O PROTESTO DE TÍTULOS E OUTROS DOCUMENTOS DE DÍVIDA NA ATUALIDADE. O NOVO CPC E O PROTESTO. 2015 – Aula 5 DOCUMENTO DE DÍVIDA E SEU PROTESTO EXTRAJUDICIAL Vicente de Abreu Amadei SUMÁRIO 1. Do protesto especial para fins de falência ao protesto comum de documentos de dívida. 2. Noção de “documentos de dívida” e delimitação daqueles suscetíveis de protesto. As definições de certeza, liquidez e exigibilidade. 3. A qualificação dos documentos de dívida para o protesto 1 I Do protesto especial para fins de falência ao protesto comum de documentos de dívida ESPÉCIES DE PROTESTO NOTARIAL PROTESTO COMUM ou CÂMBIAL (art. 21 LP) ESPECIAL ou EXTRACAMBIAL Protestos de documentos de dívida 2 II Noção de “documentos de dívida” e delimitação daqueles suscetíveis de protesto. As definições de certeza, liquidez e exigibilidade DOCUMENTOS DE DÍVIDA SÃO DOCUMENTOS ORDINÁRIOS (não títulos de crédito) ⇒ enquanto documentos ordinários, eles têm função probatória e acessória do direito que representam ou materializam por escrito; ⇒ não têm função cambial, não incorporam o direito ao documento e não seguem o regime cambiário. 3 DOCUMENTOS DE DÍVIDA SÃO REPRESENTATIVOS DE DÍVIDA (não de débito qualquer) ⇒ enquanto documentos de dívida representam obrigação de pagar determinada quantia em dinheiro; ⇒ mas a ideia de dívida (ao menos na expressão “documento de dívida”, para fins de protesto) vai além da noção de débito: dívida é débito qualificado pela certeza, liquidez e exigibilidade da obrigação de pagar. Assim, a potência está para o ato, como o débito está para a dívida. DOCUMENTOS DE DÍVIDA Documentos de dívida suscetíveis de protesto não são títulos de crédito, são títulos (documentos) ordinários que comprovam por escrito obrigações pecuniárias certas, líquidas e exigíveis, e que podem ser protestados pelo tabelião. 4 CERTEZA – LIQUIDEZ - EXIGIBILIDADE • Certa é a dívida isenta de dúvida em sua existência (Carnelutti), sem controvérsia sobre sua existência (em fundamento, an debeatur Calamandrei), é o título (documento de dívida) formalmente perfeito e completo em “face da lei que o instituiu e da ausência de reservas à plena eficácia do crédito nele documentado” (Humberto Theodoro Jr.); • Líquida é a dívida isenta de dúvida em seu objeto (Carnelutti), de prestação determinada em sua importância (quantum debeatur Calamandrei); • Exigível é a dívida isenta de dúvida em sua atualidade (Carnelutti), quando o seu pagamento não depende de termo ou condição, nem está sujeito a outras limitações (Calamandrei). (Cf. Humberto Theodoro Júnior, in Curso de Direito Processual Civil, Volume II. Ed. Forense) DOCUMENTOS DE DÍVIDA STJ, REsp 1.340.236-SP (representativo de controvérsia), j. 14/10/2015: • A legislação de regência estabelece que o documento hábil a protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de obrigação pecuniária líquida, certa e exigível. Portanto, a sustação de protesto de título, por representar restrição a direito do credor, exige prévio oferecimento de contracautela, a ser fixada conforme o prudente arbítrio do magistrado. • Voto do rel. Min. Luis Felipe Salomão: “Em recente precedente da Quarta Turma, REsp 1.124.709/TO, foi observado que o art. 1º da Lei n. 9.492/1997, em enunciação abstrata, admite o protesto de títulos e de outros "documentos de dívida" (entenda-se: prova escrita a demonstrar a existência de obrigação pecuniária, líquida, certa e exigível), não havendo razoabilidade em entender que o protesto, instituto desde a sua origem concebido para protesto cambial, seja imprestável para título de crédito dotado de executividade. 5 DOCUMENTOS DE DÍVIDA PROTESTÁVEIS 1º) documentos de dívida de responsabilidade das pessoas sujeitas às conseqüências da legislação falimentar (art. 23, parágrafo único, da Lei 9.492/97): a) qualquer título líquido que legitime ação executiva (art. 585 do Código de Processo Civil), ainda que não seja cambial (ou cambiariforme); b) título líquido formalizado em mera verificação de conta judicial; 2º) documentos de dívidas protestáveis diversos, mesmo que não seja para fins de falência, desde que haja específica previsão legal (v.g. contrato de câmbio e outros), ou que se qualifiquem como representativos de obrigações pecuniárias certas, líquidas e exigíveis. OUTROS DOCUMENTOS DE DÍVIDA POSIÇÃO CGJ-SP (LEI Nº 9.492/97) • CGJ-SP (1º tempo): sem previsão legal específica, não se pode ampliar o rol dos títulos protestáveis (Proc. 2.374/97, parecer MM. Juiz Auxiliar Marcelo Fortes Barbosa Filho, de caráter normativo, DOE 10/09/98). • CGJ-SP (2º tempo): compreendem “todos os títulos executivos judiciais e extrajudiciais previstos pela legislação processual” (Processo CG nº 864/2004, parecer do então Juiz José António de Paula Santos Neto, em 4.4.05, aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Mario António Cardinale, em 24.5.05). 