GARANTIA DE QUALIDADE DOS PRODUTOS LÁCTEOS E A EFETIVIDADE
DOS SISTEMAS PREVENTIVOS DE CONTROLE: O APPCC
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APRESENTACAO ORAL-Economia e Gestão no Agronegócio
LUCIANE DA SILVA RUBIN; MATHEUS DHEIN DILL; VERÔNICA SCHMIDT.
UFRGS, PORTO ALEGRE - RS - BRASIL.
Garantia de qualidade dos produtos lácteos e a efetividade dos sistemas
preventivos de controle: o APPCC.
Quality assurance in milk products and the effectiveness of preventive
control systems: the APPCC.
Grupo de pesquisa: Economia e Gestão no Agronegócio
Resumo
Este trabalho teve por objetivo discutir a importância da adoção de estratégias e programas
para a garantia da qualidade dos alimentos, mais especificamente as dificuldades por parte
das empresas do setor de lácteos para a aplicação de sistemas preventivos de controle, o
APPCC, e a sua efetividade quanto à obtenção dos resultados planejados. Os
procedimentos metodológicos utilizados para o desenvolvimento do estudo e para o
cumprimento dos objetivos propostos tiveram por base o levantamento bibliográfico
especializado no assunto, a fim de reunir informações sobre o tema. Após a revisão da
literatura, considera-se que os princípios do APPCC, se bem aplicados entre todos os elos
da cadeia, é uma ferramenta importante para garantir a inocuidade e segurança dos
produtos láteos, porém, na prática, são encontradas diversas barreiras a sua aplicação e à
efetivação dos resultados programados. As barreiras vão desde a impossibilidade por parte
dos agentes de garantir as pré-condições necessárias a sua correta aplicação, até a falta de
conhecimento sobre o sistema. Essas barreiras têm comprometido a efetivação do
programa e, consequentemente, a capacidade de prevenir problemas relacionados à
qualidade e a segurança dos alimentos.
Palavras-Chave: qualidade; produtos lácteos; APPCC; PAS.
Abstract
This work aimed at discussing the importance of adopting strategies and programs to
assure food quality, especially the difficulties found by companies from the milk sector to
apply preventive control systems, the APPCC and its effectiveness in obtaining the
planned results. The methodological procedures used in the study development and in
achieving the proposed objectives were based in a specialized bibliographical research
focused in gathering information about the topic. After a literature review, we considered
that the basics of APPCC, if well applied among all the chain links, is an important tool to
assure the safety and security of milk products but, many barriers are found in its
application and in the achievement of the proposed results. The barriers range from the
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impossibility by the agents to assure the necessary preconditions to its correct appliance to
the lack of knowledge about the system. These barriers have been compromising the
program effectuation and, consequently, that capacity to prevent problems related to food
safety and security.
Key words: quality; milk products; APPCC; PAS.
1. INTRODUÇÃO
O agronegócio brasileiro é considerado o setor mais dinâmico da economia pois
apresenta importância considerável no que diz respeito à garantia de alimentos
relativamente baratos (em relação a outros países), além de gerar renda, emprego e divisas.
O país tem sido apontado como um dos maiores potenciais de oferta de alimentos para o
mundo, devido à disponibilidade e abundância de nossos recursos naturais como fatores de
competitividade.
Conforme o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), da
Esalq-USP, o agronegócio (considerando insumo+agropecuária+indústria+distribuição),
apresentou, em 2008, um PIB de R$ 764.494 milhões, o que representou 26,46% da
riqueza gerada pelo país. A maior parte vem do setor distribuição (8,38%), seguido pela
indústria (8,00%), o setor agropecuário (6,96%) e o setor de insumos (3,12%). No que diz
respeito à geração de emprego, o setor do agronegócio foi, em 2008, responsável por 37%
dos empregos formais e informais gerados no país (IICA, 2009). O maior destaque do
agronegócio está na capacidade de gerar saldos comerciais positivos, cerca de US$ 57,7
bilhões em 20081. As exportações do agronegócio totalizaram US$ 69 bilhões, o que
representou 35,2% das exportações totais do país. Os principais produtos na pauta de
exportação do agronegócio foram o complexo soja (US$17,9 bilhões) e carnes (US$14,2
bilhões) (CONAB, 2008).
Apesar do desempenho do agronegócio brasileiro, o país possui uma extraordinária
capacidade potencial a ser explorada que, se bem conduzida, pode contribuir para a
crescente inserção sustentável dos agronegócios no mundo e para aumentar ganhos de
bem-estar para a sociedade como um todo. Um dos setores que vem se apresentando
extremamente importante, especialmente para os pequenos agricultores no que diz respeito
à geração de emprego e renda para o meio rural, é o setor lácteo. Até 2003, o país era
importador líquido de produtos lácteos, com um déficit que chegou a aproximadamente
meio bilhão de dólares em 1998. Por outro lado, em 2008 o país se torna superavitário em,
aproximadamente, US$300 milhões. Entretanto, a exploração das capacidades do país está
muito aquém de suas potencialidades. Estudiosos na área são unânimes em afirmar que
para que o país alcance graus de sustentabilidade, competitividade e, consequentemente,
melhor retorno financeiro para o setor de lácteos, principalmente para a incorporação dos
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O acúmulo de superávits no Balanço de Pagamentos contribui para reduzir a vulnerabilidade externa do
país.
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pequenos produtores que estão na informalidade, é preciso melhorar a eficiência no que diz
respeito à qualidade de processos e produtos.
