HOSPITAL UNIVERSITÁRIO SÃO JOSÉ CLÍNICA DE ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA Diabetes Insípido Luíza Paulino Guerra Acadêmica 4º ano Medicina FCMMG e Estagiária CEM-HUSJ Belo Horizonte Introdução • Conceito: excreção de volume excessivo de urina diluída. • Volume urinário: > 45-50 mL/kg/24 h • Uosm: < 300 mOsm/kg • Dois mecanismos principais: - deficiência na síntese da AVP (ADH): DI neurogênico, central, hipotalâmico, neurohipofisário, craniano ou responsivo à vasopressina - diminuição da sensibilidade renal ao ADH: DI nefrogênico ou não responsivo à vasopressina Introdução • • • • • DI gestacional (vasopressinase – placenta) Polidipsia primária DI parcial X DI completa DI neurogênico ou central: 80% a 85% dos casos Tabela 1- Etiologias Tabela 1 Fonte: VILAR, L. Manuseio do Diabetes Insípido. In_: Endocrinologia Clínica. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. Cap 11, p.118-135. ADH: Considerações • Estrutura: nonapeptídeo, peso molecular de 1228 kDa Fonte: VILAR, L, et al. Distúrbios na secreção e ação do hormônio antidiurético. In_: Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia, vol.47, no.4, São Paulo, Ago 2003. ADH: Considerações • Síntese: - neurônios magnocelulares dos núcleos supraópticos e dos núcleos paraventriculares do hipotálamo - ADH e neurofisina II derivados de um precursor comum ADH: Considerações Fonte: VILAR, L, et al. Distúrbios na secreção e ação do hormônio antidiurético. In_: Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia, vol.47, no.4, São Paulo, Ago 2003. ADH: Considerações • Controle da secreção: - Poms: 285 a 295 mOsm/kg - Equilíbrio entre a entrada e a excreção renal de água - Osmorreceptores: hipotâlamo anterior, variações de 2% na Posm - Estímulos não-osmóticos: baroregulação, reflexo nasofaringeano, estímulo nauseoso, mediadores químicos e outros fatores ambientais. ADH: Considerações Fonte: VILAR, L, et al. Distúrbios na secreção e ação do hormônio antidiurético. In_: Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia, vol.47, no.4, São Paulo, Ago 2003. ADH: Considerações • Mecanismo de ação: - 3 receptores: V1, V2 e V3 - V1: contração músculo liso vascular, síntese de PG e glicogenólise hepática (insensível ao DDAVP) - V2: ações renais do ADH (proteína G – cAMP) - V3: liberação do ACTH - Efeito renal: aumento da permeabilidade à água na membrana luminal do epitélio dos ductos coletores (aquaporinas – transporte transcelular de água) ADH: Considerações Fonte: CHIDDE, L; SCHOR, N. Revisão: transportadores de áqua. In_: Revista da Associação Médica Brasileira, vol 45, nº 1, São Paulo, Jan/Mar, 1999. Diabetes Insípido Central • CAUSAS GENÉTICAS - DIFC: degeneração específica dos neurônios magnocelulares vasopressinérgicos nos NSO e NPV. - Condição mais freqüente: transmissão autossômica dominante, M=H, deficiência progressiva na secreção de ADH. Mutações heterozigóticas de gene da pré-pró-vasopressinaneurofisina II (não afeta seqüência codificadora do ADH). Manifestações entre 1 e 6 anos. - Forma mais rara: transmissão autossômica recessiva, mutação homozigótica no gene da AVPNP-II (prolina – leucina), ADH mutante. Diabetes Insípido Central • CAUSAS GENÉTICAS - Forma recessiva ligada ao X: indivíduos do sexo masculino, perda progressiva da capacidade secretória de ADH. - Síndrome de Wolfram (DIDMOAD) Distúrbio autossômico recessivo, mutações no gene Wolfram (WFS-1). 