Análise Estatística das Áreas de Contato e Comparação entre
Forças Teóricas e Experimentais entre Grãos e Geomembranas de
PVC após o Ensaio de Dano Mecânico por Compressão
Maruska T. Nascimento da Silva, M. Sc.
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília – Brasília, Brasil
Ennio M. Palmeira, D. Sc.
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília – Brasília, Brasil
RESUMO: A utilização de geossintéticos em obras de proteção ambiental tem crescido bastante nos
últimos anos. Para o melhor desempenho destes materiais como barreiras a líquidos e gases, deve-se
garantir que as geomembranas não sejam danificadas durante a sua instalação e ao longo da vida
útil da obra. Este trabalho apresenta uma análise da distribuição de freqüências das áreas de contato
geradas na superfície de geomembranas quando submetidas a carregamentos de compressão e
comparações entre valores das forças observadas, teóricas e experimentalmente, nas superfícies das
amostras após o ensaio de dano mecânico por compressão realizado no Laboratório de Geotecnia na
UnB. Faz-se também um ajuste de distribuição com os valores das áreas de contato observadas
utilizando-se à curva de Gauss.
PALAVRAS-CHAVE: Geossintéticos, Dano Mecânico, Estatística.
1.INTRODUÇÃO
A utilização de geossintéticos em obras de
proteção ao meio ambiente decorre da
necessidade de proteger o solo e os corpos
d’água subterrâneos, onde serão dispostos os
resíduos sólidos e os efluentes. Porém, para que
os sistemas de impermeabilização funcionem,
deve-se evitar ou minimizar os danos gerados
nas superfícies dos geossintéticos utilizados
nestas obras. O dano mecânico é apenas um dos
fatores que possuem ação deletéria, uma vez
que a investigação da durabilidade desses
geossintéticos deve levar em consideração a
totalidade dos fatores que podem alterar as
propriedades físicas e químicas desses
materiais.
Os
engenheiros
geotécnicos
normalmente têm que tomar decisões com certo
grau de incerteza e, por esse motivo, a análise
estatística pode ser uma ferramenta excelente
para interpretação de resultados obtidos em
laboratório ou no campo. Assim, por meio da
literatura também pode-se recorrer a dados
experimentais e teóricos para servirem de
referência na escolha do geossintético mais
apropriado às condições dos projetos.
2. MATERIAIS E METODOLOGIA
2.1. Material sintético e material granular
utilizado
Utilizou-se neste estudo geomembrana em PVC
(policloreto de vinila) com 0,5, 1,0 e 2,0mm de
espessura e geotêxtil não-tecido, agulhado, com
filamentos contínuos de poliéster, OP 15. Esses
produtos são comumente utilizados em obras de
disposição de resíduos e efluentes, podendo
ainda ser utilizadas em obras hidráulicas.
Os materiais granulares utilizados nos
ensaios foram micro-esferas de vidro e areia
grossa com diâmetros variando entre 0,5 e
2,0mm (Figura 1). O objetivo da utilização das
micro-esferas de vidro foi de simular em
laboratório
areia
grossa
com
grãos
arredondados.
material que passa (%)
Areia Grossa Amarela e Micro-esfera de Vidro
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
0,01
0,1
1
10
d (mm)
Areia Grossa Amarela
Micro-esfera de Vidro
Figura 1 – Curvas Granulométricas da Areia e Microesferas de Vidro.
2.2. Metodologia do Ensaio de Dano Mecânico
por Compressão
O equipamento de Dano Mecânico permite a
aplicação de tensões normais de até 2000kPa
sobre a amostra ensaiada, podendo ainda ser
adaptado para carregamentos maiores. A tensão
vertical é transferida sobre o geossintético por
meio de uma placa rígida sobre um material
granular (Figura 2). A amostra de geossintético
é fixada no plano central do equipamento,
podendo estar sobre solo ou base rígida.
Existem duas conexões, na parte superior e
inferior do equipamento, que permitem a
percolação de fluido ou ar, visando verificar a
ocorrência de vazamento através da membrana
durante ou após os ensaios.
o conjunto solo-geomembrana permaneça com
o carregamento aplicado até a estabilização das
deformações
por
compressão.
Esse
procedimento foi adotado nos ensaios
realizados.
As dimensões e formas das áreas de contato
entre os grãos e as geomembranas foram
obtidas por meio de utilização de papel
alumínio.
Esse equipamento foi projetado e construído
na Universidade de Brasília, confeccionado em
aço inoxidável, conforme mostrado em corte na
Figura 2 (Nascimento,2002).
3. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS
RESULTADOS
3.1. Superfície das geomembranas (e = 1,0mm)
antes e após o ensaio de dano mecânico por
compressão
Observam-se nas Figuras 3, 4 e 5 as superfícies
das geomembranas de PVC com espessura de
1,0mm, antes e depois de ensaios de dano
mecânico por compressão, utilizando-se as
micro-esferas de vidro. Pode-se notar
claramente na Figura 4 as impressões deixadas
pelas
micro-esferas
na
superfície
da
geomembrana (áreas em formato circular) e na
Figura 5 (áreas em formatos variados) as
impressões deixadas pela areia grossa.
P
pistão
12.5
célula
placa rígida
100
solo
60
base
geomembrana
80
Obs.: Dimensões em milímetros.
Figura 2 – Corte transversal do equipamento de dano
mecânico.
Sobre a camada do material granular foram
aplicados tensões de 300, 500 e 1000kPa,
valores
passíveis
de
ocorrerem
em
carregamentos reais em obras de disposição de
resíduos. Nesse tipo de ensaio é importante que
Figura 3– Condições da superfície da geomembrana antes
do ensaio de dano mecânico (escala em milímetros).
Figura 4 – Superfície da geomembrana (PVC) com
0,5mm de espessura após ter sido submetida à tensão de
500kPa (micro-esfera de vidro).
Figura 6 – Superfície da geomembrana (PVC) de 1,0mm
submetida à tensão de 300kPa (areia) com proteção de
geotêxtil.
Figura 5 – Superfície da geomembrana (PVC) com
0,5mm de espessura após ter sido submetida à tensão de
500kPa (areia grossa).
Figura 7 – Superfície da geomembrana (PVC) de 1,0mm
submetida à tensão de 500kPa (areia) com proteção de
geotêxtil.
3.2. Superfície das geomembranas (e = 1,0mm)
com proteção de geotêxtil após o ensaio de
dano mecânico por compressão, para as tensões
de 300kPa, 500kPa e 1000kPa
Em muitos casos utiliza-se geotêxtil como
camada de proteção para a geomembrana,
proporcionando
a
separação
entre
geomembrana e solo. Pode-se observar nas
Figuras 6, 7 e 8 que os efeitos das forças de
contato, geradas durante os ensaios de dano
mecânico, praticamente desaparecem com o uso
da camada de proteção em geotêxtil (gramatura
de 150 g/m2). Utilizou-se um geotêxtil com
pequena gramatura exatamente para se observar
se os materiais granulares submetidos a
esforços de compressão proporcionariam áreas
de contato nas geomembranas semelhantes
àquelas observadas para a situação sem
proteção. A inspeção microscópica permite
notar que o geotêxtil realmente protege a
superfície da geomembrana. Observam-se
apenas ranhuras no papel alumínio colocado
sobre a superfície da geomembrana antes do
ensaio de dano, porém nenhuma área de contato
significativa foi claramente formada.
Figura 8 – Superfície da geomembrana (PVC) de 1,0mm
submetida à tensão normal de 1000kPa (areia) com
proteção de geotêxtil.
3.3. Resultados das distribuições de freqüência
e ajuste segundo a distribuição normal
Após análise da superfície das amostras dos
ensaios de dano, foram observadas 130 áreas de
contato circulares com dimensões variando
entre 0,034 e 0,307mm2, para as amostras que
foram submetidas às tensões de 300kPa, 163
áreas de contato com dimensões variando entre
0,012 e 0,283mm2, para as amostras submetidas
às tensões de 500kPa e 119 áreas de contato
para as amostras submetidas às tensões de
1000kPa com dimensões variando entre 0,018 e
0,865mm2. A partir desses resultados, iniciou-se
(1)
Com o número de classes foram construídas
as distribuições de freqüências, para uma
melhor visualização e aproveitamento dos
resultados. Cabe salientar que a amplitude das
classes foi calculada por meio da diferença
entre o maior e o menor valor de área de
contato observada.
4. RESULTADOS PARA TENSÕES DE
COMPRESSÃO VARIANDO DE 300 ATÉ
1000kPa
0,012 a 0,046 a 0,080 a 0,114 a 0,148 a 0,182 a 0,216 a 0,250 a
0,046 0,080 0,114 0,148 0,182 0,216 0,250 0,283
2
Área (mm )
Distribuição de freqüência
Ajuste da curva segundo a distribuição normal
Figura 10 – Gráfico representativo da freqüência das
áreas de contato geradas na superfície da geomembrana
quando submetida à tensão de compressão de 500kPa.