Consumidores, empresas, governos e organizações internacionais estão, cada vez
mais, atentos e preocupados com a qualidade dos alimentos. Estes, de um modo geral,
podem ter um efeito benéfico ou maléfico à saúde das pessoas logo a proteção da saúde
pública envolve o controle de qualidade destes, antes de serem consumidos. Alimentos
com qualidade sanitária insatisfatória podem causar inúmeros casos de enfermidades, além
de doenças crônicas como alergias e neoplasias (RODRIGUES FILHO, 1996).
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), quase dois milhões de
crianças morrem por ano de diarréias causadas por água e alimentos contaminados (25%
por Escherichia coli, 10 a 15% por Campilobacter jejuni e 5 a 15% por Shigella sp.)
(MONARDES, 2004). O leite e seus derivados, por sua vez, são produtos altamente
perecíveis devido a suas características químicas, físicas e biológicas e facilmente alterados
pela ação de microorganismos, o que lhe confere condições de ser considerado um veículo
de doenças, caso não seja produzido em um sistema com medidas preventivas de produção
(DÜRR, 2004).
Com o objetivo de aumentar a qualidade dos produtos lácteos e aumentar a
competitividade do setor no mercado externo, o país vem passando por um processo de
implantação do Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite (PNQL), que foi
regulamentado com a publicação da Instrução Normativa nº 51/2002 (BRASIL, 2002), a
fim de estabelecer parâmetros sobre a qualidade do produto e seus derivados e dar
conformidade aos parâmetros mínimos higiênico-sanitários, exigidos no mercado externo.
No Brasil, novas normas de sanidade animal, higiene, refrigeração e nutrição
animal foram implementadas com vistas a atender as exigências do mercado internacional,
promover a melhoria da qualidade do leite e derivados, garantir a segurança alimentar e
aumentar a competitividade dos produtos lácteos (SANTOS et al., 2009). O Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) criou o Programa Nacional de Melhoria
da Qualidade do Leite - PNQL e publicou a Instrução Normativa Nº 51/2002 (IN51/2002),
estabelecendo limites legais (gordura, proteína, sólidos totais, células somáticas e
contagem bacteriana total) dos diversos tipos de leite no país, bem como a coleta e o
transporte a granel de leite cru refrigerado (DÜRR, 2006; ZANELA et al., 2006). Os
procedimentos e práticas de higiene relacionadas ao leite e os produtos lácteos seguem a
abordagem do sistema Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle, APPCC (FAO,
2009).
APPCC permite analisar e detectar, de forma preventiva, perigos significativos,
como biológicos, químicos e físicos, que podem ocorrer na linha de produção e, assim,
controlá-los através dos Pontos Críticos de Controle (PCC) (PAS, 2009), oferecendo mais
segurança ao consumidor final, contribuindo para o aumento da competitividade das
empresas e a conquista de novos mercados, além de propiciar redução nas perdas de
matéria prima, embalagem e produto (ANVISA, 2009).
Apesar do sistema de controle e prevenção APPCC ser apontado como requisito
essencial para a garantia de qualidade dos alimentos e sua adoção ser recomendada pelo
Cordex Alimentarius da FAO/OMS de forma extensiva para todos os elos da cadeia
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alimentícia, pouco se sabe sobre a efetividade de tal programa e das dificuldades para a sua
implantação na cadeia do leite.
O objetivo deste estudo é discutir a importância da adoção de estratégias e
programas para a garantia da qualidade dos alimentos, mais especificamente o APPCC, e
as dificuldades e a efetividade de sua implantação por parte das indústrias de laticínios e
produtores de leite.
Este trabalho se justifica pela importância do tema e pela falta de estudos que se
proponham a medir e estimar a efetividade dos programas de garantia de qualidade no
Brasil.
2. METODOLOGIA
Utilizou-se pesquisa bibliográfica, elencando-se trabalhos que relatam os resultados
da implementação de programas de controle e garantia da qualidade na cadeia do leite,
com ênfase ao APPCC e PAS, como subsídio às discussões dos fatores que envolvem a
qualidade do leite e seus derivados.
Segundo Cervo et al. (2007), a pesquisa bibliográfica procura explicar um problema
a partir de referências publicadas, com o intuito de conhecer e analisar as contribuições
científicas sobre determinado problema. Informações relativas aos princípios básicos sobre
APPCC e os passos para sua implantação foram estruturados para uma melhor
compreensão do problema de qualidade e sanidade do leite.
O rastreamento bibliográfico foi executado através de sites de busca bibliográfica
como o Scopus, SciELO, InterScience e outras bibliografias de instituições ligadas ao
objeto de estudo e alguns dados secundários, para complemento da análise.
Após, realizou-se entrevista qualitativa, padronizada aberta (GODOI et al., 2007)
com o especialista Leonir Martello, médico veterinário, coordenador da unidade gestora
operacional do PAS – Indústria de alimentos via correio eletrônico. O objetivo foi
identificar os principais problemas referentes à implantação do PAS pelas agroindústrias
de lacticínios do Rio Grande do Sul.
3. CONCEITO DE QUALIDADE
O conceito de qualidade no setor agroalimentar é amplo e apresenta inúmeras
conotações. Sua definição envolve um complexo conjunto de atributos que podem estar
associados ao desempenho ou características do produto, ao processo de produção e
transformação do produto (final ou intermediário) e ao marketing (preço de oferta, grau de
aceitação do consumidor, políticas de comercialização, imagem, etc).