1ª década:DM e atrofia óptica, 2ª década: DI neurogênico e surdez neurossensorial, 3ª década: dilatação TU, 4ª década: anormalidades neurológicas e psiquiátricas. Diabetes Insípido Central • CAUSAS GENÉTICAS - Síndrome de Wolfram (DIDMOAD) Atrofia gonadal primária e redução da fertilidade. Morte: 30 anos (insuficiência respiratória ou renal). • CAUSAS CONGÊNITAS - Diversas doenças congênitas: displasia septoóptica, síndromes holoprosencefálicas, agenesia ou hipogenesia da hipófise, associação com lábio leporino, palato em ogiva e outros defeitos craniofaciais na linha média. Diabetes Insípido Central • CAUSAS ADQUIRIDAS - Lesão na região hipotalâmico-hipofisária – destruição dos neurônios produtores de ADH ou transporte deficiente. - 75% a 85% de destruição ou lesão dos neurônios. - Necessário lesão alta do trato supra-ópticohipofisário. - Neoplasias: mais comum é o craniofaringioma. Diabetes Insípido Central • CAUSAS ADQUIRIDAS - Traumas: cirurgia transesfenoidal – DI transitória, craniotomia – DI permanente, TCE – DI central por contusão ou secção da haste hipofisária. - Doenças infecciosas: abscesso hipofisário (50%), meningite, encefalite, tuberculoma selar e supra-selar, infecção hipotalâmica por CMV e neurossífilis. - Doenças granulomatosas: sarcoidose, HCL (doença sistêmica que mais causa DI) e granulomatose de Wegener. Diabetes Insípido Central • OUTRAS CAUSAS - Hipofisite linfocítica (20%), hemorragia intraventricular, aneurismas, trombose, síndrome de Sheehan, púrpura trombocitopênica, xantoma disseminatum, doença de Erdheim-Chester, doença de Behçet, síndrome poliglandular auto-imune. • DI IDIOPÁTICO - 50% dos casos de DI neurogênico em adultos. Mais freqüente no sexo masculino (60%), média de início aos 20 anos. Diabetes Insípido Central • DI IDIOPÁTICO - Auto-imune? - Associação com suprimento sangüíneo anormal para hipófise posterior. - Diagnóstico de exclusão, estabelecido após seguimento prolongado. • DI NA INFÂNCIA - 50% - TU intracranianos. Outras etiologias: idiopáticos, malformações cerebrais, infecções do SNC e histiocitose. Diabetes Insípido Nefrogênico • FORMAS HEREDITÁRIAS - DIN congênito: raro distúrbio genético, insensibilidade parcial ou completa ao ADH. Níveis de ADH: normais ou elevados. >90%: mutação no gene do receptor V2 do ADH (ligado ao X, H>M). Outras: mutações no gene AQ2 e outros genes. Início da doença e sintomas similares. Diferenciação: respostas extra-renais ao DDAVP (mutações no gene AQ2), identificação molecular das mutações. Diabetes Insípido Nefrogênico • FORMAS ADQUIRIDAS - Várias causas: drogas, distúrbios metabólicos, nefropatias crônicas, uropatia obstrutiva, doenças sistêmicas, etc. Doenças renais crônicas – perda de massa renal funcionante. Distúrbios metabólicos e drogas – diminuição da ativação da AC e da geração do cAMP. Hipocalemia, obstrução ureteral e lítio – redução da densidade do receptor V2 e da expressão da AQ2. Diabetes Insípido Nefrogênico • FORMAS ADQUIRIDAS Fonte: VILAR, L, et al. Distúrbios na secreção e ação do hormônio antidiurético. In_: Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia, vol.47, no.4, São Paulo, Ago 2003. Diabetes Insípido associado à gravidez • Rápida e excessiva degradação do ADH por uma vasopressinase produzida pela placenta. Não degrada a desmopressina. Algumas gestantes também têm deficiência na secreção do ADH. • 3º trimestre de gestação - poliúria e polidipsia. Reversão 3-6 semanas após o parto. Polidipsia Primária • Principal DD para DI central e nefrogênico. É a poliúria hipotônica secundária à ingestão excessiva de líquidos. • DIPSOGÊNICA Diminuição do limiar osmótico para a sede. 75% - idiopática. Outras: TC, drogas, vasculites, infecções. • PSICOGÊNICA Mais freqüente. Neuroses (“ingestão compulsiva de água”), distúrbios bipolares, esquizofrenia. Diagnóstico Quadro Clínico Fonte: http://www.equi-shop.cz/clanky/clanek.php?id=1813 Diagnóstico Quadro Clínico • Principais sintomas: - Poliúria Início abrupto na DI central. Nictúria. - Polidipsia - Anidrose (raro) • DI central: volume urinário de poucos litros a 18 litros/dia. Queixas após 4 litros/dia. DI parcial: diagnóstico na restrição hídrica. Diagnóstico Quadro Clínico • Predileção por bebidas geladas. • Acesso à água interrompido – hiperosmolalidade plasmática – manifestações neurológicas. • DI gestacional – oligoidrâmnio (reversível). • DI nefrogênico congênito – 1ªs manifestações