Histograma representativo das áreas de contato geradas na
superfície da geomembrana (força de compressão = 1000kPa)
0,034 a 0,068 a 0,102 a 0,136 a 0,170 a 0,204 a 0,238 a 0,272 a
0,068 0,102 0,136 0,170 0,204 0,238 0,272 0,307
2
Área (mm )
Ajuste segundo a distribuição normal
45
2,5
40
2
35
Freqüência
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
A Figura 11 apresenta o ajuste de curva segundo
a distribuição normal. Nota-se que não houve
um bom ajuste assim como observado para os
resultados de amostras submetidas às tensões de
500kPa.
Médias das classes
Histograma representativo das áreas de contato geradas na
superfície da geomembrana (força de compressão = 300kPa)
Freqüência
8
7
6
5
4
3
2
1
0
30
1,5
25
20
1
15
10
0,5
5
0
0
0,018 a
0,139
Figura 9 – Gráfico representativo da freqüência das áreas
de contato geradas na superfície da geomembrana quando
submetida à tensão de compressão de 300kPa.
4.2. Resultados para tensões de compressão de
500kPa
Observa-se na Figura 10 que o ajuste
utilizando-se a distribuição normal foi mais
Médias das classes
Percebe-se na Figura 9 que não ocorreu um
bom ajuste entre a curva e a distribuição de
freqüência de dimensões de impressões.
Distribuiçãode freqüência
40
35
30
25
20
15
10
5
0
4.3. Resultados para tensões de compressão de
1000kPa
4.1. Resultados para tensões de 300kPa
45
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Histograma representativo das áreas de contato geradas na
superfície da geomembrana (força de compressão = 500kPa)
Médias das classes
K = 1 + log2n
coerente.
A
curva
ajustou-se
quase
perfeitamente à distribuição de freqüência.
Freqüência
um agrupamento ordenado dos dados. Para
facilitar a análise do comportamento das
amostras após o dano, optou-se em organizar
esses dados agrupando-os em classes. Segundo
Assis et. al (2001) essa quantidade de classes
pode ser obtida por meio da equação abaixo
(Eq. 1).
0,139 a
0,260
0,260 a
0,381
0,381 a
0,502
0,502 a
0,623
0,623 a
0,744
0,744 a
0,865
0,865 a
0,986
2
Área (mm )
Distribuição de freqüência
Ajuste segundo a distribuição normal
Figura 11 – Gráfico representativo da freqüência das
áreas de contato geradas na superfície da geomembrana
quando submetida à tensão de compressão de 1000kPa.
5. COMPARAÇÃO ENTRE FORÇAS DE
CONTATO TEÓRICA E EXPERIMENTAL
NAS
SUPERFÍCIES
DAS
GEOMEMBRANAS
Sabe-se que o contato com os grãos pode causar
danos mecânicos aos geossintéticos. Koerner
(1984) sugere a seguinte equação (Eq. 2) para
obter-se a força requerida (Freq) pelo
geossintético. Essa equação foi proposta para a
obtenção da resistência ao puncionamento
requerida baseada na norma ASTM D4833.
Freq = p’ x da2 x S1 x S2 x S3
(2)
Onde:
p’ = Força aplicada (kN);
da = Diâmetro médio dos grãos que
estarão em contato com o geossintético;
S1 = (e + D50 do solo) / D50 do solo;
D50 = Valor encontrado na curva
granulométrica do solo;
Para areia fofa, e = (γg/ γareia fofa)-1;
Para areia densa, e = (γg/ γareia densa)-1;
γg = Peso específico dos grãos;
S2 = Relação entre o diâmetro médio
encontrado na superfície das amostras após o
ensaio de dano mecânico por compressão e o
diâmetro do solo que é responsável pela
aplicação do carregamento no ensaio;
S3 = Valor entre 0,6 e 0,7;
Para esse estudo, consideramos S3 = 0,65.
John (1986) sugere outra equação (Eq. 3) para
o cálculo da força de contato gerada na
superfície dos geossintéticos.
Fp = 0,79 x D502 x (p – η2 x qr)
(3)
Consideramos: qr = p;
De posse das equações 2 e 3 foram
calculadas as forças de contato teóricas geradas
nas superfícies das geomembranas e
comparadas com as forças de contato médias
estimadas por Nascimento (2002) no ensaio de
dano mecânico por compressão, realizados no
Laboratório de Geotecnia da UnB. Essas forças
de contato são em função da dimensão dos
grãos e das forças normais atuantes e foram
obtidas por meio da análise microscópica da
superfície das amostras após o ensaio de Dano
Mecânico. A Tabela 1 apresenta a comparação
entre esses resultados. Observa-se que os
valores das forças de contato estimadas no
ensaio de dano mecânico foram superiores
(entre 40 e 70%) àquelas calculadas a partir da
equação 3. Enquanto que, comparando os dados
experimentais com os valores obtidos a partir da
equação 2, nota-se que os resultados foram
demasiadamente diferentes (menores). Para as
condições do presente estudo, os resultados
sugerem que as previsões por esta equação são
bastante conservadoras.