Esses atributos, associados às características de qualidade do produto e de processo,
envolvem diversos fatores, entre eles estão: (1) aparência, higiene e gosto; (2) segurança,
por exemplo, presença de pesticidas e resíduos de hormônios artificiais e de células
microbiana; (3) características nutricionais; (4) autenticidade ou identidade, no que diz
respeito à origem geográfica ou uso de processos tradicionais; (5) boas práticas, como
condições de segurança no trabalho e a preservação do meio ambiente (REARON, 2001).
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Esses fatores são incorporados ao produto à medida que os agentes da cadeia
produtiva responsáveis pela qualidade do produto (produtores, indústrias, varejo etc.)
sentem a necessidade de responder à intensificação da concorrência e às exigências da
demanda (necessidades civilizadas, que varia ao longo do tempo e de acordo com a
cultura). Há, ainda, a necessidade de incorporação de normas e regras, muitas vezes
impostas pelo Estado, pois a qualidade está freqüentemente associada à avaliação
percebida ou não pelos consumidores, isto é, existem fatores de qualidade intrínsecos e
extrínsecos ao produto. Os fatores intrínsecos (padrões microbiológicos, nutricionais,
impurezas, substâncias tóxicas) estão geralmente ocultos (SCALCO & TOLEDO, 2002) e,
na maioria das vezes, relacionam-se à saúde dos consumidores, como enfermidades,
alergias, doenças crônicas etc. (RODRIGUES FILHO, 1996).
As normas e programas de controle de qualidade têm o papel de padronizar
processos e produtos, a fim de garantir a qualidade e eliminação de riscos à saúde e de
corrigir ineficiências no sistema, tais como reduzir os custos de transação ao longo da
cadeia e/ou eliminar informações assimétricas. Também, hoje, tem funcionado como uma
estratégia de competição, de diferenciação por parte das organizações (construir uma
reputação) e de segmentação de mercado, visando nichos de alto valor, principalmente no
que diz respeito às normas e certificações privadas (REARDON, 2000; HENSON &
REARDON, 2005; BUSCH, 2006; FARINA, 2005).
No que diz respeito ao setor de lácteos, o conceito de qualidade deve envolver
normas, regras e programas que possam garantir ao consumidor a confiança no produto e
sua aceitação, oferta de produtos seguros à saúde e sua acessibilidade em quantidade,
variedades adequadas às preferências e custo, boas práticas sociais, ambiental e de bemestar animal.
Desta forma, os programas de garantia de qualidade do setor de lácteos devem ir
muito além da indústria e devem incorporar os produtores primários em todos os seus
processos (uso de produtos veterinários, as práticas na fazenda e manejo dos animais,
cuidados com a acumulação de lixo e outros resíduos em locais inadequados, a limpeza dos
equipamentos, o uso de materiais de limpeza adequados, a possibilidade de infestações de
insetos e roedores, o armazenamento adequado, o processo de manuseio, etc.), que
geralmente não são incluídos em tais programas, até a distribuição final
(NOORDHUIZENA & METZB, 2005).
4. CONTROLE E GARANTIA DA QUALIDADE NA CADEIA DO LEITE
O controle e a garantia da qualidade do leite requerem um sistema de
procedimentos e de ferramentas que possam dar suporte para o monitoramento e registro
em todo o sistema de produção ao longo da cadeia (NOORDHUIZENA & METZB, 2005).
A complexidade do processo exige a formalização do controle de perigo potencial de
contaminação.
Existem diferentes técnicas que são utilizadas para controle e garantia da qualidade
do leite, ente elas estão: BPF (Boas Práticas de Fabricação), ISO 9000 (Organização
Internacional para Normalização), PPHO (Procedimentos Padrões de Higiene
5
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Operacional), APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle) e PAS (Programa
Alimento Seguro) (NOORDHUIZENA & METZB, 2005).
Para dar garantia da inocuidade nos produtos lácteos não basta a fiscalização, é
necessário o desenvolvimento de medidas preventivas, através da aplicação de um método
sistemático para planejar, controlar e documentar a produção segura dos produtos, sendo o
APPCC um desses métodos. Baseado em um processo científico, ele é utilizado para
“construir” a inocuidade dos alimentos compreendendo todas as suas fases, desde o campo
até a mesa do consumidor (ALMEIDA, 1998). O APPCC é uma abordagem universal e foi
elaborado com o objetivo de identificar os perigos biológicos, químicos e físicos aos
alimentos antes que eles ocorram e, em seguida, estabelecer medidas para o controle.
Também, permite a maior fiscalização do governo, através do rastreamento do problema
desde a sua origem (CULLOR, 1997; DÜRR, 2006).
4.1 Análise de perigos e pontos críticos de controle e programa de alimento seguro
Na década de 50, a indústria de alimentos adaptou as Boas Práticas (BP) da
indústria farmacêutica, intitulando-a como Boas Práticas de Fabricação (BPF), com o
objetivo de aperfeiçoar e dinamizar a produção de alimentos seguros e de qualidade (PAS,
2009).
O sistema Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC), da sigla
original em inglês HACCP (Hazard Analysis and Critical Control Points), teve sua origem
na década de 50 em indústrias químicas na Grã Bretanha (RIBEIRO-FURTINI & ABREU,
2005). Na década de 60-70 a National Aeronautics and Space Administration (NASA) e a
Pillsbury Company adaptaram o sistema para a produção de alimentos, visando aumentar a
segurança alimentar dos astronautas (PAS, 2009).
