UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS EMPRESAS DE ÔNIBUS NO CASO DE ASSALTO Por: Bruno Rodrigues Vasconcellos Rocha Orientador Prof. Francis Rajzman Rio de Janeiro 2011 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS EMPRESAS DE ÔNIBUS NO CASO DE ASSALTO Apresentação Candido de Mendes monografia como à requisito Universidade parcial para obtenção do grau de especialista em Direito Privado e Civil Por: Bruno Rodrigues Vasconcellos Rocha 3 AGRADECIMENTOS Aos professores e mestres da Universidade Cândido Mendes por todo carinho e conhecimento transmitidos. 4 DEDICATÓRIA Dedica-se aos meus pais, João Luiz e Léa Maria, por tudo que me ajudaram. 5 RESUMO O objetivo deste trabalho é discutir as questões mais relevantes da responsabilidade civil do transportador urbano, principalmente em relação a assaltos no interior dos coletivos. Este estudo é baseado nas leis que regulam a matéria, tais como a Lei das Estradas de Ferro, o Código Civil, a Constituição da República Federativa do Brasil, e o Código de Defesa do Consumidor. Também abordamos a causa de tal delito ter se tornado cada vez mais freqüente, a aplicação das leis de forma eficaz e o entendimento da doutrina e jurisprudência sobre o assunto. Para garantir a qualidade desta obra, mencionamos as principais situações que ocorrem nos casos concretos, bem como os fatores que determinam a responsabilidade civil do transportador em caso de assalto no interior dos coletivos. Portanto, trata-se de uma obra robusta e que ajudará a por fim toda a polêmica existente sobre o tema. 6 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I DO CONTRATO DE TRANSPORTE 11 CAPÍTULO II EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR 20 CAPÍTULO III O ESTADO NA RELAÇÃO DE TRANSPORTE 29 CAPÍTULO IV A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR FRENTE AOS ROUBOS E FURTOS OCORRIDOS NO INTERIOR DOS ÔNIBUS 36 CAPÍTULO V ESTUDO DE CASOS CONCRETOS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR 44 7 CONCLUSÃO 53 BIBLIOGRAFIA 54 ÍNDICE 56 8 INTRODUÇÃO O objetivo deste trabalho é discutir as questões mais relevantes da responsabilidade civil do transportador urbano, principalmente em relação a assaltos no interior dos coletivos. De todos os contratos, nenhum terá maior relevância social e jurídica do que o contrato de transporte. Milhões e milhões de pessoas são transportadas diariamente de casa para o trabalho e vice-versa, principalmente nos grandes centros urbanos, gerando um grande número de problemas sociais e jurídicos, alguns deles até insolúveis. Pode-se dizer que o transporte coletivo urbano tornou-se instrumento fundamental para o cumprimento das funções sociais e econômicas do Estado moderno. Nos países desenvolvidos, com economias estáveis, o transporte urbano é feito preponderantemente sobre trilhos (trens, metrôs,...) responsáveis por 60% da demanda, cabendo ao modo rodoviário, algo em torno de 30%. No Brasil, o transporte sobre trilhos participa hoje, com apenas 6% da demanda diária do transporte coletivo do país. O modal rodoviário, com emprego do ônibus, chega ao percentual de 93%.1 Por incrível que pareça, na primeira metade dos anos 60, quando a economia brasileira era muito mais precária, os investimentos em transporte 1 FILHO, Sérgio Cavalieri.. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.290 9 coletivo representavam cerca de 40% da formação bruta do capital fixo do país. No final dos anos 80, esses percentuais de investimento despencaram para 10% e 1,7%. Daí o estado caótico que se encontra o transporte coletivo no Brasil, obrigando o trabalhador a viajar quatro ou cinco horas diárias, em péssimas condições, para ir ao seu trabalho e voltar.2 De acordo com o ilustre desembargador Sérgio Cavalieri Filho, apenas na região Metropolitana do Rio de Janeiro, para atender a demanda diária de oito milhões de passageiros, os trens suburbanos respondem por apenas 7 %, o metrô por 3%, as barcas por 2 %, cabendo aos ônibus o restante 88%. Cerca de sete milhões de passageiros (a população total da Bolívia) diariamente recorrem aos ônibus para atenderem suas necessidades de trabalho, educação, saúde, consumo, etc. Esse complexo sistema de transporte metropolitano é operado por 200 empresas, empregando uma frota de 15 mil ônibus. Atente-se agora para o que ocorre na grande São Paulo, Recife, Belo Horizonte, Porto Alegre, etc., e se terá idéia da enormidade dos problemas sociais e jurídicos que diariamente ocorrem no campo dos transportes coletivos. É por isso que as ocorrências com os meios de transporte, até já constituem um setor especial da responsabilidade civil. Portanto, torna-se evidente a grande importância dos contratos de transportes realizados com as empresas de ônibus, principalmente para determinar de quem é a responsabilidade dos assaltos em coletivos, tendo em vista que estes tornam-se cada vez mais freqüentes. 2 Ibid. , p 288. 10 No presente trabalho, abordaremos no primeiro capítulo uma visão geral do contrato de transporte, analisando os seus principais elementos e aspectos como a cláusula de incolumidade, a questão do transporte gratuito e a celebração do contrato. No segundo capítulo estudaremos as excludentes de responsabilidade do transportador, citando-as, explicando-as e demonstrando todas as divergências existentes na doutrina e jurisprudência. Já no terceiro capítulo trataremos do Estado na relação de transporte, mencionando os casos em que o mesmo é o responsável pelos assaltos ocorridos no interior dos coletivos, bem como a distinção entre responsabilidade do Estado e a do transportador. No quarto capítulo enfocaremos a responsabilidade do transportador frente aos roubos ocorridos no interior dos coletivos, visto sob a ótica de que se opera uma relação de consumo. Desta forma veremos as noções básicas da responsabilidade civil no CDC, o contrato de transporte, os direitos do transportado, a responsabilidade do transportador e as concessionárias de serviço público, tudo sob a ótica consumerista. Por fim, no quinto capítulo faremos o estudo de casos concretos sobre a responsabilidade civil do transportador, onde apontaremos os mais recentes acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, bem como a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Desta forma demonstrando os principais posicionamentos de nossos tribunais a cerca do tema. 11 CAPÍTULO I DO CONTRATO DE TRANSPORTE De acordo com o art. 730 do Código Civil de 2002 contrato de transporte é aquele em que alguém se obriga, mediante retribuição, a transportar de um lugar para outro, pessoas ou coisas. O contrato de transporte de passageiros é um contrato de adesão, ou seja, suas cláusulas são previamente estipuladas pelo transportador, sem a menor interferência do passageiro que se submete a ela no momento da celebração. É ainda, um contrato consensual, bilateral, oneroso e comutativo, pois para sua celebração basta o simples acordo, cria direitos e obrigações para ambas as partes e há um equilíbrio entre as respectivas prestações. Neste tipo de contrato existem dois contratantes: de um lado o transportador que é quem se compromete a efetuar o transporte e de outro lado o passageiro que é a pessoa que se propõe a ser transportada, pagando certo preço ao transportador. Cabe ressaltar que o bilhete ou passagem não é indispensável para a celebração e caracterização do contrato de transporte, pois este constitui-se em uma fase posterior, que é a fase de execução. O mesmo pode-se dizer do pagamento, que também é fase de execução. O contrato de transporte teve sua origem legal no Decreto n° 2.681 de 7 de dezembro de 1912(conhecido como Lei das Estradas de Ferro) que regula a responsabilidade civil das estradas de ferro. Tal decreto é considerado 12 extremamente moderno para época em que foi promulgado, e consagrou a presunção de culpa da ferrovia nos casos de danos sofridos pelos passageiros em suas linhas. Esta presunção somente pode ser elidida se o transportador provar a culpa exclusiva da vítima, a força maior ou o caso fortuito, conforme expresso no art. 17 do referido diploma legal. Art. 17- As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas: I- caso fortuito ou força maior; II- culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada. Com o passar dos anos, utilizando-se a analogia, a jurisprudência foi aplicando a Lei das Estradas de Ferro, também nos casos de danos ocorridos com bondes, devido à semelhança existente entre estes dois meios de transporte que circulam sobre trilhos. O avanço jurisprudencial foi tanto que passou, posteriormente, a aplicar o referido decreto aos casos de danos envolvendo ônibus, haja vista que também se trata de meio de transporte coletivo, e que também tem uma responsabilidade oriunda do contrato. Hoje em dia a Lei das Estradas de Ferro é aplicada para todos os meios de transportes de pessoas em que a responsabilidade é contratual. Neste sentido cabe destacar o posicionamento do ilustre Washington de Barros Monteiro: “Hoje a doutrina dominante da nossa jurisprudência é no sentido de sustentar que as empresas de transporte, quaisquer que sejam elas, estabeleçam com os seus serviços organizados uma relação jurídica entre si e os seus passageiros, tornando-se responsáveis por todos os danos 13 sobrevindos, pelo fato de assumirem a obrigação de transportar as pessoas, que delas se servem, ao seu destino são e salvas.” 