1
POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO
CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E ESTUDOS SUPERIORES
CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS
DEFESA CIVIL – O SISTEMA ESTADUAL E AS
CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS DA DECRETAÇÃO DO
ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA
Cap PM Airton Alves da Silva
São Paulo
1999
2
POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO
CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E ESTUDOS SUPERIORES
CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS
DEFESA CIVIL – O SISTEMA ESTADUAL E AS
CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS DA DECRETAÇÃO DO
ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA
Monografia
apresentada
no
Curso
de
Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do
Estado de São Paulo
Autor: Cap PM Airton Alves da Silva
Orientador: Cel PM Clodomir Ramos Marcondes
São Paulo
1999
3
AS DEDICATÓRIAS
Todo autor, no pórtico de seus trabalhos,
faz uma dedicatória a alguém. Aqui também
faço as minhas.
Em primeiro lugar dedico-o ao amor: àquela que, junto de mim, por anos e anos,
tem me criado uma atmosfera propícia às
conquistas do Espírito e da Cultura - minha
esposa Ivone.
Também às minhas filhas – Débora e
Marcela – que, com pequenos gestos de
carinho, me incentivam a continuar em busca
de meus objetivos pessoais e profissionais.
Aos meus pais: - José e Edith - cujos
esforços não foram medidos para orientar o
curso da minha vida.
4
AGRADECIMENTO
A Deus, por me oferecer a oportunidade
nesta vida para realização deste trabalho.
Ao Sr Cel PM Marcondes, pela orientação
certa e segura, auxiliando sobremaneira a
busca dos objetivos.
Ao Cap PM Roberval Ferreira França,
pela amizade e paciência nas incansáveis
horas de discussão sobre este trabalho.
Aos Srs Cel PM Roberto Lemes, Maj PM
Adauto, Capitães PM C.Botelho, Berardinelli,
Brito, Soares, Suzuki, Selma e Marli pela
prestimosa colaboração. E em especial ao
Ten PM Tércius, companheiro da equipe da
CEDEC/SP, estudioso do tema.
5
Por mais forte que sopre o vento
da
adversidade, não permita jamais que apague
os seus valores e as suas verdades.
ABREVIATURAS
6
CF – Constituição Federal
CEDEC - Coordenadoria Estadual de Defesa Civil
COMDEC – Comissão Municipal de Defesa Civil
CONDEC – Conselho Nacional de Defesa Civil
EMFA – Estado Maior das Forças Armadas
ESG – Escola Superior de Guerra
FUNCAP – Fundo Especial para Calamidades Públicas
GEACAP – Grupo Especial para Assuntos de Calamidades Públicas
ITR – Imposto sobre a Propriedade Rural
LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias
ONG’s – Organizações Não Governamentais
REDEC – Coordenadoria Regional de Defesa Civil
SINDEC – Sistema Nacional de Defesa Civil
SUMÁRIO
7
PREFÁCIO.................................................................................................... 9
.
RESUMO
12
.......................................................................................................
INTRODUÇÃO ............................................................................................. 13
1
A DEFESA CIVIL
17
..............................................................................
1.1
A Defesa Civil no Brasil.......................................................................... 17
1.2
A Defesa Civil no Estado de São Paulo................................................. 23
1.3
Defesa Civil – Conceitos e Definições................................................... 27
2
SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA – ESTADO DE
CALAMIDADE PÚBLICA ............................................................... 31...
2.1
Competência Legal................................................................................ 31
2.2
Elementos da Situação de Emergência ou Estado de Calamidade ........
Pública, Adotados pelo Estado de São Paulo.......................................
33
2.2.1 Desastre................................................................................................
33
2.2.2 Dano...................................................................................................... 35
2.2.3 Prejuízo.................................................................................................. 36
2.2.4 Critérios agravantes............................................................................... 36
2.2.5 Necessidade de recursos suplementares............................................
2.3
37
Declaração de Situação de Emergência ou Estado de Calamidade ........
Pública................................................................................................... 38
2.3.1 Momento da decretação........................................................................ 38
2.3.2 Homologação......................................................................................... 40
2.3.3 Reconhecimento.................................................................................... 41
3
ASPECTOS LEGAIS ...................................................................... 42
3.1
Referências às Disposições Legais em Circunstâncias de Desastre.... 43
3.1.1 Disposições legais aplicáveis em quaisquer circunstâncias de ........
desastre................................................................................................. 45
3.1.2 Disposições legais aplicáveis em situação de emergência e estado de ........
calamidade............................................................................................. 48
8
3.1.3 Disposições legais aplicáveis exclusivamente a estado de calamidade ........
pública.................................................................................................... 49
3.2
Conseqüências
jurídicas
da
não
observância
dos
preceitos ........
doutrinários e legais para decretação da situação de emergência ou ........
do estado de calamidade......................................................................
55
CONCLUSÃO..................................................................................... 64
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................. 65
BIBLIOGRAFIA................................................................................. 66
.
9
PREFÁCIO
Desde os primórdios da civilização o ser humano sempre se preocupou
com o socorro do companheiro ferido. A parábola do Bom Samaritano é um
exemplo vivo onde um fariseu é atendido e transportado por um viajante
cuidadoso.
Preparado para atender essas vítimas, continua preocupado em
oferecer auxílio e proteção a sua família, a sua vila, a sua cidade, enfim ao seu
país.
O cenário das guerras e dos cataclismos é uma realidade constante na
vida da pessoa solidária.
No início da Segunda Guerra Mundial, o Brasil procurou ficar neutro,
mantendo equilíbrio entre as grandes potências.
Devido ao ataque japonês a PEARL HARBOR no final de 1941 e após
o afundamento de cinco navios brasileiros por submarinos alemães, o governo
declara-se em estado de beligerância contra a Alemanha e Itália em agosto de
1942.
Surgindo a Defesa Civil no Brasil, as tragédias mostram de forma clara
o despreparo dos órgãos governamentais e da comunidade para controlar essas
catástrofes:
18 de março de 1967, Caraguatatuba – litoral Norte de São Paulo.
-
deslizamento – 210 mortes, além de 90 desaparecidas
10
24 de fevereiro de 1972, Edifício Andraus – São Paulo – incêndio 17
mortes
1º de fevereiro de 1974, Edifício Joelma – São Paulo – incêndio 186
mortes
14 de fevereiro de 1981, Edifício Grande Avenida – São Paulo –
incêndio – 17 mortes
25 de fevereiro de 1984, Vila Socó, Cubatão – São Paulo – explosão
seguida de incêndio no oleoduto – 70 mortes
11 de junho de 1996, Osasco Plaza Shopping Center – Osasco –
São Paulo – desabamento – 48 mortes.
É dez vezes mais perigoso andar pelas ruas do Brasil do que ter sido
combatente na Guerra do Vietnã.
É quarenta e três vezes mais perigoso andar pelas estradas e ruas
brasileiras do ter que sido soldado aliado na Guerra do Golfo.
A violência em São Paulo mata mais que a Guerra da Iugoslávia, 3256
homicídios (mortes) no 1º trimestre de 1999, 1500 mortes em 6 semanas na
guerra (Jornal da Tarde – 07/Maio/99).
Chega de tragédias e mortes !
O Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores da Polícia Militar,
exige de seus alunos a apresentação de monografia.
O Capitão PM AIRTON ALVES DA SILVA, aluno do Curso de
Aperfeiçoamento de Oficiais (CAO-I/99), teve a iniciativa de elaborar sua tese
baseada em uma larga experiência profissional, sendo profundo conhecedor do
assunto, trouxe os indicativos para a adequação e solução de tão importante
tema.
11
Escrita de maneira simples, didática de fácil entendimento e
direcionado aos profissionais interessados em reduzir os danos e controlar as
emergências, a monografia é roteiro jurídico, seguro, objetivo e inédito.
Parabéns ao autor que merece nossos aplausos.
Sucesso e realização.
ROBERTO LEMES DA SILVA
Coronel da Polícia Militar
Chefe da APMTJ/SP
12
RESUMO
A presente monografia trata dos aspectos jurídicos e decorrências
legais da decretação, homologação e reconhecimento da situação de emergência
ou estado de calamidade pública. Aborda e explicita critérios adotados pelo
Governo do Estado de São Paulo, considerando a envergadura do desastre, do
dano e do prejuízo, haja vista a União não tê-los baixados até a presente data.
Os dados, conceitos e definições foram obtidos através de pesquisa
documental bibliográfica e da coleta de normas legais e regulamentares que
disciplinam o assunto.
Conclui pela necessidade e oportunidade do fornecimento do
embasamento
técnico
e
jurídico
aos
policiais
militares
integrantes
da
Coordenadoria Estadual de Defesa Civil e, como conseqüência, da adequada
orientação dos Administradores Públicos Municipais.
13
INTRODUÇÃO
Remonta ao século passado, final do segundo Império, a preocupação
em socorrer as províncias do Nordeste que vivenciavam grave situação de
calamidade pública. Em virtude da grande seca que acometeu a região, o
Governo Imperial confiscou alimentos para distribuição aos flagelados; mais
adiante, com a
participação do Brasil na II Grande Guerra Mundial, dá-se
efetivamente o surgimento da Defesa Civil. Denominada à época como Defesa
Passiva Anti-aérea, tinha por objetivo preparar a população para defender-se
passivamente de possíveis ataques. Preocupava-se, na época, com a construção
de abrigos, sistemas de alarme, extinção de luzes, ordens de dispersão e outros
procedimentos típicos ao cenário de guerra.
Os anos se passaram e felizmente o fantasma da guerra com eles
desapareceu. Contudo, por falta de um enfoque governamental sobre a
abrangência e importância do tema, a
Defesa Civil também desapareceu da
tônica das atividades da administração pública.
14
Nos anos sessenta, em decorrência das fortes chuvas e sucessivos
escorregamentos havidos no Rio de Janeiro, ressurge a Defesa Civil. O êxito
obtido no atendimento das vítimas daquele flagelo deixou demonstrada a
importância de se ter um órgão específico para coordenação
dos esforços
dispendidos pelo governo, pelas entidades privadas e pela comunidade.
O Estado de São Paulo começa a despertar para o assunto somente
em março de 1967, com a ocorrência de deslizamento de morro no município de
Caraguatatuba. Contudo, o seu sistema de defesa civil só se organizou após os
incêndios dos edifícios Andraus e Joelma, no Centro da cidade de São Paulo,
ocorridos, respectivamente, nos anos de 1972 e 1974.
Após esta reminiscência histórica, o leitor mais atento e sensível ao
problema poderá estar se perguntando: Depois de tragédias dessa dimensão,
com centenas de perdas humanas e de prejuízos materiais significativos, dentre
outros, o governo, as entidades privadas e a comunidade estão preparadas para
as catástrofes?
