UMA BREVE ANÁLISE DOS PARADIGMAS DA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL BRASILEIRA Huarlei Augusto de Oliveira Chaves Comunicação Social – Jornalismo / UFOP Pesquisador PIBIC/CNPq / UFOP Orientador Prof. Dr. José Benedito Donadon-Leal EM UMA ÉPOCA MARCADA PELA VOLATILIDADE E PELA VELOCIDADE CRESCENTE NA TROCA DE INFORMAÇÕES, TUDO SE TRANSFORMA RAPIDAMENTE. NESSE ARTIGO, VAMOS DEMONSTRAR O QUE ESSAS TRANSFORMAÇÕES ACARRETAM NA DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES NO BRASIL. VIVEMOS EM UMA SOCIEDADE DOMINADA PELA CRIATURA, COMO DIZ SFEZ (1994), TAL COMO EM FRANKENSTEIN, O HOMEM-CRIADOR VÊ-SE DOMINADO POR SUA PRÓPRIA CRIAÇÃO. ESCRAVO DA TECNOLOGIA, ESCRAVO DA ACUMULAÇÃO, ESCRAVO DE EXPLICAÇÕES E DESCRIÇÕES QUE SE REVELARAM TOTALITÁRIAS, MAS INSUFICIENTES. DISCUTIREMOS COMO A COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL SE CARACTERIZA NO BRASIL E COMO ELA É VINCULADA À CULTURA NACIONAL. PALAVRAS-CHAVE: organizações, autoridade, trabalho, poder, cultura brasileira, discurso. O Brasil, em si, é uma sociedade coletivista, mas não se coloca entre as mais coletivistas do mundo. As empresas brasileiras são marcadas por decisões caracterizadas por interação social intensa, bem como por um envolvimento ativo dos dirigentes superiores geralmente autocráticos. Mesmo com essa intensa interação social, os brasileiros estão sempre recorrendo às normas ditadas pelo superior, por alguém que está a um cargo acima. Sempre está recorrendo a uma criatura de sua própria criação, aqui tomo a liberdade de tratar o sistema organizacional como essa criatura que criamos para conseguirmos organizar melhor a convivência nos locais de trabalho. Essa autoridade hierárquica e a intensiva comunicação fora das horas de trabalho, bem como fora do trabalho, levam muitas decisões empresariais brasileiras a serem tomadas de forma rápida, como dita o mundialmente conhecido “jeitinho brasileiro”. Aí está o aspecto coletivista da sociedade brasileira que se faz presente no meio organizacional. A comunicação interna no âmbito organizacional no Brasil muda, ao longo dos anos, acompanhando a cultura, as formas e os pensamentos de cada época. A convivência com as transformações virou rotina nas organizações, esse movimento é dado como natural. Algo que surge espontaneamente de acordo com as necessidades de cada empresa. O velho é descartado e o novo é introduzido de forma a aprimorar a comunicação interna. Mas, conforme vamos substituindo o velho, o novo sempre traz consigo algo que o embasou, algo que vem dos modelos mais antigos. Em seu artigo “Traços Brasileiros Para Uma Análise Organizacional”, FREITAS (1997), pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) especifica os “traços brasileiros” mais nitidamente influentes no âmbito organizacional, são eles: Hierarquia, Personalismo, Malandragem, Sensualismo, Aventureiro. Dentre esses traços, podemos considerar alguns que são mais relevantes no âmbito organizacional, como sendo herança da época do Brasil Colônia como a Hierarquia e o Personalismo. A hierarquia tende a centralizar o poder de forma que os submissos sigam as ordens de quem está no comando. Isso sobrevive no Brasil desde a época da escravidão, pois há ainda quem espera ordens do “senhor”, de caráter paternalista, similar ao chefe do núcleo familiar do país da época colonização. Esse comportamento tem características de quem deseja conservar o mesmo modelo de dominação (da relação senhor / escravo) para o sistema capitalista. Assim, explorar seus trabalhadores torna-se uma forma de obter cada vez mais lucro, acumular mais valores. Para Marx, O valor torna-se, portanto, valor em processo, dinheiro em processo e como tal, capital. Que posteriormente pode ser investido ampliando o domínio da indústria ou, simplesmente aumentar os lucros de quem está mais acima na hierarquia. Já Adam Smith, encara o emprego do capital como algo que permite a apropriação de valor porque está associado à elevação da produtividade, para ele, a produtividade e sua conseqüente ampliação, é a forma mais importante de se acrescentar riqueza aos meios de produção. No que se refere à distribuição de poder, as organizações brasileiras geralmente estão marcadas por uma distância grande entre os cargos que lembra nossa distribuição de renda e o passado escravocrata. Assim, essa distribuição de poder marca o ramo organizacional no país. Quando a sociedade