogeneizados através de batedeira Walita, por cerca de 2 minutos,
em velocidade média.
A acidez total titulável foi determinada pelo método acidimétrico da
A.O.A.C. [3], utilizando-se NaOH 0,2N.
A curva de acidez foi levantada para se determinar a quantidade exata
de ácido que deve ser adicionada ao produto para o mesmo atingir a
acidez ou o pH desejado.
O pH foi determinado pelo método potenciométrico [4].
No cálculo das Aa teóricas das soluções de sacarose, glicose e glicerol
(não-eletrólitos) utilizou-se o Modelo de Norrish. No caso específico
do açúcar invertido, o cálculo de Aa teórica foi feito com base na
composição do açúcar invertido fornecida pelo fabricante, ou seja,
30% de glicose, 30% de frutose, 40% de sacarose e 76,8° Brix,
utilizando-se o Modelo de Ross. A Aa calculada foi obtida pela
aplicação do Modelo de Ross, utilizando-se os valores da Aa teórica e
da Aa experimental da polpa original.
A medida experimental da Aa das amostras foi feita no higrômetro
AQUA-LAB, digital, modelo CX-2, fabricado pela Decagon Devices
Inc., EUA. Foram retiradas 3 amostras de cada produto, sendo feitas 3
leituras de cada amostra em seqüências alternadas. A temperatura para
leitura da Aa foi controlada a 25,0 ± 0,3° C.
O Aqua-lab foi periodicamente limpo sendo aferida a sua precisão.
Construíram-se as curvas de calibração à mesma temperatura utilizada
nas leituras das amostras, com soluções salinas saturadas, padrões de
referência [6]. Essas leituras foram feitas em quadruplicatas de seis
soluções salinas saturadas diferentes (NaCl, (NH4)2SO4, KCl, BaCl2,
KNO3 e K2SO4) na faixa de Aa de 0,75-1,00, utilizada neste trabalho.
Foi feita uma análise de regressão linear e traçadas as respectivas
curvas de calibração.
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nas concentrações muito baixas (até cerca de 0,5%) os ácidos testados
apresentaram comportamento semelhante na redução do pH (Figura
1), para as demais o ácido fosfórico abaixou mais o pH seguido pelos
ácidos cítrico e láctico, nas mesmas concentrações.
FIGURA 1. Efeito da adição de ácidos no pH da polpa de goiaba.
O ácido fosfórico aumentou mais a acidez da polpa de goiaba seguido
pelo ácido cítrico e láctico (Figura 2). Em baixas concentrações (até
cerca de 1%) os ácidos testados apresentaram comportamentos
semelhantes.
FIGURA 2. Efeito da adição de ácidos na acidez da polpa de goiaba.
Os valores de Aa calculados e experimentais mostraram-se bastante
próximos para os solutos testados. Para a sacarose e glicose houve uma
diferença maior entre esses valores nas concentrações acima de 30%,
para o glicerol acima de 20% e para o açúcar invertido apenas para os
valores acima de 45%. Assim seria possível predizer os valores de Aa
após a adição destes solutos nos casos em que a polpa de goiaba
apresentasse Aa inicial diferente (Figuras 3, 4, 5 e 6).
FIGURA 3. Efeito da adição de sacarose na Aa teórica, experimental e calculada
da polpa de goiaba.
FIGURA 4. Efeito da adição de glicose na Aa teórica, experimental e calculada
da polpa de goiaba.
FIGURA 5. Efeito da adição de glicerol na Aa teórica, experimental e
calculada da polpa de goiaba.
FIGURA 6. Efeito da adição de açúcar invertido na Aa teórica, experimental e
calculada da polpa de goiaba.
Em geral, os valores de Aa experimentais apresentaram-se
ligeiramente menores do que os calculados ou bastante próximos,
indicando que em termos práticos pode-se alcançar valores de Aa ainda
menores que os preditos pelas equações, conferindo, assim, uma
melhor estabilidade microbiológica ao produto.