A resposta há de ser fundamentada na análise dos seguintes dados:
a. A Assembléia Nacional Constituinte de 1988 estabeleceu, no artigo
84 - inciso VI da CF, que é competência privativa do Presidente da
República dispor sobre a organização e funcionamento da
Administração Pública Federal;
b. o inciso XVIII do artigo 21, da Carta Magna, dá competência à
União para planejar e prover a defesa permanente contra as
calamidades públicas, especialmente as secas e inundações; e
15
c. a matéria constitucional apresentada deu fundamentação à criação
do Sistema Nacional de Defesa Civil- SINDEC, instituído pelo
Decreto Federal nº 895/93. Este diploma legal estabelece, em seu
artigo 6º- inciso IV, que compete ao Conselho Nacional de Defesa
Civil – CONDEC, a aprovação de critérios para declaração,
homologação e reconhecimento da situação de emergência ou
estado de calamidade pública, dispondo inclusive em seu artigo
12 que a competência para a declaração pertence ao Município,
a homologação ao Estado e o reconhecimento à União.
Passada mais de uma década sem que o CONDEC normatizasse tais
critérios, a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Estado de São Paulo,
premida por inúmeros pedidos de homologação, estabeleceu critérios próprios a
fim de viabilizar a análise dos referidos pedidos. Extraiu, de alguns preceitos
legais e doutrinários, elementos que pautassem tal análise, em particular aqueles
estabelecidos implícita ou explicitamente no Artigo 37 da Constituição Federal:
“A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios
obedecerá
aos
princípios
de
legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também,
ao seguinte: ...”.
No entanto, surgindo norma federal superveniente, esta será
legalmente adotada, uma vez que tal competência é privativa da União, conforme
já se destacou.
16
Desta forma, objetiva-se fornecer embasamento técnico e jurídico aos
policiais militares integrantes da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil, do
Estado de São Paulo, para que os mesmos, além de aperfeiçoarem o serviço de
assessoramento prestado ao Governador do Estado, possam orientar os
Administradores Públicos Municipais no sentido de que passem a analisar a
situação desastrosa que vierem a enfrentar de forma análoga à da CEDEC. Essa
orientação, poderá abranger, inclusive, os aspectos jurídicos decorrentes do ato
de decretação, homologação e reconhecimento da situação de emergência ou
estado de calamidade pública.
Só o conhecimento muda comportamento. Como, felizmente, a cada
dia que passa a Administração Pública persegue melhorias, e a população se
conscientiza de seus direitos de cidadania, o presente trabalho monográfico não
tem a pretensão de esgotar o assunto, mas de fornecer subsídios para que
administradores e administrados estreitem seus caminhos e juntos consigam
adotar posturas preventivas na busca de qualidade de vida melhor para todos.
17
1
DEFESA CIVIL
1.1
A Defesa Civil no Brasil
A defesa contra eventos excepcionais, de intensa gravidade, que
assolam vastas regiões ou grandes núcleos populacionais, não era, nos
primórdios da República, tarefa atribuída à União. A Constituição de 1891 1 (art.
5º) autorizava a União a prestar
“socorros ao Estado que, em caso de
calamidade pública, os solicitar”. Estas solicitações foram tão constantes e
repetidas que já em 1897, o governo federal, pelo Ministério do Interior e Justiça,
baixava aviso a fim de disciplinar os casos em que cabia tal auxílio 2. A carta
Magna de 1934 (art. 7º,II, “in fine”) fazia dever da União “prestar socorros ao
Estado que, em caso de calamidade pública, os solicitar”.
O envolvimento do Brasil na II Grande Guerra Mundial nos colocou no
mapa do teatro de operações como região conflagrada e de beligerância. O
afundamento de embarcações em nossas águas marítimas trouxe a reboque o
fantasma da fragilidade na defesa organizada de nosso território, suscitando a
percepção da limitada, ou até inexistente capacidade de mobilização dos órgãos
governamentais e da população civil contra agressões externas.
Era imperioso ao Brasil contar com mecanismos de reação e
mobilização interna que lhe permitissem atuar no território inimigo com relativa
1
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988, v. 1,São Paulo:
Saraiva, 1990, p.166.
2
HORTA, Raul Machado. Tendências do Federalismo Brasileiro. Revista Brasileira de Estudos Poíticos,
28:11, apud FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988, v. 1,São
Paulo: Saraiva, 1990, p.166.
18
tranqüilidade. Foi nesse contexto que a Defesa Civil conquistou, ainda em 1942,
relevância e dimensão tornando-se uma das principais áreas de abrangência da
Doutrina de Segurança Nacional.
No período da II Grande Guerra Mundial, com o título de Defesa
Passiva Anti-aérea3, a infra-estrutura de Defesa Civil foi consolidada com a
finalidade de preparar a população a defender-se passivamente de possíveis
ataques ao país, determinando a adoção de medidas de proteção, individual e/ou
coletiva, a todos os brasileiros e estrangeiros residentes ou que aqui estivessem
em trânsito.
Com o aumento da tensão no cenário mundial o Governo Brasileiro
adotou procedimentos de implemento e adequação às medidas de proteção,
criando o Sistema de Defesa Passiva Anti-aérea4, integrado por serviços públicos
organizados, pelo aproveitamento e adaptação de órgãos federais, estaduais e
municipais, já existentes, e por serviços privados.
Para coordenar as ações de proteção desencadeadas, foi criada,
em 21 de Setembro de 1.942, como órgão diretor, orientador e consultivo, a
Diretoria Nacional do Serviço de Defesa Passiva Anti-aérea5, diretamente
subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, com sede no Distrito
Federal (à época, Rio de Janeiro).
No mês seguinte à criação da Diretoria Nacional, o ensino de defesa
passiva torna-se obrigatório para os alunos dos estabelecimentos de ensino,
públicos ou particulares, existentes no país6: e ainda torna-se obrigatório a todo o
3
Brasil. Decreto-lei n. 4.098, de 6 de fevereiro de 1942, define como encargos necessários à defesa da Pátria,
os serviços de defesa passiva anti-aérea.Rio de Janiero: DOU, 1942.
4
.Brasil. Decreto-lei n. 4.624, de 26 de agosto de 1942, cria o Serviço de Defesa Passiva Anti-Aérea e dá
outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1942
5
Brasil. Decreto-lei n. 4.716, de 21 de setembro de 1942, dispõe sobre a criação e organização da Diretoria
Nacional do Serviço de Defesa Passiva Anti-aérea, com sede no Distrito Federal, e dá outras providências.
Rio de Janeiro: DOU, 1942
6
Brasil. Decreto Lei n. 4.800, de 6 de outubro de 1942, torna obrigatório o ensino de defesa passiva e dá
outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1942
19
pessoal docente e administrativo dos mesmos estabelecimentos de ensino, o
estudo dessa nova disciplina7.
Vale lembrar que o serviço de defesa passiva constituía uma
obrigação para com o Estado5, à qual estavam sujeitos brasileiros e estrangeiros
residentes ou em trânsito no país. Entre os deveres registramos: receber
instrução sobre serviços; socorrer seus semelhantes; atender os sinais
convencionais de alarme, extinguir ou velar as luzes... etc.
Finalmente, em 30 de Setembro de 1.943, o Serviço de Defesa
Passiva Anti-aérea passa a denominar-se Serviço de Defesa Civil8.
Com o término da II Grande Guerra o Governo Federal não soube
reestruturar ou dar novas atribuições à Defesa Civil, e em 17 de Junho de 1.946,
simplesmente a extinguiu9.
Posteriormente, várias tentativas foram feitas para recriar a Defesa
Civil no Brasil:
a. em 1949 o Estado Maior das Forças Armadas elaborou Anteprojeto
da Lei de Defesa Civil, que não chegou a ser enviado ao Congresso;
b. em 1950 a Escola Superior de Guerra apresentou trabalho
recomendando a criação de um órgão central, em âmbito federal, e
outros regionais, em número equivalente às Regiões Militares, com
as quais deveriam manter íntima ligação, e
7
Idem a n.1
Brasil. Decreto Lei n.5.861, de 30 de setembro de 1943, modifica a denominação do Serviço de Defesa
Passiva Anti-aérea e da respectiva Diretoria Nacional. Rio de Janeiro: DOU, 1943.
9
Brasil. Decreto Lei n. 9.370, de 17 de junho de 1946, extingue o Serviço de Defesa Civil e dá outras
providências. Rio de Janeiro: DOU, 1946
8
20
c. em 1958 o Estado Maior das Forças Armadas encaminhou à
Presidência da República um novo Anteprojeto de Lei, não
aproveitado.
Em 1966 o Rio de Janeiro sofreu inundações, deslizamentos de
encostas e desabamento de moradias com dezenas de mortos. Como resultado,
foi criada a Comissão Estadual de Defesa Civil, pioneira no Brasil, graças à
iniciativa do Governador do Estado da Guanabara.
Em 1967, com a reforma administrativa, criou-se o Ministério do
Interior10, competindo-lhe:
a. o beneficiamento de áreas e obras de proteção contra secas e
inundações, e
b. a assistência às populações atingidas pelas Calamidades Públicas.
Durante algum tempo, os recursos financeiros atribuídos para viabilizar
ações governamentais, em benefício das populações atingidas, vinham sendo
aplicados de maneira ineficaz, uma vez que tais atividades eram praticadas por
órgãos municipais de forma isolada.
Em razão da conjuntura apresentada fez-se necessária a implantação
de uma coordenação única, em nível federal, a fim de racionalizar e dispor de
verba específica para assistência imediata, bem como reembolsar eventuais
despesas decorrentes. Criou-se então, em outubro do ano de 1969, o Fundo
Especial para Calamidades Pública – FUNCAP, regulamentado
Decreto lei n.º 66.204, de 13 de fevereiro de 1970.
por meio do
21
Em outubro de 1970, o Governo Federal criou o Grupo Especial para
Assuntos de Calamidades Públicas – GEACAP, com objetivo de coordenar e
orientar, em todo o território nacional, as atividades relacionadas à prevenção de
calamidades públicas, de assistência às populações atingidas e recuperação das
áreas flageladas.
Praticamente todos os Ministérios do Governo Federal estavam
representados no GEACAP. Cada um atuando dentro do campo de atividades
peculiares a sua pasta.
Graças à atuação do GEACAP, a estrutura básica de defesa civil
acabou implantada em todas as Unidades da Federação, demonstrando sua
operacionalidade em todos os eventos anormais ocorridos nas diversas regiões
brasileiras. E em decorrência dessa atuação, em 13 de agosto de 1979, quando
da reestruturação do Ministério do Interior11, em sua Secretaria Geral há a criação
da Secretaria Especial de Defesa Civil – SEDEC, com a finalidade de exercer, em
todo o território nacional, a coordenação das atividades relativas às medidas
preventivas, assistenciais e de recuperação dos efeitos produzidos por
fenômenos adversos de quaisquer origens, bem como, aquelas destinadas a
preservar o moral da população e o restabelecimento da normalidade da vida
comunitária. A SEDEC, também ficou incumbida de dar apoio técnico e
administrativo ao GEACAP.
Com a repetição e desenvolvimento de “fatos adversos”, por todo o
Brasil, os Municípios, os Estados e a União foram percebendo a necessidade
prática de se manterem interligadas as estruturas de defesa civil nos três níveis:
10
Brasil. Decreto Lei n. 200, de 25 de fevereiro de 1967, dispõe sobre a organização da Administração
Federal, estabelece diretrizes para a Reforma da Administrativa e dá outras providências. Rio de Janeiro:
DOU, 1967
22
a. Municipal – através das COMDEC – Comissões Municipais de
Defesa Civil,
b. Estadual – via CEDEC – Coordenadorias Estaduais de Defesa Civil,
e
c. Federal – pela atuação da Secretaria Especial de Defesa Civil e
suas Coordenadorias Regionais, especialmente se considerarmos
os fatores de apoio material e financeiro.