6 OUTROS DOCUMENTOS DE DÍVIDA POSIÇÃO CGJ-SP (LEI Nº 9.492/97) “... ampliação do rol dos títulos (lato sensu) protestáveis, no Estado de São Paulo, não foi fruto de precipitação, mas resultado de sólida reflexão e prudente amadurecimento, como se impõe às decisões judiciais: a) a uma, porque, após a vigência da Lei n° 9.492/97, a interpretação primeira foi de maior cautela, exigindo, além da genérica previsão da lei federal, "expressa e específica previsão normativa" para se permitir o protesto de documento de dívida (Proc. CG n° 2.374/97, parecer de 02 de setembro de 1998), com interpretação restritiva do artigo 1º da referida Lei n° 9.492/97 (Proc. CG 1.500/2002), situação essa que se alterou apenas em 24 de maio de 2005, quando bem sedimentado o novo enfoque “à luz de novos e significativos elementos, de cunho legislativo (pense, v.g, no advento do novo Código Civil, da recente Lei de Falências, e, ainda, da Lei Estadual n 11.331/02, engendrada de forma mais madura, estudada, discutida e transparente), doutrinário e, mesmo fático" (Proc. CG 864/2004); b) a duas, porque a guarida doutrinária àquela interpretação extensiva atenta à dinâmica atual da realidade social é, com efeito, expressiva (...) - (Voto do Des. Gilberto Passos de Freitas, no Agravo Regimental nº 126.917-0/6-01 (0008759-80.2005.8.26.0000), Órgão Especial TJSP, rel. designado Des. Paulo Fernando Lopes Franco, j. 22.03.2006). ° LEI ESTADUAL Nº 13.160, DE 21.07.2008 (ALTERA A LEI 11.331/02) • Artigo 1º - Passam a vigorar com a seguinte redação os itens 7 e 8 das Notas Explicativas da Tabela IV - Dos Tabelionatos de Protesto de Títulos da Lei nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002 (...) : • • I - o item 7: “7 - Havendo interesse da administração pública federal, estadual ou municipal, os tabelionatos de protesto de títulos e de outros documentos de dívida ficam obrigados a recepcionar para protesto comum ou falimentar, as certidões de dívida ativa, devidamente inscrita, independentemente de prévio depósito dos emolumentos, custas, contribuições e de qualquer outra despesa, cujos valores serão pagos na forma prevista no item 6, bem como o crédito decorrente de aluguel e de seus encargos, desde que provado por contrato escrito, e ainda o crédito do condomínio, decorrente das quotas de rateio de despesas e da aplicação de multas, na forma da lei ou convenção de condomínio, devidas pelo condômino ou possuidor da unidade. • O protesto poderá ser tirado, além do devedor principal, contra qualquer dos codevedores, constantes do documento, inclusive fiadores, desde que solicitado pelo apresentante.” 7 LEI ESTADUAL Nº 13.160, DE 21.07.2008 (ALTERA A LE 11.331/02) • Artigo 1º - Passam a vigorar com a seguinte redação os itens 7 e 8 das Notas Explicativas da Tabela IV - Dos Tabelionatos de Protesto de Títulos da Lei nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002 (...) : • • II - o item 8: “8 - Compreendem-se como títulos e outros documentos de dívidas, sujeitos a protesto comum ou falimentar, os títulos de crédito, como tal definidos em lei, e os documentos considerados como títulos executivos judiciais e extrajudiciais pela legislação processual, inclusive as certidões da dívida ativa inscrita de interesse da União, dos Estados e dos Municípios, em relação aos quais a apresentação a protesto independe de prévio depósito dos emolumentos, custas, contribuições e de qualquer outra despesa, cujos valores serão pagos pelos respectivos interessados no ato elisivo do protesto ou, quando protestado o título ou documento, no ato do pedido do cancelamento de seu registro, observados os valores dos emolumentos e das despesas vigentes na data da protocolização do título ou documento, nos casos de aceite, devolução, pagamento