2ª. TURMA
AGRAVO DE PETIÇÃO Nº 0000268-33.2011.5.05.0122AP
AGRAVANTE: Sindiquimica - Sindicato dos Trabalhadores do Ramo
Químico/Petroleiro do Estado da Bahia
AGRAVADO: Graftech Brasil Participações Ltda.
RELATOR: Desembargador CLÁUDIO BRANDÃO
DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO TRANSITADA EM
JULGADO. APLICAÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA.
IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE EFEITOS
ETERNOS. RESTRIÇÃO AO DIREITO DE GREVE. Não
se pode atribuir efeitos eternos à decisão transitada em
julgado, proferida em interdito possessório, a fim de se
coibir qualquer mobilização da entidade sindical na defesa
dos interesses da categoria, sob constante ameaça de
execução de multa cominatória, sobretudo quando os
fatos ensejadores são distintos daqueles originariamentes
apontados na peça incoativa e ocorreram após o
transcurso de mais de um ano.
SINDIQUÍMICA – SINDICATO DOS TRABALHADORES
DO RAMO QUÍMICO E PETROLEIRO DO ESTADO DA BAHIA, nos autos do
interdito proibitório manejado por GRAFTEC BRASIL PARTICIPAÇÕES
LTDA, inconformada com a decisão proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara do
Trabalho de Candeias, interpôs AGRAVO DE PETIÇÃO.
Apelo tempestivo.
Contraminuta regularmente apresentada.
Foi dispensada a manifestação do Ministério Público do
Trabalho.
É o relatório.
VOTO
Desembargador Relator: CLÁUDIO MASCARENHAS BRANDÃO. Firmado por assinatura digital em
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Trata-se de execução de multa por descumprimento de
obrigação de fazer, cominada nos autos do interdito proibitório proposto pela
empresa, em face da mobilização realizada pelo Sindicato da categoria
profissional respectiva, a fim de negociar a denominada “cláusula quarta” de
instrumentos coletivos. Para melhor compreensão da manifestação recursal,
impõe-se fazer uma pequena narrativa do processo.
A Graftec Brasil ajuizou Interdito Proibitório em face do
Sindicato Profissional a fim de coibir a prática de quaisquer ações que
dificultassem ou impedissem o exercício regular da posse de que é titular, em
face do movimento de protesto realizado nos portões de acesso à fábrica,
capitaneado pela entidade de classe, com objetivo de negociar a aplicação da
chamada “cláusula quarta” do instrumento normativo coletivo.
A sentença (fl. 158/161) julgou procedente o pedido, por
força da aplicação da pena de confissão decorrente de revelia, e determinou a
abstenção de realização de
quaisquer atos que pudessem resultar em turbação,
entendendo-se como tal qualquer espécie de turbação, ou
esbulho na posse da parte autora em sua unidade industrial de
Candeias, abstendo-se de realizar qualquer espécie de
restrição de acesso que liga o portão da fábrica em questão até
a rodovia Candeias a BR 324.
E fixou penalidade para hipótese de descumprimento:
Para eventual hipótese de descumprimento da presente ordem,
fixo a multa equivalente a R$ 50.000,00 por dia em que a parte
demandada viole tal restrição.
Houve o trânsito em julgado da decisão, com regular
quitação das custas e honorários advocatícios em maio de 2011, e
consequente arquivamento do feito.
Passados aproximadamente seis meses, a acionante
solicitou o desarquivamento dos autos e requereu a aplicação e execução da
multa mencionada por descumprimento do comando sentencial, haja vista a
realização de nova mobilização do Sindicato, nos dias 21 e 22 de novembro de
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2011, em frente aos portões da fábrica, com restrição de acesso e violação do
seu patrimônio, segundo sustentou.
Em cumprimento ao Mandado de Vistoria, em 28 de
novembro de 2011, o Sr. Oficial de Justiça certificou a presença de cerca de
vinte pessoas em frente à empresa, com carro de som e faixa do “Sindicato
dos Aposentados da Graftec”, além da presença de policiais que confirmaram
o caráter pacífico do movimento (fl. 244).
O Sindicato apresentou impugnação (fls. 249/260), sobre a
qual se manifestou a ré, ocasionando a conclusão dos autos. Em 18 de abril
de 2012, a Graftec ingressou com nova petição (fl. 282), agora denunciando a
invasão da planta industrial, por cerca de 150 filiados ao sindicato, com
participação direta de membros da Diretoria - o que revelaria reiteração do
descumprimento da sentença transitada em julgado – e requereu a
desocupação da fábrica, com aplicação de penalidade. Colacionou fotografias,
DVD e informe publicitário do Sindicato convocando seus membros para
mobilização.