Em dezembro de 1988, a então Secretaria dá lugar ao Sistema
Nacional de Defesa Civil – (SINDEC)12, extingue-se o GEACAP, que tem sua
estrutura e destinação absorvidas pelo novo Sistema. Em agosto de 1993 o
SINDEC é reorganizado13, e, em 30 de Janeiro de 1995, a matéria Defesa Civil é
relacionada como área de competência do novo Ministério do Planejamento e
Orçamento14, ficando ligada à Secretaria Especial de Políticas Regionais, o que
se confirma em 1998, quando da recente reforma ministerial15.
Com o início de um novo mandato presidencial, houve uma nova
reestruturação ministerial, a Secretaria de Defesa Civil continuou integrando a
Secretaria Especial de Políticas Regionais, a qual passou a vincular-se
diretamente à Presidência da República, em decorrência da extinção do
Ministério do Planejamento e Orçamento.
11
Brasil. Decreto-lei n. 83.839, de 13 de agosto de 1979, dispõe sobre a estrutura básica do Ministério do
Interior, e dá outras providências. Brasília: DOU, 1979.
12
Brasil. Decreto n. 97.274, de 16 de dezembro de 1988, dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de
Defesa Civil (SINDEC), e dá outras providências. Brasília: DOU, 1988.
13
Brasil. Decreto n.895, de 16 de agosto de 1993, dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa
Civil ( SINDEC), e dá outras providências. Brasília: DOU, 1993
14
Brasil. Medida Provisória n. 886, de 30 de janeiro de 1995, dispõe sobre a organização da Presidência da
República e dos Ministérios, e dá outras providências. Brasília: DOU, 1995
15
Brasil. Lei n. 9.649, de 27 de maio de 1998, dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos
Ministérios, e dá outras providências. Brasília: DOU n. 100, de 28 de maio de 1998
23
1.2
A Defesa Civil no Estado de São Paulo
“... e o Homem principiou a compreender que não deveria temer
apenas e tão somente a guerra e a fúria dos elementos, mas, e
sobretudo, as catástrofes que chegavam sem qualquer aviso e
deixavam, em seu funéreo eclodir, a marca indelével da dor, do
pranto, do luto.
E tanto mais sua preocupação aumentou, quanto mais se
percebeu que, em muitos momentos de tragédia, poderia ter
minorado os sofrimentos, minimizado perdas, diminuído óbitos,
se preparado estivesse para se defender do acontecido”16.
Conforme demonstrado, a organização de sistemas de defesa passiva,
embriões da defesa civil, deu-se em decorrência de situação de guerra e, tão logo
essa se findou, os sistemas surgidos desapareceram. Não tinham os governantes
a clareza de que problemas adversos que pudessem surgir, decorrentes ou não
de atitudes humanas, não teriam sua solução e/ou superação vinculadas tão
somente aos mecanismos administrativos da própria estrutura governamental.
Não vislumbravam que “Governo nenhum, diante de determinadas
catástrofes tem capacidade para sozinho fazer frente a esses eventos,
havendo a necessidade de que povo mais Governo realizem o Bem-Estar da
Comunidade”17.
Com o surgimento de situações adversas, em que se evidenciou a
incapacidade governamental de enfrentar por si só todos os problemas, o que
somente se deu com a mobilização da comunidade, é que se constatou a
necessidade de se estabelecerem medidas para a preparação e emprego
racional de recursos humanos, materiais e financeiros, dando origem à Defesa
Civil.
16
RAMOS, Dr. Fábio Vidal, Defesa Civil - Apostila
24
No Estado de São Paulo, com a ocorrência de deslizamento de um
morro um na cidade de Caraguatatuba, em 1967, em decorrência de fortes
chuvas, é que se inicia a constatação, por parte do governo, da necessidade de
dispor-se de uma
estrutura para dar suporte técnico e operacional em tais
eventos. Começa-se a verificar que no atendimento de desastres o improviso
deve ser evitado.
Em 1969, repete-se a ocorrência de fortes chuvas na Capital e em
algumas cidades do interior, determinando a criação, pelo Governador, da 1ª
Comissão de Defesa Civil, vinculada à Secretaria de Promoção Social, devido ao
flagelo da comunidade, cuja duração foi episódica.
Duas outras catástrofes demonstraram o despreparo e a falta de
organização: os incêndios dos edifícios Andraus e Joelma, em 1972 e 1974
respectivamente, ambos com número elevado de vítimas.
Após o incêndio do edifício Joelma, foi constituído, na Secretaria de
Economia e Planejamento, um Grupo de Trabalho para estudar a Prevenção de
Incêndios em São Paulo. O item relativo à mobilização foi entregue à Casa Militar,
que concluiu pela necessidade de um trabalho mais amplo, abrangendo outros
tipos de eventos desastrosos; e ainda, que o enfrentamento de tais situações
dependia necessariamente da participação comunitária.
É em 1975, com a reorganização da Casa Militar, que se lhe atribui a
responsabilidade e competência para promover a organização e coordenação do
Sistema de Defesa Civil18; marco do surgimento do Sistema Estadual de Defesa
Civil19, órgão do Gabinete do Governador, com a finalidade de coordenar as
medidas destinadas a prevenir as conseqüências nocivas de eventos desastrosos
e a socorrer as populações e as áreas atingidas por esses eventos.
17
Apud RAMOS, Dr. Fábio Vida;. Defesa Civil - Apostila
Brasil. Decreto n. 5.796, de 5 de março de 1975, reorganiza a Casa Militar do Gabinete do Governador.
São Paulo: DOE, 1975
18
25
Atualmente, o Sistema Estadual de Defesa Civil 20 encontra-se
articulado com os órgãos do Sistema Nacional de Defesa Civil – SINDEC, e é
formado por órgãos e entidades da Administração Pública Estadual e dos
municípios, por entidades privadas e pela comunidade, sob a coordenação da
Coordenadoria Estadual de Defesa Civil – CEDEC, cuja direção é exercida pelo
Governador do Estado por meio de seu Secretário, Coronel PM-Chefe da Casa
Militar.
Os objetivos do Sistema Estadual de Defesa Civil são:
a. planejar e promover a defesa permanente contra desastres naturais
ou provocados pelo homem,
b. atuar na iminência e em situações de desastres,
c. prevenir ou minimizar danos,
d. socorrer e
e. assistir populações atingidas e recuperar áreas afetadas por
desastres.
Para atingir os objetivos colimados, o Sistema Estadual de Defesa Civil
dispõe da seguinte estrutura:
a. Órgão Central: a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil , a qual
dispõe de uma Diretoria Executiva junto à Casa Militar;
b. Órgãos Regionais: as Coordenadorias Regionais de Defesa Civil –
REDEC,
distribuídas
no
interior
do
Estado
e
na
Região
Metropolitana da Grande São Paulo, vinculadas à CEDEC;
c. Órgãos Municipais: as Comissões Municipais de Defesa Civil –
COMDEC, uma em cada município do Estado, que manifestar
oficialmente interesse em integrar o Sistema,
d. Órgãos Setoriais: os órgãos e entidades da Administração Pública
Estadual, envolvidos nas ações de defesa civil e
1919
Brasil. Decreto n. 7550, de 9 de fevereiro de 1975, dispõe sobre o Sistema Estadual de Defesa Civil. São
Paulo:: DOE, 1976
20
Brasil. Decreto n.40.151, de 16 de junho de 1995, reorganiza o Sistema Estadual de Defesa Civil, e dá
outras providência. São Paulo: DOU n. 114, de 17 de junho de 1995.
26
e. Órgãos de Apoio: entidades públicas e privadas. Por entidades
privadas entendem-se Organizações não Governamentais – ONGs,
clubes de serviços e associações diversas, que venham prestar
ajuda aos órgãos integrantes do Sistema Estadual de Defesa Civil e
que manifestarem oficialmente interesse em integrar referido
Sistema Estadual.
Com os objetivos delineados e a estrutura apresentada pelo Sistema
Estadual, a CEDEC passa a atuar da seguinte forma:
a. coordenando e supervisionando as ações de defesa civil;
b. mantendo atualizadas e disponíveis as informações relacionadas à
defesa civil;
c. elaborando e implantando planos, programas e projetos de defesa
civil;
d. prevendo
recursos
orçamentários
necessários
às
ações
assistenciais, de recuperação ou de recursos da União, na forma da
legislação vigente;
e. capacitando recursos humanos para as ações de defesa civil;
f. mantendo o órgão central do SINDEC informado sobre as
ocorrências de desastres e atividades de defesa civil,
g. propondo à autoridade competente a decretação ou homologação
de situação
de emergência e de estado de calamidade pública,
observando os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de
Defesa Civil – CONDEC e
h. providenciando a distribuição e o controle dos suprimentos
necessários ao abastecimento em situações de desastres.
Integram-se à CEDEC um representante de cada Secretaria de
Estado; um representante da Polícia Militar; um representante da Polícia Civil e
um representante do Fundo de Solidariedade do Estado de São Paulo.
1.3
Defesa Civil – Conceitos e Definições
27
Ao longo de décadas, diferentes conceitos sobre Defesa Civil foram
formados; contudo, todos assemelham-se na essência.
Na década de 50, a legislação estabelecia que: Defesa Civil é o
conjunto de medidas que tem por finalidade prevenir e minimizar, em
situações de guerra ou de paz, os riscos e perdas a que estão sujeitas a
população, os recursos e bens materiais de toda a natureza, por ação
inimiga ou em conseqüência de calamidades quaisquer. Compreende,
também, medidas para reparar ou restaurar os serviços públicos essenciais
e preservar a moral da população.
A convenção de Genebra, Suíça, adotou a seguinte definição: Defesa
Civil é o conjunto de medidas preventivas, de socorro, assistenciais e
recuperativas, destinadas a evitar conseqüências danosas de eventos
previsíveis ou imprevisíveis, preservar a moral da população e restabelecer
o moral da população e restabelecer o bem-estar social quando da
ocorrência desses eventos.
O Centro de Treinamento de Defesa Civil Internacional, com sede em
Benex (Genebra/Suíça) cita que: A Defesa Civil é necessária durante a
calamidade, indispensável em caso de guerra e útil todos os dias.
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha, opinando sobre Defesa
Civil, afirma: Defesa Civil engloba as tarefas humanitárias destinadas a
salvaguarda da população civil contra os efeitos que surjam de atos hostis
ou calamidades, para assegurar sua sobrevivência e para prover as
condições necessárias a sua existência.
O Estado Maior das Forças Armadas – EMFA, assim a conceitua:
Defesa Civil é um conjunto de medidas que tem por finalidade limitar, em
situação de guerra ou de paz, os riscos e perdas a que estão sujeitos a
28
população, os recursos e bens materiais, por ação inimiga ou em
conseqüência de calamidades quaisquer.
