Anais da Jornada de Estudos Antigos e Medievais
ISSN 2177-6687
A TRADIÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA: O CENÁRIO
BUCÓLICO, IDÍLICO E O LIRISMO TROVADORESCO COMO
FORMADORES DAS PERSONAGENS FEMININAS EM VIAGENS
NA MINHA TERRA, DE ALMEIDA GARRETT
BETIATO, Diego Rafael (UEM)
CORTEZ, Clarice Zamonaro (UEM)
Introdução
O Romantismo é por si só uma escola literária, uma tendência, uma forma, um
fenômeno histórico, um estado de espírito, ele é tudo isso junto e cada item separado. O
Romantismo enquadra-se como uma emergência histórica, um evento sócio cultural,
uma escola historicamente definida, que surgiu num dado momento, em condições
concretas e com respostas características à situação que se lhe apresentou.
A introdução da nova literatura em Portugal pode ser comparada à situação
política, considerando-se suas consequências radicais e péla sua quebra de continuidade
com o passado, à revolução política de 1832-1834. Em 1825, exilado em Paris, Almeida
Garrett publica o poema Camões, dando início ao movimento romântico em Portugal.
Saraiva e Lopes (s/d, p.694) registram que:
(...) esta obra não teve sequência imediata na nossa literatura. Só
depois do regresso dos emigrados se verifica o fluxo contínuo de uma
corrente literária diferente. É preferível marcar o início do romantismo
em Portugal no ano de 1936, em que se publica A Voz do Profeta, de
Herculano.
Três momentos distintos devem ser considerados no estudo do Romantismo em
Portugal: 1º) O Romantismo propriamente dito (1825-1836) ou Primeira Geração
Romântica, na qual participaram Almeida Garrett (introdutor do movimento), ao
publicar os poemas Camões e Dona Branca, além de romance e teatro (Frei Luís de
Sousa); Alexandre Herculano, introdutor do romance de caráter histórico, ao publicar
Eurico, o Presbítero e o poeta Antonio Feliciano de Castilho, defensor ardoroso do
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movimento até o final da primeira metade do século. 2º) O Ultra-romantismo (18361860), fase marcante do movimento romântico em toda a Europa, com a participação de
Camilo Castelo Branco, com uma vasta produção que compreende poesia, teatro, crítica
literária, jornalismo, conto, romance (Amor de Perdição) e novela.
O poeta Soares de Passos participou também desse segundo momento romântico
em Portugal. 3º) O período que pode ser chamado de transição para o Realismo (18601865), tendo como principal representante o romancista Júlio Dinis, autor do romance
analítico, considerado o primeiro teorizador do romance em Portugal. Escreveu entre
muitos As Pupilas do Senhor Reitor. Na poesia, destacam-se João de Deus e Tomás
Ribeiro.
Garrett interessou-se sempre pelas tradições nacionais e inicia a recolha de
romances populares portugueses, considerados como poesia primitiva, principalmente
os cancioneiros medievais. E, com a nacionalização da literatura e o repúdio da poesia
clássica culmina com a revolução romântica, sintetizada em sua célebre frase, na
introdução do primeiro volume do Romanceiro: “Nenhuma coisa pode ser nacional, se
não é popular”, expressando as suas ideias liberais. Nesse sentido, podemos concluir
que o Romantismo português é inseparável do liberalismo, consequência direta da
emigração, o que o distingue do Romantismo europeu.
O romance é constituído fundamentalmente pelo relato de um fato verídico: a
viagem de Garrett de Lisboa a Santarém, para visitar Passos Manuel, o ex-chefe dos
setembristas (ou liberais) e o principal opositor à ditadura de Costa Cabral. Garrett,
simultaneamente, é o protagonista e o narrador do romance, coincidindo o eu biográfico
e o eu artístico: o homem e o artista, identificando-se. No romance, há uma variedade de
motivos que encantam o leitor: realistas, líricos, humorísticos, históricos, artísticos,
literários e políticos, mas todos exprimem o amor por tudo o que é nacional, genuíno,
marcadamente português.