O APPCC foi endossado pelo Cordex Alimentarius, órgão que estabelece normas
internacionais de segurança dos alimentos, e foi criado em 1963, pela FAO (Organização
das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) e pela OMS (Organização Mundial
de Saúde), a fim de desenvolver normas e regulamentos relacionados à segurança dos
alimentos, além de outros textos sobre códigos de práticas de processos. Os principais
objetivos do programa são a proteção da saúde dos consumidores, assegurar boas práticas
de comércio e a promoção e coordenação de todas as normas alimentárias acordadas pelas
organizações governamentais e não-governamentais; sendo que o leite e produtos lácteos
possuem um manual de normas específicas - o Código de Práticas de Higiene para o Leite
e os Produtos Lácteos (FAO, 2009).
No Brasil, o APPCC teve início em 1993, estabelecido pelo Ministério da Saúde,
sendo que em 1998, a Portaria nº 46 do MAPA, estabeleceu a implantação gradativa em
todas as indústrias de produtos de origem animal, cujo pré-requisito essencial é BPF
(RIBEIRO-FURTINI & ABREU, 2005). Em 2003, através da resolução nº 10, foi
instituído o Programa Genérico de Procedimentos - Padrão de Higiene Operacional
(PPHO), a ser utilizado nos estabelecimentos de leite e derivados (entreposto-usina, usina
de beneficiamento, fábrica de laticínios, granja leiteira e entreposto de laticínios), que
funcionam sob o regime de Inspeção Federal, como etapa preliminar e essencial ao sistema
APPCC (BRASIL, 2003).
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Em 2002, o MAPA criou o Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite PNQL e publicou a Instrução Normativa Nº 51/2002 (IN51/2002), estabelecendo limites
legais (gordura, proteína, sólidos totais, células somáticas e contagem bacteriana total) dos
diversos tipos de leite no país, bem como a coleta e o transporte a granel de leite cru
refrigerado2 (DÜRR, 2006; ZANELA et al., 2006). O novo programa de sanidade animal,
higiene, refrigeração e nutrição animal busca atender às exigências do mercado
internacional, promover a melhoria da qualidade do leite e derivados, garantir a segurança
alimentar e aumentar a competitividade dos produtos lácteos (SANTOS et al., 2009). O
programa, também, recomenda os estabelecimentos com SIF (Sistema de Informações
Fiscais) a implantarem as BPF (Boas Práticas de Fabricação) e o APPCC na indústria de
laticínios (LOPES et al., 2006).
Neste enfoque, as entidades SENAI, SEBRAE, SESI, SENAC, SESC e SENAR
desenvolveram o Programa Alimento Seguro (PAS), com objetivo de reduzir os riscos dos
alimentos à população. Este programa visa desenvolver tecnologias, metodologias,
formação e capacitação de técnicos para disseminar, implantar e certificar ferramentas de
controle em segurança de alimentos, como BP e APPCC, nas empresas integrantes da
cadeia dos alimentos, em todo o país (PAS, 2009).
A mudança do nome APPCC para PAS ocorreu em 2002, devido o aumento na
abrangência de atuação. Esta nova nomenclatura tem como objetivo conscientizar o
consumidor final e a sociedade, além de melhor caracterizar a ampliação de seu escopo,
com a inclusão de ações de implantação de Boas Práticas. Sendo assim, o PAS ficou
estruturado como um Programa do campo à mesa, composto de seis projetos: PAS-Campo,
PAS-Indústria, PAS-Distribuição, PAS-Transporte, PAS-Mesa e PAS-Ações Especiais
(PAS, 2009).
Cabe ressaltar que os órgãos internacionais, Organização Mundial do Comércio
(OMC), Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e
Organização Mundial de Saúde (OMS), nas décadas de 80-90 começaram a recomendar a
adoção do sistema APPCC pelas indústrias, sendo que o sistema é exigido pela
Comunidade Européia e Estados Unidos para garantir a qualidade dos produtos (ANVISA,
2009).
Cullor (1997) e Dürr (2006) apresentam os sete princípios básicos do APPCC e um
modelo com 12 passos à implementação do sistema APPCC, conforme apresentado no
Quadro 01.
2
A normativa estabelece os valores mínimos de gordura (3%), proteína bruta (2,0%) e sódios
desengordurados 8,4%. Para a CCS e CBT os limites são graduais para diferentes prazos. Para as regiões Sul,
Sudeste e Centro-Oeste, em jul/2011, o limite máximo de CCS será de 400 mil células mL-1, e para CBT o
máximo será de 100 mil células mL-1 de UPF (leite individual) ou 300 mil mL-1 (leite de conjunto). Os
limites para temperatura máxima são de 7ºC para a propriedade rural e tanque comunitário, e de 10ºC no
laticínio ou posto de resfriamento. Não deve ter presença de antibiótico. Para as regiões Norte e Nordeste, os
prazos são estendidos para jul/2012 (ZANELA et al., 2006; BRASIL, 2002).
7
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Princípios Básicos
Passos à implementação
1. Identificação dos perigos, 1. Definir uma equipe local e multidisciplinar para liderar o
severidades e riscos (químicos, programa de APPCC;
microbiológicos e físicos);
2. Descrever o(s) produto(s) final(is) e o seu meio de
distribuição (p. ex., requisitos de formulação e
2. Estabelecimento dos pontos processamento);
críticos de controle (PCCs) 3. Identificar o provável uso do alimento e a população
para os perigos identificados;
consumidora alvo;
4. Desenvolver um fluxograma que descreva o processo de
3.