ou desistência] do protesto, ou na data do cancelamento do protesto, observando-se, neste caso, no cálculo, a faixa de referência do título ou documento na data de sua protocolização. Os contratos de locação e demais documentos demonstrativos da dívida poderão ser apresentados por meio de cópia autenticada; não estando indicado no título ou no documento de dívida o valor exato do crédito, ou quando este se referir a parcela vencida, o apresentante, sob sua inteira responsabilidade, deverá juntar demonstrativo de seu valor.” LEI FEDERAL x LEI ESTADUAL Processo CG 2010/88798 • “ ...competência privativa da União legislar sobre Direito Obrigacional (Constituição da República, art. 22, inciso I). No que toca ao protesto, o poder dos Estados se limita à definição do valor dos emolumentos relativos aos atos notariais (Constituição da República, art. 236, § 2º; Lei nº 10.169/00, art. 1º, caput).” • “Ora, a atividade legislativa estadual que dispõe sobre matéria de competência privativa da União padece de inconstitucionalidade, como tem proclamado o Supremo Tribunal Federal (ADI 3.080-SC, Relatora Ministra Ellen Gracie, j. 20.8.04).” 8 POSIÇÃO ATUAL DA CGJ-SP • NSCGJ. T. II, Cap. XV: • 20. Podem ser protestados os títulos de crédito, bem como os documentos de dívida qualificados como títulos executivos, judiciais ou extrajudiciais. • 22. Além dos considerados títulos executivos, também são protestáveis outros documentos de dívida dotados de certeza, liquidez e exigibilidade, atributos a serem valorados pelo Tabelião, com particular atenção, no momento da qualificação notarial. • 23. Os documentos de dívida podem ser apresentados no original ou em cópia autenticada ou cópia digitalizada, mediante arquivo assinado digitalmente, no âmbito do ICPBrasil, sendo de responsabilidade do apresentante o encaminhamento indevido ao Tabelionato. • 24. Os documentos de dívida assinados digitalmente, no âmbito do ICPBrasil, podem ser enviados a protesto na forma eletrônica. III A qualificação dos documentos de dívida para o protesto 9 A AUSÊNCIA DE ROL TAXATIVO • Rol fechado (delimitação precisa): documentos de dívida qualificados como títulos executivos (judiciais ou extrajudiciais) ou com previsão legal para o protesto; • Corte aberto (delimitação difusa): documentos de dívida dotados de certeza, liquidez e exigibilidade, conforme valoração (qualificação prudencial) do tabelião. QUALIFICAÇÃO PRUDENCIAL DO TABELIÃO • Juízo formal e concreto de operador do direito, na verificação do título/documento de dívida apresentado, em ordem a sua protestabilidade, ou improtestabilidade, segundo a lei; • Em “outros documentos de dívida” impõe-se a avaliação prudencial-jurídica dos atributos de certeza, liquidez e exigibilidade (conditio sine qua non do protesto). 10 QUALIFICAÇÃO PRUDENCIAL DO TABELIÃO • Balizas objetivas: apoio legal, doutrinário e jurisprudencial, na definição dos atributos de certeza, liquidez e exigibilidade; • Evitar o risco de subjetividade: nenhuma qualificação pode ser arbitrária nem discricionária, mas é sempre vinculada à lei, ainda que envolva valoração de atributos; • Evitar o risco de falta de congruência sistêmica e de uniformidade: quer interna (no próprio serviço), quer dos serviços em geral (relevância do autocontrole de classe e do controle correcional da CGJ). Outras questões no âmbito da qualificação • Duplicidade ou multiplicidade de títulos/documentos de dívida do mesmo crédito: evitar. • Título já protestado e documentos de dívida subsequente apresentado para o protesto: evitar. • Cf. Proc. CG 68.026/2008: caso de inadmissibilidade de protesto de acordo judicial homologado (título executivo judicial), referente a cheque não pago já protestado. 11 Questões secundárias ou reflexivas da qualificação de documentos de dívida => O erro teratológico, o rigor excessivo ou a fluidez exagerada no âmbito da qualificação podem refletir no campo da responsabilidade: • civil indenizatória; • administrativa disciplinar. => Mas é preciso, nisso, também considerar que se está em sede de juízo prudencial de operador de direito, que qualifica com independência jurídica (atenção especial ao critério do estudo do documento e do direito, segundo as normas aplicáveis e o status da ciência jurídica do tempo da Qualificação). FIM 12