A decisão vergastada reconheceu o descumprimento da
decisão judicial, proferida havia quase um ano, determinou a expedição de
mandado de reintegração de posse e impôs a aplicação de multa equivalente a
três dias de descumprimento da ordem.
Contudo, no caso concreto, há matéria prejudicial que não
pode deixar de ser tratada, em estrita coerência com o quanto tenho decidido.
Reconheço a competência funcional da Seção Especializada em Dissídios
Coletivos para apreciar o feito, já que a causa de pedir remota está
relacionada aos limites do exercício do direito de greve, conforme julgado de
minha lavra, abaixo mencionado:
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COMPETÊNCIA FUNCIONAL. INTERDITO PROIBITÓRIO.
EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE. Não há dúvidas a respeito
da competência material outorgada a esta Justiça para julgamento
das ações voltadas ao exercício do direito de greve (art. 114, II), o
que inclui todas aquelas diretamente relacionadas à paralisação
em si e outras que envolvam o exercício de direitos de que sejam
titulares terceiros por ela atingidos. Contudo, no caso de interdito
proibitório, a competência funcional não pertence ao magistrado
de primeiro grau e sim aos tribunais. Processo 000020815.2010.5.05.0019 RecOrd, ac. nº 064374/2011, Relator
Desembargador CLÁUDIO BRANDÃO, 2ª. TURMA, DJ
16/06/2011.
Contudo, verifico que o Tribunal Superior do Trabalho tem
posicionamento contrário sobre o tema, conforme revela decisão da lavra do
Ministro Walmir Oliveira da Costa, nos autos do Interdito Proibitório autuado
como petição nº Pet-5473-59.2011.5.00.0000, julgado em 12/09/2011:
INTERDITO PROIBITÓRIO COM PEDIDO DE LIMINAR DE
MANUTENÇÃO DE POSSE. COMPETÊNCIA FUNCIONAL DAS
VARAS DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL LIGADA À DEFESA DA
POSSE.
1. Nos termos do art. 114, II, da Constituição Federal e da Súmula
Vinculante nº 23 do STF, inscreve-se na competência originária
das Varas do Trabalho julgar interdito proibitório cuja causa de
pedir decorra de movimento grevista, ou seja, com o fim de
garantir o livre acesso de funcionários e clientes a agências
bancárias durante período de greve, na medida em que se trata
de ação civil de natureza possessória, e não de dissídio coletivo
de natureza econômica ou de greve, em que a Justiça do
Trabalho exerce o Poder Normativo.
2. O acórdão regional divergiu dessa orientação ao declinar de
sua competência recursal e determinar a remessa dos autos à
Seção de Dissídios Coletivos do TST, órgão jurisdicional ao qual
não foi outorgada constitucionalmente a competência originária
para julgar ação possessória.
Determinação de retorno dos autos ao TRT da 10ª Região
para prosseguir no julgamento do recurso ordinário
interposto pela entidade sindical.
Diante de tal circunstância, com reservas do meu
entendimento pessoal, ultrapasso o óbice e avanço na apreciação do feito.
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Não tenho dúvidas da necessidade de reforma da
sentença proferida na fase de execução.
Primeiro, impõe-se lembrar que interdito proibitório é
cabível quando o possuidor demonstra justo receio, direto ou indireto, de ser
molestado na posse, revelado por um ato ou atos praticados pelo réu, nos
termos do art. 932 do CPC supletivo. Objetiva-se preservar a posse e os
atributos a ela inerentes.
No caso concreto, buscava-se originariamente garantir o
direito de acesso dos empregados à fábrica, bem como dos fornecedores, ou
seja, preservar sua liberdade de ir e vir, conforme se observa de diversos
trechos de sua narrativa:
A ação do Réu no dia 1º de março de 2011 impossibilita o
acesso à fábrica da Autora pelos seus empegados e diretores.
Igualmente ficou impedido o trânsito de mercadorias pelos
portões da Autora, por conta do bloqueio de carretas que
deveriam entregar insumos e expedir produtos da Autora. - (fl.
4);
[...]
Facilmente demonstrada também, é a ocorrência da turbação,
eis que as manifestações impediram a livre entrada e saída de
bens e pessoas relativamente às dependências do
estabelecimento da Autora, sem a supressão completa da posse
desta. - (fl. 5);
[...]
Com efeito, manifestações desta natureza não possuem caráter
prolongado, mas sim em um estado permanente de ameaça de
ocorrência de uma nova turbação.
A turbação efetiva vem ocorrendo nesta data de 15 de fevereiro
de 2011, impedindo os funcionários (sic), diretores e prestadores
de serviço da Autora de acessar à fábrica da mesma para
trabalhar.