Estabelecimento
dos produção e distribuição;
critérios (limites críticos) para 5. Verificar o fluxograma;
cada PCC;
6. Preparar uma lista dos pontos no processo de produção em
que ocorrem perigos químicos, físicos e microbiológicos e
4. Adoção de procedimentos começar a descrever medidas preventivas;
de monitoramento rotineiro 7. Identificar os PCCs no processo produtivo;
para os PCCs;
8. Estabelecer limites críticos que disparem a implementação
de medidas preventivas associadas a cada PCC identificado;
5. Adoção das medidas 9. Estabelecer as exigências de monitoramento e organizar os
corretivas, quando o critério procedimentos para o uso dos resultados do programa de
não for atingido;
monitoramento (Meta: usar os resultados do programa de
monitoramento para ajustar procedimentos e manter controle
6. Estabelecimento de um sobre o processo de produção);
sistema efetivo de registro de 10. Criar ações corretivas a serem iniciadas quando o
informações para o programa; programa de monitoramento indicar desvios em relação aos
e
critérios ou limites críticos estabelecidos;
11. Estabelecer procedimentos efetivos de registro de
7. Estabelecimento de um informações que atestem a implementação do sistema de
sistema de verificação para APPCC (p. ex., o plano de APPCC, os dados gerados durante
documentar que programa de o processo de produção etc.) e
APPCC está sendo seguido.
12. Estabelecer procedimentos de verificação de que o sistema
de APPCC está trabalhando corretamente (p. ex., auditorias
internas e externas, revalidações periódicas do sistema etc.).
Fonte: Cullor, (1997); Dürr, (2006).
Quadro 01- Os sete princípios básicos do APPCC e os passos à implementação
4.2 A aplicação dos programas de controle de riscos e de qualidade
8
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Existe uma carência de estudos e investigações a respeito da aplicação do APPCC,
de outros tipos de programas de qualidade, dos possíveis problemas enfrentados e dos
resultados da sua aplicabilidade no setor de lácteos.
Spexoto, Oliveira e Olival (2005) realizaram um estudo em uma propriedade
produtora de leite tipo A, no município de Descalvado/SP, com 128 animais da raça
Holandesa em lactação e produção média de 3.584kg de leite dia-1 para avaliar a
aplicabilidade e a eficiência do APPCC no que diz respeito à diminuição dos níveis de
células somáticas (CCS), da carga microbiana e do resultado do exame California Mastitis
Test (CMT).
O trabalho consistiu na implantação do programa3 e a medição dos níveis de CS,
CMT e carga microbiana4.
Os resultados apresentados mostraram-se eficientes para o controle de coliformes
fecais no leite, melhorando as condições sanitárias do leite, para redução do número de
quartos afetados e no escores de mastite, estimados pelo teste de CMT. Entretanto, os
autores não verificaram influência do APPCC nas contagens de microrganismos mesófilos
e psicrotróficos e CCS no leite de mistura e nos percentuais de casos de mastite.
Entre as principais dificuldades encontradas pelos autores na aplicação do programa
APPCC na propriedade leiteira escolhida, estão as seguintes:
“(...) motivação e envolvimento de funcionários para a nova rotina
implementada; dificuldades de tomada de decisão rápida, muitas vezes
necessária para o controle de perigos e pontos críticos; falta de dados
indicando, de maneira precisa, os limites críticos e as formas de
monitoramento do trabalho; necessidade de um tempo maior para a
correção de diversos perigos e pontos críticos, indicando que muitas das
práticas adotadas apenas resultaram em efeitos observáveis a longo
prazo” (p.1429).
Os autores ressaltam a dificuldade na implantação do sistema em granjas leiteiras e
a importância do comprometimento dos funcionários e do proprietário como fator essencial
para o sucesso do sistema APPCC.
Um outro estudo realizado por Teixeira, Fonseca e Meneses (2007), junto aos
laticínios de quatro das cinco regiões mais importantes na produção de queijos e derivados
do estado de Minas Gerais, teve como objetivo analisar a qualidade microbiológica do soro
(quanto a coliformes totais e termotolerantes, microrganismos psicrotróficos, bolores e
3
O trabalho descreve no item Material e Métodos todos os passos que foram realizados para a execução e
implementação das seguintes atividades: obtenção do comprometimento e formação da equipe de trabalho;
descrição da propriedade e do pessoal envolvido na ordenha; aplicação e treinamento em Boas Práticas de
Produção e Manipulação (BPPM); descrição do fluxograma das operações de ordenha, constituição dos
grupos de trabalho formados pelos funcionários; identificação de todos os perigos, definição das medidas
preventivas para os perigos constatados, identificação dos PCCs (árvore decisória); estabelecimento dos
limites críticos, monitoramento dos PCCs; estabelecimento de ações corretivas; documentação de todas as
atividades desenvolvidas para a implantação do sistema; verificação e avaliação periódica do funcionamento
de todo o sistema; registros de todas as reuniões educativas; e avaliação da eficiência do sistema.
4
A medição se deu em três fases: no início, após o treinamento dos agentes envolvidos e após a aplicação do
programa APPCC.