3 Para que se caracterize a responsabilidade do transportador, é necessário que o dano ocorra durante a vigência do contrato, ou seja, no momento em que o passageiro entra na estação de embarque, pede o bilhete ou faz um sinal para o transportador, até o instante em que deixa o veículo e atravessa o portão de saída da estação de desembarque. 1.1 - Da cláusula de incolumidade A principal característica do contrato de transporte de pessoa é a cláusula de incolumidade, que nele está implícita. A cláusula de incolumidade consiste no fato de que o transportador tem o dever de transportar são e salvo o passageiro até o seu lugar de destino, o que significa dizer que, se o passageiro sofrer algum dano durante a viajem a transportadora é responsável. Portanto, a obrigação da empresa transportadora é de fim, isto é, garante o bom êxito, e não de meio, que é a obrigação de tomar todos os cuidados e cautelas para o bom sucesso do transporte. Neste contexto destaca-se o entendimento da festejada autora Maria Helena Diniz: “...a finalidade do contrato de transporte não é apenas o fato material do transporte de uma pessoa ou de uma coisa, mas sim executar uma obrigação de resultado, isto é, a entrega dessa pessoa ou dessa mercadoria no local de destino sã e salva.” 3 4 4 Monteiro, Washington de Barros apud Rodrigues Silvio, Direito Civil, 4°v.,Saraiva, 19ed., p 101 Diniz, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, 7°v, Saraiva, 14ªed, p.391. 14 Da mesma forma cabe destacar o acórdão n° 0000704- 34.2006.8.19.0087 da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, julgado em 17/11/2010: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS PROCEDIMENTO SUMÁRIO -QUEDA SOFRIDA POR PASSAGEIRA MENOR NO INTERIOR DO COLETIVO DA EMPRESA TRANSPORTADORA RÉ - CONTRATO DE TRANSPORTE -RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - CLÁUSULA DE INCOLUMIDADE.Em razão do contrato de transporte, tem a transportadora a obrigação de zelar pela incolumidade do passageiro na extensão necessária a lhe acontecimento funesto. demonstrado.Verba indenizatória princípios da evitar qualquer Nexo que causal atende proporcionalidade aos e razoabilidade.INCAPACIDADE TOTAL TEMPORÁRIA MENOR ESTUDANTE."Tratando-se de menor que estuda e não atingiu a faixa etária em que o trabalho é presumido, não há como se indenizar o período em que ficou impossibilitada normais."JUROS de DE exercer suas atividades MORA.Tratando-se de responsabilidade contratual, os juros moratórios incidem a partir da citação.Precedentes do Superior Tribunal de Justiça Desprovimento do recurso. 15 1.2 – Do transporte gratuito Inicialmente, deve ser feita a distinção entre transporte puramente gratuito e transporte aparentemente gratuito. O transporte aparentemente gratuito é quando o transportador tem algum interesse patrimonial, mesmo que indireto, como no transporte que o patrão oferece a empregada até a casa de praia, do corretor que leva o cliente para ver o imóvel, do carona que divide a gasolina... Em todas estas hipóteses, embora aparentemente gratuito, o transportador tem um interesse patrimonial, desta forma retirando a característica de gratuidade do ato. O mesmo ocorre quando o ônibus transporta crianças com o uniforme da rede pública de ensino ou idosos. É óbvio que a empresa está embutindo o valor das passagens supostamente gratuitas no preço global da tarifa. Sábias são as palavras do festejado desembargador Sergio Cavalieri Filho: “A toda evidência, esse transporte não é gratuito porquanto tem seu custo incluído no valor global da tarifa e repassado aos demais usuários do serviço. Tanto é assim que a empresa transportadora não opera com prejuízo, buscando sempre que necessário, o reajuste das tarifas junto ao Poder concedente, para manter a lucratividade do seu negócio.”5 Portanto, o transporte aparentemente gratuito não possui o elemento de liberalidade que é essencial para caracterizar a gratuidade. Na realidade, o transporte aparentemente gratuito não é gratuito. Transporte gratuito é aquele realizado pelo transportador como uma cortesia, um favor, para atender exclusivamente o interesse do passageiro. A questão do transporte gratuito é muito controvertida na doutrina. Para o ilustre Silvio Rodrigues trata-se de contrato benéfico e para regular tal contrato aplica-se o artigo 392 do CC/2002. 5 Filho, Sergio Cavalieri, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, 5ª ed, p. 312. 16 “Artigo 392 – Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a quem o contrato aproveite e por dolo a quem aquele não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei.” Logo, para o respeitado civilista em caso de inadimplemento, o transportador, que é o contratante a quem o contrato não favorece, responde somente por dolo. O ensinamento do referido doutrinador vai mais além, para ele seria indesculpável eximir-se o transportador de responsabilidade pelo dano causado ao passageiro que ele conduzia gratuitamente quando esse dano derivou de culpa grave de sua parte. Porém, em caso de culpa leve ou levíssima, e aplicando-se a regra do artigo 392 do CC/2002, o transportador que conduz gratuitamente seu passageiro não esta sujeito a reparar. Data vênia, tal posicionamento não nos parece o melhor entendimento e ficamos com aqueles que entendem que transporte gratuito não é contrato. O artigo 736 CC/2002 é claro e não deixa dúvidas de que o transporte feito gratuitamente não se subordina as regras do contrato de transporte. “Artigo 736 – Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia.” 17 De acordo com o respeitável desembargador Sergio Cavalieri Filho, em sua obra Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed, “ transporte puramente 6 gratuito não é transporte.” Também cabe destacar o posicionamento da não menos respeitada doutrinadora Maria Helena Diniz : “Será preciso distinguir o contrato de transporte da condução de pessoa ou de coisa por mera amizade ou cortesia, sem caráter obrigatório, pois nesta hipótese, o transportador terá responsabilidade extracontratual.”7 Diante do exposto, podemos concluir que no transporte gratuito não se aplicam as normas previstas no Título VI do CC/2002, que são as normas de responsabilidade contratual pelo simples fato de não existir contrato de transporte. 1.3 - Da celebração do contrato Pelo fato de ser consensual o contrato de transporte, ele se realiza pela simples manifestação de acordo de vontades. Quando o transeunte faz sinal para que o ônibus pare, ele já esta demonstrando que quer celebrar o contrato com a transportadora e que aceita as condições impostas pela mesma e quando o motorista para o veículo, a empresa demonstra que aceita contratar. 6 7 Ibid, p.313. Diniz op. cit, p.390 18 No momento em que o pedestre começa a subir no ônibus se realiza o contrato e a partir de então, surgem as obrigações para ambas as partes, mesmo que o passageiro ainda não tenha adentrado por completo no veículo. Cabe ressaltar que, imediatamente a celebração do contrato surge a cláusula de incolumidade. Neste sentido, destaca-se o acórdão n°0003779-66.2007.8.19.0210 da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro: APELACAO - 1ª Ementa DES. MALDONADO DE CARVALHO - Julgamento: 15/12/2010 - PRIMEIRA INDENIZATÓRIA. CAMARA CIVEL RESPONSABILIDADE TRANSPORTADOR. QUEDA NO AÇÃO CIVIL DO INTERIOR DE COLETIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. NEXO DE CAUSALIDADE. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO DA VERBA REPARATÓRIA. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. SUCUMBENCIA RECÍPROCA. No contrato de transporte, a cláusula de incolumidade gera obrigação de resultado. Por ser tratar de responsabilidade objetiva, responde o prestador do serviço pelo dano causado ao passageiro, independentemente de culpa. Provado que o acidente se deu durante o percurso contratado, a responsabilidade do transportador tem fundamento na teoria do risco, presente em todo contrato de transporte. Se cada litigante for em parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles 19 os honorários e as despesas. PROVIMENTO PARCIAL DO PRIMEIRO RECURSO (O DO RÉU) PREJUDICADO O SEGUNDO É importante salientar, que a obrigação do transportador termina com o desembarque do transportado. No que tange a execução, cabe à transportadora conduzir o passageiro são e salvo para seu lugar de destino e em relação ao passageiro, cabe a ele pagar o preço da passagem. Portanto, o pagamento já se constitui em fase de execução do contrato e não de celebração, até porque, é bastante comum, em transporte rodoviário o parcelamento da quitação da passagem, isto é, o passageiro faz a viajem, chega ao seu local de destino e no entanto, somente irá pagar sua locomoção depois de alguns dias. Neste caso a execução tem lugar posterior. 20 CAPÍTULO II EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR Primeiramente iremos abordar as excludentes de responsabilidade de forma bastante sintética e superficial para depois adentrarmos nas questões mais relevantes discutidas pela jurisprudência. Como visto anteriormente, no contrato de transporte está implícita a cláusula de incolumidade, O transportador tem uma obrigação de resultado, ou seja, levar o viajante são e salvo ao seu destino. Se o passageiro sofrer algum dano basta provar que o acidente se deu no curso da viagem que este terá direito a indenização. Ocorre que existem algumas causas que excluem a responsabilidade do transportador as quais são chamadas de excludentes de responsabilidade, a saber: fato exclusivo do passageiro, fato exclusivo de terceiro, caso fortuito e força maior. 2.1 - Do fato exclusivo da vítima Tal excludente de responsabilidade ocorre quando o evento danoso advém do próprio comportamento do passageiro, ou seja, a própria vítima deu causa ao dano, não podendo atribuir se não a ela a responsabilidade pelo evento, pois não há nenhum nexo causal entre o dano e a atividade da empresa transportadora. A viagem é a ocasião e não a causa do dano. Foi o passageiro que deu causa ao dano e não o transportador. 21 Em se tratando de contrato de transporte, não se vislumbra a hipótese de culpa concorrente do transportador como excludente de responsabilidade. É necessário que somente o viajante dê causa ao acidente. Se concorrer culpa do transportador e do transportado, haverá o dever de indenizar, mesmo que de forma atenuada. A lei das Estradas de Ferro em seu artigo 17, inciso II é clara ao prevê que somente a culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada é que exonera a responsabilidade. Art. 17- As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas: III- caso fortuito ou força maior; IV- culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada. Portanto para haver excludente de responsabilidade é necessário que a culpa da vítima seja a única e exclusiva causa do fatídico. 2.2 - Do fato exclusivo de terceiro O fato de terceiro ocorre quando um indivíduo estranho ao passageiro e ao transportador causa dano a aquele. O comportamento do terceiro é a causa exclusiva do prejuízo, inexistindo qualquer relação de causa e efeito entre a conduta do suposto agente causador do dano e da vítima. O verdadeiro 22 causador do dano é o terceiro, não havendo dever de indenizar da transportadora. O ilustre doutrinador Silvio Rodrigues ensina que: “ ...o fato de terceiro, para excluir por inteiro a responsabilidade do causador direto do dano, há que se vestir de características semelhantes as do caso fortuito, 5 sendo imprevisível e irresistível.” Torna-se mister salientar que no artigo 17 do Decreto n° 2.681/1912 o fato de terceiro não é excludente de responsabilidade, devendo o transportador indenizar a vítima. Não se pode deixar de mencionara súmula 187 do STF que posteriormente foi positivada pelo Código Civil de 2002 em seu artigo 735. Diz a súmula: “a responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.” 2.3 - Do caso fortuito e da Força maior O caso fortuito e a força maior geram uma grande discussão na doutrina sobre suas diferenças. O Código Civil, em seu artigo 393 parágrafo único, admite como sendo sinônimas tais expressões, ao determinar que o 23 caso fortuito ou a força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. Data máxima vênia não podemos admitir tal posicionamento, pois conforme salienta Sérgio Cavalieri Filho: “...estaremos em face do caso fortuito quando se tratar de evento imprevisível, e por isso inevitável; se o evento for inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato superior as forças do agente , como normalmente são os 6 fatos da natureza... estaremos em face da força maior...” Portanto, o que caracteriza o caso fortuito é a imprevisibilidade e o que caracteriza a força maior é a inevitabilidade. 2.4-O assalto a ônibus previsível ou imprevisível ? Muito se tem discutido a cerca da previsibilidade ou não dos assaltos ocorridos no interior dos coletivos. Certo é que existem dois posicionamentos; um defendido pelas empresas transportadoras e o outro pelas vítimas de tais ilícitos. Os primeiros são partidários da tese de que tais ocorrências são imprevisíveis, desta forma não gerando responsabilidade para elas, ou se são previsíveis são inevitáveis, e diante disto, expõe vários argumentos que nem 5 Rodrigues, Silvio, Direito Civil , v. 4, 19 ed, p.173 24 sempre são aceitos pelo nosso Tribunal de Justiça, como por exemplo: o preço da passagem é tarifado pelo poder público, logo torna-se inviável, economicamente, contratar uma firma de segurança para proteger todos os veículos da frota; que trata-se de fato de terceiro, que não guarda conexidade com a atividade desempenhada pela empresa, caracterizando desta forma o fortuito externo o qual também não gera responsabilidade; que o Poder de Polícia é indelegável pelo Estado, assim sendo impossível proceder-se em revista em todos os passageiros que adentram nos coletivos; e que o assalto a coletivos representam caso fortuito ou força maior, logo inexistindo o dever de indenizar. Para tal entendimento a assalto realizado no interior dos coletivos é causa estranha a realização do contrato de transporte, configurando o chamado fortuito externo que exclui a responsabilidade da empresa. Para os adeptos deste entendimento, os assaltos a mão armada são previsíveis, mas sem dúvida, quando ocorrem são inevitáveis, não dispondo a concessionária de serviço coletivo, do Poder de Polícia para realizar policiamento interno, o que lhe possibilitaria a proceder em “buscas” e “revistas” aos passageiros, para saber se ingressaram ou não armados no ônibus. Neste sentido cabe destacar a apelação cível nº 2003.001.02442, julgada pela 3ª Câmara Cível do TJ/RJ: Como já comentado, inexiste possibilidade de vistoria pessoal dos passageiros. Para isso deveria haver seguranças numerosos, de ambos os sexos e bem treinados. Durante a viagem, outros seguranças deveriam ficar no interior dos coletivos, do ponto inicial ao final, em revezamento. E todos eles teriam que ser de grande 6 Filho, Sérgio Cavalieri , Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed, p. 84 25 rapidez e habilidade na prática de tiro e arte de luta; porque, falhando até por pouco, ferimentos ou morte de passageiros também poderiam acontecer. Situação vista utópica em nossa realidade. Mesmo porque tais “seguranças de elite” teriam de ser bem remunerados ao depois de bem selecionados; tudo importando