Há, além disso, um justo receio de realização de nova turbação
por parte da conduta ilícita do Réu, nos dias subsequentes,
razão pela qual se requer a medida protetiva adequada a evitar
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novas lesões ao livre exercício da posse da Autora e impedirem
os seus colaboradores de trabalhar. - (fl. 6)
A restrição de acesso não caracteriza turbação ou esbulho
possessório. Em verdade, o remédio jurídico, no particular, seria o Habeas
Corpus, capaz de garantir a liberdade de locomoção, até mesmo porque o
movimento não ocorria nas dependências da empresa, mas na parte externa,
em frente aos seus portões, segundo sua própria narrativa.
Em segundo plano, ultrapassado tal óbice, o último trecho
da petição inicial invocado revela, com clareza, que “manifestações desta
natureza não possuem caráter prolongado” e requer a tutela jurisdicional
contra prática da conduta do réu, que poderá se prolongar “nos dias
subsequentes”.
Nessa senda, não há como se desprezar o lapso temporal
entre a data indicada na causa de pedir da peça incoativa (15 de fevereiro de
2011) e aqueloutra apontada para aplicação de multa por descumprimento da
decisão (18 de abril de 2012). A própria autora reconhece a impossibilidade de
a manifestação ter um caráter prolongado, embora pretenda a cominação de
penalidade
por
fato
ocorrido
um
ano
depois
daquele
denunciado
originariamente. Frise-se, mais de um ano!
Isso sem mencionar a modificação completa da causa
de pedir, revelada nos fatos denunciados. Inicialmente, havia obstrução das
vias de acesso; agora a denúncia é de INVASÃO DA FÁBRICA (fl. 282) e se
requer a sua desocupação!
A causa de pedir primitiva e o fato apontado para aplicação
da penalidade não podem ser vinculados, por possuírem eventual causa de
pedir remota – negociação da “cláusula quarta”, até porque não houve maiores
investigações ou prova sobre a matéria.
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Além disso, após a prolação da sentença transitada em
julgado, ficou confirmado pelo próprio réu e não controvertido pelo autor, que o
movimento havia sido desfeito, o que revela a extinção da execução, pelo
adimplemento total da obrigação, qual seja, desobstrução do acesso e quitação
da condenação atinente a custas e honorários advocatícios.
Por fim, a extensão que se pretende conferir à sentença
viola o direito fundamental, com exercício pelo sindicato, de greve, insculpido
no art. 9º da Constituição Federal e na Lei nº 7.783/89. A decisão não pode ter
efeitos eternos, conforme bem destacado pelo Desembargador Edilton
Meireles, em decisão incidental de Mandado de Segurança, extinto por
questões processuais (fl. 385):
Para assim concluir, por óbvio, levamos em conta que a decisão
proferida no interdito possessório deve, em sua execução, ter
vinculação direta com os atos que se buscou impedir de modo a
não se ter uma ordem judicial eterna.
Ora, a se pensar que a decisão proferida em interdito
possessório, resguardando a posse da Agravante, tem o condão
de impedir qualquer movimento sindical em sentido contrário de
modo definitivo para o futuro, estaríamos diante de um cheque
em branco nas mãos da empresa. Isso porque, a qualquer
momento, ela pode alegar que os novos atos sindicais são
desdobramentos daqueles ocorridos em fevereiro e março de
2011 para, a qualquer momento, impor ao Agravado a multa
cominatória.
Por todas as razões elencadas, reconheço a extinção da
execução, por adimplemento da condenação.
Considerando,
ainda,
que
há
relevante
numerário
bloqueado na conta-corrente da entidade sindical, o que, se não impede, no
mínimo, dificulta, e muito, o exercício das suas atividades, ao lado da flagrante
ilegalidade na aplicação da multa cominatória, determino que a imediata
liberação dos valores constritos.
Desembargador Relator: CLÁUDIO MASCARENHAS BRANDÃO. Firmado por assinatura digital em
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DOU PROVIMENTO AO AGRAVO PARA LIBERAR, DE
IMEDIATO,
INDEPENDENTE
DECISÃO,
OS VALORES BLOQUEADOS NA CONTA-CORRENTE DO
SINDICATO,
E
DECLARAR
DO
A
TRÂNSITO
EXTINÇÃO
EM
DA
JULGADO
EXECUÇÃO
DESTA
PELO
ADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO.
Isto posto, acordam os Excelentíssimos Desembargadores
da Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Quinta Região, POR
UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO PARA LIBERAR, DE
IMEDIATO,
INDEPENDENTE
DO
TRÂNSITO
EM
JULGADO
DESTA
DECISÃO, OS VALORES BLOQUEADOS NA CONTA-CORRENTE DO
SINDICATO,
E
DECLARAR
A
EXTINÇÃO
DA
EXECUÇÃO
PELO
ADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO.//
Salvador, 28 de junho de 2013 (sexta-feira).
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Decisão do TRT da Bahia