A Figura 7 retrata uma comparação da capacidade de redução de Aa
provocada pela adição de solutos na polpa de goiaba. Observa-se que o
glicerol é o maior depressor de Aa do produto, seguido pela glicose,
sacarose e açúcar invertido. Esse fato está relacionado com a massa
molar desses solutos. Até cerca de 20% de concentração, o açúcar
invertido reduz ligeiramente mais a Aa do que a sacarose, porém,
acima desta concentração, a sacarose apresenta maior eficiência na
redução de Aa. Apesar do açúcar invertido ser uma mistura de glicose
e frutose de menor massa molar que a sacarose, o açúcar invertido
também apresenta na sua composição sacarose e água que contribuem
para a menor eficiência deste soluto na redução de Aa nas mesmas
concentrações.
FIGURA 7. Efeito da adição de solutos na Aa da polpa de goiaba.
4 – CONCLUSÕES
Os ácidos testados apresentaram comportamento semelhante na
redução do pH e aumento da acidez para os níveis de concentrações
mais baixas (até 1%). Para as demais concentrações (acima de 1%) o
ácido fosfórico abaixou mais o pH e aumentou mais a acidez seguido
pelo cítrico e láctico, nas mesmas concentrações.
Para todos os solutos testados, a comparação das curvas experimentais,
teóricas e calculadas, revela que há uma concordância razoável entre
valores experimentais e preditos por equações. O glicerol mostrou
maior capacidade de reduzir a Aa da polpa de goiaba, seguido pela
glicose, sacarose e açúcar invertido.
5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS DA
ALIMENTAÇÃO. Compêndio da legislação brasileira de
alimentos. São Paulo, 1992.
[2] CHIRIFE J. Prediccion de la actividad de agua en alimentos. In:
JARDIM, D. C. P. (coord). I Seminário sobre atividade de água em
alimentos. Campinas, Instituto de Tecnologia de Alimentos. 1987. p. 1-
40.
[3] HELRICH, K. (ed).Official methods of analysis of the
Association of Official Analytical Chemists.15 th ed., Arlington,
A.O.A.C., 1990. 1298 p.
[4] INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Normas analíticas do Instituto
Adolfo Lutz. Métodos químicos e físicos para análise de alimentos.
3aed., v. 1. São Paulo, 1985. 533 p.
[5] JAGLIANI, J. ; CHAN Jr., H. T. ; SAKA, W. S. Tropical Fruit
Processing.Londres, Academic Press Inc. Ltd., 1988. p. 9-43.
[6] KITIC, D. ; JARDIM, D. C. P. ; FAVETTO, G. J. ; RESNIK, S. L.
; CHIRIFE, J. Theoretical prediction of water activity of standard
satureted salt solutions at various temperatures. Journal of Food
Science, Chicago, v. 51, n. 4, p. 1037-1041, 1986.
[7] LABUZA, T. P. The properties of water in relationship to water
binging in food: a review. Journal of Food Processing and
Preservation, Westport, v. 1, n. 2, p. 167-1, 190, 1977.
[8] NORRISH, R. S. An equation for the activity coefficients and
equilibrium relative humidities of water in confectionery syrups.
Journal of Food Technology, Oxford, v. 1, n. 1, p. 25-39, 1966.
[9] ROSS, K. D. Estimation of water activity in intermediate moisture
foods. Food Technology, Chicago, v. 29, n. 3, p. 26-34, 1975.
1
Recebido para publicação em 26/06/98. Aceito para publicação em
18/01/99.
2 EMBRAPA-CTAA- Av. das Américas, 29.501 - Guaratiba - CEP
23020-470 - Rio de Janeiro - RJ.
3 EMBRAPA-CNPTIA. Caixa Postal 6041. CEP 13083-970 Campinas - SP.
4 ITAL . Caixa Postal 139. CEP 13073-001 - Campinas - SP.
* A quem a correspondência deve ser enviada.
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