era escravocrata, existia quem dominava e o dominado. Quem não encaixasse nesse molde de sociedade era colocado à margem do sistema. Hoje em dia, quem não se encaixa no molde das organizações com suas relações de poder é colocado à margem desse sistema e não consegue ser parte integrante do mercado de trabalho. Esse molde se mostra cada vez mais engessado na relação hierárquica de dominante/dominado com a divisão especializada do trabalho, que visa cada vez mais ampliar a riqueza do dominante, explorando cada vez mais o dominado. Para Adam Smith, a ampliação da riqueza depende fundamentalmente de se favorecer a divisão do trabalho e, com esta, a produtividade, que acarreta uma maior especialização dos meios de produção. Marx entende que os produtos destinados a serem esses meios de produção não são apenas os resultados, mas também as condições e processos de trabalho que levam até esse resultado final, que, de acordo com ele é o lucro cada vez maior por parte do capitalista conseqüente da exploração da mão de obra assalariada. O personalismo nos remete à sociedade patriarcal da época do Brasil colônia, aquela relação em que o patriarca tinha um domínio moral e econômico, quando a sociedade era baseada em relações pessoais, troca de favores e buscava uma proximidade de afeto nas relações. FREITAS (1997) define o paternalismo como uma relação em que o pai (superior), ao mesmo tempo em que controla o subordinado e o ordena (relação econômica), também o agrada e protege-o (relação pessoal). Como conseqüência dessa relação paternalista, percebemos a comunicação de uma forma verticalizada, que vem de cima para baixo (do patrão) diretamente para os empregados, não havendo dualidade na transmissão, o que, por conseguinte, não permite o intercâmbio de informações. O subordinado fica à mercê das vontades do subordinador, como um filho que apenas cumpre as ordens do pai, sem poder questionar sua autoridade paterna. Max Weber, em seu livro Ensaios de Sociologia, encara o patriarca como o “líder natural” da rotina cotidiana: “O poder patriarcal, especialmente, tem raízes no atendimento das necessidades freqüentes e normais da vida cotidiana. A autoridade patriarcal tem, assim, a sua origem na economia, ou seja, nos ramos da economia que podem ser satisfeitos por meio de uma rotina normal. O patriarca é o “líder natural” da vida cotidiana.” WEBER (1979) A comunicação organizacional interna pode ser tomada como um instrumento de opressão, uma opressão que tem por objetivo, dominar os subordinados. Geralmente a comunicação interna é tida como um meio apenas de transferência de informação, sendo o veículo de comunicação apenas o “encanamento” por onde a informação a ser transferida “escoa”, conforme diz SCROFERNEKER (SD), no sentido de que ela é repassada de uma pessoa, tida como emissor para outras, tidas como os receptores. Esse meio de transmitir as informações, frequentemente é utilizado para passar ordens, objetivos e metas para os membros da organização que, em sua maioria, não participaram da tomada dessas decisões. Para essas informações serem transmitidas por esse “encanamento”, elas não podem ser distribuídas ao acaso, têm que ter um objetivo, um emissor e um receptor definidos. Eliséo Verón chamou esse conjunto de energia: “Só há transmissão de informação quando a energia não se distribui ao acaso pelo canal” VERÓN (1970). Nas organizações modernas do Brasil, em que as relações sociais se processam a partir da ideia de setorização, o emissor e o receptor desse cenário da comunicação interna nas organizações, embora pertencentes a uma mesma organização, embora sejam de uma mesma linha hierárquica, cumprem funções distintas em setores distintos. Há, por certo, uma quebra explícita na tradição de dominação senhorial. Nessas organizações em que a ideia de setorização é utilizada, as formas de dominação e regulação cada vez mais se encontram apoiadas por formas de comunicação, ao invés das tradicionais formas de legitimação. A própria dinâmica produtiva também se mostra grandemente modificada em relação aos modos de produção do passado. Homens comandam máquinas que produzem. A demanda humana concentra-se na produção de ideias e de estratégias que norteiem produção e comércio. A lógica presente nos atos, nas ações, é que vai determinar a racionalidade do homem perante a organização. Assim, seguindo essa lógica, um ato racional é aquele que segue o