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leveduras e Staphylococcus coagulase positiva)5, a partir da produção de dois tipos de
queijos (o mozarela e o queijo-de-minas)6. Os resultados encontrados pelos pesquisadores
revelaram que o soro analisado era impróprio para o consumo humano e para o uso pela
indústria. Os autores salientam que os resultados encontrados são graves e preocupantes,
principalmente em relação aos percentuais de contaminação em termos de contagem de
coliformes termotolerantes e Staphylococcus coagulase positiva (UFC/mL) e porque as
empresas pesquisadas eram inspecionadas pelo Serviço de Inspeção Federal e já haviam
implantado ou estavam em processo de implantação das BPF, ou seja, as BPF adotadas
pelos laticínios não estão sendo efetivamente aplicadas.
Ainda, os autores constataram que a contaminação encontrada ocorreu durante o
processamento, possivelmente por falha na higienização dos utensílios utilizados e dos
próprios manipuladores, uma vez que 90% das amostras de soro (exceto algumas oriundas
da fabricação de mozarela) apresentaram fosfatase alcalina inativada (negativa), indicando
que o leite utilizado tinha sido pasteurizado.
Tais resultados reforçam a importância de procedimentos e de ferramentas que
possam dar suporte ao monitoramento e registro em todo o processo de produção.
Já, um estudo realizado no Egito, por Kassem et al. (2002), junto a uma empresa de
leite e produtos lácteos, com o objetivo de monitorar o processo e avaliar a qualidade e
higiene de uma amostra de pacotes de leite pasteurizado ou esterilizado e de outros
produtos lácteos, antes e após a aplicação da APPCC, teve como resultado a melhoria na
qualidade e, de modo geral, a melhoria nas condições da empresa. Os autores recomendam
o uso de treinamento dos colaboradores e a formação de uma equipe qualificada para o
planejamento e aplicação do APPCC.7
Segundo Panunzio, Antoniciello e Pisano (2007), o APPCC foi introduzido na Itália
para as indústrias de alimentos pelo Decreto Legislativo 155/97, porém, há pouco controle
ou auto-avaliação dos planos de monitoração do APPCC. Por isso, os autores realizaram
um trabalho com dados de 250 empresas de alimento8, a fim de avaliar os pontos críticos
do monitoramento e aplicação do programa APPCC. Para a análise, as empresas foram
subdivididas em quatro grupos: grupo 1 – conta com a ajuda de uma equipe qualificada;
grupo 2 - conta com a ajuda de uma equipe não qualificada; grupo 3 – conta com a ajuda
5
Conforme os autores, as técnicas utilizadas foram em conformidade com as normas para leite e derivados
da International Dairy Federation (IDF) para cada microrganismo, em duplicata. O experimento foi
delineado como inteiramente ao acaso, com um fatorial 2x4x6 (tipo de soro x região x repetições). Foi
utilizado o teste Mann e Whitney para a comparação entre médias, e, para a comparação entre regiões, o teste
Kruskal e Wallis.
6
O soro lácteo é a fração aquosa do leite que é separada da caseína durante a produção de queijos, e
correspondem, aproximadamente, a 90% do volume do leite, levando consigo 50 a 55% dos sólidos totais.
Tais características fazem do soro uma matéria-prima muito utilizada na indústria alimentícia, seja como
simples substituto da água ou como ingrediente de funcionalidade reológica ou nutricional, fazendo parte da
dieta da população, incluindo os idosos e principalmente as crianças. Entretanto, ele é um produto que tem
vida útil de curta duração, devido ao valor nutritivo, às condições de umidade e ao pH, condições favoráveis
ao crescimento microbiano (TEIXEIRA, FONSECA e MENESES, 2007).
7
Tais informações estão disponíveis no resumo do artigo, obtido através do Scopus e nas citações de outros
trabalhos, como Panunzio, Antoniciello e Pisano (2007).
8
Os dados foram coletados pela SIAN - Alimentação e Nutrição (Serviço de Saúde) do FG / 3, para o
período de janeiro de 2004 a junho de 2005.
10
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de um especialista não qualificado; Grupo 4 – não tem auxílio de especialista9. Cada grupo
foi avaliado em quatro pontos críticos do programa: a especificidade (os planos do APPCC
devem ser pertinentes às especificidades e à realidade da empresa individual), a
simplicidade (o plano não deve conter elementos desnecessários ou supérfluos),
viabilidade (deve ser viável e não idealizado a partir de livros de receitas ou de “sonhos”) e
aderência (o plano deve ser bem adaptado ao método do APPCC e aos princípios de
análise de perigos em pontos críticos de controle). A partir daí, foram construídos índices e
indicadores com o intuito de avaliar a efetividade dos planos de APPCC, validando ou
apresentando os fatores mais críticos10.
Os índices encontrados mostram resultados qualitativamente insatisfatórios quando
considerados de forma conjunta em relação aos quatro pontos críticos (especificidade,
simplicidade, viabilidade e aderência). Para a análise dos grupos (1 a 4), o grau de
associação entre qualidade do programa APPCC estava relacionado positivamente aos
melhores níveis de qualificação das equipes, isto é, particularmente, as empresas que
utilizaram um sistema com uma equipe qualificada obtiveram bons resultados nos
quatro pontos críticos; ao contrário, nas empresas que fazem uso de colaborador não
qualificados ou que não possuem auxílio de especialista, a elaboração de planos do APPCC
foi considerada inaceitável quanto ao nível de especificidade e aderência. Tais resultados
reforçam a necessidade da existência de uma equipe qualificada para a aplicação e
efetividade do modelo de qualidade e controle APPCC.