Tabela 1 - Comparações entre forças requeridas teóricas e
dados experimentais usando material granular com grãos
arredondados.
Koerner
John
Nascimento
*e
Tensão
(1984)
(1986)
(2002)
(mm)
(kPa)
Teórica
Teórica
Exp.
(kN)
(kN)
(kN)
300
13,8x10-4 1,6x10-4
3,8 x10-4
500
20,9 x10-4 2,7x10-4
4,4 x10-4
0,5
-3
-3
1000
12,8 x10
0,6x10
1,2 x10-3
1,0
300
500
1000
11,0 x10-4
35,1 x10-4
7,3 x10-3
1,6x10-4
2,7x10-4
0,6x10-3
2,7 x10-4
9,2 x10-4
1,2 x10-3
2,0
300
500
1000
28,1 x10-4
38,7 x10-4
5,4 x10-3
1,6x10-4
2,7x10-4
0,6x10-3
3,7 x10-4
4,8 x10-4
1,2 x10-3
* e = Espessura da geomembrana.
Onde:
p = Pressão vertical média atuante sobre
a manta (kPa);
η = Fator de forma dos grãos do material
do aterro,
Para grão arredondados, η = 0,50;
Para grãos angulares, η = 0,25;
A Tabela 2 apresenta a comparação entre os
valores das forças de contato encontradas a
partir das equações 2 e 3 e os valores
experimentais observados no ensaio de dano
mecânico por compressão, para grão angulares.
Percebe-se que o comportamento das amostras
foi semelhante ao observado na Tabela 1, para
grãos arredondados. Comparando os valores das
forças de contato experimentais e às calculadas
segundo a equação 3, estimadas á partir dos
dados experimentais foram em torno de 40 a
60%, maiores que as teóricas.
Tabela 2 - Comparações entre forças requeridas teóricas e
dados experimentais usando material granular com grãos
angulares.
Koerner
John
Nascimento
*e
Tensão
(1984)
(1986)
(2002)
(mm)
(kPa)
Teórica
Teórica
Exp.
(kN)
(kN)
(kN)
300
7,6x10-4
2,1x10-4
5,2 x10-4
500
5,9x10-4
3,5x10-4
7,4x10-4
0,5
-3
-3
1000
11,3x10
0,7x10
1,8x10-3
1,0
300
500
1000
11,0x10-4
35,4x10-4
7,3x10-3
2,1x10-4
3,5x10-4
0,7x10-3
2,7x10-4
9,2x10-4
1,2x10-3
2,0
300
500
1000
8,9x10-4
33,4x10-4
21,2x10-3
2,1x10-4
3,5x10-4
0,7x10-3
4,1x10-4
7,3x10-4
1,8x10-3
* e = Espessura da geomembrana.
6.CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho abordou o estudo de
dimensões de áreas de contato entre grãos de
solo e geomembranas. Em que pesa o número
limitado de resultados, os dados disponíveis
mostraram que a distribuição de dimensões das
áreas de contato grão-geomembrana não seguiu
de forma satisfatória a distribuição normal.
A aplicação da equação para a previsão de
forças de contato grão-geomembrana que,
relacionam diâmetro médio dos grãos, tensão
aplicada, tipo dos grãos (arredondados ou
angulares), entre outros parâmetros, forneceram
valores a favor ou contra a segurança,
dependendo do método considerado. Estes
resultados mostram a necessidade de maiores
pesquisas sobre o assunto.
Os resultados dos ensaios mostraram a
eficácia da utilização de camada de geotêxtil
como elemento de proteção da geomembrana.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Assis, A. P., Espósito, T. J., Gardoni, M. G. & Silva, P. D.
E. A. (2002). Métodos Estatísticos e Probabilísticos
em Geotecnia. Apostila: Publicação G.AP – 002/01,
2.1 – 4.17.
ASTM D4833, 1987. Puncture Resistence. American
Standard Testing Materials, USA.
John, N. W. M. (1986). Geotextiles, Blackie and SonLtd,
London, U.K., 347p.
Koerner, R. M. (1994). Designing with Geosynthetics. 3rd
Ed. Prentice Hall, Englewood Cliffs, New York, 83 p.
Nascimento, M. T. (2002). Avaliação do Dano Mecânico
em Geossintéticos em Obras de Disposição de
Resíduos. Dissertação de Mestrado, Universidade de
Brasília, Publicação G.DM-093A/02,102p.
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