Itaqui (RS), Sexta-feira, 25/07/2014 07 GERAL PROJETO CULTURAL: MEMÓRIA E SENSIBILIDADES NA PRODUÇÃO LITERÁRIA FEMININA DA FRONTEIRA OESTE DO RS (http://neurociencia.tripod.com/mnemosine.htm ). Tanira Rodrigues Soares* O Projeto Cultural é integrante das atividades acadêmicas do Mestrado Profissional em Memória Social e Bens Culturais do UNILASALLE - Canoas, e visa transpor os muros da academia e aglutiná-los aos conhecimentos experimentados na sociedade, especificamente na região da Fronteira Oeste do RS, nos municípios de Itaqui e Uruguaiana. Para tanto, será utilizada como elo entre memória e sensibilidades a produção literária de duas escritoras que projetaram em seus romances estes cenários, sendo elas Tânia Lopes, com a obra Limites e Ieda Inda, com o romance Baguala. Serão realizadas 8 publicações no Jornal Folha de Itaqui, na página 7, e um Colóquio denominado Memória e sensibilidades na produção literária feminina da Fronteira Oeste do RS, que contará com a presença das escritoras trabalhadas e palestrantes que desenvolvem estudos nas áreas abordadas pelo projeto. MEMÓRIA A memória sempre esteve presente nas sociedades humanas, pois através dela muitas informações, tradições, manifestações culturais e ritos são transmitidos de geração a geração. Devido a grande importância que a memória exerce com relação aos fatos acontecidos os gregos criaram uma deusa com capacidade de rememorar todas as coisas acontecidas através da lembrança, reelaborando o passado, ressignificando o presente e possibilitando novas reestruturações no futuro. Mnemosine é a deusa da memória e utilizando-se do poeta e de seus versos, expressa lembranças de feitos heróicos protagonizados pelos homens no passado, oportunizando sua releitura no presente. Os principais estudos sobre a memória remontam ao final do século XIX, mais especificamente à obra de Henri Bergson, Matéria e Memória (1896), direcionando os estudos para a memória individual. Em 1950, Maurice Halbwachs apresenta seu estudo sobre memória, tendo como foco a memória coletiva, desenvolvendo a reflexão de que "[...] cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva" (HALBWACHS, 1990, p. 51). Halbwachs (1990) não nega a existência de uma memória individual, mas estabelece um vínculo com a memória coletiva, caracterizando sua continuidade a partir das lembranças dos diversos grupos e de seus integrantes, permitindo que o indivíduo se identifique e rememore os acontecimentos, sempre levando em consideração o ângulo vivenciado por determinado grupo social. É salutar mencionar que Halbwachs (1990, p. 37) tece uma explicação relativa ao fato de não existir uma memória puramente individual, sem excluir a existência do que chamou de intuição sensível, "[...] o chamado a um estado de consciência puramente individual", que se destacaria no cenário social do indivíduo onde as lembranças estariam ligadas intimamente às suas percepções do mundo, sendo responsáveis por uma rememoração diferente e ímpar em relação aos demais integrantes do grupo social. Esta intuição sensível é a abertura para que outros estudos sobre a memória abordem as questões individuais e coletivas, sem considerar o campo de estudo de forma fechada, pois como menciona Halbwachs (1990), o rememorar não ocorre de maneira unilateral, mas a partir de relações recíprocas entre o individual e o coletivo. Nesta brecha identificada de que Halbwachs (1990) não nega a existência da memória individual, mas condiciona sua existência à memória coletiva, surgem estudos que enfocam a presença dos dois tipos de memória, 7.p65 1 Deusa Mnemósine, de Dante Gabriel Rosseti (1876-1881) sem que haja a sobreposição de uma sobre a outra, e sim um entrecruzamento entre as duas memórias. Neste caso, podem-se citar os estudos de Pollak (1992), ressaltando que as duas memórias têm como elementos constitutivos os acontecimentos, as pessoas ou personagens e os lugares. Para Pollak (1992), a memória se constitui de experiências vividas e de heranças deixadas pelas coletividades, ou