Também, Bao, Yüksel e Çavuooflu (2007) apresentam um estudo cujo objetivo era
determinar as barreiras encontradas pelo setor de alimentos da Turquia, para a
implementação do sistema de gestão de qualidade e sanidade dos alimentos, o APPCC. A
aplicação do sistema foi exigida a todas as empresas produtoras de alimentos, a partir da
inclusão da Turquia como Estado membro da UE, e, ainda, o cumprimento dos requisitos
de qualidade e sanidade dos alimentos, desde os produtores primários. A pesquisa foi
realizada por pessoal treinado em APPCC, em 115 empresas do setor de alimentos, no
período de 2004 a 2005, em Ancara, na Turquia11.
Entre os principais problemas ou barreiras identificados pelo estudo, estão: a falta
de compreensão do sistema HACCP (63,5% informaram que realmente não sabiam o que
era APPCC e 23,5% disseram que era muito complicado); falta de conhecimento (83,5%);
9
Foi considerada como equipe qualificada aquela que possui um grupo de pessoas que inclui vários
profissionais, nas áreas de biologia, ciências veterinárias, ciência dos alimentos e tecnologia, agricultura e
medicina, e que têm pelo menos, um curso de capacitação HACCP, organizadas por entidades públicas ou
privadas.
10
No item Material e Método, na página 35, são apresentados os testes de confiabilidade, o cálculo das
pontuações e as questões levantadas para avaliação dos quatro pontos críticos.
11
O questionário foi elaborado com base em uma pesquisa na Irlanda (Food Safety Authority), em 2001. Os
questionários incluiram: parte I- 10 questões relacionadas com as empresas de alimentos (tais como número
de empregados e diretores, a implementação de sistemas de HACCP, nível de escolaridade do gerente); parte
II -incluídos 6 itens relacionados à benefícios em ter um sistema de segurança alimentar como HACCP no
lugar; parte III - consistiu de 12 itens relacionados para os problemas dos gestores encontradas na execução
segurança alimentar e de sistemas HACCP; parte IV - refere-se a 12 itens relacionados à melhoria da
segurança alimentar e nas empresas; parte V - incluiu 23 perguntas relacionadas às práticas de higiene
pessoal e procedimentos, incluindo implementação de programas pré-requisito, como boas práticas de
fabricação e procedimentos de higiene; parte VI - incluídos 10 itens relacionados ao conhecimento dos
gestores para os sistemas de HACCP. Todas as análises estatísticas foram realizadas usando SPSS.
11
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falta de tempo (88,7%); volume de recursos (80,9%); falta de motivação dos empregados
(83,5%); terminologia complicada (87,0%); falta de treinamento de pessoal (91,3); e falta
dos pré-requisitos, como instalações físicas (92,2%). Entretanto, a pesar das imensas
dificuldades apontadas, a maioria dos gestores (91,3%) identificou como fator importante a
implantação de um sistema de gestão para a garantia de segurança alimentar. Como
sugestão, foi enfatizada a necessidade de programas de treinamento, tanto no que diz
respeito a segurança básica dos alimentos, quanto para apoio à estrutura para a
implementação do programa APPCC.
Em entrevista realizada com Leonir Martello, coordenador da unidade gestora
operacional do PAS – Indústria de alimentos, os relatos revelam que, no estado do Rio
Grande do Sul, 24 empresas de laticínios aderiram ao programa.
Quando perguntado sobre as principais dificuldades encontradas por estas empresas
em implantar o PAS, foi descrito que os entraves são as questões financeiras das empresas,
em função das exigências na adequação das instalações. Não menos importante, são as
questões referentes à baixa disponibilidade de profissionais capacitados para gerenciar o
programa e a cooperação dos envolvidos.
Referindo-se às melhorias no produto final (leite e derivados), após a adoção do
programa, foi relatado que ocorreram melhorias. No entanto, as empresas não divulgam
estes dados e as avaliações dos indicadores necessitam uma consolidação da implantação
do programa e isso leva alguns anos.
Segundo Martello, a adoção do PAS traz melhorias para os produtos e o aumento
da qualidade é inerente à implantação do programa. Porém, das 24 empresas que
participaram, 3 (três) não conseguiram atingir os pré-requisitos.
Para melhor visualização, são apresentadas (Quadro 02) as resposta da entrevista
quanto aos principais fatores internos e externos que interferiram no Programa Alimento
Seguro da Indústria (PAS Indústria), com seus respectivos pontos negativos e positivos.
FATORES INTERNOS DO PAS INDUSTRIA
PONTOS FORTES
PONTOS
POSITIVOS
1-garantia de produção de alimento seguro
2-redução de reprocessos e devoluções, (aumento do lucro)
3-conhecimento da empresa
PONTOS FRACOS
PONTOS
NEGATIVOS
4-custo da implantação e investimento em reformas estruturais
5-dificuldade em implantar a ferramenta por algumas empresas
6-falta de cultura de registro e indicadores
FATORES EXTERNOS
OPORTUNIDADES
PONTOS
POSITIVOS
7-Concorrência
8-Diversificação do setor de alimentos (PAS Segmentos)
9-exigência legal
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AMEAÇAS
PONTOS
NEGATIVOS
10-concorrência desleal
11-Fiscalização inadequada por interpretação errônea da legislação
12-Crises internacionais
Fonte: elaborado pelos autores
Quadro 02: Fatores internos e externos do PAS-Indústria
O objetivo do trabalho tem algumas limitações devido à falta de estudos que
discutem a efetividade da aplicação do APPCC. Porém, os princípios do APPCC, tanto ao
nível dos produtos como das indústrias, é recomendado por alguns autores, por exemplo,
Dürr (2006)12, como estratégia e fator fundamental para a garantia da qualidade do leite e
dos produtos derivados e para a maior competitividade junto aos mercados internacionais.