em ônus financeiros pesados, que por seu turno encareceriam as tarifas, ou compeliriam o poder público, já com verbas apoucadas, a despender grandes valores em subsídio. Por outro lado, as vítimas dos eventos danosos alegam que as empresas de ônibus têm, em virtude do contrato de transporte, que é um contrato de fim, o dever de transportar incólume, ou seja, são e salvo os seus passageiros, até o local de desembarque. Se marginais ingressam no interior dos coletivos e praticam assaltos vitimando passageiros, está evidente a obrigação da transportadora, haja vista que falhou na obrigação assumida. O assalto não mais a exime de sua responsabilidade, pois nos dias atuais tais delitos são tão corriqueiros e notórios que acabam afastando a ocorrência dos requisitos do caso fortuito e da força maior que são a imprevisibilidade e inevitabilidade. Somos que, sem medo de adotar um posicionamento minoritário, o transportador deve prestar um serviço seguro, o que não vem ocorrendo nos dias atuais. Desta forma este se sujeita a responsabilização referente a danos causados aos passageiros. O desleixo das transportadoras com seu consumidores é tão grande que acaba por incentivar a prática de tais infrações, em virtude da facilidade de praticá-las, portanto, devem elas serem responsabilizadas para providenciarem uma maior segurança aos passageiros. 26 Caso fortuito e força maior são causas excludentes da responsabilidade do transportador devido à imprevisibilidade e inevitabilidade, ocorrendo tais causas inexiste o dever de indenizar. Cabe ressaltar que nos dias atuais o assalto à ônibus é mais que previsível, devendo as transportadoras tomarem medidas para evitá-los ou então criar um seguro a fim garantir a indenização das vítimas destes ilícitos. 2.5-Fato de terceiro gera o dever de indenizar para as transportadoras? Tal questão também gera inúmeras discussões. Uns dizem que o fato de terceiro não gera o dever de indenizar, outros dizem que gera dever de indenizar sim. A fundamentação para quem entende que não gera o dever de indenizar é o inciso II, § 3° do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que expressamente exclui a responsabilidade do fornecedor pelos danos causados ao consumidor na hipótese de culpa exclusiva de terceiro, dispositivo este que evidentemente também se aplicaria ao caso de dolo. Não se configura na hipótese, a responsabilidade das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público, prevista no §6° do art. 37 da CF, eis que do próprio teor de tal dispositivo se verifica que só existe responsabilidade quando o ato danoso é praticado por agente da pessoa jurídica, ainda que sem culpa, sendo que no caso trata-se de ato praticado por terceiro. Alegam que o fato de terceiro que não exonera o transportador da responsabilidade é aquele que guarda conexidade com o transporte, inserindose nos riscos próprios do deslocamento dos veículos, não considerando-se, assim, quando acontece fato inteiramente estranho, como ocorre em caso de assalto. Dizem que inexiste nexo causal entre o comportamento de terceiro e a 27 atividade de transporte, equiparando-se o roubo no interior do ônibus, a hipótese de fortuito externo, inevitável para ela, que não possui Poder de Polícia. O assalto a ônibus constituiria fortuito externo, não podendo a empresa de transportes coletivos ser responsabilizada por fato de terceiro, mesmo sendo a sua responsabilidade classificada como objetiva. É objetiva fundada no risco administrativo, e não na teoria do risco integral. Assim cabendo, perfeitamente a exclusão da responsabilidade pelo caso fortuito. Cabe ressaltar, a apelação cível do TJRJ n°0028026- 64.2009.8.19.0203: TRANSPORTE PASSAGEIRO. COLETIVO. EVENTO NÃO ASSALTO A RELACIONADO AO RISCO NORMAL DO NEGÓCIO. OCORRÊNCIA DE FORTUITO EXTERNO, A AFASTAR A RESPONSABILIDADE CIVIL. DÁ-SE PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E NEGA-SE SEGUIMENTO AO SEGUNDO RECURSO, NOS TERMOS DO ART. 557, DO CPC. DES. VERA MARIA SOARES VAN HOMBEECK - Julgamento: 13/12/2010 - PRIMEIRA CAMARA CIVEL Agora para quem entende que o fato de terceiro gera responsabilidade para as empresas, sustentam o seguinte posicionamento: A invocação de culpa de terceiro não extingue a responsabilidade da transportadora conforme Súmula 187 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: 28 “A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente do passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.” Acrescente-se ainda que o fato de terceiro, caracterizador do fortuito, não elide a responsabilidade das empresas de ônibus, que na condição de permissionárias de serviço público de transporte respondem objetivamente por danos causados aos passageiros em decorrência da sua própria atividade. “O fato de terceiro não serve de arredar a cláusula de incolumidade física do passageiro que ao ingressar no coletivo, firma contrato de transporte, que tem por escopo levá-lo ao destino da viagem com suas normais e regulares condições de vida. O dolo de terceiro jamais se presta a elidir a responsabilidade do transportador, pois que é previsível, e passa a estar diretamente relacionado com o fato do transporte.” APELAÇÃO CÍVEL N° 2002.001.18318 Os assaltos aos ônibus, hoje em dia, são tão corriqueiros, freqüentes, comuns e previsíveis que até mesmo os menos desavisados, antes de adentrar no coletivo, procuram esconder o relógio, pulseiras, celular ou qualquer outro objeto que possa, por ventura, aparentar ter algum valor, mesmo que seja apenas um utensílio sem nenhum quantum econômico. 29 CAPÍTULO III O ESTADO NA RELAÇÃO DE TRANSPORTE 3.1.-Em que sentido encontramos licitude na imputação da responsabilidade civil do Estado em relação aos assaltos ocorridos no interior dos coletivos? A responsabilidade do Estado existe quando se trata de ato praticado por servidor contratado, funcionário de fato ou temporário. Para a vítima é indiferente o título pelo qual o causador direto do dano esteja vinculado à Administração; o necessário é que se encontre a serviço do Poder Público, embora atue fora ou além de sua competência administrativa.8 São agentes públicos desde as mais altas autoridades até os mais modestos trabalhadores que atuam pelo aparelho estatal. Cabe agora analisar a relação existente entre o ato do agente e o serviço público. O mínimo necessário para determinar a responsabilidade do Estado é que o cargo tenha influído o ato, ou que a condição de funcionário tenha sido a oportunidade para a prática do ato ilícito. Sempre que a condição de agente do estado tiver contribuído de algum modo para a prática do ato danoso, ainda que simplesmente lhe proporcionado a oportunidade para o comportamento ilícito, responde o Estado pela obrigação de ressarcir. Não se faz necessário, que o exercício da função constitua a causa do evento danoso; basta que ela ministre a ocasião para praticar. O fundamento da responsabilidade estatal é garantir uma equânime repartição dos ônus provenientes de atos ou efeitos lesivos, evitando que 8 MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 28ª ed, Malheiros, p. 627 30 alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião ou por causa de atividades desempenhadas no interesse de todos. 9 Duas outras conclusões podem ser extraídas do texto constitucional em exame (art. 37, §6º CF). O Estado só responde pelos danos que os seus agentes nessa qualidade, causem a terceiros. O dispositivo está a evidenciar que o constituinte adotou expressamente a teoria do risco administrativo como fundamento da responsabilidade da Administração pública, e não a teoria do risco integral, portanto condicionou a responsabilidade objetiva do Poder Público ao dano decorrente da sua atividade administrativa, isto é, aos casos em que houver relação de causa e efeito entre a atividade do agente público e o dano. Sem essa relação de causalidade, não há como nem por quê responsabilizá-lo. Importa dizer que o Estado não responderá pelos danos causados a outrem pelos seus servidores quando não estiverem no exercício da função, nem agindo em razão dela. Não responderá, igualmente, quando o dano decorrer de fato exclusivo da vítima, caso fortuito, ou força maior e fato de terceiro, por isso que tais fatores, por não serem agentes do Estado, excluem o nexo causal. É que, deslocada a questão para o plano da causalidade, qualquer que seja a qualificação que se pretenda atribuir ao risco como fundamento da responsabilidade objetiva do Estado, aos tribunais se permite a exclusão ou atenuação daquela responsabilidade quando fatores outros, voluntários ou não, tiverem prevalecido na causação do dano provocando o rompimento do nexo de causalidade. 