A Escola Superior de Guerra – ESG, apresenta a seguinte definição:
Defesa Civil é o conjunto de medidas destinadas a prevenir e limitar os
riscos e as perdas, aos quais ficam sujeitos a população e os recursos
materiais da Nação em decorrência de Guerras (atos hostis) ou de
calamidades públicas. Compreende, também, medidas tomadas para a
reparação dos serviços vitais do País e para a preservação da moral da
população.
Na atualidade, quando o Governo Federal organizou o Sistema
Nacional de Defesa Civil, adotou nova definição de Defesa Civil, a qual foi
recepcionada pela Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Estado de São
Paulo, e forneceu outros conceitos que a complementam e a caracterizam,
tornando mais claro seu entendimento:
a. Defesa Civil: o conjunto de ações preventivas, de socorro,
assistenciais e recuperativas destinadas a evitar ou minimizar os
desastres, preservar o moral da população e restabelecer a
normalidade social;
b. Preventiva: é a primeira fase, desenvolvida em períodos de
normalidade. É o período de elaboração de exercícios simulados
destinados ao desenvolvimento e aperfeiçoamento do sistema de
autodefesa, conforme os riscos de cada região ou município;
c. Socorro: dependem diretamente do treinamento e planejamento
realizados na fase preventiva. Atua diretamente nos efeitos do
desastres com emprego coordenado de pessoal treinado. É a fase,
por exemplo, da extinção do incêndio, resgates de vítimas,
evacuações, remoções etc.;
d. Assistencial:
os
trabalhos
da
fase
assistencial
ocorrem
concomitantemente ou logo após o impacto violento da emergência.
Constituem-se, dentre outras medidas, na alimentação, assistência
médica, abrigo da população vitimada;
29
e. Recuperativa: recuperar as instalações, obras de arte, etc. é a fase
mais longa e onerosa. É o período dos investimentos objetivando a
volta à normalidade da área atingida, restabelecendo as condições
anteriores da vida comunitária. Após concluída a fase recuperativa,
fecha-se o ciclo do atendimento emergencial e inicia-se a prevenção
de sua repetição;
f. Desastres: o resultado de eventos adversos, naturais ou provocados
pelo homem, sobre um ecossistema, causando danos humanos,
materiais ou ambientais e conseqüentemente prejuízos econômicos
e sociais;
g. Situação de Emergência: o reconhecimento pelo poder público de
situação anormal, provocada por desastres, causando danos
superáveis pela comunidade afetada e
h. Estado de Calamidade Pública: o reconhecimento pelo poder
público de situação anormal, provocada por desastres, causando
sérios danos à comunidade afetada, inclusive a incolumidade ou à
vida de seus integrantes.
O Governo do Estado de São Paulo, ao recepcionar as definições e
conceitos adotados pelo Sistema Nacional de Defesa Civil, entendeu ser
oportuno explicitar que as Comissões Municipais de Defesa Civil, instituídas
mediante legislação municipal, poderão constituir unidades-base e de execução
de ações de defesa civil;
pois, em situações de desastres, as atividades
assistenciais e de recuperação serão de sua responsabilidade, cabendo
posteriormente ao Estado, as ações supletivas, quando comprovadamente
esgotadas a capacidade de atendimento da Administração local. A atuação dos
órgãos federais, estaduais e municipais na área atingida, far-se-á sempre em
regime de cooperação, cabendo a coordenação à Comissão Municipal de Defesa
Civil.
Daí a importância de se estimular o trabalho das Comissões Municipais
de Defesa Civil no sentido de permanente integração das áreas municipais entre
si e com órgãos regionais da esfera estadual, federal, organizações privadas e a
30
comunidade em geral. Desse trabalho é que se obterá o maior ou menor grau de
capacidade tempo/resposta do município que vier a sofrer um desastre.
SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA – ESTADO DE
2
CALAMIDADE PÚBLICA
2.1
Competência Legal
A Assembléia Nacional Constituinte de 1988 definiu no artigo 84 inciso
VI, da Constituição Federal, que é competência privativa do Presidente da
31
República “dispor sobre a organização e funcionamento da Administração
Pública Federal”; dispôs ainda, no artigo 21 inciso XVIII, da Carta Magna, que é
da competência da União “planejar e promover a defesa permanente contra
as calamidades públicas, especialmente as secas e inundações”. Em
decorrência de tais preceitos Constitucionais foi editado, em 16 de Agosto de
1993, o Decreto Federal n.º 895, que organizou o Sistema Nacional de Defesa
Civil, o qual traz em seu artigo 6o inciso IV, que compete ao Conselho Nacional
de Defesa Civil – CONDEC, a aprovação de critérios para a declaração,
homologação e reconhecimento da situação de emergência ou do estado de
calamidade pública, dispondo inclusive em seu artigo 12, que a
competência para a declaração pertence ao Município, a da homologação ao
Estado e o reconhecimento à União. No entanto, passado mais de uma
década, inexiste norma acerca de tais critérios que ampare os mencionados atos
da Administração Pública.
A Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Estado de São Paulo, ao
receber inúmeros pedidos de homologação, deparou-se com uma situação
administrativa delicada: se de um lado não encontrava critérios técnicos que
viabilizassem qualquer tipo de análise, por outro deparava-se com situação fática
de possível repercussão jurídica e social. Diante de tal quadro, extraiu de alguns
preceitos legais e doutrinários critérios que pautassem tal análise, critérios esses
contidos implícita ou explicitamente no Artigo 37 da Constituição Federal 21 :
“A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: ...”.
21
Constituição Federal, DOU, 1988
32
No entanto, surgindo norma federal superveniente, esta será
legalmente adotada, naquilo que couber, uma vez que tal competência é privativa
da União, conforme já se destacou.
Com tal adoção, pode a CEDEC analisar cada pedido de homologação
impedindo-a de tornar-se “devedora de falsos credores”. Isto porque no
desenvolvimento das análises encontramos prefeituras que confundem Estado de
Calamidade Pública, em sua essência, com a exclamação popular calamidade
pública; outras procuram utilizar-se da decretação como resposta política a seus
munícipes e como meio de tentar pressionar, as demais esferas de governo, a
liberar
recursos
financeiros
e/ou
materiais
para
executar
obras,
cuja
responsabilidade lhe é originária. Entretanto, o ponto mais delicado é que aqueles
que se dispõem a tal prática desconhecem os efeitos jurídicos que podem
dela decorrer. A bem da verdade não lhes ocorre que poderão estar causando
sérios prejuízos à própria Administração Pública e aos munícipes.
2.2
Elementos da Situação de Emergência ou Estado de
Calamidade Pública adotados pelo Estado de São Paulo
Da análise dos conceitos de Situação de Emergência e de Estado de
Calamidade
Pública,
oferecidos anteriormente,
encontram-se
os termos:
desastre, dano e prejuízo, os quais foram adotados pela CEDEC/SP22 da
seguinte forma:
2.2.1 Desastre
22
São Paulo. Resolução C. Mil 4.610-CEDEC, de 16 de novembro de 1995, estabelece critérios para
Homologação da Declaração de Situação de Emergência ou de Estado de Calamidade Pública no Estado de
São Paulo.DOE,1995
33
Desastre é o resultado de eventos adversos, naturais ou
provocados pelo homem sobre um ecossistema vulnerável, causando
perdas humanas, danos materiais e ambientais e conseqüente
prejuízos econômicos e sociais, qualificados de acordo com sua
magnitude (gravidade) e grau de vulnerabilidade do sistema receptor.
Desastre de Nível I
Acidentes e ou desastres de pequeno porte, características:
a) danos pouco
importantes,
mais facilmente suportáveis e/ou
superáveis, pela comunidade afetada;
b) não são caracterizadores de situação anormal (situação de
emergência ou estado de calamidade pública);
c) prejuízos pouco vultosos.
Desastre de Nível II
Desastre de médio porte, características:
a) os danos podem ser suportáveis (ou superáveis) por comunidades
bem preparadas,
b) prejuízos mediamente vultosos, ou apenas significativos e
c) não são, em princípio, causadores de situação anormal, no entanto,
podem atingir uma faixa limítrofe com a situação de emergência,
para tanto devem ser observados os critérios agravantes.
Desastre de Nível III
Desastres de grande porte, características:
a) causam danos suportáveis e/ou superáveis por uma comunidade
bem preparada, além de prejuízos vultosos,
34
b) a situação de anormalidade pode ser superada com recursos do
município reforçada ou suplementada por meios estaduais e/ou
federais e
c) caracteriza a situação de emergência.
Desastre de Nível IV
Desastres de muito grande porte, características:
a) danos sérios, dificilmente suportáveis e/ou superáveis pela
comunidade local, causadores de prejuízos vultosos,
b) a volta da situação de normalidade depende de substancial ajuda de
fora da área atingida e
c) caracteriza o estado de calamidade pública, sendo possível em
casos excepcionais a decretação do Estado de Defesa (art. 136
CF).
2.2.2 Dano
Dano é a medida que define a intensidade ou severidade de um
acidente ou desastre, classificação:
Quanto à dificuldade de retorno à situação de normalidade
a) raramente serão suportáveis e superáveis pelas comunidades
locais;
b) danos sérios: têm caráter irreversível ou de recuperação muito
difícil; e
c) danos suportáveis e/ou superáveis: têm caráter reversível ou de
recuperação menos difícil, são mais facilmente suportáveis pela
comunidade local.
35
Quanto ao objeto
a) humanos: desalojados, desabrigados, deslocados, desaparecidos,
feridos gravemente, feridos levemente, enfermos e mortos,
b) materiais: edificações, instalações e outros locais e
c) meio ambiente: medidos em função do volume de recursos
necessários para reabilitação do meio ambiente.
2.2.3 Prejuízo
Prejuízo é a medida que define o volume de perdas econômicas
ou sociais provocadas por desastres, classificação:
Quanto à intensidade
a) pouco vultosos: provocado por desastres de pequeno e médio
porte (nível I e II);
b) mediamente vultosos: podem ser provocados por acidentes de
médio porte (nível II),
c) vultosos: provocados por desastres de porte (nível III) e
d) muito vultosos: provocados por desastres de muito grande porte
(nível IV).
Quanto ao objeto
a) econômicos: aferidos pelo PIB (Produto Interno Bruto) em função –
da agricultura, pecuária, indústria, comércio, mineração, transportes
e
b) sociais: interrupção de funcionamento ou colapso nos serviços
públicos essenciais (ex.: saúde, transporte, segurança pública,
distribuição de energia elétrica, esgoto, águas pluviais, coleta de
lixo, etc.).
36
Obs.: Os danos e prejuízos são critérios preponderantes que irão
caracterizar a intensidade do desastre e a necessidade ou não de recursos
suplementares, para o retorno da situação de normalidade.
2.2.4 Critérios agravantes
São outros eventos ocorridos após o desastre, agravando a
situação anormal da comunidade assolada, dificultando o retorno desta
à situação de normalidade; são eles:
Padrão evolutivo do Desastre, classificam-se:
a) súbitos: ocorrem de forma inesperada e surpreendente, podendo ser
inclusive previsíveis, se forem de natureza cíclica e de caráter
sazonal;
b) por somação: somação de efeitos, parciais, considerados a longo
prazo.
