CAPITAL SOCIAL E DESENVOLVIMENTO LOCAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO GLOBAL 1 Eraldo Souza do Carmo Resumo: O presente artigo tem como questão central, realizar uma discussão a cerca do capital e desenvolvimento local no processo de desenvolvimento global. A análise terá como base as discussões que Veiga (2008) vem fazer sobre como pode entendido o desenvolvimento, a partir de diversas lógicas subjacentes. Realizaremos um esforço no sentido da compreensão sobre suas manifestações no aspecto local a partir da teoria do capital social com enfoque nas produções teóricas em que se manifestam a relação entre capital social e desenvolvimento local e global. Palavras-chave: Capital social, desenvolvimento local, desenvolvimento global. Abstract: This article has the central issue, hold a discussion about the capital and local development in the process of global development. The analysis will be based on the discussions that Veiga (2008) has done on how to understand the development, from a variety of underlying logic. We work in an understanding of its manifestations in the local aspect of the theory of social capital with focus on products that present theoretical in the relationship between social capital and local development and global. Key words: Social capital, local development, development. 1 Mestrando. Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] INTRODUÇÃO Discutir desenvolvimento local e capital social é um debate contemporâneo. Portes (2000) ao discutir as origens do capital social ressalta que a sociologia já vem discutindo há muito mais tempo e que ele se manifesta em cada realidade com características próprias como fonte de controle social; fonte de apoio familiar e fontes de benefícios através de redes sociais. No entanto, não há como desconsiderar uma série de produções que vem sendo construída com o objetivo de contrapor a lógica que o desenvolvimento é papel das corporações a partir de grandes empreendimentos, seja estatal ou privado, com capital financeiros volumosos, sempre com a promessa que os resultados serão benéficos a sociedade. A história econômica tem mostrado que esta estratégia não tem favorecido a grande maioria daqueles que em tese deveriam ser os privilegiados destas políticas econômicas, a população, principalmente os mais pobres, pois o grau de desenvolvimento tecnológico provocou o aumento do desemprego estrutural e baixa renda da produção familiar (BARQUERO, 1999, 2007; SEN, 2000; MORAES, 2003). Ao contrário, as assimetrias sejam entre as classes sociais, regiões, continentes ou países têm aumentado a cada década, os poucos países que conseguem se destacar representam uma amostra muito pequena dentro do geral, e ainda tem de se submeterem as condições impostas pelos países desenvolvidos. Nesse contexto, faz-se necessário pensar o desenvolvimento a partir da valorização da realidade sociocultural dos indivíduos, o respeito à cultura dos diversos sujeitos, do meio ambiente, da natureza, dos valores humanos, da organização das pessoas nas comunidades seja do campo ou da cidade. É sobre este prisma que paira a grande discussão teórica daqueles que defendem o desenvolvimento a partir das pessoas, a fim de sensibilizar principalmente os governos que o desenvolvimento baseado apenas em dados quantitativos como o produto interno bruto dos países, o PIB, não tem sustentabilidade social, econômica, ecológica, espacial e cultural (SACHS, 1993). 1. A LÓGICA SUBJACENTE DO DESENVOLVIMENTO A discussão sobre desenvolvimento deve considerar qual a lógica subjacente as propostas e projetos implementados. Veiga (Op. Cit.) destaca que as possibilidades de um país do segundo e terceiro grupo passarem para o primeiro são mínimas, ou seja, há uma lógica econômica ao que parece definida e que esta é uma corrida para o abstrato. Mesmo porque, os países centrais dependem dos demais para importação de matéria prima a custo baixo ou para subsidiar suas empresas em busca de mão de obra barata. Assim, as reflexões que seguem, tecem criticas as economias centrais que vêem o desenvolvimento como acúmulo de riqueza baseado no PIB, uma vez que, para as demais economias este tem sido um processo lento e demorado, o