Essa concepção do autor se deve ao fato de que, para ele, a memória não é dada pelo presente que volta ao passado, mas do passado que retorna ao presente. A memória pura (aquela que fica dentro do inconsciente) é conservada no indivíduo. O lembrar é determinado por ação da percepção que busca, nessa memória pura, os acontecimentos passados. Para Bérgson, o passado conserva-se no espírito de cada ser humano, e a memória é diferente da percepção. Esse é o mecanismo da ação através do qual a memória se torna ação e, por isso, nos faz lembrar de fatos passados. Possuímos, também, memória de fatos que não vivemos efetivamente, mas conhecemos através do outro, seja ele um objeto, como um livro, ou outra pessoa que nos relata fatos ocorridos ou imaginados. (BÉRGSON, 1990). Considerando essa compreensão do aspecto da memória como conservação, um outro conceito que difere é a divisão para a interpretação da memória como inteligência ou pensamento e a memória como mecanismo associativo. Ao primeiro grupo de teóricos da memória pertence o grande filósofo Hegel (1770 a 1831), e ao segundo, que é o da memória como mecanismo associativo, Espinosa (1632 a 1677), Hume (1711 a 1776), entre outros. Esses estudos sobre a compreensão da memória evoluíram e, atualmente, com a análise da psicologia moderna e a importância da personalidade do indivíduo no reconhecimento do que foi vivido, também as atitudes relativas à lembrança têm grande valor, sendo consideradas importantes pelos estudiosos da memória, que concentram seus estudos mais no aspecto da lembrança (ABBAGNANO,1998). Abrahão (2004), no texto: Teoria da história e reabilitação da oralidade: convergência de um processo, analisa avanços nos estudos da memória e identifica os tipos de memória individual, pública e coletiva. Para a autora, Bérgson (1990) relaciona o subjetivo à memória, e Halbwachs (1990) relaciona a memória ao fato social, que é responsável por organizá-la. Ela salienta, ainda, o que considera fundamental na análise de Halbwachs (1990), que é o conceito da memória, que é social, construída a partir da memória coletiva, e que se forma e transforma. A memória do indivíduo se forma a partir da significação que é dada pelo grupo. Lembrar, portanto, é refazer as experiências vividas no passado com o olhar do presente. Quanto ao conceito de lembrança, Halbwachs (1990) considera que, na maioria dos casos, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstituir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências do passado. Para o autor, quando lembramos, utilizamos os recursos de nossa consciência atual. Por mais nítida que pareça a lembrança de um fato antigo, ela não é a mesma imagem que experimentamos na infância, porque nós não somos os mesmos de então e porque nossa percepção alterou-se e, com ela, também nossas idéias, nossos juízos de realidade e de valor. Ao lembrarmos de fatos passados, realizamos um trabalho que exige disposição para que ele aconteça. As lembranças não são lineares, sendo, muitas vezes, fragmentos, ou seja, pequenas lembranças, que são detonadas por algum fator externo ou interno, e que precisam ser analisadas para que sejam compreendidas no contexto em que ocorreram. Isso acontece porque lembramos com o olhar do presente. A memória, também como função social, ainda para Halbwachs (1990), desempenha o papel da lembrança. O relembrar traz grande número de imagens do passado e esta faculdade exige um espírito alerta, que tenha capacidade de não confundir a vida atual com a que passou, de reconhecer as lembranças e opô-las às imagens de agora. As lembranças precisam do trabalho da reflexão para que possam reaparecer a partir de uma evocação. Como analisamos, a lembrança não é linear porque lembramos de fatos, aspectos, pessoas, lugares sem uma seqüência lógica, a menos que nos seja solicitado realizá-la. Podemos lembrar de ontem e recorrer a um fato da infância, assim como podemos ir imediatamente, ou não, para uma