estratégia e execução | reportagem
sustentabilidade
Eu, gestor de riscos?
Todos nós somos guardiões de riscos nas empresas agora, mas nem todos
estamos preparados para lidar com eles, como sugerem especialistas
E
Era uma vez a gestão de riscos, algo que costumava ficar a cargo de alguém que não era você e que respondia por segurança, uma pessoa
que se preocupava com extintores de incêndio
e espionagem industrial, alertava sobre viagens
a países inseguros, contratava apólices de seguro e verificava a situação de crédito de candidatos a postos executivos.
Só que o mundo dos negócios ficou mais instável e mais complexo, e o significado de risco
foi se ampliando, especialmente da crise financeira de 2008 para cá. Isso porque a crise foi
causada, em grande medida, por riscos imensos
A reportagem é de
John Buchanan,
colaborador de
The Conference Board Review.
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que poucos levaram a sério.
Assim, a disciplina “gestão de
riscos” evoluiu, juntamente
com a lista dos responsáveis
por serem os guardiões dos
negócios –lista na qual você
entrou, mesmo que não tenha
consciência disso.
“A crise financeira mostrou
que a gestão de riscos deve ser
mais holística e contemplar
todos os aspectos do negócio”,
salienta Guy Gioino, vice-presidente e consultor sênior para seguros da HUB International. De acordo com Russell
Walker, autor de Winning with
Risk Management, esse contexto
inclui novos focos de atenção,
tais como riscos de financiamento ou liquidez, operacionais, regulatórios ou ainda
de ação de informantes ou
ladrões de propriedade intelectual, entre outros. Também
estão sob o guarda-chuva dos
riscos as crescentes preocupações com a disponibilidade de
recursos naturais.
Max Rudolph, da Rudolph
Financial, firma de consultoria financeira e atuarial,
realizou uma pesquisa para
identificar os riscos que mais
têm preocupado as empresas
foto: shutterstock
nos últimos sete anos em nível
mundial. Neste ano, as quatro
mais importantes foram volatilidade financeira, preço das
ações, segurança de dados e
preço do dólar. Perderam posições no ranking as preocupações com o preço do petróleo,
conflitos regionais e Estados
falidos (cujos governos não
têm controle sobre criminalidade, corrupção, instituições
judiciárias, milícias ou outras instâncias). Da pesquisa,
é possível depreender que as
preocupações com riscos são,
hoje, globais e, com frequência, de origem externa, fora
do controle das companhias.
A maior mudança dos últimos tempos, no entanto, é
que pessoas cujas responsabilidades não incluíam a análise
de riscos agora precisam levar
em consideração o que pode acontecer se as coisas não
derem certo, incorporando o
planejamento de cenários a
seu dia a dia.
valor centrais, que são negligenciados por serem considerados parte normal dos negócios.
“Para mim, o grande desafio é combinar esses
riscos ligados ao negócio central com os eventos de baixa probabilidade e fortes consequências”, pondera Spetzler.
As empresas devem adotar uma abordagem
sofisticada de gestão de riscos corporativos como meio de tomar decisões estratégicas melhores, e isso inclui, segundo Rudolph, ver o lado
positivo dos riscos. Assim, as companhias começam a migrar de uma visão de apenas ava-
o lado positivo
dos riscos
“Os riscos que precisam ser
gerenciados não são, na maioria, aqueles de baixa probabilidade e fortes consequências,
mas aqueles mais prováveis,
de impacto intermediário”,
explica Carl Spetzler, consultor da área e diretor do programa “Strategic Decision
and Risk Management”, da
Stanford University, Estados
Unidos. Segundo o especialista, cerca de 70% dos riscos
que as organizações enfrentam vêm de seus vetores de
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liar riscos para pensar sobre como os riscos importantes se alinham à estratégia –aos vetores
de desempenho específicos que alimentam a
organização. “Essas empresas estão realmente monitorando os riscos de ponta a ponta, de
maneira holística”, comenta Brian Schwartz,
líder de governança, riscos e compliance da firma de consultoria PwC. Tal tendência é saudável, já que permite que se justifiquem os riscos
que mais afetam os resultados e a sustentabilidade de longo prazo do negócio.
guardiões na média gerência
A maioria dos gestores de nível médio não
foi formada em ambientes em que o risco fosse grande preocupação. Jim Prieur, membro
do conselho da Manulife Financial, considera
que a mudança de mentalidade desses profissionais é fundamental para um futuro mais seguro. Se a gestão de riscos for distribuída pela
média gerência das companhias, e mesmo para
outros escalões, há maior probabilidade de um
problema ser identificado e resolvido antes que
chegue à mesa do presidente como uma crise.
ligar com a
estratégia
Não se trata mais de apenas
avaliar riscos, e sim de pensar
sobre como os riscos se
alinham à estratégia, aos
vetores de desempenho
Por isso, cada vez mais as
empresas criam meios, tais
como as hotlines, para que os
funcionários possam alertar
os gestores sobre problemas
potenciais sem que se identifiquem. No entanto, de acordo com Walker, o mais provável é que, nas organizações
de cultura mais rígida ou que
tenham códigos de conduta
fracos, se diga: “Vamos deixar
para lá e esperar para ver se as
coisas mudam”.