10 Cabe transcrever ementa do acórdão da apelação cível do processo nº 2003.001.21887 proferido pela 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro no famoso caso que foi televisionado ao vivo por vários canais de televisão, retratado no cinema e ficou conhecido como o caso do ônibus 174, em que a passageira Geisa foi utilizada como escudo humano 9 MELLO, Celso Bandeira de, Curso de Direito Administrativo, 15º ed, Malheiros, p. 866 CAHALI, Yussef, Responsabilidade Civil do Estado, p 41 10 31 pelo assaltante e que por uma atitude no mínimo desastrosa de um policial, causou a morte da refém, sendo desta forma o Estado responsabilizado pelo fatídico: “APELAÇÃO. Ordinária de reparação de danos materiais e morais. Ação policial de que resultou a morte de passageira de ônibus, tomada como refém por assaltante. O fato, comprovado, de que este disparou os tiros que produziram o resultado não elide a responsabilidade estatal pela ação miliciana, que deu causa à reação do malfeitor e à morte da refém. Dano material bem afastado, posto não haver prova de dependência econômica do pai, autor da demanda, em relação à filha, vitimada. Dano moral caracterizado, quer se analise o episódio sob o prisma da responsabilidade subjetiva (o agente policial foi imprudente e imperito ao tentar dominar o assaltante enquanto este fazia da passageira escudo) ou objetiva (a ação policial funcionou defeituosamente, independentemente de culpa do agente). Se, como pondera o Estado, o criminoso mostrava "personalidade irracional", maior o motivo para que os agentes policiais redobrassem a prudência, inaceitável a tese de que, agindo em legítima defesa da vítima, poderiam fazê-lo de modo impetuoso e arriscado. Provimento parcial do recurso, para, sopesadas as circunstâncias do caso, reduzir-se o valor arbitrado, de cem mil para cinqüenta mil reais. Honorários devidos na forma dos artigos 20, § 4º e 21, parágrafo único, do CPC.” 32 Nota-se claramente que no acórdão transcrito, o agente do Estado (no caso o policial) foi quem deu a causa adequada à morte da vitima, haja vista que se o mesmo não tivesse se precipitado em tentar atingir o meliante, de forma completamente errônea, este não teria atirado em seu escudo humano, ou seja, na vítima. 3.2-– Distinção entre a responsabilidade civil do Estado e a responsabilidade civil das transportadoras. Quais as implicações face ao Direito Positivo? A distinção entre a responsabilidade do Estado e das empresas de ônibus se faz porque estas empresas de Direito Privado, prestadoras de serviço público, respondem em nome próprio, com seu patrimônio e não o Estado com elas e nem por elas, como pode ser percebido diante da análise dos fatores a baixo mencionados: ● O artigo 37 §6º da CF estende aos prestadores de serviço público a responsabilidade objetiva idêntica a do Estado; ● As pessoas prestadoras de serviço público têm personalidade jurídica, patrimônio e capacidade próprios, portanto são seres distintos do Estado, com direitos e obrigações em relação as suas condutas e omissões, assim devendo responder por seus atos; ● Não se pode falar em responsabilidade solidária por que esta advém da lei ou do contrato, não existindo nenhuma previsão legal quanto a solidariedade nestes casos. Muito pelo contrário, o artigo 25 da lei 8.987/95, que dispões sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, estabelece a responsabilidade pessoal e direta, da concessionária por todos os prejuízos causados a terceiros, aos usuários e ao poder concedente; 33 ● O que pode haver, é a responsabilidade subsidiária do Estado em virtude do artigo 42 da Lei das Sociedades por ações, que prevê expressamente que a pessoa jurídica controladora da sociedade de economia mista responde subsidiariamente pelas suas obrigações. Neste sentido, o Estado responde apenas subsidiariamente, uma vez exauridos os recursos da entidade prestadora de serviço público. Se o Estado escolheu mal aquele a quem atribuiu a execução de serviços públicos, deve responder subsidiariamente caso o mesmo se torne insolvente. 11 Por outro lado, há vozes na doutrina com entendimento contrário. Há quem entenda que, a prestação de serviço constitui relação de consumo, o que atrai para tais hipóteses a disciplina dos acidentes de consumo e, de modo geral, a solidariedade dos diversos entes públicos e privados que se apresentem como fornecedores dos respectivos serviços prestados (direta ou indiretamente) pela atividade estatal. 12 Na teoria, cabe a quem aufere o lucro arcar com o prejuízo, ocorre que por muitos anos não foi isso que se praticava. Empresas privadas, prestadoras de serviço público, por ausência de dispositivos legais que impusessem o dever de indenizar, quando ocorria algum dano aos administrados, deslocavam a responsabilidade para o Estado, assim esquivando-se do dever que lhe competia, desta forma atribuindo a este os prejuízos e as concessionárias ficavam com o lucro. Com o advento da Constituição Federal de 1988, em seu artigo 36, § 6º foi criada a responsabilidade subsidiária do Estado, que não exclui sua responsabilidade, mas o coloca em situação subsidiária, ou seja, este só responde se a concessionária não tiver patrimônio suficiente para pagar a indenização, portanto impõe a prestadora de serviço responsabilidade, sem excluir do Estado a culpa in eligendo. 11 12 FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil, 5º ed, p.253 TEPEDINO, Gustavo, Temas de Direito Civil, Renovar, 1999, p.197 público a 34 Destaca-se o posicionamento do professor José Maria Pinheiro Madeira que diz que se o concessionário ficar insolvente e impossibilitado de responder pelo dano, como atuava em nome do Estado, este terá responsabilidade subsidiária (não solidária). 13 Note-se que, a concessão de serviço público não diminui a responsabilidade do poder concedente, pois este ainda terá que averiguar se a concessionária está prestando o serviço na forma da qual foi estipulada no contrato, isto é, se os direitos, garantias e obrigações do usuário estão sendo respeitados, se a tarifa está no valor ajustado, se os critérios, os parâmetros, e os indicadores de qualidade, expansão e modernização, se as regras e as condições do serviço estão sendo cumpridas etc. A questão da concessão, encontra-se constitucionalmente regulada em seu artigo 175, abaixo transcrito: Art. 175- Incube ao Poder Público, na forma da lei, diretamente sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único- a lei disporá sobre: I- o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e recisão da concessão ou permissão; 13 II- os direitos dos usuários; III- a política tarifária; Madeira, José Maria Pinheiro, Administração Pública Centralizada e Descentralizada, 2ª ed, p.576 35 IV- a obrigação de manter serviço adequado;” Neste contexto, é importante trazer a baila o artigo 25 da Lei 8987/95, que reza : “Incube a concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade.” Em suma, o Estado responderá subsidiariamente, ou seja, quando o transportador não possuir bens suficientes para indenizar o dano do passageiro, e não solidariamente, pois se assim fosse, a vítima do fatídico poderia ajuizar demanda contra o Estado e a empresa transportadora em litisconsórcio, ou antes mesmo de impetrar contra o transportador poderia acionar o Estado, situação esta que não é cabível. 