durante a 1ª semana de vida. Irritação, choro constante, êmese após amamentação, constipação persistente, febre inexplicável e irregular, dificuldade em ganhar peso. Diagnóstico Quadro Clínico • DI nefrogênico congênito: episódios de desidratação hipertônica (convulsões e morte) – retardo mental. Baixa estatura. Dilatação ou obstrução do trato urinário baixo. IRC (final da 1ª década de vida). • DI central congênito: poliúria e polidipsia após 1º ano de vida (capacidade limitada de secretar ADH). Não apresentam retardo mental. Crianças maiores: enurese noturna, problemas escolares, cansaço e sonolência (nictúria), anorexia e redução no desenvolvimento somato-ponderal. Diagnóstico Quadro Clínico • DI pós neurocirurgia ou TCE: resposta trifásica - 1ª fase: ADH = poliúria e polidipsia (horas a 5-6 dias); - 2ª fase: progressiva do volume urinário (horas até 12 dias); - 3ª fase: DI central (10-14 dias após cirurgia) transitório ou permanente, total ou parcial. • DI não relacionado com neurocirurgia ou TCE: habitualmente irreversível. Diagnóstico Quadro Clínico • Insuficiência adrenal ou hipotireoidismo: redução do clearance de água livre – mascaramento da DI (poliúria após terapêutica). Diagnóstico Achados laboratoriais • Achados principais: - Hipostenúria persistente (densidade < 1.010) - U osm < 300 mOsm/kg • DI parcial: Uosm pode ser maior do que a Posm, pode se manifestar apenas através de urina diluída com Posm aumentada. • Posm: normal ou levemente elevada (sede e ingestão de água). Na+ sérico elevado. (PP ambos levemente diminuídos). • Radioimunoensaio: ADH plasmático. Diagnóstico Avaliação radiológica • RM: pesquisa de tumores ou outras patologias na região hipotalâmico-hipofisária. • 80% dos casos de DI central e maioria dos de DI nefrogênico: desaparecimento do ponto brilhante na hipófise posterior. • Espessamento da haste hipofisária (DI idiopático, HL, germinoma ou doenças granulomatosas). • Poliúria por longos períodos – dilatação ou saculação da bexiga, hidroureter e hidronefrose. Diagnóstico Avaliação radiológica Fonte: VILAR, L. Manuseio do Diabetes Insípido. In_: Endocrinologia Clínica. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. Cap 11, p.118-135. Diagnóstico Diferencial • Poliúria = volume urinário > 45-50 mL/kg/dia. • Descartar outras causas de poliúria (DM, distúrbios metabólicos) e DI nefrogênico secundário ao uso de drogas. • Diferenciação das diversas categorias de DI. • Importância da história clínica e exames laboratoriais. DD - História Clínica • PP: VU > 18 L/dia, HP de doença psiquiátrica, ausência de nictúria ou poliúria episódica. • DI central: poliúria pós neurocirurgia ou TC ou evidências clínicas de TU de linha média. • DI nefrogênico: poliúria de início precoce em menino com HF (mutação do AVPV), poliúria após uso de drogas indutoras de DI, pacientes com hipocalemia, hipercalcemia ou doenças renais crônicas. DD - Exames de Imagem • RM crânio pós gadolínio: sensível para detecção de tumores e outras patologias da região H-H. • DI central e DI nefrogênico: desaparecimento do ponto brilhante na hipófise posterior. Presença do ponto brilhante – PP. • Espessamento da haste hipofisária (DI idiopático, HL, germinoma ou doenças granulomatosas). DD - Exames laboratoriais • DOSAGEM DA NATREMIA E Posm BASAIS Não é útil no diagnóstico – valores normais ou superpostos. Valores elevados: diagnóstico de PP excluído. • DOSAGEM DO ADH PLASMÁTICO BASAL/AVALIAÇÃO DA RESPOSTA ANTIDIURÉTICA AO DDAVP (SC, 10 nanogramas) DI central: ADH (< 1 pg/mL) ou aumento da Uosm pós DDAVP maior que 50%. DI nefrogênico grave: ADH ou pouco ou nenhum aumento da pós DDAVP. DD - Exames laboratoriais • TESTE TERAPÊUTICO COM A DDAVP DIC X DIN X PP Efeito antidiurético significativo: exclusão do DIN. Redução da poliúria e polipsia, concentração da urina, sem hiponatremia: 90% DIC. Redução da poliúria sem melhora da polidipsia e hiponatremia