que se reflete em uma ilusão. No entanto, há corrente de pensamento extremamente contrária a esta forma de mensurar o desenvolvimento, Veiga (Op. Cit.) ressalta que são os gurus do mito do desenvolvimento que tem esta visão quantitativa do mundo. Para este autor, os processos qualitativos são ignorados, principalmente as questões históricas e culturais, e ainda, o progresso da sociedade que não é linear. Esta forma de conceber e mensurar o desenvolvimento apenas pela via do PIB, das exportações ou pelo o desempenho das ações como destaca Veiga não tem proporcionado o desenvolvimento humano. Ao contrário, as economias subdesenvolvidas ou periféricas estão ficando apenas com os resultados negativos deste processo, como desestrutura social, cultural e ecológica. Isto porque, têm se tornado apenas exportadores de matéria prima, mão de obra barata e importadores dos bens manufaturas dos países centrais. No entanto, continuam a ilusão que podem tornar-se desenvolvidos, para aí sim, pensar na população, a lógica de deixar o bolo crescer e depois dividir ainda continua, embora as pressões sociais por políticas inclusivas sejam latentes. Veiga (Op. Cit.) ainda acena para um certo pessimismo aos países em desenvolvimento, uma vez que eles tem um problema que considera emblemático aos tempos atuais, o qual chama de “miséria científico-tecnológica”. A partir das reflexões de Rivero destaca que enquanto os serviços de alta tecnologia cresce 15% ao ano, os de matéria prima e transformação fica entre 3 e 4 %, e ainda com preço em decadência. Ou seja, o caminho escolhido por eles foi à contramão do processo, pois enquanto os países centrais vinham investindo em tecnologia de ponta, eles apostaram em firmar suas economias em exportação de matéria prima. Outra problemática apontada por Veiga (Op. Cit.) está relacionada à explosão demográfica dos países subdesenvolvidos que para ele acaba sendo produtora de pobreza. O problema estaria exatamente nas suas receitas que é baseada em comoddites de exportação com preços em declínio no mercado internacional, aliado ao baixo nível de tecnologia. Desta forma, estariam impossibilitados de gerar recursos para garantir políticas que assegurem as necessidades básicas da população, principalmente o emprego. Como se percebe a realidade dos países subdesenvolvidos é bastante complexa, considerando que se continuarem a trilhar o mesmo caminho não conseguirão superar as desigualdades sociais e a pobreza que os afligem. Historicamente tornaram-se economias dependentes das agências e bancos internacionais em forma de empréstimo, submetendose as orientações destes organismos, seja no aspecto orçamentário, controle fiscal, flexibilização de leis trabalhistas e gastos públicos. Para este autor o caminho para estes países seria o controle da taxa de natalidade e investimento em tecnologia a fim de modernizar a produção. O que as reflexões sobre o desenvolvimento tem nos conduzido até aqui, nos leva a retornar na indagação de Veiga sobre o sentido do desenvolvimento, pois, os resultados deste processo que tem provocado concentração de renda e o abismo entre pobres e ricos só tem aumentado. A tônica é de uma sociedade democrática, mas as pessoas não tem liberdade para escolher seus próprios destinos, a realidade é dada, com isso, as pessoas são estimuladas a competir entre si para sobreviver. Para Veiga (Op. Cit.) para pensar em desenvolvimento é fundamental que se tenha liberdade, seja individual, política e até mesmo a cultural e econômica, sem estes princípios a retórica torna-se vazia. 2. CAPITAL SOCIAL E DESENVOLVIMENTO LOCAL A idéia de desenvolvimento local ganha materialidade no planejamento público, comunidades, cooperativas, associações de moradores e empresariais, a partir que os grandes projetos desenvolvimentistas focado mais no aspecto econômico pelo estado não deram conta de resolver as assimetrias entre as regiões do país. Ou seja, ao que parece fracassou a estratégia do Estado brasileiro de ingerir recursos públicos nos empreendimentos regionais para que estes retornassem em forma de benefícios a população. Ao contrário, fortaleceu ainda mais o capital das elites industriais e comerciais principalmente do centro sul do