36 CAPÍTULO IV A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR FRENTE AOS ROUBOS E FURTOS OCORRIDOS NO INTERIOR DOS ÔNIBUS 4.1-Noções básicas sobre a responsabilidade civil do transportador no CDC 4.1.1 O contrato de transporte visto como relação de consumo Diante da análise dos artigos 2° e 3º ambos do CDC, torna-se evidente que a relação existente entre os passageiros e as empresas transportadoras é uma relação consumerista, ou seja, uma relação que está sob a égide do Código de Defesa do Consumidor (lei n˚ 8.078/1990), haja vista que os passageiros se enquadram perfeitamente na figura descrita no primeiro dispositivo mencionado e as transportadoras no segundo. Art 2ª CDC: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” Art. 3º CDC: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços: 37 §2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitárias, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.” Entendemos por consumidor qualquer pessoa física ou jurídica, que isolada ou coletivamente, contrate para consumo final, em benefício próprio ou de outrem, a aquisição ou locação de bens, bem como a prestação de um serviço. 14 Fala ainda o artigo 3º do Código de proteção ao Consumidor que o fornecedor pode ser público ou privado, entendendo-se no primeiro caso o próprio Poder Público, por si ou então por suas empresas públicas que desenvolvem atividade de produção, ou ainda as concessionárias de serviço público; sobrelevando-se salientar neste aspecto que um dos direitos dos consumidores expressamente consagrados pelo art. 6º, mas precisamente em seu inc. X, é a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. Em síntese, o transporte de passageiros executado por empresas permissionárias ou concessionárias de serviço público é uma atividade com fins lucrativos inserida no mercado de consumo. Portanto, o transporte de passageiro pode perfeitamente ser enquadrado no CDC, mormente com o expresso no artigo 22 do referido diploma legal. Art.22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra 14 Filomeno, José Geraldo Brito. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do ante projeto. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.31. 38 forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados. eficientes, seguros, e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e reparar os danos causados, na forma prevista neste código. 4.1.2 Os direitos assegurados pelo CDC ao transportado O principal objetivo do Código de Defesa do Consumidor é garantir a efetiva reparação de todo e qualquer dano sofrido pelo consumidor, que é a parte mais fraca na relação, em decorrência da conduta do fornecedor. Reza o artigo 6º, inc. I do CDC que: Art. 6º São direitos básicos do consumidor : I- a proteção à vida , saúde e segurança, contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos. Portanto, têm os consumidores inegável direito de não serem expostos a perigos que atinjam sua incolumidade física; devendo a transportadora zelar pela total segurança dos seu passageiros, inclusive, nos casos de assaltos no interior de seus veículos. 39 Já que se trata de relação de consumo, devem ser aplicadas todas as regras contidas neste código, respeitando os direitos de proteção à vida, à saúde e à segurança; a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais individuais, coletivos e difusos, bem como, aplicar a inversão do ônus da prova... etc. 4.2- Da responsabilidade da transportadora frente ao CDC Diante da simples leitura do CDC, nota-se que este prevê expressamente e de forma clara, em inúmeros artigos, que o prestador de serviço deve zelar sempre pela segurança dos consumidores, prestando um serviço eficiente e sem nenhum risco. Cabe mencionar que o fornecedor de serviços responde, independente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços. Com a simples leitura do artigo14 do CDC percebe-se facilmente que o fornecedor responde independente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, ou seja, não há que se falar em culpa, tendo o CDC adotado a teoria da Responsabilidade Civil Objetiva. O principal elemento adotado pelo CDC é a ausência da apuração da culpa do fornecedor, desta forma não se valorando o comportamento. Cabe ressaltar que, desde antes do advento da Constituição Federal de 1988 o saudoso Hely Lopes Meirelles, bem como o festejado autor Celso Antônio Bandeira de Mello já admitiam estender a responsabilidade objetiva as concessionárias e permissionárias de serviço público, e a justificativa para tal extensão era que quem tem o bônus deve arcar com o ônus. 40 O próprio artigo 14 em seu parágrafo 1º expressamente define o que é serviço defeituoso e no parágrafo 3º menciona as possibilidades do fornecedor não ser responsabilizado. Art. 14, §1º - O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I- o modo de seu fornecimento; II- o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam ; III- a época em que foi fornecido. §3-O fornecedor de serviço só não será responsabilizado quando provar : I- que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II- a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Neste sentido é importante mencionar que o CDC acrescentou o fato de terceiro às três causas de exclusão de responsabilidade previstas na Lei das Estradas de Ferro (Decreto nº 2.861/1912). Antes do advento do Código de defesa do Consumidor a responsabilidade do transportador somente era elidida pela ocorrência de caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima, que são as causas que 41 excluem o nexo causal, existindo qualquer um desses fatores não surge o dever de indenizar, conforme o artigo 17 da Lei das Estradas de Ferro. Art. 17- As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas: V- caso fortuito ou força maior; VI- culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada. Atualmente, o CDC incluiu o fato de terceiro como causa de exclusão da responsabilidade. Cabe mencionar que, a doutrina e jurisprudência têm dividido o caso fortuito em dois, ou seja, o fortuito externo e o fortuito interno, sendo que aquele não gera o dever de indenizar e este gera sim o dever de indenizar. O fortuito interno é aquele que embora imprevisível guarda conexidade com a atividade desempenhada pelo transportador, como por exemplo o mau súbito do motorista ou o estouro de um pneu. Já o fortuito externo é aquele que não tem nenhuma relação com a atividade desempenhada pelo transportador e é considerado inevitável como, por exemplo, os eventos da natureza. Voltando ao CDC, é preciso analisar se o referido código derrogou a lei das Estradas de Ferro em seu artigo 17. Com um estudo mais aprofundado nota-se que não existe nenhum tipo de incompatibilidade entre as duas leis, e que a lei nova não determina expressamente a derrogação do Dec. 2.861/12, 42 apenas acrescenta mais uma causa de excludente de responsabilidade. Portanto as duas leis continuam em vigor, podendo ser aplicadas simultaneamente ao caso concreto. Sempre se entendeu que a responsabilidade civil do transportador é objetiva em razão do disposto no artigo 17 da Lei das Estradas de Ferro. Logo, o artigo 14, §3º do CDC não trouxe grandes novidades, apenas instituiu a relação existente entre passageiro e transportador como sendo relação de consumo. 4.3- As concessionárias de serviço público frente ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor Dispõe o artigo 22, caput e parágrafo único do CDC, que as permissionárias ou concessionárias de serviço público são obrigadas a fornecerem serviços adequados, eficientes e seguros, e no caso de descumprimento destas obrigações, serão as mesmas obrigadas a reparar os danos causados. Art. 22- Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias, ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código. 43 Além da União, Estados, Municípios, e Distrito Federal, estão envolvidas as respectivas autarquias, fundações, sociedades de economia mista, empresas públicas, inclusive as concessionárias ou permissionárias de serviço público. Todas estas entidades são obrigadas a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. 15 Portanto, as empresas transportadoras, as quais são concessionárias de serviço público, diante da regra expressa no art. 22 do CDC são plenamente responsáveis pela segurança de seus passageiros. 