seja, memória herdada. Tanto a memória individual quanto a coletiva são alvo de flutuações e seleções que, dependendo do momento, serão organizadas, preservadas ou deletadas, considerando as intenções prévias. Este fato comprova que a memória, seja vivida ou herdada, caracteriza-se como um fenômeno construído. Pollak (1992) defende a ideia de que o passado pode ser rememorado, considerando o olhar individual e o coletivo deste tempo, onde não haja sobreposição de um enfoque sobre o outro e que os olhares, tanto individual, quanto coletivo, sirvam de mecanismos para a construção de uma memória repleta de informações, sentimentos, vivências e heranças. Para Gondar (2008), recordar ou rememorar o passado no presente é uma ação possível de ser realizada a partir da memória individual e coletiva. No presente estudo, reuniram-se estas duas manifestações da memória, 23/07/2014, 11:44 sem estabelecer a sobreposição de uma sobre a outra, mas uma relação de complementaridade entre os dois tipos de memória. Outra pesquisadora que aborda a memória individual e coletiva é Ecléa Bosi, argumentando que é a partir do indivíduo que a memória se apresenta, embora esteja ligada ao coletivo. "Ele [indivíduo] é o memorizador e das camadas do passado a que tem acesso pode reter objetos que são, para ele, e só para ele, significativos dentro de um tesouro comum" (BOSI, 1994, p. 411). SENSIBILIDADES Entendendo-se a Literatura enquanto manifestação cultural de uma determinada sociedade, considerá-la como uma fonte de memória é profundamente profícuo, pois permite visualizar a forma como o escritor representou seu contexto social e cultural, possibilitando um descortinar de informações capazes de fornecer novas reinterpretações do passado. Esta forma singular e ímpar de produzir um discurso literário, que desperte a atenção e consiga estabelecer um vínculo com o leitor, tem como pressuposto a sensibilidade literária, isto é, a capacidade de registrar, através de palavras, os sentimentos e emoções vivenciados pelo escritor e seu grupo social. Segundo Leenhardt (2010), o termo sensibilidade deriva do latim sensibilitas e significa a capacidade do ser humano de sentir emoções. "A sensibilidade é, por conseguinte uma paixão, um estado passivo de receptividade [...] não pertence à ordem da razão nem à da inteligência conceitual" (LEENHARDT, 2010, p. 27). Se a sensibilidade é algo relacionado à emoção e aos sentimentos mais íntimos do indivíduo. A partir de seu olhar diferenciado em relação aos demais integrantes do seu grupo e, através da sua capacidade sensível, o escritor consegue registrar, reinventar, reinterpretar e ressignificar as informações ao seu alcance, não necessariamente aquelas por ele vivenciadas, mas também as transmitidas pelos integrantes do seu contexto social e cultural. O escritor estabelece uma relação dinâmica e interativa com a realidade, na qual sua materialidade é representada pelo corpo, já sua espiritualidade se manifesta na capacidade de sentir emoções. Após este primeiro estágio, o indivíduo organiza suas impressões de mundo através da percepção (PESAVENTO, 2007). O ato da percepção carrega consigo a atividade mental reflexiva, envolvendo as emoções, não ficando somente restrito à lógica dos princípios racionais. A sensibilidade, no entender de Fleck (2006), caracteriza-se por ser a via de acesso dos corpos humanos ao mundo externo, incluindo as relações com as demais pessoas e a forma como se estabelecem. "[...] é o modo como olhamos para as coisas, como ouvimos, mas também como as pensamos" (FLECK, 2006, p. 218). Estes dois conceitos trabalhados são responsáveis por forneceram informações pertinentes à temática trabalhada no Projeto Cultural, pois através da memória e das sensibilidades é possível estudar a produção literária feminina no Rio Grande do Sul, assunto que será abordado no dia 22 de agosto, nesta mesma página. *Mestranda do Curso de Mestrado Profissional em Memória Social e Bens Culturais do Unilasalle - Canoas Contato: [email protected]