Para Spetzler, a maior parte da gestão de riscos atual
deve ser feita pela média gerência na operação do dia a
dia ou por supervisores de
linha que acompanham processos específicos. “É o gerente de linha que instala e
monitora procedimentos de
fabricação ou segurança”,
O risco no brasil
O leitor familiarizado com o estudo que Gert
Hofstede fez na década de 1980, com base em
levantamentos da IBM sobre os valores de seus
funcionários em diferentes países, já sabe: empresas
brasileiras têm elevado índice de aversão à incerteza
(UAI, na sigla em inglês) e, portanto, baixa propensão
a assumir riscos nos negócios. O psicólogo holandês
estudou a influência de seis dimensões culturais
principais na gestão corporativa e a mais alta
pontuação do Brasil deu-se justamente na dimensão
UAI: 76, em uma escala ascendente de 1 a 120. Nem
na dimensão “distância do poder” a pontuação foi
tão alta –69–, apesar de a sociedade brasileira ser
considerada bastante hierárquica.
A dimensão “aversão à incerteza” traduz a maneira
como uma sociedade lida com sua ansiedade em
relação a um futuro incontrolável. Se os gestores de
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determinado país se sentem muito ameaçados pelo
desconhecido e tentam evitá-lo a qualquer custo, a
pontuação é elevada. É o que acontece com o Brasil
e com a maioria dos países latino-americanos –a
religião católica seria uma das explicações para o
destaque. Segundo Hofstede explica em seu website,
sociedades com essa característica mostram uma forte
necessidade de regras, controles e burocracia. Além
disso, quanto maior o grau de aversão à incerteza de
um país, maior é o grau de intervenção governamental
esperado em sua economia.
Ao menos, as grandes empresas brasileiras possuem
departamentos de gestão de riscos ativos e nossos
gestores tendem a levar os riscos em conta em suas
decisões, agindo instintivamente como “chief risk
officers”. O desafio aqui talvez seja passar da prática
de sempre evitar riscos para uma avaliação ponderada.
foto: divulgação
Carl Spetzler,
diretor do
programa
“Strategic
Decision
and Risk
Management”,
da Stanford
University,
Estados Unidos
diz ele. Assim, o modo mais eficaz de alcançar melhor gestão de riscos é motivar esses funcionários a prestar atenção
suficiente a esse tipo de responsabilidade. Isso se faz promovendo, a partir do conselho e dos altos executivos, a cultura
de responsabilidade, defende Daniel Draz, fundador da Fraud
Solutions, especializada em roubo de propriedade intelectual.
Schwartz concorda com Draz e salienta que, por vezes, as pessoas não percebem que estão ajudando a gerir riscos apenas por
fazerem seu trabalho bem-feito. Ele ainda informa que muitas
empresas estão incorporando as responsabilidades sobre os riscos
em avaliações de desempenho anuais e com vistas à remuneração.
olhar para dentro da empresa
Não é mais aceitável que alguém diga “eu não sabia” diante de
fatos como a crise de 2008. Segundo Walker, apesar de ser impossível para qualquer um estar totalmente preparado, há uma
Na era da
incerteza, é
preciso cultivar
a cultura da
resiliência e
contemplar
cenários
potenciais
regularmente,
com as
ameaças mais
prováveis
nova expectativa de excelência em gestão de riscos, ligada
mais a olhar para dentro da
companhia do que para fora.
Na visão de Gioino, a resiliência é a qualidade fundamental para a empresa lidar
com o pior dos cenários imagináveis. Alan Brill, diretor-executivo sênior da Kroll Advisory
Solutions, firma de consultoria
em segurança, aposta no exercício de contemplar cenários
potenciais com as ameaças
mais prováveis a enfrentar. “As
pessoas que passam por essa
preparação tendem a ter desempenho melhor quando há
um incidente. Elas também são
mais aptas a atenuar os prejuízos decorrentes”, comenta.
Allyson Heumann, gestora de riscos especializada em
planos de saúde e serviços financeiros, preocupa-se com
a complacência como risco.
“Quando se é complacente,
não se é proativo. Ser proativo é o único modo de evitar
o impacto negativo dos riscos.
E, quando se é reativo, não se
está bem preparado para lidar
com um acontecimento.”
A arena dos negócios é cada
vez mais implacável com erros.
Por esse motivo, todos, você inclusive, têm de se tornar gestores de riscos vigilantes.
hsm management
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