Ocorrência de Desastres Secundários:
a) desastres secundários que agravam a situação anormal provocada
pelo desastre primitivo.
Níveis de Preparação e Eficiência:
- da Administração Pública e da Defesa Civil, aferidos de acordo com
a capacidade de resposta aos desastres e sobre o restabelecimento
da situação de normalidade.
Grau de Vulnerabilidade do cenário do desastre e da
comunidade local:
a) senso de percepção de riscos;
b) grau de segurança da população aferido pelos órgãos formadores
da opinião pública
37
c) vontade da Administração Pública Municipal em aumentar a
segurança da população;
d) responsabilidade e nível de competência da Administração
municipal.
2.2.5 Necessidade de recursos suplementares
A
necessidade
de
Recursos
Suplementares
terá
como
caracterizador os danos e os prejuízos provocados pelo evento
desastroso, classificam-se:
a) não significativa: provocados por danos pouco importantes e
prejuízos pouco vultosos, facilmente superáveis e suportáveis pela
comunidade afetada;
b) pouco significativa: provocados por danos superáveis e/ou
suportáveis e por prejuízos pouco vultosos, necessitando o
município de pequeno suplemento de recursos para retornar à
normalidade;
c) significativa: provocado por danos superáveis e/ou suportáveis e
por prejuízos vultosos, necessitando de um suplemento expressivo
para o retorno da situação de normalidade;
d) muito significativa: provocados por danos sérios e por prejuízos
muito vultosos, necessitando de substancial destinação de recursos
suplementares.
2.3
Declaração da Situação de Emergência ou de Estado de
Calamidade
Documento oficial (Decreto) que registra e divulga uma situação
anormal provocada por desastre, com danos suportáveis ou não pela
38
comunidade. São competentes para tal declaração, os Prefeitos e o Governador
do Distrito Federal.
2.3.1 Momento da decretação da situação de emergência ou
estado de calamidade pública
A finalidade da Administração Pública resume-se em um único
objetivo, o bem comum, ou seja, proporcionar uma série de condições físicas e
morais que permitam a manutenção e aprimoramento da vida humana, para tanto
a declaração de situação de emergência ou do estado de calamidade pública é
ato necessário para desencadear procedimentos administrativos, com uma
destinação final que é o retorno da normalidade da comunidade assolada por
qualquer evento desastroso.
Para tanto, os atos motivadores da decretação da situação de
emergência ou do estado de calamidade pública, pelo município, devem estar
fundamentados em situações de fato e de direito que tipifiquem a situação
anormal, exigindo-se correlação lógica entre evento e a situação desastrosa a
qual motivou aquele procedimento desta forma, sendo que tal motivação deve ser
contemporânea ao fato que lhe deu causa (evento desastroso), pois se não
observado tal disposto o ato estará viciado.
Assim, por exemplo, estaria viciado o ato e passível de anulação ou
revogação pela própria Administração Pública ou anulado pelo poder judiciário, a
decretação de situação de emergência ou de estado de calamidade, no mês de
julho de fato desastroso de médio porte ocorrido no mês de janeiro do mesmo
ano, sendo que o município não se encontra mais vitimado pela situação
anormal, assim esta decretação estaria razoavelmente em desacordo com
critérios aceitáveis do ponto de vista racional, isto é incoerente, desarrazoada,
sendo, além de inconveniente, ilegítima.
39
Desta forma, não pode o administrador praticar o presente ato, com
intuito
de
conquistar
certas
finalidades
dele
decorrentes,
pois
estará
impregnando-o de total vício, o que não coaduna com sua destinação legal e
doutrinária.
Para tanto, o decreto de declaração de situação de emergência ou de
estado de calamidade pública deve estar devidamente alicerçado pelos princípios
componentes do ato administrativo, sobretudo os consagrados no artigo 37 da
CF, ou seja, legalidade, impessoalidade, moralidade e da publicidade.
Aliada a decretação da situação de emergência ou do estado de
calamidade pública, temos a necessidade legal, da homologação, por parte do
Governo do Estado, e o reconhecimento, este pelo Governo Federal. Tais atos
são necessários para o desencadeamento legal das providências que cada caso
pode vir a requerer. Esta homologação, bem como o reconhecimento, ratificam a
situação declarada, assegurando, assim, a execução das providências legais
necessárias, de competência de cada ente federativo envolvido; para tanto, tais
atos devem estar cingidos pelos mesmos motivos que dão origem à declaração,
caso contrário também estarão contaminados pelo vício, tornando os atos
executivos deles decorrentes como que praticados com total desvio de finalidade
pública, sujeitos, além da sua anulação ou revogação, as demais conseqüências
e responsabilizações legais.
Concluindo, a decretação, homologação e o reconhecimento da
situação de emergência ou do estado de calamidade pública, devem ter como
fundamento um fato contemporâneo, isto é, durante o frigir dos acontecimentos,
além de estarem dotados de natural razoabilidade, para não se tornarem
inconvenientes e ilegais, bem como proporcionais na sua extensão e intensidade,
requisitos necessários igualmente para atingirem o interesse público de retorno à
situação de normalidade, uma vez que as possíveis restrições a liberdade ou à
propriedade dos administradores deles decorrentes, só serão obrigatórios para
satisfação deste interesse; assim, se a medida for inadequada, estará
inadequada com relação à própria finalidade da lei.
40
2.3.2 Homologação da situação de emergência ou estado de
calamidade pública
Aprovação e confirmação da situação declarada habilitando-a a
produzir os efeitos jurídicos próprios.
A competência de tal homologação pertence ao Governo Estadual,
estando o Distrito Federal por razões próprias dispensado da homologação.
Para ser oportuno, tendo em vista as peculiaridades da própria
Administração Pública, esta terá o prazo razoável de 120 horas para avaliar a
situação desastrosa, homologando ou não a declaração formalizada pelo
município.
2.3.3 Reconhecimento da situação de emergência ou estado de
calamidade
Portaria do Ministro da Secretaria Especial de Políticas Regionais
reconhecendo e proclamando a legitimidade da declaração e homologação da
situação anormal para produção dos seus efeitos jurídicos.
41
3
ASPECTOS LEGAIS
Na medida em que vai se consolidando o amadurecimento social,
sedimenta-se a certeza de que a responsabilidade pelo bem-estar social não
pode e nem deve ser atribuída em caráter exclusivo ao governo. É essa mesma
certeza que tem impulsionado a sociedade na direção de uma maior
conscientização e envolvimento com o problema.
Esse grau de conscientização apresenta como decorrência um
paradoxo: ao mesmo tempo em que a sociedade civil organizada torna-se mais
42
solidária, o cidadão, individualmente, e os grupos sociais, coletivamente, exigem
dos órgãos governamentais maior responsabilidade resolutiva.
Já vai longe o tempo em que a sociedade se comprazia em receber
justificativas superficiais, declarações vazias e promessas vagas. Cada vez mais
o usuário dos serviços públicos prepara-se para exigir seus direitos e cobrar
responsabilidades dos gestores da coisa pública. Ao mesmo tempo em que o
cidadão é mais solidário, ele espera e exige do governo mais efetividade na
prevenção ou minimização dos efeitos dos desastres.
Ciente de seus direitos e bem informado quanto às responsabilidades
dos órgãos governamentais, o cidadão comum não hesita em buscar a
responsabilização judicial dos responsáveis pela prevenção dos desastres,
exigindo-lhes ampla cobertura de socorro e assistência às vítimas e pronta
recuperação da área flagelada. Cada vez mais recrudesce a predisposição pela
interposição de ações de responsabilidade civil contra o Estado e Municípios,
com os pleitos por indenizações decorrentes de perdas e danos materiais ou
morais, por exemplo, dentre outros instrumentos jurídicos.
Evitar ou minimizar desastres, preservar o moral da população e
restabelecer a normalidade social são, com certeza, os fins e a razão de ser da
Defesa Civil. Na medida em que se amplia a incidência de eventos desastrosos,
com uma freqüência cada vez maior, cogita-se também, por vezes, pelo próprio
Ministério Público, a responsabilização de prefeitos e governadores por
improbidade administrativa em face da omissão na implementação de medidas
preventivas.
Por essas razões, o tratamento do tema requer mais do que uma
abordagem meramente retórica, onde declarações de princípios jamais
encontram lugar ou efeito prático no cotidiano e na vida das pessoas.
43
É com esse ímpeto que passamos a fornecer elementos para nortear
decisões da Administração Pública acerca das responsabilidades legais de seus
atos e suas conseqüências.
3.1
Referências às Disposições Legais em Circunstâncias de
Desastres
Ao longo dos anos, numerosas disposições legais foram estabelecidas
na legislação brasileira, com a finalidade de facilitar o restabelecimento da
situação de normalidade, em circunstâncias de desastres
Tanto as disposições legais como as medidas administrativas
estabelecidas por ocasião de desastres podem ser classificadas como:
Genéricas, quando estabelecidas em legislação corrente e ordinária.
Nesses casos, por terem caráter geral, são aplicáveis em quaisquer
circunstâncias de desastre, em função do nível de abrangência
definido pela decretação de situação de emergência ou de estado de
calamidade pública.
Restritas ou específicas, quando estabelecidas em legislação
específica ou para atender a um desastre determinado. Nesses casos,
embora a norma tenha sido prevista para ser utilizada apenas quando
julgada necessária, pode estabelecer precedente jurídico e caracterizar
jurisprudência firmada.
Tanto as disposições genéricas como as específicas são aplicáveis em
três níveis de abrangência decrescente:
44
Disposições aplicáveis em qualquer circunstância de desastre,
mesmo que não se decrete situação de emergência ou estado de
calamidade pública.
Disposições aplicáveis nos casos em que se decretou situação de
emergência ou estado de calamidade pública.
Disposições aplicáveis apenas nos casos em que se decretou
estado de calamidade pública
É necessário que os especialistas em defesa civil e as autoridades
administrativas conheçam todas as possíveis implicações jurídicas relacionadas
com a decretação de situação de emergência ou estado de calamidade pública;
pois a decretação dessas situações de anormalidade implica a geração de
direitos e a isenção de obrigações, e, conseqüentemente, seu desconhecimento
pode surpreender o administrador com redução da arrecadação ou com a
geração de despesas imprevistas.
3.1.1 Disposições legais aplicáveis em quaisquer circunstâncias
de desastre
As disposições legais e medidas administrativas apresentadas nesta
seção
são
aplicáveis
em
quaisquer
circunstâncias
de
desastre,
independentemente da decretação de situação de emergência ou estado de
calamidade pública.
Disposições de caráter genérico:
Constitucionais:
............
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
45
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos seguintes termos:
............
XI – a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela
podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em casos de flagrante
delito ou desastre, ou para prestar socorro ou, durante o dia, por determinação
judicial;
XXV – no caso de iminente perigo público, a autoridade
competente poderá dispor de propriedade particular, assegurada ao proprietário
indenização ulterior, se houver dano;
............
Para garantir esses direitos, em caso de desastre, ou para prestar
socorro, o agente de defesa civil está autorizado a penetrar nas casas, de dia ou
de noite, mesmo sem consentimento do morador, sem que seja necessário
mandado judicial ou a decretação de situação de emergência ou estado de
calamidade pública.