4.4- Da prescrição O Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 27 determina o prazo de 5 anos como sendo o prazo prescricional para a propositura da ação de reparação pelos danos causados pelo fato do serviço. Art. 27- Prescreve em cinco anos a pretensão pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na seção II deste capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. Tal questão é controvertida, pois o Código Civil estabelece em seu artigo 203, §3º,V o prazo de 3 anos. Entendemos que, se a vítima propuser a ação com base no artigo 186 do CC/2002, a prescrição será a do Código civil. Por outro lado, se a vítima invocar a condição de consumidor, o prazo será de cinco anos. 15 15 Ibid, p. 196 44 CAPÍTULO 5 ESTUDO DE CASOS CONCRETOS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR 5.1 No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro 0028026-64.2009.8.19.0203 - APELACAO - 1ª Ementa DES. VERA MARIA SOARES VAN HOMBEECK Julgamento: 13/12/2010 - PRIMEIRA CAMARA CIVEL TRANSPORTE COLETIVO. ASSALTO A PASSAGEIRO. EVENTO NÃO RELACIONADO AO RISCO NORMAL DO NEGÓCIO. OCORRÊNCIA DE FORTUITO EXTERNO, A AFASTAR A RESPONSABILIDADE CIVIL. DÁ-SE PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E NEGA-SE SEGUIMENTO AO SEGUNDO RECURSO, NOS TERMOS DO ART. 557, DO CPC. 0019790-17.2001.8.19.0038 - APELACAO - 1ª Ementa DES. CUSTODIO TOSTES - Julgamento: 18/11/2010 PRIMEIRA CAMARA CIVEL RESPONSABILIDADE COLETIVO. CIVIL. ÓBITO RESPONSABILIDADE DE DA RÉ ASSALTO EM PASSAGEIRO. ELIDIDA PELA 45 CONSTATAÇÃO DE EXCLUDENTE, POIS CARACTERIZADO FORTUITO EXTERNO. EVENTO NÃO RELACIONADO AO RISCO NORMAL DO NEGÓCIO, NÃO PODENDO SER CONSIDERADO COMO EVITÁVEL E INERENTE AO SERVIÇO DE TRANSPORTE, EVENTO, QUE MAS NÃO FOI A CAUSA DO APENAS SUA OCASIÃO. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO ASSUMIDA COM RELAÇÃO À PROMOÇÃO DA SEGURANÇA DOS PASSAGEIROS, CUJO DEVER PERMANECE COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ENTENDIMENTO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DESPROVIMENTO LIMINAR DO RECURSO. 0008201-97.2006.8.19.0023 - APELACAO - 1ª Ementa DES. ROBERTO GUIMARAES - Julgamento: 14/07/2010 - DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E CONTRATUAL DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTES. INTELIGÊNCIA DO ART. 37, §6° DA CRFB. ASSALTO A ÔNIBUS. VIOLAÇÃO DA CLÁUSULA DE INCOLUMIDADE. TEORIA DO RISCO PROVEITO.1-A Constituição da República, em seu artigo 37, § 6º, adotou a teoria da responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos, onde, na caracterização do dever de reparar, basta o nexo de 46 causalidade entre o evento lesivo e a ação do ente público. 2-No caso de contrato de transporte coletivo, a presunção de responsabilidade do transportador, em virtude da cláusula de incolumidade, é tão forte que somente o caso fortuito externo, ou seja, aquele fato estranho à organização do negócio, exonera o dever de indenizar.3-O transportador, através do contrato de transporte, de caráter oneroso e não formal, tem a obrigação de levar o passageiro e as coisas transportadas incólumes ao seu destino, já que ele em regra, obtém uma vantagem, um contra-prestação por essa sua atividade.4-Reforma da sentença para condenar a empresa ré ao pagamento ao autor de indenização por danos morais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), acrescida de correção monetária a partir deste julgado e de juros legais de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação.5-Provimento do recurso. Tipo da Número Ação: do APELAÇÃO Processo: CÍVEL 2003.001.25977 Órgão Julgador: DÉCIMA CÂMARA CÍVEL AÇÃO INDENIZATÓRIA. MORTE DE ASSALTO PASSAGEIRO. EM ÔNIBUS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA CONCESSIONÁRIA. DANOS MORAIS E PENSIONAMENTO DEVIDOS À VIÚVA E À FILHA DA PROVIDO. VITIMA. RECURSO PARCIALMENTE 47 0009441-63.2006.8.19.0204 (2008.001.44432) - APELACAO - 1ª Ementa DES. NAGIB SLAIBI - Julgamento: 03/12/2008 - SEXTA CAMARA CIVEL Direito Civil. Passageiro. Rito Vítima sumário. fatal. Responsabilidade Roubo no civil. ônibus. Habitualidade.Comprovação do nexo de causalidade e do dano. Responsabilidade objetiva neste caso concreto. Os testemunhos revelam que roubos são freqüentes na linha de ônibus. Havendo habitualidade de roubos na linha, no trajeto do ônibus, deve a concessionária se precaver para dar segurança aos seus passageiros, afinal tem responsabilidade pela incolumidade do passageiro até o seu destino. RESPONSABILIDADE CIVIL. Transporte coletivo. Assalto. Responsabilidade da empresa transportadora. O assalto a cobrador de ônibus não é fato imprevisível nem alheio ao transporte coletivo, em zona de freqüentes roubos, razão pela qual não vulnera a lei a decisão que impõe à empresa a prova da excludente da responsabilidade pela morte de um passageiro.Precedente desta Quarta Turma (REsp nº 50.129/RJ, rel. Ministro Torreão Braz). Recurso exclusivamente pela alínea a, não conhecido. (REsp 175.794/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 05/11/1998, DJ 21/02/2000 p. 130).Provimento do recurso, por maioria. 0003052-78.2000.8.19.0008 (2008.001.29020) - APELACAO - 1ª Ementa DES. CARLOS SANTOS DE 48 OLIVEIRA - Julgamento: 12/08/2008 - NONA CAMARA CIVEL ASSALTO NO DISPARO INTERIOR DE ARMA DE ONIBUS DE FOGO LESAO CORPORAL EM PASSAGEIRO DO VEICULO CLAUSULA DE TEORIA DO OBRIGACAO DE INCOLUMIDADE RISCO PROVEITO INDENIZAR RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE DE PASSAGEIRO. ASSALTO NO INTERIOR DE COLETIVO. DISPARO DE ARMA DE FOGO QUE FERE PASSAGEIRA. SENTENÇA QUE JULGA IMPROCEDENTE REFORMA DO INCOLUMIDADE. O PEDIDO JULGADO. FREQUÊNCIA INICIAL. CLÁUSULA DE DE ASSALTOS À VIAÇÃO. FATO QUE NÃO É ALHEIO A ATIVIDADE. TEORIA DO RISCO PROVEITO. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.- A prática de assaltos no interior de coletivos a muito deixou de ser fato imprevisível ou inevitável. Trata-se de fato corriqueiro e que não se mostra alheio a atividade desenvolvida. Pelo contrário, faz parte do risco da atividade, pela natureza do serviço, na medida em que o transportador tem o dever de incolumidade, ou seja, de assegurar a segurança dos passageiros. Em virtude deste dever de incolumidade as transportadoras são obrigadas a tomar medidas que garantam o transporte seguro dos passageiros, seja com relação aos acidentes de trânsito, seja com relação a assaltos praticados no interior do coletivo. Tais não configuram o denominado fortuito externo, sendo incapazes de excluir o dever de indenizar. Precedentes do E.TJ/RJ.- Teoria do risco proveito, pela qual a prestadora do serviço que tem vantagens com a atividade 49 desenvolvida deve responder pelos efeitos prejudiciais que dela decorrem.- Dever de indenizar por danos materiais e morais. Possibilidade de acúmulo de pensionamento no período de incapacidade laborativa com beneficio previdenciário. Natureza distinta das verbas. Comprometimento da potencialidade produtiva característica da condição humana. Incapacidade de realizar tarefas cotidianas. Rejeição do pedido de pensionamento vitalício. Inexistência de redução permanente da capacidade laborativa. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. Com a análise dos acórdãos acima transcritos, nota-se que inexiste um entendimento pacífico no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro acerca do tema: Há câmaras que entendem ser tal evento considerado como excludente de força maior, logo, exclui o nexo causal e a responsabilidade pelos danos advindos por este motivo; sendo totalmente alheio aos riscos próprios da atividade exercida pela transportadora. Estes julgadores entendem inexistir nexo causal entre aquela causa eficiente e a conduta da aludida transportadora ou de seus agentes, isentando-as do dever de indenizar. Já outras câmaras entendem que tal fato constitui fortuito interno, devido à reiteração dos assaltos aos coletivos, sem que as empresas de transportes adotem providências que, pelo menos, reduzam os riscos dos passageiros, e que já tornaram previsíveis tais incidentes e os concebem como inerentes aos riscos das atividades desempenhadas pela empresa. Trata-se de um fato tão corriqueiro, nos dias atuais, que chega a ser completamente previsível. 