diluicional: PP (intoxicação hídrica). Na+ sérico, Posm e VU, paciente hospitalizado. DD - Exames laboratoriais • TESTE DA PRIVAÇÃO HÍDRICA OU DA DESIDRATAÇÃO Diagnóstico não realizado com exames anteriores. - Procedimento Poliúria moderada: Privação ingestão de líquidos após 20 hs Exame às 8 hs, no dia seguinte - sangue e urina (Na+ sérico, Posm e Uosm a cada hora) Peso após cada litro de urina Avaliação horária da PA e pulso DD - Exames laboratoriais • TESTE DA PRIVAÇÃO HÍDRICA OU DA DESIDRATAÇÃO Poliúria grave: privação ingestão de líquidos de manhã Interrupção: perda ponderal > 3%, estabilização da Uosm em 2 amostras consecutivas, Posm > 360 mOsm/kg ou Na+ sérico > ou igual a 150 mEq/L. Dosagem do ADH, administração DDAVP, liberação ingestão de líquidos, Uosm (1,2,3,4,5 e 7 hs). DD - Exames laboratoriais • TESTE DA PRIVAÇÃO HÍDRICA OU DA DESIDRATAÇÃO - Interpretação Posm= 296 a 300 mOsm/kg - efeito máximo do ADH endógeno. Indivíduos normais: elevação da Uosm (<295 mOsm/kg), Posm = 800-1000 mOsm/kg, fluxo urinário < 0,5 mL/min. Pós DDAVP: incremento desprezível da Uosm. DD - Exames laboratoriais • TESTE DA PRIVAÇÃO HÍDRICA OU DA DESIDRATAÇÃO - Interpretação DI central completo: elevação da Posm (>295 mOsm/kg), Uosm diluída (<300 mOsm/kg).Pós DDAVP: incremento >50% da Uosm. DI nefrogênico completo: Posm e Uosm similares ao DICC. Pós DDAVP: não há incremento significativo. DD - Exames laboratoriais • TESTE DA PRIVAÇÃO HÍDRICA OU DA DESIDRATAÇÃO - Interpretação DI central e nefrogênico parciais: aumento moderado da Uosm com aumento entre 9%-50% após DDAVP. PP: Uosm > 750 mOsm/kg. Pós DDAVP: incremento desprezível na Uosm. Discrimina bem o DICC do DINC, mas não diferencia bem as formas parciais de DI da PP. Fonte: VILAR, L. Manuseio do Diabetes Insípido. In_: Endocrinologia Clínica. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. Cap 11, p.118-135. Tratamento • TRATAMENTO AGUDO Encefalopatia hipertônica: recompor água corporal (homeostase osmótica). Escolha do líquido: intensidade do eventual colapso circulatório, velocidade de desenvolvimento e magnitude da hipernatremia. Contração volumétrica modesta e Na+ < 160 mEq/L – SF a 0,9% ou líquidos orais. Hipernatremia mais grave, sobretudo de desenvolvimento gradual (>24 hs) – SF a 0,9%. Tratamento • TRATAMENTO AGUDO Hipernatremia aguda não associada a colapso circulatório – solução glicosada a 5%. • ESTIMATIVA DO DÉFICIT DE ÁGUA LIVRE Cálculo do déficit de água DA = 0,6 x peso corporal (1-140/sódio) Tratamento • TRATAMENTO CRÔNICO Formas parciais – só ingestão hídrica (pacientes assintomáticos). Tratamento da doença de base – melhora da poliúria. DICC: reposição de vasopressina com DDAVP (ação por 6 a 24 hs/solução intranasal, spray nasal, comprimidos e ampolas). Tratamento • TRATAMENTO CRÔNICO DICP: opções terapêuticas ao DDAVP em pacientes com poliúria leve a moderada com baixo poder aquisitivo: clorpropamida, diuréticos tiazídicos, carbamazepina e clofibrato. DIN: se possível, tratar fator desencadeante. Não há tratamento específico. Abordagem mais comumente utilizada: depleção volumétrica leve, reduzindo o VU, a nictúria e a dilatação da bexiga e dos ureteres. Tratamento • TRATAMENTO CRÔNICO DIN: principais opções terapêuticas: diuréticos (tiazídicos e amilorida) e AINEs (indometacina). PP: não utilizar diuréticos e DDAVP. Correção da doença de base e alteração comportamental. DI da gravidez: DDAVP (doses maiores). Referências Bibliográficas • VILAR, L. Manuseio do Diabetes Insípido. In_: Endocrinologia Clínica. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. Cap 11, p.118-135. • VILAR, L, et al. Distúrbios na secreção e ação do hormônio antidiurético. In_: Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia, vol.47, no.4, São Paulo, Ago 2003. • CHIDDE, L; SCHOR, N. Revisão: transportadores de áqua. In_: Revista da Associação Médica Brasileira, vol 45, nº 1, São Paulo, Jan/Mar, 1999.