Nos casos de perigo público iminente, mesmo antes da ocorrência do
desastre, a autoridade competente poderá dispor (usar livremente, utilizar,
determinar, fazer o que se quer de alguma coisa) de propriedade particular,
cabendo a indenização apenas naqueles casos em que resultar dano ou prejuízo,
em conseqüência do uso. Nesses casos, para garantir o direito à vida, a
autoridade pode, inclusive, determinar a evacuação compulsória de residências.
Decreto 895, de 16 de agosto de 1993 - Dispõe sobre a
organização do Sistema Nacional de Defesa Civil – SINDEC, e
dá outras providências.
.................
Art.13 – Em situações de desastres, as atividades assistenciais e
de recuperação serão da responsabilidade do Governo Municipal ou do
Distrito Federal, cabendo ao Estado e, posteriormente, à União as
46
ações supletivas, quando comprovadamente empenhada a capacidade
de atendimento da administração local.
§ 1º - Caberá aos órgãos públicos, localizados na área atingida, a
execução imediata das medidas que se fizerem necessárias.
§ 2º - A atuação dos órgãos federais, estaduais e municipais, na
área atingida, far-se-á sempre em regime de cooperação, cabendo a
coordenação ao órgão local de defesa civil.
Disposições de caráter específico:
Caracterização da Omissão de Socorro como Crime Culposo
A omissão de socorro em casos de emergências médico-cirúrgicas
caracteriza crime culposo. Podem incorrer em crime culposo, por omissão de
socorro em casos de emergências médico-cirúrgicas, os médicos, enfermeiros,
cirurgiões dentistas, auxiliares de enfermagem, socorristas, diretores de hospitais
e de serviços e demais profissionais relacionados com a assistência médicacirúrgica e/ou com atendimento hospitalar e pré-hospitalar (APH) de urgência.
Omissão de Socorro em Circunstâncias de Naufrágio e de
Outros Sinistros com Embarcações
O Brasil é signatário de acordos e tratados internacionais relacionados
com a navegação, que definem a obrigatoriedade de prestar socorro em
circunstâncias de naufrágio e de outros sinistros com embarcações.
A legislação, decorrente da regulamentação desses acordos e
tratados, caracterizou como crime culposo a omissão do socorro nessas
circunstâncias.
47
Podem incorrer nesse crime os comandantes e as tripulações das
embarcações omissas e seus proprietários, caso tenham sido cientificados
previamente e concordaram com a decisão de omissão.
Omissão de Socorro em Circunstâncias de Desastre
O art.5º. incisos XI e XXV, da Constituição Federal de 1988, trata da
questão enunciada.
O art. 2º do Decreto n.º 895/93 estabelece que são objetivos do
SINDEC:
I.
Planejar e promover a defesa permanente contra desastres
naturais ou provocados pelo homem;
II.
Atuar na iminência e em situações de desastre;
III. Prevenir ou minimizar danos, socorrer e assistir populações
atingidas e recuperar áreas deterioradas por desastres.
Em conseqüência, o agente de defesa civil que se omitir de suas
obrigações de prestar socorro e de ordenar a evacuação de moradias em
situação de risco iminente, em conseqüências de desastre, incorre em crime
culposo.
3.1.2 Disposições legais aplicáveis em situação de emergência e
estado de calamidade pública
As disposições legais e as medidas administrativas apresentadas
nesta seção são aplicáveis nos casos em que forem decretados situação de
emergência ou estado de calamidade pública.
48
Disposições de caráter genérico:
Licitações
A Lei n.º 8.666/93 – e suas alterações, regulamenta o Art. 37, inciso
XXI da Constituição Federal, instituindo normas para licitações e contratos da
Administração Pública. O Art. 24, da referida lei, em seu inciso IV, em situações
definidas neste, dispensa a licitação para aquisição de bens e para a contratação
de obras e serviços, os quais devem estar concluídos no prazo de 180 dias
consecutivos e ininterruptos da ocorrência do fato que motivou a declaração de
emergência ou Estado de Calamidade. O art. 89 do mesmo dispositivo legal
tipifica o crime e sua pena no caso de dispensar licitação fora dos casos da Lei.
Então a caracterização da Situação de Emergência ou Estado de Calamidade
deve coadunar, de tal forma, com os requisitos legais e doutrinários para não
conduzir o administrador à prática do fato típico, previsto nesse artigo.
Disposições de caráter específico:
Decretos e Atos Administrativos do Poder Público
As
praxes
administrativas
aplicáveis,
tanto
em
situações
de
emergência como em estado de calamidade pública, estão fundamentadas no
Decreto n.º 1080, de 8 de março de 1994, que regulamenta o FUNCAP.
Destacamos as seguintes:
-
suprimento de recursos materiais disponíveis nos órgãos do
SINDEC ou que possam ser adquiridos com recursos financeiros
previstos em orçamento;
49
-
transferência de recursos financeiros, previstos em orçamento,
mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos previstos
por bancos oficiais;
-
concessão de créditos subsidiados por bancos oficiais;
-
prorrogação de prazos para o pagamento de débitos a bancos
oficiais.
3.1.3 Disposições legais aplicáveis exclusivamente a estado de
calamidade pública
Quando for decretado estado de calamidade pública, são aplicáveis
todos os dispositivos citados anteriormente e mais os que serão apresentados no
prosseguimento:
Disposições de caráter genérico:
Dispositivos Constitucionais
Os artigos n.º 62, 136, 148 e 167, da Constituição Federal, são
pertinentes ao estado de calamidade pública, no contexto de defesa civil.
Decreto n.º 895/93
.............
Art.3º.......
IV – estado de calamidade pública: o reconhecimento pelo poder
público de situação anormal, provocada por desastre, causando sérios
danos à comunidade afetada, inclusive à incolumidade ou à vida de
seus integrantes.
..........
50
Art.14 – Na situação definida no inciso IV do Artigo 3º, ou na
iminência de sua ocorrência, o Secretário de Políticas Regionais, ou
autoridade a quem o Órgão Central do SEINDEC estiver subordinado,
poderá requisitar temporariamente servidores de órgãos ou entidades
integrantes do SINDEC, bem como contratar pessoal técnico
especializado para a prestação de serviços eventuais nas ações de
defesa civil, observando o disposto no Título VII da Lei n.º 8112, de 11
de dezembro de 1990.
Parágrafo único – O servidor público requisitado na forma do
“caput” deste artigo ficará à disposição do SINDEC, sem prejuízo do
cargo ou função que ocupe e da remuneração e dos direitos
respectivos, à conta do órgão cedente, não fazendo jus a retribuição ou
gratificação especial, salvo recebimento de diárias e transporte, em
caso de deslocamento.
Art.15 – Para o cumprimento das responsabilidades que lhes são
atribuídas neste Decreto, os órgãos e entidades públicos federais
integrantes do SINDEC utilizarão recursos próprios, objeto de dotações
orçamentárias específicas, as quais poderão ser suplementadas
através da abertura de crédito extraordinário, na forma do art. 167,
parágrafo 3º, da Constituição.
............
Fundo Especial para Calamidades Públicas (FUNCAP)
O FUNCAP, regulamentado pelo Decreto n. 1.080/94, tem por objetivo
financiar as ações de socorro, de assistência à população e reabilitação de áreas
atingidas por calamidades públicas. Sua dotação no orçamento da União,
aumenta a flexibilidade do SINDEC e reduz a necessidade de se recorrer com
freqüência às medidas provisórias.
51
Art.1º - O Fundo Especial para Calamidades Públicas – FUNCAP,
criado pelo Decreto-lei n.º 950, de 13 de outubro de 1969, e ratificado,
nos termos do art. 36 do Ato das Disposições Transitórias, pelo
Decreto Legislativo n.º 66, de 18 de dezembro de 1990, tem por
finalidade financiar ações de socorro, de assistência à população e de
reabilitação de áreas atingidas.
Parágrafo único – As aplicações de recursos do FUNCAP
destinam-se:
a) suprimento de:
1. alimentos;
2. água potável;
3. medicamentos, material de penso, material de primeiros
socorros e artigos de higiene individual e asseio corporal;
4. roupas e agasalhos;
5. material de estacionamento ou de abrigo, utensílios domésticos
e outros;
6. material necessário à instalação e operacionalização e
higienização de abrigos emergenciais;
7. combustível, óleo e lubrificantes;
8. equipamentos para resgate;
9. material de limpeza, desinfecção e saneamento básico
emergencial;
10. apoio logístico às equipes empenhadas nas operações;
11. material de sepultamento;
b) pagamento de serviços relacionados com:
1.
desobstrução,
desmonte
de
estruturas
definitivamente
danificadas e remoção de escombros;
2.
restabelecimento
emergencial
essenciais;
3.
outros serviços de terceiros;
4.
transporte;
dos
serviços
básicos
52
c) reembolso de despesas efetuadas por entidades públicas ou
privadas prestadoras de serviços e socorros.
Art. 2º - A condição para a aplicação dos recursos nas ações
estabelecidas no artigo 1º deste Decreto é o reconhecimento do estado
de calamidade pública pelo Governo Federal.
Parágrafo único – O estado de calamidade pública, observados
os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Defesa Civil –
CONDEC, será reconhecido por portaria assinada pela autoridade a
quem o Órgão Central do SINDEC estiver subordinado, à vista do
decreto do Governador do Distrito Federal ou do Prefeito Municipal,
homologado este pelo Governador do Estado.
Desapropriação por Utilidade Pública
O Decreto-lei n.º 3.365, de 21 de junho de 1941, é que dispõe sobre a
desapropriação por utilidade pública. Examinemos alguns artigos pertinentes ao
tema:
Art.1º - A desapropriação por utilidade pública regular-se-á por
esta lei, em todo o território nacional.
Art.2º - Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens
poderão ser desapropriados pela União, pelos Estados, Municípios,
Distrito Federal e Territórios.
Art.5º - Consideram-se casos de utilidade pública:
............
d) o socorro público em caso de calamidade;
............
Portanto, em caso de estado de calamidade pública, todos os bens
poderão ser desapropriados pelos Municípios, Distrito Federal, Territórios,
53
Estados e/ou União, mediante declaração de utilidade pública, com a finalidade
de facilitar as ações de resposta aos desastres e reconstrução.
É desejável que, nessas oportunidades, sejam desapropriadas as
áreas de riscos intensificados de desastres, para reduzir a necessidade de
socorro público, quando da ocorrência dos próximos eventos adversos.
Imposto sobre a Propriedade Rural – ITR
O Decreto n.º 84865, de 6 de maio de 1990, regulamenta a Lei n.º
6746, de 10 de dezembro de 1979, que trata do Imposto sobre a Propriedade
Rural, e dá outras providências.
Art.13 – Nos casos de intempérie ou calamidade de que resulte
frustração de safras ou destruição de pastos, o Ministério da Agricultura poderá
determinar que o percentual de redução referido no art. 8º seja:
a) calculado com base em dados do ano anterior ao da
ocorrência;
b) fixado
genericamente
para
todos
os
imóveis
que
comprovadamente estejam situados na área da intempérie ou
da calamidade.
