21/04/2014 LITERATURA PARNASIANA (1882) Andrea Mantegna - Parnaso (1497). 150 x 192cm. Museu do Louvre Vaso chinês www.marcioadrianomoraes.com A tríade parnasiana Teófilo Dias – Fanfarras (1882) Foto: da esquerda para a direita Alberto de Oliveira – Versos e rimas (1895) Raimundo Correia – Sinfonias (1883), Poesias (1898) Olavo Bilac – Poesias (1888), Tratado de versificação (1910) www.marcioadrianomoraes.com 1 21/04/2014 A Nuvem As pombas Sulcas o ar de um rastro perfumoso Que os nervos me alvoroça e tantaliza, Quando o teu corpo musical desliza Ao hino do teu passo harmonioso. Vai-se a primeira pomba despertada ... Vai-se outra mais ... mais outra ... enfim dezenas De pombas vão-se dos pombais, apenas Raia sanguínea e fresca a madrugada ... A pressão do teu lábio saboroso Verte-me na alma um vinho que eletriza, Que os músculos me embebe, e os nectariza, E afrouxa-os, num delíquio langoroso. E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada... E quando junto a mim passas, criança, Revolta a crespa, luxuosa trança, Na espádua arfando em túrbidos negrumes, Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais; Naufraga-me a razão em sombra densa, Como se houvera sobre mim suspensa Uma nuvem de cálidos perfumes! No azul da adolescência as asas soltam, Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais... (Teófilo Dias) (Raimundo Correa) www.marcioadrianomoraes.com Vaso grego Vaso chinês Esta, de áureos relevos, trabalhada De divas mãos, brilhante copa, um dia, Já de aos deuses servir como cansada, Vinda do Olimpo, a um novo deus servia. Estranho mimo, aquele vaso! Vi-o Casualmente, uma vez, de um perfumado Contador sobre o mármor luzidio Entre um leque e o começo de um bordado. Era o poeta de Teos que a suspendia Então e, ora repleta ora esvazada, A taça amiga aos dedos seus tinia Toda de roxas pétalas colmada. Fino artista chinês, enamorado, Nele pusera o coração doentio Em rubras flores de um sutil lavrado Na tinta ardente, de um calor sombrio. Depois. Mas o lavor da taça admira, Toca-a, e, do ouvido aproximando-a, às bordas Finas hás de lhe ouvir, canora e doce, Mas, talvez por contraste à desventura — Quem o sabe? — de um velho mandarim Também lá estava a singular figura. Ignota voz, qual se da antiga lira Fosse a encantada música das cordas, Qual se essa a voz de Anacreonte fosse. Que arte em pintá-la! A gente acaso vendo-a Sentia um não sei quê com aquele chim De olhos cortados à feição de amêndoa (Alberto de Oliveira) (Alberto de Oliveira) www.marcioadrianomoraes.com 2 21/04/2014 Profissão de Fé Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo, Talhar no mármore divino Com o camartelo. [...] Torce, aprimora, alteia, lima A frase; e, enfim, No verso de ouro engasta a rima, Como um rubim. Invejo o ourives quando escrevo: Imito o amor Com que ele, em ouro, o alto relevo Faz de uma flor. [...] Quero que a estrofe cristalina, Dobrada ao jeito Do ourives, saia da oficina Sem um defeito: [...] Imito-o. E, pois, nem de Carrara A pedra firo: O alvo cristal, a pedra rara, O ônix prefiro. Porque o escrever - tanta perícia, Tanta requer, Que oficio tal... nem há notícia De outro qualquer. Por isso, corre, por servir-me, Sobre o papel A pena, como em prata firme Corre o cinzel. [...] Assim procedo. Minha pena Segue esta norma, Por te servir, Deusa serena, Serena Forma! [...] (Olavo Bilac) www.marcioadrianomoraes.com Via Láctea Súplica XIII "Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, pálido de espanto... Falava o sol. Dizia: “Acorda! Que alegria Pelos ridentes céus se espalha agora! Foge a neblina fria... Pede-te a luz do dia, Pedem-te as chamas e o sorrir da aurora!” E conversamos toda a noite, enquanto A via-láctea, como um pálio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: "Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?" E eu vos direi: "Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas". (Olavo Bilac) Dizia o rio, cheio De amor, abrindo o seio: “Quero abraçar-te as formas primorosas! Vem tu, que embalde veio O sol: somente anseio Por teu corpo, formosa entre as formosas! Quero-te inteiramente Nua! quero, tremente, Cingir de beijos tuas róseas pomas, Cobrir teu corpo ardente, E na água transparente Guardar teus vivos, sensuais aromas!” [...] Tudo a exigia... Entanto, Alguém, oculto a um canto Do jardim, a chorar, dizia: “Ó bela! Já te não peço tanto: Secara-se o meu pranto Se visse a tua sombra na janela!” (Olavo Bilac) www.marcioadrianomoraes.com 3