país, em muitos casos, aprofundando as desigualdades regionais. Segundo Sachs (2004) o relatório da UNCTAD2 sobre os países menos desenvolvidos aponta para uma pobreza estrutural em detrimento do subdesenvolvimento de suas forças produtivas. Embora o desenvolvimento local, seja um conceito que esteja buscando se firmar enquanto um novo paradigma corre o perigo de cair na dicotomia do desenvolvimento e do 2 Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento crescimento, agora, entre o local e o global. A discussão não deixa de ser também uma fantasia, mais seus princípios têm outras dimensões, uma vez que, não só o Estado, ou, o capital privado tem centralidade na condução do processo sobre os rumos da nação. Sobre esta nova lógica, a sociedade cível assume papel central para discutir junto com os poderes públicos a melhor forma da implementação das atividades econômicas. Nesta intencionalidade, há uma sensibilização dos diversos atores sociais para conciliar desenvolvimento com os limites da natureza e a qualidade de vida da população. Ao considerar os conceitos de capital social e desenvolvimento local faz-se necessário compreender suas relações, sabendo que ambos têm suas implicações e dificuldades, considerando que dependem da sociedade civil para serem fortalecidos. Isto porque, requer organização social, capacidade gestão, diálogo, participação, compreensão política, controle social e a construção de um projeto coletivo de sociedade que sirva de orientação para as ações. Esta lógica não deixa de ser um mito ou ideologia de desenvolvimento, mesmo estando assentada sobre outras perspectivas, do empoderamento das pessoas como enfatiza Sachs, para serem atores no processo dentro de uma lógica democrático. Sobre o capital social, Portes (Op. Cit.) destaca que nos últimos anos houve uma enxurrada de publicações sobre as diversas perspectivas deste viés, no entanto, alerta para os cuidados que deve-se utilizar sobre este termo, pois ao contrário poderá perder seu significado especifico. Ressalta também, que na visão de muitos sociólogos estas reflexões não apresentam nada de novo, pois conceitos como envolvimento e participação já havia sido utilizado por Durkheim para superar a “anomia” e autodestruição na sociedade entre uma classe social e outra. Concordo com o autor, que talvez as discussões não apresentem nada de novo, mais as análises são necessárias para que estas contribuições teóricas fortaleçam as discussões contemporânea onde os desafios colocados são outros. Em relação ao desenvolvimento local uma das críticas que gira em torno, está na tendência de reduzir esta ideia ao localismo, ou outras áreas do conhecimento chegar a um consenso em torno deste paradigma, no entanto, as contribuições de Boudin (2001), Acseirad (2006), Barquero (1999, 2007), Abramovay (2000) nos ajudam em análise para além do localismo. Temos clareza que quando uma região busca se organizar, seja através de ações governamentais ou de organizações sociais, o que se pretende na prática é identificar seus potenciais econômico ou cultural para organizá-los, para no caso de produtos, comercializar em outros mercados. No caso, de patrimônio cultural buscar formas de atrair as pessoas de fora para o local, ou seja, estas ações pensadas estrategicamente interligam o local com o global. No entanto, há uma necessidade de identificar o local que se está enfatizando, neste sentido, Bourdin (Op. Cit.) ressalta que esta é uma definição que tem vários sentidos, e vê sobre duas vertentes: uma que está relacionada à projeção feita por uma autoridade que passa por questões históricas ou mesmo técnica. E a outra, reflete a proximidade das pessoas para valorizar as questões da identidade cultural e as relações econômicas. Hora, este é um principio que está relacionado à sustentabilidade social das comunidades, pois como ele mesmo enfatiza “a afirmação do local passa igualmente pela valorização sistemática das entidades comunitárias territoriais” (p.26). Abramovay (Op. Cit.) ao falar do desenvolvimento dos territórios destaca que as relações históricas, configurações políticas e identidades precisam ser levadas em consideração em uma reconfiguração econômica. Para estes autores, o