Parágrafo único: Nos casos de estado de calamidade pública,
decretado pelo Poder Público Federal; ou Estadual, a redução de que
trata o artigo 8º poderá ser de 90% (noventa por cento), desde que o
imóvel tenha sido efetivamente atingido pelas causas determinantes
daquela situação.
A redução prevista no parágrafo único, do artigo 13 desse Decreto
aplica-se aos casos em que o estado de calamidade pública, observados os
critérios estabelecidos pelo CONDEC, foi reconhecido por portaria da autoridade
administrativa a quem o Órgão Central do SINDEC estiver subordinado, à vista do
54
decreto do Governador do Distrito Federal ou do Prefeito Municipal, homologado
este pelo Governador do Estado.
O decreto pelo qual se declarar o estado de calamidade pública
determinará o tempo de sua duração e especificará as áreas afetadas pelo
desastre que o provocou.
Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO
A LDO, aprovada anualmente pelo Congresso Nacional e sancionada
pelo Presidente da República, trata das transferências de recursos da União para
os Estados, Distrito Federal; e Municípios, na forma da legislação vigente,
ressalvadas aquelas transferências destinadas a atender a estado de calamidade
pública legalmente reconhecido por ato ministerial.
Nos casos de estado de calamidade pública, a LDO estabelece que:
-
os municípios ficam isentos de apresentação de documentos
comprobatórios de regularidade ( CND, CADIM, SIAFI etc.).
-
a isenção de contrapartida por parte do município aplica-se apenas
às transferências de recursos destinados ao financiamento das
ações de resposta aos desastres e de reconstrução.
Código de Processo Civil
Conforme o disposto nos arts. 177 e 182, do citado código, a
decretação do Estado de Calamidade Pública poderá interferir nos prazos dos
atos processuais inclusive os peremptórios, contribuindo para a lentidão da
justiça, pois neste caso os prazos processuais poderão ser prorrogados pelo Juiz,
no prazo superior a 60 dias.
55
3.2
Conseqüências Jurídicas da não observância dos preceitos
doutrinários e Legais para a Decretação da Situação de
emergência ou do Estado de Calamidade
A inobservância dos preceitos doutrinários ou legais de Defesa Civil,
que definem a ação Supletiva do Estado e/ou União nos Municípios assolados
por desastres que configurem a situação de emergência ou estado de
calamidade, ou destinação supletiva de recursos, a fim de atenderem obras
preventivas, no intuito de prevenir ou minimizar as conseqüências danosas de
eventos previsíveis, podem sujeitar a Administração Pública bem como os
administradores às seguintes medidas jurídicas:
Responsabilidade Civil do Estado
A responsabilidade do Estado foi consagrada pela primeira vez no art.
194 da Constituição Federal de 1946, sendo confirmada e aperfeiçoada no § 6º
do art. 37 da Carta Magna atual, impondo-lhe uma teoria extremamente rígida no
que diz respeito ao dever indenizatório:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus
agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito
de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
“Hoje a teoria dominante é a teoria da responsabilidade objetiva
por risco. Em outras palavras, como o Estado mobiliza instrumentos de
grande potencial lesivo, ao assim fazer, está ele de antemão
assumindo o risco pelos danos que daí advenham.
56
A moderna teoria do risco administrativo, de Hely Lopes
Meirelles23, faz surgir a obrigação de indenizar o dano do ato lesivo e
injusto causado à vítima pela administração. “Aqui não se cogita de
culpa da Administração ou de seus agentes, bastando que a vítima
demonstre fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão do
Poder Público. Tal teoria, como o nome está a indicar, baseia-se no
risco que a atividade pública gera para os administrados e na
possibilidade de acarretar dano a certos membros da comunidade,
impondo-lhes um ônus não suportado pelos demais. Para compensar
essa desigualdade individual criada pela própria Administração, todos
os outros componentes da coletividade devem concorrer para
reparação do dano, através do erário, representado pela Fazenda
Pública24. O risco e a solidariedade social são, pois, suporte desta
doutrina que, por sua objetividade e partilha dos encargos, conduz à
mais perfeita justiça distributiva”.
A abrangência da responsabilidade civil do Estado atinge
qualquer ato causador de dano. A redação constante do § 6º do art. 37
traz a palavra agente, que é denotadora de qualquer pessoa que
pratica função pública, ainda que irregularmente investida, como é o
caso de funcionário de fato; podemos, pois, afirmar que não resta ato
provindo do Estado, nas suas diversas expressões, assim como
pessoas privadas que cumprem função pública que não se encontre
sancionada pela responsabilidade civil.
Agente, ainda, é mesmo aquele servidor que extravase a sua
competência. Não importa que tenha atuado abusivamente. Se o fez a
23
MEIRELLES, Hely Lopes. apud BASTOS, Celso Ribeiro, in Comentários à Constituição do Brasil São
Paulo: Saraiva, 1992, p.171
24
A 3ª Câmara deste Pretório (TJSP), aos 26-05-1977, decidiu à unanimidade, Ap.n.260.146,Capital:
“Responsabilidade civil do Estado. Inundação de casa decorrente de forte aguaceiro. Evento devido
à falta de conservação de bueiros e galerias. Indenização devida pela Prefeitura Municipal. Tanto à doutrina
como a jurisprudência dominante nos tribunais já assentaram que o Poder Público deve responder pelos
danos sofridos pelos particulares, em razão do mau funcionamento dos serviços públicos”. (São Paulo,
Revista dos Tribunais, 1985, v.3, p.132-5).
57
partir de uma situação que lhe propiciava a própria Administração,
agente é.
......................
Há que se notar que hoje não se aceita mais a doutrina que fazia
distinção entre atos de império e atos de gestão25.
Como a reparação civil do Poder Público visa restabelecer o
equilíbrio rompido com o dano causado individualmente a um ou
alguns membros da comunidade, não há falar em indenização coletiva.
.........................
Aqui os Poderes Públicos não são propriamente causadores do
dano, visto que não há nexo de causalidade entre omissão e o
surgimento do prejuízo. Verifica-se, tão-somente, que pela sua inércia
a Administração possibilitou o dano. A sua não-atuação tornou-se uma
condição para que o ato lesivo se consumasse.
É bom frisar, no entretanto, que mesmo na teoria do risco é
possível aos responsabilizados por ela fazerem prova de culpa ou dolo
da
vítima.
Nestas
hipóteses
desaparece
a
responsabilidade
administrativa, quer totalmente, no caso de a culpa ter sido exclusiva
da vítima, quer concorrentemente, no caso de a culpa desta ter sido
meramente parcial.
A parte final do preceito sob comento assegura àqueles que
respondem patrimonialmente nos seus termos um direito de regresso
25
Em acórdão unânime da 1ª Câmara decidiu nosso Tribunal de Justiça:
“O que domina a nossa doutrina e jurisprudência atuais é o princípio da responsabilidade absoluta da
pessoa jurídica de direito público interno pelos atos que, direta ou indiretamente, causem danos a terceiros,
independentemente da consideração de se tratar de ato praticado jure imperi ou jure gestionis, e sem se
cuidar, outrossim, se houve culpa dos prepostos da administração. Desde que o ato desta acarretou prejuízos a
terceiros, sem que estes tenham concorrido exclusivamente para eles, impõe-se a sua responsabilidade pelo
Poder Público”( RT, 238:163).
58
contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Isto significa que
aquelas hipóteses em que os Poderes Públicos e concessionários são
condenados a reparar o dano, em sendo possível identificar um ou
alguns servidores responsáveis por ele e tendo ainda estes agido com
dolo ou culpa, deverão sofrer uma ação de regresso, isto é, ser
acionados pelo agente responsável a fim de haver o ressarcimento da
indenização paga. Essa ação de regresso só é cabível depois de ter
havido a condenação dos Poderes Públicos ou concessionários26
Dever de Probidade
O dever de probidade está constitucionalmente integrado na
conduta do administrador público como elemento necessário à
legitimidade de seus atos. O velho e esquecido conceito romano do
“probus”
e do “improbus” administrador público está presente na
nossa legislação administrativa, como também na Constituição da
República, (art. 37, § 4º), que pune a improbidade na Administração
com sanções políticas, administrativas e penais, nos seguintes termos:
“Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos
bens e o ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em
lei, sem prejuízo da ação penal cabível“.
No atual Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União
(Lei 8.112/90), como nas demais normas que incidem sobre a conduta
dos agentes públicos em geral, são encontradiças disposições
coibitivas da improbidade no trato dos bens que lhes são confiados
para gestão, sujeitando-os, pelo mau emprego ou dilapidação, a
responsabilização administrativa, civil ou criminal, conforme o caso e a
categoria do agente.
A Lei n.º 8.429, de 2.6.92, dispõe sobre as sanções aplicáveis
aos agentes públicos nos casos de improbidade administrativa, que
26
BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. Saraiva. São Paulo, 1992, 3º volume –
tomo III, p.168 –187.
59
classifica em três espécies: a) os que importam enriquecimento ilícito
(art.9º): b) os que causam prejuízo ao Erário (art.10); e c) os que
atentam contra os princípios da Administração Pública (art.11). As
sanções estão previstas no art. 12 e a lei determina que o Judiciário
deve aplicá-las levando em conta a extensão do dano e o proveito
patrimonial obtido pelo agente.
Paralelamente a esse preceitos, a lei reguladora da ação popular
(Lei 4.717/65), em conformidade com a instituição constitucional (art.
5º, LXXIII), explicitou os atos passíveis de anulação por esta via
judicial, desde que ilegais e lesivos ao patrimônio público, assim
considerados não só os das entidades estatais autárquicas como,
também,
os
das
fundacionais,
paraestatais
e
até
os
dos
estabelecimentos particulares subvencionados com dinheiro público.
Assim, o ato administrativo praticado com lesão aos bens e
interesses públicos também fica sujeito a invalidação pela própria
Administração ou pelo Poder Judiciário, por vício de improbidade,
que é uma ilegitimidade como as demais que nulificam a conduta do
administrador público.
Ao lado do dever de probidade e como seu complemento natural
está sempre o dever de prestar contas27.
Mandado de Segurança
27
MEIRELLES, Hely Lopes.. Direito Administrativo Brasileiro, 24. Ed.. São Paulo: Malheiros 1999, p. 92 e
93.
60
Previsto no Art. 5º, inciso LXIX, assim como na Lei Complementar n.º
1.533/51, confere aos indivíduos, admitindo-se também as entidades de direito
público, instrumento legal para se defenderem de atos ilegais ou praticados como
abuso de poder, por parte do poder público.
Assim por exemplo, se reconhecido o Estado de Calamidade Pública,
fica autorizada de acordo com o Art. 5º do Decreto Lei 3.365/41, a
desapropriação por utilidade pública de qualquer bem.
Suponhamos, a título ilustrativo, que o prefeito de determinado
município queira que, com a decretação do Estado de Calamidade Pública
devidamente reconhecido (antes já homologado pelo Governador do Estado) para
atingir desafeto político, desaproprie-se sua propriedade. Assim o ato, embora
eivado de forma legal, está totalmente contaminado pelo desvio de finalidade,
podendo a partir da decretação do Estado de Calamidade pelo município, ser
objeto de mandado de segurança o qual terá como autoridades coatoras, as
responsáveis pela decretação, homologação e reconhecimento do Estado de
Calamidade Pública.