O sucesso no desenvolvimento, instalação, monitoramento e verificação de um
sistema APPCC depende de um mistura complexa de gestão organizacional, técnicas
especializadas e habilidades uma vez que mesmo nas grandes empresas, que dispõem de
recursos, podem enfrentar desafios (BAO, YÜKSEL & ÇAVUOOFLU, 2007).
Entretanto, pode-se inferir que as dificuldades para a implantação do sistema
APPCC ou outro sistema de controle e garantia de qualidade com bases científicas, devem
se intensificar ao nível do produtor e das indústrias, visto que, na maioria, esses agentes
sofrem com problemas relacionados à falta de informação e capacitação, falta de higiene,
equipamentos e ordenha adequada, má nutrição e que se acentuam nas pequenas
propriedades (SANTOS et al., 2009). Soma-se a esses fatores, problemas inerentes do
Brasil, como a falta de recursos financeiros para subsidiar programas e estabelecer apoio
aos produtores, garantido aos produtores dos países mais ricos, como os da UE e dos EUA,
a fim de criar as condições iniciais à implantação de um programa ou sistema de qualidade
e, assim, garantir que os pequenos produtores sejam mantidos na atividade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A preocupação com a qualidade e a garantia de alimentos saudáveis tem sido
crescente por parte dos consumidores, empresas, instituições públicas e organismos
internacionais. Tais preocupações se justificam pelos problemas que os alimentos
contaminados possam causar à saúde humana.
12
Apesar dos novos esforços para a melhoria da qualidade do leite cru no Brasil, o país
ainda está longe de atender, na sua totalidade, os parâmetros propostos pela normativa e às
necessidades contemporâneas de segurança alimentar. Após dez meses de monitoramento
oficial realizado pela RBQL, mais de 50% das amostras de leite cru analisadas
apresentaram CBT acima dos índices permitidos pela legislação, dando sinal das precárias
condições de higiene e conservação na maioria das fazendas leiteiras do país (DÜRR,
2006). Para o autor, o setor tem que avançar rapidamente caso queira aproveitar as grandes
oportunidades de inserção no mercado internacional de lácteos que se vislumbra.
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Os produtos lácteos, de um modo geral, apresentam um grau de risco à saúde
elevado, devido as suas características de ser altamente perecível e de fácil contaminação.
Exigências de garantia de qualidade, nas diversas dimensões, têm estimulado os
governos à criação de normas, regras e programas para o setor que possam abranger desde
os produtores, passando pela indústria, até a distribuição final.
Um sistema mundialmente aceito, baseado em critérios científicos, e que visa o
controle dos perigos potenciais de contaminação dos alimentos é o APPCC. O governo,
com base nos princípios do APPCC, com vistas à incorporação de todos os elos da cadeia,
incluindo ações de Boas Práticas e buscando a atender às exigências do mercado
internacional e a melhoria da qualidade do leite e derivados, lançou o Programa Alimento
Seguro (PAS).
Porém, os poucos estudos que se preocupam em discutir a implementação e a
investigar a efetividade dos princípios do APPCC, isto é, se quando implementados estes
têm produzido os resultados esperados, revelam que os resultados são qualitativamente
insatisfatórios. Na maioria dos estudos, ao nível de produtor e de indústria, pouco se
avançou com a implementação de sistemas e programas de controle. As causas dos
resultados insatisfatórios estão associados a inúmeras barreiras encontradas na sua
implementação.
Também, constata-se que devido às características de cada país e a fatores internos
e externos às empresas, essas barreiras se ampliam e, em muitos casos, não é
implementado nenhum tipo de programa ou sistema de controle de qualidade.
Porém, conforme bibliografia consultada, fica claro que o Programa APPCC é um
sistema que, se bem aplicado, pode garantir a qualidade e inocuidade dos produtos
alimentícios e, em especial dos lácteos; porém, este não deve ser incorporado às estratégias
das empresas e aos planos dos países como se fosse um receituário e sim, adaptado às
características individuais de cada empresa ou produtor, isto é, ele deve ser construído de
acordo com a especificidades, possibilidades de recursos (financeiros, de mão-de-obra,
equipamentos, etc.) e, principalmente, da disponibilidade de equipes qualificadas.
Essa questão pode ser uma barreira importante a ser considerada no caso do Brasil,
pois os problemas podem ser agravados pela diversidade cultural, financeira e de nível de
conhecimento. Um país grande, com recursos escassos, tem dificuldade de implementar
programas que subsidiem a apropriação de pré-condições necessárias às pequenas
indústrias e pela maioria dos produtores para a implementação efetiva do sistema APPCC.
Fica como recomendação para futuros trabalhos, a investigação dos problemas
enfrentados pelos pequenos produtores e de pequenas indústrias para a garantia de
permanência no sistema e ao mesmo tempo, ser capaz de atender as normas e regulamentos
que visem a segurança alimentar.
REFERÊNCIAS
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