viés das ações que já estão correndo e dos objetivos previamente definidos. Os meios de produção em série exigiram a setorização, essa forma de produzir não “conhece distinções pessoais” WEBER (1979), os interesses funcionais o dominam. Os métodos Tayloristas de organização do trabalho sendo a produção realizada em série, são construídos de forma que torne os trabalhadores “servidores ou acessórios das máquinas, completamente controlados pela organização e pelo ritmo de trabalho” MORGAN (2007). Paralela à relação hierárquica de poder dentro das organizações, está a burocracia que tem sua fonte de legitimidade no poder racional-legal, e não no poder patrimonial ou carismático. A representatividade de poder dentro de uma organização tem a forma de uma pirâmide em que cada superior tem sobre seu comando subordinados, que tem outros subordinados e assim por diante. Assim, emissores e receptores são estrategistas de produção e de comércio e processam relatos de produção e dados sobre mecanismos dessa produção, para que a dinâmica dentro das organizações não sofra interrupções. Os atores da comunicação interna são representantes de setores da organização e não peças fixas; entram e saem de cena com novos meios de comunicar e novas definições do processo comunicacional, conforme a dinâmica produtiva intercalando a comunicação entre os diferente níveis hierárquicos. A comunicação norteia todas as relações humanas. Quando se comunica alguma coisa a alguém, torna-se essa coisa comum a ambos. A facilidade na distribuição das informações contribui para a desestabilização do modelo clássico Taylorista. Isso dinamiza o processo de comunicação interna, mas afasta emissor de receptor, uma vez que ou o emissor, ou o receptor está sempre em transição, nunca ocupando um locus fixo. A influência da cultura nacional sobre a cultura organizacional é presente no meio gerencial, isso pode explicar o porquê de modelos de gestão importados não darem muito certo no Brasil. Esses modelos, muitas vezes, trazem pressupostos e valores, tanto culturais quanto mercadológicos que conflitem e batem de frente com os nossos. Se as organizações fazem parte de uma sociedade, fazem parte de sua cultura, são subculturas da sociedade. Existe um problema no que se refere ao vínculo da realidade social com a realidade organizacional. A realidade dentro das organizações muitas vezes apresenta-se diferente da encontrada na sociedade em que ela está inserida. Conclusão O direcionamento unilateral do trabalho deu lugar a uma extensão da circulação das informações necessárias a uma produtividade maior, superior e de melhor qualidade, e que melhoraram a dignidade e a motivação dos trabalhadores. Assim, as organizações, tanto no cenário nacional quanto no mundial, têm que dar mais atenção à sua comunicação interna, uma vez que ela é peça chave na transmissão de informações entre as diferentes esferas de poder no contexto organizacional. As mudanças dentro das organizações, muitas vezes, sugerem uma análise interna. Para que essas mudanças sejam satisfatórias ao ponto de as organizações conseguirem ter uma maior integração entre seus trabalhadores, é necessário que conheçam os traços da cultura brasileira. Encontrarão pelo caminho aqueles traços que irão prejudicar essas mudanças, é preciso guardá-los para serem estudados posteriormente. Não obstante, encontrarão também as características que possibilitarão um crescimento, um desenvolvimento maior do dinamismo entre os funcionários. Tais características deverão ser aproveitadas e divulgadas para que integrem um modelo de gestão brasileiro para que não precisemos importar tantos modelos do exterior. Referências Bibliográficas CARNEIRO, Ricardo, organizador. Os Clássicos da Economia, Editora Ática, São Paulo, 2008. FREITAS, Alexandre Borges de. Traços Brasileiros Para uma Análise Organizacional, em Cultura Organizacional e Cultura Brasileira, Organização: MOTTA, Fernando C. Prestes e CALDAS, Miguel, Editora Atlas, São Paulo, 2007. MORGAN, Gareth. Imagens da Organização, Editora Atlas, São Paulo, 2007. SCROFERNEKER, Cleusa Maria Andrade. Perspectivas Teóricas da Comunicação organizacional. (SD) SFEZ, Lucien. Crítica da Comunicação, Editora Instituto Piaget, Porto Alegre, (1994) VERÓN, Eliséo. Ideologia, Estrutura e Comunicação, Editora Cultrix, Rio de Janeiro, 1970. WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. São Paulo: Ed. Atlas, 1979.