local não está relacionado apenas às questões econômicas, mas como uma forma de identificar um determinado território com toda sua especificidade e potencialidade. A este processo que a sociedade vem discutindo junto com os governos Bourdin (Op. Cit.) caracteriza como resistência a lógica da modernidade. Destaca também, três interrogações sobre a vulgata localista que estaria relacionado a: constituição do vínculo social e da identidade; especificidade do político e a articulação entre as diferentes escalas de organizações social. Mas uma vez fica evidente que os argumentos do autor sobre o sentido do local parte da valorização dos aspectos culturais e a importância da organização da sociedade civil enquanto participe do processo, pois para ele: 3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Fica explicito nas argumentações dos autores que o desenvolvimento não e mais aceito apenas enquanto crescimento econômico, uma vez que, é concentrador de renda e distribuidor de miséria, o verdadeiro sentido não tem sido benéfico à maioria da população. Com isso, o esforço de se pensar sobre outra lógica, com outros valores é uma necessidade urgente da sociedade contemporânea. Entendo que não é a substituição de um modelo pelo outro em curto prazo, nem talvez a longo, considerando que como o sistema é dinâmico não se substitui uma dinâmica pela outra de forma imediata, ao contrário, ele vai transformando ou aperfeiçoando as ferramentas. Neste sentido, a teoria a do capital social como fortalecimento do desenvolvimento local se caracteriza mais com uma alternativa de contraposição a teoria econômica. Pois, suas ações para terem coerência social vão exigir um bom nível de organização das instituições governamentais locais e da sociedade civil para terem capacidade de diálogo, confiança para construírem alternativas viáveis que priorizem a população, principalmente os excluídos que estejam em consonância com sustentabilidade ambiental. Estas ações evidentes, não se referem apenas a construções de experiências econômicas, mas repensar todas as políticas públicas de educação, saúde, assistência social, reforma agrária, agricultura de uma região ou território. Pois isto é necessário para romper com a lógica das ações isoladas e canalizá-las e forma estratégica para um projeto coletivo. Abramovay (Op. Cit.) ao se referir à educação rural destaca a necessidade de estar em sintonia com a política de um território, não é melhorar a escola, mas o sentido que ela pode dar na aquisição do conhecimento para os jovens rurais. Diante dos desafios frente ao novo cenário de integração econômica e globalização, Barquero (1999) destaca que a resposta continua nas mãos da sociedade e daqueles de representam as instituições para conduzirem o desenvolvimento endógeno. Por fim, tanto o capital social como desenvolvimento local em que pese às divergências teóricas, é uma necessidade torna-se importante para construir uma sociedade com mais equidade social, política, cultura e ambiental. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, Ricardo. O Capital Social dos Territórios: repensando desenvolvimento rural. Economia Aplicada – nº 2, vol. IV: 2000. P. 379-397. o ACSEIRAD, Henri. Território, localismo e política de escalas. In: Ambiente e Política. Rio de Janeiro. Gramond. 2006. BARQUERO, Antônio Vázquez. El desarrolo local: Una Estratégia para El Nuevo Mileno. Revista de Estúdios Cooperativos. Nº 68. 1999. BOUDIN, A. A questão Local. Rio de Janeiro. DP&A. 2003. p. 25-75 MORAES, Jorge Luiz Amaral. O Capital Social e o Desenvolvimento Regional. In: O Capital Social e o Desenvolvimento Regional. CORRÊA, Silvio Marcus de Souza (Org.). Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003. PORTES, Alejandro. Capital Social: origens e aplicações na sociologia contemporânea. In: Sociologia problemas e práticas, nº 33, 2000, PP. 133-158. SACHS, Ignacy. Estratégias de desenvolvimento para o século XXI. in Bursztyn, M. Para pensar Desenvolvimento sustentável. São Paulo. Brasiliense. 1993 SEN, Amartya Kumar. O desenvolvimento como liberdade. MOTTA, Laura Teixeira (Trad). SP: Companhia das Letras2000. VEIGA, José Eli da. Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2008.