Justificativa
Este projeto se justifica pelo nosso interesse no estudo das influências da
literatura medieval no Romantismo português. No projeto de pesquisa docente em que
se insere, estudamos o perfil feminino em cantigas de amigo e em cantigas de milagre,
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de Afonso X. Quando iniciamos o estudo do Romantismo nas aulas da graduação, com
a leitura do romance Viagens na minha Terra, de Almeida Garrett, a hipótese de que o
perfil da mulher medieval refletia-se na criação das personagens românticas, não só do
romance em questão como também na poesia do autor, ficou-nos evidente, abrindo-nos
a possibilidade de pesquisa. No decorrer da leitura do romance, outra categoria da
narrativa chamou-nos a atenção – o estudo do espaço, do cenário que enquadra a
personagem, tornando-se indissociável na sua criação. As cenas ocorrem em função do
cenário, como no Vale do Santarém, por exemplo, descrito como um local privilegiado,
que recorda o paraíso terrestre, e onde necessariamente só podem viver pessoas boas,
puras, angélicas, afastadas do pecado do mundo, tais como Joaninha e a Avó, mas onde
outras personagens não podem se integrar.
Objetivos
Objetivo Geral:
Estudar a tradição literária portuguesa em Viagens na minha Terra, de Almeida
Garrett, tendo como cenário a paisagem bucólica, idílica e o lirismo trovadoresco como
elementos formadores das personagens femininas.
Objetivos Específicos:
*Pesquisar as origens do Romantismo, originário da Escócia e da Prússia,
definido na segunda metade do século XVIII, quando se introduziu em Portugal com o
poema Camões de Garrett (1825) ao ano de 1865, quando as teses realistas entram em
substituição ao movimento romântico.
*Pesquisar o contexto sócio cultural do período denominado Idade Média
Central, séculos XI a XIII, quando foram produzidas e divulgadas as cantigas de amigo,
comprovando serem as cantigas a base da tradição literária portuguesa, especificamente
do Romantismo.
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*Reconhecer nessa pesquisa o perfil literário de Almeida Garrett e as influências
dos cancioneiros medievais na criação do cenário e das personagens femininas de
Viagens na minha Terra.
*Pesquisar em manuais de teoria da literatura o espaço e sua importância na
construção da narrativa e no enquadramento das personagens do romance em questão.
*Propor uma leitura de Viagens na minha Terra, de Almeida Garrett, a partir
dos estudos da paisagem (espaço) e do perfil feminino da menina das cantigas como
elementos formadores das personagens românticas do texto garrettiano.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa de caráter descritivo-analítico, devendo ser os fatos
identificados, descritos, classificados, interpretados e, principalmente, analisados pelo
pesquisador sem a interferência e manipulação do mesmo.
O estudo do espaço na narrativa será fundamental no desenvolvimento do
projeto. De acordo com a teoria da literatura, é no espaço que a ação se desenvolve e as
personagens se movimentam. Com base nessa premissa, cabe a ele, conforme Dimas
(1985), funcionar como armadilha virtual do texto, na medida em que poderá provocar a
adesão ou a repulsão do leitor, bem como instigar sua curiosidade através das
referências sobre o cenário. Nesse sentido, ressalta Dimas (p.5) “o espaço pode alcançar
estatuto tão importante quanto os outros componentes da narrativa, tais como foco
narrativo personagem, tempo, estrutura etc.”.
O foco narrativo escolhido lhe permitirá uma visão panorâmica limitada à
descrição exterior ou uma visão mais subjetiva centrada no interior, tanto do espaço
como da personagem. Com base nessa relação, o conceito de espaço assim se apresenta:
”O espaço do romance não é, no fundo, senão um conjunto de relações existente entre
os lugares, o meio, o cenário da ação e as pessoas que esta pressupõe, quer dizer o
indivíduo que relata os eventos e as personagens que neles participam.” (REIS E
LOPES, 1988, p.207).
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DIMAS, Antônio. Espaço e Romance. São Paulo: Ática, 1985.
FERREIRA, Maria Ema Tarracha. Introdução às Viagens na minha Terra. Lisboa:
Ulisseia, 1987.
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GUINSBURG, Jaime. O Romantismo. 3[ ed.; São Paulo: Perspectiva, 1978.
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MALEVAL, Maria do Amparo Tavares. Rastros de Eva no Imaginário Ibérico:
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MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa. São Paulo Cultrix, 1987.
REIS, Carlos e LOPES, Ana Cristina. Dicionário de Teoria da Narrativa. São Paulo:
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SANTOS, Luiz Alberto e OLIVEIRA, Silvana. Sujeito, tempo e espaço ficcionais.
Introdução à Teoria da Literatura. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
SARAIVA, António e LOPES, Oscar. História da Literatura Portuguesa. 16ª ed.;
Porto: Porto Editora, s/d.
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