50 Na realidade, o que podemos observar é um completo descaso das transportadoras em relação à segurança dos passageiros, e apenas em relação à proteção dos passageiros, porque no que tange a segurança do cobrador da passagem, a transportadora faz de tudo para este não sofrer nenhum assalto, por exemplo, há alguns anos foi trocada a posição em que este ficava no ônibus (no final do coletivo) e foi para próximo ao motorista, somente para evitar que os meliantes assaltassem além dos usuários, o próprio trocador, também é evidente que as empresas aconselham seus funcionários a esconderem parte do dinheiro das passagem, pois quem já não viu o trocador retirando o troco de dentro do bolso de seu uniforme, ou então de baixo da gaveta, tudo isso para amenizar uma possível perda para a empresa em caso de assalto. Demonstrados estão todos os cuidados da transportadora em relação a sua própria segurança, porém para os passageiros não existe a menor preocupação ou cuidado. 5.2- No Superior Tribunal de Justiça RESP175794 RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE DA EMPRESA COLETIVO. ASSALTO. RESPONSABILIDADE TRANSPORTADORA. O ASSALTO A COBRADOR DE ÔNIBUS NÃO É FATO IMPREVISÍVEL NEM ALHEIO AO TRANSPORTE COLETIVO, EM ZONA DE FREQÜENTES ROUBOS, RAZÃO PELA QUAL NÃO VULNERA A LEI A DECISÃO 51 QUE IMPÕE À EMPRESA A PROVA DA EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE PELA MORTE DE UM PASSAGEIRO. PRECEDENTE DESTA QUARTA TURMA (RESP Nº 50.129/RJ, REL. MINISTRO TORREÃO BRAZ). Resp 200808 CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE COLETIVO DE PASSAGEIROS. O transportador só responde pelos danos resultantes de fatos conexos com o serviço que presta, mas nestes se inclui o assalto, propiciado pela parada do veículo em ponto irregular, de que resultou vítima Resp 74534 RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE INTERMUNICIPAL. ASSALTO PRATICADO DENTRO DO ONIBUS. CASO EM QUE O FATO DE TERCEIRO NÃO GUARDA CONEXIDADE COM O TRANSPORTE. EXONERAÇÃO DA TRANSPORTADOR, RESPONSABILIDADE DE ACORDO PRECEDENTES DO STJ: RESP'S 13.351, Resp 118123 DO COM 52 DIREITO CIVIL. TRANSPORTE RODOVIÁRIO. MORTE DE PASSAGEIRO DECORRENTE DE ROUBO OCORRIDO DENTRO DO ÔNIBUS. FORÇA MAIOR. EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR DE INDENIZAR. PRECEDENTES. RECURSO ACOLHIDO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO Em relação aos acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça, que é o órgão competente para analisar a questão em última instância, também se verifica a mesma divergência, ou seja, nos dois primeiros acórdãos, o STJ entende ser o transportador responsável pelos assaltos, pois estes não são imprevisíveis, nem alheios ao transporte coletivo, em zonas de freqüentes roubos, ou quando o motorista parou o veículo em ponto irregular propiciando a entrada dos marginais. Desta forma, o assalto é conexo com a atividade desempenhada pela empresa. Cabe destacar o segundo posicionamento do STJ, que considera ser a transportadora irresponsável por tais eventos, haja vista que o assalto equipara-se a fato de terceiro não guardando conexidade com o transporte, e a força maior que é uma excludente da responsabilidade do transportador. Evidente está que, as empresas transportadoras têm grande parcela de culpa no elevado índice de roubos ocorridos no interior dos coletivos, haja vista que só se preocupam com seu próprio lucro, não fazendo o mínimo de investimento necessário a segurança dos passageiros. É por este motivo que tais eventos tornaram-se comuns, freqüentes e até já fazem parte do cotidiano das pessoas que utilizam tal meio de transporte. Não se pode negar que quando vamos a um shopping, por exemplo, não temos a certeza de que não sofreremos nenhum tipo de violência, mas é 53 claro que nos sentimos mais seguros, pois sabemos que existem seguranças, que se não vão impedir, com certeza vão tentar evitar que tais eventos ocorram. É assim que deveríamos nos sentir quando andamos de ônibus. Portanto, no nosso entendimento, embora minoritário, em virtude do total descaso das transportadoras em relação aos assaltos este se proliferaram de tal forma que podem ser considerados completamente previsíveis e evitáveis. CONCLUSÃO Diante de todo estudo, demonstrações e comparações realizadas neste trabalho, ficou evidente a grande relevância do tema aqui abordado. Não se pode negar que o tema é polêmico e sobre ele há muitas divergências, seja em função da caracterização ou não do fortuito externo ou interno, seja na previsibilidade ou imprevisibilidade, seja em relação ao poder de polícia pertencente ao Estado, etc. Este trabalho propôs-se a abordar as principais questões referentes ao assalto ocorrido no interior dos coletivos, tais como a cláusula de incolumidade que está implícita no contrato, o momento da celebração do contrato, as excludentes de responsabilidade tais como fato exclusivo do passageiro, o fato exclusivo de terceiro, o caso fortuito e força maior. Também foi abordado nesta obra, a responsabilidade do Estado em relação aos assaltos nos coletivos, a distinção da responsabilidade deste em relação a responsabilidade do transportador. Não seria esta uma obra de qualidade se não tratasse da aplicação do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, que é uns dos mais modernos 54 que se tem notícia, recebendo elogios de inúmeros operadores do direito de diversos países. O trabalho pretendeu ser um convite à discussão, que ultimamente tem “roubado” espaços em jornais e revistas pelo Brasil, face a polêmica e atualidade. A cada dia que passa, constantes se tornam os casos de assaltos e até morte no interior dos coletivos. Notável é, que nem mesmo os tribunais do nosso país têm um entendimento pacificado a respeito da matéria. A mesma discussão é encontrada na doutrina, onde há posicionamentos dos mais variados possíveis. Diante de tanta divergência, este trabalho objetivou mostrar o caminho adequado a ser seguido por todos os operadores de direito, para que seja feita a tão sonhada justiça, eliminando qualquer tipo de dúvida ou incerteza a respeito da matéria. Portanto, evidente está a relevância social e jurídica do tema abordado, devendo este ser cada vez mais estudado a fim de que seja alvo de consenso, e conseqüentemente uma resposta às demandas sociais. BIBLIOGRAFIA CAHALI, Yussef, Responsabilidade Civil do Estado DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, 7°v, Saraiva, 14ªed 55 FILHO, Sérgio Cavalieri, Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do ante projeto. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004 MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 28ª ed, Malheiros MELLO, Celso Bandeira de, Curso de Direito Administrativo, 15º ed, Malheiros MONTEIRO, Washington de Barros apud Rodrigues Silvio, Direito Civil, 4°v.,Saraiva, 19ed., p 101 RODRIGUES, Silvio, Direito Civil, v. 4, 19 ed TEPEDINO, Gustavo, Temas de Direito Civil, Renovar, 1999 MADEIRA, José Maria Pinheiro, Administração Pública Centralizada e Descentralizada, 2ª ed, América Jurídica. 56 ÍNDICE FOLHA DE ROSTO 2 AGRADECIMENTO 3 DEDICATÓRIA 4 RESUMO 5 SUMÁRIO 6 INTRODUÇÃO 8 CAPÍTULO I DO CONTRATO DE TRANSPORTE 11 1.1 – Da Cláusula de Incolumidade 13 1.2 – Do Transporte Gratuito 15 1.3 – Da Celebração do Contrato 17 CAPÍTULO II EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR 20 2.1 – Do Fato Exclusivo da Vítima 20 2.2 – Do Fato Exclusivo de Terceiro 21 2.3 – Do Caso Fortuito e Força Maior 22 2.4 – Assalto a Ônibus Previsível ou Imprevisível? 23 2.5 – Fato de Terceiro Gera Dever de Indenizar para as Transportadoras?26 CAPÍTULO III O ESTADO NA RELAÇÃO DE TRANSPORTE 3.1 – Em que Sentido Encontramos 29 Licitude na Imputação da Responsabilidade Civil do Estado em Relação aos Assaltos Ocorridos no Interior dos Coletivos 29 3.2 – Distinção entre Responsabilidade Civil do Estado e a Responsabilidade Civil das Transportadoras. Quais as Implicações Face ao Direito Positivo?32 57 CAPÍTULO IV A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR FRENTE AOS ROUBOS E FURTOS OCORRIDOS NO INTERIOR DOS COLETIVOS 36 4.1 – Noções Básicas sobre a Responsabilidade Civil do Transportador no CDC 36 4.1.1 – O Contrato de Transporte Visto como Relação de Consumo 36 4.1.2 – Os Direitos Assegurados pelo CDC ao Transportado 38 4.2 – Da Responsabilidade da Transportadora frente ao CDC 39 4.3 – As Concessionárias de Serviço Público Frente ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor 42 4.4 – Da Prescrição 43 CAPÍTULO V ESTUDO DE CASOS CONCRETOS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR 44 5.1 – No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro 44 5.2 – No Superior Tribunal de Justiça 50 CONCLUSÃO 53 BIBLIOGRAFIA 54 ÍNDICE 56