Da mesma forma, a declaração ou manifestação do não atendimento
com recursos suplementares por parte do Estado e/ou União quando homologada
e reconhecida a Situação Anormal (Situação de Emergência ou Estado de
Calamidade), poderá acarretar mandado de segurança, pois, segundo os
aspectos legais e doutrinários, não há de se contestar nestas situações a falta do
atendimento, pois trata-se de direito líquido e certo, uma vez que não há dúvidas
quanto a verdadeira situação de fato.
Ação Popular
61
Prevista no Art. 5º LXXIII, da C.F., e regulamentada em nível infraconstitucional pela Lei 4.717/65, dá capacidade a qualquer cidadão em promovêla, por exemplo, no intuito de anular ato lesivo ao patrimônio público ou à
moralidade pública.
Para tanto entende-se como patrimônio público bens e direitos de valor
econômico, artístico, estético ou histórico.
Ressalta-se que o mandado de segurança não obsta a possibilidade
da promoção da ação popular ( súmula 101 do STF).
Assim, quando se destina recurso suplementar do Estado e/ou União,
por intermédio da Defesa Civil, sem contudo observar a tipicidade legal e
doutrinária que possibilita tal destinação, faz com que as autoridades públicas
que promovem o atendimento dos petitórios municipais, bem como estes, fiquem
sujeitos a fiscalização popular, através da citada ação.
Para tanto, a documentação pertinente fica à disposição de qualquer
cidadão, estando as entidades públicas obrigadas a fornecerem certidões e
informações no prazo de 15 quinze dias, sendo que, no caso de desobediência
estarão sujeitas às penas da Lei.
Aliada a anulação do ato lesivo ou imoral, ocorrerá a responsabilização
administrativa, ficando o Ministério Público obrigado a promover a devida
responsabilização civil ou criminal das partes envolvidas, no caso contra as
autoridades
públicas,
funcionários
ou
administradores
que
autorizaram,
aprovaram, ratificaram ou praticaram o ato impugnado, ainda que por omissão,
tiverem dado a oportunidade à lesão e contra os beneficiários diretos do mesmo.
Ação Civil Pública
Prevista na Lei n.º 7.347/85, responsabiliza sem prejuízo da ação
popular os danos causados, por exemplo, ao patrimônio público que atinjam
62
qualquer interesse difuso28 ou coletivo29. Uma diferença entre a ação popular e a
ação civil pública é que qualquer cidadão pode promover a primeira, já a
segunda, só pode ser promovida pelos legitimados no Art. 5º da retrocitada Lei
(Ministério Público, União, Estado, Município, Autarquia, Empresa Pública,
Fundação, Sociedade de Economia Mista ou Associação, que esteja constituída
pelo menos há um ano e inclua, entre as suas finalidades institucionais, a
proteção ao Meio Ambiente, ao consumidor, ao patrimônio Artístico, Estético,
Histórico, Turístico e Paisagístico ou a qualquer outro interesse difuso ou
coletivo). Da mesma forma o atendimento descabido, em desacordo com a
legislação e doutrina de Defesa Civil, aliado aos outros efeitos civis, criminais e
administrativos, acarretará a anulação do ato.
Por exemplo, o repasse de recurso suplementar do Estado e/ou União
ao município através dos órgãos de Defesa Civil, sem contudo este não estar em
situação legal que autorize o auxílio. Neste caso, poderá ser o ato jurídico alvo de
uma Ação Civil Pública.
Emprego Irregular de Verbas ou Rendas Públicas
É um tipo penal, previsto no Art. 315 do Código Penal Brasileiro, que
tem como objetivo manter os atos jurídicos que envolvam o Erário em
consonância com a sua destinação legal.
Assim, a destinação de recursos pela Defesa Civil em desacordo com
a sua doutrina e legislação poderá desencadear fato típico previsto no citado
dispositivo de Lei. Quando a autoridade praticante do ato lesivo ao Erário, for o
Prefeito Municipal, deverá observar-se o contido no Art.1º, inciso III do DecretoLei n.º 210/67.
28
Interesse Difusos – Interesses que sejam titulares pessoas indetermindas e ligadas por uma circunstância de
fato.
29
Interesse Coletivos – Interesses que sejam titulares grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si;
ou com parte contrária por uma razão jurídica base.
63
CONCLUSÃO
O desenvolvimento do tema “Defesa Civil – O Sistema Estadual e as
Conseqüências Jurídicas da Decretação do Estado de Calamidade Pública” foi
realizado por meio de pesquisa bibliográfica, onde se constatou que, apesar do
não estabelecimento de critérios que efetivamente norteiem a análise do referido
decreto, por parte do Governo Federal, as bases legais e doutrinárias adotadas
64
pela CEDEC têm dado o suporte técnico necessário para tal análise; constatouse, ainda, a excepcionalidade do ato homologatório e do reconhecimento do
decreto municipal.
Indicou-se o amparo legal para as atividades de Defesa Civil, bem
como, a legislação que deve ser observada pelos gestores da coisa pública, de
modo que os policiais militares, no desempenho de suas atividades junto à
CEDEC, possam aperfeiçoar seus conhecimentos e os disponibilizarem não só
no assessoramento que prestam ao Governador do Estado, mas também na
orientação dada aos administradores públicos municipais, clientes do Sistema
Estadual.
A triste constatação de que, atualmente, 68 prefeitos estão sendo
processados por improbidade administrativa e vários outros estão no Tribunal de
Justiça tentando justificar a falta ou irregularidades em licitações levadas a efeito
para a aquisição de bens ou serviços destinados ao atendimento de desastres,
por si só evidencia a carência dos dirigentes municipais de uma orientação
técnica e jurídica adequada.
Por força de tal constatação, recomenda-se a análise deste trabalho
monográfico pela CEDEC, dele extraindo-se os conceitos técnicos e jurídicos
apresentados para a elaboração de manuais, impressos ou qualquer outro meio
que possa ser utilizado com o escopo de orientar os dirigentes municipais, tendo
em vista o desconhecimento da matéria pelos mesmos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Nova Fronteira, 1986.
RUIZ, João Álvaro. Metodologia Científica. 1ª ed., Atlas, São Paulo. Atlas, 1978.
____Decreto n.º 40151, de 16 de junho de 1995. Reorganiza o Sistema Estadual
de Defesa Civil e dá outras providências. DOE, 1995.
____Decreto n.º 40069, de 2 de maio de 1995. Autoriza a Coordenadoria
Estadual de Defesa Civil – CEDEC, a celebrar convênios com municípios do
Estado, objetivando a transferência de recursos financeiros destinados à
execução de obras preventivas e de recuperação de defesa civil. DOE, 1995.
JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO – MP vai apurar culpa de Estado e
Prefeitura, São Paulo: 3 de março de 1999, p. 5.
JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO – Ações Integradas podem pôr fim às
enchentes na cidade, São Paulo: 8 de março de 1999, p. 5.
BIBLIOGRAFIA
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Paulo, 1992.
BRASIL. Constituição Federal. DOU, 1988.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de
1988, v. 1,São Paulo: Saraiva, 1990.
66
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HORTA, Raul Machado. Tendências do Federalismo Brasileiro. Revista Brasileira
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Comentários à Constituição Brasileira de 1988, v. 1,São Paulo: Saraiva, 1990.
SECRETARIA DE DEFESA CIVIL. Manual para a Decretação de Situação de
Emergência ou Estado de Calamidade Pública. Março, 1999.
MEIRELLES, Hely Lopes.. Direito Administrativo Brasileiro, 24. Ed.. São Paulo:
Malheiros 1999.
RAMOS, Dr. Fábio Vidal, Defesa Civil, Apostila.
Revista dos Tribunais, São Paulo, 1985, v.3, p.132-5.
SÃO PAULO. Constituição Estadual. São Paulo: DOE, 1989.
____. Decreto-lei n. 4.098, de 6 de fevereiro de 1942, define como encargos
necessários à defesa da Pátria, os serviços de defesa passiva anti-aérea.Rio de
Janeiro: DOU, 1942.
____. Decreto-lei n. 4.624, de 26 de agosto de 1942, cria o Serviço de Defesa
Passiva Anti-Aérea e dá outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1942
____. Decreto-lei n. 4.716, de 21 de setembro de 1942, dispõe sobre a criação e
organização da Diretoria Nacional do Serviço de Defesa Passiva Anti-Aérea, com
sede no Distrito Federal, e dá outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1942
____. Decreto Lei n. 4.800, de 6 de outubro de 1942, torna obrigatório o ensino
de defesa passiva e dá outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1942
____. Decreto Lei n.5.861, de 30 de setembro de 1943, modifica a denominação
do Serviço de Defesa Passiva Anti-Aérea e da respectiva Diretoria Nacional. Rio
de Janeiro: DOU, 1943.
____. Decreto Lei n. 9.370, de 17 de junho de 1946, extingue o Serviço de
Defesa Civil e dá outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1946
____. Decreto Lei n. 200, de 25 de fevereiro de 1967, dispõe sobre a organização
da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma da Administrativa
e dá outras providências. Rio de Janeiro: DOU, 1967
____. Decreto-lei n. 83.839, de 13 de agosto de 1979, dispõe sobre a estrutura
básica do Ministério do Interior, e dá outras providências. Brasília: DOU, 1979.
____. Decreto n. 97.274, de 16 de dezembro de 1988, dispõe sobre a
organização do Sistema Nacional de Defesa Civil (SINDEC), e dá outras
providências. Brasília: DOU, 1988.
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____. Decreto n.895, de 16 de agosto de 1993, dispõe sobre a organização do
Sistema Nacional de Defesa Civil ( SINDEC), e dá outras providências. Brasília:
DOU, 1993
____. Medida Provisória n. 886, de 30 de janeiro de 1995, dispõe sobre a
organização da Presidência da República e dos Ministérios, e dá outras
providências. Brasília: DOU, 1995
____. Lei n. 9.649, de 27 de maio de 1998, dispõe sobre a organização da
Presidência da República e dos Ministérios, e dá outras providências. Brasília:
DOU n. 100, de 28 de maio de 1998
____. Decreto n. 5.796, de 5 de março de 1975, reorganiza a Casa Militar do
Gabinete do Governador. São Paulo: DOE, 1975
____. Decreto n. 7550, de 9 de fevereiro de 1975, dispõe sobre o Sistema
Estadual de Defesa Civil. São Paulo:: DOE, 1976
____. Decreto n.40.151, de 16 de junho de 1995, reorganiza o Sistema Estadual
de Defesa Civil, e dá outras providência. São Paulo: DOU n. 114, de 17 de junho
de 1995.
____. Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da
Educação. Brasília: DOU, 1996.
____. Resolução C. Mil 4.610-CEDEC, de 16 de novembro de 1995, estabelece
critérios para Homologação da Declaração de Situação de Emergência ou de
Estado de Calamidade Pública no Estado de São Paulo.DOE,1995
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Defesa Civil – O Sistema Estadual e as Cinseguências Jurídicas da